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1. INTRODUÇÃO
Várias foram as obras que passaram pela minha vida deixando rastro de
influência permanente. Como determinante para esse projeto, mencionarei o jogo
The King of Fighters da empresa SNK. Impressionou-me no primeiro momento a
animação e a beleza do conjunto. Porém, com o aprofundamento que se seguiu,
comecei a entender o quanto essa beleza ultrapassava a mera aparência ou
virtuosismo técnico. Havia significado no seu modo de fazer. Além do que, por ser
um jogo, eu dispunha de algo mais que o movimento: Era-me permitido interagir com
a imagem, jogar com ela.
significados que se possa atribuir a obra, além de uma reflexão acerca do tema
proposto, o momento de epifania.
Entende-se por Pixel Arte como uma forma de produzir imagens digitais
diretamente a partir dos pixels. A empresa SNK Playmore enfatiza o aspecto
artesanal, referindo-se a ela como “uma imagem construída a partir de milhares de
pequenos pontos (pixels), cada uma pintado à mão por um artista. Imagine um
artista trabalhando na construção de um mosaico de azulejos, criando
deslumbrantes imagens a partir de intrincados desenhos, e assim terá certa idéia de
como é este trabalho” 1. O pixel (picture element) pode ser definido como um
elemento da imagem ou a menor unidade individual da imagem da tela do
computador (CONCI, 2008, Pág. 69). Uma imagem pode ser considerada uma
distribuição de energia luminosa em uma posição espacial (CONCI, 2008, Pág. 52).
fig.2 - Mario em tamanho original, e com um aumento de 5 vezes para ajudar na visualização.
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“De quadradinho em quadradinho: conheça a Pixel Art” (Fábio Bracht, site Arena Turbo)
http://arenaturbo.ig.com.br/materias/480501-481000/480733/480733_1.html
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Três matizes (quase de cores primárias) e um espaço menor que 1cm² foi
o suficiente para a criação desse personagem de expressiva popularidade. Eis um
bom exemplo para se perceber o quanto tal técnica exige um grau de decisões
acertadas. Cada uma delas é justificada por problemas de ordem artística
encontrados no meio a ser trabalhado. Quadrados e cores puras para gerar figuras
reconhecíveis, características que dentro da História da Arte nos remete ao
Cubismo, onde a representação do mundo não tinha nenhum compromisso com a
aparência real das coisas, tal quais outros movimentos modernistas. Inclusive parte
do movimento se dedicava a estudar o quanto a imagem se mantinha reconhecível
com o mínimo de elementos possível. Como diz o chavão artístico, “menos é mais”.
Seria essa então uma das principais diferenças da pixel arte pra outras
modalidades de imagem digitalizada: Uma imagem em pixel arte não é
necessariamente uma adaptação, mas uma configuração própria, reproduzida
plenamente na resolução em que foi concebida. Essa minúscula imagem do
personagem Mário, por exemplo, não teria sido alcançada caso tivesse partido de
uma referência real e tentado adaptar àquela resolução. Ele precisou nascer dos
próprios pixels e sua configuração é a adaptação plena àquela resolução.
Fig 3. Três versões em pixel arte do personagem Mário, em duas diferentes abordagens de “evolução”
O primeiro traço (fig. 8A) equivale a uma forma feita diretamente a partir
dos Pixels. Podemos ver as bordas formadas por pequenos quadrados encostados
constituindo uma figura uniformemente negra sobre um fundo uniformemente
branco. A imagem de apenas duas cores puras, facilmente verificáveis, que não
interagem em tons intermediários.
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O segundo traço (fig. 8B) equivale a uma linha feita com a ferramenta
Brush do Photoshop, que encontra versões similares em programas atuais. Também
se trata de uma imagem constituída de pixels, chamadas também de imagens raster.
Porém pelo fato de terem sido criados automaticamente tons de cinza entre o preto
do traço e o fundo branco, tal construção já não seria classificada como pixel arte.
Há vários tons nesse traço que não foram introduzidos de forma consciente pelo
artista. Uma suavização automática. Há variantes do Brush que simulam pinceladas
analógicas de diferentes tintas. Uma linguagem própria que tem seu valor, mas não
está no âmbito de estudo da pixel arte e não pertence a seu leque de possibilidades.
A terceira linha (fig. 8C) representa uma linha feita em Vetor. Uma imagem
vetorial é gerada a partir de descrições geométricas de formas, diferente das
imagens chamadas mapa de bits (imagem raster), isto é, utilizam vetores
matemáticos para sua descrição. Por serem baseados em vetores, esses gráficos
geralmente são mais leves (ocupam menos espaço em mídias de armazenamento)
e não perdem qualidade ao serem ampliados, já que as funções matemáticas
adequam-se facilmente à escala. Essa é a principal característica que a difere das
imagens em pixel, muito presa a sua ecala original de concepção.
