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Ações situadas e vocabulários de motivos1

Charles Wright Mills


University of Wisconsin
Originalmente publicado na American Sociological Review, Vol. 5, n. 6, 1940, pp. 904-913.
Tradução: Alexandre Werneck

A principal reorientação experimentada pelas atuais teorias e formas de observação na socio-


logia da linguagem surgiu com a derrubada da noção wundtiana de que a linguagem tem co-
mo função a “expressão” de elementos anteriores a ela e interiores ao indivíduo. O postulado
fundamentador do moderno estudo da linguagem é simples: temos que abordar o comporta-
mento linguístico, não o referindo a estados particulares dos indivíduos, e sim observando sua
função social como coordenador de ações diversas. Em vez de expressar algo antecedente e
interior à pessoa, a linguagem é tomada por outras pessoas como um indicador de ações futu-
ras.2
Nessa abordagem, há sugestões a respeito de problemas de motivação. O objetivo deste
artigo é delinear um modelo analítico para a explicação de motivos baseada em uma teoria
sociológica da linguagem e em uma psicologia sociológica.3
Em contraste com a dedutível concepção dos motivos como “auroras” subjetivas da ação,
os motivos podem ser considerados como vocabulários típicos dotados de funções determiná-
veis em situações societais delimitadas. Os atores sociais verbalizam e imputam motivos para
si e para os outros. Explicar o comportamento referindo-o a um “motivo” inferido e abstrato é
uma coisa. Analisar os mecanismos linguageiros observáveis de imputação e declaração de
motivos conforme eles operam na conduta é uma coisa bastante diferente. Antes de serem
elementos fixos “no interior” de um indivíduo, os motivos são os termos por meio dos quais
opera a interpretação de conduta pelos atores sociais. Essa imputação e essa declaração de mo-
tivos pelos atores são fenômenos sociais a serem explicados. As diferentes razões que os ho-
mens dão para suas ações não são algo sem razão.

1
Versão revisada de um paper apresentado à Society for Social Research, na University of Chicago, em 16 e 17
de agosto de 1940.
2
Ver: C. Wright Mills. “Bibliographical Appendices”, Section I, 4: “Sociology of Language”. Em: Contemporary
Social Theory. Nova York, Barnes, Becker & Becker, 1940.
3
Ver George Herbert Mead. “Social Psychology as Counterpart of Physiological Psychology”. Psychology Bulle-
tin, VI, 1909, pp. 401-408; Karl Mannheim. Man and Society in an Age of Reconstruction. Nova York, 1940;
Leopold von Wiese-Howard Becker. Systematic Sociology, part I. Nova York, 1932; John Dewey. “All Psychology
is either Biological or Social Psychology”. Psychological Review, Vol. 24, p. 276.
Primeiramente, devemos demarcar as condições gerais sob as quais essa imputação e es-
sa declaração de motivos parecem ocorrer.4 Em seguida, devemos oferecer uma caracterização
de motivos em termos nítidos e um paradigma explicativo para o porquê de certos motivos
serem verbalizados em vez de outros. E, por fim, temos que apontar os mecanismos de ligação
entre vocabulários de motivos e sistemas de ação. O que queremos é uma análise da função
integradora, controladora e especificadora cumprida por um certo tipo de discurso falado em
ações socialmente situadas.
A situação genérica em que a imputação e a declaração de motivos surgem envolve,
primeiramente, a conduta social ou os programas (declarados) de criaturas treinadas na lin-
guagem, ou seja, programas e ações orientados com referência a ações e falas de outrem; em
segundo lugar, a declaração e a imputação de motivos são concomitantes com a forma discur-
siva conhecida como “questão”. Situações por trás de questões tipicamente envolvem progra-
mas ou ações alternativos ou inesperados cujas fases analiticamente denotam “crises”.5 O que
diferencia a questão é o fato de que geralmente ela provoca uma ação verbal, não uma resposta
motora. A questão é um elemento de conversação. A conversação pode estar relacionada com
as características factuais de uma situação na medida em que elas sejam vistas ou se acredite
que sejam; ou ela pode buscar integrar e promover um conjunto de ações sociais diversas com
referência à situação e a seu padrão normativo de expectativas. É nesta última fase de conver-
gência e divergência da conversação que surgem discursos e vocabulários persuasivos e dissu-
asivos. Pois os homens vivem por atos instantâneos de experiência e suas atenções são direci-
onadas para fora de si, até que os atos sejam frustrados de alguma forma. É nesse momento
que têm lugar a percepção de si e do motivo. A “questão” é um índice linguageiro de tais con-
dições. A declaração e a imputação de motivos são característicos de tais conversações, uma
vez que surgem em situações de “questionamento”.
Os motivos são imputados ou declarados como respostas a questões que interrompem
atos ou programas. Motivos são palavras. Mas, genericamente, a que elas se referem? Eles não
denotam quaisquer elementos “nos” indivíduos. Eles representam consequências situacionais

