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Para que se construa uma genealogia sobre o que seria o Queer, seria necessário um

olhar multifocado em diversas áreas de conhecimento e em diversas partes do mundo.


Existem certas fontes epistemológicas, conceituais e teóricas comuns e também um contexto
sócio-historico que marcou a emergência do que conseguimos reconhecer no passado o que
hoje chamamos de Queer. Do ponto de vista histórico, sem dúvidas os primeiros estudos
construtivistas sobre sexualidade como Guy Hocquemhem, que escreveu “O Desejo
Homossexual’, Deleuze-Guattari, “O Anti-Édipo”, Foucault, mas também a obra de Jeffrey
Wickes e de Gayle Rubin. Isso, sem dúvida nenhuma não seria possível sem a participação de
conceitos lésbicos feministas que iniciaram-se com a ideia de Adrienne Rich de
heterossexualidade compulsória.

Do ponto de vista epistemológico, é uma corrente que não existiria sem o pós-estruturalismo,
sobretudo o francês e sem a desconstrução. O pós-estruturalismo traz a noção de que um
sujeito é criado pelas instituições, pela cultura, pela política, portanto o sujeito é sempre
moldávem, não é preexistente, por assim dizer. Para que se entenda a importância da
desconstrução nas produções queer, é fundamental perceber que a noção de cultura queer
que marca diversas produções em diversos países, não é a noção de cultura da antropologia.
Ela é a noção de cultura dos estudos culturais. Ela é uma noção de cultura derivada de um
marxismo crírtico com origens passadas de Gamsci. É aí que a desconstrução faz sentido como
uma estratégia que é muito mais de não fazer estudos para explicar como as pessoas são, mas
sim desconstruir a cultura para compreender por quê elas se tornaram o que são.

Se prestrmos atenção em “Desejos Homossexuais”, poderemos observar esse processo


de partida da cultura como algo a que não retomar historicamente para dizer: “chegou-se a
isso”, mas muito mais “somos assim”, esta é uma sociedade que recusa o desejo homossexual
como um fantasma e devemos compreender desconstruindo isso para descobrirmos quais são
seus meandros, os seus mecanismos ou negociações que geraram tal recusa. A
homossexualidade em particular e principalmente a transitividade de gênero, se tornam outro
elemento nesse processo desconstrutivo.

Posto as fontes conceituais e epistemológicas, partiremos para um contexto histórico-


social, em que boa parte dos estudos queer surgem nos anos 80, por mais que existam
leituras divergentes, é perceptível que encontra-se nos estudos queer no presente, descende,
tem um vínculo muito forte com os anos 80. Mas o que se passa nessa década para que isso
aconteça?

Bem, sabe-se que aconteceram coisas bastante trágicas e tristes, sendo a primeira
delas a epidemia de AIDS, que a partir de 1981 vai marcar a vida das pessoas: o pensamento
político, os movimentos homossexuais e dissidências de gênero. Há também elementos da
grande política que não podem ser descartados, sobretudo se pensarmos o queer não
apenascomo uma crítica problemática de gênero e sexualidade, mas também uma
problemática política mais ampla, os anos 80 foram marcados por governos de direita,
governos muito conservadores, neoliberais, particularmente na Europa e nos Estados Unidos,
basta lembrar do duo Tatcher e Reagan.

Então há na década de 80 um fluxo conservador e, apesar disso ter existido, não


significa que não houvesse resistência, pois havia. Pessoas que foram muito marcadas pela
experiência que eu diria que ocorreu entre 68 e 71, do que hoje chama-se de revolução sexual.
Apesar do momento conservador em que vivemos, muitos parecem esquecer que houve entre
68 e 81 um ensaio, por assim dizer, do que alguns teóricos críticos, como Wilhelm Reich,
chamavam de revolução sexual. Tal ensaio, entre 68 e 71, ele é destruído pelos anos 80, mas
as pessoas que vivenciaram a revolução sexual, que refletiram sobrela, que estavam engajadas
nesse projeto de transformação social, cultural e politica profundas continuaram a escrever, e
são essas pessoas, nesta leitura que se faz presente, que se dá a origem do Queer, que estão
criando Teoria Queer. O que marca, eu diria a formação do Queer então em termos histórico,
sociológico e que ajudam a entendermos porquê estas pessoas começaram a escrever o que
hoje estamos chamando de Queer.