Porém, para o público de imagens digitais (que por vezes são um público
de jogos, que se depara com tais imagens por conseqüência), tais diferenciações
são abordadas por um ponto de vista evolucionista, estando a pixel arte entre as
formas mais primárias e o 3D sendo a última palavra em representação. Há uma
base tecnológica para tal concepção. De fato, foi necessário um desenvolvimento
significativo dos processadores e aumento da capacidade de armazenamento, para
hoje se chegar à representação virtual de ambientes reais em diversos ângulos,
giros de câmera e toda conquista na reprodução de imagens concebidas
digitalmente que presenciamos hoje. Porém, artisticamente falando, as antigas
formas de representação nada perdem de seu valor expressivo e de suas
potencialidades de expressão. Algo como comparar desenho a lápis com escultura
em mármore, linguagens que, convenhamos, são tão distintas que comparações
evolucionistas tornam-se sem sentido. As propriedades são outras. A linguagem da
escultura não é uma versão melhorada do desenho a lápis.
Fig 10 – Personagem Chun-li, nas versões Street Fighter III e Street Fighter IV.
tridimensional. Não pretendo entrar no mérito de qual é a melhor, pior, mais rica,
mais elaborada, afinal a maneira de conceber cada imagem difere por demais para
permitir paralelos. Não disponho de dados precisos quanto ao real autor da primeira
versão. Apenas sabe-se que na ocasião ele trabalhava para empresa Capcom.
Excelente animador 2D, ele desenvolveu um estilo próprio reconhecível com
características e trejeitos próprios que me fizeram reconhecer seu trabalho no meio
de outros animadores. De modo geral ele faz uso de poucos quadros e grandes
contrastes (saltos muito bruscos de um quadro para o outro). Na animação dessa
personagem em específico ele teve que usar mais quadros do que costuma devido o
conceito do jogo de ter animação super fluente. Ele contornou tal imposição exterior
mantendo as características de seu estilo (torna-se muito complicado explicar os
trejeitos próprios de sua animação no meio impresso estático). O importante é saber
que é possível ver o artista nas decisões que ele toma. É possível ver o processo
continuado de obras mais antigas suas e o amadurecimento de sua linguagem.
Artisticamente falando, sua Chun-li (personagem acima) alcançou um altíssimo nível
de compreensão do meio, personalidade e condensação de seu estilo. A dinâmica
bidimensional é digna de Cézanne. Entende-se aqui por dinâmica bidimensional
como a capacidade de reordenar os elementos sobre a superfície de modo a
valorizar a composição, mesmo que isso signifique distorcer e desobedecer a uma
possível projeção óptica. No geral isso ocorre de maneira explícita em muitos jogos
2D, entretanto por vezes tal fenômeno ocorre de modo tão sutil que não chama a
atenção imediata. Repare o rosto, como seus elementos são dispostos de modo
organizado para melhor visualidade no plano (basta comparar nas duas imagens a
posição dos olhos e da orelha, a franja e, mais notoriamente, o tecido que desce do
coque no cabelo que, a rigor, indicaria que seu penteado é assimétrico). Também a
ombreira esquerda que se projeta para frente, a curvatura do quadril, os sapatos, a
maneira como o tecido de trás se curva, envolvendo-a, tudo está elegantemente
disposto numa distorcida projeção para a superfície, feita de modo bastante lúcido e
enriquecedor para a linguagem.
Eis uma questão. A empresa que faz o jogo citado no último exemplo tem
nome e prestígio. E ela está investindo pesado em publicidade para vender sua nova
forma de produção como Arte 2D, por mais óbvio que seja o aspecto 3D dela. Como
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seus antigos produtos eram feitos num 2D de alta qualidade técnica (em baixa
resolução, que não incomodava ninguém até o momento em que o HD entrou em
evidência), os executivos da empresa previram o impacto que teria em mudar sua
tradicional franquia de 2D para 3D. Criar imagens 2D em alta resolução era mais
dispendioso e inviável que as tão impressionantes imagens em 3D. Também havia
uma pressão constante na indústria de jogos (o mercado maistream de jogos, não o
alternativo) para que seus produtos se parecessem cada vez mais com filmes,
incorporando uma estética de cinema (que inclui trilha orquestrada, certos giros de
câmera, diálogos interpretados como cenas cinematográficas, com atuações reais).