4
A importância para a pesquisa dessa tarefa inicial é clara. A maioria das pesquisas no nível verbal apenas colo-
cam perguntas abstratas sobre indivíduos, mas se podemos experimentalmente delimitar as situações em que
certos motivos podem ser verbalizadas, podemos usar essa delimitação na construção de questões situacionais, e
estaremos testando deduções de nossa teoria.
5
Sobre a “questão” e a “conversação”, ver: G. A. DeLaguna. Speech: Its function and Development, 37 (e index).
New Haven, 1927. Sobre os motivos em crises, ver: J. M. Williams. The Foundations of Social Science, 435. Nova
York, 1920.
previstas para condutas questionadas. Uma intenção ou um propósito (apresentado como um
“programa”) é o percebimento de uma consequência prevista; motivos são nomes dados a si-
tuações consequentes, e substitutos para ações que conduzem a elas. Por trás de questões estão
possíveis ações alternativas com suas consequências finais. “As palavras introspectivas que
usamos como motivos são descrições grosseiras, estenográficas, para certos padrões típicos de
estímulos, discrepantes e contraditórios.”6
O modelo de conduta propositada associado ao nome de Dewey pode ser apresentado
de forma breve. Indivíduos confrontados com “atos alternativos” executam um ou outro com
base nas consequências diferenciais que preveem. Esse esquema abertamente utilitarista é ina-
dequado, porque: (a) os “atos alternativos” de conduta social “aparecem” na maioria das vezes
em forma linguageira, como uma questão, declarada por si mesmo ou por outrem; (b) é mais
adequado dizer que indivíduos agem em termos da antecipação de consequências nomeadas.
Entre esses nomes e em algumas linhas de ação tecnologicamente orientadas, podem
surgir termos como “útil”, “prático”, “prestativo”, etc., termos bastante “definitivos” para os
pragmatistas e também para alguns setores da população americana inseridos nessas situações
delimitadas. No entanto, há outras áreas da população com diferentes vocabulários de motivos.
A escolha das linhas de ação é acompanhada por representações – e da seleção entre elas – de
seus fins situacionais. Os homens distinguem as situações por meio de vocabulários específi-
cos, e é nos termos de algum vocabulário delimitado que eles antecipam consequências de
conduta.7 Vocabulários estáveis de motivos interligam consequências previstas e ações especí-
ficas. Não há necessidade de invocar como explicação termos “psicológicos” como “desejo” ou
“vontade”, uma vez que eles próprios devem ser explicados socialmente.8 A previsão é uma
nomeação, subvocal ou manifesta, de fases terminais e/ou consequências societais de conduta.
Quando um individuo nomeia consequências, ele provoca os comportamentos para os quais o
nome é uma sugestão restauradora. Em uma situação societal, está implícita nos nomes dados
a consequências a dimensão social dos motivos. Por meio de tais vocabulários, operam tipos
de controles sociais. Além disso, os termos em que a questão é formulada geralmente conterão
ambas as alternativas: “amor ou dever?”, “negócios ou prazer?” Situações institucionalmente

6
K. Burke. Permanence and Change, 45. Nova York, 1936. Estou em dívida com esse livro pelas várias pistas que
são sistematizadas na presente apresentação.
7
Ver esses experimentos com em C. N. Rexroad. “Verbalization in Multiple Choice Reactions”. Psychological
Review, Vol. 33, 1926, p. 458.
8
Ver: John Dewey. “Theory of Valuation”. International Encyclopedia of Unified Science. Nova York, 1939.
diferentes possuem diferentes vocabulários de motivos adequados a seus respectivos compor-
tamentos.
Essa concepção sociológica de motivos como fases linguageiras relativamente estáveis de
situações delimitadas é bastante coerente com o programa de Mead para abordar a conduta
socialmente e a partir do exterior. Ela não permite esquecer que “tanto motivos quanto ações
geralmente se originam não do interior, mas da situação em que os indivíduos se encon-
tram...”9 Ela traduz a questão do “porquê”10 em um “como”, respondível em termos de uma
situação e seu vocabulário típico de motivos, ou seja, aqueles que convencionalmente acom-
panham aquela situação típica e funcionam como deixas e justificativas para ações normativas
em seu interior.
Foi indicado que a questão é geralmente um índice para a declaração e a imputação de
motivos. Max Weber define motivo como um complexo de sentido que pareça ao próprio ator
ou ao observador ser uma base adequada para sua conduta.11 O aspecto do motivo que essa
concepção alcança é seu caráter intrinsecamente social. Um motivo satisfatório ou adequado é
aquele que satisfaz os questionadores de um ato ou programa, quer seja dos outros ou do pró-
prio ator. Como palavra, um motivo tende a ser aquela que seja para o ator e os outros mem-
bros de uma situação uma resposta inquestionável para questões relativas à conduta social e
linguageira. Um motivo estável é um ultimato em uma conversação justificatória. As palavras
que em uma situação típica cumprirão essa função são circunscritas pelo vocabulário de moti-
vos aceitáveis para essas situações. Motivos são justificações aceitas para programas ou atos
atuais, futuros ou passados.
Denominá-los de justificação não nega a sua eficácia. Muitas vezes, antecipações de jus-
tificativas aceitáveis controlarão a conduta (“Se eu fizesse isso, o que poderia dizer? O que eles
diriam?”) As decisões podem ser, no todo ou em parte, delimitadas por respostas a essas inter-
rogações.

9
Karl Mannheim. Man and Society. Londres, 1940, p. 249.
10
Convencionalmente respondível por referência a “fatores subjetivos” interiores a indivíduos. R. M. Maclver.
“The Modes of the Question Why”. Journal of Social Philosophy, 1940. Ver também seu “The lmputation of Mo-
tives”. American Journal of Sociology, 1940.
11
Wirtschaft und Gesellschajt, 5. Tubingen, 1922: “‘Motiv’ heißt ein Sinnzusammenhang, welcher dem Han-
delnden selbst oder dem Beobachtenden als sinnhafter ‘Grund’ eines Verhaltens erscheint. ‘Sinnhaft adäquat’ soll
ein zusammenhängend ablaufendes Verhalten in dem Grade heißen, als die Beziehung seiner Bestandteile von
uns nach den durchschnittlichen Denk- und Gefühlsgewohnheiten als typischer (wir pflegen zu sagen: ‘richti-
ger’) Sinnzusammenhang bejaht wird.”
Um homem pode dar início a um ato por um motivo. No decorrer do mesmo, ele pode
adotar um motivo auxiliar. Isso não significa que o segundo motivo apologético seja ineficaz.
A expectativa vocalizada de um ato, sua “razão”, não é apenas uma condição mediadora dele,
mas uma condição próxima e controladora para a qual o termo “causa” não é inadequado. Ela
pode reforçar o ato do ator. Pode conquistar novos aliados para seu ato.
Quando apelam para outros envolvidos no ato de alguém, os motivos se tornam estraté-
gias de ação. Em muito casos, para ações sociais terem lugar é necessário que esses outros en-
volvidos ofereçam sua concordância, tácita ou explicitamente. Assim, muitas vezes atos serão
abandonados se nenhuma razão que os outros aceitem puder ser encontrada. A diplomacia na
escolha do motivo geralmente controla o diplomata. A escolha diplomática de motivos é parte
da tentativa de motivar os atos de outros membros em uma situação. Esses motivos, pronun-
ciados, desarmam críticas iradas e integram as ações sociais. E essa diplomacia não implica
necessariamente o uso da mentira de forma intencional. Apenas indica que um vocabulário de
motivos apropriado será utilizado – que esses motivos são condições para certas linhas de
conduta.12
Quando um agente declara ou imputa motivos, não está tentando descrever a ação social
que experienciou. Ele não está apenas apresentando “razões”. Está influenciando os outros – e
a si mesmo. Geralmente, está a procura de novas “razões” que mediarão a ação. Assim, não
precisamos tratar uma ação como discrepante de “sua” verbalização, pois em muitos casos a
verbalização é um novo ato. Nesses casos, não há uma discrepância entre um ato e “sua” ver-
balização, e sim uma diferença entre duas ações díspares, uma sociomotora e uma verbal.13
Essa lingualização14 adicional (ou “ex post facto”) pode envolver o recurso a um vocabulário
de motivos associado a uma norma com a qual ambos os membros da situação estejam de
acordo. Como tal, torna-se um fator integrador nas fases futuras da ação social original ou em
outras ações. Por resolverem conflitos, os motivos são eficazes. Geralmente, se “razões” não
fossem dadas, um ato não poderia ocorrer, nem diversas ações poderiam ser a ele integradas.
Os motivos são bases comuns para comportamentos mediados.

