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Resumo
Esse artigo traz algumas reflexões sobre as tendências da ação sindical
no Brasil no século XXI e está estruturado em duas partes. A primeira parte
apresenta um balanço de caráter descritivo que aponta para tendências na
ação sindical no período entre 2003 e 2015. No conjunto das práticas sindi-
cais destacaram-se duas linhas interpretativas que elucidam (i) o papel insti-
tucional do sindicalismo e que sugerem estratégias no plano da regulação do
trabalho e das políticas públicas e (ii) as formas de luta sindical, incluindo as
múltiplas identidades e condições socioculturais que apontam para a diversi-
dade político-ideológica do sindicalismo brasileiro. A segunda parte traz uma
breve discussão sobre as alterações ocorridas na estrutura sindical brasileira
ao longo dos últimos anos, a partir da análise dos dados do Cadastro Nacional
de Entidades Sindicais (CNES) gerido pelo Ministério do Trabalho e Emprego
(MTE) que efetiva os mecanismos institucionais do sindicalismo. Desse modo,
buscamos abordar as questões teórico-metodológicas empregadas recente-
mente na discussão sobre a organização e representação dos trabalhadores,
a fim de caracterizar as linhas interpretativas que elucidam a importância dos
sindicatos na contemporaneidade.
Palavras-chave
greves, negociação coletiva, estrutura sindical, participação, sindicatos.
1 Mestre em Sociologia, Professora do Bacharelado Interdisciplinar em Ciências do Trabalho da Escola DIEESE e téc- REVISTA CIÊNCIAS DO TRABALHO - Nº 8
nica do DIEESE (e-mail: thamires@dieese.org.br). AGOSTO DE 2017
2 Sociólogo e supervisor da área Sistemas de Acompanhamento de Informações Sindicais (SAIS-DIEESE) (e-mail:
luisribeiro@dieese.org.br).
3 Doutora em Sociologia, Coordenadora do Bacharelado Interdisciplinar em Ciências do Trabalho da Escola DIEESE
(e-mail: sirlei@dieese.org.br).
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THAMIRES CRISTINA DA SILVA
LUÍS AUGUSTO RIBEIRO DA COSTA
SIRLEI MARCIA DE OLIVEIRA Introdução
Os anos 2000 testemunharam mudanças importantes na sociedade bra-
sileira ao longo do governo do Partido dos Trabalhadores (PT) por quatorze
anos na Presidência da República. Nesse período, um horizonte promissor foi
delineado por um governo forjado na história das lutas sindicais do país que
coincidiu com a dinâmica de crescimento econômico orientado por políticas
sociais redistributivas que proporcionaram melhorias nas condições de vida e
de bem-estar da classe trabalhadora. Nesse plano, a literatura sobre sindicalis-
mo enfatizou a ampliação do campo de participação de sindicatos e movimen-
tos sociais por meio de práticas inovadoras e da adoção de uma agenda social
interligada com as políticas públicas (POGREBINSCH; SANTOS, 2011; ARAÚJO;
OLIVEIRA, 2014) e os avanços na negociação coletiva com resultados paradig-
máticos de aumentos reais de salários para a maioria das categorias profissio-
nais (AMORIM, 2015). Também foram destaque as mobilizações paredistas em
termos de frequência e volume (DIEESE, 2015).
Assim, verifica-se em linhas gerais que a atuação do movimento sindical
dos últimos anos ocorreu em consonância com os principais desdobramen-
tos da política governamental, o que permitiu a acomodação de interesses
distintos e, em certa medida, antagônicos nos processos decisórios nas áreas
que envolvem as relações de trabalho. A partir da construção de uma agenda
comum para os trabalhadores, a retórica em torno da efetividade das ações
sindicais, para assegurar proteção por meio da legislação trabalhista, provocou
dissensos cujas raízes se encontram, sobretudo, nas contradições apontadas
ao governo do Partido dos Trabalhadores, ao qual se atribui a responsabilida-
de de uma agenda de reformas contrárias aos interesses dos trabalhadores,
o que causou descontentamento de uma parcela das organizações sindicais
brasileiras que apoiou os governos petistas. Por um lado, algumas das análises
destacaram o processo de reconfiguração do sindicalismo brasileiro, indicando
mudanças na composição das bases sindicais de onde emergiram novas orga-
nizações cujas lideranças passaram a fazer oposição ideológica à CUT e ao PT
(GALVÃO; MARCELINO; TROPIA, 2015). Por outro lado, as experiências exitosas
de um momento ímpar na história do sindicalismo, hoje, apresentam desafios
ainda mais difíceis de serem superados, diante dos retrocessos frente a direitos
sociais e trabalhistas que expressam uma visão flexível de relações de trabalho
em prejuízo às conquistas dos trabalhadores (RAMALHO; RODRIGUES, 2015).
