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Outros Temas em Educação - 04 p.

241- 253

INFLUÊNCIA DA FAMÍLIA NA APRENDIZAGEM


ESCOLAR DA CRIANÇA: ponto de reflexão
Roberta Gama Brito98
Sebastião Silva Soares99

RESUMO
O presente trabalho, por meio de um estudo bibliográfico de cunho qualitativo sob a abor-
dagem epistemológica histórico-cultural de Vygotsky (1996), tem por objetivo propor
uma reflexão sobre a influência das relações familiares no processo de aprendizagem
escolar das crianças. Para isso, o estudo baseou-se na análise de referenciais teóricos,
utilizando como aporte de análise as concepções de família, de infância e de aprendizagem
fundamentada nos estudos de Ariès (1981), Carvalho (2005), Larsh (1991), Piaget (1987),
Vygotsky (1984), dentre outros. Buscou, com essa metodologia, compreender as ideias
apresentadas pela literatura acerca das relações familiares e as suas possíveis influências
na formação escolar da criança. O estudo possibilitou visualizar que a família pode
contribuir positiva ou negativamente no processo de aprendizagem escolar, pois a criança
internaliza os acontecimentos que ocorrem em casa e os exterioriza na escola. Conclui-se
com este estudo que há necessidade de um equilíbrio no sistema familiar, com o propósito
de minimizar déficits de aprendizagem das crianças. Além disso, os dados obtidos apontam
para a necessidade de desenvolver novas análises sobre as atuais conjunturas familiares e
seus impactos na aprendizagem escolar das crianças, principalmente questões relacionadas
a gênero, etnia e raça.

Palavras-chave: Família. Criança. Aprendizagem escolar.

98
Assistente Social no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás. Pós-Graduada em Psicopedagogia
Clínica e Institucional pelas Faculdades Santo Agostinho (FASA). E-mail: robertagam@yahoo.com.br
99
Mestrando no Programa de Pós-graduação em Educação pela Universidade de Brasília (UnB). Professor de Língua
Portuguesa e suas Respectivas Literaturas no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de goiás. E-mail:
sebastiaokenndy@yahoo.com.br.
revista EXITUS | Volume 04 | Número 01 | Jan/Jun. 2014
242 Roberta Gama Brito, Sebastião Silva Soares

INFLUENCE OF THE FAMILY IN THE CHILD’S SCHOOL


LEARNING: point for reflection

ABSTRACT
This paper, through a bibliographic study of a qualitative approach in the epistemological
cultural-historical Vygotsky (1996) aims to propose a reflection on the influence of family
relationships in the learning process of school children. For this, the study was based on
the theoretical analysis , using as input the analysis of conceptions of family, childhood and
learning based on studies of Aries (1981 ), Carvalho (2005 ), Larsh (1999), Piaget (1987),
Vygotsky(1984) among others. Sought with this methodology, understand the ideas pre-
sented by the literature on family relationships and their possible influences on children’s
schooling. The study made it possible to visualize that the family can contribute positively
or negatively on the school learning process, because the child internalizes the events that
occur at home and at school externalized. It is concluded from this study that there is need
for a balance in the family system, with the purpose of minimizing the learning deficits of
children. Furthermore, the data indicate the need to develop new analyzes on current con-
junctures family and their impact on school learning of children, especially issues related
to gender, ethnicity and race.

Keywords: Family. Children. School learning.