Tudo tornava o 3D mais viável, em detrimento aos fãs fieis das obras em
duas dimensões. Assim tal empresa optou por uma ousada estratégia de marketing
de fazer seus jogos em 3D e tentar de todas as formas convencerem de que é uma
continuidade a estética 2D, e um grande salto artístico. A ênfase artística fica por
conta de sua identidade visual completamente suja de tinta, como um quadro de
Pollock, emulando uma possível espontaneidade da pintura gestual.
O jogo teve êxito e foi super aclamado pela crítica e pelo público tendo o
sucesso comercial esperado. Porém não diminui o fato de que a pincelada da
pintura foi reduzida a um efeito visual falso e como foi pregado veementemente que
o 3D é a substituição ideal para o 2D. Assim sendo o trabalho mostrado
anteriormente (fig 10. primeira versão) corre o risco de cair no limbo do
esquecimento porque sua empresa não considera mais aquele tipo de produção
economicamente viável. Sua contribuição é anulada, caso ninguém se prontifique a
lembrá-la e reconhecer seu enriquecimento a visualidade 2D que ela proporciona.
Isso não importa ao mercado.
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[...] Como a cada “obra” o artista muda de meios – Hoje são baldes de plástico,
amanhã tijolos ou garrafas, depois de amanhã cordas ou pedaços de borracha – seu
trabalho se mantém ocasional e exterior ao material, sem, por isso, organizar-se em
linguagem. A obra, então, não resulta da elaboração e aprofundamento da
experiência, mas de sacações (“Tive uma boa idéia”) que visam de fato abrir uma
brecha na indiferença da mídia. (GULLAR, 1993, Pág. 26)
“Uma redescoberta dos jogos clássicos também vem ocorrendo nos últimos
anos, e com ela veio uma [recém chegada onda de apreciação] da pixel art
como [midia visual] - o poder unico dos pixels, e o distinto estilo gráfico que
nasceu das animações desenhadas a mão, quadro a quadro, sob limitações
pesadas de hardware. Uma pequena, mas crescente familia de
[títulos/publicações/jogos] tem deliberadamente escolhido 2D para a parte
gráfica hoje em dia, e cada vez mais designers notaram que a pixel art pode
ser tão detalhada e eficiente quanto gráficos 3D. Pixel Art tem outra vantagem
importante - com todo aspecto do movimento de um personagem sendo
desenhado estritamente a mão, o design visual resultante ganha uma
presença única e poderosa, e um [alcance de expressão] que os gráficos 3D
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não podem imitar." (About “Dot Art”, trechos do site da SNK Playmore)3
Todos na equipe de produção do KOF XII estavam certos quanto a uma coisa
[no inicio/desde o inicio]: qualquer [título/publicação/jogo] na série principal de
KOF teria de apresentar arte 2D [feita/desenhada] a mão.(...) Numa era na
qual o 3D domina o genero de Luta, a equipe queria um visual e [um
clima/uma sensação/uma idéia] que nenhum jogo 3D poderia oferecer - algo
que apenas eles seriam capazes de produzir (About “Dot Art”, trechos do site
da SNK Playmore)4
Tal posição ressoa em conjunto com a concepção do papel do artista e da
Arte tão bem elucidados por Ferreira Gullar em seu comentário, argumentando
contra a morte da Arte:
O Artista é um homem que descobriu que as coisas não são apenas o que se
vê, o que erradamente se vê. As coisas dizem mais do que demonstram na
sua anônima mudez. Essa descoberta pode também ser interpretada como
expressão de uma necessidade interior: O artista é um homem que quer
romper a sua individualidade, os limites dela, porque ele sabe que é mais do
que aparenta. Enfim, o particular – seja coisa, seja gente – é a solidão. Mas o
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artista sabe que ele é uma expressão da humanidade e que cada coisa é a
expressão do universo. O universo é uma infinidade de coisas, seres e atos, e
a vasta maioria dessas coisas, desses seres e desses atos, 'se perde'; como
se não tivesse sentido. O Artista quer mostrar que cada coisa está ligada a
todas as outras e que ele é parte desse todo. Não há fórmula para expressar
isso. Não há um código pronto e infalível. Todas as linguagens da cultura
contribuem para tornar possível esse enlace do particular com o universal.
Que existe naturalmente, mas está sempre oculto. Quando o milagre se dá,
algo se acende: um curto-circuito. (GULLAR, 1993, Pág. 95)
Fig.14 – Trecho do Clip Pagan Poetry da cantora islandesa Björk. Assistindo-o pude vivenciar o conceito de epifania.
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On the surface simplicity / But the darkest pit in me / It's pagan poetry / Pagan poetry
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Morsecoding signals /They pulsate and wake me up / from my hibernating
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sua maneira, através dos meios em que atua. A inquietude dessa compreensão nos
faz querer formar, criar e recriar através da materialidade a nosso dispor, aquilo que
compreendemos e não sabemos traduzir de outra forma. Partindo dessa premissa e
tendo-a como norte, iniciei essa pesquisa em artes e venho prosseguindo na
construção de meu trabalho, e na elaboração formal de sua mensagem.
