Sei sulla pagina 1di 10

António Jorge Gomes Giroto

“Semearrelvinhas”
Comunidade, história e princípios de uma cooperativa modelo

Recensão crítica para a UC “Conferências e narrativas de experiências vividas na economia social”

Coimbra, 01 de Junho de 2018


Índice
Resumo......................................................................................................................... 3
Introdução .................................................................................................................... 4
Um pouco de história ................................................................................................... 5
Os princípios ................................................................................................................. 6
Conclusão ..................................................................................................................... 9
Bibliografia ................................................................................................................. 10
Resumo

A presença do sr. Jorge Vilas da Fonseca, presidente da cooperativa


“Semearrelvinhas”, na unidade “Experiências vividas” e na pós-graduação “Economia
social, cooperativismo, mutualismo e solidariedade” foi uma verdadeira lufada de ar
fresco. A idade avançada do sr. presidente e os longos anos do projeto poderiam levar-
nos a pensar numa conferência virada mais para o passado do que para o futuro, mas
assim não aconteceu. A lucidez em relação ao passado transforma-se, no sr. Jorge, em
otimismo e esperança. Neste trabalho procuramos elencar os princípios cooperativos e os
princípios orientadores das organizações da economia social presentes na lei de bases,
dando-lhe a forma de que se revestem nesta cooperativa especial que os cumpre e lhes dá
um sentido profundo e concreto, alicerçados numa história prodigiosa e bela. O primado
das pessoas, a sua participação e intercooperação, o bem comum e o interesse pela
comunidade, a autonomia e liberdade com que conduziram o ideal do bairro das
“relvinhas” são inspiradores, fazendo desta organização uma verdadeira escola pela qual
devem passar todos aqueles que partilham os ideais e princípios de uma economia não
lucrativa nem mercantilista, procurando valorizar o que de melhor as pessoas têm,
nomeadamente a sua vontade de fazer algo que valha a pena para todos aqueles que estão
inseridos neste projeto. Conhecer a história da “Semearrelvinhas” é a melhor forma de
alicerçar um futuro que se quer diferente. A originalidade e criatividade dos moradores
deste bairro têm tanto a ensinar a quem vive nesta aldeia global e a quer transformar com
a ajuda de todos, que começaremos por conhecer a sua história, passaremos pelos
princípios e apontaremos caminhos novos, insuspeitados, mas construídos sobre o
substrato rochoso em que se tornou esta organização.
Introdução

Neste trabalho remontaremos aos idos anos da década de cinquenta para conhecer
as vicissitudes que estiveram na origem de uma das mais espetaculares cooperativas de
habitação da cidade de Coimbra e mesmo do país. A ideia, repetida até à exaustão, de
transformar obstáculos em oportunidades aparece-nos aqui realizada em todo o seu
esplendor. Os princípios inspiradores hoje defendidos pela Aliança Cooperativa
Internacional (ACI) e definidos em Rochdale ocuparão a segunda parte do nosso trabalho,
tendo em atenção a sua aplicação nesta organização. Elencaremos também os valores da
solidariedade que estão presentes no desenvolvimento da “Semearrelvinhas” e que são a
pedra de toque da economia social. Por fim, procuramos problematizar algumas questões
e abrir pistas para levar a “Relvinhas” a um país que tanto carece de habitação condigna,
cuja ausência abre portas à exclusão social e à pobreza, criando lugares em que viver seja
um realizar de sonhos e não uma luta pela sobrevivência.
Um pouco de história

Quando em 1954 se dá o desalojamento dos moradores da zona da Estação Velha


não havia muita história para fazer, embora houvesse já um longo passado. A existência
partilhada pelos que sobreviviam naquela zona que havia de dar lugar à avenida Fernão
de Magalhães era contada pela pobreza extrema, miséria e exclusão, que a todos atingia.
A falta gritante de condições mínimas de higiene e salubridade, bem como a convivência
com vários perigos entre eles as cheias, criou um espírito de grupo tão forte que se
transformou na base do movimento que estamos a estudar. O modo de sobreviver, nem
sempre baseado no escrupuloso cumprimento da lei, nem por isso terá deixado de ser
justo. A “candonga” e o “furto da fome” eram meios de sobrevivência para os quais não
havia alternativa. A emoção presente no discurso do sr. Jorge Vilas não esconde a frieza
necessária para manter a vida naquele tempo/lugar. De sublinhar que este protagonista
nunca se colocar ao lado da história, aceitando sempre ser um personagem importante,
presente e não diferente dos seus pares.
Seguiu-se um novo episódio, agora no eixo industrial Loreto-Pedrulha, onde se
deu o realojamento de 28 famílias em casa de madeira, cujas condições estavam muito
abaixo das exigidas. A presença de ratos testemunhada pelo sr. Jorge é bem indicativa da
falta de condições das habitações. É de salientar que neste período, de 1954 até aos
alvores da revolução, os moradores do bairro não se fecharam sobre si mesmos. Pelo
contrário, e como mais à frente referiremos, foram ao encontro da cidade e dos seus mais
notáveis, os estudantes, aprendendo com eles e levando-lhe estas preocupações que
acrescentaram às suas e que conduziram a grandes manifestações.
A revolução fez chegar ventos de mudança com um programa de apoio à habitação
do primeiro governo pós-revolução. Pouco antes os moradores tinham conseguido a
reparação dos telhados de madeira das barracas. No ano seguinte à revolução, a 28 de
Fevereiro, foi fundada a Associação de moradores do Bairro da Relvinha, sendo
publicados os seus estatutos em Diário da República, um mês depois. Este passo foi
determinante para chegar aos apoios do governo e sua execução.
Entre 76 e 80 foram construídas 34 habitações com as condições mínimas
indispensáveis e com o apoio e participação de muita gente. A 27 de Janeiro de 1986 a
associação passou a Cooperativa recebendo a designação de “Cooperativa de Construção
e Habitação económica Semearrelvinhas C.R.L.”, apesar dos princípios cooperativos já
estarem presentes na organização, desde a sua génese.
Os princípios