INTRODUÇÃO as relações familiares podem influenciar


O presente trabalho tem por objetivo na aprendizagem escolar da criança, res-
propor uma reflexão sobre a influência das gatando historicamente conceitos e ideias
relações familiares no processo de apren- que permeiam essa mediação. A escolha
dizagem escolar das crianças, a partir de dessa perspectiva justifica-se pelo fato de
uma pesquisa teórica, visto que nos últi- compreender-se que o desenvolvimento da
mos anos diversos autores têm apontado criança acontece antes mesmo de se inserir
a necessidade de compreender a formação na escola. Ou seja, a aprendizagem é um
escolar da criança e a influência da família fenômeno social-cultural, anterior ao pro-
nesse processo (DROUET, 1995), (MAR- cesso de escolarização.
TURANA, 1997), (ALOSP 1999). Para alcançar tal objetivo, a metodo-
Nesse sentido, objetiva-se compre- logia deste trabalho baseou-se na análise
ender, a partir de uma perspectiva histó- de referenciais teóricos a partir da pesquisa
rico-cultural Vygotskyana (1996), como bibliográfica de natureza qualitativa (GIL,

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2012, p.50), utilizando como aporte de aná- rimentar, conhecer e criar novas aprendi-
lise as concepções de família, de infância e zagens.
aprendizagem fundamentadas nos estudos Espera-se que este estudo venha con-
de Ariès (1981), Carvalho (2005), Larsh tribuir com novas análises sobre a relação
(1991), Piaget (1987), Vygotsky (1984), entre a família, criança e a aprendizagem
dentre outros. escolar, a fim de que se possa pensar em
A escolha da pesquisa bibliográfica diretrizes que favoreçam qualitativamente
justifica-se por proporcionar ao investiga- na formação integral da criança, respeitan-
dor a cobertura de uma gama de fenômenos do o seu ritmo e estilos de aprendizagem,
muitos amplos do que aquela que poderia ou seja, “assegurando-lhe por lei ou por
pesquisar diretamente (GIL, 2012, p.51). outros meios, todas as oportunidades e fa-
Por meio da pesquisa bibliográfica, será cilidades, a fim de lhes facultar o desenvol-
possível compreender como as relações vimento físico, mental, moral, espiritual e
familiares podem influenciar na aprendiza- social, em condições de liberdade e de dig-
gem escolar da criança e quais as possibili- nidade” (BRASIL, 2012, p. 07).
dades e desafios impostos por essa media-
ção no seu desenvolvimento. CONCEPÇÃO DE FAMÍLIA
Nessa perspectiva, o texto está estru- Partindo da compreensão de que o ser
turado em três partes: primeiramente, apre- humano está em permanente construção de
senta-se uma análise sobre a concepção de si mesmo, por meio das interações cultu-
família, a fim de analisar como se configu- rais, sociais e histórico-familiares, faz-se
ra o termo família e suas implicações no necessário entender como se dá a relação
contexto social. Na segunda parte, discor- de aprendizagem da criança, tendo como
re-se sobre o conceito de criança, buscando ponto de partida as relações familiares,
a partir de uma análise sociocultural o con- visto que a família é o primeiro ambiente
ceito de criança e a sua atuação no contex- de socialização que a criança experiência.
to familiar e social. Por fim, apresenta-se, Nas palavras de Medici (1961, p 40.),
na terceira parte do trabalho, a análise dos “[...] Todo o seu progresso psicológico foi
dados obtidos no estudo, na qual a família realizado, até então, através das relações
interfere no desenvolvimento da criança, com outrem, principalmente os pais. De
na medida em que oferece condições para começo, a criança fundiu-se com as pesso-
a criança se apropriar de conhecimentos as que a rodeiam, identificou-se com elas,
socialmente históricos construídos pela foi invadida pela sua presença [...]”. Para o
humanidade (SAVIANI, 2011, p13), des- teórico, a convivência familiar proporcio-
pertando no pequeno (a) o desejo de expe- na à criança momentos de socialização que