12
Naturalmente, uma vez que os motivos são comunicados, eles podem ser mentiras; mas isso tem que ser pro-
vado. Verbalizações não são mentiras apenas porque são socialmente eficazes. Estou aqui mais preocupado com
a função social dos motivos pronunciados do que com a sinceridade daqueles que os pronunciam.
13
Ver: F. Znaniecki. Social Actions. Nova York, 1936, p. 30.
14
O termo lingualização diz respeito à representação de um nível mais abstrato em uma hierarquia semântica em
uma forma linguisticamente estruturada. (N.T.)
Perry apresenta sumariamente o olhar freudiano sobre os motivos “como a visão de que
os reais motivos de conduta são aqueles que temos vergonha de admitir tanto para nós mes-
mos quanto para os outros.”15 Pode-se dar cobertura os fatos meramente dizendo que os es-
crúpulos (ou seja, os vocabulários morais de motivos) são geralmente eficazes e que os ho-
mens alterarão e impedirão seus atos em termos desses motivos. Um dos componentes de um
“outro generalizado” como um mecanismo de controle social são vocabulários de motivos
aceitáveis. Por exemplo, um homem de negócios ingressa no Rotary Club e proclama seu vo-
cabulário cheio de espírito público.16 Se não for possível a esse homem atuar sua conduta de
negócios sem segui-lo, fica provado que esse vocabulário de motivos é um fator importante
em seu comportamento.17 Uma longa atuação segundo um papel, com seus motivos adequa-
dos, geralmente induzirá um homem a tornar-se o que a princípio ele apenas procurou pare-
cer. Mudanças nos vocabulários de motivos utilizados posteriormente por um indivíduo reve-
larão um aspecto importante das várias integrações de suas ações com vários grupos concomi-
tantemente.
Os motivos efetivamente utilizados para justificar ou criticar um ato definitivamente o
vinculam às situações, integram as ações de um homem com as dos outros, e alinham a con-
duta com as normas. Os motivosubstitutos18 de situações, socialmente sustentados, são ao
mesmo tempo restrições e incentivos. Pois é uma hipótese digna de nota e passível de ser tes-
tada que vocabulários típicos de motivos para diferentes situações são determinantes significa-
tivos de conduta. Como segmentos linguageiros da ação social, os motivos orientam ações por
possibilitar a discriminação entre seus objetos. Adjetivos como “bom”, “agradável” e “ruim”
podem promover uma ação ou a dissuadir. Quando constituem componentes de um vocabu-
lário de motivos, ou seja, são acompanhamentos típicos e relativamente inquestionável de si-
tuações típicas, tais palavras muitas vezes funcionam como diretrizes e incentivos em virtude
de representarem os julgamentos dos outros na forma prevista pelo ator. Nesse sentido, os
motivos são “instrumentos sociais, ou seja, dados por meio de cuja modificação o agente será

