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UNIVERSIDADE INTERNACIONAL DA PAZ (UNIPAZ-GOIÁS)

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM PSICOLOGIA


ANALÍTICA

RENATA FIORESE FERNANDES

MEMÓRIAS E CONCEPÇÕES JUNGUIANAS: UM BREVE RELATO

GOIÂNIA
2019
RENATA FIORESE FERNANDES

MEMÓRIAS E CONCEPÇÃO JUNGUIANAS: UM BREVE RELATO

Artigo apresentado para obtenção de nota referente ao Núcleo


de Fundamentos de Psicologia Analítica do Curso de Pós-
Graduação em Psicologia Analítica realizado pela Universidade
Internacional da Paz (UNIPAZ-GOIÁS).

Orientadora: Profa. Dra. Sonia Bufarah Tommasi

GOIÂNIA
2019
Infância e Adolescência: A Origem

Jung nasce em 1875 em Kesswill, uma comuna da Suíça, no cantão Turgóvia, tendo seus
pais mudado seis meses depois para o presbitério do castelo de Laufen, próximo as cataratas do
Reno. Suas primeiras lembranças datam já de seus três, quatro anos de idade, marcadas fortemente
por seu deslumbramento pela natureza, sendo os primeitos vislumbres da manifestação de sua
curiosidade e, mais tarde, por intenso estudo da psicologia primitiva.

Jung foi um homem complexo, assim como configurou-se sua criação - a Psicologia
Analítica ou Profunda. Ainda criança, apresentava-se como um ser bastante peculiar, questionando-
se desde cedo sobre a origem e o objetivo da vida. Foi esta, umas das questões principais que o
fizeram divergir tantas vezes das concepções e ações de seu pai. Pastor luterano, via seu pai como
um homem conformado e ao mesmo tempo angustiado, e isto se deu, de acordo com as observações
de Jung, por ele nunca ter se permitido aprofundar nos mistérios da divindade, no sentido de
questionar-se sobre sua natureza e sobre suas múltiplas manifestações.

Em 1878, devido à uma iminente separação de seus pais, ele adoece, sofrendo de um eczema
generalizado, seguido de um afastamento da mãe, que durante vários meses, permanecera no
hospital de Basileia em consequência de sua decepção matrimonial, ficando Jung aos cuidados de
uma tia e da empregada.

Aqui ele destaca vários fragmentos de lembranças relacionados a esta moça, descrevendo
algumas características físicas particulares, parecendo ela se tratar de origem oriental, e assinala que
estas características mais tarde se tornaram aspectos de sua anima e de sua compreensão da
quintessência do feminino, da alma do feminino – ideia posteriormente desenvolvida em Os
Arquétipos e o Inconsciente Coletivo:

“A anima não é alma no sentido dogmático, nem uma anima rationalis, que é um conceito
filosófico, mas um arquétipo natural que soma satisfatoriamente todas as afirmações do
inconsciente, da mente primitiva, da história da linguagem e da religião. Ela é um "factor"
no sentido próprio da palavra. Não podemos fazê-la, mas ela é sempre o a priori de
humores, reações, impulsos e de todas as espontaneidades psíquicas. Ela é algo que vive por
si mesma e que nos faz viver; é uma vida por detrás da consciência, que nela não pode ser
completamente integrada, mas da qual pelo contrário esta última emerge...Embora pareça
que a totalidade da vida anímica inconsciente pertence à anima, esta é apenas um arquétipo
entre muitos. Por isso, ela não é a única característica do inconsciente, mas um de seus
aspectos. Isto é mostrado por sua feminilidade.” (JUNG, 2000, p. 37)

Na primeira infância, suas preocupações se concentravam na compreensão do universo


religioso que o circulava, tendo tido alguns sonhos relacionados a Jesus e a sua tentativa
inconsciente de compreendê-lo. Ele se refere à um sonho em particular, o primeiro do qual ele se
recorda, no qual vê um falo ritual ereto sentado em um trono de ouro em uma câmara fúnebre
ornamentada, seguida de uma voz, que ele associara com a de sua mãe, dizendo se tratar do
“devorador de homens” (2016, p.36). Isto o surpreendeu profundamente e tanto a imagem quanto o
sentimento que o sonho despertara o acompanhou por grande parte de sua vida:

“Esse sonho de criança iniciou-me nos mistérios da Terra. Houve nessa época, de certa
forma, uma catacumba onde os anos se escoaram até que eu pudesse sair de novo. Hoje, sei
que isso aconteceu para que a mais intensa luz possível se produzisse na obscuridade. Foi
como que uma iniação no reino das trevas. Nessa época principiou inconscientemente
minha vida espiritual.” (JUNG apud JAFFÉ, 2016, p. 37)

Desde então, Jung se questionou sobre a face sombria de Deus sem nunca atraver-se à
compartilhar sua angústia com quem quer que fosse, já que sua atmosfera não favorecia
questionamentos deste teor, guardou seus temores – os primeiros vislumbres do aspecto sombrio da
psique, que depois ele relaciona com sua anima:

Com o arquétipo da anima entramos no reino dos deuses, ou seja, na área que a metafísica
reservou para si. Tudo o que é tocado pela animatoma-se numinoso, isto é, incondicional,
perigoso, tabu, mágico. Ela é a serpente no paraíso do ser humano inofensivo, cheio de bons
propósitos e intenções. Ela convence com suas razões a não lidar-se com o inconsciente,
pois isso destruiria ínibições morais e desencadearia forças que seria melhor permanecerem
inconscientes. Como quase sempre, ela não está totalmente errada; pois a vida não é
somente o lado bom, é também o lado mau. Porque a anima quer vida, ela quer o bom e o
mau.” (JUNG, 2000, p. 37)

Filho único, ele descreve várias brincadeiras solitárias, dentre as quais destaca seu interesse no
fogo e de como ele precisava mantê-lo sempre aceso em uma brecha na parede de pedra que havia
no jardim e ainda suas experiências com construções usando blocos de madeira, e outra ainda mais
instigante e singular, foi quando ele descreve ter esculpido em uma das extremidades de uma régra
de madeira, a figura de um homem com “fraque, cartola e sapatos lustrosos” e o colocou em um
estojo, “onde lhe preparara um pequeno leito” (2016, p. 42), pintara também, uma pedra, que
carregara durante muito tempo, referindo-se à pedra como propriedade do homenzinho.

Somente depois, nos seus 35 anos, que este fato voltara a consciência quando então Jung se ocupava
da preparação de seu livro Metamorfoses e símbolos da libido, ele lê acerca dos esconderijos dos
antigos australianos para guardar suas pedras da alma, muio semelhantes à pedra que pintara:

“Com retorno dessa lembrança fui, pela primeira vez, levado à ideia de que existem
elementos arcaicos na alma, que não penetraram na alma individual a partir de uma tradição
qualquer. Não havia, com efeito, na biblioteca de meu pai – que, nota bene, só explorei
muito mais tarde – um só livro que contivesse tais informações. É fato comprovado que
meu pai ignorava tudo acerca dessas coisas.” (JUNG apud JAFFÉ, 2016, p. 44)

Aqui já começa a delinear-se sua experiência e compreensão do inconsciente como algo


mais amplo e impessoal, que ligava de certa forma todos os homens a toda a história da humanidade
– o Inconsciente Coletivo – conceito que fez com que se divergisse das ideias de Freud.

Em seu contato com os primeiros colegas da escola rural, ainda na primeira infância, relata
sobre a percepção de um segundo aspecto de sua personalidade, já que a convivência com os
amigos, o fazia se comportar de maneira inusual, fazendo as mais diversas travessuras, por
influência de seus colegas e pelo temor de não ser aceito no grupo.

“Nessa época da minha primeira infância fiz uma descoberta, convivendo com meus
colegas da escola rual: eles me alienavam de mim mesmo. Na companhia deles eu me
tornava diferente do que eu era em casa, quando só. Participava de travessuras e chegava a
inventar algumas que jamais me teriam ocorrido. Sabia perfeitamente que poderia só, em
casa, tramar uma variedade de coisas. Parecia-me, porém, que essa mudança era devida à
influência de meus companheiros, os quais de certa forma me arrastavam e me constragiam
a ser diferente do que eu costumava ser.” (JUNG apud JAFFÉ, 2016, p. 40)

Estas primeiras experiências estão associadas com sua posterior concepção da persona e das
personalidade nº 1 e n º 2 que ele também observara algumas vezes em sua própria mãe, salietando
até mesmo a diferença de seu tom de voz.

“O jogo alternado das personalidades nº 1 e nº 2, que persistiu no decorrer da minha vida,


não tem nada em comum com a 'dissociação', no sentido médico habitual. Pelo contrário, tal
dinâmica se desenrola em todo indivíduo. Em primeiro lugar, são as religiões que sempre se
dirigiram ao nº 2 do homem, o 'homem interior'. Em minha vida, o nº 2 desempenhou papel
principal e sempre exprimentei dar livre curso àquilo que irrompia em mim, a partir do
íntimo. O nº 2 é uma figura típica que só é sentida por poucas pessoas. A compreensão
consciente da maioria não é suficiente para perceber sua existência.” (JUNG apud JAFFÉ,
2016, p. 63)

Na adolescência, com a entrada no ginásio de Basileia, se percebe pobre, diferente de seus


colegas. A grande maioria se gabava de passar as férias nos Alpes de Zurique, enquanto ele
conseguira uma bolsa de estudos devido ao cargo do pai. Foi também nesta mesmo época que sua
irmã nascera.

A escola o aborrecia, ele não se dava bem com aritmética, além das diferenças já citadas
com os colegas. Aos 12 anos, em uma briga com outro colega, leva um soco, batendo a cabeça no
chão e então percebe uma oportunidade de se abster dos dias enfadonhos de estudos. Durante os
seis meses seguintes, sempre quando diziam ser necessário ir à escola, Jung sofria ataques,
desmaiando. Satisfeito, passava seu tempo perto da natureza, desenhando e lendo, exatamente como
queria.
Um dia escutara seu pai conversando com um amigo, expressando sua preocupação com
suas crises, já que eram pobres e os ataques impediriam Jung de conseguir trabalhar e ganhar a
vida. Sua reação foi ir direto para bibliteca do pai e esforçar-se a estudar, até que as crises
cessassem e assim fizeram. Foi o momento que ele compreendeu o que era uma neurose, tornando-
se consciente de sua participação ativa em sua produção.

Logo depois, de volta a sua rotina, enquanto percorria o trajeto até escola, teve um súbito
insight, descrito como uma sensação de emerssão de uma névoa espessa, tomando consciência de
sua individualidade, do eu, sendo invadido por um senso de autoridade de um homem velho e sábio,
tornando-se explícita essa cisão de sua personalidade que só muitos anos mais tarde entende como
sendo o Filemon, um ser criado em suas experiências de imaginação ativa, o guru de suas fantasias,
que lhe transmitia saberes valiossíssimos, que de outra forma não poderia obté-los, sendo este
relacionado também ao homenzinho que ele esculpira muitos anos antes e que mantivera escondido
no sótão – posteriormente desenvolvido como o arquétipo do velho sábio:

“O mago é sinônimo do velho sábio, que remonta diretamente à figura do xamâ na


sociedade primitiva. Como a anima, ele é um daimon imortal que penetra com a luz do
sentido a obscuridade caótica da vida. Ele é o iluminador. o professor e mestre, um
psicopompo (guia das almas) de cuja personificação nem NIETZSCHE, o 'destruidor das
tábuas da Lei', pôde escapar. Na vivência deste arquétipo, o homem moderno experimenta a
forma mais arcaica do pensar, como uma atividade autônoma cujo objeto somos nós
mesmos. Hermes Trismegisto ou o Thoth da literatura hermética, Orfeu, o Poimandres e seu
parentesco com o Poimen de Hermes são outras formulações da mesma experiência. Se o
nome 'Lucifer' não fosse marcado pelo preconceito, seria provavelmente o nome mais
adequado para este arquétipo. Bastou-me por isso designá-lo como o arquétipo do veiho
sábio, ou do sentido.” (JUNG, 2000, p. 45, grifo do autor)

Ainda adolescente, retornando da escola em um dia de verão, apreciando o céu azul e os


raios solares, agradecendo à vida e a benfeitoria do Bom Deus, arrebata-lhe um poderoso
pensamento, ele imagina Deus sentado em seu trono acima de uma cathedral, admirando sua
criação, quando subitamente, vê um excremento caindo sobre o teto da igreja, destruindo-a. Esta
fantasia leva-o a pensar sobre o desejo de Deus de que os homens pudessem pecar, remontando até
o mito de Adão e Eva e na criação da serpente com o único fim de persuadi-los ao pecado.

Essa ideia o perturbou durante muito tempo, levando-o a procurar nos livros do pai algo que
confirmasse sua experiência, que dissesse sobre a face obscura de Deus, mas nada encontrara. Nesta
época, ele fica ainda mais desconfiado em relação aos discursos do pai, descrevendo suas palavras
como “insípidas e vazias, tal como as de uma história contada por alguém que nela não crê, ou que
só a conhece por ouvir dizer.” (2016, p. 61). Mas Jung ainda mantinha esperança de conseguir
ajudar o pai a sentir a maravilhosidade da vontade de Deus, travando com ele inúmeras discussões,
já com seus 18 anos. No entanto, suas discussões jamais chegavam a uma solução satisfatória.

Sempre dedicado, chegou a ser o melhor aluno de sua turma no colegial, mas como
despertara inveja e competição com os colegas, acabara por tornar-se o segundo. Alguns
professores o perseguiam, tendo sido acusado até mesmo de plágio, o que muito o aborreceu e o
fizera sentir ainda mais desconfiado e distante do “mundo dos homens”.

Universidade e o Encontro com Freud: O Atrito

A escolha da profissão não foi tarefa fácil. Sua gama de interesses era vasta, e iam desde a
filosofia, as ciências naturais, até a arqueologia. Pelo seu íntimo contato com a natureza, durante
algum tempo considerou seguir carreira nas ciências naturais e foi por esse caminho que logo
depois surgiu a ideia de estudar medicina, como seu avó paterno, de mesmo nome.

Com a influência de seu pai, conseguiu, em 1895, uma bolsa de estudos na Universidade de
Basileia. Um ano depois, seu pai faleceu, afastando Jung temporariamente dos estudos devido a
obrigação iminente de cuidar financeiramente da família. Pouco depois, com a ajuda de alguns
parentes, conseguiu restabelecer-se e logo retornou à Universidade.

Se juntou a Sociedade de Zofingia, ao qual seu pai, em seus tempo de estudante de filosofia,
também pertencera, e lá conheceu e estabeleceu várias amizades preciosas que muito lhe ensinaram
sobre teologia que ele sempre demonstrou imenso interesse. Quanto as ciências naturais presente
nos primeiros anos da medicina, por mais que abarcasse uma infinidade de conhecimentos, tratava
de campos especializados e portanto, não aprofundava nas questões fundamentais que o instigavam.

Pouco tempo depois, descobrira na biblioteca do pai de um colega de estudos, um livro dos
anos 70 sobre a aparição de espíritos. O material muito o impressionou pela semelhança que ele
identificara com os relatos e histórias que ele presenciara desde os tempos de menino. Logo
constatou que as mesmas histórias eram contadas em diferentes lugares do mundo desde os tempos
mais remotos. Se questionando sobre tal fato, pressupôs que se tratava de algo relacionado com o
comportamente objetivo da alma humana, mas ainda restava a dúvida sobre a essência da natureza
da alma.

O assunto muito o instigou, mas na tentativa de discutir sobre com os colegas descobriu
imensa resistência em tratar sobre o tema, o rechassavam, dizendo se tratar de charlatanismo ou
impossibilidade. Mas isso não diminuiu o interesse de Jung, que continou pesquisando e devorando
toda obra relacionada ao espiritismo, fenômenos parapsicológicos, buscando referências de
investigação na perspectiva filosófica e psicológica.
Na primeira seleção para estágio, por assim dizer, se torna sub-assistente de anatomia e no
semestre seguindo é encarregado da direção do curso de histologia. Se interessava pela teoria da
evolução, pela anatomia comporada e pela teoria neovitalista. Nesta mesma época teve contato com
o controvérsio trabalho de Nietzsche e se identificara com seu Zaratrusta por conta de sua
semelhança com sua personalidade nº 2. Carregava uma angústia escondida de compartilhar do
mesmo isolamento do estimado filósofo, pois como seu contato com o espiritismo lhe demostrara,
seu interesse perpassava muitas vezes dos limites racionais de alguns.

Depois de presenciar dois acontencimentos impressionantes em sua casa, onde um móvel de


madeira rachara sem motivo aparente e uma lâmina de uma faca ficara estatelada, descobriu que
alguns membros de sua família estavam participando de “mesas giratórias” com influência de uma
jovem médium com pouco mais de 15 anos. Passou a se encontrar com essa jovem todo o fim de
semana afim de investigar os fenômenos e foi então, que tais observações, deram origem a sua tese
de doutorado – Sobre a psicologia e a patologia dos assim chamados fenômenos ocultos, de 1902.

Ao fim de seus estudos médicos, fora convidado por Mueller a acompanhá-lo como
assistente em Munique, mas logo depois, encontrara na psiquiatria um campo de encontro entre seu
interesse na natureza com os misteriosos dados espirituais que até então experenciara e acabou indo
para Zurique, para o hospital de Burghölzli, em 1900.

Lá, ele confrotara a natureza objetiva da análise psiquiátrica que restringia-se a avaliar os
sintomas e decretar diagnósticos, abstendo-se completamente da personalidade do doente mental,
não havendo interesse algum em sua individualidade. Sentindo-se insatisfeito com tal abordagem e
na esperança de descobrir novas formas de atuação, deu de encontro com as pesquisas de Freud
sobre a psicologia da histeria e do sonho.

Em 1905, torna-se professor de psiquiatria da Universidade de Zurique e desenvolve esta


função até 1913, ministrando cursos de psicopatologia e psicanálise. Em paralelo, mantinha seu
consultório particular e passara mais alguns anos no hospital de Burghözli como médico-chefe,
encerrando suas atividades em 1909.

Em sua prática percebera que a história de vida dos pacientes era base fundamental para
compreensão de seu adoecimento, fosse em casos mais brandos, como nas neuroses, ou nos mais
graves, como na esquizofrenia, a causa primeira do desenvolvimento da doença parecia se
concentrar em eventos mobilizadores de uma carga emocional tão intensa que o indivíduo se
tornara incapaz de lidar, dando origem ao adoecimento psíquico.

No decorrer de suas pesquisas Jung foi se debruçando cada vez mais sob o conteúdo trago
pelos seus doentes, procurando obter um sentido de seus delírios e associando com sua história
pessoal. Em alguns casos de fragmentação mais evidente das então chamadas “demências precoces”
ele afirma intuir a presença de uma parte da psique que se mantinha à espreita, observando, a espera
de uma oportunidade de reorganização, o que parece ser um dos primeiros vislumbres do arquétipo
do Si-Mesmo.

A partir de suas experiências e análises das associações de palavras, experimento conduzido


no hospital em que trabalharava sob supervisão de Bleuler, Jung teve seu primeiro contato com a
obra de Freud com seu livro Interpretação dos sonhos que lhe elucidara sobre os mecanismos de
recalque das neurores obsessivas e das psicoses, embora não concordasse que as causas fossem
todas de natureza sexual.

A obra de Freud auxiliou Jung a perceber os mecanismos de recalque que envolviam os


complexos:

“A importância que eu atribuía a ela se ligava ao fato de encontrar frequentemente recalques


no curso de minhas experiências de associações; a certas palavras indutoras, os pacientes
não encontravam resposta associativa ou davam-na somente depois de um tempo de reação
prolongado. Pareceu-me logo que tal perturbação se produzia cada vez que a palavra
indutora tocava uma dor moral ou um conflito.” (JUNG apud JAFFÉ, 2016, p. 155)

Tais observações o levaram a escrever Psicologia da Demência Precoce, obra que fez com
que Freud o convidasse para ir até Viena visitá-lo. O primeiro encontro foi de muito entusiasmo e
levou à uma discussão de treze horas quase ininterruptas, porém, Jung logo percebeu a resistência
de Freud em discutir outros fenômenos por qual ele se interessava, como a espiritualidade e a
experiência do numinoso.

Na medida em que essa relação se estreitava, Jung percebera que tal fato devia -se a
concepção mística que Freud atribuira ao sexo, mas que devido à necessidade de ater-se a
descrições objetivas, já que lhe era de suma importância categorizar a psicanálise como ciência,
nunca conseguira expressar a intensidade que a sexualidade lhe conferia.

Em 1909, Jung lhe confrotara a respeito dos fenômenos parapsicológicos e da precognição o


que Freud ignorara com veemência, foi então que nesse momento eles presenciaram um estalido na
estande de madeira ao lado, o que causara uma forte impressão em ambos e suscitara a
desconfiança de Freud em relação ao seu herdeiro demarcando o começo do fim desta colaboração.

Em uma viagem aos Estados Unidos em que ambos foram convidados a ministrar
conferências sobre psicologia, Jung teve um sonho e compartilhou com Freud para que este o
analisasse. Já alguns dias, Freud estivera convencido sobre um desejo oculto de Jung por sua morte,
o que levou-o a interpretar o sonho por este viés. Para Jung, contudo, o sonho fora um prelúdio à
sua concepção dos arquétipos como manifestações do instinto primitivo do homem:

“Por causa desse sonho pensei, pela primeira vez, na existência de um a priori coletivo da
psique pessoal, a priori que considerei primeiramente como sendo os vestígios funcionais
anteriores. Só mais tarde, quando minhas experiências se multiplicaram e meu saber se
consolidou, reconheci que esses modos funcionais eram formas do instinto: os arquétipos.”
(JUNG apud Jaffé, 2016, p. 168)

Tal sonho fizera com que ele retomasse seus estudos sobre arqueologia, aprofundando em
leituras sobre simbologia e mitologia na tentativa de maior compreensão sobre a base da
constituição do inconsciente. Já nessa época Jung pesquisava sobre a alquimia medieval e com todo
esse conteúdo ele escreve Metamorfoses e símbolos da libido, livro que custara seu envolvimento
com Freud e a psicanálise, fazendo-o passar por um período de isolamento do meio acadêmico.

O Confronto com o Inconsciente

Após o rompimento com Freud Jung deu-se de cara com o desconhecido, com o
inexplorado. Ao mesmo tempo que se sentia perdido e repleto de dúvida, a dissolução dos laços
teóricos com a psicanálise lhe abriu infinitas possibilidades de exploração e de elucidação de suas
próprias ideias.

Foi então que ele se pôs a pesquisar as profundezas da própria alma, realizando
experimentos que mais tarde dera o nome de imaginação ativa, permitindo que suas fantasias, das
mais grotescas às mais celestiais, jorrassem ao campo da consciência, sem preocupar, a priori, em
lhes exprimir qualquer sentido racional, mas mantivera-se registrando os pormenores de todo o
conteúdo emergente.

Ousando o passo no escuro, Jung preferiu por abdicar de seu cargo na Universidade para se
dedicar às suas experimentações, além de julgar que não se encontrava apto naquele momento para
lecionar, afinal ele próprio estava repleto de dúvidas e incertezas. Em suas memórias, ele relata que
sempre quando tinha tempo livre, e todas as noites, se dedicara em mergulhar em suas fantasias,
deixando emergir imagens do inconsciente e registrando-as à grosso modo, no que mais tarde deu
origem ao seu Livro Vermelho.

Obra esta digna das elucubrações dos livros alquimistas medievais, repletas de gravuras
pintadas por ele, além de diversas mandalas. A produção das mandalas surgiu espontaneamente e
durante muito tempo Jung não entendia do que se tratava e qual o objetivo de tal ato. Foi quando
recebara de Wilhelm um antigo texto alquímico taoista chinês que o auxilou a clarear muito do que
fazia.

Na filosofia oriental antiga, Jung (2016) compreendera que a mandala é um símbolo de


formação e transformação, através da qual a psique exprime uma certa ordem e objetividade no
tocante ao seu desenvolvimento, apresentando uma tentativa de organização dos conteúdos
psiquícos em volta de um centro principal, em torno de uma totalidade, que mais tarde ele chama de
Si-Mesmo.

“De 1918 a perto de 1920, tornou-se claro para mim que a meta do desenvolvimento
psíquico é o Si Mesmo. A aproximação em direção a este último não é linear, mas circular,
isto é, 'circum-ambulatória'. Uma evolução unívoca existe quando muito no princípio;
depois, tudo não é mais que referência ao centro. Compreender isso deu-me firmeza e,
progressivamente, restabeleceu-se a paz interior. Atingira, com a mandala – expressão do 'si
mesmo' – a descoberta última a que poderia chegar. Alguém poderá ir além, eu não.”
(JUNG apud JAFFÉ, 2016, p . 201)

Todo esses conteúdos emergentes deste processo Jung desenvolve enfim, no decorrer de sua
carreira, dando origem aos seus mais importantes conceitos como: Inconsciente coletivo,
Arquétipos (Anima/ Animus), Complexos, dentre outros:

“Os anos durante os quais me detive nessas imagens interiores constituiram a época mais
importante da minha vida e neles todas as coisas essenciais se dediciram. Foi então que tudo
teve início e os detalhes posteriores foram apenas complementos e elucidações. Toda minha
atividade ulterior consistiu em elaborar o que jorrava do inconsciente naqueles anos e que
inicialmente me inundara: era a matéria-prima para a obra de uma vida inteira.” (JUNG
apud JAFFÉ, 2016, p. 204)

Conclusões e considerações pessoais

Ler sobre a riqueza do mundo interior de Jung me fez acessar lugares em mim que
desconhecia. Através de suas palavras descobri a intensidade viva de meu próprio mundo interior.
Recobrei sentidos, penetrei nas sombras, me desconstrui e reconstrui mais vezes do que posso
contar. Através de suas palavras, recobrei memórias há muito reprimidas, entendi comportamentos
que rechaçava, escolhas tomadas, e percebi a presença vívida de um aspecto dentro de mim que
parece me direcionar ao caminho do coração.

Quando criança, eu tinha o hábito de colocar um colchão no fundo do quintal da casa dos
meus pais para ficar olhando o céu horas sem fim, até que minha vista se confundisse com o espaço
a ponto de eu esticar os braços na tentativa de agarrá-lo em minhas pequenas mãos. Lembro de
olhar para as estrelas e ter a nítida impressão de pertencer ao espaço, de que minha vida na Terra
não passava de uma passagem, que era preciso descobrir ao que viera, concluir minha missão e
retornar para casa.

Quando me perguntavam o que eu queria ser quando crescesse minhas respostas oscilavam
entre astrônoma, arqueologista ou paleontóloga, demostrando um claro interesse pelo passado da
humanidade. Eu tinha vários livros sobre dinassauros e sociedades antigas, questionava-me
constantemente sobre a origem do Universo e dos homens, queria entender qual era o propósito dos
humanos na Terra e o sentido da vida.

Todas estas inquietações conseguiram me levar de alguma forma até a Psicologia, onde parte
das minhas questões foram respondidas, mas foi apenas quando encontrei a teoria de Carl Gustav
Jung que algo se ascendeu dentro de mim. Inicalmente comecei o curso de pós-graduação na
certeza que em algum momento eu descobriria alguma falha em sua teoria ou alguma concepção
que não faria sentido para mim e eu não concordaria, mas isso não aconteceu.

Me pego espantada, lendo suas obras, com a capacidade deste homem de explorar lugares
tão profundos da alma humana. Sei que de alguma maneira, todos que se atraiem por sua teoria,
possuem o arquétipo do Self trabalhando as escondidas nos confins do inconsciente, pelo menos,
em mim, sinto sua força que me impulsiona a procura do sentido, e isto, desde que me entendo por
gente.

Depois de formada, a procura do rumo a seguir, intui que era necessário trabalhar minhas
bases, feminino e masculino, minhas raízes fundamentais. Cheguei a esta conclusão por uma série
de vivências, memórias infantis de repressão e negligência, experiências de uma sexualidade sem
respeito, sem entrega. Percebi minha persona utilizada durante o período da Universidade e eu não
queria mais interpretar aquele papel, queria me permitir descobrir novas nuances de mim mesma.

De volta à minha origem, à minha cidade natal e a casa dos meus pais, depois de oito anos
longe, foi clareando ainda mais questões, que pela falta de convivência, não eram tão óbvias para
mim. Precisei ressignificar, através da relação próxima com eles, todas minhas concepções sobre
meu feminino e meu masculino, que atrelado aos estudos concomitantes da pós, pude compreender
se tratar de meus complexos materno e paterno e do Animus presente em mim.

E a medida que vou me inteirando da obra de Jung e de seus colaboradores, meu mundo fica
maior, descubro novas facetas sobre mim mesma, sobre o mundo e sobre os outros, ampliando
minha visão e minha perspectiva de vida. Continuo, com os olhos fixos no horizonte, em minha
jornada heróica no processo de individuação à busca de mim mesma.
Referências

JUNG, C.G. Memórias, Sonhos e Reflexões. 30º ed. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2016.

__________. Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo. 2º ed. Perrópolis, RJ: Editora Vozes, 2000.

SILVEIRA, N. Jung – Vida e Obra. 21º ed. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra S/A, 1992.

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