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contribuem para a construção sócio-histó- Faz-se necessário ressaltar com isso


rica do indivíduo. que a família é uma construção sócio-his-
No entanto, antes de se investigar a tórica e, devido às transformações sociais,
influência da família no processo da apren- vem apresentando novos arranjos100. Em
dizagem escolar da criança, precisa-se si- Silva (1987, p.42), compreende-se que “o
tuar nesta análise a concepção de família. estudo da história social da família deixa
Etimologicamente o vocábulo família: evidente que esta instituição social aparece
intimamente ligada à situação concreta de
[...] origina-se, remotamente, do radical
uma época e assume características distin-
dha, que significa pôr, estabelecer, da língua
ariana, que se transformou, na passagem tas, nos diferentes grupos locais”.
ao osco, em fam [...] Assim, a palavra dha-
Dessa maneira, é perceptível que o
man, que, em sânscrito, significa casa, com a
transformação do dh em f, fez nascer, entre modelo de família nuclear101 vem perdendo
os dialetos do Lácio, como é o caso do osco,
espaço para os novos arranjos familiares, os
o vocábulo faama, donde surgiu famel (o ser-
vo), famelia [...] Da palavra famel derivou fa- quais trazem consigo um novo conceito de
mulus, com a criação intermediária de famul,
família que, apesar de ter novas configura-
forma primitiva ou arcaica de famulus, don-
de derivou, provavelmente, famulia [...] Tudo ções, não perde a sua essência. Isso, na opi-
mostra, pelo visto, que esse radical dha te-
nião de Carvalho (2000, p.13), representa
nha dado origem às palavras: domus (casa),
no latim, e domos (casa), no grego, radical produzir cuidados, proteção, aprendizado
esse que significa unir, construir (AZEVEDO,
dos afetos, construção de identidades e vín-
1999, p. 202).
culos relacionais de pertencimento, capazes

Segundo a literatura, o termo “famí- 100


- Famílias com base em união livre;
- Famílias monoparentais dirigidas pelo homem ou pela
lia” pode ser conceituado como uma uni- mulher (sendo que grandes porcentagens destas famílias
dade de pessoas em interação, um sistema são dirigidas por mulheres);
- Divorciados gerando novas uniões (famílias
semiaberto, com uma história natural com- recompostas);
- Mães/adolescentes solteiras que assumem seus filhos;
posta por vários estágios, sendo que a cada - Mulheres que têm filhos através de “produção
um deles correspondem tarefas específicas independente” (sem companheiro estável). (COLLANGE,
Christine. Defina uma família. Trad. Mário Fondelli. Rio
por parte da família (BURGENS; RO- de Janeiro: Racco. 1994.)
101
Kaloustian afirma que: “A família nuclear ou família
GERS, 1990 apud ELSEN, 2002). conjugal moderna é aquela família composta por pai,
Nesse sentido, entende-se o concei- mãe e filhos, coexistindo por meio de laços de aliança
e de consaguinidade. A família nuclear moderna
to de família como um sistema constituído surge como uma categoria interpretativa, como um
tipo ideal que num determinado período permitiu
por um grupo de pessoas com ou sem laços a compreensão do real. Nessa concepção, todos os
consanguíneos que compartilham senti- arranjos familiares que se encaixavam dentro deste
modelo eram considerados como famílias boas, certas,
mentos, valores, afetividade, solidariedade estruturadas, sendo que todos os arranjos que não se
enquadravam constituíam-se em disfunções do sistema
e reciprocidade. ou simplesmente em famílias desorganizadas e/ou
desestruturadas.” (KALOUSTIAN; FERRARI, 2005, p. 93).

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de promover melhor qualidade de vida a e desenhos que a família contemporânea


apresente, ela se constitui num canal de ini-
seus membros e efetiva inclusão social na ciação e aprendizado dos afetos e das rela-
comunidade e sociedade em que vivem. ções sociais.