15
General Theory of Value. New York, 1936, pp. 292-293.
16
lbid., p. 392.
17
O “motivo lucro” da economia clássica pode ser tratado como um vocabulário típico-ideal de motivos para
situações e comportamentos econômicos delimitados. Para fases tardias do capitalismo monopolista e regulado,
esse tipo exige modificação; os vocabulários de lucro e comercio adquiriram outros ingredientes. Para um descri-
ção sugestiva do comportamento e motivos não econômicos de burocratas de negócios, ver: N. R. Danielian. AT
& T. Nova York, 1940.
18
No original, “motive-surrogates”. (N.T.)
capaz de influenciar [a si mesmo ou aos outros].”19 Habitualmente, o “controle” dos outros
não é direto, e sim dado por meio da manipulação de um campo de objetos. Influenciamos
um homem nomeando seus atos ou imputando motivos a eles – ou a “ele”. Por exemplo, os
motivos que acompanham as instituições de guerra não são “as causas” da guerra, mas pro-
movem a participação integrada de forma contínua, e variam de uma guerra para outra. Vo-
cabulários de motivos que funcionam possuem carreiras urdidas por meio da mudança de te-
cidos institucionais.
Geneticamente, motivos são imputados pelos outros antes que sejam declarados pelo
próprio ator. A mãe ordena à criança: “Não faça isso, é ganância.” A criança não apenas
aprende o que fazer e o que não fazer, mas ouve motivos padronizados que promovem ações
prescritas e dissuadem as proscritas. Juntamente às regras e normas de ação para várias situa-
ções, assimilamos vocabulários de motivos que lhes são próprios. Esses são os motivos que
deveremos usar, pois eles são uma parte da nossa linguagem e componentes de nosso compor-
tamento.
A busca por “motivos reais” supositiciamente colocados em contraste com a “mera raci-
onalização” é muitas vezes conformada por uma leitura metafísica dos “verdadeiros” motivos
como algo de alguma maneira biológico. Acompanhando essas buscas por algo mais real e por
trás da racionalização, está a leitura, defendida por muitos sociólogos, de que a linguagem é
uma manifestação externa ou concomitante de alguma coisa anterior, mais genuína, e “pro-
funda” no indivíduo. A oposição “atitudes reais” versus “mera verbalização” ou “opinião” im-
plica que na melhor das hipóteses apenas inferimos a partir da linguagem do indivíduo qual é
“realmente” sua atitude ou seu motivo.
Agora, o que poderíamos inferir, então? Do que precisamente a verbalização seria um
sintoma? Não podemos inferir processos fisiológicos de fenômenos linguageiros. Tudo que
podemos inferir e verificar empiricamente20 é outra verbalização do agente do que acredita-
mos que estava orientando e controlando seu comportamento no momento em que a ação foi
realizada. Os únicos elementos sociais que podem “repousar nas profundezas” são outras for-

19
Social Actions, p. 73.
20
Obviamente, poderíamos inferir ou interpretar construtos postuladas no indivíduo, mas estes não são facil-
mente verificados e eles não são explicativos.
mas linguageiras.21 “Real atitude ou motivo” não é algo diferente em espécie da verbalização
ou da “opinião”. Eles acabam por ser apenas relativa e temporariamente diferentes.
A expressão “motivo inconsciente” também é infeliz. Tudo que ela pode significar é que
um motivo não é explicitamente vocalizado, mas não há necessidade de se inferir motivos in-
conscientes dessas situações e, em seguida, colocá-los nos indivíduos como elementos. A ex-
pressão é conformada pela persistência da noção desnecessária e sem fundamento de que “to-
da ação tem um motivo”, e é promovida pela observação de lacunas na verbalização relativa-
mente frequente em situações cotidianas. Os fatos aos quais essa expressão supostamente é
dirigida estão cobertos pelas afirmações de que os homens nem sempre explicitamente articu-
lam motivos, e que nem todas as ações giram em torno da linguagem. Já indiquei as condições
nas quais os motivos são tipicamente declarados e imputados.
Na perspectiva aqui sob consideração, o motivo verbalizado não é utilizado como um
índice de algo no indivíduo, mas como uma base de inferência para um vocabulário típico de
motivos de uma ação situada. Quando perguntamos pela “real atitude” em vez de pela “opini-
ão”, pelo “motivo real” em vez de pela “racionalização”, tudo pelo que podemos perguntar
com algum sentido é a forma controlada de discurso que foi incipientemente ou abertamente
apresentada na realização do ato ou da série de atos. Não há maneira de pesar a verbalização
em um indivíduo e verificar diretamente nosso fornecimento-de-motivos, mas há uma forma
empírica segundo a qual podemos guiar e delimitar as pesquisas sobre os motivos, conside-
rando determinadas situações históricas. É pela construção de vocabulários típicos de motivos
presentes em tipos de situações e ações. A imputação de motivos pode ser controlada por refe-
rência à constelação típica de motivos que se observa ser societalmente ligada a classes de
ações situadas. Alguns dos motivos “reais” imputados aos atores sequer são conhecidos por
eles. A meu ver, os motivos são circunscritos ao vocabulário do ator. A única fonte para uma
terminologia dos motivos são os vocabulários de motivos efetiva e habitualmente verbalizados
por atores em situações específicas.
Vocabulários de motivos individualistas, sexuais, hedonistas e pecuniários são aparen-
temente dominantes em muitos setores da vida urbana dos EUA século XX. Sob um ethos
com esse, a verbalização de uma conduta alternativa nesses termos é algo menos provável de
ser desafiado entre os grupos dominantes. Nesse meio, indivíduos se mostram céticos em rela-