No centro das contradições inerentes à relação capital-trabalho, as difi-
culdades de organização e mobilização permanecerão no horizonte das lutas
operárias, em virtude do fim do ciclo de conquistas vivenciadas pela classe tra-
REVISTA CIÊNCIAS DO TRABALHO Nº 8
AGOSTO DE 2017 balhadora brasileira, que foi substituído por uma onda de reformas e pela de-
sarticulação das relações entre sindicatos e Estado, que constituíram arranjos
20 institucionais de composição bipartite/tripartite, na tentativa de redefinir uma
esfera de atuação por meio do diálogo. Desse modo, para refletir sobre o pa- TENDÊNCIAS DA AÇÃO SINDICAL NO
BRASIL DO SÉCULO XXI: LEITURAS E
drão de ação sindical constituído a partir dos anos 2000 será feita uma revisão
INTERPRETAÇÕES À LUZ DO DEBATE
bibliográfica dos acontecimentos mais recentes no campo do sindicalismo e SOBRE O SINDICALISMO NO PERÍODO
das relações de trabalho que lograram resultados bem-sucedidos (ainda que 2003-2015
sob constante ameaça parlamentar, haja vista a aprovação recente da reforma
trabalhista-sindical e a lei da terceirização, entre outras iniciativas que visam
o desmonte de direitos constitucionais), alcançados por meio de estratégias
encampadas por governos, empresários e sindicatos e inúmeros movimentos
sociais ao longo das últimas décadas do período democrático brasileiro.
Para desenvolver algumas reflexões sobre as tendências da ação sindi-
cal no Brasil no século XXI, estruturamos o presente artigo em duas partes: na
primeira faremos um balanço descritivo das leituras realizadas com o objetivo
de apontar tendências na ação sindical no período abordado, quando possível
trazendo pontos do debate sobre a discussão internacional. No esforço de ca-
racterizar as linhas interpretativas que elucidam a importância dos sindicatos
na contemporaneidade, destacar-se-á: 1) a dimensão institucional que sugere
estratégias no plano da regulação do trabalho e das políticas públicas, caben-
do aí, os recursos empregados nos processos de negociação coletiva e de par-
ticipação nas instâncias criadas pelo governo e 2) a dimensão das formas de
luta sindical, incluindo múltiplas identidades e condições socioculturais que
apontam para a diversidade político-ideológica do sindicalismo brasileiro, ou
seja, as diferenças e as peculiaridades nas estratégias e formas de mobilização
e organização da classe trabalhadora e o potencial agregador dessas lutas.
Com o objetivo de apontar as alterações ocorridas ao longo dos últimos
anos na estrutura sindical brasileira, a segunda parte do artigo apresenta um
quadro descritivo dos aspectos da estrutura sindical a partir da análise dos da-
dos do Cadastro Nacional de Entidades Sindicais (CNES) geridos pelo Ministé-
rio do Trabalho e Emprego (MTE) que efetiva os mecanismos institucionais do
sindicalismo. Desse ângulo, espera-se mapear as características que apontam
para a renovação da estrutura sindical (LADOSKY, 2015; CARDOSO, 2013) a par-
tir do perfil das relações de trabalho no Brasil, abordando questões teórico-
-metodológicas presentes na atual discussão sobre a organização e represen-
tação dos trabalhadores.