Nessa direção, compreende-se que, de-


vido às transformações sociais que ocorrem, Nessa perspectiva, busca-se com-
a família, hoje, busca, a todo o momento, li- preender, no próximo tópico, a inserção da
dar com as fragilidades existentes, sejam elas criança no contexto familiar e apresentar
internas sejam externas, causadas por fatores quais as concepções de criança em cada
pessoais, profissionais e/ou sociais. De acor- período da história, com o propósito de
do com Carvalho (2000, p. 14): estabelecer, a partir do marco histórico, as
possíveis influências das relações família-
É preciso olhar a família no seu movimento. res na aprendizagem escolar da criança.
[...] Este movimento de organização-reorga-
nização torna visível a conversão de arran-
jos familiares entre si, bem como reforça a A CRIANÇA NO CONTEXTO FAMILIAR
necessidade de se acabar com qualquer es-
tigma sobre as formas familiares diferentes. Para se falar da representação da
Evitando a naturalização da família, precisa- criança na família, faz-se necessário um res-
mos compreendê-la como grupo social cujos
movimentos de organização-desorganiza- gate histórico do conceito de infância, visto
ção-reorganização mantêm estreita relação que os significados foram surgindo e/ou se
com o contexto sócio-cultural. [...] É preciso
enxergar na diversidade não apenas os pon- modificando com o passar dos tempos.
tos de fragilidade, mas também a riqueza das A infância, durante muito tempo,
respostas possíveis encontradas pelos gru-
pos familiares, dentro de sua cultura, para as não foi vista como uma etapa a ser vivida
suas necessidades e projetos. pelo indivíduo. Essa concepção partia do
olhar dos adultos que percebiam a crian-
Sendo assim, a maioria das famílias, ça como um pequeno adulto, o que gera-
segundo Lahire (1997, p.338), buscam dar va questionamentos acerca de quem era a
aos filhos a oportunidade de aprender, já criança e quando se iniciava e terminava
que a instituição familiar é privilegiada a infância.
por proporcionar conhecimentos diversos Preocupado com essa questão, o pes-
que, em contato com a realidade fora do quisador francês Philippe Ariès publica em
lar, ajudam no processo da formação do 1960 a primeira edição da obra “História
ser. Sobre isso Carvalho (2005, p.93) ex- Social da Criança e da Família”, na qual
põe que: expõe que o conceito de infância foi sendo
construído historicamente.
A família é o primeiro sujeito que referencia
e totaliza a proteção e socialização dos indi- Segundo Ariès (1981), durante o pe-
víduos. Independente das múltiplas formas ríodo da idade média, as crianças não vi-

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venciavam a infância, pois as pessoas defi- cionou às famílias observarem que a pre-
niam essa idade como: sença das crianças no seio familiar possuía
significado, pois representava a heredita-
[...] a primeira idade é a infância que plan-
riedade (sucessão parental).
ta os dentes, e essa idade começa quando
nasce e dura até os sete anos, e nessa ida- A família, com esse novo olhar, vi-
de aquilo que nasce é chamado de enfant
sava garantir a sobrevivência das crianças,
(criança), que quer dizer não falante, pois
nessa idade a pessoa não pode falar bem assim como a educação, já que, segundo
nem formar perfeitamente suas palavras [....]
gélis (1991, p.315), as aprendizagens da
(ARIÉS, 1981, p. 36).
infância e da adolescência deviam, pois, ao
mesmo tempo fortalecer o corpo, aguçar os
Dessa maneira, para o teórico, as
sentidos, habilitar o indivíduo a superar os
crianças aos 07 (sete) anos de idade eram
revezes da sorte e, principalmente, a trans-
inseridas diretamente no mundo adulto,
mitir também a vida, a fim de assegurar a
pois estavam aptas para o trabalho e a vida
continuidade da família.
social. Segundo Ariès (1981, p. 231), a fa-
mília “era uma realidade moral e social, Nessa direção, como assevera Ariès
mais que do sentimental”. (1981, p.232), a escola passa a ter maior
presença no âmbito familiar:
Diante desse contexto, percebe-se
que as experiências vivenciadas pelas
A substituição da aprendizagem pela escola
crianças advinham do trabalho domésti- exprime uma aproximação da família e das
crianças, do sentimento da infância e da fa-
co, pois elas não frequentavam estabele-
mília, outrora separados [...] o clima senti-
cimentos escolares, visto que, segundo mental era agora completamente diferente,
mais próximo dos nossos, como se a família
o autor supracitado, “não havia lugar
moderna estivesse nascido ao mesmo tempo
para a escola nessa transmissão através que a escola , ou pelo menos o hábito geral
de educar as crianças na escola.
da aprendizagem direta de uma geração
Desse modo, apesar das transforma-
a outra”.
ções ocorridas em torno da família e da
No entanto, no período moderno, de-
criança, percebe-se que aquela ainda tem
vido às transformações sociais, culturais,
um papel significativo em torno do desen-
econômicas e políticas, ocorrem mudanças
volvimento, da sociabilidade, afetividade,
no âmbito familiar. A criança, antes por-
responsabilidade, em especial da infância e
menorizada, agora passa a receber dos pais
adolescência. Ou seja, pode-se inferir que a
carinho, afeto e preocupação, o que para
família possui um conjunto de papéis defi-
Ariès (1981) representava sentimento pela
nidos que devem ser trabalhados em prol de
infância. Em outras palavras, o sentimento
um crescimento conjunto no âmbito fami-
atribuído à descoberta da infância propor-
liar e nas vivências sociais dos indivíduos.

