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¿Popular, pop, populachera?

El dilema de las músicas populares en Amércia Latina 106

Possíveis distinções entre arranjo e composição, através da análise de


dez gravações da música “Carinhoso”, de Pixinguinha.
Marcelo Gomes1

1 _ Marcelo Silva Gomes é Doutor em Música pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), professor da FAAM (SP) e da Fundação das Artes de São Caetano
do Sul. Tem ministrado clínicas nas Universidades de Indiana e William Paterson (EUA), PUC Lima (Peru) e na Universidade de Córdoba (Argentina). Possui uma disco-
grafia significativa, com seis CDs lançados e duas indicações ao Grammy Latino na categoria “melhor álbum instrumental”.

Resumo: Palavras-chave: arranjo - composição - recebe letra de Carlos Alberto Ferreira Braga (1907-
A música “Carinhoso” de Alfredo Rocha Pixinguinha - Carinhoso – 2006) 2 e nesse mesmo ano é registrada na voz de
Vianna (Pixinguinha, 1897-1973) recebe, Orlando Silva (1915-1978). Nessa gravação, ouve-se
O choro é tradicionalmente um gênero instrumental.
em 1937, letra de Carlos Alberto Ferreira primeiro uma exposição instrumental completa se-
Segundo Sève, “É até agora, sem dúvida, o gênero
Braga (Braguinha ou João de Barro, 1907- guida da execução cantada o que, de certa forma,
mais representativo da música instrumental cario-
2006) e nesse mesmo ano é registrada na alude à importância da linguagem instrumental
ca e fonte onde bebem nossos maiores músicos”1
voz de Orlando Silva (1915-1978). Depois dentro do gênero, a despeito do sucesso posterior
(1999: 5). Isso é verificável também empiricamente,
disso, é regravada mais de 200 vezes, da peça como choro-canção. Depois disso, foi re-
na medida em que as letras de muitos deles foram
tanto em versões vocais quanto exclusi- gravada mais de 200 vezes, tanto em versões vo-
adicionadas anos depois, na maioria dos poucos
vamente instrumentais. No intuito de ve- cais quanto exclusivamente instrumentais.
choros cantados. A música Lamento (é possível en-
rificar o grau de reincidências e, em con-
contrar as duas formas), por exemplo, foi composta
trapartida, de reinvenções nos processos Ainda que sua primeira gravação seja de 1926, em
por Alfredo da Rocha Vianna Filho, o Pixinguinha,
de arranjo, o artigo compara dez grava- formato instrumental, o arranjo registrado em 1937
em 1928, mas a letra de Vinicius de Moraes data,
ções instrumentais de diferentes épocas foi o que se tornou paradigmático. E não apenas
até onde se pôde verificar, de 1963.
e instrumentações, obtidas através de um num só nível: além dos elementos detectáveis
programa de shareware, com a gravação como composicionais, intervenções típicas da es-
Já a música que trato nesse artigo, “Carinhoso”, de
citada. A partir dos dados obtidos, o texto fera do arranjo se tornaram referenciais. Coelho,
Pixinguinha (1897-1973), segundo ele próprio, em
finalmente discute possíveis distinções em sua tese de doutorado trata, a partir do olhar
depoimento ao Museu da Imagem e do Som do Rio
entre arranjo e composição. de Tatit, da noção de “arranjo mínimo”. Coloca que
de Janeiro, foi composta entre 1916 e 1917 e grava-
“para que o núcleo virtual de uma canção se realize
da pela primeira vez dez anos depois. Só em 1937
é necessário um mínimo de escolhas iniciais como
1 _ Grifo meu. A despeito de certo senso comum da colocação,
pinço-a apenas para reforçar a natureza instrumental do gênero. 2 _ Braguinha ou João de Barro são codinomes do compositor.
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timbre de voz, andamento, intensidade e tonalida- jador se submetem são bastante distintos. Gros- gravação original também tenha sido consultada
de, considerando que a canção seja manifestada so modo, há certa tendência de que o compositor sempre que houvesse dúvidas sobre alguma solu-
a capella, isto é, sem acompanhamento de instru- trabalhe num nível um tanto mais intuitivo e o ar- ção empregada. E desprezou-se o trecho vocal, já
mentos musicais” (Coelho 2002: 13). ranjador tenha que necessariamente ter um tipo de que o que se está considerando aqui são questões
preparo, em geral, ligado a uma educação musical estritamente musicais. O outro parâmetro empre-
mais formal3. Segundo Tatit, esses compositores gado foi a partitura presente no volume O Melhor
Já Aragão vai um pouco mais longe.