21
O que não quer dizer que, fisiologicamente, não possa haver cãibras na parede do estômago ou adrenalina no
sangue, etc., mas o caráter da “relação” de tais itens para a ação social é bastante discutível.
ção aos motivos religiosos declarados por Rockefeller para sua conduta nos negócios, porque
tais motivos não são hoje termos do vocabulário convencional e proeminentemente associa-
dos a situações empresariais. Um monge medieval escreve que deu comida a uma mulher po-
bre mas bonita “pela a glória de Deus e eterna salvação de sua alma”. Por que tendemos a
questioná-lo e a imputar ao caso motivações sexuais? Porque o sexo é um motivo influente e
difundido em nossa sociedade e em nosso tempo. E vocabulários religiosos de explicação e de
motivos estão agora em declínio. Em uma sociedade na qual os motivos religiosos têm sido
desacreditados em uma escala bastante ampla, certos pensadores são céticos em relação àque-
les que as proclamem ubiquamente. Para porções selecionadas das populações modernas, os
motivos religiosos decaíram e outros motivos tornaram-se “definitivos” e funcionais. Mas dos
monastérios da Europa medieval não temos nenhuma evidência de que vocabulários religio-
sos não sejam funcionais em muitas situações.
Um líder trabalhista diz que realiza um determinada ação porque quer conquistar me-
lhores padrões de vida para os trabalhadores. Um homem de negócios responde que isso ou é
uma racionalização ou uma mentira, que é na verdade porque ele quer mais dinheiro para si
próprio vindo dos trabalhadores. Um radical diz que um professor universitário não partici-
pará de movimentos radicais porque teme por seu emprego e, além disso, porque é um “reaci-
onário”. O professor universitário diz que é porque ele gosta apenas de descobrir como as coi-
sas funcionam. O que é razão para um homem é uma racionalização para outro. A variável é o
vocabulário de motivos aceito, os ultimatos do discurso, do grupo dominante com cuja opini-
ão cada homem se importa. A determinação desses grupos, sua localização e seu caráter, per-
mitiria a delimitação e o controle metodológico da atribuição de motivos para atos específicos.
O trabalho árduo sobre essa ideia nos conduzirá a pesquisas sobre a compartimentaliza-
ção dos motivos funcionais em personalidades de acordo com a situação e os tipos e condições
gerais de vocabulários de motivos em diversos tipos de sociedades. As estruturas motivacio-
nais dos indivíduos e os padrões de seus propósitos são relativos aos enquadramentos sociais.
Poderíamos, por exemplo, estudar os motivos ao longo de linhas estratificadas ou ocupacio-
nais. Max Weber observou

que em uma sociedade livre, os motivos que induzem as pessoas a trabalhar variam de acordo
com... diferentes classes sociais... Há normalmente uma escala graduada de motivos pelos quais
os homens de diferentes classes sociais são levados ao trabalho. Quando um homem muda de
classe, ele muda de um conjunto de motivos para outro.22

Os laços linguageiros que as mantêm as pessoas juntas reagem sobre elas a fim de cons-
tituir estruturas de disposição e de motivos. Recentemente, Talcott Parsons apontou, por refe-
rência às diferenças nas ações em profissões e nos negócios, que não se pode saltar da “análise
econômica para as motivações finais; os padrões institucionais sempre constituem um ele-
mento crucial do problema”.23 Minha sugestão é que podemos analisar, indexar e calibrar esse
elemento, concentrando-nos sobre os apêndices verbais específicos de ações institucionaliza-
das variáveis apontadas como vocabulários de motivo.
Em sociedades simples24, as constelações de motivos relacionadas a várias áreas de com-
portamento tendem a ser tipicamente estáveis e a permanecer apenas com o seu setor. Nas
sociedades tipicamente primárias, religiosas e rurais, os motivos das pessoas seriam regular-
mente compartimentados. Vocabulários de motivos ordenados para diferentes situações esta-
bilizam e orientam o comportamento e as expectativas das reações dos outros. Em suas situa-
ções apropriadas, os motivos verbalizados não são tipicamente questionados.25 Em estruturas
secundárias, seculares e urbanas, vocabulários de motivos variados e em competição operam
sobrepondo seus limites e as situações a que eles são apropriados não são claramente definidas.
Motivos outrora inquestionados para situações definidas são agora colocados em questão. Vá-
rios motivos podem liberar atos semelhantes em uma dada situação. Assim, pessoas situadas
de diversas maneiras ficam confusas e especulam sobre que motivo “ativou” uma pessoa. Esse
questionamento resultou intelectualmente em movimentos como a psicanálise, com o seu
dogma de racionalização e sua sistemática de oferta de motivos. Esses fenômenos intelectuais
são sustentados por seções divididas e conflitantes de uma sociedade individualizada, que se

