Sei sulla pagina 1di 15

www.aquinate.

net/artigos ISSN 1808-5733

A ATUALIDADE DE SANTO TOMÁS DE AQUINO NO MAGISTÉRIO DE JOÃO


PAULO II∗

D. Álvaro del Portillo – Antigo Prelado do Opus Dei.

Resumo: A obra filosófica e teológica de Santo Tomás prestou um grandioso serviço a toda a
Igreja. João Paulo II, em diversas ocasiões, expressou a gratidão e o
reconhecimento que lhe são devidos por justiça e, como já tantas vezes fizeram
seus predecessores, convidou aqueles que cultivam as ciências sagradas, e também
outros estudiosos, a dirigirem seus próprios passos sobre o caminho sólido e
seguro traçado pelo Aquinate.
Palavras-chave: Tomás de Aquino, João Paulo II, Tomismo, Magistério da Igreja.

Abstract: St. Thomas Aquinas’s philosophical and theological work has been of enormous
service to the entire Church. John Paul II has on several occasions expressed the
gratitude and recognition owed in justice to Aquinas and encouraged, as his
predecessors had done many times before, those who cultivate the sacred sciences
(as well as other scholars) to guide their own steps by the sound and safe path
outlined by Aquinas.
Keywords: Thomas Aquinas, John Paul II, Thomism, Magisterium of the Church.

A obra filosófica e teológica de Santo Tomás prestou um grandioso


serviço a toda a Igreja. João Paulo II, em diversas ocasiões1, expressou a
gratidão e o reconhecimento que lhe são devidos por justiça e, como já tantas
vezes fizeram seus predecessores, convidou aqueles que cultivam as ciências
sagradas, e também outros estudiosos, a dirigirem seus próprios passos sobre o
caminho sólido e seguro traçado pelo Aquinate.

Conferência de Mons. Álvaro del Portillo, Prelado do Opus Dei, na abertura do IX
Congresso Tomista Internacional sobre Santo Tomás de Aquino. Agradecemos à Romana –
Boletín de la Prelatura de la Santa Cruz y Opus Dei, n° 11, Luglio-Dicembre 1990, pagina
222 [http://www.romana.org/art/11/3.5/1], por autorizar sua publicação na
www.aquinate.net. Este texto foi traduzido do italiano por Daniel Nunes Pêcego. [Nota do
tradutor: esta conferência foi proferida em 1990; desde então, houve novas manifestações
do Papa João Paulo II sobre a vida e a obra de Santo Tomás; certamente a mais expressiva é
a plena acolhida da filosofia tomista pela Carta Encíclica Fides et Ratio, publicada em 1998.
1
Recordamos, dentre outras, a visita do Santo Padre ao Angelicum, em 17 de novembro de
1979, para comemorar o centenário da Encíclica Aeterni Patris, a Audiência concedida em
13 de setembro de 1980 aos participantes do VIII Congresso Tomístico Internacional, a
Audiência concedida ao Comitê promotor do Index thomisticus, em 28 de março de 1981 e
a Audiência concedida em 4 de janeiro de 1986 aos participantes do Congresso
Internacional sobre a doutrina de Santo Tomás acerca da alma, organizado pela “Sociedade
Internacional Tomás de Aquino”.

AQUINATE, n°6, (2008), 179-193 179


www.aquinate.net/artigos ISSN 1808-5733

Já em 1980, na audiência concedida aos participantes do VIII Congresso


Tomístico Internacional, o Papa podia afirmar que “desde os inícios do meu
Pontificado não deixei passar ocasião propícia sem recordar a excelsa figura de
São Tomás como, por exemplo, na minha visita à Pontifícia Universidade
Angelicum e ao Institut Catholique de Paris, na alocução à UNESCO e, de modo
explícito ou implícito, nos meus encontros com os Superiores, professores e
alunos das Pontifícias Universidades Gregoriana e Lateranense”2.
Mas é também justo reconhecer que o Santo Padre sublinhou a atualidade
da doutrina de Santo Tomás trazendo, com acentos novos e adequados às
nossas circunstâncias culturais, um conjunto de razões filosóficas e teológicas
que renovam e enriquecem o reconhecimento com o qual a Igreja acolheu o
pensamento do Doutor Angélico.
João Paulo II desenvolveu tal obra com o claro intento de pôr em prática
as disposições do Vaticano II. É o que dizia em 1979: “As palavras do
Concílio são claras: na íntima ligação com o pensamento cultural do passado, e
em particular com o pensamento de São Tomás, viram os Padres um elemento
fundamental para a adequada formação do clero e da juventude cristã e,
portanto, em perspectiva, uma condição necessária para a desejada renovação
da Igreja. Não é caso de inculcar aqui a minha vontade de dar plena execução
às disposições conciliares, uma vez que nesse sentido já me pronunciei
explicitamente na homilia de 17 de Outubro de 1978, no dia seguinte à minha
eleição para a Cátedra de Pedro e depois repetidas vezes”3.
Dividirei esta minha conferência em cinco seções: 1) Espírito de abertura
e fidelidade à voz do ser; 2) A fidelidade à voz da Igreja; 3) A filosofia do ato
de ser; 4) Antropologia filosófica e Cristologia; 5) O caminho ainda a
percorrer.

