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De A legião estrangeira:
“Preferia sua cólera antiga, que me ajudara na minha luta contra mim mesma, pois coroava
de insucesso os meus métodos e talvez terminasse um dia me corrigindo: eu não queria era
esse agradecimento que não só era a minha pior punição, por eu não merecê-lo, como vinha
encorajar minha vida errada que eu tanto temia, viver errado me atraía.”.
“Ele parecia um mendigo que agradecesse o prato de comida sem perceber que lhe haviam
dado carne estragada.” 22
“Eu tinha muita consciência de ser uma criança, o que explicava todos os meus graves
defeitos, e pusera tanta fé em um dia crescer – e aquele homem grande se deixara enganar
por uma menina safadinha.” 23
“Ali fiquei ofegante e de olhos fechados, sentindo na boca o amargo empoeirado do tronco,
os dedos mecanicamente passando e repassando pelo duro entalhe de um coração com
flecha.” 23
“Seria fácil demais querer o limpo; inalcançável pelo amor seria o feio, amar o impuro era a
nossa mais profunda nostalgia.” 24
De Laços de família:
Conto “Amor”:
“Ela apaziguara tão bem a vida, cuidara tanto para que esta não explodisse. Mantinha tudo
em serena compreensão, separava uma pessoa das outras, as roupas eram claramente feitas
para serem usadas e podia-se escolher pelo jornal o filme da noite – tudo feito de modo a que
um dia se seguisse ao outro. E um cego mascando goma despedaçava tudo isso. E através da
piedade aparecia a Ana uma vida cheia de náusea doce, até a boca.” P. 24
De Água Viva
“Eu quero captar o instante já, que de tão fugidio não é mais, já tornou-se um novo instante.
Cada coisa tem um instante em que ela é. Eu quero apossar-me do é da coisa. Eu tenho um
pouco de medo, medo ainda de me entregar, pois o próximo instante é o desconhecido.”
(adaptado por Bethania)
“Obediente, ela olhou. E de súbito eis que o pardal alçou vôo, e na surpresa Lóri esqueceu-
se de si própria e disse com uma criança para Ulisses:
Falara com a inocência que usava nas aulas com as crianças, quando não temia ser julgada.
Inquieta então olhou rápido para o lado de Ulisses. Ele a olhava. Com um susto Lóri notou:
era um olhar... de amor?”
De A hora da estrela:
“Quero antes afiançar que essa moça não se conhece senão através de ir vivendo à toa. Se
tivesse a tolice de se perguntar “quem sou eu?” cairia estatelada e em cheio no chão. É que
“quem sou eu?” provoca necessidade. E como satisfazer necessidade? Quem se indaga é
incompleto.” 20.
Da dedicatória do autor:
“(...) Sei de muita coisa que não vi. E vós também. Não se pode dar uma prova da existência
daquilo que é mais verdadeiro, o jeito é acreditar. Acreditar chorando.”
Sobre metaficção:
“Eu não sou um intelectual, escrevo com o corpo. E o que escrevo é uma névoa úmida. As
palavras são sons tranfigurados de sombras que se entrecruzam desiguais, estalactites, renda,
música transfigurada de órgão. (...) Tentarei tirar ouro do carvão. (...) Este livro é uma
pergunta.” 21
“(Escrevo sobre o mínimo parco enfeitando-o com púrpura, jóias e esplendo. É assim que se
escreve? Não, não é acumulando e sim desnudando. Mas tenho medo da nudez, pois ela é a
palavra final.)” 98
“Enquanto eu tiver perguntas e não houver resposta continuarei a escrever. (...) A minha vida
a mais verdadeira é irreconhecível, extremamente inferior e não tem uma só palavre que a
signifique.”
“Perdi alguma coisa que me era essencial, e que já não me é mais. Não me é necessária, assim
como se eu tivesse perdido uma terceira perna que até então me impossibilitava de andar mas
que fazia de mim um tripé estável. Essa terceira perna eu perdi. E voltei a ser uma pessoa
que nunca fui. Voltei a ter o que nunca tive: apenas as duas pernas.” 7-8
De A descoberta do Mundo (trecho):
" Vi a Esfinge. Não a decifrei. Mas ela também não me decifrou. Encaramo-nos de igual para
igual. Ela me aceita, eu a aceitei. Cada uma com o seu mistério. "
Trechos de crítica:
– Manuel da Costa Pinto: “ O paralelo mais óbvio é com Clarice Lispector. Assim como a
autora de A paixão segundo G. H. (1964), (Hilda) Hilst cria personagens mergulhadas na
pura interioridade, em que os referentes externos são fagulhas que desencadeiam uma
torrente de pensamentos e sensações.” (Literatura Brasileira Hoje, p. 97).
Alfredo Bosi: “Basta ler as obras que precederam A Paixão para acompanhar a lenta redução
operada: dos fragmentos em que se estilhaçava a intuição da escritora à unidade da
consciência que se esforça por transmitir os momentos de sua iluminação. Termo que
parecerá místico, mas que é justo empregar aqui, pois tem o selo da iluminação religiosa
aquele reconhecimento súbito de uma verdade que despoja o eu das ilusões cotidianas e o
entrega a um novo sentido da realidade (...).” (p.480).
José Paulo Paes: “Com razão se tem chamado de poética a ficção de C.L. Poética é tanto pela
riqueza metafórica da linguagem como pelo fato de se constituir toda ela numa vasta metáfora
do real, a que busca captar, não em termos de verossimilhança mais ou menos realista, mas
ao nível de uma abordagem por assim dizer fenomenológica. Daí o sentido muito especial
que a introspecção nela assume: ao se debruçar sobre a vida interior de suas personagens,
preocupa-se a ficcionista menos em desvendar-lhes o mecanismo psicológico dos atos que a
própria razão metafísica de seu “estar no mundo”.” (Pequeno dicionário de Literatura
Brasileira, p. 232)
Affonso Romano de Sant´Anna: “Em Clarice importa mais a geografia interior. Por isto, seus
personagens parecem tão estranhos. Ao invés de tipos épicos e dramáticos, temos figuras
situadas numa aura de mistério, vivendo relações profundas dentro do mais ordinário
cotidiano.”; “O extraordinário, no entanto, surge não do aspecto exterior dessas figuras, mas
do que lhes sucede no íntimo. Com todos eles ocorre um fenômeno que a autora não nomeia,
mas que a crítica pode chamar de epifania: uma súbita revelação da verdade.” (Clarice: a
epifania da escrita, p. 4 e 5)
Ivo Barbieri: “E já aí vislumbramos uma tensão que será constante na romancista: o mundo
convertido pelo homem em opacidade com que a vida, os sentimentos vivos, “o coração
selvagem”, são exilados para alguns raros momentos.”; “Na tensão entre a opacidade e o
instante liberador se concentra a tensão básica da obra de Lispector. Tal como exposta, essa
tensão parece processar-se em condições ainda abstratas. Mas não é verdade. À medida em
que nos entranhamos no seu universo, iremos percebendo que ela assenta e responde à
captação de uma certa realidade histórica: a realidade do homem contemporâneo nas grandes
metrópoles.” (P. 528, A literatura no Brasil)