Em primeiro lugar, a epidemia de AIDS, não foi geradora de um pânico e de um reforço


de imagens negativas sobre homossexualidade. Richard Miskolci, em artigo com a professora
Larissa Pelúcio, sobre como a AIDS repatologizou a homossexualidade. Se historicamente a
homossexualidade foi patologizada, inclusive criminalizada em boa parte do mundo, entre
1870, mais ou menos e 1973, que é quando a homossexualidade sai da lisa da Sociedade
Americana de Psiquiatria. O que se passa a partir do momento em que se cria um sentido
mesmo de dar um nome, de definir o que é a AIDS, a partir dali o que se tem é uma
repatologizaçao da homossexualidade em novos termos.

No fundo a homossexualidade, para se dizer de forma bastante radical, e ãs vezes é


bom que seja bem explícito, somente entre 73 e 81 houve um respiro de despatologização,
pois até 1973, a homossexualidade era vista como doença mental, uma espécie de loucura.
Não é de se espantar que até os dias atuais em comunidades mais remotas do Brasil, ainda se
pense dessa forma.

A partir de 1981, quando 2 em cada 5 casos de AIDS, vale ressaltar que não era nem a
metade, os médicos norte-americanos com base nesses dados foram capazes de transformar a
AIDS numa doença que, para eles e para o grande público era uma doença homossexual. E aí,
qual era a diferença? Se ate 1973 a homossexualidade era vista como uma doença mental, a
partir de 1981 ela é vista como vinculada, mas frequentemente associada de uma forma muito
brutal e simplória tanto que até hoje isso circula como uma questão epidemiológica. Então se
o dente mental ele pode ser isolado, pode ser transferido para um hospital psiquiátrico,
separado, alienado da sociedade, quando se tem a associação da homossexualidade como um
problema epidemiológico, é algo muito mais perigoso, assustador, na visão dos conservadores,
porque a homossexualidade, ela adquire uma espécie de condição de contágio.

Então para o discurso conservador dos anos 80, é fundamental que se perceba que a
homossexualidade foi vista como uma ameaça de contágio social. Isso nos permite
compreender tanto os anos 80 como os grupos conservadores do presente, porque é que
tantas pessoas que poderiam estar fazendo trabalho social, se dizendo até religiosas, perdem
seu tempo em redes sociais, criando discursos de ódio, sob suposta desculpa da liberdade de
expressão. Por quê é que ainda existe esse discurso conservador? Porque dos anos 1980, pra
cá, no nível simbólico, no nível das representações sociais, a homossexualidade foi associada a
um perigo que ameaça ã própria sobrevivência da sociedade.

Esse contexto dos anos 1980 então e essa repatologização da homossexualidade em


termos epidemiológicos geraram um pânico sexual, que teve o momento mais grave, sem
dúvida nenhuma, entre o início da epidemia em 1981, até a invenção do coquetel
antirretroviral e a sua distribuição, no caso do Brasil, inclusive gratuita a partir de 1997. Esse
foi o auge do pânico sexual, há cerca de 20 anos, mas ainda persiste até hoje, mesmo com
muito esclarecimento, com a existência de tratamento adequado, no caso brasileiro público e
gratuito, ainda assim a sociedade associa a homossexualidade com um perigo para a
coletividade.

Um outro elemento importante, absolutamente vinculado a isso que pretende neste


texto, é que houve o refluxo conservador em relação ãs expectativas com relação a esse ensaio
de revolução sexual ocorrido entre 68 e 71, as pessoas têm opiniões muito diversas, sabe-se
que a maior parte dos queer, incluindo Miskolci, consideram por exemplo, que a luta pelo
casamento por direito que fazem com que as pessoas tem que ser assimiladas às formas
tradicionais para serem reconhecidas como sujeitos de direitos, esta luta, ela tem a ver
diretamente com esse contexto extremamente hostil, nos ajuda a compreender porque certos
grupos homossexuais resolveram aderir a uma noção de cidadania dada, a uma concepção de
cidadania dada, a uma concepção de sociedade já dada, ao invés de querer transformar a
sociedade em concepção de cidadania.

Então isso que é chamado de refluxo conservador tem a ver com uma coisa que muitos
autores já encontravam, isso é um outro elemento: Michael Warner tem o livro “The Trouble
with Normal”, em que ele mostra muito isso. Nos Estados Unidos, mas isso vale para todos os
movimentos, sempre houve certa tensão nos movimentos homossexuais e de dissidência de
gênero entre se assimilar, buscar a assimilação social, boscar ser “normal”, buscar ser aceito
de qualquer maneira, mesmo que seja nos termos existentes ou combater a normalidade e
transformar a sociedade.

