RAJAGOPALAN, Kanavillil. Os Caminhos da Pragmática no Brasil. Documentação de
Estudos em Linguística Teórica e Aplicada – D.E.L.T.A. Vol. 15, nº especial, 1999. p. 323- 338.
O texto de Rajagopalan (1999) trata do advento dos estudos pragmáticos no Brasil e o
lugar da pragmática no âmbito dos estudos linguísticos, apontando os posicionamentos de vários autores acerca do objeto de estudo da pragmática. Um dos primeiros questionamentos que aparecem em pauta é a indefinição do que vem a ser a pragmática. Vogt (1983, p. 7 apud Rajagopalan, 1999, p.323) menciona que, “Hoje a pragmática são muitas coisas, sem ser nenhuma em especial”, então, tratando-se do fenômeno da linguagem em uso, aquilo que a linguística não dá conta de explicar é considerado do domínio da pragmática. Os estudos pragmáticos no Brasil despontaram na década de oitenta, no entanto, não há uma cronologia definida de quando e como surgiu essa área de investigação, passado trinta anos de produção da monografia de Morris e do trabalho de Montague sobre a Pragmática são raras as pesquisas que refletem sobre o estado da arte em pragmática. Podemos observar que existem vários trabalhos de descrição das línguas naturais, com enfoque nos estudos de fonologia, sintaxe e psicolinguística, todavia, os aspectos pragmáticos são desprezados, andando sempre à margem das pesquisas na área de linguística, o que nos causa um certo prejuízo para a documentação das línguas, visto que esse conhecimento não sendo registrado, corre o risco de ser extinto, no processo de evolução das línguas. Os estudiosos da linguagem fazem confusão sobre a delimitação das subáreas da linguística no que concerne à proximidade entre elas e suas possíveis relações hierárquicas. Orlandi (1996), apresenta a diferença entre pragmática e análise do discurso, enfatizando que a própria noção de discurso, na ótica de Possenti (1996) é fator relevante para a delimitação de abordagens teórico-metodológicas diferenciadas. No que tange a semântica e a pragmática, como modo de separação entre os dois campos de estudos, a tradição consagrada amarra-se na noção de contexto, porém, assim como a pragmática, a noção de contexto também apresenta o seu grau de complexidade. Autores como Castilho e Altman (1994), defendem a proposta de inter-relação entre a pragmática e outros campos, tais como: análise do discurso, análise da conversação e linguística de texto, bem como aconteceu com o ‘núcleo duro’ da linguística que obteve aporte do ramo funcional das ciências que estudam a linguagem. Levando em consideração o implemento dos variados ramos, Dascal (1982) estuda a pragmática na linguística textual, analisando o contexto em uma sequência maior de enunciados, por meio da noção de ‘contexto da enunciação’. A maior divergência entre os linguistas encontra-se em marcar ou não marcar uma linha divisória entre a semântica e a pragmática, pois é uma questão muito complexa demarcar esses limites. O nome Pragmática nos cursos de pós-graduação em linguística figurou até pouco tempo com um papel secundário, sendo apresentado por meio de tópicos como a teoria dos atos de fala, a teoria da conversação de Grice, pertencentes ao conteúdo da disciplina de Semântica. Foi no Instituto de Estudos da Linguagem (IEL), que os estudos pragmáticos se destacaram, houve uma revisão teórico-metodológica dos aspectos a eles concernentes. Como disciplina autônoma a pragmática apresentou uma indefinição de conteúdo, ocasionando determinados conflitos, alguns teóricos defendem que o estudo do significado literal está voltado para semântica e os fatores que modificam o sentido literal estão relacionados à pragmática, porém não existe critérios precisos para distinguir um campo do outro, apenas tendências de estudos são colocadas em questão. Uma das questões está relacionada à dimensão pragmática da linguagem, na análise semântica das línguas naturais, apresentando três tendências, uma centrada na análise gramatical, atribuindo a pragmática um papel marginal; a outra centrada em categorias gramaticais, todavia incorporando elementos pragmáticos na elaboração de uma teoria semântica e a última seria uma tendência englobante em relação à sintaxe e à semântica. Nesse sentido, podemos observar a questão do formalismo versus funcionalismo imbricada nos limites de estudos entre a semântica e a pragmática, relacionando a gramática à forma e a pragmática ao uso. Os adeptos ao formalismo não aceitam a incorporação dos fatores pragmáticos associados à gramática, já os funcionalistas acreditam na integração entre a pragmática e a gramática. Alguns analistas de texto atribuem importância à pragmática e a incluem em seus trabalhos. Vale destacar, que vários pesquisadores consideram seus trabalhos inseridos no âmbito da pragmática, contudo, trabalham com sentenças isoladas, o que caracteriza uma pesquisa um tanto limitada, por não observar o contexto real de produção dos dados linguísticos. O fato da pragmática trabalhar com dados autênticos é propícia a contribuição de outras áreas do saber, tais como análise conversacional, análise do discurso, linguística de texto, sociolinguística; nesse cerne, os pragmaticistas podem se interessar também pelas questões tratadas sob o rótulo de linguística aplicada. A pragmática é multidisciplinar, mantendo o vínculo com diversas áreas do conhecimento para implementar o seu trabalho. A ligação entre a pragmática e a linguística aplicada consiste nas questões de interesse social, visando o entrelaçamento da ‘linguística pura’ com a prática linguística, tal entrelaçamento daria conta de minimizar a distância entre o domínio teórico e o aplicado, visto que a prática linguística expressa os contextos de uso em que a linguagem é realizada. As discussões levantadas sobre a pragmática nos permitem compreender que nos meios acadêmicos ela apresenta-se consolidada. Até então, o que se verifica é a necessidade de realização de pesquisas nesse campo para contribuir com o registro e divulgação dos estudos pragmáticos, aspectos estes tão importantes para documentar às línguas naturais.