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Universidade Federal da Paraíba

Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes


Curso de Comunicação Social

FERNANDA VASCONCELOS EGGERS


JORNALISMO

300 DE ESPARTA:
A CONSTRUÇÃO DO HERÓI E A ESTÉTICA NA TRADUÇÃO
DOS QUADRINHOS PARA O CINEMA

João Pessoa - Paraíba


2010
FERNANDA VASCONCELOS EGGERS

300 DE ESPARTA:
A CONSTRUÇÃO DO HERÓI E A ESTÉTICA NA TRADUÇÃO DOS
QUADRINHOS PARA O CINEMA

Trabalho apresentado à Universidade Federal


da Paraíba, em cumprimento às exigências
para obtenção do título de Bacharel em
Comunicação Social, habilitação Jornalismo.
Orientador: Prof. Dr. Luiz Antonio Mousinho
Magalhães.

João Pessoa - Paraíba


2010
“O herói, por conseguinte, é o
homem ou mulher que conseguiu
vencer suas limitações históricas
pessoais e locais e alcançou formas
normalmente válidas, humanas”
Joseph Campbell
RESUMO

As obras Os 300 de Esparta, história em quadrinhos criada por Frank


Miller, e 300, adaptação cinematográfica dirigida por Zack Snyder, foram
estudadas com base em teorias da narrativa, do cinema e dos quadrinhos,
buscando investigar seus mecanismos de produção de sentido e as
possibilidades estéticas experimentadas em cada uma das obras e nos
processos de adaptação. A categoria personagem e, mais especificamente, a
categoria herói, foi observada com especial atenção, sobretudo no que toca ao
estudo de Leônidas, rei e general espartano. O herói é um elemento de grande
parte das narrativas e sua presença é verificada através de conceitos teóricos
da construção do herói e da identificação do herói épico.

Palavras chave: herói, estética, narrativa dos quadrinhos, narrativa do cinema


ABSTRACT

The graphic novel 300, created by Frank Miller, and the film with the same
name directed by Zack Snyder were studied based on theories of film and
comics narrative,in order to investigate its mechanisms of production of
meaning and the aesthetic possibilities experienced in each of the works and in
the process of adaptation. The character and, specifically, the hero, was
observed with special attention, especially in the study of Leonidas, Spartan
king and general. The hero is an element present in most of the narratives and
its presence is verified by theoretical concepts of construction of the hero and
the identification of the epic hero.

Keywords: hero, aesthetic, film narrative, comics narrative.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1.A: rosto do mensageiro espartano detalhado e 1.B: rosto do rei


Leônidas em traços simples. Fonte: Os 300 de Esparta (Frank Miller; Lynn
Varley, 2006) .................................................................................................... 23

Figura 2: Exemplo de elipse na construção dos quadrinhos. Fonte: Quadrinhos


e Arte Seqüencial (Will Eisner, 2001, p.39) ...................................................... 24

Figura 3: Imagem de página inteira, assemelhando-se a uma pintura. Fonte: Os


300 de Esparta (Frank Miller; Lynn Varley, 2006) ............................................ 26

Figura 4: Exemplo de quadros menores dentro de um quadro maior. Fonte: Os


300 de Esparta (Frank Miller; Lynn Varley, 2006) ............................................ 27

Figura 5: Cena final da lança na HQ. Fonte: Os 300 de Esparta (Frank Miller;
Lynn Varley, 2006) ........................................................................................... 32

Figura 6: Recortes do filme, com o trajeto da lança. Fonte: Os 300 de Esparta


(Frank Miller; Lynn Varley, 2006) e 300 (Zack Snyder; 2007, DVD). ................ 33

Figura 7.a e 6.b: Exemplos do figurino espartano na HQ e no filme. Fonte: The


Art of the Film.(Tara DiLullo, 2007, p.102-103) ................................................ 47

Figura 8: Imagens da produção, mostrando a tenda de Xerxes. Fonte: 300


(Zack Snyder; 2007, DVD). .............................................................................. 50

Figura 9: Cenas do filme mostrando a tenda de Xerxes. Fonte: Os 300 de


Esparta (Frank Miller; Lynn Varley, 2006) e 300 (Zack Snyder; 2007, DVD) ... 50

Figura 10.A e 9.B: Efialtes representado na HQ e no filme, dentro da tenda de


Xerxes. Fonte: Os 300 de Esparta (Frank Miller; Lynn Varley, 2006) e 300 (Zack
Snyder; 2007, DVD) ......................................................................................... 51

Figura 11: Exemplo de títulos, com respingos de sangue. Fonte: Os 300 de


Esparta (Frank Miller; Lynn Varley, 2006). ...................................................... 53
SUMÁRIO

Introdução .......................................................................................................... 8
1 Um pouco de História
1.1 Um breve histórico das histórias em quadrinhos .................................... 10
1.1.1. Graphic Novel .................................................................................. 12
1.2 Um breve histórico do cinema ................................................................ 14
1.3 Frank Miller ............................................................................................. 16
2 Narrativa
2.1 Quadrinhos e narrativa ........................................................................... 19
2.2 Cinema e Narrativa ................................................................................. 28
2.2.1 Filmes de Guerra .............................................................................. 35
3 Conceito de Herói.......................................................................................... 38
4 Análise
4.1 300 de Esparta ....................................................................................... 44
4.1.1 Figurino ............................................................................................. 46
4.1.2 Efialtes: aparência física e personalidade ......................................... 51
4.1.3 O sangue como elemento estético.................................................... 52
4.1.4 Dílios e a imagem de Leônidas como herói ...................................... 54
Considerações Finais ....................................................................................... 57
Referências Bibliográficas ................................................................................ 59
Filmografia........................................................................................................ 63
Glossário .......................................................................................................... 64
Anexo A
Ficha técnica Resumida ............................................................................... 66
Anexo B ............................................................................................................ 67
INTRODUÇÃO

A obra Os 300 de Esparta, escrita e desenhada por Frank Miller e colorida por
Lynn Varley, foi publicada pela primeira vez em 1998, pela editora Dark Horse, e
ganhou sua versão em graphic novel em 2006, ano em que foi publicada no Brasil
pela Devir. Nela, um soldado do exército espartano, Dílios, narra a história de
Leônidas e da Batalha das Termópilas, que aconteceu em 480 a.C., no desfiladeiro
das Termópilas, na Grécia. Na dita batalha, algumas centenas de espartanos (que
passaram para a História como apenas 300) e de árcades enfrentaram o exército
persa, que pretendia invadir a Grécia. O livro em quadrinhos se atém apenas a
alguns detalhes da criação de um espartano, neste caso o rei e general Leônidas, e
à narrativa da batalha, criando um clima de poema épico.
O filme 300, dos estúdios Warner Bros Pictures, dirigido por Zack Snyder e
lançado em 2007, traz a maior parte das situações descritas no livro, mantendo
Dílios como narrador. No entanto, procura retratar, também, algo da vida em
Esparta. Estão presentes nesta obra os conflitos políticos existentes e o
relacionamento de Leônidas com a esposa, além da visão do narrador, um
espartano, sobre os persas e a vida de Xerxes no assentamento de guerra.
O presente trabalho analisa comparativamente aspectos da história em
quadrinhos e do filme a partir da seleção de algumas cenas comuns às obras.
Foram destacados alguns elementos que caracterizam os personagens que
compõem a trama, a ação narrativa e o espaço narrativo, com destaque para a
questão do cenário. Foi dada atenção especial ao conceito de herói de Joseph
Campbell (2007) com a finalidade de identificar a construção do herói Leônidas,
tanto na história em quadrinhos quanto no filme, e verificar elementos de construção
narrativa das duas obras estudadas.
Para Joseph Campbell (2007), o herói está presente em toda narrativa, ainda
que não se identifique como tal, e supera as adversidades impostas pela aventura a
ser percorrida. Campbell considera que a construção de um herói segue passos pré-
definidos, a começar pelo chamado, o motivo que gera desequilíbrio na vida do
personagem e o lança na jornada para tentar restaurar o equilíbrio inicial. Ao partir,
ele enfrentará diversos conflitos, através dos quais encontrará a resolução para o

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problema. O ciclo se encerra com o retorno para casa, acompanhado de um
aprendizado ou mensagem obtido durante a aventura.
As obras fornecem elementos plausíveis para investigação a partir do
conceito criado por Campbell (2007) e da idéia pessoal de Frank Miller sobre herói,
que se utilizou de fatos históricos como fonte de inspiração para montar seu livro em
quadrinhos. Tendo em vista que o presente trabalho não pretende analisar os fatos
com base na História factual, mas com o filtro poético da reconstrução do real
proposta pelo quadrinista e pelo cineasta, relatos históricos serviram para facilitar a
análise dos trechos escolhidos, no entanto não foi feita uma comparação entre
História e ficção.

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1 UM POUCO DE HISTÓRIA

1.1 UM BREVE HISTÓRICO DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS

O marco inicial das histórias em quadrinhos com formato parecido com o que
temos atualmente é a criação de Richard Fenton Outcalt, The Yellow Kid (O Menino
Amarelo), em 1896. “Outcalt essencialmente sintetizou o que tinha sido feito antes
dele e introduziu um novo elemento: o balão.” (JARCEM, 2007)
As HQs (histórias em quadrinhos) têm precursores de diversos países, mas
se fortaleceram nos Estados Unidos, aonde são chamadas de comics porque,
inicialmente, seu conteúdo era apenas de humor. Começaram a ser divulgadas nas
páginas dos jornais, esperando, com isso, aumentar a vendagem. Mesmo com o
viés cômico, as HQs sempre transmitiram mensagens politizadas. A camiseta do
Menino Amarelo1 de Outcalt, por exemplo, trazia freqüentemente frases e críticas ao
momento que estavam vivenciando. (SILVA, Nadilson, 2002)
Com a quebra da Bolsa de Valores, em 1929, o contexto dos quadrinhos
mudou e surgiram novos gêneros, como o de aventura, o que deu origem aos
quadrinhos de heróis, com Fantasma, de Lee Falk, sendo o primeiro herói
uniformizado. Os heróis apareceram com o “intuito de oferecer ao jovem leitor uma
opção para fugir da dura realidade em que a América se encontrava”. (MATTOS e
SAMPAIO, 2004) Os quadrinhos, bem como o cinema, atuaram como reparadores
de fissuras, causadas pelo crack da Bolsa, criando novos símbolos e novos
personagens para fomentar os sonhos dos leitores.
O Super-Homem foi criado em 1933, por Jerry Siegel e Joe Shuster, e
começou a ser publicado pela DC Comics em 1938. Quando a Segunda Guerra
Mundial estourou, o Homem de Aço foi “convocado” pelo então presidente dos
Estados Unidos, Franklin Roosevelt, para ajudar na luta contra a Alemanha. A partir
daí, temos diversos heróis empunhando a bandeira americana na defesa da
liberdade e do “american way of life” nos quadrinhos.

1
A tirinha em quadrinhos The Yellow Kid, de Richard Fenton Outcalt, surgiu pela primeira vez em dois de junho
1894 na revista americana Thruth, onde ficou até fevereiro de 1895, quando começou a ser publicada no jornal
The New York World, se tornando famosa. (OLSON) Além dos balões de fala, sua camiseta também servia como
meio de exibição de textos ou mensagens.

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Nos anos 40 do século XX, os heróis se tornam um fenômeno e passam a ser
publicadas as comic books, ou revistas em quadrinhos, cujo público alvo é crianças
de 8 a 13 anos, que tinham dinheiro para comprar as próprias revistas. (DAVIDSON,
1982)
Na década de 1950, as HQs recebem críticas severas do psiquiatra Frederic
Wertham, que acusou os quadrinhos de corrupção e delinqüência juvenis no livro A
Sedução do Inocente.
Foi adotado então um código de ética, que fez com que vários títulos, editoras
e até gêneros desaparecessem, bem como diversos heróis, exceto Mulher Maravilha
(de William Marston), Super-Homem e Batman (de Bob Kane). (BOICHEL, 1991)
A década de 1960 ficou conhecida como Era de Prata dos Quadrinhos
(JARCEM, 2007) e consolidou o mundo dos super-heróis. É quando as empresas de
quadrinhos mais conhecidas atualmente ganham força: Marvel Comics e DC
Comics.
Os anos 70 trazem ares novos às HQs. Começam a ser produzidos,
principalmente de forma independente, os quadrinhos underground. Um exemplo é a
revista francesa Métal Hurlant, que chega aos Estados Unidos com o nome de
Heavy Metal, cujas temáticas incluem “fantasia, ficção científica, viagens
psicodélicas, rock'n'roll, corpos nus, novas diagramações e literatura”. (JARCEM,
2007) Outro exemplo é Clic, do italiano Milo Manara, cujo tema principal é sexo.