1. ESPÍRITO DE ABERTURA E FIDELIDADE À VOZ DO SER.

Uma das características pelas quais a filosofia de Santo Tomás “merece


atento estudo e aceitação convicta”4 é, segundo João Paulo II, o “seu espírito
de abertura e de universalismo, característica que é difícil de encontrar em
muitas correntes do pensamento contemporâneo. Trata-se da abertura ao
conjunto da realidade em todas as suas partes e dimensões, sem reduções ou
particularismos (sem absolutizações de aspectos singulares), assim como é

2
JOÃO PAULO II. Discurso, 13 de setembro de 1980. In Insegnamenti di Giovanni Paolo II,
III, 2 (1980), p. 605.
3
Discurso, 17 de novembro de1979. In Insegnamenti di Giovanni Paolo II, II, 2 (1979), p.
1183.
4
Ibid.

AQUINATE, n°6, (2008), 179-193 180


www.aquinate.net/artigos ISSN 1808-5733

exigido da inteligência em nome da verdade objetiva e integral, concernente à


realidade”5.
O Aquinate manifesta em suas obras uma atitude de “grande respeito (...)
pelo mundo visível, que é obra e, portanto, vestígio e imagem de Deus
Criador”6, um “vivíssimo sentido de fidelidade à verdade, que pode também se
dizer realismo. Fidelidade à voz das coisas criadas, para construir o edifício da
filosofia; fidelidade à voz da Igreja, para construir o edifício da teologia”7.
Tal abertura à realidade inteira, tão necessária nesta época em que
abundam as visões reducionistas do homem, “tem o seu fundamento e sua
fonte no fato de que a filosofia de Santo Tomás é filosofia do ser, isto é, do
“actus essendi”8. Esta filosofia – diz sugestivamente João Paulo II – pode ser
realmente chamada filosofia da proclamação do ser, o canto em honra ao
existente”9.
A atenção ao ser das criaturas, longe de se afastar da realidade concreta,
nos introduz nela para contemplá-la, para estudá-la e para orientar o nosso
agir. Segundo o Santo Padre, da visão sobre o ser “a filosofia de Santo Tomás
deduz a sua capacidade de acolher e de afirmar tudo o que se apresenta diante
do intelecto humano (o dado de experiência, no sentido mais amplo) como
existente determinado em toda a riqueza inexaurível do seu conteúdo; ela
origina, em particular, a sua capacidade de acolher e de afirmar aquele ser, que
está em condição de conhecer a si mesmo, de se maravilhar em si e, sobretudo,
de decidir por si e de forjar a própria irrepetível história...”10.
Com o olhar voltado para o progresso científico característico do nosso
século, o Santo Padre afirma que justamente por causa da fidelidade à voz do
ser, Santo Tomás pode ser considerado “um autêntico pioneiro do moderno
realismo científico, que faz as coisas falarem, mediante o experimento
empírico, mesmo se o seu interesse se limita a fazê-lo falar do ponto de vista
filosófico. Antes, é de se perguntar se não é justamente o realismo filosófico
que, historicamente, estimulou o realismo das ciências em todos os seus
setores”11.
Com estas palavras, João Paulo II faz uma ponte entre ciência e filosofia
para superar as recíprocas incompreensões, indo à raiz comum de ambos os
tipos de saber: o realismo. O discurso racional e científico que segue a “lógica

5
Ibid., pp. 1183 e 1184.
6
Ibid., p. 1181.
7
Discurso, 13 se setembro de 1980. Cit., p. 607.
8
Discurso, 17 de novembro de 1979. Cit., p. 1184.
9
Ibid.
10
Ibid.
11
Discurso, 13 de março de 1980. Cit., p. 607.

AQUINATE, n°6, (2008), 179-193 181


www.aquinate.net/artigos ISSN 1808-5733

do ser” é particularmente necessário hoje, “quando em muitas partes se


lamenta justamente a falta de comunicação entre as várias ciências e a perda da
unidade do saber”12. O diálogo interdisciplinar, tão desejado nos ambientes
universitários e tão necessário para superar a fragmentação da cultura e a sua
separação da Fé, encontra aqui um fundamento seguro.
Dentro da temática da situação cultural contemporânea, João Paulo II
aborda uma outra questão capital: aquela da historicidade do homem e da
cultura, que tanto incide sobre a filosofia e sobre a teologia atuais e à qual se
aplicaram tantos pensadores do nosso século. Não falta quem veja a teologia
elaborada em harmonia com a filosofia do ser como estranha ou contrária à
historicidade. O Papa responde a tais inquietudes afirmando que o “realismo,
bem longe de excluir o senso histórico, cria as bases para a historicidade do
saber, sem fazê-lo decair na frágil contingência do historicismo, hoje
largamente difundido”13.
Tal sentido histórico é evidente no Aquinate que, mesmo afirmando que
há uma só Sabedoria absoluta, admite que existam muitos sábios que dela
participam14. A Verdade suma que refulge no criado é recebida na mente
humana em graus diversos e de modo limitado. Por isso, “depois de ter dado a
precedência à voz das coisas, Santo Tomás se põe em respeitosa escuta do que
disseram e dizem os filósofos, para avaliá-los, colocando-se em confronto com
a realidade concreta. Ut videatur quid veritatis sit in singulis opinionibus et in quo
deficiant. Omnes enim opiniones secundum quid aliquid verum dicunt (I Dist., 23, q. 1, a.
3)”15. Disto, com sensibilidade vivamente atual, o Papa encontra uma aplicação
sempre válida e hoje ainda mais necessária na pesquisa científica, afirmando
que “esta presença da verdade, mesmo parcial e imperfeita e às vezes
distorcida, é uma ponte, que une todos os homens aos outros homens e torna
possível o acordo quando há boa vontade”16.
João Paulo II gosta de evidenciar que Santo Tomás “sempre dedicou
respeitosa escuta a todos os autores, também quando não podia compartilhar
inteiramente das opiniões; também quando se tratava de autores pré-cristãos
ou não-cristãos, como por exemplo, os comentaristas árabes dos filósofos
gregos”17. Destes põe igualmente em relevo o “otimismo humano” quando,
frente à linguagem obscura e imperfeita dos primeiros pensadores gregos,

12
Discurso, 28 de março de1981. In Insegnamenti di Giovanni Paolo II, IV, 1 (1981), p. 797.
13
Discurso, 13 de setembro de 1980. Cit., p. 607.
14
SANTO TOMÁS DE AQUINO, Super Iob, I, lect. 1, n. 33.
15
Discurso, 13 de setembro de 1980. Cit., p. 607.
16
Ibid., p. 608.
17
Ibid.

AQUINATE, n°6, (2008), 179-193 182


www.aquinate.net/artigos ISSN 1808-5733

observa mais as suas intenções que o teor literal das expressões lingüísticas18. A
mesma postura do Doutor Angélico se manifesta no estudo dos grandes
Padres e dos Doutores da Igreja: ele procura sempre encontrar o acordo, mais
na plenitude da verdade que possuem como cristãos, do que no modo, diverso
do seu, com que se exprimem”19. Tudo isto naturalmente não o impedia “de
ser sinceramente crítico, toda vez que sentia dever fazê-lo, e o fez
corajosamente em muitos casos”20.
Pela capacidade de acolher o que de verdade se encontra em qualquer
doutrina, o pensamento de Santo Tomás constitui um elemento de união,
nunca de divisão, e possui uma “profunda ‘eclesialidade’” que o torna livre de
limitações, caducidade e fechamentos e extremamente aberto e disponível a
um progresso indefinido, capaz de assimilar todo novo autêntico valor
emergente na história de qualquer cultura”21: “toda compreensão da realidade
– que efetivamente reflita esta realidade – possui pleno direito de cidadania na
‘filosofia do ser’”22, independentemente de quem a tenha proposto. Daí João
Paulo II tira a conclusão de que “as outras correntes filosóficas, portanto, se se
as observa deste ponto de vista, podem, ou melhor, devem ser consideradas
como aliados naturais da filosofia de Santo Tomás e como parceiras dignas de
atenção e de respeito no diálogo que se desenvolve na presença da realidade”23.
As considerações lembradas levam João Paulo II a conceder a Santo
Tomás o novo título de Doctor Humanitatis, que constitui o tema central deste
congresso: “Este método realista e histórico, fundamentalmente otimista e
aberto, faz de Santo Tomás não apenas o Doctor Communis Ecclesiae, como o
chama Paulo VI, na sua bela Carta Lumen Ecclesiae, mas o Doctor Humanitatis,
porque sempre pronto e disponível a receber os valores humanos de todas as
culturas”24.

2. A FIDELIDADE À VOZ DA IGREJA.

É este um fio condutor dos louvores dirigidos a Santo Tomás pelos


Romanos Pontífices há cerca de sete séculos. Também João Paulo II a eles se
une com novos acentos, adequados às circunstâncias atuais.

18
Cfr. Ibid.
19
Ibid.
20
Ibid.
21
Discurso, 4 de Janeiro de 1986. In Insegnamenti di Giovanni Paolo II, IX, 1 (1986), p. 23.
22
Discurso, 17 de novembro de 1979. Cit., p. 1185.
23
Ibid., pp. 1185 e 1186.
24
Discurso, 13 de setembro de 1980. Cit., p. 609.

AQUINATE, n°6, (2008), 179-193 183


www.aquinate.net/artigos ISSN 1808-5733

A propósito de tal fidelidade a primeira característica evidenciada pelo


Papa é “aquela de ter professado um pleno obséquio de mente e de alma à
divina Revelação (...). Como seria profícuo à Igreja de Deus – prossegue João
Paulo II – que também hoje todos os filósofos e teólogos católicos imitassem
o sublime exemplo dado pelo Doctor communis Ecclesiae!”25.
O Aquinate professou, além disso, por toda a vida uma “sincera e total
adesão (...) nos confrontos do Magistério da Igreja”26, uma “fidelidade à voz da
Igreja”27, que se reflete também em sua afirmação: Magis standum est auctoritati
Ecclesiae... quam cuiuscumque Doctoris28. O Santo Padre, comentando a frase
citada, observa que “aqui a autoridade da doutrina do Aquinate se esclarece e
se atualiza na autoridade da doutrina da Igreja. Eis porque a Igreja o propôs
como modelo exemplar da pesquisa teológica”. E acrescenta que a postura de
Santo Tomás, que antepondo a voz da Igreja universal à voz dos doutores e à
sua própria voz, quase antecipa a afirmação do Concílio Vaticano II: “A
totalidade dos fiéis que receberam a unção do Espírito Santo não pode
enganar-se na fé”29. “Quando o Romano Pontífice, ou o corpo episcopal
juntamente com ele, define uma doutrina, fá-lo em harmonia com a revelação,
à qual todos devem obedecer e conformar-se”30. Ora, o Doutor Angélico –
prossegue João Paulo II – não limitou “o obséquio de sua mente apenas ao
Magistério solene e inefável dos Concílios e dos Sumos Pontífices”31. E
novamente o coração do Papa se mostra nestas palavras: “Fato este muito
edificante e digno também hoje de ser imitado por quantos desejam
conformar-se à Constituição Dogmática Lumen gentium (cfr. nº 25)”32.
Uma outra conseqüência da fidelidade de Santo Tomás à voz da Igreja foi
“o ter ele posto os princípios dos valores universais, que regem a relação entre
razão e fé”33. Frente às repetidas tentativas de sustentar uma presumida
incompatibilidade entre fé e ciência, a harmoniosa doutrina do Aquinate sobre
a convergência de ambas constituiu um claro ponto de referência,
especialmente no Concílio Vaticano I que tratou da questão de fide et ratione
frente “às correntes filosóficas e teológicas inquinadas do racionalismo
dominante”34.

25
Discurso, 17 de novembro de 1979. Cit., p. 1180.
26
Ibid., p. 1181.
27
Discurso, 13 de setembro de 1980. Cit., p. 609.
28
SANTO TOMÁS DE AQUINO, STh. II-II, q. 10, a. 12.
29
Lumen gentium, n. 12.
30
Lumen gentium, n. 25.
31
Discurso, 17 de novembro de 1979. Cit., p. 1181.
32
Ibid.
33
Discurso, 13 de setembro de 1980. Cit., p. 610.
34
Discurso, 17 de novembro de 1979. Cit., p. 1179.

AQUINATE, n°6, (2008), 179-193 184


www.aquinate.net/artigos ISSN 1808-5733

Na doutrina do Doutor Angélico há um maravilhoso equilíbrio entre fé e


razão, que se distinguem e ao mesmo tempo convergem. “Pesquisa filosófica e
pesquisa teológica são duas diversas direções da marcha da única verdade,
destinadas a se encontrarem, não a se desencontrarem, sob a mesma via, para
se ajudarem. Assim, a razão iluminada, fortalecida, garantida pela fé, se
transforma numa fiel companheira da fé mesma e a fé alarga imensamente o
horizonte limitado da razão humana. Sobre este ponto – exclama João Paulo II
– Santo Tomás é verdadeiramente um mestre que ilumina”35. Disso é prova o
fato de que o Papa tenha querido recordar em um de seus discursos que
estamos comentando o nº 10 da Declaração Gravissimum educationis, que diz:
“(...) indagando acuradamente as novas questões e pesquisas postas pela época
que se desenvolve, se colha claramente como Fé e Razão se encontram na
verdade única, segundo as pegadas dos Doutores da Igreja, especialmente de
Santo Tomás de Aquino”36.
A harmonia e a colaboração entre saber filosófico e teológico não elimina
as diferenças entre as duas. Com grande equilíbrio e realismo João Paulo II
recorda que enquanto a fé goza da segurança absoluta da autoridade divina,
“também a melhor filosofia, aquela de estilo tomista, que Paulo VI bem
definiu como ‘filosofia natural da mente humana’, dócil à escuta e fiel no
exprimir a verdade das coisas, é sempre condicionada pelos limites da
inteligência e da linguagem humana”37.
Há uma diferença de método e de fundamento, mas, adverte o Papa,
também a filosofia deve elevar o homem até Deus: “Por Santo Agostinho,
verus philosophus est amator Dei (De Civitate Dei, VIII, 1: PL 41, 225). Santo
Tomás, fazendo-lhe eco, diz, em outras palavras, a mesma coisa: Fere totius
philosophiae consideratio ad Dei cognitionem ordinatur (Contra Gentiles, I, 4, n. 23)”38.
Nesta filosofia são inseparáveis o amor da verdade e do bem. João Paulo II
quer repelir a falsa idéia de Santo Tomás como “frio intelectualista”, quando
ele na realidade “explica o mesmo conhecer como amor à verdade, quando
põe como princípio de toda consciência: verum est bonum intellectus (Ethic., I, lect.
12, n.139). Portanto, o intelecto foi feito para a verdade e o ama como seu
bem conatural. E posto que o intelecto não se satisfaça com nenhuma verdade
parcial conquistada, mas tende sempre para além, o intelecto tende para além
de toda verdade particular e é naturalmente estendido à Verdade Total e
Absoluta que, em concreto, não pode ser outra que não Deus (...). Toda a
filosofia e a teologia de Santo Tomás não estão situadas fora, mas dentro do

35
Discurso, 13 de setembro de 1980. Cit., p. 610.
36
Discurso, 17 de novembro de 1979. Cit., p. 1183.
37
Discurso, 13 de setembro de 1980. Cit., p. 611.
38
Ibid.

AQUINATE, n°6, (2008), 179-193 185


www.aquinate.net/artigos ISSN 1808-5733

célebre aforismo agostiniano: Fecisti nos ad Te; et inquietum est cor nostrum, donec
requiescat in Te (Confessiones, I, 1)”39. Se nos referimos à teologia, então o
Aquinate se transforma, não menos que São Boaventura e São Bernardo, em
um cantor do primado da caridade”40.
O Papa recorda que “antes que a metodologia técnica de um mestre, a sua
foi a metodologia do santo, que vive em plenitude o Evangelho, no qual a
caridade é tudo (...). O gigantesco esforço intelectual deste mestre do
pensamento foi estimulado, sustentado, orientado por um coração cheio de
amor por Deus e pelo próximo. Per ardorem caritatis datur cognitio veritatis (In Io.
Ev., XV, 6). São palavras emblemáticas que deixam entrever, por trás do
pensador capaz dos vôos especulativos mais ousados, o místico habituado a
atingir diretamente na fonte mesma de toda verdade a resposta às invocações
mais profundas do espírito humano. Não confessou, de resto, ele mesmo de
não ter escrito nem jamais lecionado sem antes recorrer à oração?”41.

3. A FILOSOFIA DO ATO DE SER.

Inevitavelmente, já fizemos algumas referências à filosofia de Santo


Tomás. Queremos agora evidenciar como João Paulo II, conhecendo os
aprofundamentos realizados especialmente neste século por insignes
estudiosos, caracteriza a filosofia do Aquinate como “filosofia do essere, isto é,
do actus essendi”42, indicando desse modo o núcleo do seu pensamento.
Na afirmação do ser, o Papa vê a “auto-justificação metodológica” da
filosofia de Santo Tomás como “disciplina irredutível a qualquer outra
ciência”43 e conjuntamente o fundamento do posto peculiar que ela ocupa no
campo total das ciências, que consiste no “transcender-lhes a todas se pondo
em seus confrontos como autônoma e ao mesmo tempo como complemento
delas em sentido substancial”44.
Também a contemplação do ser se revela hoje vivamente necessária, já
que o valor transcendental do ser “é a via mais direta para elevar-se à
consciência do Ser subsistente e Ato puro, que é Deus”45. Daqui a filosofia de
Santo Tomás deduz “a possibilidade e ao mesmo tempo a exigência de
ultrapassar tudo o que é oferecido diretamente à consciência enquanto

39
Ibid., pp. 611 e 612.
40
Ibid., p. 612.
41
Discurso, 17 de novembro de 1979. Cit., p. 1188.
42
Ibid., p. 1184.
43
Ibid.
44
Ibid.
45
Ibid.

AQUINATE, n°6, (2008), 179-193 186


www.aquinate.net/artigos ISSN 1808-5733

existente (o dado de experiência) para alcançar o ipsum Esse subsistens e


conjuntamente o Amor criador, no qual encontra a sua explicação última (e
por isso necessária) o fato que potius est esse quam non esse e, em particular, o fato
de nós existirmos...”46. Com isso, esta filosofia responde adequadamente à
interrogação metafísica contemporânea formulada pela pergunta: por que o ser
e não, ao contrário, o nada?
A via metafísica para Deus se revela particularmente adaptada para
alcançar a Deus exatamente como criador, já que, como diz o Doutor
Angélico: “Ipsum enim esse est communissimus effectus, primus et intimior omnibus aliis
effectibus; et ideo soli Deo competit secundum virtutem propriam talis effectus (De Potentia,
q. 3, a. 7 c)”47.
A mesma metafísica nos oferece na “analogia transcendental do ser o
critério metodológico para formular as proposições acerca da realidade toda,
ali compreendido o Absoluto. É difícil – sustenta o Papa – supervalorizar a
importância metodológica desta descoberta para a pesquisa filosófica, como,
de resto, também para a consciência humana em geral”48.
Depois desta sintética e profunda caracterização da filosofia do Aquinate,
João Paulo II conclui que “é supérfluo sublinhar o quanto deve a esta filosofia
a teologia mesma, não sendo nada mais que fides quaerens intellectum ou intellectus
fidei. Nem mesmo a teologia, portanto, poderá renunciar à filosofia de Santo
Tomás”49.
É sabido que a necessidade de usar uma filosofia adequada como
instrumento para o aprofundamento teológico da revelação já era objeto de
interesse e de estudo do Papa, particularmente no campo da moral, antes da
eleição à cátedra de Pedro. Em uma das suas visitas às paróquias da Urbe, a
mesma convicção o levava a afirmar, dirigindo-se a sacerdotes e religiosos, que
“muitos naufrágios na fé e na vida consagrada, passados e recentes, e muitas
situações atuais de angústia e de perplexidade têm na origem uma crise de
natureza filosófica. É necessário cuidar com extrema seriedade da própria
formação cultural. O Concílio Vaticano II insistiu sobre a necessidade de
conservar sempre Santo Tomás de Aquino como mestre e doutor, porque
somente à luz ou sobre a base da “filosofia perene” se pode fundar o edifício
assim lógico e exigente da Doutrina cristã”50.

46
Ibid., pp. 1184 e 1185.
47
Cfr. Ibid., p. 1185.
48
Ibid.
49
Ibid.
50
Discurso, 28 de outubro de 1979. In Insegnamenti di Giovanni Paolo II, II, 2 (1979), pp.
995 e 996.

AQUINATE, n°6, (2008), 179-193 187


www.aquinate.net/artigos ISSN 1808-5733

4. ANTROPOLOGIA FILOSÓFICA E CRISTOLOGIA.

Próprio do conhecimento intelectual de quem dedicou muitos anos e


numerosas publicações a temas de antropologia e ética, em diversos discursos
João Paulo II indica um outro importante motivo para a atualidade de Santo
Tomás: “o seu altíssimo senso do homem, tam nobilis creatura (Contra Gentiles,
IV, 1, n. 3337)”51. O Papa se compraz em referir diversas expressões felizes do
Aquinate, que revelam a sua concepção do homem: a pessoa é dita
“perfectissimum in tota natura”52; o homem é comparado ao “mar”, enquanto
recolhe, unifica e eleva em si todo o mundo infra-humano, como o mar
recolhe todas as águas dos rios que para ali se dirigem”53; ou o homem é
definido ainda “como o horizonte do criado, no qual se conjugam o céu e a
terra; como vínculo do tempo e da eternidade; como síntese do criado”54.
Como que resumindo, João Paulo II explica: “O seu vivíssimo senso do
homem não é nunca diminuído em todas as suas obras. Nos últimos tempos
de sua vida, iniciando o tratado da Encarnação na Terceira Parte da Summa
Theologiae, inspirando-se sempre em Santo Agostinho, afirma que somente
assumindo a natureza humana o Verbo podia mostrar quanta sit dignitas humanae
naturae ne eam inquinemus peccando (S. Th., III, q. 1, a. 2). E logo depois
acrescenta: encarnando-Se e assumindo a natureza humana Deus pôde
demonstrar quam excelsum locum inter creaturas habeat humana natura (Ibid.)”55.
Já nestas palavras é claramente sugerida a estreita relação entre a
Cristologia e a visão filosófica do homem própria de Santo Tomás. Tendo em
conta a afirmação da Constituição Gaudium et Spes, n. 22, segundo a qual
somente Cristo “revela plenamente o homem ao homem”, João Paulo II se
pergunta: “Não é talvez a Cristologia o fundamento e a primeira condição para
a elaboração de uma antropologia mais completa, segundo as exigências de
nossos tempos?”56. Esta é a razão da particular profundidade do Aquinate em
sua doutrina sobre o homem. O Papa afirma: “A antropologia tomista
encontra o seu cume e a sua inspiração teológica de fundo no tratado sobre a
Humanidade de Cristo. A análise e a interpretação deste sublime mistério de
salvação levaram o Doutor Angélico a refinar e a aprofundar admirável e
insuperavelmente as noções de sua antropologia, que vieram assim a prestar

51
Discurso, 13 de setembro de 1980. Cit., p. 612.
52
SANTO TOMÁS DE AQUINO, STh. I, q. 29, a. 3.
53
Discurso, 13 de setembro de 1980. Cit., p. 612.
54
Ibid.
55
Ibid., pp. 612 e 613.
56
Discurso, 17 de novembro de 1979. Cit., p. 24.

AQUINATE, n°6, (2008), 179-193 188


www.aquinate.net/artigos ISSN 1808-5733

um extraordinário serviço também no campo puramente racional da ordem


humana e natural”57.
Obviamente, existe também uma relação estreita no outro sentido, já que
a antropologia filosófica de Santo Tomás é um “refinado instrumento de
pesquisa”, que “pode se revelar também hoje utilíssimo ao propor os
contornos válidos de uma autêntica Cristologia, criticando-lhe as
deformações”58. Sem dúvida, as circunstâncias atuais da Teologia tornam
desejável tal estudo antropológico.
Descendo a um plano mais concreto, João Paulo II ressalta como o
Doutor Angélico iluminou, com a ajuda da própria especulação cristológica,
diversos problemas concernentes ao homem: “a sua natureza criada à imagem
e semelhança de Deus, a sua personalidade digna de respeito desde o primeiro
instante da concepção, o destino sobrenatural do homem na visão beatífica de
Deus Uno e Trino”59.
Ao expor sinteticamente a antropologia de Santo Tomás, o Papa
distingue dois aspectos: “a doutrina da natureza humana como ‘unidade de
alma e corpo’ explica, no Doutor Comum, a inteligibilidade do ser humano e
de sua história”, enquanto “a doutrina da pessoa nos orienta de modo especial
do ponto de vista ético para aquilo que é o caminho concreto do homem no
plano da criação e da salvação cristã”60. Não se trata de aspectos
independentes. Pelo contrário, “a antropologia de Santo Tomás – afirma João
Paulo II – une sempre estreitamente a consideração da ‘natureza’ e a da
‘pessoa’, de modo tal que a natureza fundamenta os valores objetivos da
pessoa e esta dá um significado de concretude aos valores universais da
natureza”61.
No que diz respeito à pessoa, o Papa louva a filosofia do homem de
Santo Tomás, porque exprime, “sobre a base da experiência e, sobretudo, dos
ensinamentos da Revelação, uma destacada sensibilidade – tão cara aos
modernos – à condição concreta, histórica, da pessoa humana, à sua –
diríamos hoje – “situação existencial” de criatura ferida pelo pecado e redimida
pelo Sangue de Cristo; à originalidade e dignidade da pessoa singular
(individual); ao seu aspecto dinâmico e moral; à ‘fenomenologia’, em suma –
diríamos ainda com um vocábulo do nosso tempo – da existência humana”62.

57
Discurso, 4 de janeiro de 1986. Cit., p. 24.
58
Ibid.
59
Discurso, 17 de novembro de 1979. Cit., p. 1187.
60
Discurso, 4 de janeiro de 1986. Cit., pp. 22 e 23.
61
Ibid., p. 23.
62
Ibid., p. 22.

AQUINATE, n°6, (2008), 179-193 189


www.aquinate.net/artigos ISSN 1808-5733

Segundo João Paulo II, a estima do Doutor Angélico pela realidade


pessoal é radicada na sua metafísica, na qual “a máxima perfeição é dada pelo
ser compreendido como “ato de ser” (esse ut actus). Ora, a pessoa, ainda mais
do que pela “natureza” e pela “essência”, mediante o ato de ser que a faz
subsistir, se ergue exatamente ao vértice da perfeição do ser e da realidade e,
portanto, do bem e do valor”63.
Como veremos, o Santo Padre deixa espaço à fenomenologia da
existência humana, mas como caminho para a visão metafísica do homem. No
ano de 1980, uma Carta do Cardeal Secretário de Estado assim expressava o
pensamento do pontífice: “A primeira palavra sobre o homem é oferecida pela
ciência – a fenomenologia antropológica precede a antropologia filosófica –
como concreto ponto de partida, mas a última palavra continua reservada à
metafísica, a qual, enquanto recebe das disciplinas científicas um mais
depurado dado de base, oferece a elas um enquadramento sintético e
integrador, abrindo-lhe à perspectiva dos valores e dos fins”64.
Na doutrina do Aquinate, João Paulo II encontra “uma definição precisa
e sempre válida do que consiste a substancial grandeza do homem: Ipse est sibi
providens (Contra Gentiles III, 81). O homem é padrão de si mesmo, pode prover
a si e projetar o próprio destino”65. A escolha desta visão da pessoa como ser
livre revela também neste caso uma sensibilidade do Santo Padre pelos
problemas atuais entre os quais se destaca aquele do sentido da liberdade.
Talvez exatamente para resolver os paradoxos da liberdade na cultura
contemporânea, João Paulo II acrescenta que, considerado em si mesmo, o
fato de ser padrão de si “não decide ainda a grandeza do homem e não garante
a plenitude de sua auto-realização pessoal. Decisivo é somente o fato de que o
homem se submeta no seu agir à verdade, que ele não determina, mas apenas
descobre na natureza, concedida a ele juntamente com o ser” (...). “O Concílio
Vaticano II, qualificando esta auto-providência do homem sub ratione veri com
o nome de ministério real (munus regale), atinge em sua profundidade esta
intuição”66.
Quanto à natureza do homem, João Paulo II afirma que a mesma
exigência, viva hoje na cultura e reforçada pelo ensinamento bíblico, “de evitar
uma antropologia ‘dualista’, como a de opor, de modo quase hostil, a alma ao
corpo” era já compreendida por Santo Tomás e fez com que ele “tenha
deixado de lado em sua antropologia metafísica (e também teológica) a

63
Ibid.
64
Mensagem, 5 de setembro de 1980. In Insegnamenti di Giovanni Paolo II, vol. III, 2
(1980), p. 544.
65
Discurso, 17 de novembro de 1979. Cit., p. 1187.
66
Ibid.

AQUINATE, n°6, (2008), 179-193 190


www.aquinate.net/artigos ISSN 1808-5733

concessão filosófica de Platão sobre a relação entre a alma e o corpo e se tenha


aproximado da concepção de Aristóteles”67.
O Santo Padre recorda que o Doutor Angélico, de acordo com os então
recentes ensinamentos do Concílio de Latrão IV, que haviam apresentado a
natureza humana “quasi communem ex spiritu et corpore constitutam”68, ensina a
“distinção real e essencial entre alma e corpo”, mas ao mesmo tempo sustenta
que “um só é o seu ser: Unum esse substantiae intellectualis et materia corporalis
(Contra Gentiles, II, c. 68). Unum esse formae et materiae, onde a alma é “forma” e o
corpo “matéria” (Ibid.)”69.Com a sua doutrina da alma espiritual como “forma
substancial” do corpo, Santo Tomás “soluciona o árduo problema de uma
relação que salvasse por um lado a distinção dos componentes essenciais e,
por outro, a unidade do ser pessoal do homem”70. Esta doutrina é repetida no
Concílio Ecumênico de Vienne e no de Latrão V, “para permanecer em
seguida como patrimônio da fé católica”71. De fato, o Papa recorda que “a
doutrina antropológica como ‘unidade de alma e de corpo’ foi retomada pelo
Concílio Vaticano II, o qual pôde por isso achar no pensamento do Doutor
Angélico um intérprete particularmente apropriado”72.
Para completar a presente sintética exposição da antropologia tomista,
acrescentemos que nela o Papa vê satisfeita a exigência de “dar fundamento e
justificação aos mais altos valores da pessoa – hoje assim freqüentemente
invocados –, tais como os valores da consciência moral, dos direitos
inalienáveis, da justiça, da liberdade e da paz: em suma, tudo aquilo que
concorre para aclarar o verdadeiro bem do homem redimido por Cristo para
que reconquistasse a dignidade perdida e alcançasse a condição de filho de
Deus”73.

5. O CAMINHO AINDA A PERCORRER.

Santo Tomás “indicou uma via que pode e deve ser levada adiante e
atualizada, sem lhe trair o espírito e os princípios de fundo, mas também
levando em conta as conquista científicas modernas”74. Estas breves reflexões
procuraram recapitular a orientação geral proposta por João Paulo II para

67
Discurso, 4 de janeiro de 1986. Cit., p. 21.
68
DS 800.
69
Discurso, 4 de janeiro de 1986. Cit., p. 21.
70
Ibid., p. 22.
71
Ibid.
72
Ibid.
73
Ibid., p. 23.
74
Ibid., p. 23.

AQUINATE, n°6, (2008), 179-193 191


www.aquinate.net/artigos ISSN 1808-5733

progredir hoje no estudo da filosofia e da teologia na estrada aberta por Santo


Tomás.
O impulso dado pelo Papa me traz à memória – com reconhecimento
filial – o pedido que o Servo de Deus Monsenhor Escrivá75 dirigia a seus filhos
no Opus Dei: de seguir fielmente, sem por isso formar uma escola filosófica ou
teológica peculiar, as indicações da Igreja sobre Santo Tomás no estudo e no
ensinamento. Em concreto, ele insistia sobre necessidade de “cultivar a
doutrina do Doutor Angélico, do mesmo modo que ele a cultivaria hoje se
estivesse vivo”76.
O Romano Pontífice convida a manter “o olhar atento aos sinais dos
tempos, às exigências de maior organicidade e penetração, segundo as diretivas
do Vaticano II (cfr. Optatam totius, n. 16; Gravissimum educationis, n. 10) e às
correntes de pensamento do mundo contemporâneo”77. Poder-se-á, assim,
colher e conservar a alma “universal e perene do pensamento tomista e fazê-la
reviver hoje em diálogo e em um confronto construtivo com as culturas
contemporâneas, assim delas podendo assumir os valores, refutando os
erros”78. O mesmo direcionamento é indicado de modo particular para aquilo
que diz respeito à dignidade do ser humano; sobre o tema, Santo Tomás disse
o essencial, mas “fica ainda muito a indagar neste campo, com a ajuda das
próprias reflexões oferecidas pelas correntes filosóficas contemporâneas”79.
Obviamente, trata-se de um trabalho que requer um estudo desenvolvido
de modo sério e sereno, que distinga bem o nível da pesquisa daquele do
ensinamento, mesmo com relação aos diversos graus deste último. O Papa, de
fato, recorda que “o decreto sobre a formação sacerdotal Optatam totius, antes
de falar da necessidade de levar em conta o ensinamento das correntes
filosóficas modernas, especialmente “daquelas que exercem maior influxo na
própria nação”, exige que “as disciplinas filosóficas sejam ensinadas de modo
que os alunos sejam antes de tudo levados à aquisição de um sólido e
harmônico conhecimento do homem, do mundo e de Deus, baseando-se
sobre o patrimônio filosófico perenemente válido” (cfr. nº 15)”80. Por outro
lado, o Santo Padre propõe estabelecer uma relação de colaboração entre a
filosofia e a ciência: “O verdadeiro progresso da ciência não pode nunca
contradizer a filosofia, como a filosofia não pode nunca contradizer a fé (...). A

75
N. do T. São Josemaria Escrivá, comemorado em 26 de junho, foi beatificado em 17 de
maio de1992 e canonizado em 06 de outubro de 2002 pelo Papa João Paulo II.
76
ESCRIVÁ, J. Carta, 9 de janeiro de 1951, n. 22.
77
Discurso, 13 de setembro de 1980. Cit., p. 613.
78
Discurso, 4 de janeiro de 1986. Cit., p. 23 e 24.
79
Discurso, 17 de novembro de 1979. Cit., p. 1184.
80
Ibid., pp. 1182 e 1183.

AQUINATE, n°6, (2008), 179-193 192


www.aquinate.net/artigos ISSN 1808-5733

luz não pode ser obscurecida, mas só potencializada pela luz. A ciência e a
filosofia podem e devem mutuamente colaborar para que uma e outra
permaneçam fiéis ao próprio método. A filosofia pode iluminar a ciência e
liberá-la de seus limites, assim como, por sua vez, a ciência pode projetar nova
luz sobre a filosofia mesma e abrir-lhe novos caminhos”81.
Gostaria de concluir com as palavras de encorajamento pronunciadas por
João Paulo II por ocasião do encerramento do Congresso Tomista
Internacional de dez anos atrás: “Exorto-vos – ele dizia – a continuar, com
grande empenho e seriedade, a realizar as finalidades da vossa Academia; que
seja um centro vivo, pulsante, moderno, no qual o método e a doutrina do
Aquinate sejam postos em contínuo contato e em sereno diálogo com os
complexos fermentos da cultura contemporânea, na qual vivemos e estamos
imersos”82.

81
Discurso, 13 de setembro de 1980. Cit., pp. 613 e 614.
82
Ibid., pp. 615.

AQUINATE, n°6, (2008), 179-193 193

Potrebbero piacerti anche