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8 Cidade aberta ou o direito a cidade? m todo o mundo, arquitetos, paisagistas e urban desig. iners progressistas € de mentalidade criativa tém se envolvido em projetos de placemaking, propondo a criagao de “cidades mais abertas”. Tratase do mesmo tipo de cidade que, na formulagio sucinta de Gerald Frug (2009), habilitaria “cada residente ¢ visitante a sentir que ele ou ela pertence & cidade [...] independentemente da sua condicao econdmica, raca, religiio ‘ou orientagio sexual, e de qualquer outra maneira que discri- mine as pessoas em categorias”. Embora tais iniciativas sejam geralmente comandadas pelo Estado, bem como por promotores imobilidrios e clientes corporativos, elas também vém surgindo, na maioria das vezes, como resposta as lutas contra as formas de privatizacao, gentrificacio, remogao, isolamento ¢ exclusio socioespaciais desencadeadas no capitalismo péskeynesiano ¢ neoliberal. No contexto desta crise financeira global em curso, na qual o fundamentalismo do mercado continua a ser a ideo- logia politica dominante da maioria dos governos nacionais ¢ ocais, propostas para confrontar essas profundas divisoes sociais ce espaciais das cidades do século XI sao certamente bem-vindas por todos aqueles que se empenham em promover formas mais justas, igualitarias, democraticas, diversas, cosmopolitas ¢ tole- rantes de vida urbana (FAINSTEIN, 2009; SOJA, 2010). Mas, de que modo intervengées relativamente pequenas no desenho urbano poderiam enfrentar a tarefa monstruosamente dificil - tal como Richard Sennett questiona - de “curaras divisoes da sociedade em raga, classe ¢ etnia”? (SENNET, 2013). Hoje em dia, até mesmo os designers mais radicais também se veem enre- dados nos contextos politico-institucionais em que trabalham, contextos esses geralmente definidos pelos imperatives naturali- 195 Cidade aberta 0x o direito @ cidade zados da politica econémica urbana orientada para o mercado € para o crescimento “acima de tudo” € das abordagens de gover nanga urbana nas quais os interesses corporativos ¢ de incorpo- racio imobilidria mantém controle hegem@nico sobre os regimes ocais de uso do solo. Na pritica, vale dizer que as propostas dos designers em “abrirem” a cidade por meio de iniciativas baseadas naqueles tipos de projetos contribuiram, amitide, para intenst ficar ainda mais as proprias formas de injustica espacial as quais pretendiam combater originalmente, pelo menos em termos ret6ricos. Isso ocorre porque as condicdes espaciais associadas a esse tipo de “urbanismo aberto” - a exemplo do surgimento de freas densas de centralidade, interacio, trocas miituas, diverst- dade e encontro espontineos ~ também geram, frequentemente, grandes retornos econémicos na forma de lucros privados apro- priados pelos donos de terra ou de iméveis situados no proprio Jocal ou nos arredores contemplados por esses projetos. Embora muitos lugares tenham se valido temporariamente da utilizacio de instrumentos de reinvestimento comunitério, ‘com zeladores locais ¢ mecanismos de participagéo nos lucros, nessas reas experimentais do urbanismo, a tendéncia global predominante continua a apontélo para os interesses das “maquinas de crescimento” - interesses frequentemente vincu- Iados a investimentos especulativos ¢ predatérios dos recursos financeiros globais de mercados - de modo a colher as principais recompensas financeiras derivadas daf. Por conseguinte, essas iniciativas do inicio do século XXI em prol da construcio de um “bem comum urbano” também produzem reiteradamente 0 efeito oposto: a producao de uma cidade em que as classes dominantes continuam a reforcar seu controle rigido da producio ¢ da apro- priagdo do espaco urbano. Por mais socialmente vibrantes ¢ este- ticamente atraentes esses tipos de urbanismos chegam a ser, por outro, muitas das vezes, nao oferecem mais do que um vislumbre fagaz do que seria o modelo de urbanismo genuinamente demo- cratico ¢ socialmente igualitério impedido de se ampliar numa escala maior, urbana ou metropolitana, pelas forcas politico-ins- titucionais € coalizagbes que geralmente os levam a se circuns- 196 Cidade aberta ou 0 divito@ cidade ereverem a uma escala menor, A “cidade aberta” se transforma, assim, numa ideologia que mascara, ou que talvez simplesmente suaviza, as abordagens top-down do planejamento urbano, a gover- nanca orientada pelo mercado, a exclusio e as remogées em jogo durante € apés o redesenho desses espacos supostamente “revi- talizados”. caso do High Line, no bairro do Chelsea, em Manha- ttan, Nova York, exemplifica esse problema. Uma intervencio urbana brilhante ¢ bem planejada, inicialmente liderada por uma iniciativa comunitéria, destinou um espaco industrial até entao inacessfvel para 0 uso puiblico, contando com grande aclamagio Popular. Porém, ao fazélo dessa maneira, incitou um processo de gentrificagao a partir da onda de novos investimentos orien- tados principalmente para consumidores da elite, que acometeu as quadras no entorno com a chegada de hotéis ¢ residéncias de luxo, restaurantes de alta qualidade, cafés ¢ lojas que sé podem ser desfrutados pelos moradores mais ricos e pelos turistas. Assim, nota-se uma intervenco urbana que, embora inicialmente orientada para expandir e ativara esfera do bem comum urbano, acabou por estimular processos de gentrificacio, remocao, segre- gacio ¢ exclusio na escala de bairro e do préprio espaco urbano (LOUGHRAN, 2014; REICHL, 2016). Dessa forma, a cons- trugio de um espaco urbano supostamente “aberto” criou novas barreiras ao desenvolvimento de um urbanismo genuinamente Piiblico, democratico, diverso € igualitério, no apenas no local de imterven¢4o, mas em todo 0 tecido urbano que circunda os edificios, quadras ¢ bairtos inteiros. Nas principais cidades do mundo, em diferentes contextos, narrativas parecidas a do High Line poderiam ser infelizmente elencadas tendo como referéncia uma lista extensa de projetos proeminentes de desenho urbano, cujos efeitos desfavordveis advieram, apesar disso, da imple- mentacio de conceitos criativos, habilidosos ¢ ostensivamente progressistas de design (SORKIN, 2009; FAINSTEIN, 2011). Em que medida, ¢ de que forma, a pratica do desenho Provoca resultados t4o retrégrados? A primeira vista, esses problemas parecem ser menos culpa da complexidade em si das 197 Gidade aberta ow o divito @ cidade concepcdes do desenho urbano do que do sistema mais amplo de leis, por exemplo, que rege o uso da terra, a propriedade, 0 financiamento, a tributacio, o investimento e os bens ptiblicos na cidade, regio e territério porventura atendidos por esses projetos. Certamente, os designers nao podem ser criticados por condicionarem sua criatividade as restrigdes impostas por esses regimes legislativos. Afinal, quais outras opges poderiam escolher, uma vez que nio detém controle ou influéncia sobre ‘0s fluxos de investimento, propriedades € decisdes politicas? E, mesmo que as condicdes de trabalho impostas pelo cliente sejam inferiores as condicées ideais necessdrias, nado é muito melhor ver um projeto bom, criativo ¢ imaginativo implementado do que um mau, pouco auténtico e chato? Do meu ponto de vista, as formulacées acima oferecem uma_ perspectiva insuficientemente critica sobre o papel dos desig- ners ¢ das profissdes correlatas, cujas experiéncias, capacidades criativas ¢ forga de trabalho sao recorrentemente aproveitados, no entanto, para mascarar, naturalizar, gerenciar ou suavizar as contradi¢ées espaciais do urbanismo neoliberal. De forma bastante ingénua, esse posicionamento insinua que 0 desenho urbano se trata de um produto isolado tanto como pritica profis: sional, bem como forma de engajamento social dos contextos politico-econémicos mais amplos em que est incorporado € que alimenta e enquadra ativamente suas operacées cotidianas. Esses pressupostos sao insustentaveis, tanto na perspectiva empirica € politica, como na ética; tal como observa Edward Soja (2009), eles envolvem um reducionismo bastante miope no qual a proble- miatica da remodelagdo da vida urbana é reduzida a um exame microscépico “de como ela se organiza e na qual a aparéncia do bando de prédios e edificios que a compéem esta dissociada de seu contexto urbano e regional maior” (p. 258). Os designers preocupados com a justica social - isto é, com: a cidade aberta em um sentido genuinamente democritico € igualitério - podem e devem amadurecer, para além da visio formal ¢ espacialmente reducionista da cidade como se fosse constituida por um “bando de edificios construidos dentro de 198

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