Esse novo estilo de quadrinhos torna-se importante meio de expressão de


uma juventude cada vez mais inquieta com o que estava ocorrendo à sua
volta: a guerra fria, o racismo, a luta pelos direitos civis etc. A partir desse
momento inicia-se um processo, que se intensifica cada vez mais, de
aproximação desse meio de expressão com os desejos desse público jovem
ansioso por mudanças nas mais diversas esferas. (SILVA, 2002)

Na década seguinte, os quadrinhos se voltam ainda mais para o público adulto, com
gêneros novos, sem deixar de contemplar crianças e adolescentes.
Além da ampliação de gêneros adultos, os anos 80 também trazem inovação
na forma de publicação. Nascem as graphic novels (romances gráficos), que tem
como carro chefe O Cavaleiro das Trevas, de Frank Miller, que trás um Batman
amargurado e violento. As histórias se tornam mais sombrias, no entanto os super-

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heróis se tornam mais humanos. Eles possuem problemas, defeitos e
personalidades críveis.
Os anos 1990 trouxeram algumas mudanças: alguns grandes desenhistas de
quadrinhos saíram das editoras DC e Marvel e fundaram a Image Comics, levando
consigo seus heróis; os mangás (quadrinhos japoneses) passaram a influenciar a
caracterização dos personagens e teve início a era da colorização computadorizada.
Com a queda das Torres Gêmeas em Nova Iorque, em 11 de setembro de
2001, houve uma retomada da Era de Prata (década de 1960) e dos quadrinhos dos
anos 1980, bem como resgate da origem dos personagens. A mudança foi feita
porque o ataque aos prédios de Nova Iorque abalou o mercado de quadrinhos.
(JARCEM, 2007)
Will Eisner classifica as histórias em quadrinhos como arte seqüencial, pois os
quadros contendo os desenhos e textos que contam a história são apresentados em
sequência, e, nos quadrinhos ocidentais, seguem a forma ocidental de leitura: da
esquerda para a direita e de cima para baixo. Para que a história seja
compreendida, o leitor “entra em acordo” com o artista de que seguirá esta
sequência de leitura. Eisner (2000) compara os quadrinhos com o cinema quando
diz que um filme impõe uma sequência ao leitor, mostrando apenas um “quadro” por
vez, enquanto nos quadrinhos o único controle existente é a virada da página, que
apresenta diversos quadros ao mesmo tempo, possibilitando ao leitor visualizar o
último quadro de uma página ao mesmo tempo em que o primeiro. Para que a
história em quadrinhos seja compreendida, o leitor segue um acordo implicitamente
firmado com o artista de obedecer à forma ocidental de leitura.

1.1.1. GRAPHIC NOVEL

O termo graphic novel foi cunhado por Will Eisner em 1978, já que o termo
“comic books” (ou revistas em quadrinhos, gibis) carregava muitas conotações
negativas e, além disso, ainda hoje remete aos quadrinhos de conteúdo infantil. De
acordo com a definição de Eisner, Rothschild (1995) considera que as graphic
novels são revistas em quadrinhos mais robustas e longas, com uma história única,
como Os 300 de Esparta, ou diversas histórias que tratam de um mesmo tema,

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como é o caso de Nova York, de Will Eisner. Em Nova York, a maior parte das
histórias é curta, mas segue a mesma temática de habitantes de uma metrópole, por
vezes de um mesmo bairro da cidade ou moradores do mesmo prédio.
As graphic novels são consideradas por Rothschild (1995) alternadamente
como primos pobres e jóias da coroa do mundo dos quadrinhos. Isso se dá por
serem mais caras que uma revista em quadrinhos comum, portanto venderem
menos. Com isso, há menos graphic novels nas lojas voltadas para o público leitor
de quadrinhos e elas se tornam menos conhecidas neste meio. Entretanto, o formato
permite publicação de material que dificilmente é encontrado em revistas em
quadrinhos comuns, como histórias completas, muitas vezes contendo introdução e
esboços prévios do artista. Histórias biográficas, como Maus, de Art Spiegelman,
não teriam espaço em gibis de publicação mensal ou semanal. Spiegelman (2005)
conta a história de seu pai, um judeu que sobreviveu a um campo de concentração
nazista, entrelaçando a história do pai com a da execução do livro.
A autora afirma que, geralmente, as lojas não sabem em que sessão
classificar as GN (graphic novels) e acabam colocando-as junto a livros de RPG
(role-playing games), ficção, artes ou literatura infantil. Para ela, nenhuma das
categorias é adequada, especialmente as duas últimas. Rothschild sugere que
graphic novel seja um gênero próprio, aonde os quadrinhos do estilo seriam
catalogados sem gerar confusão ou dificuldade no público que deseja encontrá-las.
Os quadrinhos, especialmente as GN, são considerados produtos que primam
pelo acabamento gráfico, afinal é o meio através do qual a mensagem será
transmitida. Para Guimarães (2008), a relação do público mudou ao longo do século
20. Inicialmente considerava-se o entretenimento fosse um sinal negativo quanto ao
caráter estético de uma obra e, atualmente, “torna-se aceitável e até mesmo
desejável que um produto atual agregue as funções de divertir e, ao mesmo tempo,
proporcione uma experiência estética.” (GUIMARÃES, 2008)
Para a autora, o que caracteriza a GN é o fato de o álbum contar uma história
completa, sob a forma de uma narrativa visual romanceada. Guimarães defende o
uso do termo em inglês, “pois „novela gráfica‟ e „romance gráfico‟ não são
expressões usadas no Brasil. Além disso, em língua inglesa, novel é sinônimo de
„romance‟, mas em português há diferenças teóricas entre os vocábulos.”
(GUIMARÃES, 2008)

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O público-alvo de uma graphic novel é diferente daquele das HQs
convencionais, pois a GN possui um repertório normalmente mais sofisticado, em
comparação com outras histórias em quadrinhos e pode mesmo quebrar algumas
regras da narrativa dos quadrinhos. Os 300 de Esparta alternam entre a seqüência
comum de quadrinhos, encontrada em gibis, painéis de página inteira, por vezes
ocupando mais de uma página, utilizando as vantagens de seu formato diferenciado,
e uma sequência própria, aonde uma série de quadrinhos menores é encontrada
dentro de um quadro maior.
A obra de Frank Miller não é feita no formato vertical, comum a outras HQs e
a livros, mas em formato horizontal. Isso permitiu ao autor realizar cenas
panorâmicas e enfatizar o tom épico que buscava ao contar a história. O formato
horizontal lembra aquele da tela do cinema, remetendo a um estilo cinematográfico.
Guimarães considera que a liberdade que a GN permite, em relação aos
quadrinhos tradicionais, confere uma “expressiva dimensão poética” à obra:

Trata-se de um tipo de obra inspirada na tradição erudita, mas que utiliza


recursos típicos dos mass media, não no sentido de “massificar” a produção
erudita nem tampouco de “eruditizar” a comunicação de massas, porém sim
de encontrar outra forma de dizer, em busca de uma nova ordem desviante,
2
que é estética em sua essência . (GUIMARÃES, 2008)

O livro de Frank Miller sobre a Batalha das Termópilas utiliza essa dimensão
poética em sua composição, com o formato dos quadrinhos e a utilização de
grandes painéis, que evocam pinturas.

1.2 UM BREVE HISTÓRICO DO CINEMA

O Cinema não teve seu início em 1895, com o cinematógrafo dos irmãos
Lumière. Podemos considerar que esta é uma evolução das projeções de lanternas
mágicas, que ocorriam no século XVII. No século XIX, acreditava-se que, de forma
semelhante à fotografia, o cinema seria principalmente documental. Com a sua
evolução, o cinema tornou-se ficcional, “assim que ganhou forma industrial, impôs-

2
Grifo nosso.

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se esmagadoramente como território das manhas do imaginário, mantendo-se fiel
aos seus ancestrais mágicos pré-industriais.” (MIUCCI)
Os próprios criadores do cinema não acreditavam em seu futuro como arte ou
indústria. Bazin (1991) destaca que Edison contentava-se com seu kinetoscópio,
uma máquina individual de projeção, pois acreditava que o público logo se cansaria
das exibições, portanto deveria explorar sua máquina o máximo possível.
Inicialmente, os filmes eram exibidos como curiosidades em circos e feiras.
Nos grandes centros urbanos, a exibição cinematográfica se concentrou em casas
de espetáculos e variedades, mas não como atração única, muito menos principal.
Além dos filmes, havia música, dança, bebidas e comidas. A própria duração dos
filmes, que nunca ultrapassava cinco minutos, não permitia que fossem feitas
sessões exclusivamente de cinema. (MIUCCI)
No início do século XX aqueles que trabalhavam com cinema sentiram a
necessidade de atingir um novo público, que não fosse restrito a trabalhadores
imigrantes, para que ocorresse o desenvolvimento comercial do meio. Com o cinema
ainda no início de sua “vida semiótica”, como diz João Batista de Brito, as outras
artes vivenciavam uma crise generalizada de representação. O cinema ficou na
retaguarda e buscou no romance do século XIX um modelo narrativo “contando uma
história com início, meio e fim e assumindo ser três coisas, ao mesmo tempo:
ficcional, narrativo e representacional”. (BRITO, 2006)
“A busca de um novo público leva ao desenvolvimento de uma nova
linguagem e os realizadores vão buscar no romance e no teatro o modelo capaz de
conferir legitimidade ao cinema.” (MIUCCI) David W. Griffith, baseado na narrativa
de Charles Dickens, acabou criando a linguagem cinematográfica atual, que se
aprimorou com o passar dos anos, ao desafiar seus produtores e alternar, pela
primeira vez, uma panorâmica e um close. (BRITO, 2006) Os produtores não
achavam que o público seria capaz de entender o recurso e Griffith provou que
estavam errados. “O interessante é que, aparentemente „imitando‟ o romance,
Griffith inventava uma linguagem específica, genuinamente cinematográfica.”
(BRITO, 2006)

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1.3 FRANK MILLER

Nascido em Olney, Maryland, Frank Miller foi para Nova Iorque em 1975,
aonde começou sua carreira como escritor e desenhista de histórias em quadrinhos.
Uma de suas grandes inspirações eram as histórias policiais noir, estilo que
influenciou a criação de séries como Sin City, mas para o qual ele acreditava não
haver mercado na época em que iniciou a sua carreira.
Em 1978, Miller trabalhou no número 84 da revista Além da Imaginação, da
editora Golden Key, por indicação do desenhista Neal Adams. Em seguida, realizou
alguns trabalhos para a DC Comics e a Marvel Comics. Em 1979, foi convidado para
fazer a arte de uma edição de Homem-Aranha (da Marvel Comics) na qual o
personagem Demolidor aparecia como coadjuvante. Ele se ofereceu para trabalhar
nas histórias deste personagem, assumindo o posto de desenhista regular e,
posteriormente, assumiu a revista individualmente, a partir do número 168, quando
criou Elektra, o que alavancou a revista do Demolidor, que foi considerada a melhor
publicação da Marvel nos dois anos consecutivos.
Frank Miller foi convidado a elaborar uma história do Batman em 1986,
criando algo novo no mundo dos quadrinhos. Em O Cavaleiro das Trevas, Batman
precisa reassumir o papel de justiceiro, o que faz com relutância e, depois, passa a
tratar seus opositores com brutalidade. Miller criou um herói amargurado e sombrio,
mas essa inovação não foi sua única contribuição para o mundo dos quadrinhos. A
estrutura dos quadrinhos também foi repensada, para influenciar a narrativa.
Num depoimento presente no livro Artists on Comic Art, de Mark Salisbury,
Frank Miller conta que, quando estava estruturando o Cavaleiro das Trevas,
estabeleceu o esquema de 16 quadros por página, no qual a série toda seria
baseada. É uma tentativa de controlar o passo e oferecer um ritmo intenso à
narrativa, que é quebrada com desenhos de meia página ou página inteira, para
oferecer uma pausa e uma oportunidade de analisar a história. A idéia é tratar os
quadros como notas musicais em staccato. (SALISBURY, 2001)
É O Cavaleiro das Trevas que transforma Miller em celebridade. Ele diminuiu
um pouco a relação com os personagens das grandes editoras, trabalhou nos
roteiros de Robocop II (1990) e Robocop III (1993), que resultou num repúdio quanto
à adaptação de suas obras para o cinema, e começou a buscar independência

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financeira e criativa. O quadrinista encontrou espaço na editora Dark Horse, que
permitia que os direitos autorais permanecessem com o autor. No selo Legend,
publicou, dentre outras obras, a série Sin City. A primeira adaptação para o cinema
de uma das obras de Frank Miller saiu justamente desta série, em 2005, com o título
Sin City: A Cidade do Pecado, que junta histórias dos volumes O Assassino Amarelo
e Balas, Garotas & Bebidas. O volume Os 300 de Esparta, também publicado pela
Dark Horse, foi a segunda adaptação cinematográfica de uma obra de Frank Miller,
com a presença do autor na produção.
A obra de Frank Miller não é diretamente inspirada na batalha das
Termópilas, mas no filme Os 300 de Esparta, de 1962. Miller assistiu ao filme
quando tinha sete anos, com seus pais e seu irmão mais velho e se impressionou ao
notar que os heróis iriam morrer. Aquilo mudou o rumo de sua vida criativa, pois
deixou de ver os “caras bons” como aqueles que ganham medalhas, mas como
aqueles que fazem o que é certo, independente do resultado.
Frank Miller decidiu que a história dos 300 espartanos defendendo sua terra
era uma história que ele queria contar. Para tanto, ele estudou a história grega e
suas batalhas e, em visita à Grécia, estudou o terreno e visitou as Termópilas.
O estilo de criação também foi alterado, a começar pelo formato da página. A
página tipo retrato, convencional nas histórias em quadrinhos, não se adequava à
forma que Frank Miller queria contar a história da Batalha das Termópilas, portanto
ele adotou o formato paisagem, que serviria melhor à narrativa épica. Outro método
utilizado pelo autor é o de preencher o espaço com diversos elementos, fazendo
assim com que o leitor se demore mais em cada página e utilizando uma técnica que
McCloud define como aspecto-a-aspecto. Apesar de, na entrevista concedida a
Salisbury, Miller ter declarado que “comics are not pin-ups and everything has to
serve the narrative purpose” (quadrinhos não são cenas congeladas e tudo precisa
servir ao propósito da narrativa), se referindo à possível semelhança com o cinema,
sua narrativa dos 300 de Esparta foi tomada por Zack Snyder como um storyboard a
ser seguido.
Miller declarou que “ninguém em sã consciência jamais me acusou de ser
realista.” Ao escrever a história de Leônidas e sua guarda pessoal, ele não buscou
ser fiel à história verdadeira, mas utilizá-la como base e ali construir algo novo.
Snyder partiu do mesmo princípio para criar o filme. O livro de Frank Miller foi
utilizado como storyboard, mas diversas passagens do filme que poderiam ser reais

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não o são e outras são completamente ficcionais. Um bom exemplo é o rinoceronte
utilizado pelos persas, fato historicamente irreal, mas que Snyder decidiu incluir no
filme como uma representação do desconhecido, daquilo que os espartanos temem.
A historiadora Bettany Hughes diz que, apesar de não haver evidências de que a
rainha Gorgo tenha falado ao parlamento ou de que ela tivesse algum poder político,
o fato poderia ter acontecido na Esparta da época, pois as espartanas possuíam
uma liberdade desconhecida por mulheres de outras cidades-Estado gregas.

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2 NARRATIVA

2.1 QUADRINHOS E NARRATIVA

D O S Q U A D R I N H O S A O C I N E MA

A partir do conceito de arte seqüencial sugerido por Will Eisner (2001), Scott
McCloud (2005) procurou definir o que são os quadrinhos, deixando de lado
qualquer menção ao formato, gênero, personagem ou público e chegou à conclusão
que quadrinhos são “imagens pictóricas e outras justapostas em sequência
deliberada destinadas a transmitir informações e/ou produzir uma resposta no
espectador.”
Para chegar a esta conclusão, McCloud começou com a expansão da
definição de Eisner para “arte seqüencial visual”, que poderia ser aplicada à
animação ou a um filme, com a diferença que a animação é:

seqüencial em tempo, mas não espacialmente justaposta como nos


quadrinhos! Cada quadro de um filme é projetado no mesmo espaço – a
tela –, enquanto nos quadrinhos, eles ocupam espaços diferentes. O
espaço é pros quadrinhos o que o tempo é pro filme. (McCLOUD, 2005,
3
p.9)

Essa noção é utilizada pelos criadores de histórias em quadrinhos para


acelerar ou desacelerar o andamento da leitura. Para Eisner (2001), tempo e timing
andam juntos nos quadrinhos, já que a própria estrutura do desenho define o ritmo
da história e o tempo que ela aparenta levar para acontecer. Para mostrar o tempo
de uma ação nos quadrinhos, o artista usa a experiência de vida do leitor:

No universo da consciência humana, o tempo se combina com o espaço e o


som numa composição de interdependência, na qual as concepções ações,
movimentos e deslocamentos possuem um significado e são medidos
através da percepção que temos da relação entre eles. (EISNER, 2001,
p.25)

Enquanto o espaço e o som são facilmente percebidos, “o tempo é mais


ilusório: nós o medimos e percebemos através da lembrança da experiência.”
(EISNER, 2001, p.25) O espaço é facilmente representado nos quadrinhos, ao se

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Grifos do autor.

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desenhar o ambiente; e o som acontece dentro dos balões e onomatopéias. A
representação do tempo, no entanto, conta com a experiência do leitor, além de
elementos próprios da narrativa quadrinhográfica. Eisner (2001, p.25) define o tempo
nos quadrinhos como um “elemento estrutural essencial”.
O balão de fala é tido pelo autor como um dos elementos que contribuem
para a percepção do tempo pelo leitor, pois há uma experiência prévia de que o som
precisa de um tempo determinado para ocorrer. A fala, inserção de narrativa ou
onomatopéia complementam a ação que ocorre no quadro. O leitor, então, percebe
o tempo daquele quadro como o tempo da ação e do som.
O requadro que emoldura a ação não apenas delimita o perímetro, mas
“estabelece a posição do leitor em relação à cena e indica a duração do evento.”
(EISNER, 2001, p.28) O tamanho do quadro tem influência na duração do ato que
ele contém. Quadros pequenos indicam ações mais rápidas, que não necessitam de
tanto tempo para ocorrer, enquanto quadros maiores são, geralmente, o contrário.
Uma seqüência de quadros pequenos cria no leitor a sensação de pressa, de
urgência e vários quadros grandes ou um único quadro ocupando uma página
sugere uma diminuição da velocidade de leitura.

Os quadrinistas utilizam o recurso, combinado à ação e à representação de


som, para definir o andamento da história. Muitas vezes um elemento que marque o
tempo é inserido na história, como o gotejar de uma torneira, o nascer ou
amanhecer, a mudança de estações. Em Os 300 de Esparta podemos observar,
além das indicações temporais que Dílios dá ao contar a história, a tempestade com
relâmpagos e a ação das ondas destruindo embarcações persas.

A tirinha em quadrinhos The Yellow Kid, de Outcalt, é tida como o marco


inicial das histórias em quadrinhos atuais por ter adicionado o balão de fala como
novo elemento do meio, mas as narrativas feitas através de imagens são anteriores,
inclusive, à imprensa de Guttemberg. McCloud identifica diversas obras como sendo
quadrinhos, ainda que falte uma de suas principais características, o requadro 4, por
serem imagens seqüenciais que narram uma história. Ele cita como exemplo uma

4
O requadro “é a moldura dentro da qual se colocam objetos e ações separando as vinhetas. De acordo com o
traçado da moldura, podem sugerir várias conotações (requadros com traçado reto sugerem que as ações
contidas no quadrinho estão no tempo presente, o traçado sinuoso ou ondulado é o indicador mais comum do
passado). Este elemento visual exerce uma função metalingüística, por revestir-se de uma significação.”
(SANTOS, 2002).

20
tela asteca de 1049 d.C., “descoberta” por Cortés em 1519, que conta a história de
um herói militar e político, 8-Cervos “Garras de Tigre”; a Tapeçaria de Bayeux, cujos
70 metros detalham a conquista normanda da Inglaterra, iniciada em 1066, na qual
também não há requadros, mas há uma divisão clara por assunto; e uma pintura do
Egito antigo com detalhes da cultura do trigo, desde o plantio até o pagamento dos
impostos após a coleta.
William Hogarth, em 1731, publicou uma série de seis quadros, intitulada O
Progresso de uma Prostituta, que “apesar de ter poucos quadros, contam uma
história rica em detalhes e motivada por fortes preocupações sociais”(McCLOUD,
2005, p.16), que deveriam ser vistas lado a lado. A obra se tornou tão popular que
novas leis de direitos autorais foram criadas para esta arte.
Rodolphe Töpffer foi além do novo estilo criado por Hogarth e, por hobby,
passou a produzir histórias contadas através de imagens satíricas, empregando
caricaturas e requadros e combinando, pela primeira vez na Europa, palavras e
figuras de forma interdependente. Por essa inovação, feita no século XIX, Scott
McCloud o considera o verdadeiro pai dos quadrinhos modernos, já que ele
aprimorou uma linguagem que já vinha sendo utilizada pela civilização egípcia antiga
e introduziu elementos que são utilizados atualmente – as palavras e os requadros.
O Menino Amarelo5 de Outcalt introduziu, em 1894, outro elemento que caracteriza
as histórias em quadrinhos: o balão.
As histórias em quadrinhos utilizam-se de ícones, imagens que representam
pessoas, locais, coisas ou idéias, como ferramenta de transmissão de informação.
Os ícones podem ser não-pictóricos, como números e letras, que possuem
significado fixo, já que representam idéias invisíveis, a aparência não altera o
significado. Já os ícones pictóricos, as figuras, possuem significado fluido e variável.
Por serem imagens criadas para se assemelharem a algum tema, uma alteração na
figura pode mudar seu significado. A alteração de uma linha no desenho de um rosto
pode transformar a representação de alegria em representação de tristeza. McCloud
organiza os ícones pictóricos utilizados para representar um ser humano a partir do
mais realista, como a fotografia, ao mais abstrato, como o cartum, uma imagem
simplificada do rosto humano, mas que, justamente por isso, é capaz de gerar maior

5
The Yellow Kid.

21
identificação. Por ser uma imagem simples, o cartum pode descrever mais pessoas
que um desenho realista.
O realismo, para McCloud, representa o mundo externo, aquilo que nos cerca,
o que podemos ver, tocar, cheirar ou ouvir, enquanto o cartum está no mundo dos
conceitos, representando o mundo interno das pessoas, gerando maior identificação
com o público e, conseqüentemente, maior grau de envolvimento. “Quando você
olha para uma foto ou desenho realista de um rosto, você vê isso como o rosto de
outra pessoa. Contudo, quando entra no mundo do cartum, você vê a si mesmo.”6
(McCLOUD, 2005, p. 36)
Em Os 300 de Esparta há uma mudança entre realismo e iconicidade 7 do
personagem. Tal característica é identificada por McCloud nos quadrinhos
japoneses, que empregam personagens desenhados com simplicidade em alguns
momentos, para gerar maior identificação com o leitor e, em outros, eles são feitos
de forma mais realista, “enfatizando sua „infamiliaridade‟ pro leitor” (McCLOUD,
2005, p.44). A mudança do desenho simples, mais abstrato, para o desenho mais
complexo e realista pode ser vista na página em que o mensageiro persa dialoga
com o rei espartano. O rosto de Leônidas é feito com traços simples enquanto o do
mensageiro, que aparece em close no quadro seguinte, é extremamente detalhado.
Os quadrinhos utilizam a conclusão para que a história avance. A conclusão,
para McCloud, é um fenômeno em que a mente humana observa as partes, mas
percebe o todo, diferente do conceito usual, que significa término. Para ele, o ato de
ver dois quadros distintos e entender o que acontece entre um e outro, o que não é
mostrado, é o fenômeno da conclusão. Neste meio de comunicação, o espaço entre
um quadro e outro, denominado sarjeta, é responsável pelo momento em que a
mente “capta duas imagens distintas e as transforma em uma única idéia”
(McCLOUD, 2005, p. 66) e gera um entendimento da história.

Os quadros das histórias fragmentam o tempo e o espaço, oferecendo um


ritmo recortado de momentos dissociados. Mas a conclusão nos permite
conectar esses momentos e concluir mentalmente uma realidade contínua e
unificada. Se a iconografia visual é o vocabulário das histórias em
quadrinhos, a conclusão é a sua gramática. (MCCLOUD, 2005, p.67)

6
Grifos do autor.
7
Para McCloud, personagens icônicos são aqueles cartunizados, com traços mais simples.

22
Figura 1.A: rosto do mensageiro espartano detalhado e 1.B: rosto do rei Leônidas em traços simples .

O editor da DC Comics, Bob Schreck, fala sobre o fenômeno da conclusão e


de como ele acredita que Zack Snyder tenha feito isso na criação de 300, em um
dos filmes do DVD de extras: “A beleza dos gibis é que você tem que fechar os
olhos entre uma cena e outra e complementar, e foi isso que Zack fez. Ele fechou os
olhos e imaginou o que Frank queria entre uma cena e outra.” (SCHRECK, 2007,
DVD 2)
As histórias em quadrinhos não são o único meio a utilizar a conclusão. Além
do uso na vida diária, quando identificamos, por exemplo, o que é um objeto ao ver
apenas um pedaço dele, a conclusão também está presente no cinema, onde
acontece continuamente, fazendo com que a mente reconheça uma série de
imagens paradas como um movimento contínuo, e na televisão, onde um único
ponto de luz cruza a tela rapidamente, representando as imagens centenas de vezes
por segundo. Os quadrinhos, no entanto, fazem do leitor “um colaborador consciente
e voluntário, e a conclusão é o agente de mudança, tempo e movimento”
(McCLOUD, 2005, p.65), enquanto “a conclusão da mídia eletrônica é contínua,
amplamente involuntária e virtualmente imperceptível.” (p. 68)

23
Nos quadrinhos, uma cena não precisa estar amplamente descrita quadro a
quadro. De acordo com Eisner (1999, p.39) a história divide o fluxo ininterrupto de
uma história em segmentos “congelados”. O primeiro quadro pode conter, por
exemplo, um homem abrindo a porta de um carro para uma mulher e o segundo,
retratar o carro em movimento numa estrada. Na sarjeta entre os quadrinhos,
conclui-se que ambos entraram no carro, que foi ligado pelo motorista e seguiu para
a estrada. Eisner mostra uma sequência parecida, como é possível ver na Figura 2.
Esse fenômeno se aproxima da elipse no cinema, que se constitui da
“supressão de lapsos temporais mais ou menos alargados” (REIS & LOPES, 1988),
ou seja, “pontos cegos”, como define Brito (1995, p. 192) “deixados para que o
espectador preencha como lhe convier.” Brito cita o exemplo de um personagem que
atende ao telefone exaltado e, em seguida, é mostrado entrando no hospital. O
espectador entende que ele saiu de casa e enfrentou o trânsito de alguma forma,
sem que tenha sido necessário mostrar o caminho percorrido.

FIGURA 2: Exemplo de elipse na construção dos quadrinhos.

De acordo com Genette (s.d., p.106-109), a elipse pode ser distinguida de três
formas diferentes. A primeira delas é a elipse explícita, que é caracterizada pela
indicação do lapso temporal elidido, que pode ser determinada ou não. Esse tipo de
elipse pode ser encontrado no final tanto do livro de Miller, quanto do filme de

24
Snyder. Dílios, no final de sua narração, conta aos gregos que a Batalha das
Termópilas aconteceu há quase um ano.
O segundo tipo de elipse identificado por Genette é a elipse implícita, que não
está declarada no texto e é inferida pelo leitor. Assemelha-se ao conceito de
conclusão que McCloud utiliza para a passagem de um quadrinho para outro. Nos
quadrinhos Os 300 de Esparta, vemos, em uma página, Leônidas na cidade,
conversando com sua esposa e, na seguinte, a marcha dos espartanos em direção
às Termópilas. Em nenhum momento é mostrada a seleção ou reunião dos
guerreiros que irão à guerra ou saída deles de Esparta. No filme 300, os guerreiros
aparecem reunidos, portanto subentende-se que houve uma seleção. Em seguida os
membros do conselho se manifestam contra a partida e o rei declara que está
apenas levando sua guarda real “para dar uma volta” e, então, eles partem para a
guerra.
O último tipo de elipse citado por Genette é a “elipse puramente hipotética,
impossível de localizar, por vezes mesmo de colocar onde quer que seja [...]
estamos, neste ponto, evidentemente, nos limites da coerência narrativa”.
(GENETTE, s/d, p.109)
Nas histórias em quadrinhos, as representações de tempo podem ser feitas
através do espaço, das falas e outras representações de som, da divisão dos
quadros por meio das sarjetas e pelo tamanho da sarjeta ou do quadro.
A representação de som é um dos fatores mais importantes de marcação de
tempo nas HQs. Uma cena sem falas ou outros sons pode representar um momento
único, congelado, como uma pintura. Ao introduzir um som dentro da história, esse
momento passa a ser contínuo. McCloud entende que o som faz com que o leitor
veja a cena como um acontecimento em andamento, enquanto uma imagem que
não contém essa representação se parece mais com uma pintura ou um retrato,
isolando o acontecimento.
Em Os 300 de Esparta há quadros de página inteira que se assemelham a
pinturas, e o são, quando isolados do resto da narrativa. A inserção de balões de
fala confere movimento a alguns desses quadros. Isso acontece pois o leitor sabe
que uma fala precisa de um determinado tempo para acontecer, portanto entende
que aquela cena se estendeu pelo tempo da fala em questão. Outros quadros,
mesmo que não possuam representação sonora ou narração, transmitem a
sensação de movimento por haver diversos quadros seguidos ou quadrinhos

25
menores dentro de um quadro maior, mostrando diferentes momentos da ação ou
outras ações que ocorrem ao mesmo tempo.

FIGURA 3: Imagem de página inteira, assemelhando-se a uma pintura

O requadro também funciona como indicador temporal, sendo um indicador


mais geral. “A duração do tempo e as dimensões do espaço são definidas mais pelo
conteúdo do quadro do que pelo quadro em si.” (McCLOUD, 2005, p.99) O
movimento dos olhos pelos quadros pode dar a impressão de que algumas cenas
são mais longas. Esse efeito pode ser obtido aumentando o espaço entre os
quadros (tornando o requadro maior) ou aumentando o espaço de um quadro
específico. O leitor normalmente compreende, pela familiaridade com a situação,
que isso significa um prolongamento do tempo, não uma ampliação do espaço.

Na história de Frank Miller, há quadros dentro de quadros. A técnica confere


não apenas uma idéia de rapidez nos acontecimentos, como acontecimentos
simultâneos. Os quadros menores mostram ações que acontecem ao mesmo tempo

26
daquela no quadro maior, no qual está contido, além de conferirem dinamismo às
páginas.

FIGURA 4: Exemplo de quadros menores dentro de um quadro maior.

Além de representar a duração do tempo da história, os quadros também


representam o presente, o passado e o futuro. O painel que o leitor está olhando é o
presente. Qualquer quadro anterior a ele representa o passado e os posteriores,
representam o futuro.

Todavia, diferente de outras mídias, nos quadrinhos, o passado é mais do


que apenas uma lembrança, e o futuro, mais do que só possibilidade. O
passado e o futuro são reais e visíveis, e estão ao nosso redor! Onde seus
olhos estiverem concentrados, esse vai ser o agora, só que seus olhos
também captam a paisagem circunvizinha do passado e do futuro.
(McCLOUD, 2005, p.104)

Scott McCloud (p. 122) afirma que, com a evolução das belas artes e o
surgimento dos movimentos Impressionista e Expressionista, desenvolveram-se
técnicas para representar as emoções de forma visível. Os traços passaram a
possuir significado pela sua direção, forma ou caráter. De fato, a linha que McCloud
apresenta como de caráter selvagem e mortal assemelha-se às linhas utilizadas por

27
Miller para representar o sangue que decora a capa do livro, algumas páginas
internas e a arte do DVD do filme 300. Os guerreiros espartanos, especialmente
Leônidas, são retratados com linhas angulosas, sugerindo personalidade implacável.
As linhas nos quadrinhos podem representar também, quando relacionadas a
outros elementos, cheiro, vapor, fumaça, movimento, estados de espírito, sensações
e emoções, Frank Miller se utiliza deste recurso principalmente para representar
eventos naturais, como o vento e a chuva, nesta obra.

2.2 CINEMA E NARRATIVA

D O C I N E MA A O S Q U A D R I N H O S

O cinema é o “grande contador de histórias da era moderna” (BARCELOS &


SOUZA, 2005) e o cinema americano, especificamente o de Hollywood, desenvolveu
entre os anos 1910 e 1920 um modo eficiente de contar histórias. John Belton
(1994) compara a evolução da produção cinematográfica hollywoodiana com a linha
de produção criada por Henry Ford, por ter desenvolvido um estilo de narrativa
eficaz, mas invisível para o público médio do cinema, que o autor denominou
“narration machine” (máquina narrativa, em tradução livre).
O resultado da máquina narrativa de Belton é que a história é entregue ao
público de forma a parecer que não houve esforço empreendido ou que houve um
criador. A impressão é de que o filme se desenrola na tela magicamente, como que
se criando espontaneamente para a platéia. No entanto, o filme é criado e isto é feito
seguindo princípios de clareza, simplicidade, elegância, ordem, economia e simetria.
(BELTON, 1993)
O processo narrativo do cinema hollywoodiano segue um padrão em que um
estado inicial é introduzido e depois acontece algo que quebra o equilíbrio. Os
eventos seguintes tentarão restaurar o equilíbrio original, objetivo normalmente
atingido no final no filme.
O cinema clássico de Hollywood, de acordo com Belton, é centrado
principalmente no personagem, que normalmente possui objetivos claros. O
personagem está no centro do enredo e interage com os eventos, buscando, no
decorrer da história, atingir suas metas e resolver os problemas que foram impostos
na trama.

28
A “transparência” do cinema de Hollywood, a sensação de que tudo é feito de
forma simples, é, na verdade, fruto de muito trabalho. Por trás da aparência de
simplicidade existem técnicas narrativas muito bem elaboradas, que buscam mostrar
a história da forma mais poderosa possível sem interromper seu curso com sinais da
construção daquela história.
A maior parte dos espectadores está ciente de que o que se passa na tela é
uma ficção, mas este conhecimento é negado para que haja certa participação na
história. O decorrer do filme pede que a audiência se esqueça por um momento do
que é a realidade e o público assim o faz, porque a narrativa lhe traz prazer e se
mostra gratificante e significativa. O público também aprecia a técnica utilizada para
fazer um filme, distinguindo um filme bem trabalhado ou com uma maneira
empolgante de contar uma história de outros que considera não serem tão bons.
Há três aspectos da narrativa, segundo Bordwell (1985) que podem ser
distinguidos. O primeiro deles é a representação, que é como a narrativa se refere
ou significa o mundo ou um corpo de idéias. É o que pode ser chamado de
semântica da narrativa. O outro aspecto é a estrutura da narrativa, o modo como as
partes se combinam para criar um todo distinto. O terceiro aspecto pelo qual a
narrativa pode ser estudada é o ato, a dinâmica do processo de apresentação da
história ao público.
Gerard Betton destaca que o cinema é arte, linguagem, escrita, leitura e meio
de comunicação, transmitindo a visão do cineasta numa linguagem que cabe ao
público decifrar. (BETTON, 1987, p. 1) Para ele, a decupagem do filme pode ser
extremamente detalhada ou flexível, deixando margem para improvisação. O diretor
de 300, Zack Snyder, afirma que o caso de seu filme é o primeiro, pois o roteiro
segue à risca um storyboard baseado na história em quadrinhos e construído em
parceria com Frank Miller.
O filme 300 não se pretende uma representação realista, tanto em relação ao
tratamento formal quanto em relação ao enredo. Há, inclusive, incorporação de
elementos mitológicos e os fatos não são apresentados tais como foram registrados
na História.
As cores do filme são baseadas na paleta de Lynn Varley, colorista dos
quadrinhos, para criar sensações parecidas com as da HQ. “O que aparece na tela
não é a realidade suprema [...]; o que aparece é um simples aspecto (relativo e

29
transitório) da realidade, de uma realidade estética que resulta da visão
eminentemente subjetiva e pessoal do realizador.” (BETTON, 1987, p 9)
Betton (1987, p. 13) observa que nem sempre é fácil distinguir o realismo do
idealismo, porque os dois tendem a misturar-se, mas o idealismo se caracteriza pela
escolha de assuntos fantásticos ou pelo gosto do mórbido ou macabro, situações
presentes no filme de Snyder. Enquanto algumas passagens do filme poderiam ser
compatíveis com a história real da Batalha das Termópilas, o exército de Xerxes
possui diversos componentes fantásticos, como os Imortais (guerreiros tidos como
invencíveis, com rostos deformados escondidos sob uma máscara), os seres
mitológicos do harém de Xerxes, o gigante acorrentado 8 ou o Carrasco 9 , que
executa os generais que desagradam o imperador persa com as lâminas de osso
que possui no lugar dos braços. O macabro e o mórbido estão presentes tanto no
exército persa quando na vila devastada pela qual os espartanos passam em sua
marcha, tendo a Árvore da Morte10 como ponto mais marcante. Além disso, Os 300
de Esparta tem o sangue como presença marcante, não apenas nas lutas, mas
como elemento decorativo presente na capa e nas divisórias dos capítulos. Zack
Snyder transportou isso para o filme, procurando fazer da presença do sangue um
elemento de produção de sentidos.
A câmera lenta permite que os movimentos sejam observados com maior
detalhe. “Este procedimento permite colocar em evidência a beleza de um gesto ou
a elegância de uma atitude. [...] Além disso, demonstrou-se que o efeito da câmera
lenta provoca muitas vezes a adesão completa do espectador” (BETTON, 1987,
p.18) Ao gerar este efeito de adesão, a câmera lenta pode também provocar
reações afetivas, e isso é explorado em 300. A câmera lenta é utilizada na dança do
oráculo, enfatizando a atividade onírica, e nas cenas de luta, causando maior
impacto nos golpes de espada e lança, principalmente. A cena em que a lança de
Leônidas arranca os adornos faciais de Xerxes é feita em câmera lenta desde o
princípio, acompanhando a trajetória da lança até o momento em que ela prende na
parte de trás do carro do imperador persa.

8
DiLullo (2007, p. 82) chama o personagem de “Uber Immortal”, algo como Super Imortal, já que ele faz parte do
exército dos Imortais.
9
“The Executioner”. (DiLullo, 2007, p.94)
10
“Tree of the Dead” (DiLullo, 2007, p.39)

30
O mesmo efeito é visto nos quadrinhos, onde o movimento da lança é
detalhado e o momento do lançamento até o momento em que ela acerta o alvo se
desenvolve por duas páginas. Scott McCloud (2005, p. 101) explica que o tempo nos
quadrinhos pode ser afetado pela quantidade de quadros, pelo tamanho do quadro
ou pelo espaço da sarjeta (espaço entre um quadro e outro), além da própria
percepção do leitor do tempo que uma ação leva para ocorrer. Will Eisner (2008, p.
74) discute a influência de outras mídias na narrativa dos quadrinhos e a influência
do ritmo cinematográfico na impressão. A obra de Frank Miller foi concebida como
cinematográfica, como o próprio autor diz, e podemos observar o ritmo
cinematográfico apresentado por Eisner em diversos momentos, sendo a cena da
lança uma das mais marcantes.
A câmera rápida, no entanto, é vista por Betton (1987) de duas formas. A
primeira é a criação de efeitos cômicos, transformando até mesmo cenas que
deveriam ser dramáticas. A segunda é a criação de efeito dramático. É possível ver
tal efeito no filme analisado especialmente pela câmera lenta seguida imediatamente
da câmera rápida em diversas cenas de luta, antes da retomada do tempo regular.
Primeiramente, o movimento é enfatizado pela câmera lenta para, depois ser
intensificado pela câmera rápida, que acentua a severidade do golpe e a surpresa
da vítima.
O recurso de aceleração seguida da desaleceração da câmera é utilizado em
grande parte das cenas de luta do filme. “Em termos cognitivos, o efeito que a
montagem acelerada busca alcançar no espectador é a necessidade de reajuste
freqüente da percepção, mantendo seus sentidos alerta” (CARREIRO, 2010). Há, no
entanto, duas cenas emblemáticas nesse sentido. A primeira delas é a cena da
chegada do embaixador da Pérsia, que espera conseguir a rendição dos espartanos,
mas quando estes não lhe dão atenção, ele usa o chicote. A partir do momento em
que o chicote está no ar, a câmera desacelera e enquadra o chicote, em primeiro
plano, em seguida o soldado espartano Stelios, que pula em cima do embaixador
com a lança, para depois enquadrar o braço empunhando o chicote separado do
corpo. A imagem, então, acelera rapidamente enquanto o embaixador cai no
encosto de sua liteira, carregada por escravos, para depois retornar à velocidade
normal de 24 quadros por segundo.
A segunda cena acontece no final do filme, quando Xerxes e Leônidas se
encontram e o monarca persa acredita que obterá a rendição do espartano. Diante

31
de uma narração que leva o espectador a crer que a rendição acontecerá, Leônidas
se desfaz de sua armadura, até que exigem sua lança. Com ajuda de Stelios, que
mata o persa responsável pela exigência, o rei atira a arma contra Xerxes. Toda a
ação, do momento do impulso ao momento em que a lança atinge o alvo, é
mostrada em câmera lenta. O momento do impulso é acompanhado pela
continuação da narrativa, que explica que o rei espartano se desfez da proteção do
elmo e do escudo porque limitavam sua visão e tiravam o equilíbrio “e seu alvo
estava distante”, como diz Dílios, ao contar a história para os outros gregos. A lança
é mostrada em câmera lenta durante todo o seu percurso, enquadrando sua sombra
na escadaria da enorme liteira de Xerxes, também carregada por escravos, até o
momento em que rasga a boca do persa, retomando a velocidade normal quando a
ponta da lança se prende na parede atrás dele. Mesmo que a imagem não acelere
além dos 24 quadros por segundo neste momento, a sensação que o espectador
tem é a de maior rapidez, pois esta cena tem um dos momentos de câmera lenta
mais longos do filme (aproximadamente 40 segundos).

FIGURA 5: Cena final da lança na HQ.

32
FIGURA 6: Recortes do filme, com o trajeto da lança.

O mesmo fenômeno pode ser observado na Graphic Novel, especialmente na


cena da lança. Frank Miller dedica três páginas, uma delas completas, para o
percurso da lança, encerrando com dois quadros contendo cinco quadros menores,
sugerindo a câmera lenta no percurso da lança e a câmera rápida nos vários
quadrinhos num mesmo espaço.
As cenas em que a imagem acelera ou desacelera podem ser vistas como
alteração da velocidade narrativa, que é “uma atitude mais ou menos seletiva
adotada em relação à pluridimensionalidade e ao alargamento temporal da história”
(REIS; LOPES, 1988, p. 297-298). A velocidade pode ser definida pela relação entre
“uma duração, a da história, medida em segundos, minutos, horas, dias, meses e
anos, e uma extensão: a do texto, medido em linhas e páginas” (GENETTE apud
REIS; LOPES, 1988, p. 297). Nos quadrinhos e no filme, portanto, o autor tem a
liberdade de estender um fato que levaria apenas alguns segundos para ocorrer em
uma cena de quase um minuto ou de diversas páginas, enfatizando o momento.
Durante a redução da velocidade do arremesso da lança, Dílios explica o
motivo das ações de Leônidas na cena anterior. Então, numa cena lenta cujo único
acontecimento é o percurso da lança, há a narrativa de Dílios preenchendo o
espaço,com a atenção do espectador/leitor voltada para a explicação. O desacelerar

33
da história para conter a fala de Dílios pode ser vista como pausa narrativa, que
“representa uma forma de suspensão do tempo da história, em benefício do tempo
do discurso” (REIS; LOPES, 1988, p. 273).
A história dos 300 espartanos é uma narração feita por Dílios, soldado que
volta à Esparta antes do ataque final dos persas, por ordem de Leônidas. O motivo
para o rei ter dispensado um de seus guerreiros da tradição espartana de vencer a
batalha ou morrer tentando (que fica evidente na fala da rainha Gorgo, tanto no filme
quanto na HQ: “Espartano! Volte com seu escudo ou sobre ele!”) é seu talento para
a oratória. O dom de Dílios é evidenciado no filme e nos quadrinhos, mas em
momentos diferentes.
Nas duas obras, o rei pede que ele volte para Grécia com os árcades, para
que a história dos 300 espartanos que se colocaram contra milhares seja conhecida
por todos os gregos. Dílios o faz, com pesar. Em suas próprias palavras: “Um
punhado de homens fica. Milhares vão embora. Apenas um olha para trás.” Com
isso, ele ressalta o desejo de ficar e, se necessário, morrer pelo país, ainda que
obedeça à ordem de seu rei. Isso permite que ele conte aos gregos a história da
Batalha das Termópilas e, ao mesmo tempo, aos espectadores. No filme, fica claro
que o narrador é Dílios quando conhecemos o personagem. Já na graphic novel, o
narrador só é revelado na última página, por causa da conjunção aditiva “e”, que liga
a narrativa ao texto do primeiro balão de fala de Dílios.
“A voz off tem um grande poder de sugestão e permite efeitos extremamente
interessantes”, de acordo com Betton (1987, p.42). Utilizar Dílios como narrador faz
do filme uma história pré-batalha, contada para exaltar os guerreiros e incitá-los
contra o inimigo – os persas de Xerxes. A emoção que se procura inspirar no
espectador é a mesma incutida nos guerreiros e a narração feita por um espartano
sobrevivente das Termópilas à frente de um grande exército grego passa a
sensação de esperança e até um vislumbre de vitória, mesmo com a morte do rei
espartano.
O autor diz ainda que “o poder de convencimento da palavra humana não
está unicamente nas palavras pronunciadas e nas idéias que estas sugerem: ele
reside também no próprio som da voz.” (BETTON, 1987, p.44) O poder de sugestão
da voz não é o único elemento influenciado, a voz também exalta emotividade. As
variações na voz de Dílios contribuem para a manifestação do estado de espírito
que o diretor procura. O personagem Xerxes também se beneficiou do poder da voz

34
que lhe foi dado em sua construção para o cinema. Ele crê ser um deus e impõe tal
idéia aos seus subordinados. Para evidenciar a característica supostamente divina
do personagem, a voz do ator que o interpreta (Rodrigo Santoro) foi tratada
digitalmente para equivaler ao seu status, tornando-se mais grave, quase gutural.
Em entrevista à Folha Ilustrada, Santoro declara que "Zack [Snyder] dizia que,
quando Xerxes abre a boca no filme, a sala de cinema tem de tremer".

2.2.1 FILMES DE GUERRA

John Belton (1994, p. 21) acredita que, no cinema americano, o estilo


individual de cada diretor existe dentro de um estilo nacional. Os filmes americanos
de guerra, em sua visão, não seriam diferentes e mesmo que pareçam divergentes
entre si, devem seguir algumas regras da narrativa de filme de guerra americano.
Nem todas, entretanto, são obedecidas pelo 300 de Snyder.
O produtor e diretor de cinema que lutou na II Guerra Mundial Samuel Fuller
declara que “cinema é como o campo de guerra: amor, ódio, ação, violência, morte...
em suma, emoção11” (FULLER apud BELTON, 1994, p. 164) e, com base nessa
citação, Belton crê os filmes de guerra como a melhor forma de cinema, porque cria
condições para representações extremas de emoção e acontece num mundo em
que a menor ação (ou falta dela) pode acarretar em morte de um personagem.
Uma vez no campo de batalha, os homens de Leônidas estão com a vida
constantemente em risco, mas não parecem se preocupar com isso, porque foram
forjados para a guerra desde crianças. “O campo de guerra é um mundo em que as
leis, crenças, costumes e moralidade da civilização são suspensos. 12 ” (BELTON,
1994, p. 165) Como foram treinados como soldados desde os sete anos, na Agogê,
os espartanos representados em 300 estão acostumados com o mundo violento das
batalhas e não se chocam com facilidade com os excessos cometidos na guerra. O
código espartano é o código da guerra, de vencer ou morrer tentando, de nunca
recuar e nunca se render. o personagem Leônidas deixa esta idéia clara para os

11
Tradução nossa: “film is like a battleground: love, hate, action, violence, death… in a word, emotion.”
12
Tradução nossa: “The battlefield is a world in wich the laws, beliefs, behavior, and morality of civilization are
suspended.”

35
árcades quando eles descobrem que a batalha das Termópilas está perdida e
decidem se retirar para a Grécia.
Gerard Buttler, ator que interpreta Leônidas, declara em uma das entrevistas
contidas no DVD de extras que via apenas uma forma de interpretar o personagem,
no tocante à guerra:

Há uma forma simplista para este homem prosseguir, que é: “nós não nos
submetemos, não nos rendemos, não fugimos. Se você não vai retroceder,
então vamos lutar. E vamos lutar da melhor maneira que pudermos.”
(BUTTLER, 2007, DVD 2)

Belton destaca que, em filmes de guerra americanos atuais, a volta para casa
é mostrada como um evento traumático, já que os homens têm dificuldade em se
adaptar à “vida normal” em decorrência da extrema masculinização 13 pela qual
passam no exército. Esse processo é visível nos quadrinhos, durante um
treinamento, não mostrado no filme, e Leônidas deixa a entender que isso é comum
para o seu povo. Numa conversa com Xerxes, ele diz: “Você claramente não
conhece nossas mulheres. A julgar pelo que vi aqui, poderia tê-las trazido para a
batalha”. O diálogo sugere que mesmo as mulheres espartanas estão preparadas
para a batalha (tendo passado pelo processo de masculinização). A historiadora
Bettany Hughes confirma que, na Esparta histórica, as mulheres eram preparadas
para lutar tal qual os homens.

O soldado combatente arquetípico de Hollywood é uma caricatura da


masculinidade, sua tenacidade cartunizada é sintetizada no Rambo de
Sylvester Stallone. Esse personagem é, em si mesmo, uma compilação de
14
heróis encontrados em histórias em quadrinhos. (BELTON, 1994, p.169)

A masculinidade cartunizada também é facilmente encontrada em 300. Uma


das representações da masculinidade é a aparente força física, vista nos soldados
espartanos seminus. Para ressaltar essas características, os atores não apenas
passaram por semanas de treinamento intenso, como foram utilizadas técnicas de
maquiagem que destacassem seus músculos. Outra característica é a rejeição do
lado feminino, que não é encontrada com tanta força no filme como na HQ.

13
Original: “overmasculinization”.
14
Tradução nossa. Original: “The archetypal Hollywood combat soldier is a caricature of masculinity; his
cartoonlike toughness is epitomized in Sylvester Stallone‟s Rambo. This character is itself a compilation of action
heroes found in comic books.”

36
Enquanto esta exibe momentos em que os homens são menosprezados por seus
superiores e, com isso, devem procurar se fortalecer emocionalmente, aquele
mostra situações de afeto familiar entre os soldados.
Os filmes de guerra americanos, de acordo com Belton (1994, p. 177),
procuram educar e “racionalizar a necessidade da guerra”. Vemos essa justificativa
constantemente em 300, na qual os espartanos não lutam por lutar, mas por sua
nação, pela honra e pela glória. Em diversos momentos, os personagens afirmam
buscar a “bela morte”, que será abordada mais adiante.
Belton afirma que filmes de guerra mediam a relação das pessoas com as
guerras reais e auxiliam no seu entendimento, além de funcionar como meio de
catarse, inspiração e protesto. “Independentemente de quem vença ou perca a
batalha, o cinema está aí para que vençamos a guerra”15 (BELTON, 1994, p.182)

15
Tradução nossa. Original: “Wether we win or lose the battle, the movies are there to enable us to win the war.”

37
3 CONCEITO DE HERÓI

Joseph Campbell (2007) identifica o herói como “o homem ou a mulher que


conseguiu vencer suas limitações históricas pessoais e locais e alcançou formas
normalmente válidas, humanas”. Alguém que superou as limitações e ascendeu
“como homem eterno – aperfeiçoado, não específico e universal” (CAMPBELL,
2007, p.28). Ele também separa o herói do conto de fadas, que busca o triunfo
doméstico ao vencer opressões pessoais, do herói do mito, que busca regenerar sua
sociedade através do triunfo histórico-universal.
Nem o livro de Frank Miller nem sua adaptação audiovisual parecem seguir à
risca os passos da aventura do herói na ordem em que Campbell os elenca, mas a
maioria desses passos se faz presente nas duas obras, a começar pelo chamado
da aventura: “Um erro – aparentemente um mero acaso – revela um mundo
insuspeito e o indivíduo entra numa relação com forças que não são plenamente
compreendidas.” (CAMPBELL, 2007, p.60)
A perturbação inicial, o que chama os guerreiros espartanos para a aventura,
é a chegada de um mensageiro persa exigindo terra e água como prova de
submissão ao rei persa, Xerxes, o que é negado por Leônidas, resultando na morte
do mensageiro e início da guerra contra a Pérsia.
O segundo passo é a recusa do chamado. “A recusa à convocação converte
a aventura em sua contraparte negativa. Aprisionado pelo tédio, pelo trabalho ou
pela „cultura‟[...]” (CAMPBELL, 2007, p. 66), que impõe que o rei espartano não lute
por causa de celebrações religiosas. A aventura não é negada por Leônidas em
momento algum, no entanto, Esparta está impedida de lutar pelos Éforos 16 , que
anunciam a aproximação do ritual sagrado da Carnea, enfatizando que Esparta não
vai à guerra neste período. O conselho espartano se coloca a favor dos místicos e
Leônidas, para honrar as tradições e, ao mesmo tempo, salvar seu país, se vê
obrigado a usar artifícios não convencionais para enfrentar o contingente persa:
afirma que não irá à guerra, apenas levará 300 de seus homens para uma longa
caminhada e que o exército permanecerá na cidade.

16
Para termos referentes à vida e sociedade em Esparta, ver glossário.

38
O auxílio sobrenatural não é encontrado na HQ nem em sua adaptação para
o cinema. Ao contrário: o sobrenatural é visto como algo negativo, o que pode ser
visto no modo como são caracterizados os Éforos, no início da narrativa, e os
Imortais, durante as batalhas.
O primeiro limiar da aventura do herói demarca o fim do mundo conhecido e
o início do desconhecido. “Além desses limites estão as trevas, o desconhecido e o
perigo”. (CAMPBELL, 2007, p.82) O território pelo qual os espartanos marcham lhes
é conhecido. É justamente o conhecimento de terreno que Leônidas tem e sabe que
os persas não possuem que o impulsiona a ir à guerra. Este conhecimento é um
elemento chave, inclusive, em sua estratégia militar. O desconhecido, portanto, não
está no terreno. Enquanto a história em quadrinhos não possui nenhum elemento
prévio às lutas que denotem perigo ou causem medo nos espartanos, o filme os os
leva até uma vila devastada por um grupo de reconhecimento persa, na qual se
deparam com com a “Árvore dos Mortos 17 ” (DILULLO, 2007) Muitos soldados
mostram expressões horrorizadas. É o primeiro sinal de perigo com o qual se
deparam e a primeira vista que têm do poderio bélico persa.