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Dessa maneira, percebe-se uma pre- uma cadeia de idéias atomisticamente for-
mada a partir do registro dos fatos e se reduz
ocupação das famílias com o futuro dos fi- a uma simples cópia do real.
lhos, o que se configura como um legado de
uma era em que os ideais são projetados pela De acordo com a visão de que a
sociedade de cunho racionalista e capitalis- aprendizagem parte da experiência, Mus-
ta que, apesar de todas as inovações, busca sen (1970) propõe que a aprendizagem se
guiar os passos dos filhos. Isso, nas palavras tornaria mais satisfatória se ocorresse por
de Lasch (1991, p.25), é iniciado na infância: uma motivação/reforço. No entanto, o teó-
rico também expõe que aprendizagem po-
Como principal agente de socialização, a fa-
mília reproduz padrões culturais no indiví- deria ocorrer sem motivação/ reforço, ou
duo. Não só confere normas éticas, propor- seja, a criança, por critério de identificação,
cionando a criança sua primeira instrução
sobre as regras sociais predominantes, mas adquire as características, pensamentos e
também molda profundamente seu caráter, sentimentos advindos dos pais; assim, é es-
utilizando vias das quais nem sempre ela tem
consciência. A família inculta modos de pen- tabelecido um padrão de comportamento.
sar e atuar que se transformam em hábitos. Por outro lado, Celidonio (1998) vê a
Devido a sua enorme influência emocional,
afeta toda a experiência anterior da criança. aprendizagem como um processo em que a
criança se desenvolve de forma autônoma
AS RELAÇÕES SOCIOFAMILIARES E O e não como um reflexo de modelo de indi-
PROCESSO DE APRENDIZAGEM víduo ou família. Para a autora, a aprendi-
Primeiramente, se irá discutir nesse zagem é um processo ativo, que envolve a
tópico o conceito de aprendizagem e como atribuição de significado àquilo que é apre-
ela se dá no contexto social da criança, visto endido.
que esta, ao se inserir no núcleo escolar, traz Segundo Piaget (1987), a criança,
consigo experiências e saberes advindos da devido às atividades realizadas no convívio
convivência com familiares e outras pesso- social, começa a estabelecer ações que vão
as. Agnela giusta (1985, p. 26) expõe que: ser aplicadas em determinadas situações
vivenciadas por ela. Para o teórico, essa
O conceito de aprendizagem emergiu das adaptação se dá por assimilação de esque-
investigações empiristas em Psicologia, ou
seja, de investigações levadas a termo com mas e por acomodação de novas estruturas
base no pressuposto de que todo conheci- mentais, a partir das quais se faz o processo
mento provém da experiência. Isso signifi-
ca afirmar o primado absoluto do objeto e da aprendizagem, ou seja, qualquer apren-
considerar o sujeito como uma tábula rasa, dizado novo somente poderá ser assimila-
uma cera mole, cujas impressões do mun-
do, formadas pelos órgãos dos sentidos, são do se existir uma base de conhecimento su-
associadas umas às outras, dando lugar ao ficiente que proporcione a sua existência.
conhecimento. O conhecimento é, portanto,