24 tulares, passando para 92 na gestão de Dilma Rousseff. O decreto nº 8.887 de 24/10/2016 atualizou a composição do
Conselho com a participação de 96 membros e teve a sua 45ª plenária realizada em novembro de 2016, no Palácio
do Planalto, em Brasília http://www.cdes.gov.br/
agendas mobilizações abrangentes, que acabam por atender mais às multi- TENDÊNCIAS DA AÇÃO SINDICAL NO
dões excluídas do que aos membros socialmente incluídos de sua base” (CDES, BRASIL DO SÉCULO XXI: LEITURAS E
INTERPRETAÇÕES À LUZ DO DEBATE
2003, p. 21). SOBRE O SINDICALISMO NO PERÍODO
O Fórum Nacional do Trabalho (FNT), realizado em 2003, voltou-se para 2003-2015
o quadro de mudanças do mundo do trabalho e a necessidade de atualização
do modelo brasileiro de relações sindicais e trabalhistas. As discussões realiza-
das nas Conferências Estaduais do Trabalho, ciclos de debates, oficinas, semi-
nários e plenárias ocorreram em todas as unidades da federação e contou com
a colaboração massiva de milhares de especialistas e atores envolvidos com
a temática. As propostas foram consubstanciadas no anteprojeto de emenda
constitucional apresentado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) à
presidência da república em 2005, o qual preservou os princípios da liberdade
e autonomia sindical, conforme a exposição dos motivos reproduzida a seguir:
Trabalhadoras do Brasil
FS - Força Sindical 1991 1.615 14,78% 1.285.348 10,08%
CSB - Central dos Sindicatos
2008 597 5,46% 1.039.902 8,15%
Brasileiros
NCST - Nova Central Sindical
2005 1.136 10,40% 950.240 7,45%
de Trabalhadores
Centrais sindicais que não alcançaram o índice de representatividade
CONLUTAS 2004 105 0,96% 286.732 2,25%
CGTB - Central Geral dos
1986 217 1,99% 239.844 1,88%
Trabalhadores do Brasil
CBDT - Central Brasileira
Trabalhadores
PÚBLICA 2015 21 0,19% 16.580 0,13%
UST - União Sindical dos
2006 6 0,05% 791 0,01%
Trabalhadores
Central Unificada dos
Públicos do Brasil
INTERSINDICAL 2006 1 0,01% 1.739 0,01%
Fonte: MTE (Consulta de Aferição das Centrais Sindicais), 2016. Disponível em:
http://trabalho.gov.br/central-sindical/consulta-de-afericao-das-centrais-
sindicais. Elaboração dos(as) autores(as).
7 O balanço das greves teve a sua série de acompanhamento histórico prejudicada nos anos de 2014 e 2015. A au-
sência de informação nesse curto período depende da inserção dos registros no SAG que ainda não fora concluída
devido ao grande volume de mobilizações realizadas. Contudo, é possível afirmar com base nas notícias já mapea-
das que o comportamento das greves seguiu a tendência de crescimento observada a partir de 2008.
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THAMIRES CRISTINA DA SILVA automotiva na Índia, o setor de vestuário no Camboja, greves deflagradas por
LUÍS AUGUSTO RIBEIRO DA COSTA
trabalhadores da construção civil no Brasil, e greves selvagens (wildcat strikes)
SIRLEI MARCIA DE OLIVEIRA
na Turquia dividiram a atenção da mídia e dos governos locais com efeitos so-
bre o contexto político-econômico (GALLAS; NOWAK, 2016, p. 12).
Nesse aspecto, tanto em perspectiva global quanto em perspectiva local,
a greve constitui instrumento de ação sindical fundamental para contrapor as
ameaças do empresariado e exprime as condições precárias de trabalho que
são objeto de reivindicação constante por parte dos trabalhadores. Para Ruy
Braga e Marco Aurélio Santana (2015), o descenso dos direitos do trabalho é
um elemento presente em diversas nações: “o atual aprofundamento da pre-
carização laboral em escala global apoia-se no aumento da taxa de exploração
da força de trabalho, tendo em vista, sobretudo, a espoliação dos direitos so-
ciais” (BRAGA; SANTANA, 2015, p. 536). No contexto nacional, os autores ressal-
taram o papel da juventude trabalhadora precária, especificamente os jovens
do setor de teleatendimento, e como o sindicalismo passou a lidar com novas
demandas políticas e de participação que trazem um sentido horizontaliza-
do da ação, de encontro com as formas organizacionais de sindicatos e cen-
trais sindicais. Contudo, as possibilidades de interação entre teleoperadores
submetidos ao trabalho precário e sem acesso às políticas públicas basilares
e sindicatos conformam um quadro potencial de renovação das pautas sindi-
cais com incorporação das especificidades de “gênero, raça, idade e orientação
sexual” nas campanhas e ações, com destaque para a aderência do setor em
movimentos paredistas (BRAGA; SANTANA, 2015).
No contexto de investimentos sobre a infraestrutura energética do país
através do qual se efetivou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC),
as greves ocorridas nos canteiros de obras das Usinas Hidrelétricas de Jirau e
Santo Antonio (RO) ganharam notoriedade pelas formas de luta empreendidas
pelos trabalhadores submetidos às condições degradantes de vida e trabalho.