A idéia de que a passagem do limiar mágico é uma passagem para uma


esfera de renascimento é simbolizada na imagem mundial do útero, ou o
ventre da baleia, O herói, em lugar de conquistar ou aplacar a força do
limiar, é jogado no desconhecido, dando a impressão de que morreu.
(CAMPBELL, 2007, p.91)

O ventre da baleia passa a idéia de auto-aniquilação. O herói se deixa ser


engolido pela baleia – pelo inimigo – ao invés de investir imediatamente contra ele. A
Batalha das Termópilas pode ser vista como a baleia, pois Leônidas já sai de sua
cidade com a certeza de que não voltará a vê-la. Sua esposa também parece ter a
mesma certeza, pois nas duas obras ela se despede com a frase: “Espartano! Volte
com seu escudo ou sobre ele!”, dando-lhe a recomendação de voltar vitorioso ou
morto. Logo em seguida, Leônidas pensa que nunca mais verá sua terra. Leônidas
não retorna à Esparta vivo, mas como lenda de honra e exemplo a ser seguido –
que é narrada por Dílios aos gregos, antes de partirem para uma batalha posterior.
O que Campbell identifica como o caminho de provas é a maior parte da
narrativa. “Tendo cruzado o limiar, o herói [...] deve sobreviver a uma sucessão de

17
Tradução nossa. Original: “Tree of the Dead”.

39
provas. Essa é a fase favorita do mito-aventura.” (CAMPBELL, 2007, p.102) Este é o
momento em que o herói prova seu valor. Os espartanos o fazem por meio de
estratégias bem articuladas aliadas à força bruta. Apesar de Leônidas não acreditar
na interferência dos deuses, seus homens acreditam e vêem na tempestade que
destrói embarcações persas um auxílio divino, alegrando-se com isso. Os
espartanos não possuem outro tipo de auxiliar mágico ou quaisquer artefatos
místicos, no entanto eles têm aliados, os árcades com quem se encontraram durante
a marcha até as Termópilas, e que são usados em manobras militares. Leônidas
aproveita o encontro com Xerxes, o rei persa, para identificar seus defeitos e usá-los
contra ele em batalha. Deste modo, Esparta vence sucessivas lutas contra a Pérsia,
até a traição por parte de um de seus conterrâneos.
“Terminada a busca do herói, [...] o aventureiro deve ainda retornar com seu
troféu transmutador da vida.” (CAMPBELL, 2007, p.195) Leônidas e seus soldados
jamais vêem Esparta novamente, exceto por Dílios, enviado pelo rei para retornar
com os árcades, com a missão de informar aos gregos aquilo que aconteceu nas
Termópilas: “Você tem um conto ilustre para contar. Um conto sobre vitória.” O troféu
que Leônidas manda para casa é o sacrifício pelo país e a inspiração para que os
gregos se unam sob o comando espartano e, assim, derrotem os persas.
Leônidas se dirige voluntariamente ao limiar da ventura e, ao encontrar a
primeira presença sombria – os Éforos, que desejam que Esparta não lute – não
tenta fazer acordo com ela ou vencê-la, mas engana-a, partindo de forma não-oficial
e sem declarar que irá à guerra. Além do limiar, ele encontra forças desconhecidas,
mas estranhamente íntimas. Xerxes é seu oposto; é vaidoso, corrupto, crê ser um
deus e vê a liberdade grega como algo a ser comprado ou destruído. Sua oferta, no
entanto, é algo que poderia agradar o rei espartano: poder sobre os rivais
atenienses, controle militar sobre diversos povos. Entretanto abrir mão da liberdade
e da honra é um preço que Leônidas não está disposto a pagar.
Kothe caracteriza uma narrativa como um sistema que possui um herói como
princípio de organização, aquilo que rege a narrativa ou é o seu centro. Com base
nos gêneros literários clássicos (tragédia, epopéia, comédia e sátira), faz a
classificação dos heróis como trágico, épico (personagens considerados de tipo
elevado) ou pícaro (personagem considerado de tipo baixo).
O enredo épico normalmente busca restaurar a situação inicial de equilíbrio,
que é ameaçada no início da narrativa. O herói épico é aquele que procura fazer sua

40
própria história e não deixa que as dificuldades deturpem a sua característica de
“bom”, de “herói”, sendo identificado principalmente por sua faceta bélica. Junito
Brandão faz a análise etimológica da palavra:

Etimologicamente, héros talvez se pudesse aproximar do indo-europeu


servä, da raiz ser-, de que provém o avéstico haurvaiti, "ele guarda" e o
latim seruäre, "conservar, defender, guardar, velar sobre, ser útil", donde
18
herói seria o "guardião, o defensor, o que nasceu para servir".
(BRANDÃO, 1987, p.15)

A função principal do herói é, portanto, a proteção de seu povo e onde são


depositadas as esperanças de defesa e salvação. Vieira considera que o herói é,
“aquele que põe o interesse coletivo acima de seus próprios, que se sacrifica por
uma causa, um ideal, por um mundo justo onde o bem-comum está acima de tudo.”
(VIEIRA, 2007) Este é o papel que Leônidas assume ao sair de Esparta com sua
guarda de 300 homens, para defender a cidade dos invasores persas, mesmo
desrespeitando a ordem dos Éforos e do conselho.
Dean Miller (2000) trata da graduação da palavra herói através do tempo que,
inicialmente, tinha o significado de semideus, depois a de um homem que se
destacava em batalha por feitos extraordinários até, finalmente, um homem que, em
um determinado momento, mostra marcas que são motivo de grande orgulho ou
nobreza. O autor também aborda a definição que Homero utilizava para o termo
herói. No grego arcaico, herói era qualquer homem livre ou notável, quer por
características épicas e bélicas ou não. Hesíodo tratava o herói como alguém do
passado que esteve em lugares lendários, como Tróia; e Píndaro, finalmente, define
os heróis gregos como semideuses, estando acima dos homens comuns e abaixo
dos deuses.
Homero, apesar de não entender o termo como um homem além da média,
associou-o a personagens épicos, especialmente na sua narração da Guerra de
Tróia, ao construir a imagem dos guerreiros famosos da Ilíada como:

18
Grifos do autor.

41
a poderosa imagem dos jovens heróis, fisicamente perfeitos, morrendo pela
fama e escapando da maturidade (e, assim, escapando da “morte ruim” da
velhice impotente e feia), atingindo a “boa morte” que termina sua história
19
física em combate. (MILLER, Dean, 2000, p.4-5)

Para identificar o herói épico, Dean Miller o compara com o herói trágico,
ambíguo, questionador, muitas vezes com forte sentimento de culpa, indeciso e
amargurado, que geralmente terá um final pessimista. O autor, então, identifica o
herói épico como emocionalmente limitado, livres de culpa e com decisões claras, o
herói-guerreiro em busca da fama. Leônidas, no filme, é um pouco mais reflexivo e
indeciso do que a graphic novel deixa transparecer, já que busca conselhos com a
rainha Gorgo em assuntos importantes. Entretanto, ele se mantém certo da decisão
de sacrificar-se por Esparta, pela esposa e filho, pela glória e honra, como é repetido
à exaustão tanto na HQ quanto no filme.
A história em quadrinhos Os 300 de Esparta é considerada uma obra épica
por seu próprio autor e Leônidas, seu personagem principal, pode ser classificado
como herói épico, pois atende às características listadas, inclusive no tocante à sua
queda. O herói épico, ao decair, deixa de mostrar apenas sua face de guerreiro e
mostra também o lado das relações afetivas: o pai, o marido. Frank Miller mantém
essa linearidade no seu livro, a esposa de Leônidas tem uma aparição muito rápida,
não há menção a um filho, mas o quadro que marca o início de sua morte é
dedicado a ela, onde Leônidas chama Gorgo, em pensamento: “Minha rainha. Minha
esposa. Meu amor”. Neste momento, a HQ mostra as relações do rei espartano que
vão além da guerra.
Zack Snyder seguiu um caminho diferente. Durante todo o filme mostrou
guerreiros corajosos e ansiosos pela batalha, ainda que isso significasse a morte, no
entanto deixou transparecer as relações familiares e de amizade e usou esses laços
como algo que dá mais força aos espartanos. Gorgo tem participação importante
nas tomadas de decisão de Leônidas. No campo de batalha é mostrada tanto a
relação pai e filho como a relação entre amigos. O lado guerreiro e o lado afetivo dos
espartanos são exibidos de forma equilibrada no filme, como a declarar que não são
excludentes. Ao exibir Leônidas como rei, pai e marido, juntamente com sua face de

19
Tradução nossa. Original: “the powerful image of the physically perfect young hero dying for fame and escaping
maturation (and thus the “bad death” of the impotent and ugly old age) by achieving a “good death” that ends his
physical history in combat.”

42
guerreiro e chefe militar, Snyder torna o personagem mais palpável, gerando
identificação maior por parte do público – que é mais variado do que o público de
quadrinhos.

43
4 ANÁLISE

4.1 300 DE ESPARTA

Betton descreve o cinema como arte, linguagem, escrita, leitura e meio de


comunicação, que transmite a visão do diretor para que o público a decifre. Em 300
de Esparta, o diretor, Zack Snyder, trabalhou da forma mais próxima possível aos
quadrinhos de Frank Miller, procurando usá-lo como storyboard em certos momentos
ou como base para a criação das cenas existentes apenas no filme.
A história dos trezentos espartanos que guardaram as Termópilas,
impressionante por si própria, foi transfigurada primeiramente na história em
quadrinhos, para conter a construção da imagem heróica de Leônidas, a partir de
sua luta com o lobo, a violência e o sangue como proposta estética e a inserção de
criaturas míticas ou tidas como monstros – como os elefantes - que dificilmente
estavam presentes quando a verdadeira batalha aconteceu.
A própria luta contra o lobo não representa nenhum ritual de passagem pelo
qual os jovens espartanos tinham que passar, é uma alegoria à batalha retratada,
criada por Frank Miller, como ele explica nos extras do DVD:

Tive a idéia do lobo como alegoria para os Portões de Fogo. Não há


nenhuma evidência histórica de que ele [Leônidas] tenha lutado com um
lobo. [...] Mas quis que simbolizasse não só a batalha, na maneira que ele
prende o lobo entre duas paredes de pedra, mas também mostrar Leônidas
como um herói lendário e não simplesmente um homem prático. (MILLER,
Frank, 2007, DVD 2)

Na criação do filme, acrescentaram-se ainda mais fatos fantásticos aos


presentes nos quadrinhos. Com a própria escolha das cores, não se intenta uma
representação realística. Snyder escolhe utilizar tons terrosos para o dia e tons azuis
para a noite, de forma a manter-se fiel à coloração de Lynn Varley nos quadrinhos,
como já abordado anteriormente, e manter as sensações pretendidas por ela.
Ao colorir o céu, por exemplo, a intenção foi acrescentar dinamismo e
dramaticidade, como diz DiLullo (2007, p.23): “Esta imagem dos mensageiros persas

44
chegando em Esparta é destacada por um céu deliberadamente processado para
ser mais dinâmico e dramático para a cena, em vez de realista.”20
Na graphic novel o céu é feito utilizando técnicas de pintura, para acrescentar
intensidade às cenas, dentro do conceito de McCloud (2008, p.45), que considera
intensidade como um conjunto de técnicas visuais que conferem aos quadrinhos
contraste, dinamismo, empolgação gráfica ou sensação de urgência. A idéia de
Frank Miller de fazer uma história épica foi realizada através desses elementos
gráficos. No filme, foi utilizado o recurso de misturar fotografia à pintura, como
descrevem o diretor de arte e efeitos visuais Grant Freckelton e o supervisor de
efeitos visuais Chris Watts:

Nosso céu é criado usando uma mistura de elementos fotográficos e


aquarelas, dando origem a uma sensação única de textura, sem ser
totalmente pintado. As paletas de cores e tipos de nuvens podem variar de
seqüência a seqüência, mas a estética geral da mistura de pintura e
21
imagens fotográficas permanece constante durante todo o filme.
(DILULLO, 2007, p.23)

Ao misturar elementos para criar um céu artificial, Zack Snyder procurou


transportar para o filme as sensações dos quadrinhos. Durante todo o filme o céu
apresentado é artificial e utilizando a mistura citada, com a intenção de manter-se
fiel à estética dos quadrinhos e realçar o sentimento épico que o quadrinista
procurou imprimir em seu trabalho.
A cena da chegada do mensageiro é a primeira representação de perigo para
a cidade de Esparta. Seria, portanto, o chamado da aventura de Campbell (2007,
p.60), citado anteriormente. O céu não é o único elemento a enfatizar a cena.
Quando o mensageiro chega ao portão de Esparta, o recurso da desaceleração da
imagem é utilizado, destacando o momento.
As cores foram trabalhadas de forma a se assemelharem aos quadrinhos,
para transmitir as mesmas emoções, bem como todo o cenário. 300 foi filmado
inteiramente em um estúdio em Montreal, no Canadá, não por questões
orçamentárias ou falta de locação. Freckelton afirma que a escolha foi feita já que

20
Tradução nossa. Original: “This image of the Persian messengers arriving in Sparta is highlighted by skies that
were deliberately rendered to be more dynamic and dramatic for the scene rather than realistic.”
21
Tradução nossa. Original: Our skies are created using a blend of photographic and watercolor elements, giving
the backgrounds a uniquely textured feel without being entirely painted. The color palettes and types of clouds
may vary from sequence to sequence, but the overall aesthetic of mixing painterly and photographic imagery
remains constant throughout the film.