Miskolci chama essa vertente de vertente crítica, da vertente revolucionária, da


vertente tanto de atuação política, quanto de criação de conhecimento, que desemboca no
Queer, aquela que não quer aceitar a sociedade como ela é, aquela que não quer a assimilação
a qualquer custo e sobretudo, não sobre o custo do controle social da normalização do
enquadramento. Então nesse momento dos anos 80 até a virada dos anos 1990, percebe-se
nos movimentos homossexuais de muitos países essa tensão muito forte, inclusive cisões
mesmo, criando subdivisões, movimentos indo para a ideia de: “temos que nos casar, ter
filhos, reproduzir uma família tradicional”, e alguns dizendo: “Não, temos que continuar tendo
uma perspectiva crítica de transformação da sociedade como um todo.”.

Esse é mais ou menos o cenário que permite, com o qual se deparam algumas
pensadoras e pensadores nos anos 1980, e que vai poder permitir a criação do que se chama
Queer. A visão miskolciana é a do espirito da transformação social, da crítica do existente, da
ideia de ao invés de uma assimilação e buscar incorporar-se por meio do que é disponível, o
que se pretende é mudar a sociedade.

O que se percebe é que essa cisão gera, quer na política, mas sobretudo na academia,
é que, não por acaso, mesmo nos anos 1970 existe a fundamental emergência dos estudos
gays e lésbicos, tanto no exterior como no Brasil também, entre os anos 1970 e 1980. Tais
estudos têm uma origem que era sobretudo compreender a existência de outras sexualidades
que não a heterossexual, fizeram estudos muito importantes, mas que primavam por uma
concepção, talvez fosse o que era possível naquele momento, não se pode culpabilizar
ninguém por ter trabalhado assim, mas é como se a homossexualidade ou as
homossexualidaes e as dissidências de gênero, que nem eram muito tralhadas neste período,
elas fosse questões de minorias.

Esse termo que ainda circula, como se houvesse uma porcentagem de pessoas na
população, havia até os jornais de comunidade, chamavam-se de 5%, 10%. Como se existissem
identidades fixas e apenas uma parte da população pudesse expressar desejo por pessoas do
mesmo sexo.

Então nos anos 1970 floresceram os estudos gays e lésbicos, e isso foi uma aposta em
uma construção política e acadêmica de identidade e que talvez até mesmo contra as
melhores intenções, tendiam a fazer algo que fica mais patente nos anos 1980: reforçar a ideia
de que a maioria era heterossexual, de que o desejo heterossexual era o natural e esse tipo de
ideia é contraproducente para quem pensa em revolução sexual, na ideia de desejo livre, da
autonomia dos sujeitos, autonomia corporal e desejante.

Nos anos 1980, isso se torna muito patente, porque toda essa problemática do pânico
sexual da AIDS mostrava que provavelmente o medo era justamente das fronteiras não serem
definidas, dos sujeitos poderem expressar diversos desejos, e esse pânico, ele também fazia
pensar: se formos na perspectiva das minorias, estaremos sempre falando da proteção de um
pequeno grupo, mas não seria possível pensar num sentido muito mais amplo? Será que o
desejo por pessoas do mesmo sexo, será que a autonomia corporal, a dissidência de gênero
não seriam possibilidades para a sociedade como um todo?

Será que todos nós, se tivéssemos condições familiares, educacionais para


vivenciarmos os nossos desejos livremente, essas fronteiras não desapareceriam? E a ideia de
a que as pessoas cabem em duas ou três orientações de desejo se dissiparia? Em outras
palavras, Miskolci diz que há uma mudança do eixo da política sexual, e isso é tanto para certa
parte do movimento, mas sobretudo para a área acadêmica, que passa da defesas das
identidades para uma crítica das normas sociais no que toca o gênero e a sexualidade.