O código cooperativo de 2015 recupera, no artigo 3º, os princípios cooperativos


que vêm fazendo a história deste tipo de organizações. Também a Lei de Bases da
Economia Social (LBES), de 2013, define no artigo 5º os princípios orientadores deste
sector não lucrativo e não mercantilista, sendo a definição apofática, a nosso juízo, a mais
eficaz. Os princípios estão interligados, sendo na maior parte semelhantes,
salvaguardando aqui, do lado do cooperativismo, a participação económica dos membros.
Na “Semearrelvinhas” tudo o que se construiu, tangível ou não, teve na base o
princípio de doutrina social da Igreja denominado “bem-comum” e que se define como
“A interdependência, cada vez mais estreita e progressivamente estendida a
todo o mundo, faz com que o bem comum - ou seja, o conjunto das condições da vida
social que permitem, tanto aos grupos como a cada membro, alcançar mais plena e
facilmente a própria perfeição - se torne hoje cada vez mais universal e que, por esse
motivo, implique direitos e deveres que dizem respeito a todo o género humano. Cada
grupo deve ter em conta as necessidades e legítimas aspirações dos outros grupos e
mesmo o bem comum de toda a família humana” (Gaudium et Spes, 26).

Nesta definição abrem-se caminhos para outros princípios que mais não são do
que a concretização do que ficou dito. O primeiro princípio do Código Cooperativo
refere-se à adesão voluntária e livre, coincidente com a alínea b) do artigo 5º da LBES. A
participação no projeto da “Relvinhas” foi assumida desde cedo pelos seus membros. A
resiliência manifestada no modo como não desistiram de uma vida melhor, mais digna,
com melhores condições, transformou um conjunto de moradores num grupo com
interesses comuns, pelos quais lutaram voluntaria e solidariamente. Em segundo lugar,
está a gestão democrática pelos membros, presente na alínea c) da LBES. Apesar do
carisma que o sr. Jorge comporta, que faz dele um líder nato, nunca deixou de ouvir, de
estar próximo e de querer precisar de todos para com eles decidir qual o caminho a seguir.
O terceiro princípio, participação económica dos membros, sem equivalente na
LBES, é duplamente conseguida na “Semearrelvinhas”. Por um lado, a parte económica
partilhada, mas por outro, não menos importante, a oferta do tempo e do trabalho,
principalmente da comunidade, mas que chegou a receber contributos da cidade e até de
jovens estudantes que passavam pela cidade.
Uma organização como esta pode, se não houver cuidado, ser usada para fins
político-eleitorais. O sr. Jorge, como aliás todos os membros, souberam não se deixar
transformar em bandeiras eleitoralistas, sem com isso colocar em causa o seu
desenvolvimento. A autonomia e a independência, 4º princípio, correspondente à alínea
f) do artigo 5º da LBES, são fundamentais para a prossecução dos fins a que se dedica,
não se deixando instrumentalizar e dessa forma desvirtuar. Só com uma educação que
transforma e faz a pessoa crescer é possível manter esta liberdade, autonomia e
independência. O sr. Jorge referiu a sua passagem pelo circuito da cultura da cidade, da
sua relação com os estudantes, ainda que em ambientes informais, não deixou de receber
deles o conhecimento, quer nas famosas repúblicas, quer nas tabernas e nas ruas onde não
raras vezes se encontravam. O 5º princípio cooperativo, educação, formação e
informação, é levado muito a sério na cooperativa e dele depende a longevidade da
organização, só possível pela sua constante atualização, quer ao nível da sua natureza
jurídica, quer também na forma de se reinventar constantemente, que a faz adaptar-se a
novas exigências, sem perder o espírito que presidiu à sua conceção.
Por fim, a intercooperação e o interesse pela comunidade, 6º e 7º princípios,
manifestam todo o esplendor do cooperativismo sendo o seu selo de garantia. A
“Semearrelvinhas” nunca se isolou da cidade nem das instituições e entidades que podia
servir e em que se apoiava. Prova disso é a relação estreita com a Câmara Municipal e o
respeito profundo pelos seus presidentes, apesar de um ou outro incidente histórico, sendo
destacado pelo sr. Jorge Vilas o célebre episódio dos sacos de lixo nas escadas da
residência do sr. presidente, à altura, Araújo Vieira. Este episódio pensado na relvinha
teve como executores elementos exteriores ao bairro, sobretudo estudantes, que nesta