45
Snyder “queria dar vida à história em quadrinhos e ele sabia que filmando contra o
fundo azul teria a flexibilidade e controle máximos do aspecto do filme.”22 (DILULLO,
2007, p.35)
Dos guerreiros levados por Leônidas para “dar uma volta”, contrariando a
decisão do conselho espartano e dos Éforos, apenas um volta à Esparta, com a
função de narrar ao povo o que acontecera a seu rei. Dílios transforma as lutas
travadas contra os persas em um conto épico e é dele que parte a narrativa em voz
off no filme e nos quadros de narração dos quadrinhos. Betton (1987) relaciona a
voz off com o poder de sugestão e o papel de Dílios é justamente incitar o exército
para a batalha que garantiria a liberdade grega e tentar gerar o mesmo sentimento
no espectador.
As frases de efeito, presentes tanto no filme quanto nos quadrinhos, são
características fortes dos guerreiros espartanos de Miller. Foram utilizadas, inclusive,
nos cartazes promocionais do filme. Apesar da obra não se propor como verdade, os
diálogos espirituosos e frases de efeito dos personagens remetem à História
espartana. A historiadora Bettany Hughes declara, no DVD de extras de 300, que:

Na agogê, eles [os espartanos] eram ensinados a serem espirituosos e


perspicazes. Eles trocavam tiradas com seus professores, para ver quem
era mais engraçado e levavam isso para a guerra. Iam para a guerra
cantando e dançando. Os outros guerreiros da antiguidade achavam isso
uma loucura. (HUGHES, 2007, DVD 2)

As frases de efeito não foram as únicas a passarem para o cinema da mesma


forma como foram proferidas na HQ. Grande parte dos diálogos sofreu pouca ou
nenhuma alteração, especialmente nas cenas em campo de batalha.

4.1.1 FIGURINO

ESPARTANOS

Diz Betton que “o objetivo do guarda-roupa é exaltar a beleza, o caráter, a


personalidade dos heróis e valorizar os gestos e atitudes das personagens.” (1987,

22
Tradução nossa. Original: “he wanted to bring the graphic novel to life, and he knew that shooting againsr a
blue screen gave him the maximum flexibility to control the look of the film.”

46
p. 57) A vestimenta é importante para a caracterização dos personagens e para os
próprios personagens. Os espartanos, por exemplo, valorizam o uniforme, pois é o
que os identifica como guerreiros. O próprio Leônidas só se diferencia do resto de
seu exército pelo adorno em seu elmo. A plumagem do elmo de Leônidas é um
elemento próprio do filme e dos quadrinhos. Frank Miller pesquisou sobre as
armaduras espartanas e alterou muito do que elas na realidade eram: “Outra
liberdade que tomei foi essa, todos eles possuíam plumas, mas eu só dei a pluma
para Leônidas, para diferenciá-lo e identificá-lo como rei.” 23 Os espartanos não
lutavam semi-nus, como representado na obra de Miller e em sua adaptação:

Eu retirei a placa de peito e o saiote de couro por uma razão. Eu queria que
eles se movimentassem e tivessem boa aparência. Espartanos, com
armadura completa, eram praticamente indistinguíveis, exceto de um ângulo
24
muito próximo. (MILLER apud LANG, 2007.)

Há uma passagem no filme em que, antes da batalha, o capitão Artemis grita


para os guerreiros honrarem o escudo que portam. O escudo, o elmo e a capa
vermelha são os elementos que identificam os guerreiros espartanos tanto na
história em quadrinhos quanto no filme.

FIGURA 7.A e 6.B: Exemplos do figurino espartano na HQ e no filme.

23
Tradução nossa. Original: "Another liberty I took was, they all had plumes, but I only gave a plume to Leonidas,
to make him stand out and identify him as a king."
24
Tradução nossa. Original: "I took those chest plates and leather skirts off of them for a reason. I wanted these
guys to move and I wanted 'em to look good. ... Spartans, in full regalia, were almost indistinguishable except at a
very close angle."

47
O terreno grego, apesar de ter sido estudado por Frank Miller para compor os
quadrinhos, são igualmente uma interpretação estilizada, baseada num mito e não
na realidade, de forma que se adequasse à história.

EFIALTES

Efialtes, o espartano monstruoso e rejeitado quando criança, veste o uniforme


de guerra que pertenceu a seu pai na tentativa de reintegração à sociedade
espartana através do exército. Leônidas explica que, para ser um dos guerreiros,
precisa ser capaz de, com o escudo, proteger o seu vizinho do pescoço à panturrilha
e Efialtes não consegue ficar ereto ou erguer suficientemente o escudo. Sendo
assim, ele não poderia fazer parte de uma parede de escudos, estratégia militar que
o rei espartano considera crucial nas batalhas, e é orientado a ajudar o exército de
outras formas, como cuidar dos guerreiros feridos. No filme, quando não lhe é
permitido lutar como igual ao lado dos outros por estar aquém das exigências do
exército, ele joga seu escudo do cume da montanha em que conversava com
Leônidas.
Na graphic novel, Efialtes tenta o suicídio neste momento e sobrevive “pela
crueldade dos deuses”. Sua atitude, no entanto, é a mesma no filme e nos
quadrinhos após este momento: oferecer à Xerxes o caminho para vencer Leônidas.
Tudo o que ele pede em troca é um uniforme. Pode-se dizer que, tanto ao se
desfazer do escudo, no filme, quanto ao tentar o suicídio, na HQ, Efialtes deixa de
se identificar como guerreiro espartano, partindo em busca da vingança pela
humilhação e de uma nova nação que o acolha.
Na história em quadrinhos, ao notar que sobrevive, Efialtes amaldiçoa os
deuses por não ter morrido e seus pais, por terem fugido de Esparta quando ele era
um bebê e o protegido da morte25. Em seguida, amaldiçoa os espartanos e vai em
busca do exército persa, deixando para trás o elmo, o principal símbolo do exército
espartano nos quadrinhos, utilizado desde a capa até as introduções de capítulos.
Na transcrição da GN para o filme, a cena da tentativa de suicídio chegou a
ser filmada, no entanto, foi excluída pelo diretor durante a produção. Snyder decidiu
não incluir a tentativa de suicídio porque a cena seguinte já havia sido cortada, pois

25
Eugenia espartana.

48
tornava o filme mais longo do que poderia ser. Para ele, não havia sentido em
mostrar Efialtes se jogando do precipício e depois mostrá-lo vivo, na tenda de
Xerxes, sem a cena na qual era possível ver que ele havia sobrevivido à queda e
decidia se vingar: “Ela foi excluída do filme porque, como excluímos a posterior, não
poderíamos ter a cena dele se jogando e depois não ver o que aconteceu com ele.”
(SNYDER, 2007, DVD 2)

XERXES

A vestimenta de Xerxes é compatível com a visão que o personagem tem de


si mesmo. Revestido de ouro e jóias, o rei persa acredita ser um deus e age como
tal. Seu traje deixa claro, também, aquilo que Leônidas percebe como seu principal
defeito: a vaidade. A opulência de Xerxes é vista primeiro na sua roupa, depois
identificada no seu harém.
Frank Miller declara que o imperador persa “acreditava ser um deus e era
reverenciado como um rei-deus. Ele acreditava que seu destino era conquistar o
mundo”. Para tanto, não apenas o revestiu de ouro, como explorou essa
grandiosidade nas cores que compõem o harém. Lynn Varley, nos quadrinhos,
utilizou apenas o dourado e o preto. No filme, como os aposentos de Xerxes são
mais amplamente explorados, as cores ali presentes remetem à grandiosidade,
como o púrpura, o vermelho e o rosa, além do próprio ouro, que parece acompanhar
o imperador em todas as cenas em que ele aparece. “No filme, a tenda dá a Snyder
a oportunidade de explorar a devassidão opulenta da corte de Xerxes, utilizando [...]
26
sets luxuriosos. ” (DILULLO, 2007) As cores do cenário foram escolhidas
propositadamente, para capturar o status de Xerxes e ressaltar a potência dos
desejos obscuros e sombrios.
Além de cores que evocam a realeza e a luxúria (vermelhos, púrpuras,
dourados), a tenda de Xerxes abriga concubinas de diversas partes do mundo,
algumas delas apresentando deformidades, como ausência de membros ou
queimaduras na pele.

26
Tradução nossa. Original: “In the film, the tent provides Snyder na opportunity to showcase the opulent
debauchery of Xerxes‟ court using [...] lush set desing.”

49
FIGURA 8: Imagens da produção, mostrando a tenda de Xerxes.

FIGURA 9: Cenas do filme mostrando a tenda de Xerxes.

50
4.1.2 EFIALTES: APARÊNCIA FÍSICA E PERSONALIDADE

Nas histórias em quadrinhos, uma das formas de mostrar traços da


personalidade é pela aparência dos personagens. Scott McCloud (2005, p.124-127)
considera que as linhas utilizadas pelo desenhista são capazes de transmitir
sensações, inclusive na forma dada aos personagens. Frank Miller descreve a
personalidade de Efialtes e fala sobre a sua construção, em um dos vídeos do DVD
de extras:
O transformei num corcunda porque queria enfatizar o quanto os espartanos
eram cruéis e como ele não deveria ter sobrevivido, se fosse pela lei
espartana. Os pais fugiram com ele para as montanhas, mas ele sempre
quis ser espartano. Quis fazer dele uma figura patética e, nos quadrinhos, a
aparência física é uma metáfora do que a pessoa é por dentro. (MILLER,
2007, DVD 2)

Os gregos possuíam a visão de que tudo o que era belo, era bom, e tal idéia
se aplica ao filme e aos quadrinhos, aonde os espartanos, heróis da história, são
todos bonitos e fortes. Efialtes, o traidor, é retratado como uma monstruosidade,
assim como diversos personagens componentes do exército persa.

FIGURA 10.A e 9.B: Efialtes representado na HQ e no filme , dentro da tenda de Xerxes.

Efialtes pode ser considerado como uma ameaça a Esparta antes mesmo de
ser rejeitado pelos guerreiros, pois seus pais desafiaram a lei espartana ao mantê-lo

51
vivo. Apesar de saber que sua aparência não é agradável e que não deveria ter
sobrevivido, Efialtes, inicialmente, tem orgulho de sua nação e quer juntar-se aos
espartanos na luta contra Xerxes. Quando não tem a aceitação que espera e se
sente rejeitado, passa a representar uma ameaça real, já que resolve vingar-se.
Efialtes é o que Edvânea Silva (2008) considera um mostro ambivalente, pois
é espartano, já que nasceu em Esparta, mas não é assim considerado pelos outros.
Está, portanto, em uma constante busca por uma identidade, que pode ser
representada pelo uniforme. A ambivalência também pode ser vista na informação
que ele carrega. Primeiramente ele revela a passagem dos pastores, para Leônidas,
como uma forma de provar que está a favor dos espartanos, já que a trilha cortava a
montanha e poderia levar para a retaguarda do exército grego. Quando é rejeitado,
repassa a informação para Xerxes, indicando o caminho aos guerreiros persas. Na
tenda de Xerxes, Efialtes vê mulheres e que não são perfeitas sendo aceitas e
parece não apenas desejá-las como desejar tal aceitação para si e vê mais
facilidade de identificação ali do que entre os espartanos.

4.1.3 O SANGUE COMO ELEMENTO ESTÉTICO

Ao produzir a história em quadrinhos, Frank Miller fez da violência um


elemento artístico da história, já que é algo inerente à guerra e, em sua visão, ao
modo de vida espartano. Ele não via outra maneira, inclusive: “Não havia meio de
contar a história de 300 sem ser incrivelmente brutal.” (MILLER, Frank, 2007, DVD 2)
A violência e o sangue como propostas estéticas estão presentes, também, em
outras obras de Miller. O quadrinista acredita que “na ficção, nos quadrinhos e no
cinema há uma longa história de violência estilizada. Dá-se uma idéia do fato, em
vez de mostrar a realidade.” (MILLER, Frank, 2007, DVD 2)
O sangue na HQ aparece não só nas feridas dos guerreiros, mas como
elemento artístico da introdução de cada capítulo e das páginas do livro que não
contém história. Os produtores do filme vêem o sangue como elemento chave da
história e procuraram uma aproximação estilizada dos quadrinhos. Os respingos de
tinta vermelha que representam o sangue decorativo na HQ foram digitalizados e
incorporados ao filme, que utilizou animação em 2D para fazer o sangue.

52
27
O sangue 2D precisa ser projetado e renderizado de um modo que os
espectadores identifiquem claramente que o que estão vendo se trata de
um exercício estilístico deliberado, não um erro. Precisa ser
simultaneamente brutal e belo. Na graphic novel, Miller e Lynn Varley
representam o sangue com um efeito de respingos de tinta, técnica que é
28
levada para as batalhas do filme. (DILULLO, 2007, p. 14)

Nos quadrinhos, o efeito de respingo não é tão utilizado dentro da narrativa


quanto no filme, que procurou explorar a violência de forma ainda mais impactante.
No DVD de extras que acompanha o filme, Zack Snyder revela que foram utilizados
efeitos de computação gráfica para ampliar o impacto do sangue, além de fazê-lo
mais aparente nos ferimentos de saída dos golpes, não de entrada, para dar maior
visibilidade aos respingos extraídos da GN.

FIGURA 11: Exemplo de títulos, com respingos de sangue

Os produtores do filme afirmam que o sangue do filme é “autorizado” a


desafiar as leis da física, já que a intenção não é ser naturalista. O sangue que é
visto nos ferimentos de saída das armas é feito de tal forma que enfatize o
movimento do golpe.

27
Renderização é o processo pelo qual pode-se obter o produto final de um processamento digital qualquer e
pode aplicar-se a arquivos de imagem, áudio ou vídeo.
28
Tradução nossa. Original: “2D Blood needs to be designed and rendered in a way that audiences can clearly
identify that what they‟re seeing Is a deliberate exercise in style, rather than a mistake. It needs to be
simultaneously brutal and beautiful. In the graphic novel, Miller and Lynn Varley depict blood with a spattered ink
effect, a technique that is carried over to the film in all the live-action battles.”