É essa virada dos anos 1980 que vai possibilitar o Queer, essa percepção de que ttem
que ir dos sujeitos e da defesa de alguns sujeitos, que supostamente seriam uma minoria, um
grupo calculado para uma problemática que é de toda a sociedade. Se havia pânico sexual, se
a homossexualidade era vista como um perigo epidemiológico, isso derivava do fato de que de
uma forma ou de outra até os conservadores sabiam que, sem o reforço das normas e suas
manutenções, as pessoas transitariam entre os desejos, transitariam entre os desejps e isso
seria a revolução. Então dos sujeitos para as normas e do indivíduo para o social, foi essa
virada que permitiu que autoras e autores pudessem trabalhar com a centralidade do desejo e
da sexualidade em toda a sociedade.

Então as problemáticas de gênero e sexualidade deixam de ser estudos de minorias, de


uma problemática de defesa – pode parecer até algo bem norte-americano, porque uma
sociedade marcada por divisões étnico raciais muitas vezes cria as disputas e as defesas de
pequenos espaços, no entanto a ideia era contrária, isto é uma problemática para toda a
sociedade porque ela é central. A sexualidade, o desejo e o gênero são eixos de diferenciação
social que criam formas de desigualdade e que temos que assumir que isso e amplo e atinge a
todas e todos – e por que não a ‘todes?’- e não apenas a um grupo isolado ou que se possa
reconhecer identitáriamente.

Logo, começam a surgir discussões sobre como há uma marca na nossa ordem coletiva
em que o Estado, a ordem jurídica, todas as instituições dependem de uma ordenação da
sexualidade e do desejo. Conclui-se que desejo e sexualidade não são questões de uma
minoria, eles passam a ser centrai, eles atingem a toda ordem institucional, política e cultural.
Michel Foucault em “História da Sexualidade I” define sexualidade como um dispositivo
histórico de poder que diz claramente que não existe nada de natural na sexualidade.
Para Foucault, a sexualidade é central e é inclusive fundamental para a formação dos
estados nacionais e de toda a ordem jurídica, cultural e política do século que se monta, a
partir do final do XVIII para cá, para Miskolci Foucault não tinha ainda uma posição muito clara,
mas compreendia a homossexualidade como algo minoritário, ainda ele é o produto dos anos
70 e ele não tinha uma ênfase nas questões de gênero. Ele não incorpora o feminismo e o
gênero. Quando se faz uma leitura crítica de “História da Sexualidade I”, fica a questão: para
onde esse dispositivo histórico de poder aponta? O que esperar dos sujeitos? O que essa
ordem está fazendo com eles?

Os primeiros estudos Queer vão beber de Foucault e também de outras fontes já


citadas, mas também dizer claramente que o dispositivo de sexualidade heterossexualizou a
sociedade. Havia um interesse de construir uma cultura que se acreditasse Heterossexual, que
naturalizasse o desejo de pessoas pelo sexo oposto e compreendesse a sexualidade como
natural, mesmo porque, supostamente, sempre para reprodução. É evidente que deram um
certo pulo em relação ao Foucault, sem dúvidas eles percebem que existe um medo nessa
ordem cultural dos anos 1980, diria Miskolci que vivemos em um momento que certo grupos
fundamentalistas estão querendo retomar esse medo, inclusive no Brasil, e que seria esse
fantasma da possibilidade da transformação, no que se refere à sexualidade, ao desejo e ao
gênero, porque modificar tais elementos é mexer com toda a nossa ordem institucional, com
os direitos, é modificar relações de poder, isso amedronta a sociedade, as sociedade em geral
e em particular a brasileira: uma sociedade extremamente autoritária e que criou modalidades
de cidadania.

Este país, obviamente descendente de processos coloniais e de escravidão, é um país e


uma nação que se constrói sob o medo da possibilidade de que as pessoas alcancem a
igualdade. Para Miskolci, quando o sujeito põe a centralidade do desejo, da sexualidade, do
gênero num processo politico amplo ele começa a entender o medo que isso gera, é um medo
das classes obviamente bem situadas, que estão usufruindo da ordem do poder presente,
estão no topo da hierarquia social. Néstor Perlongher, que na visão miskolciana é um dos
primeiros autores Queer no mundo, em seu livro considerado extremamente Queer para o
sociólogo, “O que é AIDS” de 1987, Perlongher faz uma análise sociopolítica do que ele estava
vivenciando nos anos 80, em particular epidemia de AIDS, e não por acaso ele começa o livro
com a referência ao Manifesto Comunista de Marx, porque ele fala do espectro que ronda o
ocidente e, no caso tal espectro é a revolução sexual.