22
Parafraseado por Karl Mannheim, op. cit., p. 316-317.
23
“The Motivation of Economic Activities”. Em: C. W. M. Hart, Essays in Sociology, Toronto, 1940, p. 67.
24
Nota sobre “folk society”.
25
Entre os etnólogos, Ruth Benedict chegou à beira de uma leitura genuinamente sociológica da motivação. Sua
leitura ainda é vaga, pois ela não enxergou claramente a identidade de diferentes “motivações” em diferentes cul-
turas, com os variados vocabulários de motivos existentes e aprovados. “A compreensão inteligente da relação do
indivíduo com sua sociedade... envolve sempre a compreensão dos tipos de motivações e capacidades humanas
capitalizados em sua sociedade...” “Configurations of Culture in North America”. American Anthropologist, Vol.
34, n. 1, 1932, pp. 1-27; Ver também: Patterns of Culture. Boston, 1935, pp. 242-243. Ela volta suas observações
para uma busca pelo “gênio” único de cada cultura e paralisa sua pesquisa com palavras como “apolíneo”. Se ela
tentasse de forma construtiva observar os vocabulários de motivos que precipitam atos a serem executados, im-
plementam programas, e fornecem motivos aprovados para eles em situações circunscritas, ela seria mais capaz
de indicar problemas concretos e os responder com observação adicional.
caracteriza pela existência de vocabulários de motivo concorrentes. Por exemplo, intricadas
constelações de motivos são componentes dos empreendimentos de negócios nos EUA. Esses
padrões têm se infiltrado no antigo vocabulário da virtuosa relação entre homens e mulheres:
dever, amor, doçura. Entre certas classes, motivos românticos, virtuosos e pecuniários se con-
fundem. A colocação da pergunta: “Casamento por amor ou dinheiro?” faz sentido, pois o
motivo pecuniário é atualmente constante e quase onipresente, um denominador comum de
muitos outros.26
Por trás dos “motivos misturados” e dos “conflitos motivacionais” estão padrões situaci-
onais concorrentes ou discrepantes e seus respectivos vocabulários de motivos. Com situações
mutantes e intersticiais, cada uma de várias alternativas podem pertencer a diferentes sistemas
de ação, com diferentes vocabulários de motivos que lhes são próprios. Conflitos como esses
manifestam padrões de vocabulário que se sobrepunham em um indivíduo marginal e que
não são facilmente compartimentados em situações definidas.
Além de oferecer a promessa de explicar uma área de fatos linguageiros e societais, uma
outra vantagem dessa leitura dos motivos é que, com ela, devemos ser capazes de oferecer des-
crições sociológicas de outras teorias (terminologias) de motivação. Essa é uma tarefa para a
sociologia do conhecimento. Aqui, posso me referir apenas a algumas teorias. Já citei a termi-
nologia dos motivos freudiana. É evidente que seus motivos são os de uma alta burguesia pa-
triarcal com fortes orientações sexual e individualista. Quando mergulhados na introspecção
nos divãs de Freud, os pacientes utilizavam o único vocabulário de motivos que conheciam;
Freud teve seu palpite e conduziu conversações mais avançadas. Mittenzwey enfrentou com
questões semelhantes até as profundezas.27 Amplamente difundida em uma época pós-guerra,
a psicanálise nunca foi muito popular na França, onde o controle do comportamento sexual
não é puritano.28 Para indivíduos convertidos que se acostumaram com a terminologia psica-
nalítica dos motivos, todas as outras parecem autoenganadoras.29
De forma semelhante, para muitos crentes na terminologia marxista de motivos de po-
der, luta e economia, todas as outras, incluindo a de Freud, se devem a hipocrisia ou ignorân-
26
Também motivos aceitavelmente imputados e declarados para um sistema de ação podem ser difundidos para
outros domínios e gradualmente vir a ser aceito por alguns como um retrato abrangente dos motivos dos ho-
mens. Isso aconteceu no caso do homem econômico e seus motivos.
27
Kuno Mittenzwey. “Zur Sociologie der psychoanalystischer Erkenntnis”. Em: Max Scheler (org). Versuche zu
einer Sociologie des Wissens. Munique, 1924, pp. 365-375.
28