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Em especial a série/jogo Urubutrix, em parceria com de Fernando Santos.
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Fig.15 – Estudos em Pixel arte do Personagem OnOff, para atuar num jogo de luta 2D
horizonte. Não há trajetória definida. Isso enfatiza a relação do personagem com ele
mesmo, não com conflitos externos. Cogitei o preto ao invés do branco, porém
aparentava muito um caminhar pela escuridão. O branco realmente trouxe as
conotações de neutralidade que sentia necessidade nessa obra. O ambiente não é
aliado ou inimigo, diferente de uma hostilidade ambiental gerada por um deserto.
Nas
Fig.17 – duas versões de um mesmo personagem, ambas em pixel arte – SNK Playmore
Já neste primeiro plano pude explorar os pixels de uma maneira até então
pouco trabalhada por mim. Pude abordar os pixels herdando uma mentalidade
adquirida em minhas aulas de pintura, ou seja, trabalhando com massas de cor em
gestos levemente espontâneos.
Fig.22 – Degradê tradicional, em escala de tons e degradê em dithering. No segundo caso existe apenas o tom de preto e o de
branco puros, sendo o acinzentado feito pela intercalação destes.
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Fig.25 – uso de dithering para suavizar os tons de cinza, criando a atmosfera embaçada e intimista da chuva.
Não estava tão certo quanto ao significado principal da chuva, mas senti a
necessidade de incluí-la, mesmo evitando enfatizar interferências externas. No
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animado em acetato (figura 27). Tem sido essa uma vertente comum a Pixel arte, por
ser mais acessível a um iniciante (que já domine o desenho analógico). Consiste em
tratar a tela em branco dos pixels como uma folha de papel, concebendo a imagem
como quem desenha a nanquim, partindo do contorno. Traçado o contorno define-se
a sombra e desta faz-se a divisão de luz e sombra a partir de cores chapadas. Ao
contrário do dithering, que tem caído em desuso, esta abordagem de Pixel arte
como desenho tem se tornado cada vez mais popular. Possivelmente, tal
popularização se deva fato de tal procedimento não exigir por parte de um ilustrador
ou animador um pensar diferente, o pensar em pixels. O Pensamento tradicional de
desenhista (traço, linha, cor preenchendo) cabe satisfatoriamente nessa proposta.
Fig.28 – Personagem Taokaka do Jogo BlazBlue, produzido pela ARC System Works. A certa distância pouco se percebe os
pixels em sua formação, lembrando um desenho animado tradicional em acetato.
Considerações Finais
A que ponto chegou todo esse processo? Possivelmente onde dão todos
os pontos de chegada: em novos pontos de partida. Epifania não é o fim da
caminhada, apenas a consciência do caminhar. Como aspecto mais relevante,
destaco as reflexões acerca do fazer artístico presente na pixel arte e o
questionamento de sua situação no contexto de mercado em que está inserida.
Também vejo como relevante a percepção de sua materialidade. Mesmo com todas
as comparações com mosaicos, pintura pontilhista, areia colorida, lego, é também
certo que a virtualidade dos pixels permite uma série de características que não são
próprias de outros meios materiais. Os pixels não acabam, possuem um controle
muito maior quanto a cor e posicionamento, não estão expostos a efeitos do tempo,
gravidade e outros elementos que afetam a conservação de obras presentes no
mundo físico. Assim os Pixels são ao mesmo tempo limitados em certo aspecto e
ilimitados por outro. Isso torna seu uso acessível, viável e econômico, além de se
poder atingir o poético grau da “simplicidade com complexidade”.
força e charme a partir da baixa resolução, e que ser capaz de enxergar os pixels
em uma imagem não implique que esta seja de má qualidade. Foram séculos para
que os pintores pudessem exibir suas pinceladas, não há porque um pixel artista
abrir mão dessa conquista.
Onofre Paiva
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REFERÊNCIAS
KANDINSKY, Wassily. Do Espiritual na Arte. Editora Martins Fontes, 1911, Pág. 35,
37 e 59;
<http://kofaniv.snkplaymore.co.jp/english/info/15th_anniv/2d_dot/art/index.php>
Acesso em 22 de Outubro de 2009.
Glossário
RASTER - Imagens raster (ou bitmap, que significa mapa de bits em inglês) são
imagens que contém a descrição de cada pixel, em oposição aos gráficos vectoriais.
Nisso está incluso a Pixel arte assim como qualquer fotografia, desenho
escaneado...etc.