A pesquisa de campo realizada por José Alves (2014) destacou as paralisações
grevistas efetivadas pelos trabalhadores em Jirau, entre 2011 e 2012, moti-
vadas pela falta de mobilidade e problemas com deslocamento para visitas
familiares que ocorriam a cada 120 dias, não pagamento de horas extras, for-
necimento irregular de alimentação e de água potável, coerção por parte dos
encarregados para impedir a demissão voluntária, baixos salários, políticas de
metas abusivas e aumento da jornada de trabalho. Esse cenário deletério, so-
mado às denúncias de “assédio moral, de agressão, condições irregulares de
trabalho, até casos de trabalho análogo à condição de escravo” configurou um
quadro de superexploração do trabalho praticada por diversas empreiteiras
(ALVES, 2014, p. 399).
Segundo o balanço de greves, entre 2003 e 2013 foram deflagradas
REVISTA CIÊNCIAS DO TRABALHO Nº 8
AGOSTO DE 2017 6.437 greves e pouco mais de 481 mil horas paradas em território nacional. Em
2016, foram realizadas 2.093 paralisações que abrangeram trabalhadores do
32 setor público e do setor privado, sendo 65,5% dessas mobilizações por tempo
indeterminado. As greves ocorridas na esfera pública representaram 52,6% de
todas as paralizações e 74,0% da totalidade de horas paradas, sendo que em TENDÊNCIAS DA AÇÃO SINDICAL NO
BRASIL DO SÉCULO XXI: LEITURAS E
81,1% das paralizações foi utilizada a tática de greve por categoria, relaciona-
INTERPRETAÇÕES À LUZ DO DEBATE
da à mobilização de trabalhadores de uma atividade econômica específica. Na SOBRE O SINDICALISMO NO PERÍODO
esfera privada, foram registradas 986 greves e 36 mil horas paradas, com des- 2003-2015
taque para o setor de serviços que respondeu por 70% do total de registros. A
tática de greve do setor privado é, em sua grande maioria, realizada a partir de
empresas.
De modo geral, as principais reivindicações das greves estiveram rela-
cionadas ao descumprimento de direitos trabalhistas. Em 2013, enquanto a
reivindicação sobre o atraso no pagamento de salários representava 18,3% do
conjunto das greves, sendo o reajuste salarial a principal bandeira de luta que
esteve presente em 36,0% do total de paralizações, em 2016 é possível obser-
var uma inversão na ordem de prioridades reivindicativas dos trabalhadores.
Isso porque as greves cuja principal reclamação foi o atraso de salários supera-
ram as greves que reivindicaram o reajuste salarial, mostrando que o conteúdo
das paralisações se ateve mais à exigência pelo cumprimento dos direitos, o
que caracteriza as greves defensivas, que sobre o avanço nas condições sala-
riais e de trabalho associado às greves propositivas (DIEESE, 2017).
Considerações finais
Nos anos 2000, o sindicalismo brasileiro desenvolveu múltiplas estraté-
gias para enfrentar as dificuldades de representação, organização e mobiliza-
ção advindas do contexto de crise que marcou a década de 1990, quando o
perfil de trabalhador, mais heterogêneo, flexível, precário e com uma percep-
ção mais individualista e fragmentada sobre as atividades sindicais passou a
predominar o mercado de trabalho. Contudo, mesmo com a promoção do de-
senvolvimento econômico sustentado pelo discurso de proteção ao trabalho
e emprego, as ações sindicais permaneceram frágeis diante da lógica flexível
que impera nas empresas de diferentes setores econômicos. Embora o con-
texto de participação institucionalizada tenha consolidado mecanismos alter-
nativos de negociação com o envolvimento de atores sociais formuladores de
políticas públicas que buscaram amenizar o quadro de instabilidade e ameaça
ao emprego, posturas sindicais cada vez mais reativas explicitam os desafios
para representar os interesses dos trabalhadores que obtiveram ganhos im-
portantes no período analisado, (2003 e 2015), mas insuficientes para reverter
o quadro de perdas antigas através da redução das desigualdades sociais do
país.
REVISTA CIÊNCIAS DO TRABALHO Nº 8
AGOSTO DE 2017
Nesse artigo, mostramos que o desempenho dos sindicatos nas nego-
ciações coletivas consolidou uma prática normativa que reverberou sobre a
Referências bibliográficas
ALVES, José. As revoltas dos trabalhadores em Jirau (RO): degradação
do trabalho represada na produção de energia elétrica na Amazônia., 2014.
TESE (Doutorado) - Faculdade de Ciências e Tecnologia – UNESP, Presidente
Prudente: 2014.
CARDOSO, Adalberto. Para onde foram os sindicatos? In: KREIN, José Dari
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DIEESE. Balanço das greves em 2013. São Paulo, dez. 2015. (Estudos e
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