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Entretanto, Vygotsky (1984), a par- Em outras palavras, o desenvolvi-


tir do enfoque da psicologia sociocultural, mento potencial da criança ocorre a par-
caracterizada fundamentalmente pela ten- tir do momento em que ela interage com
tativa de reunir, de modo dialético, num uma pessoal mais experiente, encontrando
mesmo modelo explicativo, tanto os me- nesse ente uma orientação para solucionar
canismos cerebrais subjacentes ao funcio- o problema enfrentado. No entanto, para
namento psicológico quanto o desenvolvi- que isso aconteça, faz-se necessário que a
mento do indivíduo e da espécie humana criança tenha contato com outras pessoas
ao longo de um processo sócio-histórico, adultas que lhe forneceriam experiências
acredita que a criança por si só não seria para a criação de competências e aptidões
capaz de formular uma estrutura de conhe- e favoreceriam o desenvolvimento das fun-
cimentos a partir de uma base própria. ções psicológicas superiores, classificadas
Para exemplificar tal questão, o teó- em consciência, intenção, planejamento,
rico desenvolveu o conceito de zona de de- entre outras.
senvolvimento proximal (ZDP), entendido Nessa ótica, pode-se entender que o
por ele como: aprendizado está relacionado com o desen-
volvimento, embora haja um processo de
[…] a distância entre o nível de desenvolvi-
maturação que depende do organismo para
mento real, que se costuma determinar atra-
vés da solução independente de problemas, se desenvolver; é o aprendizado que possi-
e o nível de desenvolvimento potencial, de-
bilita o despertar de processos internos de
terminado através da solução de problemas
sob a orientação de um adulto ou em cola- desenvolvimento. Ou seja, com base nes-
boração com companheiros capazes (VYGOT-
sa perspectiva, acredita-se que a aprendi-
SKY, 2001, p. 97).
zagem da criança não ocorre apenas pela
experiência individual, mas pela interação
Dessa maneira, a zona de desenvol-
social construída pela criança no âmbito
vimento real estaria relacionada às ativi-
familiar e social, levando em consideração
dades que a própria criança consegue de-
a formação sócio-histórica do sujeito e as
senvolver sem a mediação de uma pessoa
relações construídas nesse contexto.
mais experiente, ou seja, são as ações cons-
Desse modo, a aprendizagem se dá
truídas pela criança sem a colaboração de
através de uma relação sujeito-objeto, na
um adulto. Enquanto o desenvolvimento
qual o sujeito, além de ser biológico, é
potencial é relacionado às atividades para
um sujeito psicológico. Dessa maneira, a
cuja realização a criança necessita da me-
diação de um adulto.