53
A Árvore dos Mortos representada no filme, inexistente na HQ, é feita de
corpos dos habitantes de uma vila pela qual os espartanos passam e foi feita para
representar a filosofia do diretor em relação ao filme, de que a representação da
violência em 300 seria impactante, mas estaria distante do realismo. Sua idéia é
transformar guerra em arte, a partir dos quadrinhos de Frank Miller, como ele
declarou no livro de DiLullo:

300 é a história de Frank Miller trazida à vida, sua estética foi realizada com
a fusão de fotografia e efeitos visuais altamente estilizados. É a
representação de um evento histórico real, mas é mais fantasia do que fato,
[...] editado num filme anti-anti-guerra, aonde as lutas, a morte e o sacrifício
são coisas a serem celebradas. (DILULLO, 2007, p. 39)

As mortes dos espartanos (ou mesmo golpes não mortais recebidos por eles)
foram trabalhadas de forma que recebessem mais atenção do espectador. Além do
movimento não natural do sangue, são momentos em que a técnica de redução da
velocidade da imagem é mais utilizada e a câmera se demora mais no ato seguinte
ao golpe.
O sangue nas duas obras é, portanto, estilizado de modo a ser entendido
como arte. Nos quadrinhos, sua representação não remete ao sangue real, mas a
respingos de tinta. No filme, além de utilizar a mesma técnica da HQ, o sangue
desafia as leis da física pela forma como sai dos ferimentos e foi elaborado para ser,
visivelmente, diferente dos outros elementos das cenas, pela própria forma de
renderização escolhida. Enquanto as outras artes do filme são em 3D, o sangue foi
feito em animação 2D. O propósito, como já dito, foi fazer algo que fosse
simultaneamente brutal e belo. Se a narrativa impressiona pela violência, a arte em
computação gráfica impressiona pelas cores e movimentos, inclusive o do sangue.

4.1.4 DÍLIOS E A IMAGEM DE LEÔNIDAS COMO HERÓI

Quando Efialtes revela a passagem dos pastores pela qual os persas podem
encurralar os espartanos, Leônidas manda Dílios de volta para Esparta, pois ele
possui um talento a mais em relação aos outros guerreiros. Dílios é um contador de
histórias e seu talento é mostrado diversas vezes durante a narrativa. Tanto na HQ

54
quanto no filme, o vemos entretendo o exército com a história de Leônidas
adolescente e o lobo. Ao receber a ordem de voltar, recebe também a de contar
para os gregos o que aconteceu na Batalha das Termópilas.
Dílios volta para Esparta antes do embate final, ou seja, não deveria saber
como se deu a morte de Leônidas e seus soldados; ainda assim conclui a narrativa
com os fatos que ocorreram depois de seu retorno. Genette (s.d., p. 195) classifica
essa alteração narrativa como paralepse, que é o excesso de informação, algo que o
narrador não deveria saber, mas que ainda assim está presente na narrativa.
De fato, a narrativa do livro é feita por Dílios, ainda que o leitor só veja quem é
o narrador no final. Frank Miller (2007) declara, nos extras do DVD que sua intenção
era contar a história na visão dos espartanos e que, para isso, “não se deve estragar
o momento apenas com fatos verdadeiros. Deve-se exagerar o momento para maior
dramaticidade.” Com isso, pode-se inferir que Dílios procurou fazer de seu rei um
herói sem comparação, tanto para os gregos que enfrentariam os persas quanto
para o espectador.
Campbell (2007) define que o herói retorna para seu mundo com uma
mensagem, um ensinamento do que aprendeu em sua aventura. Ainda que
Leônidas não tenha sobrevivido à batalha, sua imagem volta, engrandecida, para
Esparta, na narrativa de Dílios, e uma mensagem é transmitida: a de que se 300
espartanos (e alguns árcades) puderam segurar os persas nos Portões de Fogo,
então os gregos juntos podem derrotá-los. No final do filme, Dílios revela que os
gregos são 40 mil e que há três persas para cada grego.
A cena em que Leônidas se desfaz de sua armadura para tentar atingir
Xerxes com maior precisão é uma das mais emblemáticas na caracterização de
Leônidas como um grande herói espartano, que morre em batalha pela sua nação,
se necessário.
Quando os guerreiros espartanos estão entre os persas, Leônidas começa a
se desfazer de sua armadura. Primeiro deixa cair o escudo, depois retira o elmo e se
ajoelha. Amaldiçoa Efialtes, presente na primeira fileira persa, com as palavras “que
você viva para sempre”, uma ofensa para os espartanos, que sonham com uma
morte gloriosa em batalha. Um guerreiro persa exige a lança de Leônidas, momento
em que este grita por Stelios, que sai da formação espartana e, tomando impulso
das costas do rei, mata o guerreiro persa. Leônidas, então, impulsiona a lança
contra Xerxes, momento destacado na HQ e no filme. Frank Miller dedica uma

55
página à trajetória da lança e, no filme, é uma das mais longas cenas em câmera
lenta. Nesse momento, Dílios explica que o rei se desfez do escudo porque
precisava de equilíbrio e tirou o elmo porque necessitava ver longe, já que o alvo
estava distante. A lança só atingiu o rosto de Xerxes e os espartanos morreram
lutando. Para Dílios, eles morreram em nome da liberdade grega, portanto, como
heróis.
Leônidas, durante a narrativa, seguiu os passos do herói formulados por
Campbell (2007) e já analisados neste trabalho. Seguiu o chamado da aventura
representado pelo mensageiro persa, ainda que o conselho espartano tentasse
impedi-lo, e atravessa o primeiro limiar, que é o confronto com o desconhecido. No
caso do filme, a vila devastada por batedores persas. Nos quadrinhos, a
preocupação parte dos soldados, não do rei, em relação ao tamanho do exército
persa.
O caminho de provas é o momento em que o herói prova seu valor, e é
construído durante toda a narrativa, a partir do momento em que os 300 guerreiros
saem de Esparta para enfrentar as adversidades da guerra e culmina em suas
mortes. Pelas leis de Esparta citadas no filme, um verdadeiro guerreiro não se rende
nem recua, mas morre com honra em batalha. Ao cruzar o caminho de provas,
Leônidas entra com seus guerreiros no ventre da baleia, uma investida de auto-
aniquilação, da qual o herói não volta – ou volta modificado.
O rei e general espartano morre nas Termópilas, mas Dílios volta à Grécia
com a sua história, de forma a incitar os guerreiros – 10 mil espartanos e 30 mil
gregos de outras nações – na batalha de Platéia. Ao contar a história de seu rei,
Dílios o transforma num herói grego e numa lenda, um exemplo a ser seguido por
outros guerreiros.

56
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Uma vez analisados os conceitos de narrativa nos quadrinhos e no cinema,


bem como o conceito de construção do herói, foi possível perceber como se deu a
construção estética dos quadrinhos Os 300 de Esparta. Outro aspecto abordado foi
a sua tradução para o meio cinematográfico, bem como a formação da imagem de
Leônidas como herói, diegeticamente e para o público.
A graphic novel mistura elementos dos quadrinhos com elementos
cinematográficos, como planos de câmera e panorâmicas. O formato horizontal
também sugere maior proximidade com o cinema. O filme hollywoodiano aproveitou
essa proximidade na adaptação, mantendo a fidelidade aos quadrinhos em relação à
forma como as cenas foram mostradas, bem como aos diálogos nas cenas
escolhidas para análise.
Na construção cinematográfica dos personagens presentes na história em
quadrinhos, a fidelidade aos figurinos foi mantida, já que evidencia traços de
personalidade dos personagens, como no traje de Xerxes, e mostra a unidade do
exército espartano, dando destaque ao seu rei. O uniforme é uma questão tão
importante no enredo que é a principal exigência de Efialtes junto à Xerxes. Os
diálogos também foram transpostos, até onde possível, da mesma forma em que
ocorreram nos quadrinhos, de modo a manter as características dos espartanos, nas
frases de efeito, e de Xerxes, por ser uma das formas que ele demonstra acreditar
ser um deus.
O termo “herói” sofreu alterações através do tempo, com o significado inicial
de “semideus” até denotar alguém que mostra características que são motivo de
grande orgulho ou nobreza. Com as transformações e o uso em histórias de guerra,
surgiu o conceito de herói aqui utilizado, um personagem que se arrisca para atingir
um objetivo transformando-se em figura de admiração. Também foi mostrada a
concepção do herói épico, com ambições claras e mentalidade decidida.
As cenas analisadas e a narração do personagem Dílios mostram a
construção de Leônidas como um herói lendário, que escolhe sacrificar-se em prol
de um ideal e de sua nação. Ao levar sua guarda real para uma batalha da qual ele
sabia que poderia não voltar, criou um exemplo para os espartanos do que é um
verdadeiro guerreiro. Deixou, ainda, a mensagem de que se tão poucos homens

57
puderam segurar milhares para defender sua nação, então um contingente maior de
guerreiros gregos certamente poderia vencer a guerra.

58
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300 – FATO ou ficção. Produção: Eric Matthies; Tricia Todd. Los Angeles: Warner
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AS FITAS de Frank Miller. Produção: Eric Matthies; Tricia Todd. Los Angeles:
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Bros. Pictures, 2007. 1 DVD (3 min), color. DVD 2: Extras do filme 300.
GERARD Buttler. Produção: Eric Matthies; Tricia Todd. Los Angeles: Warner Bros.
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MAKING off. Produção: Eric Matthies; Tricia Todd. Los Angeles: Warner Bros.
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TREINANDO os atores. Produção: Eric Matthies; Tricia Todd. Los Angeles: Warner
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63
GLOSSÁRIO

Agogê - Os espartanos eram separados das mães quando completados sete anos
e levados para as Agogês, escolas de treinamento militar, aonde eram preparados
para as futuras batalhas e aprendiam a cantar e recitas poemas de guerra. (EGER,
2007) No filme, é mostrado o momento em que Leônidas, ainda criança, é levado
para a Agogê e o seu retorno para Esparta, após vencer um lobo.
Árcades – Os árcades eram habitantes da Arcádia, região da Grécia antiga, na
parte central do Peloponeso, que se constitui de uma península, separada do
continente pelo Istmo de Corinto.
Batalha das Termópilas – O rei e general espartano Leônidas I escolheu a
estreita passagem das Termópilas por ser defensável com poucos guerreiros, já que
o terreno limitava a quantidade de persas que os combateriam. Os Portões de Fogo
foram defendidos por 300 hoplitas espartanos e 7000 gregos de outras cidades-
estado. (CÉSAR, 2007)
Éforos - Os Éforos eram um conselho formado por cinco espartanos, eleitos
anualmente, que supervisionavam a vida militar, tinham influência sobre o rei,
podiam convocar a Gerúsia (assembléia composta por espartanos maiores de 60
anos, que redigia as leis) e a Ápela (assembléia formada por espartanos maiores de
30 anos, que podia aceitar ou recusar as propostas de lei da Gerúsia). Também
possuíam poderes judiciais e punitivos. “A eforia é outro ponto mal ordenado.
Embora nenhum outro poder tenha tão grandes atribuições, é do simples povo que
saem os que são elevados a esta superintendência [...] Muitos dentre eles,
conquistados pelo dinheiro, empenharam-se com todos os seus poderes para a
ruína do Estado.” (Aristóteles) A obra de Frank Miller mostra esse conselho como
oito sacerdotes deformados, com poder sobre o rei, que são facilmente subornáveis.
Eugenia espartana – No livro Plutarch on Sparta, o autor explica que, quando uma
criança nascia, sua vida não dependia de seu pai, pois este precisava levá-la ao
ancião, que a examinaria. Caso a criança fosse forte e sadia, era mantida. Se
apresentasse doenças ou deformidades, era levada à Apothetae (lugar da rejeição),
aonde seria abandonada à própria sorte. Os espartanos consideravam melhor para
a criança e para o Estado que ela morresse ao nascer se não tivesse força ou
saúde. (PLUTARCO, 1988, p.27)
Falange – Formação da infantaria grega, geralmente retangular, que consistia de
soldados alinhados ombro a ombro. “Com a mão esquerda carregavam um escudo
de um metro, com o qual faziam uma parede. Na direita, levavam uma lança de dois
metros, que as três primeiras fileiras apontavam para frente e o restante para cima.”
(KENSKI, 2001) Os soldados gregos, em geral, não eram soldados profissionais,
exceto os espartanos treinados na Agogê, como alude a obra de Frank Miller.

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Hoplitas – Elite da infantaria grega, “eram equipados com uma armadura cobrindo
todo o tronco, de um elmo, de grevas (parte da armadura que protegia do joelho ao
pé, espécie de caneleira), de um pesado escudo de madeira reforçado com metal,
de uma espada curta e de uma lança de aproximadamente dois metros de
comprimento.” (HENNINGER, 2004)
Portões de fogo – Termópilas.
Termópilas – Desfiladeiro entre o Monte Eta e o Golfo de Mália, que recebe este
nome devido a fontes sulfurosas existentes nas proximidades.

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ANEXO A

FICHA TÉCNICA RESUMIDA

DIRETOR: Zack Snyder

ROTEIRO: Zack Snyder e Kurt Johnstad

TRILHA SONORA: Tyler Bates

LANÇAMENTO NO BRASIL: 30 de março de 2007

GÊNERO: Ação, Fantasia, Guerra

ELENCO:
Leônidas: Gerard Butler

Gorgo: Lena Headey

Dílios: David Wenhan

Capitão: Vincent Regan

Stelios: Michael Fassbender

Efialtes: Andrew Tiernan

Xerxes: Rodrigo Santoro

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ANEXO B

DVD contendo o filme 300.

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