altura evidenciavam preocupações sociais crescentes. Não houve, de nenhum dos
membros, um interesse egoísta ou de competição. Esta foi substituída pela cooperação,
dando os assinaláveis resultados que conhecemos.
Os valores inspiradores da ação deste grupo de pessoas têm na base o primado da
pessoa e a defesa da sua dignidade, dando-lhe condições de vida e de realização pessoal.
A solidariedade, igualdade, coesão social, justiça, responsabilidade individual e social,
subsidiariedade (cf. LBES art. 5º, e), atingem na “Semearrelvinhas” pleno cumprimento,
como acabamos de mostrar. Ninguém foi deixado para trás e a solução passava sempre
pela participação de todos, desde a conceção das ideias, dos projetos, à sua concretização,
o que faz com que os moradores se sintam integrados no espaço em que vivem,
transformando-o no lugar em que habitam.
À semelhança do que tem acontecido nos municípios e até no país, a preocupação
da “Semearrelvinhas” deixou de ser o “betão”, dado que as infraestruturas básicas estão
asseguradas, para passar a ser aquilo que constrói a identidade do povo e que a perpetua
na memória social. Assim, a cooperativa procura levar a cabo ações de âmbito cultural,
recreativo e desportivo. A exceção é mesmo a tão ansiada sede, que tem como fim
principal contar a história da Relvinha e ser um laboratório social, um impulsionador da
ação de interesse da comunidade, um trampolim social. O que vai sendo feito, bailes,
teatro, eventos desportivos, música, fado, são meios indispensáveis ao reforço de laços
dos habitantes do bairro e modo de aceder a toda a sua idiossincrasia por parte dos
visitantes que se sentem sempre como convidados. Pela educação dos mais novos e pela
informação aos mais incrédulos destas ações filantrópicas a Relvinhas continua a ser
aquilo que sempre foi, o arauto de um amanhã diferente, de novas possibilidades, da
alternativa ao modo capitalista e pós-ideológico em que estamos afundados.
Conclusão

Neste trabalho procuramos conhecer melhor a cooperativa “Semearrelvinhas”


passando pela sua história e princípios orientadores. Desde o início da sua resistência que
o bairro encontrou no sr. Jorge Vilas da Fonseca um líder carismático, capaz de construir
laços tão fortes entre os moradores do bairro que sustentaram as construções que mais
tarde apareceriam. A experiência de exclusão social a que aparentemente a “relvinhas”
estava votada encontrou nos moradores uma resiliência tão forte cujo resultado foi
impedir que a cidade se esquecesse deles. Sim, a polis, a universidade, os poderes
públicos. Não foi pela “subsidio-dependência” mas sim pela participação nas soluções
que os moradores encontraram o seu “lugar ao sol” e sem o quererem tornaram-se o
espelho daqueles que não se resignam diante das dificuldades. A obra, as casas e a cultura
que as envolve, é de uma grandeza e de uma beleza que a história fará crescer ainda mais.
A não submissão a nada nem a ninguém e a manutenção dos princípios
orientadores como critérios inalienáveis da ação humana trazem em si um querer social
tão forte que não pode ser travado. É certo que a generalização das práticas pode fazer
com que se perca o efeito, mas a apropriação dos princípios ajudará muitos “bairros” a
recriarem-se e a possibilitarem uma vida nova aos seus habitantes. A “Relvinha” é um
grito silenciosos no marasmo ruidoso em que socialmente estamos inseridos, sem
compreendermos que a solução dos problemas está em nós, nos que nos são próximos e
não naquilo que nos hão-de dar. Falta-nos uma “cultura relvinhas”. Que a sede da
cooperativa expresse bem esse sentir e esse viver para que não falte a ninguém um abrigo
seguro, donde se parta para construir um mundo melhor, mais justo e fraterno, capaz de
sonhar e de concretizar, de idealizar e de construir, muito para além daquilo que julgamos
ser possível.
Bibliografia

Baía, João « Bairro da Relvinha: memórias de resistência », Ler História, 63 | 2012,


179-197.
Código Cooperativo. (2015).
Concílio Vaticano II. (1965). Gaudium et spes. Retrieved from
http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-
ii_const_19651207_gaudium-et-spes_po.html
Giddens, A. (2010). Sociologia. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.
Lei de Bases da Economia Social. (2013).

Potrebbero piacerti anche