“em geral exibiam pouca intimidade com a lingua- de Pixinguinha (1997), coordenada por Maria José
Estamos considerando o original popu- gem musical” (2004: 72) Carrasqueira, com revisão das melodias de Antônio
lar como virtual justamente porque ele Carlos Carrasqueira e das cifras por Edmilson Cape-
necessita não apenas de uma execu- Por outro lado, sabe-se de soluções de arranjo que
ção para se potencializar, mas também lupi. A peça “Carinhoso” se encontra na página 28
de um arranjo, visto que na maior parte se atrelam de tal forma à determinada peça que
e 29 de tal publicação.
das vezes o compositor não determi- apenas execuções deveras criativas – ou notoria-
na a priori (e nem se espera isso dele) mente desavisadas - abrem mão de utilizar tais A partir daí, foram escolhidas dez interpretações/
todos os elementos necessários para
uma execução elementos. Um exemplo clássico é a introdução de arranjos de “Carinhoso” para esta análise. O crité-
(2001: 18) “Corcovado” de Tom Jobim, trecho que não perten- rio de seleção empregado foi de trabalhar apenas
ce à canção, mas que, por uma série de motivos, se com versões instrumentais obtidas através de um
atrela a essa. Interessante nesse caso que também programa de shareware, digitalmente. Levando-se
Considerando-se como ponto de partida uma parti-
estejamos tratando de um compositor preparado e em conta que o universo era muito extenso, vale
tura em música popular, deve-se lembrar que esta
da introdução que fez para sua própria peça. observar que essas foram as mais disponíveis em
se restringe a revelar elementos composicionais
determinado software de compartilhamento de ar-
quase mínimos, embora super estruturais. Quer di-
quivos. De fato, são as dez primeiras gravações a
zer, ainda que as informações sejam concisas, de-
Mas de volta ao foco desse artigo, se elegeu como que se teve acesso.
vem revelar a constituição da peça no que tange a
parâmetros a gravação de 1937, embora a primeira
seus elementos primordiais. Entretanto, o ponto de Importante dizer que uma das características dessa
partida aqui já é a citada execução, de 1937. forma de obtenção dos conteúdos sonoros é a
3 _ Essa afirmação tem sido por demais flexibilizada em razão
das novas possibilidades digitais de manipulação dos sons. Sendo precariedade de dados acerca da ficha técnica de
E, nesse caso, há um diferencial não usual possível experimentar inúmeras vezes sem a necessidade da pre- cada versão. Sabe-se que, na história da música
no universo da música popular: arranjador e com- sença de músicos, tampouco o custo financeiro de estúdio, somado
à presença de samplers e as possibilidades de edição, é legítimo brasileira, foi no período da Bossa Nova que
positor são a mesma pessoa. Não usual na medida suspeitar que hoje seja possível a existência de arranjadores sem informações acerca das gravações começam a ser
em que o preparo que um compositor e um arran- educação musical formal, na medida em que cada vez é mais viável
trabalhar em termos de tentativa e erro. tratadas de forma mais meticulosa, em especial
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devido à importância que Aloysio de Oliveira4, dava segundo tempo do terceiro ao quarto compasso da determinada frase, que não consta da partitura nem
à questão. segunda parte da peça. Na terminologia da área de tampouco da gravação original, e aparece anotada
arranjo, esses trechos podem ser tratados como logo em seguida. Tal frase acontece como forma de
Entretanto, cinquenta anos depois, a forma de
espaços possíveis para contracantos, pois há a au- se concluir o trecho A e é realizada após o ponto em
compartilhamento via internet volta a apresentar
sência de movimento melódico, seja em função de que a conhecida letra diz “foges de mim”.
os mesmos problemas que o citado produtor ten-
pausas ou de notas longas da melodia.
tava evitar, ou seja, negligenciar informações como O segundo trecho se refere aos compassos de um
quem esta tocando, com quem, quem arranjou, Transcrevo, a seguir, o primeiro fragmento, exata- a cinco da segunda parte da peça. Além da reinci-
com quais instrumentos. Com o advento da rede mente os compassos de 13 a 16, a partir do início dência entre os arranjos selecionados, a frase, que
mundial, essa volta a ser uma região nublada do do tema, onde se nota certa reincidência de uma responde a “Ah!, se tu soubesse como eu sou tão
contexto musical como um todo.

Portanto, há escassez de dados quanto a este as-


pecto, aqui. Obter os arranjos escritos então seria
tarefa quase impossível. Não se sabe quem fez,
para que finalidade, quem está vivo, etc. Vale dizer
que, embora o viés da análise seja técnico, há algo
de empírico também na metodologia, afinal o con-
fronto se dá propriamente através das execuções Ilustração 1- partitura do trecho um.
ditas, dos materiais sonoros gerados na performan-
ce e disponibilizados na rede da Internet.

Ainda sim, trata-se de um escopo muito extenso.


Por isso, vai-se fazer mais uma delimitação no cor-
pus: todas as análises, comparações, discussões
e considerações se dão sobre dois trechos, a sa-
ber, os três últimos compassos da parte A e o do

4 _ Aloysio Oliveira foi fundador da gravadora Elenco, em 1963,


que primava por seu cuidado com as fichas técnicas de seu catá-
logo. Ilustração 2 – frase usual nesse trecho, escrita na pauta inferior.
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carinhoso e muito, muito, que te quero”, empre-


gando o mesmo motivo melódico através em imita-
ção, aparece na gravação de 1937 e ainda na parti-
tura que aqui foi tomada como referência. Veja-se,
Ilustração 3.

Apresento, a seguir, uma tabela com as dez per-


formances selecionadas, onde constam nome do
intérprete, tonalidade, instrumentação e presença
Ilustração 3 – segundo trecho eleito, como na partitura selecionada
ou não dos elementos de arranjo supracitados nos
dois trechos. (Ilustração 4)
Carinhoso Intérprete T. Instrumentação Trecho Trecho Obs.
um dois
Não é possível afirmar, em termos estatísticos, que “Original” Pixinguinha Fá Regional com Não aparece
sopros extras aparece
o que acontece em cinco por cento das gravações
1- arranjador Tom Jobim Lá Piano violão Não aparece
(parto do cálculo que trabalho com uma amostra- flauta e bateria aparece
gem de dez gravações entre duzentas) se repetirá 2-instrumentista Baden Powell Fá Violão e flauta aparece aparece
3-grupo Paulo Moura Fá Regional com aparece aparece
no universo total. Mas vale lembrar que a amos- instrumental trombone
tragem não foi manipulada para que se chegasse 4-instrumentista Hamilton de Fá Somente Não Não
Holanda bandolin aparece aparece
a algum resultado: reitero que foram as primeiras 5-arranjador Yo-Yo Ma Fá Cello, clarineta, Não aparece
dez performances instrumentais obtidas através aparece
6-arranjador Hermeto Sol Sopros, teclado, aparece Aparece Tr.2.
do programa de shareware. Entretanto, a freqü- Pascoal bateria/percussã desloca
ência com que os trechos aparecem e/ou deixam o do
de aparecer – o primeiro aparece quatro vezes e o 7-grupo Waldir Fá Regional com Não Aparece
instrumental Azevedo acordeão aparece
segundo sete – parecem apontar para várias ques- 8-instrumentista Toquinho Fá Violão e sax aparece Não
tões interessantes. soprano aparece
9-instrumentista Milton Fá Flauta, baixo Não aparece Trecho
Banana piano e bateria aparece 2 na
Em primeiro lugar, na medida em que a melodia flauta.
da peça é preservada na íntegra em nove deles, 10-arranjador Orquestra Fá Não Não
Tabajara aparece aparece
pode-se dizer que se tratam necessariamente de
Ilustração 4 – tabela das execuções
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elementos de arranjo, já que aquilo que não é a jara e no de Hamilton de Holanda nenhum dos dois Paulo Moura, a interpretação ao vivo acontece ao
melodia original, trafega na esfera do arranjo. O contracantos aparece. Há uma inferência tangen- lado de grandes figuras tradicionais do choro cario-
único que altera alguns aspectos melódicos, em cial: dos três arranjos onde não aparece o segundo ca5, e a tal linha melódica, o trecho um se dá no
especial com relação à métrica, é Hermeto Paschoal. trecho, em dois não consta também o primeiro. Si- violão. Existe, ao que parece, uma execução tipi-
Dirão os mais desavisados que se trata de um artista nal de criatividade? camente violonística que se tornou paradigmática,
por demais criativo. Porém, parece no mínimo no que tange a essa canção, nesse instrumento,
Quanto a isso, é importante pontuar ainda que o
idiossincrático que a suposta criatividade não abra nesse trecho.
segundo trecho aparece na partitura, aqui empre-
mão de se aproveitar dos arranjos anteriores, pois
gada como referência. Não se esta afirmando, de Mas, como explicar, então, que a frase apareça no
os dois trechos consagrados acontecem.
forma alguma, que as interpretações onde consta arranjo de Hermeto? Qualquer colocação seria por
Outro dado que deve ser levado em consideração o trecho utilizaram tal partitura como ponto de par- demais especulativa, mas se pode notar que a fra-
na comparação dos dois trechos reside no fato de tida, mas o fato é digno de nota: aquilo que é “ar- se, executada no teclado, é realizada “em bloco”6
que o primeiro não consta do original de Pixingui- ranjo” aparece numa partitura que supostamente e já não é mais melódica apenas. Ou seja, não
nha e o segundo sim. Será que esse fato aumenta se resumiria, como é tradicional em música popu- se trata de um simples aproveitamento da idéia:
tanto assim tal reincidência do segundo? De quatro lar no Brasil, a melodia e cifra. No livro que con- o músico a utiliza como referência, mas de forma
para sete vezes é um aumento de mais de 57 por tém a partitura selecionada como referência para antropofágica, ou seja, digere-a para em seguida
cento. A clássica frase imitativa do segundo trecho esta análise constam, nos créditos, no tocante a apresentá-la em outros termos.
se consagrou como um “anexo”, um trecho de ar- questões musicais, apenas produção geral e coor-
ranjo que se integrou à execução da peça e que só denação, revisão das melodias, cifras e editoração
não aparece em três interpretações: na interpreta- musical e eletrônica. Não há qualquer referência à Um aspecto de interesse ainda é sobre a questão
ção criativa de Hamilton de Holanda no bandolin presença de supervisão na área de arranjo. das tonalidades. Em oito arranjos a tonalidade é fá
solo, plena de re-harmonizações, na versão de To- maior. E mais, a partitura fonte também. Hermeto
Mas as inferências não param por aí. Por que o tre-
quinho e no arranjo de Severino Araújo. optou por sol maior e Jobim por lá maior. A primeira
cho um, que não consta da partitura, tampouco da
Neste último caso, um reconhecido arranjador bus- versão de 1937, aparece quase que na metade das
ca, ao que tudo indica, realizar um arranjo stricto execuções, frequência bastante significativa já que 5 _ Apesar da ausência de ficha técnica, além da evidência da si-
tuação ao vivo através de palmas da audiência, a gravação se alonga
sensu, o que levaria ao mesmo tempo a reconhe- são quatro em dez? A proximidade das interpreta- a ponto de se ouvir o próprio Moura apresentando os músicos e
cer e conseqüentemente negar aquilo que fosse ções de Baden Powell e Toquinho são notáveis: na respectivos instrumentos.

“arranjo” na gravação do grande chorão. Some-se instrumentação - violão e um sopro -, mesma to- 6 _ Existem algumas diferentes denominações para a técnica, como
chord melody ou soli, mas a idéia é de que para cada nota da melo-
ainda que apenas nos arranjos da Orquestra Taba- nalidade, soluções harmônicas, idem. No caso de dia aconteça um acorde.
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impressão é de que seria uma tonalidade adequa-


da aos sopros, mas as gravações com formações
outras como o “regional” e/ou com harmonização
de violão somam quatro, e mais, flauta e trombone
não são instrumentos transpositores7.

Porque então, do conjunto de dez arranjos, oito são


em fá? Porque é tradicional na música instrumental
se manter a tonalidade original. Poderia se argu-
mentar que há, na peça, a exploração do III grau,
e a região de Lá menor seria bastante confortável
no violão. Mais uma vez, é difícil não notar a qua-
lidade da execução de Hamilton de Holanda, num
bandolin solo, nessa tonalidade. Afinal, com a afi-
nação idêntica ao violino, sol-ré-lá-mi, a tendência
a tonalidades sustenido é relevante. Ainda assim, o
bandolinista manteve a tonalidade dita ”original”.

Enfim, o fato desses trechos serem facultativos per-


mite que sejam classificados como “arranjo”, em
oposição, como supracitado, ao fato de que a me-
lodia é realizada em sua íntegra. Mas a reincidência
desses trechos aponta na direção de que arranjos
são incorporados por inúmeros executantes, o que
poderia ser chamado de um “arranjo composicio-
nal”. Uma categoria singular e significativa, pois in-
dica que a noção de “original” em música popular
parece estar mais atada a uma gravação referência
do que a quaisquer outras fontes.

7 _ De fato o trombone é construído em Bb. Tradicionalmente, en-


tretanto, sua escrita não é transposta.

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