Nesse livro é muito claro para ele que o uqe se passava era uma espécie de freio, uma
tentativa de impedir ou de barrar transformações profundas que realmente se
desencadearam, estavam em andamento de 1968 em diante. Os estudos Queer trazem para a
cena acadêmica, com especial esse de Perlongher, o potencial politico desses pensamentos e
percepções de uma geração que vivenciou tanto a revolução sexual, ou esse ensaio de
revolução sexual, quanto o refluxo conservador. Isso é uma marca desses primeiros
pensadores.

De forma simplificada, Miskolci aponta para uma percepção das primeiras obras que
hoje reconhecemos como Queer, são mapeamentos, uma espécie de cartografia dos
cerceamentos à revolução sexual, um mapa onde se passava tudo o que fosse possível para
impedir que as coisas fossem transformadas profundamente. No caso de Perlongher, a forma
como ele aborda “O que é a AIDS”e vai mostrando esse processo de repatologização da
homossexualidade em outros termos e ele é muito crítico, inclusive com relação a sua própria
área de atuação na academia, quando ele percebe que as pessoas estão começando a produzir
conhecimento em torno das demandas do Estado. E que ele era completamente
antidisciplinar, então tinha esse impulso de dizer que o disciplinamento do pensamento e a
produção de conhecimento a partir das demandas estatais podem nos tornar politicamente
quietistas.

Pode-se pensar em “Gender Trouble”, no problema de gênero de Butler como um livro


que explora a possibilidade de um feminismo que englobe o desejo e a sexualidade para se
contrapor a uma matriz heterossexual, que ela também descreve e analisa, e que estava sendo
reforçado em termos históricos naquele período de escrita do livro dela. Pode-se pensar na
Epistemologia do Armário de Sedgwick, que nos Estados Unidos é vista como a criadora da
Teoria Queer para eles, aqui daremos mais ênfase a Butler e lá a Sedgwick.

Em Epistemologia do Armário, ela nos obriga a reconhecer que a revolução sexual, o


período pós-stonewall, a revolta homossexual em Nova York em 1969, nào foi capaz de
desconstruir, de eliminar o que ela chama de ‘armário’ e que ela sofistica e hoje em dia,
chamamos de regime de visibilidade, faz com que as pessoas tenham que negociar o tempo
todo a visibilidade e a aceitabilidade dos seus desejos, da sua vida íntima e da forma como
vivenciam o desejo particularmente, que pode-se também trazer para uma problemática de
um gênero.

São muitos os autores que trazem tal cartografia do conservadorismo, essa cartografia
dos freios a um ensaio de uma revolução sexual. Esse é um elemento comum em diversos
contextos nacionais, seria ingênuo imaginar que apenas ocorreu nos Estados Unidos. O que se
sabe é que houve expressões em muitos contextos nacionais, inclusive no Brasil. É
fundamental que não se reproduza o colonialismo do pensamento e das trocas acadêmicas,
pensando que o Queer é uma corrente norte-americana de pensamento. Esses elementos
históricos, teóricos e conceituais comentados aqui, eles também marcaram a produção teórica
e de pesquisa em muitos países.

Perlongher, por exemplo, ensinou na Unicamp e trabalhava com Guy Hocquenghem,


segundo o Arquivo Edgard Leuenroth, as anotações dos cursos de Perlongher, em cujas
anotações de Hocquenghem todas anotadas e curiosamente ou não, Guy Hocquengehm era
referência para Gayle Rubin nos EUA na primeira metade dos anos 80 e, com certeza, também
na França uma referência. Muitas dessas fontes eram reapropriadas em diferentes contextos
nacionais, criando pensamentos originais e que, a despeito de sua originalidade e não em
detrimento dela, criava-se pontos comuns para uma onda, por assim dizer, de formação de
pensamento do que hoje temos por Queer.

O que existe em comum, além dessa cartografia dos pensamentos das práticas sociais,
das questões culturais e de todos os referentes desse período que impediam a transformação
social ensaiada nos anos 1970. Pode-se dizer que existem muitas leituras sobre Queer de
feminismos, pode-se perceber os estudos Queer como descendentes do feminismo em muitos
aspectos. Um deles é que o feminismo se origina como uma filosofia política no final do século
XVIII, não por acaso, já fazendo uma crítica à proposta que surge como as revoluções de
igualdade.