Esse fato é interpretado por alguns como um suporte às teorias freudianas. No entanto, ele pode igualmente
compreendido de forma adequada no esquema aqui descrito.
29
Ver a arguta discussão de Freud por K. Burke, op. cit., Parte I.
cia. Um indivíduo que tenha assimilado perfeitamente apenas amontoados de motivos de ne-
gócios tentará aplicar esses motivos a todas as situações, sua casa e sua mulher incluídas. E de-
ve-se notar que a terminologia de motivos dos negócios tem sua articulação intelectual, assim
como psicanálise e marxismo.
É significativo que desde o período socrático muitas “teorias da motivação” tenham sido
relacionadas com terminologias éticas e religiosas. O motivo é aquilo no homem que o leva a
fazer o bem ou o mal. Sob a égide de instituições religiosas, os homens usam vocabulários mo-
rais de motivos: eles chamam atos e programas de “bom” e “ruim”, e atribuem essas qualida-
des à alma. Esse comportamento linguageiro é parte do processo de controle social. Práticas
institucionais e seus vocabulários de motivos exercitam o controle sobre faixas delimitadas de
situações possíveis. Poderíamos fazer um catálogo típico de motivos religiosos a partir de tex-
tos religiosos amplamente lidos e testar seu poder explicativo em várias denominações e sei-
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Em muitas situações dos EUA contemporâneos, a conduta é controlada e integrada por
uma linguagem hedonista. Para grandes setores da população, em determinadas situações, o
prazer e a dor são motivos inquestionáveis. Em determinados períodos e sociedades, essas si-
tuações devem ser determinadas empiricamente. O prazer e a dor não devem ser reificados e
imputados à natureza humana como princípios implícitos e fundamentais de todas as ações.
Note-se que o hedonismo como doutrina psicológica e ética ganharam impulso no mundo
moderno por volta do momento em que os antigos motivos morais-religiosos estavam sendo
desbancados e simplesmente descartados por pensadores de “classe média”. E por trás da ter-
minologia hedonista repousa um padrão social emergente e um novo vocabulário de motivos.
A transformação de motivos incontestados que tomou as comunidades da Europa chegou ao
clímax quando, na reconciliação, as antigas terminologias religiosa e hedonista foram identifi-
cadas entre si: o “bom” é o “prazeroso”. A situação condicionadora era semelhante no mundo
helenístico com o hedonismo de cirenaicos e epicuristas.
O que é necessário é tomar todas essas terminologias de motivo e as situar como vocabu-
lários de motivo em épocas históricas e situações específicas. Os motivos não são de nenhum
valor para além das situações sociais delimitadas para as quais eles são os vocabulários apro-
priados. Eles devem ser situados. Na melhor das hipóteses, terminologias de motivos social-

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Vocabulários morais merecem uma declaração especial. Segundo o ponto de vista aqui descritos, críticas iradas
concernentes a “juízos de valor”, etc., podem ser esclarecidas.
mente deslocadas representam tentativas inacabadas de bloquear áreas sociais de imputação e
declaração de motivos. Os motivos variam em conteúdo e caráter de acordo com épocas histó-
ricas e das estruturas sociais.
Em vez de interpretar ações e linguagem como manifestações externas de elementos
subjetivos e alocados nas profundezas dos indivíduos, a tarefa de pesquisa é a localização de
determinados tipos de ação no interior de enquadramentos típicos de ações normativas e
aglomerados e de motivos socialmente situados. Não há valor explicativo em subsumir diver-
sos vocabulários de motivo sob alguma lista ou terminologia. Esse procedimento apenas con-
funde a tarefa de explicar casos específicos. As linguagens de situações como dadas devem ser
consideradas uma porção valiosa dos dados a serem interpretados e relacionados com suas
condições. Simplificar esses vocabulários de motivos em uma terminologia socialmente abs-
traída é destruir o uso legítimo de um motivo na explicação das ações sociais.

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