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evolução das funções egoicas102 (atenção, res certamente surgirão na escola (primeiro
memória, pensamento, juízo, percepção, universo mais amplo que se segue às re-
linguagem, motricidade, afetividade) de- lações familiares) sob a forma de um pro-
pendem da relação familiar estabelecida. blema de adaptação e ou aprendizagem na
Nessa perspectiva, Bossa (1998) res- vida escolar.
salta que mais do que responsáveis pela Logo, na tentativa de se evitar tais
qualidade de vida, os pais são construto- consequências surgidas no âmbito social,
res do aparelho psíquico dos seus filhos. econômico, afetivo, que atualmente en-
Conforme o teórico, as primeiras influ- volve as famílias, faz-se necessário um re-
ências psíquicas nascem no seio familiar, pensar das relações familiares. Esse pode
por meio da relação pai-filho, mãe-filho e ser o primeiro passo para proporcionar um
irmão-irmão, despertando sentimentos que ambiente familiar que satisfaça as neces-
norteiam a relação familiar. sidades básicas de afeto, apego, desapego,
Dessa forma, é possível inferir que, segurança, disciplina, aprendizagem e co-
para um processo de aprendizagem sadio, é municação, pois é nele que se estrutura a
preciso que o contexto familiar proporcio- mais importante forma de aprendizagem: a
ne condições para isso, visto que os acon- de estabelecer vínculos, isto é, a capacida-
tecimentos no interior da família podem de de aprender a se relacionar.
afetar o desenvolvimento cognitivo103 da Pensando nisso, vale ressaltar que a
criança, seja positiva seja negativamente. possibilidade de se desenvolver esses rela-
De acordo com o aporte teórico, no- cionamentos dependerá da forma com que
tam-se diferenças na aprendizagem a partir os pais se relacionam com os filhos, sendo
do comportamento da criança que, quando que há pais com características autoritárias,
é investigado, pode revelar novas realida- permissivas e democráticas. Esses estere-
des que, nas palavras de Celidonio (1998) ótipos podem formar uma criança tímida,
resumem-se desta forma: as tensões acu- agressiva, entre outros comportamentos.
muladas na dinâmica das relações familia- Quanto a isso, Mussen (1970, p. 1970) as-
102
severa:
Para Zimerman(1999), asfunçõesegoicasrepresentam
todo movimento que é produzido dentro do campo da
consciência egoica e que são responsáveis por atitudes [...] em termos de aprendizagem e generali-
que se interligam com os aspectos da personalidade zação social: os lares tolerantes e democrá-
humana. (ZIMERMAN, David E. Fundamentos ticos encorajam e recompensam a curiosi-
psicanalíticos: teoria, técnica e clínica – uma abordagem dade, a exploração e a experimentação, as
didática. Porto Alegre: Artmed, 1999, p.478.)
103
tentativas para lidar com novos problemas
Zorzi (1995) conceitua conhecimento cognitivo como
e a expressão de idéias e sentimentos. Ob-
um processo de formação da própria inteligência; e
esta, como o conhecimento de uma capacidade geral viamente, uma vez aprendidas e fortalecidas
de estabelecer relações, seja entre objetos, eventos ou em família, essas atividades se generalizam
situações. na escola. Por outro lado, a criança que foi

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severamente controlada ou excessivamente Desse modo, levando-se em conside-


protegida por seus pais, não aprende esses
tipos de reação, visto que foi desencorajada ração que a aprendizagem se desenvolve por
de atuar independentemente, de explorar e meio da interação social (Vygotsky, 1996),
experimentar por conta própria. Adquire, en-
tão, reações tímidas, desgraciosas, apreensi- acredita-se que as relações marcadas na con-
vas e de modo geral, conformistas, as quais vivência familiar influenciam na aprendiza-
também se generalizam na escola.
gem escolar da criança, visto que a família é
primeira instituição que oferece um aprendi-
Dessa maneira, cabe à família supe-
zado moral para a criança se inserir nas prá-
rar as dificuldades, construindo uma iden-
ticas sociais, como agente de direito e dever.
tidade própria e coletiva; para isso, é fun-
damental que os membros sejam responsá-
CONSIDERAÇÕES FINAIS
veis pelo que produzem, podendo reforçar
O presente artigo teve como objetivo
ou contrariar a influência que causam na
investigar as influências das relações socio-
vida das crianças.
familiares no processo de aprendizagem,
através da conceituação de família, infância
RESULTADOS E DISCUSSÕES
e aprendizagem. Nesse percurso, desenvol-
Ao final dessa reflexão, percebe-se
veu-se uma análise que investigou o con-
que a família tem um papel fundamental
ceito de família e de criança e a evolução
na formação moral e escolar da criança, já
desses termos, com o objetivo de compreen-
que, em cada época, o conceito de família
der como se dá essa mediação da família no
evolui e traz consigo implicações históri-
processo de aprendizagem da criança.
co-sociais que são transferidas de geração
Em meio a esse contexto, apontou-se
para geração.
no estudo que a aprendizagem da criança
Por outro lado, o estudo apontou
acontece a partir da interação social com o
também que a fase psicossocial da criança
meio, que permite à criança se apropriar de
sofreu diversos entendimentos no decorrer
conhecimentos construídos historicamente
da história. Primeiramente, a criança era
pela humanidade, transmitidos pela família
compreendida como um pequeno adulto,
e exteriorizados na aprendizagem escolar,
capaz de desenvolver diversas atividades
demonstrando, assim, a importância da fa-
vinculadas ao mundo do trabalho. Logo
mília com a primeira instituição de oferece
após, a criança começa a ser reconhecida
uma instrução para a criança.
como um ser em formação, que necessita
Por outro lado, com esta análise defen-
de cuidados e atenção dos entes familiares,
de-se que a criança não constrói sua apren-
despertando o interesse dos pais para a ins-
dizagem pela experiência individual. Faz-se
trução escolar dos filhos.
necessário que a criança esteja inserida no

