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Em 1500, sob o comando de Pedro Álvares Cabral, o Brasil foi batizado com a fixação
em terra da primeira cruz, seguida da reza da primeira missa, proferida, na ocasião, pelo
frei Henrique de Coimbra, um franciscano.
A primeira impressão deixada pelos nativos na visão dos viajantes era de que estes
homens gentios não possuíam qualquer vínculo religioso, ou seja, não adoravam
nenhum tipo de Deus, nenhuma santidade, ou até mesmo um ídolo. Voltaremos a tratar
deste aspecto mais afrente. No entanto, não demoraria muito tempo para que este
conceito elaborado pelos portugueses caíssem por terra.
O fato é que os jesuítas não tinham muito tempo para o feito "missionário", pois a
colonização precisava de mão -- de -- obra. Em Pernambuco no ano de 1530 a
colonização do açúcar já estava funcionando. Temos de um lado a resistência dos índios
e do outro as ambições escravistas, na ocasião, para engenhos de açúcar. A verdade é
que os índios ficaram entre os apresadores de escravos (mamelucos) e os padres
jesuítas. Estes últimos diziam para os pajés que eles, padres, eram os verdadeiros pajés,
diziam ainda que os índios não poderiam seguir os mamelucos, por outro lado, estes
apresadores também instaram os nativos para que não ouvissem os jesuítas.
Os índios ora ouviam os apresadores, ora os padres, mas em outras oportunidades não
ouviam nem um nem outro, travando assim, uma guerra que terminava com rituais
antropofágicos.
O que podemos ver é, na verdade, uma grande resistência, por parte dos nativos. Uma
resistência antiescravista que era absorvida por esta santidade tupi.
Nóbrega conhecera o rito da santidade, logo percebeu o perigo desta dimensão dos
nativos, descreveu em 1549 uma cerimônia denominada caraimonhaga, onde o pajé
pregava a cultura tupi, revelando para seus seguidores o vindouro "paraíso tupi", a Terra
sem Mal. Nóbrega chamou este momento de santidade, tal fenômeno, para ele, era
diabólico.
"Os índios zombavam dos padres e dos sacramentos por eles ministradas, alardeando
que a verdadeira fé era a sua, assim como deus era o seu ídolo, e santos os seus caraíbas.
{Quando os brancos iam ouvir missa} -- contou Álvaro Rodrigues -- {eles (os índios)
davam apupadas dizendo que os brancos andava muito tempo errados naquela erronia
de cristãos} (...), escrava de um ferreiro em Parpe, costumava zombar da hóstia
consagrada e do próprio Deus cristão" ...
O mito da Terra sem Mal, conta o autor, revela o maior inimigo do índio: o homem
branco, os portugueses, o cativeiro, sua Igreja dos padres, a lei dos cristãos..., temos,
portanto, um sentido anticolonialista, O autor diz também que, paradoxalmente,
algumas dimensões do catolicismo também fora absolvido pela santidade, dizendo, por
exemplo, da semelhança havida entre a Terra sem Mal e o paraíso celestial cristão.
"a igreja dos índios -- diziam -- era a verdadeira santidade para ir ao céu, porque a dos
cristãos era falsa e não merecia que nela se acreditasse".
O fato é que praticamente todo o litoral brasileiro passou a conhecer este termo
santidade, e também seu significado. A busca da Terra sem Mal significava uma
"guerra" contra os portugueses, contra a escravidão, etc. A mais importante santidade
ocorreu no recôncavo baiano, liderada por Antônio, nome de batismo, ancestral dos
tupinambá. Esse líder de Jaguaripe, foi um dos exemplos práticos dos perigos da
tradução feita pelos jesuítas do catolicismo para ingua e o imaginário Tupi. Antônio
entoava cerimônias de batismo, nomeava papas, bailes tribais, orações, sua companheira
era chamada de Maria Mãe de Deus, estava, portanto, feita a fusão católica e indígena.
Em suma, a história demonstra as aproximações da Terra sem Mal dos tupis com as
alusões jesuísticas, os portugueses católicos que conseguiram enganar os "homens
gentios" dizendo sobre a Terra prometida (Jerusalém), quando na verdade, esta terra
fora travestida nas fazendas de escravos.
O Santo Oficio tinha muito a fazer, conforme afirma Ronaldo Vainfas: "teria de
enfrentar não apenas interpretações heterodoxas do divino, mas múltiplos santos pelo
avesso". De acordo com o autor, a rigorosidade do Santo Oficio, em suas visitações
realizadas na "Bahia de todos os santos", apresentou-se menos intensificada com relação
aos negros, de acordo com relatos do Acotundá, tal comportamento, segundo Ronaldo,
deve-se principalmente com relação a escravidão que não podia, de forma alguma,
sofrer um enfraquecimento.
Esta estratégia dos cristãos novos deu certo por um bom tempo, pois não havia presença
da inquisição na colônia. Evaldo Cabral de Mello evidencia que estes judeus foram
importantes para o desenvolvimento, sobretudo em Pernambuco, da açucarocracia,
termo adotado por este magnífico historiador.
Judaizar em segredo, esta foi uma das inúmeras acusações proferidas por Heitor. Muitos
foram julgados e condenados à fogueira. Ana Rodrigues, moradora da Bahia foi
sentenciada, ficou trancada em Lisboa até sua morte chegar, segundo relatos, aos 100
anos de idade. Após seu enterro foi decretara sua condenação a fogueira, então
desenterram-na e queimaram seus ossos.
Vainfas diz ainda que os cristãos novos, devido a obrigatoriedade exercida pelos
"verdadeiros cristãos de Lisboa", de se seguir o catolicismo, adorando imagens, criou
uma revolta muito grande, revolta que muitas vezes era manifestada com maus tratos a
imagens de santos, por exemplo, a banalização do crucifixo. Para os "verdadeiros
cristãos" os judeus eram os piores hereges, para alguns estudiosos do assunto, afirma o
autor, os atos dos cristãos novos nada mais era do que vingança.
Contudo, a vida cotidiana dos colonos no novo mundo não fora nada tranqüila, muito
pelo contrário, seja os cristãos novos, seja os inacianos, todos viveram momentos de
angústia e indefinições, momentos de constante contato com as dificuldades ora
elaboradas por seus costumes, ora por seus inimigos de religião. A verdade é que tanto o
céu com o inferno eram atingidos com extrema facilidade, diante de tantas dificuldades
no dia -- a dia, os pedidos para santos e derivados eram inúmeros, bastava que um
destes pedidos não fossem atendidos para o espírito de rebeldia se manifestar contra os
ícones da fé católica cristã.
Referência bibliográfica: