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1. INTRODUÇÃO

Desenho desde muito cedo, tanto que não recordo do começo


propriamente dito, do ponto de partida. Foi a primeira linguagem formal que me
acolheu, porém o ato de desenhar seria essencialmente um passo em direção
àquela que me seria a Arte mais atraente: A animação. Como se meus desenhos
estáticos não se sustentassem, eu sentia a necessidade de acrescentá-los
movimento.

Várias foram as obras que passaram pela minha vida deixando rastro de
influência permanente. Como determinante para esse projeto, mencionarei o jogo
The King of Fighters da empresa SNK. Impressionou-me no primeiro momento a
animação e a beleza do conjunto. Porém, com o aprofundamento que se seguiu,
comecei a entender o quanto essa beleza ultrapassava a mera aparência ou
virtuosismo técnico. Havia significado no seu modo de fazer. Além do que, por ser
um jogo, eu dispunha de algo mais que o movimento: Era-me permitido interagir com
a imagem, jogar com ela.

Fig.01 – Primeira animação em pixel arte que tive acesso

Ainda estava por conhecer o elemento maior de minha paixão. Foi


quando compramos o primeiro computador da família, meados de 1997. Com
internet discada pesquisei informações sobre o jogo KOF. Deparo-me com uma
pequena animação de uma das personagens, tal qual ela aparece no jogo.
Interessou-me o fato dela, mesmo pequena, se apresentar com toda expressividade
que podia ser vista no jogo (fig.01). Naquele momento eu descobrira as imagens
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produzidas através de pixels, a menor partícula de imagem virtual. O átomo da


imagem digital. Era assim que KOF e tantos outros jogos eram feitos. Nessa nova
modalidade de pintura. Nesse artesanato tecnológico. Em Pixel Arte.

Com o computador, veio gratuitamente um conjunto de programas do


Corel, dentre os quais, um bastante interessante chamado Corel Move, ferramenta
de animação bem simples que mexia com pixels. A partir de então, eu dispunha de
um meio que me permitia fazer trabalhos semelhantes aos que via em KOF.
Demorei um bom tempo para dominar o programa (contrariando o avanço
tecnológico, uso-o até hoje). Mais do que domina-lo, levei anos para compreender
de maneira empírica o segredo dos pixels, sua linguagem própria, suas nuances.
Tudo aquilo que achava fascinante no jogo que amava. Foi meu hobby sério durante
doze anos.

É nessa linguagem artística que pretendo conduzir minha pesquisa em


arte. Contudo não pretendo apenas repetir o que já tenho desenvolvido até então.
Há no trabalho uma intenção de explorar as diversas possibilidades dos pixels,
dentre as quais muitas delas me foram influenciadas pelas aulas de pintura.
Desvinculando-a dos games, pretendo apropriar-me de sua expressividade para
formular uma poética através de um vídeo em animação, um curta ou vídeo-arte,
narrando sem palavras a trajetória de um individuo em sua interioridade, rumo a um
momento de epifania, numa metáfora que remete a possibilidade de vida, arte e
espiritualidade fazerem parte de um mesmo universo interior da condição humana.

Algumas questões são colocadas como ponto de partida: Quais


características definem a pixel arte como linguagem própria? Qual o limite que a
separa de outras formas de imagem digital, já que todas se constituem de matéria-
prima virtual e são visualizadas por pixels? A forma usada na realização do vídeo se
adequa ao conteúdo? E que relações se podem estabelecer entre a forma e
mensagem pretendida?

Na primeira parte me debruço sobre as principais características da pixel


arte e como tem sido seu uso alguns games específicos. No segundo momento
relaciono alguns aspectos formais do vídeo realizado com alguns possíveis
1

significados que se possa atribuir a obra, além de uma reflexão acerca do tema
proposto, o momento de epifania.

PARTE 2 - PIXEL ARTE – CONCEITO E PROBLEMAS FORMAIS

“Cada arte, ao se aprofundar, fecha-se em si mesma e separa-se. Mas


compara-se as outras artes, e a identidade de suas tendências profundas as
leva de volta a unicidade. Somos levados assim a constatar que cada arte
possui suas forças próprias. Nenhuma das forças de outra arte poderá
tomar seu lugar.”
(KANDINSKY, 1911, Pág. 59)

Entende-se por Pixel Arte como uma forma de produzir imagens digitais
diretamente a partir dos pixels. A empresa SNK Playmore enfatiza o aspecto
artesanal, referindo-se a ela como “uma imagem construída a partir de milhares de
pequenos pontos (pixels), cada uma pintado à mão por um artista. Imagine um
artista trabalhando na construção de um mosaico de azulejos, criando
deslumbrantes imagens a partir de intrincados desenhos, e assim terá certa idéia de
como é este trabalho” 1. O pixel (picture element) pode ser definido como um
elemento da imagem ou a menor unidade individual da imagem da tela do
computador (CONCI, 2008, Pág. 69). Uma imagem pode ser considerada uma
distribuição de energia luminosa em uma posição espacial (CONCI, 2008, Pág. 52).

Tal modalidade de construção gráfica não surgiu por uma necessidade


artística, sendo mais comumente relacionada com limitações técnicas. Os pixels
eram tudo o que desenvolvedores dispunham para produzir imagens virtuais
necessárias aos recém criados jogos eletrônicos. Tais imagens estavam presas a
limitações referentes à quantidade de cores e ao tamanho. A resolução baixa não
permitia a reprodução de imagens reais nem desenhos aos moldes tradicionais.
1
“Pixel art is a form of computer-generated graphics where a picture is built up from
thousands of tiny dots or “pixels”, each one hand-painted by as artist. (…)Imagine an artist
building a mosaic out of ceramic tiles, laboring away at his craft to create dazzling, inticate
designs, and you have the right idea.”
(http://kofaniv.snkplaymore.co.jp/english/info/15th_anniv/2d_dot/art/index.php)
11

“Quanto maior a resolução, mais detalhes podem ser armazenados e,


consequentemente, maior será o espaço gasto em armazenamento” (CONCI, 2008,
Pág. 54).

Como resposta as limitações, artistas contornaram tais dificuldades com


um interessante grau de compreensão e criatividade, explorando de diversas formas
os poucos elementos a disposição. É justamente dessa exploração de possibilidades
criativas, digna de movimentos modernistas, que surge meu principal fascínio.

fig.2 - Mario em tamanho original, e com um aumento de 5 vezes para ajudar na visualização.

Para compreender melhor como se processaram tais manifestações


artísticas, tomarei como exemplo o personagem Mário (fig. 2) da Nintendo,
protagonista de vários jogos da empresa. A imagem o mostra em seu jogo de
estréia, o arcade Donkey Kong, de 1981. Seus detalhes surgiram para contornar as
limitações e dar-lhe a personalidade pretendida por seu criador, Shigeru Miyamoto.
O bigode foi incluído pela dificuldade de delimitar uma boca, e para ressaltar seu
nariz. Pela impossibilidade de se trabalhar com um número suficiente de pixels para
animar uma cabeleira, optou-se por um boné como solução. O icônico macacão
vermelho e azul foi a medida adotada para ressaltar os braços e pernas do
personagem através de seus poucos tons2.

2
“De quadradinho em quadradinho: conheça a Pixel Art” (Fábio Bracht, site Arena Turbo)

http://arenaturbo.ig.com.br/materias/480501-481000/480733/480733_1.html
1

Perceba que a construção desse personagem, simultânea a construção


de sua imagem, girou em torno de dois fatores principais que são a limitação na
quantidade de pontos e de tons. Veremos que a Pixel Arte acaba se desenvolvendo
em torno dessas duas variáveis que serão mencionadas no decorrer do trabalho.
Ancri explicita tal situação:

Existem dois conceitos importantes relacionados à imagem


digital: amostragem da imagem (sampling) e quantificação de
cada um de seus pixels (quantization). São propriedades
relativas ao processamento computacional de uma imagem,
sendo o primeiro referente ao número de pontos amostrados
de uma imagem digitalizada e o segundo referente a
quantidade de níveis de tons que pode ser atribuído a cada
ponto digitalizado. (CONCI, 2008, Pág. 53)

Três matizes (quase de cores primárias) e um espaço menor que 1cm² foi
o suficiente para a criação desse personagem de expressiva popularidade. Eis um
bom exemplo para se perceber o quanto tal técnica exige um grau de decisões
acertadas. Cada uma delas é justificada por problemas de ordem artística
encontrados no meio a ser trabalhado. Quadrados e cores puras para gerar figuras
reconhecíveis, características que dentro da História da Arte nos remete ao
Cubismo, onde a representação do mundo não tinha nenhum compromisso com a
aparência real das coisas, tal quais outros movimentos modernistas. Inclusive parte
do movimento se dedicava a estudar o quanto a imagem se mantinha reconhecível
com o mínimo de elementos possível. Como diz o chavão artístico, “menos é mais”.

Quando se pesquisa sobre pixels em relação à reprodução de imagens


digitais, geralmente estes estão atrelados à idéia de adaptação de imagens para o
meio digital, como tal enunciado demonstra:

O processamento de imagens considera a manipulação de


imagens depois de capturadas por dispositivos imageadores,
que podem ser câmeras digitais, Scanners, tomógrafos,
sensores infravermelhos, sensores de ultra-som, radares,
satélites etc. Esse processamento pode envolver o rearranjo
dos pontos ou pixels da imagem alterando os valores dos tons
dos pixels, por exemplo, de acordo com os tons dos pixels
vizinhos, ou deslocando sua intensidade para novas posições.
(CONCI, 2008, Pág. 4)
1

Abordadas de tal maneira as imagens em pixels seriam representações


de imagens retiradas de outra situação, seriam adaptações para o meio digital, já
que toda imagem reproduzida no meio digital só é possível pelos pixels. A maioria do
material referente à resolução trata dessa adaptação da imagem continua a valores
quantificáveis. Quantização é o processo de atribuir valores inteiros para um sinal
cuja amplitude varia entre infinitos valores. “As imagens reais possuem um número
ilimitado de cores ou tons. No processamento de imagens computacional, é
necessário limitar os níveis de cores ou tons possíveis de serem atribuídos a cada
pixel da imagem”. (CONCI, 2008, Pág. 53).

Seria essa então uma das principais diferenças da pixel arte pra outras
modalidades de imagem digitalizada: Uma imagem em pixel arte não é
necessariamente uma adaptação, mas uma configuração própria, reproduzida
plenamente na resolução em que foi concebida. Essa minúscula imagem do
personagem Mário, por exemplo, não teria sido alcançada caso tivesse partido de
uma referência real e tentado adaptar àquela resolução. Ele precisou nascer dos
próprios pixels e sua configuração é a adaptação plena àquela resolução.

A figura 3 apresenta três versões em pixel arte do Personagem Mário


(todas versões oficiais da Nintendo). Propositalmente as dispus em ordens
cronológica e inversa.

Fig 3. Três versões em pixel arte do personagem Mário, em duas diferentes abordagens de “evolução”

Na primeira fila tudo cresce quantitativamente, tanto a quantidade de


pixels de tons. Tal ordem seria facilmente aceita como ordem evolutiva em todos os
1

aspectos. Entretanto ao inverter a ordem da escala poderíamos simular a


mentalidade de algum designer contemporâneo buscando a simplificação da forma
aos seus elementos essenciais, ou mesmo um estudo de Picasso quanto as
possibilidade de representação a partir de formas geométricas. Nesse caso o
tamanho não corresponderia a uma evolução, também não a um retrocesso. Cabe
melhor a idéia de deslocamento, pois artisticamente não se poderia atribuir uma
melhoria à imagem maior. Não haveria uma hierarquia. Apenas pensando
tecnologicamente o Mário maior seria uma evolução. Pensando artisticamente, seria
um deslocamento, uma outra possibilidade que não exclui a anterior. E do ponto de
vista minimalista o primeiro Mário, menorzinho, seria o mais evoluído, pois foi capaz
de condensar ao máximo seus elementos ao essencial. O fato é que cada um dos
três mários corresponde a uma configuração diferente de pixels que se realiza tal
qual estão configuradas, mudar a resolução é mudar essa configuração, o que
geraria outra imagem. Assim a escolha de tons e dimensão em pixel arte trata-se de
uma escolha significativa que conduz totalmente o rumo das possibilidades e o
resultado final.

A questão do tamanho como característica de estilo também ocorre em


figuras de maior proporção onde os pixels estão presentes, porém não tão
evidentes. Vejamos outro caso:

Fig.4 – Três versões diferentes dos mesmos personagens

A figura 4 apresenta dois personagens da empresa SNK, em três jogos


diferentes (Ryo e Robert nos jogos Art of Fighting 2, Art of Fighting 3 e The King of
Fighters 98, respectivamente), por ordem cronológica de lançamento. Os três jogos
são para a mesma plataforma (MVS - Neo Geo) e suas imagens são feitas para se
adaptar ao mesmo tamanho de tela (resolução de 304 X 224).
1

Repare que a evolução cronológica dos personagens não obedeceu a um


critério quantitativo no sentido de apresentar mais tons e maior quantidade de pixels
para ser considerada evoluída. Percebemos que tudo na última (fig. 4C) está em
menor quantidade do que na primeira (fig. 4A). O interessante é que, ao contrário da
imagem do Mário, muitos reconheceriam e sentiriam a imagem última como um
passo evolutivo em relação à primeira. Ela realmente parece mais “atual” para os
olhos do jogador, enquanto com Mário a idéia do menor ser o mais evoluído não
seria facilmente aceitável. São algumas sutilezas na configuração que fazem a
última versão se mostrar mais amadurecida. O meio impresso dessas figuras pode
não favorecer a visualização, mas a mudança trata-se de uma melhor compreensão
da forma ao representar os detalhes como os rasgos da calça, os vincos, a anatomia
e o cabelo com menos elementos, porém mais precisos.

Cada tamanho exige uma mentalidade diferente da parte do criador. Em


exemplos muito pequenos como o do Mário, é quase impossível alterar a escala em
alguns pixels a mais (como faze-lo dois pixels mais alto) sem que para isso se altere
drasticamente a estrutura da imagem, e cada ponto seja repensado e refeito, como
se cada um deles estivesse na posição necessária para aquela configuração. Não é
o mesmo tipo de pensamento formal que teria um pintor ou um desenhista
analógico. Também não seria algo tão necessariamente preso ou calculado como o
bordado ou mosaico. Essa precisão, dotada de certa improvisação é um dos
aspectos que mais define a pixel arte.
1

Fig. 5 – Leona - Mesma construção em diferentes resoluções

Demonstrando isso, usarei como exemplo esse sprite da personagem


Leona, do já mencionado KOF. Na figura 5A, ela é vista no tamanho real de sua
concepção. Na fig. 5C, uma imagem equivalente, também em tamanho real e ambas
em Pixel arte. A imagem do meio é uma versão aumentada da primeira, pra melhor
comparação com a última.

Percebam a nítida diferença da construção da face. Na versão menor


existem algumas “limitações”, que para alguns é o interessante de produzir um
trabalho artístico: Tornar as limitações parte do ponto de unicidade do trabalho. A
direção do olhar não é tão fácil de fazer em pequena escala o que fez com que a
personagem não olhasse na mesma direção mesmo sendo equivalentes. Os lábios
inexistem na versão menor, porém esse elemento acrescenta algo de misterioso a
sua expressão. Tal qual o sfumato em Monalisa, a não-definição de sua expressão a
torna mais ambígua, menos precisa, mais “em aberto”. Assim é a própria
personagem. A ausência dos lábios ressalta a ausência se seu sorriso e sua eterna
seriedade expressa em seus olhos pequenos. O nariz é um único pixel
estrategicamente posicionado como um ponto de luz, ressaltando a sombra do resto
da face que está por baixo.
1

Tais aspectos provavelmente foram considerados importantes pelos seus


criadores como elementos de caracterização da personagem. A prova disso está na
mais nova versão do jogo que possui uma resolução bem maior, permitindo assim
um grau maior de detalhes (Fig. 6). Mesmo assim na maneira de conceber seu rosto
as características se mantiveram, se antes por imposição do meio, agora por opção
consciente.

Fig. 6 – Leona versão clássica e sua versão mais atual

Apesar do tamanho aparente das figuras serem próximos, a versão A da


personagem tem metade da resolução da segunda (foi necessário duplica-la para
que se equivalessem). Isso é perceptível pela forma como os pixels parecem
maiores nela, na verdade o dobro da segunda versão. Imagens com Baixas
resoluções tendem a produzir imagens granuladas pelo fato dos pixels ficarem
aparentes na imagem (CONCI, 2008, Pág. 54). No detalhe do rosto da primeira
simplesmente não caberia sequer um pixel a mais numa tentativa de insinuar uma
boca. Na segunda isso seria possível, entretanto não ocorreu.
1

Fig.7 – A Riqueza estética da Pixel Arte na personagem Leona da série KOF

A escolha consciente de não representar a Boca da personagem me


remonta a outro aspecto das imagens digitalizadas:

Existem duas subdivisões possíveis relacionadas à qualidade


da imagem: Fidelidade e inteligibilidade. No primeiro caso
preocupa-se em aproximar a imagem processada da imagem
original ou de um padrão estipulado que a represente melhor.
No segundo caso, preocupa-se com a informação que se pode
extrair da imagem, seja pelo olho humano, seja por algum
processamento automático. (CONCI, 2008, Pág. 51)

O conceito de fidelidade apenas seria cabível caso a representação da


personagem partisse de um dado real, como uma fotografia ou uma imagem
escaneada. Como a imagem em pixels é a própria imagem finalizada, essas
questões não se adequam ao que se chamaria critério de qualidade. A ausência da
boca na representação da face poderia ser considerada falta de inteligibilidade caso
existisse uma versão verdadeira dessa imagem com os lábios. Na ausência desse
referencial exterior a imagem em pixel arte apresenta-se completa, sendo a
1

ausência dos lábios parte integrante da imagem e característica original desta.

Essa apreciação da Pixel arte enquanto uma configuração de pontos


específica é mais perceptível em baixas resoluções. Assim, artisticamente, as baixas
resoluções podem gerar efeitos estéticos próprios que se perderiam em versões
mais definidas. O que se extrai como escolha artística pode fazer parte da riqueza
da obra. Representando essa concepção, recorro novamente aos sprites de Leona
(fig. 7). Repare a economia com que seu rosto é traçado, com pixels certeiros. O
olhar perdido (inexistente) na primeira imagem e os demais rostos em composições
bem simples. Tão delicadas que um leve aumento ou diminuição das proporções
alteraria tal equilíbrio. É uma imagem completa em si. Mudando-a, a construção
torna-se outra, portanto a obra é outra. A versão mais atual da personagem em
maior resolução (fig. 6B) em nada desvalida a riqueza da antiga. Acrescenta outra
proposta, mas artisticamente, não é uma substituição e sim uma continuidade que,
por pertencer à mesma linguagem, nascerem do mesmo elemento, podem ser vistas
em unidade no conjunto da obra.

As linguagens artísticas em geral percorrem um meio material específico,


seja tinta, argila ou os elementos constituintes de cada arte, como os sons para a
música, os movimentos para a dança, as palavras para a literatura, etc. A apreciação
da obra se intensifica quando se compreende as especificidades do material em uso,
atentando para suas possibilidades, tal qual um vocabulário particular, e assim
absorvendo com maior plenitude as decisões que o artista toma durante o processo.

Fayga Ostrower bem menciona tal aspecto:

As formas de arte são formas de matéria. De determinada matéria. Suas


formas características se apresentam como o "vocabulário", por assim dizer,
de uma linguagem formal. O que aqui está sendo apontado é um fato
importante, a saber: todas as linguagens artísticas são de natureza não-
verbal. [...] O que leva a um outro ponto importante: em si, essas formas são
intraduzíveis. Ou seja, no nível do 'vocabulário' de uma determinada
linguagem, no nível de seus elementos básicos, qualquer tradução ou
paráfrase, ou comparação, torna-se impossível. [...] São formas derivadas
de matérias distintas, cada qual com suas características sensuais e
formais. (OSTROWER, 1977, Pág. 35)
2

O impasse me surge quando abordo a materialidade de algo imaterial


como os pixels, matéria digital. As imagens digitais possuem maiores nuances que
podem passar despercebidas para o olhar desatento. Essa variedade é bem
colocada por Ancri:

A imagem digital é uma representação de uma imagem em uma região


discreta, limitada através de um conjunto finito de valores inteiros que
representam cada um de seus pontos. As imagens digitais podem ser
unidimensionais, bidimensionais ou tridimensionais. Podem ser Binárias,
monocromáticas, multibandas ou coloridas, quanto ao conteúdo de cada um
de seus pontos. Também podem ser vetoriais ou matriciais quanto à forma
de descrição. (Anrcri, 2008, Pág. 3)

É preciso entender que mesmo fazendo parte fundamental da


visualização das imagens digitais, portanto constituinte intrínseco destas, o pixel não
é matéria-prima original de todas as linguagens digitais. Na Pixel arte é que os
pontos transcendem para além de seu papel expositivo e adaptativo de imagens,
para uma função mais estética. De elemento básico (natural do meio digital) passa a
ser elemento central da criação.

Repare nos traços a seguir:

Fig. 8 – Três diferentes tipos de traços concebidos digitalmente

O primeiro traço (fig. 8A) equivale a uma forma feita diretamente a partir
dos Pixels. Podemos ver as bordas formadas por pequenos quadrados encostados
constituindo uma figura uniformemente negra sobre um fundo uniformemente
branco. A imagem de apenas duas cores puras, facilmente verificáveis, que não
interagem em tons intermediários.
2

O segundo traço (fig. 8B) equivale a uma linha feita com a ferramenta
Brush do Photoshop, que encontra versões similares em programas atuais. Também
se trata de uma imagem constituída de pixels, chamadas também de imagens raster.
Porém pelo fato de terem sido criados automaticamente tons de cinza entre o preto
do traço e o fundo branco, tal construção já não seria classificada como pixel arte.
Há vários tons nesse traço que não foram introduzidos de forma consciente pelo
artista. Uma suavização automática. Há variantes do Brush que simulam pinceladas
analógicas de diferentes tintas. Uma linguagem própria que tem seu valor, mas não
está no âmbito de estudo da pixel arte e não pertence a seu leque de possibilidades.

A terceira linha (fig. 8C) representa uma linha feita em Vetor. Uma imagem
vetorial é gerada a partir de descrições geométricas de formas, diferente das
imagens chamadas mapa de bits (imagem raster), isto é, utilizam vetores
matemáticos para sua descrição. Por serem baseados em vetores, esses gráficos
geralmente são mais leves (ocupam menos espaço em mídias de armazenamento)
e não perdem qualidade ao serem ampliados, já que as funções matemáticas
adequam-se facilmente à escala. Essa é a principal característica que a difere das
imagens em pixel, muito presa a sua ecala original de concepção.

Fig 9. Um voxel. Se o Pixel é um quadrado, o voxel é o cubo, ocupando um espaço virtual.

Esses três exemplos, referem-se ainda a construção de imagens digitais


em 2D, ou seja, duas bidimensionais. Embora sejam elementos virtuais, possuem
características de materialidade própria, propriedades nítidas e específicas. Mas há
ainda outra possibilidade de construção virtual, inegavelmente rica e impressionante:
2

A modelagem tridimensional (imagens 3D). Esta acrescenta uma dimensão a mais


nas imagens 2D, que corresponde a profundidade, ao afastamento da superfície
para o fundo, o comprimento para além da altura e da largura. Seus elementos
constituintes não mais ocupam necessariamente o mesmo plano, sendo dotados de
volume, portanto possuindo uma aproximação maior com nossa realidade. Essa
ilusão com nosso mundo é, para muitos, o ponto de maior fascínio.

Não aprofundarei nas explicações a respeito da modelagem 3D, nem nas


demais. O Intuito é apenas mostrar outras possibilidades de construção digital, para
assim tornar mais compreensível as características da pixel arte. Cada uma dessas
é uma linguagem própria, com características próprias. Nenhuma substitui a outra,
porque nenhuma carrega plenamente as características da outra. E definitivamente,
as propriedades do 3D diferem bastante do 2D, muito mais ainda da pixel arte. E
outra maneira de se pensar as relações, outras maneiras de construir.

Porém, para o público de imagens digitais (que por vezes são um público
de jogos, que se depara com tais imagens por conseqüência), tais diferenciações
são abordadas por um ponto de vista evolucionista, estando a pixel arte entre as
formas mais primárias e o 3D sendo a última palavra em representação. Há uma
base tecnológica para tal concepção. De fato, foi necessário um desenvolvimento
significativo dos processadores e aumento da capacidade de armazenamento, para
hoje se chegar à representação virtual de ambientes reais em diversos ângulos,
giros de câmera e toda conquista na reprodução de imagens concebidas
digitalmente que presenciamos hoje. Porém, artisticamente falando, as antigas
formas de representação nada perdem de seu valor expressivo e de suas
potencialidades de expressão. Algo como comparar desenho a lápis com escultura
em mármore, linguagens que, convenhamos, são tão distintas que comparações
evolucionistas tornam-se sem sentido. As propriedades são outras. A linguagem da
escultura não é uma versão melhorada do desenho a lápis.

Os elementos virtuais, entretanto, estão presos no mesmo universo


intocável, visíveis apenas por monitores ou a partir de impressões. Durante o ato de
jogar (lembremos que pixel arte está intimanente ligada aos jogos eletrônicos),
qualquer elemento é visto por determinada tela, gerando por vezes a indistinção por
2

parte do público que dispõe de critérios muito imprecisos para avaliação e


frequentemente consideram que “tanto faz” a escolha de representação, importando
apenas poder ver o personagem.

Entretando existe uma diferenciação material-virtual. Por mais que não se


possa tocar nos trabalhos produzidos digitalmente, é possível senti-los pelos olhos,
sentir sua específica textura, assim sendo elas são reais enquanto imagens, reais ao
mundo da visão. A ênfase que está sendo dada a diferenciação entre o 2D e o 3D
pode parecer clara. Entretanto existem certas situações de mercado em que tais
conceitos são turvados e geram confusão.

Vejamos duas versões de uma mesma personagem:

Fig 10 – Personagem Chun-li, nas versões Street Fighter III e Street Fighter IV.

É perceptível que tais imagens foram concebidas em técnicas diferentes e


bem específicas. A primeira em Pixel arte e a segunda em modelagem
2

tridimensional. Não pretendo entrar no mérito de qual é a melhor, pior, mais rica,
mais elaborada, afinal a maneira de conceber cada imagem difere por demais para
permitir paralelos. Não disponho de dados precisos quanto ao real autor da primeira
versão. Apenas sabe-se que na ocasião ele trabalhava para empresa Capcom.
Excelente animador 2D, ele desenvolveu um estilo próprio reconhecível com
características e trejeitos próprios que me fizeram reconhecer seu trabalho no meio
de outros animadores. De modo geral ele faz uso de poucos quadros e grandes
contrastes (saltos muito bruscos de um quadro para o outro). Na animação dessa
personagem em específico ele teve que usar mais quadros do que costuma devido o
conceito do jogo de ter animação super fluente. Ele contornou tal imposição exterior
mantendo as características de seu estilo (torna-se muito complicado explicar os
trejeitos próprios de sua animação no meio impresso estático). O importante é saber
que é possível ver o artista nas decisões que ele toma. É possível ver o processo
continuado de obras mais antigas suas e o amadurecimento de sua linguagem.
Artisticamente falando, sua Chun-li (personagem acima) alcançou um altíssimo nível
de compreensão do meio, personalidade e condensação de seu estilo. A dinâmica
bidimensional é digna de Cézanne. Entende-se aqui por dinâmica bidimensional
como a capacidade de reordenar os elementos sobre a superfície de modo a
valorizar a composição, mesmo que isso signifique distorcer e desobedecer a uma
possível projeção óptica. No geral isso ocorre de maneira explícita em muitos jogos
2D, entretanto por vezes tal fenômeno ocorre de modo tão sutil que não chama a
atenção imediata. Repare o rosto, como seus elementos são dispostos de modo
organizado para melhor visualidade no plano (basta comparar nas duas imagens a
posição dos olhos e da orelha, a franja e, mais notoriamente, o tecido que desce do
coque no cabelo que, a rigor, indicaria que seu penteado é assimétrico). Também a
ombreira esquerda que se projeta para frente, a curvatura do quadril, os sapatos, a
maneira como o tecido de trás se curva, envolvendo-a, tudo está elegantemente
disposto numa distorcida projeção para a superfície, feita de modo bastante lúcido e
enriquecedor para a linguagem.

Perante tamanha riqueza fica difícil encarar a segunda versão como um


salto evolutivo, uma melhoria em relação à anterior. Não querendo desmerecê-la ou
diminuí-la, mas ela pertence a outra linguagem. Seus méritos são outros. Por mais
que eu definitivamente prefira a primeira versão, meu objetivo é justamente evitar
2

qualquer hierarquia entre linguagens diferentes. Ocorre ainda a tentação de cair em


questões vazias como “qual é a mais difícil, a mais bonita, a mais realista,
verossímil” critérios que de nada serviriam pra sustentar alguma base artística.

Ferreira Gullar se refere à linguagem artística da seguinte maneira:


[...] Sua Obra funda uma linguagem, decorre da transmutação do material em
espiritual, do vulgar em poético, enfim, resulta da criação de um universo
imaginário, próprio, que não se cria por milagre. Cria-se com o trabalho, o
domínio dos meios de expressão, a acumulação gradativa da experiência
vivida que se transforma em sabedoria técnica. (GULLAR, 1993, Pág. 24)

Posso retomar as falas de Fayga citadas anteriormente “No nível do


'vocabulário' de uma determinada linguagem, de seus elementos básicos, qualquer
tradução, ou comparação, torna-se impossível”(OSTROWER, 1977, Pág. 35). A versão
3D da imagem, na mais aceitável das hipóteses, é uma releitura da anterior. Se há
nela um valor tão rico quanto à anterior precisar-se-ia de mais tempo, experiência e
disposição em sua linguagem específica para poder avaliá-la com propriedade.

Infelizmente o mercado pouca (ou nenhuma) importância dá a questões


como linguagem particular e vocabulários específicos. Na verdade a grande corrida
é pela novidade e pela massificação. O Mercado tem pressa, e a pixel arte não
acompanha com fôlego essa corrida implacável. Ferreira Gullar reflete sobre o
assunto (Pensando em termos de pintura, não em pixel arte embora o contexto seja
de certa forma semelhante):

O produto industrial, fabricado em série, está potencialmente voltado ao


consumo popular maciço. O produto artesanal, e especialmente no caso da
pintura, contém uma tal quantidade de tempo de trabalho que, vendido a
baixo custo, tornaria impossível a manutenção material do artista. Destina-se,
por isso, às camadas de maior poder aquisitivo. Por outro lado, como o valor
da obra de arte não se mede apenas pelo trabalho que contém mas,
sobretudo, por sua qualidade estética e pelo prestígio do artista, todo o
mecanismo de divulgação, exibição, premiação e avaliação estética da obra
torna-se automaticamente instrumento de sua valorização comercial.”
(GULLAR, 1993, Pág. 93)

Eis uma questão. A empresa que faz o jogo citado no último exemplo tem
nome e prestígio. E ela está investindo pesado em publicidade para vender sua nova
forma de produção como Arte 2D, por mais óbvio que seja o aspecto 3D dela. Como
2

seus antigos produtos eram feitos num 2D de alta qualidade técnica (em baixa
resolução, que não incomodava ninguém até o momento em que o HD entrou em
evidência), os executivos da empresa previram o impacto que teria em mudar sua
tradicional franquia de 2D para 3D. Criar imagens 2D em alta resolução era mais
dispendioso e inviável que as tão impressionantes imagens em 3D. Também havia
uma pressão constante na indústria de jogos (o mercado maistream de jogos, não o
alternativo) para que seus produtos se parecessem cada vez mais com filmes,
incorporando uma estética de cinema (que inclui trilha orquestrada, certos giros de
câmera, diálogos interpretados como cenas cinematográficas, com atuações reais).

Fig.12 – logo de Street Fighter IV em seu conceito de pintura gestual

Tudo tornava o 3D mais viável, em detrimento aos fãs fieis das obras em
duas dimensões. Assim tal empresa optou por uma ousada estratégia de marketing
de fazer seus jogos em 3D e tentar de todas as formas convencerem de que é uma
continuidade a estética 2D, e um grande salto artístico. A ênfase artística fica por
conta de sua identidade visual completamente suja de tinta, como um quadro de
Pollock, emulando uma possível espontaneidade da pintura gestual.

O jogo teve êxito e foi super aclamado pela crítica e pelo público tendo o
sucesso comercial esperado. Porém não diminui o fato de que a pincelada da
pintura foi reduzida a um efeito visual falso e como foi pregado veementemente que
o 3D é a substituição ideal para o 2D. Assim sendo o trabalho mostrado
anteriormente (fig 10. primeira versão) corre o risco de cair no limbo do
esquecimento porque sua empresa não considera mais aquele tipo de produção
economicamente viável. Sua contribuição é anulada, caso ninguém se prontifique a
lembrá-la e reconhecer seu enriquecimento a visualidade 2D que ela proporciona.
Isso não importa ao mercado.
2

A questão da matéria enquanto elemento de construção de uma


linguagem é colocado por Ferreira Gullar em seu comentário a respeito da tendência
artística contemporânea:

[...] Como a cada “obra” o artista muda de meios – Hoje são baldes de plástico,
amanhã tijolos ou garrafas, depois de amanhã cordas ou pedaços de borracha – seu
trabalho se mantém ocasional e exterior ao material, sem, por isso, organizar-se em
linguagem. A obra, então, não resulta da elaboração e aprofundamento da
experiência, mas de sacações (“Tive uma boa idéia”) que visam de fato abrir uma
brecha na indiferença da mídia. (GULLAR, 1993, Pág. 26)

Não tenho a intenção de desmerecer o produto. A empresa continua a ter


excelentes artistas a lhes prestar serviços, mantendo o valor estético da devida obra.
Mas ele se esgota nessa riqueza estética. Não existe, além disso, um valor espiritual
agregado. O problema não está no uso do 3D, fonte riquíssima de possibilidades
artísticas. A mudança de linguagem, que por mais que seja uma quebra, não é um
crime. Mas a super ênfase de que seus aspectos artísticos superam a antiga forma
de fazer e o enaltecimento do 3D como representação 2D (até com efeitos de
pintura, também afetando os que trabalham analogicamente), e a afirmação de que
“tanto faz” a linguagem escolhida, simplesmente não são um acréscimo a
sensibilidade do público.

Nem todos compactuam com tais distorções de percepção induzidas. A


empresa SNK Playmore, por exemplo, fez questão de produzir sua nova versão de
KOF numa sofisticada técnica de pixel Arte, fruto de uma pesquisa iniciada desde
seus primeiros trabalhos. No seu site oficial ela ostenta o orgulho por sua tentativa
de mostrar o quão tal forma de Arte tão recente ainda está longe de se esgotar
expressivamente:

“Uma redescoberta dos jogos clássicos também vem ocorrendo nos últimos
anos, e com ela veio uma [recém chegada onda de apreciação] da pixel art
como [midia visual] - o poder unico dos pixels, e o distinto estilo gráfico que
nasceu das animações desenhadas a mão, quadro a quadro, sob limitações
pesadas de hardware. Uma pequena, mas crescente familia de
[títulos/publicações/jogos] tem deliberadamente escolhido 2D para a parte
gráfica hoje em dia, e cada vez mais designers notaram que a pixel art pode
ser tão detalhada e eficiente quanto gráficos 3D. Pixel Art tem outra vantagem
importante - com todo aspecto do movimento de um personagem sendo
desenhado estritamente a mão, o design visual resultante ganha uma
presença única e poderosa, e um [alcance de expressão] que os gráficos 3D
2

não podem imitar." (About “Dot Art”, trechos do site da SNK Playmore)3

Nota-se um claro choque de visões entre as abordagens das duas


empresas. As concepções da SNK podem soar românticas, mas revelam um
profundo envolvimento com a linguagem em que atuam, não aderindo a uma
abordagem descartável dos meios de produção. Tal visão torna-se evidente no
determinado trecho:

Todos na equipe de produção do KOF XII estavam certos quanto a uma coisa
[no inicio/desde o inicio]: qualquer [título/publicação/jogo] na série principal de
KOF teria de apresentar arte 2D [feita/desenhada] a mão.(...) Numa era na
qual o 3D domina o genero de Luta, a equipe queria um visual e [um
clima/uma sensação/uma idéia] que nenhum jogo 3D poderia oferecer - algo
que apenas eles seriam capazes de produzir (About “Dot Art”, trechos do site
da SNK Playmore)4
Tal posição ressoa em conjunto com a concepção do papel do artista e da
Arte tão bem elucidados por Ferreira Gullar em seu comentário, argumentando
contra a morte da Arte:

O artista não é um produtor de objetos, não compete com a indústria. O que


lhe interessa é a qualidade e não a quantidade. Cada obra de arte é um ser
diferenciado, que retira dessa diferença a sua razão de ser. Essa diferença é
a expressão do próprio trabalho do artista, da permanente elaboração de
elementos materiais e espirituais que constituem a substância da obra. Daí
por não ter cabimento, na arte, nem as normas preestabelecidas nem as
espertezas e macetes que tornariam mais fácil sua realização e mais “eficaz”
o resultado do trabalho. Por essa razão, a necessidade de mudança
acelerada, imposta por circunstâncias exteriores ao processo de criação,
contraria a natureza da arte e conduz a graves equívocos. Um deles é a
valorização indevida de artistas medíocres – que por isso mesmo aceitam
alegremente as imposições da moda – em detrimento dos verdadeiros
artistas, para os quais não tem sentido abrir mão de suas necessidades
profundas, de sua autoconstrução e da construção de seu universo estético. A
posição contrária – a rendição à arte descartável – significa trocar essa busca
interior pelo êxito exterior, para quem segue esse caminho, a obra não tem
importância senão pela repercussão na mídia. (GULLAR, 1993, Pág. 25)
3
" A rediscovery of classic games has also been occurring in recent years, and with it has come a newfound
appreciatio for pixel art as a visual medium -- the unique power of pixels, and the distinctive graphical style
birthed by artists hand-drawing animations frames under strict hardware limitations. A small but growing
family of titles is deliberately choosing 2D for its visual today, and more and more designers have realized
that pixel art can be just as detailed and effective as 3D graphics. Pixel art has another important advantage
-- with every aspect of a character's movements drawn strictly by hand, the resulting visual design gains a
powerful, unique presence and range of expression that 3D graphics cannot imitate. (About “Dot Art”,
trechos do site da SNK Playmore)
4
Everyone on the KOF XII staff were sure about one thing from the beginning: any title in the main KOF
series had to feature hand-drown 2D art. (…)In as era where 3D dominates the fighter genre, the team wanted
a look and fell that no 3D game could offer -- one that only they were capable of producing. (About “Dot
Art”, trechos do site da SNK Playmore)
2

Há de se reconhecer uma grande coerência nessa visão de mundo que


me permite usar de outros teóricos (também artistas) que chegam à conclusão
semelhante:
[...] Nessas épocas mudas e cegas, os homens atribuem um valor especial e
exclusivo aos êxitos exteriores. Apenas os bens materiais têm importância;
cada progresso técnico que só serve e só pode servir ao corpo é saudado
como uma vitória. As forças puramente espirituais passam despercebidas.
(KANDINSKY, 1911, Pág. 37)

Em nosso contexto cultural, a maturidade é negada como um valor. Com isso


riscam-se os níveis de conscientização espiritual que o homem pode atingir,
as verdadeiras dimensões humanas, pois o entusiasmo idealista do jovem é
uma coisa, será outra quando esse idealismo, na maturidade, se converter
em generosidade e amplitude de compreensão. (OSTROWER, 1977, Pág.
96)

É desse contexto que surgem as motivações para realização deste


trabalho. Do desejo de preservar e acrescentar algo a uma linguagem que ganhou
força num contexto de mercado e agora está sendo por este descartado. Uma busca
de sentido maior no gesto artístico, para além de efeitos visuais, mas penetrando em
sentidos existenciais.
2. PERCURSO METODOLÓGICO DO VÍDEO: ‘AQUI PONTO CHEGOU’

O seguinte trabalho consiste na produção de um vídeo experimental em


Pixel arte. Uma proposta de vídeo-arte explorando os pixels como elemento
formador da imagem. O tema tratado na obra pode ser entendido como uma jornada
interna do personagem rumo a um momento de epifania. Explicitei as características
da técnica adotada, cabendo-me a partir de então, justificar a escolha desta para a
construção do significado da obra.

O curta mostra o personagem (Alter-ego) num percurso rumo ao


desconhecido, acompanhado apenas de seu próprio pensamento materializado.
Pode-se considerar que tal representação recebe influência do surrealismo, pois a
primeira imagem que guiou a o restante da obra pareceu surgir de meu
subconsciente. Trata-se de um balão de pensamento (elemento típico da linguagem
dos quadrinhos) emergindo do personagem como borbulhas de afogamento.
3

Possivelmente uma metáfora para um pensamento sufocante, uma obsessão.

2.1. FERRAMENTAS REAIS E VIRTUAIS

Fig.13 – Material de trabalho: tablet, Ferramentas de Paint e programa Corel.

Como ferramentas de manipulação direta, farei uso de uma tablet (mesa


digitalizadora) da marca Wacon Graphire, e de um mouse óptico comum (o mouse
varia de acordo com o computador que uso). Como ferramentas virtuais, farei uso
dos recursos básicos do programa Paint Brush (base para maioria dos programas de
edição). O programa que mais farei uso é o Corel Move, antigo programa de
animação da Corel, hoje fora de circulação. Existe uma razão de ser no uso de tal
programa. Uma tecnologia ultrapassada há de ressaltar o aspecto artesanal do
trabalho, devido seus vários limites e restrições.

2.2. SOBRE O TEMA: TRAJETÓRIA RUMO A EPIFANIA

Falar sobre trajetória através de um trabalho artístico acaba de certa


forma, sendo uma ação metalingüística. Isso porque a própria elaboração dos meios
até se chegar ao resultado final pressupõe uma trajetória. Mas em que ponto a
trajetória termina? O que representaria o momento da Epifania? O Momento em que
todos os pontos se ligam num só? Essa metáfora inicial já remeteria ao processo da
construção em pixels, mas creio não se resumir a isso. Para falar sobre tal conceito
(que está mais para uma sensação do que conceito), recorrerei novamente as
palavras de Ferreira Gullar:

O Artista é um homem que descobriu que as coisas não são apenas o que se
vê, o que erradamente se vê. As coisas dizem mais do que demonstram na
sua anônima mudez. Essa descoberta pode também ser interpretada como
expressão de uma necessidade interior: O artista é um homem que quer
romper a sua individualidade, os limites dela, porque ele sabe que é mais do
que aparenta. Enfim, o particular – seja coisa, seja gente – é a solidão. Mas o
3

artista sabe que ele é uma expressão da humanidade e que cada coisa é a
expressão do universo. O universo é uma infinidade de coisas, seres e atos, e
a vasta maioria dessas coisas, desses seres e desses atos, 'se perde'; como
se não tivesse sentido. O Artista quer mostrar que cada coisa está ligada a
todas as outras e que ele é parte desse todo. Não há fórmula para expressar
isso. Não há um código pronto e infalível. Todas as linguagens da cultura
contribuem para tornar possível esse enlace do particular com o universal.
Que existe naturalmente, mas está sempre oculto. Quando o milagre se dá,
algo se acende: um curto-circuito. (GULLAR, 1993, Pág. 95)

Creio que a proposta do vídeo seja representar esse “curto-circuito” ao


qual me refiro pelo termo “epifania”. Uma idéia que cabe na metáfora de encaixar as
peças da vida como num quebra-cabeça, e assim ver a figura inteira. Adquirir e
compreender o que é integridade. Como o próprio Ferreira elucida, não há fórmula
pronta para tal, sendo uma possibilidade de todas as linguagens gerarem esse
curto-circuito em apreciadores e, claro, no próprio artista. Tanto que o estalo da
compreensão do todo me ocorreu através de um vídeo-clip. No caso o vídeo da

Fig.14 – Trecho do Clip Pagan Poetry da cantora islandesa Björk. Assistindo-o pude vivenciar o conceito de epifania.

música Pagan Poetry da artista Björk.

Em determinado trecho da música ela enuncia: “Na simplicidade da


superfície/ mas há uma cova mais escura em mim/ é poesia pagã/ poesia pagã.”5.
Percebo essa poesia como o sentido oculto das coisas ao qual se refere Gullar. Na
maneira como “as coisas, seres e atos” se manifestam como expressão do universo.
E de como isso se perde como se não tivesse sentido, por este não ser enxergado
por aqueles dessensibilizados pela rotina. Uma cova escura, não acessada. É pagão
em relação ao paradigma vigente do que merece ou não merece atenção. Não
apenas esse pequeno trecho, como todo o vídeo-clip, cada nota da música e o
conhecimento que tenho da obra da autora serviram-me como “sinais em código

5
On the surface simplicity / But the darkest pit in me / It's pagan poetry / Pagan poetry
3

Morse” para desencadear uma avalanche de compreensões que se seguiria. Fez-me


acordar de “minha hibernação6” para o momento da epifania.

Também Fayga compreendeu tal sensação, e também tenta expressa-la


através de palavras, no decorrer de sua extensa e significativa obra teórica:

[...] Compreendendo-o, cada um passaria a compreender algo sobre si


mesmo. A autenticidade que sentimos ao contemplar formas expressivas é
tão grande que extrapola para outras situações da vida, outras áreas de
conhecimento. Experiência real de vida, ela repercute imediatamente em tudo
o que já sabíamos, requalificando-o em novas dimensões e iluminando tudo
que venhamos a saber daí pra frente. Captamos alguma coisa que já existia
em nós, alguma coisa que, por breve que seja o instante, torna-se uma
revelação e nos transforma. Diante de obras de arte como as imagens de
Michelângelo, este 'alguma coisa nossa' recebe uma forma concreta,
identificando-se nas imagens, que podem de agora em diante ser assumidas
por nós como que nos pertencendo. Por isso nosso sentimento diante de
grandes obras de arte não é só de admiração pela maestria técnica. É
também um sentimento de profunda gratidão. O conhecimento que ganhamos
entreabre novas possibilidades, revelando-nos potencialidades de nós
mesmos.
Não há a menor necessidade de encontrarmos palavras para este tipo de
compreensão. Sabemos, temos inteira certeza disso, que algo se
acrescentou e se desdobrou em nós. Nós crescemos e enriquecemos.
(OSTROWER, 1977, Pág. 44)

O Assunto em si é difícil de ser explicitado em palavras. Por mais


eloqüentes que sejam Ferreira e Fayga, suas palavras só ganham um sentido maior
quando em conformidade com uma vivência real do leitor. Assim as obras de arte
vêm para completar as lacunas naturais deixadas pelas palavras, os limites da
linguagem verbal, que não abrange certas totalidades. Essas palavras fizeram-me
sentido após eu ter vivenciado certa experiência assistindo o mencionado clipe de
Björk, e este por sua vez ter evocado certas vivências e compreensões acumuladas
em outras obras (incluso a Pixel arte do Jogo KOF). Dentre outras coisas, o
momento epifânico evidenciou-me a particularidade de cada linguagem e sua
conseqüente impossibilidade de tradução. De fato, meu sentimento perante tais
obras é de profunda gratidão pelo quão determinante elas foram para minha
formação humanística.

Cada artista, inconscientemente, tenta captar o “estar de cada coisa” a

6
Morsecoding signals /They pulsate and wake me up / from my hibernating
3

sua maneira, através dos meios em que atua. A inquietude dessa compreensão nos
faz querer formar, criar e recriar através da materialidade a nosso dispor, aquilo que
compreendemos e não sabemos traduzir de outra forma. Partindo dessa premissa e
tendo-a como norte, iniciei essa pesquisa em artes e venho prosseguindo na
construção de meu trabalho, e na elaboração formal de sua mensagem.

2.3. SOBRE O PERSONAGEM: DUALISMOS DE ONOFF

“Por vezes, na ponta extrema, não há mais do que um homem


sozinho. Sua visão iguala sua infinita tristeza. E os que estão mais
perto dele não o compreendem. Em sua indignação, tratam-no de
impostor, de semilouco.” (KANDINSKY, 1911, Pág. 35)

No vídeo “Aqui, ponto chegou”, a experiência epifânica será vivenciada


pelo personagem On.Off ao final de sua jornada (que pode ser compreendida como
o começo de outra). OnOff é um trocadilho com o meu nome, Onofre, e é como
chamo um personagem que uso em alguns trabalhos7. Uma maneira confortável de
falar de mim mesmo na terceira pessoa. On e Off, vêem do inglês e significam ligado
e desligado, respectivamente. Tal conotação simboliza a dualidade do personagem,
em conflito com seus opostos que são partes de um mesmo todo. Por isso OnOff
usa amarelo e azul, cores opostas, clara e escura. Esses contrastes e oposições,
tão característicos do barroco, são os pontos chave no personagem OnOff,
relevantes aos possíveis conflitos internos vividos no vídeo, como os conflitos reais
vivenciados para se fazer o vídeo.

Quase todas as decisões do processo inicial partem de dualidades.


Desde a dimensão da tela (nem tão grande a ponto de perder a essência dos pixels,
nem tão pequeno a ponto de granular demais) à quantidade de tons (nem tanta a
ponto de ficar poluída, nem tão pouca a ponto de ficar uma cor muito chapada), tudo
segue um ponto entre dois extremos. Na animação, nem tantos quadros a ponto de
ressaltar virtuosismo técnico, nem tão pouco a ponto de aparentar desleixo. O Ritmo
também nem tão rápido a ponto de ficar incompreensível, nem tão lento a ponto de
ficar entediante. Há, escondido nisso, uma obsessão pelo equilíbrio.

7
Em especial a série/jogo Urubutrix, em parceria com de Fernando Santos.
3

Há mais um dualismo, que poderia ser interpretado como uma


contradição. O trabalho é na área de tecnologia, porém trata-se de uma técnica
considerada ultrapassada. Chocam-se o novo e o defasado. Há também um conflito
entre a busca por um ineditismo (tão imperativo em nosso contexto cultural),
conciliando-se com os valores e princípios espirituais tão recorrentes nos grandes
clássicos da História da Arte. Um lado de mim é profundamente conservador a esse
respeito.

Os conflitos duais também se traduzem na relação com o outro (tema não


abordado nesse vídeo, mas relevante para compreensão dicotômica do
personagem). Individualidade e coletividade diferenciam-se e relacionam-se. Ser
humilde sem ser submisso. Desejos materiais ou espirituais, trabalhar por amor a
arte ou por dinheiro. São todas questões vivenciadas no dia a dia que alimentam
conflitos por geralmente exigirem posturas definidas.

Tais dualismos talvez possam ser sintetizadas nas duas abordagens de


mundo tão bem explicitadas no livro “Desenhando com o lado direito do cérebro” de
Beth Edwards. As modalidades de pensamento do lado esquerdo e direito do
cérebro, comumente representados pela razão e emoção, respectivamente (embora
eu considere reducionista atribuir a essas duas palavras o caráter geral dessas duas
maneiras de percepção). No momento me encontro desenvolvendo essa pesquisa,
cuja obra em si é essencialmente não-verbal, mas está sendo tratada nesse relatório
através da linguagem escrita. E linguagem verbal (mais precisamente a oral) já foi
relevante em milhares de conflitos vivenciados por mim. Realmente tenho uma
reverência por aquilo que não se pode traduzir em palavras, mas que pode ser
compreendido por outras maneiras de perceber, menos lineares que a lógica.
Ausência de lógica para mim nunca significou ausência de sentido, e nesse ponto
tenho muitos conflitos com abordagens excessivamente racionais, comuns no
ocidente.
3

Fig.15 – Estudos em Pixel arte do Personagem OnOff, para atuar num jogo de luta 2D

Percebo nessas dicotomias um desejo de se tornar completo. Essas


oposições, contrastes, dualismos e contradições são a base da personalidade de
OnOff, o sujeito que nunca aceita cara ou coroa. Sempre leva a moeda inteira. Não
vejo isso como ser indeciso, e sim como plenamente decidido pelos dois lados.

Escolher um dos lados significa assumir uma incompletude, assumir-se


como metade incompleta. Porém os dois lados não são conciliáveis, um lado da
moeda jamais enxerga o outro. Conviver com os dois como opção de completude
implica também a escolha de viver no conflito, talvez acreditando na futura
conciliação, o estado de plenitude total, em que todos os opostos não se anulam,
mas se sustentam e se unificam. A união dos opostos não significa o meio termo. A
meu ver não se trata do morno, e sim do quente e frio ao mesmo tempo. Daí o
choque térmico conflituoso, o equilíbrio dinâmico, e não a tranqüilidade amena do
clima morno.

2.4. SOBRE O TÍTULO: “AQUI PONTO CHEGOU”

Sintetizar o conceito do vídeo em um verbete talvez tenha sido uma das


questões mais difíceis, e ainda questiono o quão bem sucedido fui nessa tarefa. Não
queria entregar a questão do vídeo em uma palavra como “jornada” ou “epifania”,
porém não queria fugir para poéticas arbitrárias. Tal receio se deve ao poder
reducionista das palavras, que geram sensações de falsa compreensão. Um título
3

carregaria informações prévias que atuariam na tentativa de compreensão e devido


as idéias pré-concebidas sobre o termo epifania, resolvi evitar qualquer menção a
essa palavra.
A solução foi um título que remetesse a uma chegada, uma afirmação, ao
mesmo tempo em que remetesse a um questionamento inserido no subconsciente:
“A que ponto chegamos?”. Além do que o termo “ponto” faz referência a
materialidade em questão, os pixels, que não estão dissociados da mensagem em
questão.

2.5. DECISÕES PRÁTICAS; ANTES DO PRIMEIRO PIXEL

Já de início me deparo com uma decisão relevante: a resolução do vídeo.


Tal decisão afetará todo o processo do trabalho, ditando a técnica do começo ao fim
da obra. Quanto maior a tela, mais possibilidades de detalhamento, porém quanto
menor, mais contato direto com os Pixels terei, pois estes aparentarão serem
maiores. Escolho um tamanho de 320X180 Píxels considerando-o um valor
equilibrado (320X180 Píxels Equivalem a 7 X 4 Cm, aproximadamente). Desejo que
no resultado final os Pixels sejam visíveis enquanto matéria-prima, agregando valor
estético, porém fechar muito as possibilidades de um gesto mais espontâneo, o que
possivelmente ocorreria caso a resolução fosse menor.

Definida essa questão técnica e definido o personagem, OnOff, faltava-


me delimitar seu ambiente de atuação. De início, cogitei faze-lo trilhando por um
deserto. As cores de fundo, de um modo geral, traduziriam seu estado interior,
porém deparei-me com vários problemas que não me pareciam relevantes,
desviando-me do tema central que é o personagem e sua relação consigo.
Caminhar por um deserto dá conotações de sobrevivência, e da uma corporeidade
ao ambiente que não me era interessante. O espaço em branco se revelou mais
significativo e interiorizado. Ele pode ser qualquer coisa. Não há limites, sequer
3

horizonte. Não há trajetória definida. Isso enfatiza a relação do personagem com ele
mesmo, não com conflitos externos. Cogitei o preto ao invés do branco, porém
aparentava muito um caminhar pela escuridão. O branco realmente trouxe as
conotações de neutralidade que sentia necessidade nessa obra. O ambiente não é
aliado ou inimigo, diferente de uma hostilidade ambiental gerada por um deserto.

Outra decisão precisa foi quanto à ausência do som. Cogitei em usar


música (composição própria) e efeitos sonoros, porém tal elemento é muito forte, e
conduz demais o ritmo. E cada mudança mínima de sons poderia gerar outros
significados, outras percepções. É outro estudo. Desafiei-me a conduzir o ritmo
totalmente pela imagem. A música é para os olhos. Dessa forma, penso agora no
trabalho como um quadro em movimento (além dos quadros normais), e não como
um vídeo sem som (um vídeo aquém dos vídeos normais). Também por uma
questão da obra poder ser plenamente apreciada durante a exposição, lugar onde
qualquer elemento sonoro encontraria muita competição com o ambiente.

Tais eliminações de som e cenário me fizeram perceber a essência


minimalista da questão. O desapego, o “abrir mão” do que não é necessário,
enxugando ao máximo a obra, sem empobrecê-la. Essa já é uma característica
própria da pixel arte, que busca também os elementos essenciais. Com a tela
pequena, cada pixel é mais necessário e valorizado. Evitam-se os adornos, enfeites
supérfluos e demais elementos que nada acrescentem. Acredito que, se todos os
elementos que estão lá são importantes, então a obra é enriquecida, dotada de
maior plenitude. O excesso não me parece um bom caminho, assim como a
privação também não (outra dicotomia). O desapego é representado no vídeo pela
eliminação das peças de roupa do personagem em diferentes momentos.

Também a ausência de cenário e som, enfatiza a solidão. O caminho é


solitário na interioridade de alguém, ninguém pode ver plenamente o que se passa
na interioridade de outra pessoa. Tal trilha solitária não é apenas física, pois é muito
comum sentir-se sozinho enquanto se está acompanhado ou mesmo em meio a
uma multidão.
3

2.7. COMEÇO DO TRABALHO – MATERIALIZAÇÃO DO PENSAMENTO

Importante destacar que o trabalho será realizado na técnica de animação


2D, quadro a quadro. Assim sendo, mesmo se tratando de uma única obra, ela é
formada por várias obras seguidas, vários desenhos que possuem autonomia, mas
funcionam como um único ser, amarrados num todo. Apesar dessa unidade
característica, gosto de explorar a variedade dentro da totalidade. Devido ao grande
número de imagens necessárias para conduzir esse trabalho (mais de quinhentas),
limitar-me-ei a comentar aqueles planos que possuem, de alguma maneira, um
significado possível dentro da obra, de acordo com a maneira em que foi feito. Não
me aterei a uma análise narrativa, ou literária, assim como também não focarei nos
aspectos de linguagem cinematográfica. Abordagem principal será quanto a
plasticidade dos pixels. Assim sendo também não me aterei a ordem cronológica em
que as imagens aparecem no vídeo, pois as próprias não obedeceram a uma ordem
linear de execução.

Os seis primeiros planos são bem significativos. Eles não apenas


apresentam o personagem, como também apresentam várias modalidades de pixel
arte, representando certos períodos da técnica. O personagem surge inicialmente
como um ponto ao fundo e vai se aproximando até chegarmos ao seu rosto. Como
dito anteriormente cada tamanho exige uma abordagem diferente por parte de quem
produz uma imagem em pixels. Vejamos uma versão equivalente das imagens,
colocadas no mesmo tamanho para uma melhor comparação:

Fig.16 –Diferentes versões em Pixel arte do Personagem OnOff, já no início do vídeo


3

Não apenas houve um aumento de tamanho (e conseqüente diminuição


dos pixels), como também um aumento da quantidade de tons necessários para
modelagem das formas. A versão diminuta atinge seu ápice, afinal não é possível
reduzi-la ainda mais. Cada cor é representada por um único pixel. Entretanto as
versões com maior resolução que se seguem podem assim prosseguir em escala
indeterminada. A última versão é suficientemente confortável aos olhos, entretanto a
penúltima já apresenta ao mesmo tempo um nível de detalhamento suficiente
enquanto ainda permite a textura pixelada como elemento plástico constituinte da
imagem.

Nas

Fig.17 – duas versões de um mesmo personagem, ambas em pixel arte – SNK Playmore

imagens acima (fig 17) do mesmo personagem, são o tamanho e a quantidade de


tons que as faz serem consideradas estilos diferentes, embora ambos concebidos
em pixels e bem resolvidos em relação à proposta particular de cada. Esta variação
quantizada, por ser verificável, é comumente utilizada como valor de evolução linear.

retomando aos planos iniciais do vídeo, ao mesmo tempo em que neles


se apresenta o personagem, também se apresenta uma representação evolutiva da
técnica em questão. São mostradas seis possibilidades do personagem até que

Fig.18 – quadro-chave do efeito borbulhante no personagem OnOff.


4

enfim no sexto plano adentramos na imagem inicial a narrativa que desencadeou as


demais.

Na figura 18 vemos os quadros-chave do plano pelo qual comecei o


trabalho. Denominam-se por quadros-chave, os quadros principais que constituem
determinada animação, sendo os quadros entre elas denominados intermeios.
Acima (Fig.18 ) é possível constatar seis quadros-chave. Acrescentando-lhe os devidos
intermeios, tal animação no resultado final possui vinte imagens.

Já neste primeiro plano pude explorar os pixels de uma maneira até então
pouco trabalhada por mim. Pude abordar os pixels herdando uma mentalidade
adquirida em minhas aulas de pintura, ou seja, trabalhando com massas de cor em
gestos levemente espontâneos.

Fig.19 – Processo de construção de um dos quadros a partir de massas de cor.

Creio ser um bom momento para demonstrar a versatilidade da técnica,


derrubando o mito comum para os leigos de que o trabalho em Pixels é realizado
sempre através do ponto a ponto, como no pontilhismo. O meio me permite outras
abordagens, ou mesmo uma mistura delas. Em alguns momentos dessa imagem
realmente foi necessário aproximar para corrigir certos detalhes diretamente nos
pixels, entretanto me permiti manter um leve teor do acabamento espontâneo. O
gesto, porém, ainda estava contido devido ser o começo de minha experimentação.
4

O plano da materialização do pensamento exigiu-me um pouco mais de


aproximação dos pixels. Fiz uso de uma tradicional técnica em pixels que consiste
copiar o quadro anterior e muda-lo sutilmente.

Fig.20 – Pensamento solidifica pesa e parte ao meio.

Apropriei-me também de uma particularidade dos pixel que, de um modo


geral, seria considerado um defeito. Elas ficam distorcidas quando rotacionadas em
ângulos não retos. Nota-se acima, no terceiro quadro, as pontas ásperas no
contorno. Tais bordas serrilhadas seriam consideradas um elemento de má
qualidade, porém no caso torna-se um enfatizador do impacto e do movimento que a
pedra faz ao cair com força. A pedra, por sua vez, não seguiu critérios rigorosos de
continuidade. Ela se rompe e se esfacela já no primeiro plano de sua aparição,
sofrendo a partir daí diversas mudanças de textura e escala. Tais mudanças
sugerem a imprevisibilidade do pensamento, porém são conseqüências das diversas
abordagens técnicas pela qual ela é representada. Em meados do segundo ato o
personagem é representado em um momento de introspecção. Deliberadamente
inspirei-me na icônica imagem do pensador de Rodin.
4

Fig.21 – Releitura de Rodin.

Inicialmente pretendia homenagear alguns grandes nomes com os quais


me identifico, ou que de alguma maneira remetiam ao que estava sendo dito, porém
Rodin acabou sendo o único a entrar nesse conceito, sendo todos os demais
descartados por inadequação. Acabou se tornando a primeira releitura de obra que
produzo em pixel arte. Para tal guie-me apenas pelo olhar, não trabalhando
diretamente em cima do molde original.

Ainda nesse plano, recorri a uma técnica muita característica da Pixel


arte: O dithering, traduzido literalmente como pontilhado. É a técnica que aproxima a
Pixel arte do Bordado e consiste em intercalar dois tons ou mais a fim de produzir
determinada textura ou degradê.

Fig.22 – Degradê tradicional, em escala de tons e degradê em dithering. No segundo caso existe apenas o tom de preto e o de
branco puros, sendo o acinzentado feito pela intercalação destes.
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O dithering foi caindo em desuso, na medida em que a tecnologia permitia


um uso maior de tons, gerando degradês mais naturais. Tal técnica era realmente
necessária quando não se dispunha de muitos matizes, sendo a intercalação um
meio de criar novas tonalidades a partir das poucas existentes. Seu uso, porém
enfatiza os pixels, sendo tal característica o motivo que a levou ao desuso, além do
trabalho maior que tal efeito exige. Seu uso não se vincula a uma espontaneidade,
pois para realizar tal trançado exige-se certo grau de tempo e paciência. Esse
motivo me levou a adotar tal técnica nos planos do pensador. O momento em que o
personagem se finca e se solidifica é enfatizado a partir do uso mais clássico e
rígido dos pixels.

Fig.23 – Técnica de dithering, solidificando e enrijecendo o personagem

Um uso relativamente recente de tal técnica por parte da SNK Playmore


chamou-me a atenção. Trata-se da personagem Shion que luta usando uma
tradicional lança, na décima primeira versão do jogo KOF. Ao contrário de rigidez, o
dithering adotado em seus sprites enfatiza o movimento e a transparência da lança
ao percorrer o ar em alta velocidade.
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Fig.24 – Belíssimo uso de dithering em KOF – SNK Playmore

Percebo nesse resgate da técnica uma declaração de respeito em relação


à pixel arte e de percepção da beleza contida nesta. O contexto de lançamento
desse jogo refere-se ao último KOF produzido em baixa resolução, considerada
ultrapassada e anacrônica (2006). Como uma maneira de explorar a riqueza própria
dos pixels que aquela resolução lhe permitia usar, antes de abandoná-la por
imposições de mercado. Mas no vendaval de informações, tal gesto acaba por
tornar-se uma daquelas coisas, seres e atos que se perde, como se não tivesse
sentido.

Senti também a necessidade de explorar melhor tal técnica, já que é tão


característica da pixel art. Ela acabou servindo muito adequadamente no plano da
chuva que acontece no segundo ato e começo do terceiro. Foi uma solução que
muito me agradou ao invés de animar cada gota da chuva, cujo resultado poderia

Fig.25 – uso de dithering para suavizar os tons de cinza, criando a atmosfera embaçada e intimista da chuva.

ser demasiado artificial.

Não estava tão certo quanto ao significado principal da chuva, mas senti a
necessidade de incluí-la, mesmo evitando enfatizar interferências externas. No
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contexto atual em que realizo a animação, também participo do espetáculo


“Abraços” do Coral da UFC. Nele também é freqüente o tema da chuva com
conotações mais espirituais, de purificação. A chuva, dentro do vídeo, no primeiro
contexto aparece como um momento de dificuldade. Já sua segunda aparição
assemelha-se a um momento de lavar a alma. A realização de tal espetáculo, cujo
preparo levou em torno de dois anos, tem me influenciado fortemente devido sua
abordagem humanista, e a profunda preocupação de seus realizadores com as
sutilezas dos relacionamentos humanos. A permanência nesse coral revitalizou
algumas crenças artísticas e existenciais minhas. O próprio ato de vivenciar
literalmente o estado de harmonia com um grupo de pessoas já tem me influenciado
desde então, relacionando-se ao que compreendi no mencionado momento
epifânico.

Fig.26 – Diferentes sombreados, indicando a passagem do sol e do tempo.

Em termos formais, o efeito da chuva suavizou os contrastes, deixando a


imagem mais amena, integrando os diversos elementos numa penumbra
acinzentada, introspectiva. Efeito oposto ao plano de sol forte em que a sombra
caminha em alto-contraste, indicando a passagem do tempo (fig. 26). O plano da
chuva e o plano do sol forte aparecem seguidamente em corte seco. Situações
opostas representadas por técnicas opostas e com significados relacionados.
Destaco novamente o aspecto dual de OnOff nessa decisão.

Fig.27 – Abordagem dos pixels como um desenho em acetato.

Opondo-se a abordagem Pictórica mencionada inicialmente e ao uso do


dithering, faço um constante uso da abordagem gráfica que remete ao desenho
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animado em acetato (figura 27). Tem sido essa uma vertente comum a Pixel arte, por
ser mais acessível a um iniciante (que já domine o desenho analógico). Consiste em
tratar a tela em branco dos pixels como uma folha de papel, concebendo a imagem
como quem desenha a nanquim, partindo do contorno. Traçado o contorno define-se
a sombra e desta faz-se a divisão de luz e sombra a partir de cores chapadas. Ao
contrário do dithering, que tem caído em desuso, esta abordagem de Pixel arte
como desenho tem se tornado cada vez mais popular. Possivelmente, tal
popularização se deva fato de tal procedimento não exigir por parte de um ilustrador
ou animador um pensar diferente, o pensar em pixels. O Pensamento tradicional de
desenhista (traço, linha, cor preenchendo) cabe satisfatoriamente nessa proposta.

Um exemplo recente do uso de tal abordagem se encontra no Jogo


BlazBlue da ARC System Works. Não se trata de uma técnica nova, porém
encontra-se fortalecida neste exemplo, devido este ser o atual jogo 2D disponível no
mercado com a maior resolução (1280 X 768). Alguns entusiastas já estão
comemorando o desaparecimento dos Pixels, outros reclamam que ainda é possível
enxergá-los. Essa é uma diferença básica entre a SNK e a ARC System: Ambas
valorizam e são adeptas da animação 2D, porém a paixão da SNK é específica
sobre a Pixel Arte enquanto a ARC System aprecia o 2D enquanto animação
manual, de desenhos clássicos. Compactuo com as duas paixões, e aprecio as duas
empresas.

Fig.28 – Personagem Taokaka do Jogo BlazBlue, produzido pela ARC System Works. A certa distância pouco se percebe os
pixels em sua formação, lembrando um desenho animado tradicional em acetato.

Enfim, é chegado o momento da epifania. Após percalços não


mencionados, eis que o personagem une as peças do quebra-cabeça e sofre o
esperado curto circuito. O impacto do instante em que tudo se une é representado
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pela sucessão de imagens em variados estilos. Esse é o momento para retomar as


técnicas citadas até então, unindo-se numa só obra e num só segundo. Também a
hora de misturá-las, interagi-las, testar e experimentar tudo que ainda não havia sido
feito (afinal existia essa intenção já no começo do trabalho). Trata-se de um efeito
em animação muito comum entre animadores contemporâneos que consiste em
usar uma relação de quadros levemente desconexos seja em cores, técnica e estilo,
que, ao passarem em frações de segundo, diluem-se numa só seqüência animada.

Fig.29 – Três abordagens distintas da pixel arte.

A figura 29 mostra três quadros de uma seqüência. Os três aparecem


seguidamente, porém nota-se uma nítida diferença entre as maneiras de concebê-
los. A primeira, por exemplo, não seguiu esquema prévio, sendo que considero
predominantes os aspectos pictóricos, mesmo tendo começado a partir do esboço
em contorno. A segunda imagem tem metade da resolução das demais, por isso seu
contorno aparece bem destacado. É a primeira imagem de todas em que uso um
contorno preto, e caprichei sutilmente no dithering. Foi um dos resultados que mais
me agradou graficamente. No plano seguinte experimentei uma solução mais limpa,
com grandes áreas chapadas e sem contorno.

Olhando as três lado a lado reafirma-se a versatilidade dos pixels, não


mais buscando abordagens herdadas de outros meios como a pintura, mosaico ou
desenho, mas percebendo aquilo que o meio sugere e apenas ele permite. Creio ter
explorado um arsenal de possibilidades suficiente para contribuir na permanente
construção de meu estilo, e nessa busca de novas possibilidades formais que se
inicia a partir dessa obra.
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Considerações Finais

A que ponto chegou todo esse processo? Possivelmente onde dão todos
os pontos de chegada: em novos pontos de partida. Epifania não é o fim da
caminhada, apenas a consciência do caminhar. Como aspecto mais relevante,
destaco as reflexões acerca do fazer artístico presente na pixel arte e o
questionamento de sua situação no contexto de mercado em que está inserida.
Também vejo como relevante a percepção de sua materialidade. Mesmo com todas
as comparações com mosaicos, pintura pontilhista, areia colorida, lego, é também
certo que a virtualidade dos pixels permite uma série de características que não são
próprias de outros meios materiais. Os pixels não acabam, possuem um controle
muito maior quanto a cor e posicionamento, não estão expostos a efeitos do tempo,
gravidade e outros elementos que afetam a conservação de obras presentes no
mundo físico. Assim os Pixels são ao mesmo tempo limitados em certo aspecto e
ilimitados por outro. Isso torna seu uso acessível, viável e econômico, além de se
poder atingir o poético grau da “simplicidade com complexidade”.

Outro ganho importante foi a contribuição para um melhor entendimento


da singularidade dessa Arte. Minha ênfase não é destacar a linguagem dos pixels
como superior as outras, ou mais profunda que sua rival de mercado, o 3D. O apelo
maior deve-se a preservação do que não está sendo devidamente valorizado, assim
como esclarecer algo que a História da Arte já tem demonstrado na prática: Novas
linguagens não destroem as antigas equivalentes. Leva-se um tempo para perceber
isso e, por vezes, o novo serve para compreender melhor e valorizar as
particularidades do antigo. A fotografia libertou a pintura, não a matou. O Cinema
não acabou com o teatro, possivelmente o elitizou. Hoje nos parece visivelmente
claro o quão essas linguagens diferem entre si, o quão elas exigem pensamentos e
procedimentos diferentes para sua criação, de tal forma que não cabe um “tanto faz”
para se referir a elas. A pixel arte possui considerável numero de adeptos no meio
alternativo, provando ser uma linguagem sólida e consistente, independente da
tecnologia avançada a qual se opõe. Ainda será preciso alguma estrada para que a
alta resolução (HD –High Definiton) perceba que não destruirá uma arte que ganha
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força e charme a partir da baixa resolução, e que ser capaz de enxergar os pixels
em uma imagem não implique que esta seja de má qualidade. Foram séculos para
que os pintores pudessem exibir suas pinceladas, não há porque um pixel artista
abrir mão dessa conquista.

Houve muitos ganhos na realização prática do trabalho, mas também


senti uma dificuldade em explicar verbalmente esses ganhos. Isso devido a natureza
delicada da pixel arte a se trabalhar com elementos simples e diminutos os quais
algumas nuances só se sente e se percebe no visualizar com calma e no fazer com
paciência e dedicação. Muitas dessas nuances são intraduzíveis. E foram várias
num trabalho que inclui seguramente mais de quinhentas imagens, sendo-me
impossível relatar por completo cada pequeno feito. Ainda há pontos intocados como
animação, direção e questões literárias da narrativa, abordagens que ficaram de fora
por não se referirem diretamente a questões plásticas. Isso deixa margem a outros
estudos da obra.

A Os pixels cumpriram bem sua função no conteúdo da obra. Alguns


apreciadores da obra, por exemplo, me enfatizaram que os momentos no qual o
personagem perdia peças da roupa se assemelhava a um ato de libertar-se, a um
desapego dos bens materiais. Isso não se tornaria tão forte e verdadeiro caso a
linguagem usada fosse de última geração. Seria uma mensagem solta, não
amparada pela sinceridade da linguagem. Essa relação da linguagem com o que
está sendo disso é algo de que necessito. Outras interpretações também cabem no
relacionamento da linguagem com mensagem, inclusive não apenas para reforçar o
que é dito, mas para dizer silenciosamente coisas além do que se imaginaria.

A linguagem verbal pode estabelecer uma relação eficiente de um ser


humano com o outro, porém as linguagens não-verbais (formais e artísticas)
estabelecem um contato do homem com o mundo, com o universo e suas leis, com
a existência e o próprio viver. Através da pixel arte pude vislumbrar e vivenciar
conceitos e percepções que ultrapassam aquilo que está posto como função das
imagens em nosso contexto cultural de meramente decorativas ou de impacto vazio,
Visões próprias do mercado em que foi concebida, com seu conseqüente descaso
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da materialidade e dos meios, tido como descartáveis na cultura do “tanto faz”.


Diante disso, sinto-me felizardo pelo caminho de vida que me levou a não ignorar o
sentido maior das pequenas coisas, inclusive de um ponto, e desencadear
compreensões tão valorosas e profundas a partir de algo tão discriminado que é um
jogo para vídeo game.

Onofre Paiva
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REFERÊNCIAS

GULLAR, Ferreira. Argumentação Contra a Morte da Arte. Editora Revan, 7ª Edição,


Pág. 24-26, 93 e 95;

KANDINSKY, Wassily. Do Espiritual na Arte. Editora Martins Fontes, 1911, Pág. 35,
37 e 59;

OSTROWER, Fayga. Criatividade, Processos de Criação. Editora Vozes,1977, Pág.


35 e 96;

OSTROWER, Fayga. Universo da Arte, Editora Campus, 1996, 13ª edição.

<http://kofaniv.snkplaymore.co.jp/english/info/15th_anniv/2d_dot/art/index.php>
Acesso em 22 de Outubro de 2009.

< http://pt.wikipedia.org/wiki/P%C3%A1gina_principal> Acessos em Novembro de


2009.
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Glossário

2D é o termo usualmente usado para designar objetos e entidades com duas


dimensões: largura e comprimento. São, portanto, construídos sob uma superfície
em que todos os seus pontos fazem parte de um mesmo plano.

ARC System Works é uma desenvolvedora de vídeo game localizada em


Yokohama, Japão. Foi fundada por Minoru Kidooka em 1988. Arc System Works é
mais conhecida pelo seu jogo arce de luta em 2D, Guilty

KING OF FIGHTERS (KOF) - Português: O Rei dos Lutadores), ou KOF, é uma


série de videogames de lutas com características de animes e mangás, produzidas
pela SNK inicialmente em 1994. A série combina elementos e personagens de
outras séries e videogames também produzidos pela SNK: Fatal Fury e Art of
Fighting.

RASTER - Imagens raster (ou bitmap, que significa mapa de bits em inglês) são
imagens que contém a descrição de cada pixel, em oposição aos gráficos vectoriais.
Nisso está incluso a Pixel arte assim como qualquer fotografia, desenho
escaneado...etc.

RESOLUÇÃO de imagem descreve o nível de detalhe que uma imagem comporta.


O termo se aplica igualmente a imagens digitais, imagens em filme e outros tipos de
imagem. Resoluções mais altas significam maiores detalhes na imagem. O termo
resolução é freqüentemente usado como uma contagem de pixels em imagens
digitais. Quando a contagem de pixels é referenciada como resolução, a convenção
é descrever a resolução em pixels como o conjunto de dois números positivos
inteiros, em que o primeiro número é a quantidade de colunas (largura) de pixels e o
segundo é número de linhas (altura) de pixels; algo como 640 X 480, por exemplo.

SNK Playmore (antiga SNK) é uma empresa japonesa de videogames. SNK é um


acrônimo para Shin Nihon Kikaku, ou "Projeto Novo Japão". A empresa foi fundada
em Osaka em julho de 1978 por Eikichi Kawasaki com o propósito de criar e produzir
programas eletrônicos e componentes de informática para uma série de usos. Seu
produto mais famoso é o sistema de jogos arcade e doméstico Neo-Geo e várias
das séries de jogos para ele como Metal Slug, Samurai Shodown, Fatal Fury, Art of
Fighting e The King of Fighters.

SPRITE - Em computação gráfica, um sprite (do latim spiritus, significando


"duende", "fada") é um objeto gráfico bi ou tridimensional que se move numa tela
sem deixar traços de sua passagem. O termo Sprite é válido para figuras
bidimensionais geradas por hardware ou software, geralmente para jogos.

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