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meio social para aprender com os outros co- um tema que merece cada vez mais atenção
nhecimentos que venham contribuir para a nas políticas públicas de educação, em es-
criação de competências e aptidões. pecial o impacto dessas questões na prática
Diante disso, o estudo adverte que, se educativa, uma vez que são perceptíveis no
a família não perceber a importância dela ambiente escolar as dificuldades que os pro-
no processo de aprendizagem dos filhos, fessores e comunidade escolar enfrentam
esse fato pode acarretar várias consequên- para estabelecer um diálogo possível visando
cias prejudiciais, advindos da ineficiência à formação plena dos pequenos aprendizes.
da educação familiar, pois os pais de forma Por outro lado, o estudo aponta tam-
deliberada ou inconsciente podem permitir bém para a necessidade de investimento
ou obstruir o processo de construção indi- em novas pesquisas sobre a influência da
vidual e coletiva dos filhos. família na aprendizagem escolar da crian-
Nesse sentido, por meio da inves- ça, considerando principalmente questões
tigação, foi perceptível a preocupação da relacionadas a gênero, etnia e raça, uma
maioria dos teóricos sobre a importância vez que nas leituras realizadas percebem-
da família na formação humana da crian- se poucas análises sobre essas temáticas,
ça, principalmente na fase escolar, que foi demonstrando ao leitor possíveis lacunas
o objetivo deste trabalho. Ou seja, a famí- para um melhor atendimento do tema na
lia deve compreender a criança como um sociedade contemporânea. Enfim, espera-
ser em formação que busca por meio das se que este estudo venha favorecer a for-
experiências interpessoais construir o seu mação de novas ideias sobre a família e o
aprendizado (Vygotsky, 1996). desenvolvimento da aprendizagem, permi-
Desse modo, com base nos dados tindo ao leitor um diálogo entre os autores
apresentados, conclui-se que a família pode e as ideias defendidas no texto.
influenciar na aprendizagem escolar da
criança na medida em que oferece à criança Recebido em: Março de 2013
as primeiras instruções sobre as regras mo- Aceito em: Novembro de 2013
rais e sociais, já que se deve considerar que
a criança busca na família um melhor enten-
dimento sobre as coisas do mundo, e cabe
à família oferecer à criança espaços que REFERÊNCIAS
contribuam para a formação, respeitando os ALOSP, Pippa. Transtornos emocionais.
limites e possibilidades dessa fase da vida. São Paulo: Summus, 1999.
Portanto, acredita-se que a realização ÀRIES, P. História social da criança e da
deste trabalho contribui com a discussão de família. Rio de Janeiro: guanabara, 1981.

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