Marty Wollstonecraft, quando escreve “A Reivindicação dos Direitos da Mulher e da


Cidadã” ou Olympe de Gouges, na França, fazendo sua versão dos direitos da mulher e da
cidadã, no caso dessa última, decapitada inclusive, por isso, já problematizando uma sociedade
que irá construir uma nova ordem institucional, política e social, dizendo que vai ser igual, mas
desde que todos sejam homens. Então o feminismo é uma crítica epistemológica política, ou
melhor, uma epistemologia política das mais fundamentais, e é possível traçar rupturas, mas
também continuidades nessa epistemologia política radical, no caso do Queer.

Muitas das autoras que se tornaram conhecidas como Queer e autores também, como
Néstor Perlongher, na Argentina, que tentou vincular o movimento homossexual a um
feminismo anarquista. Essas pessoas tinham essa verve, de mostrar limites da noção de
cidadania e de ordem institucional de seu tempo. Então se as feministas, no sentido mais
radical do feminismo, com uma epistemologia política radical, que mexe com a ordem
institucional e política, tinham mostrado que o suposto olhar neutro que, sobre o qual se
construiu o conhecimento, a política, as instituições modernas, no fundo, na verdade, era um
olhar masculino, um olha de homem, e hoje sabemos que inclusive europeu, branco e
heterossexual.

Os estudos Queer darão uma ênfase de que esse mesmo olhar sempre foi um olhar
heterossexual e generificado dentro das normas, generificado dentro de uma linearidade, na
expectativa de que as pessoas que produzem conhecimento, que fazem política, que criam ou
têm mais poder sobre a ordem cultural, elas seriam sempre heterossexuais e com uma relação
linear entre sexo biológico, gênero, desejo e práticas sexuais. Entáo como foi dito, há essa
possibilidade, não há consenso sobre isso, mas é possível pensar então numa crítica
epistemológico-política feminista, na qual o Queer é um aprofundamento e talvez um salto
dentro dessa longa tradição de mais de dois séculos. E por isso, inclusive, o presente texto
busca introduzir pessoas a um novo olhar, porque é justamente o que dentro dessa história se
passou, questionar nosso olhar, que foi desconstruir esse olhar, que foi construído pela nossa
ordem social, pela nossa experiência social, para ser um olhar onde, não importando se é
homem ou se é mulher ou qualquer que seja o desejo ou gênero, todo ser humano foi
constituído, adestrado, a olhar para o mundo de maneira heterossexual, generificada, de
forma supostamente correta, e a ideia deste texto é desconstruir esse olhar, permitir que se
coloque em cheque a maneira de se ver o mundo, porque, não por acaso, a despeito dos
problemas de tradução, que não merecem ser levados em consideração, afinal ninguém
tentou traduzir capital por outra palavra, e há quem tente traduzir o Queer.

Teoria vem de theorein, vem da ideia de ver a questão da visibilidade, do que pode ser
reconhecido está no termo teoria. ATeoria Queer é uma teoria torce o olhar, que faz propor ao
menos que se enxergue o mundo de outra maneira. De uma maneira não normativa, de uma
maneira aberta a outras possibilidades e uma maneira que seja aberta a não aceitar divisões
que fazem com que os sujeitos tenham que ser divididos entre os supostamente normais, ou
seja, heterossexuais e generificados, como a sociedade espera e, obviamente brancos e
cristãos, e aqueles que ate hoje a sociedade relegou à anormalidade, à inferioridade e até
mesmo à abjeção. Aqueles que teriam que estar fora de cena.

Não é mero acaso, inclusive essa grande questão do olhar e da visibilidade, se


pensarmos que os grupos conservadores recentemente tentaram apagar uma palavra dos
documentos. A ideia é de que isso seja inaceitável, a ponto de não poder existir. O
apagamento é muito diferente do debate, da discussão, da escolha de outro termo. Então a
Teoria Queer, os estudos Queer e todas essas vertentes de reflexão que é tão mais ampla, que
é um rótulo para um conjunto que, com certeza não é tão coeso quanto pode parecer de
pesquisas, reflexões e discussões politicas, a Teoria pode ser a torção de nossos olhares e esse
texto é um convite a desconstruir o olhar normalizador de todos nós e criar uma perspectiva
que se desvie dos preconceitos que marcaram como lentes a forma como como o mundo foi
enxergado até hoje, de maneira que se possa reconhecer as possibilidades de transformação e
autonomia, envolvendo o gênero, a sexualidade e o desejo.

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