Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
O DEUTERONÔMIO
No Pentateuco
do dinheiro que se lhes entregara nas suas mãos, porquanto procediam com
fidelidade. Então disse o sumo sacerdote Hilquias ao escrivão Safã: Achei
o livro da lei na casa do SENHOR. E Hilquias deu o livro a Safã, e ele o
leu. Então o escrivão Safã veio ter com o rei e, dando-lhe conta, disse:
Teus servos ajuntaram o dinheiro que se achou na casa, e o entregaram na
mão dos que têm cargo da obra, que estão encarregados da casa do
SENHOR. Também Safã, o escrivão, fez saber ao rei, dizendo: O
sacerdote Hilquias me deu um livro. E Safã o leu diante do rei. Sucedeu,
pois, que, ouvindo o rei as palavras do livro da lei, rasgou as suas vestes.
Pg. 58
A estrutura do texto
Estamos novamente diante do desenrolar amplo e
fluente do estilo deuteronomista. Mas de novo o texto
apresenta também uma construção perfeita em cada parte. Isso
se inspira, na sua estrutura, à uma forma arcaica de relação
jurídico cultual, forma que nós indicaremos com o termo
“moldura literária do mandamento”. Essa recorrência bíblica
se encontra também em Ex 12,24-27a; 3,13-10; 13,11-16.
Todos estes textos são sem dúvida mais antigos que o nosso.
Como exemplo, reportamos o mais breve deles.
Observa isto por estatuto para ti, e para teus filhos para
sempre. E acontecerá que, quando entrares na terra que o
Senhor te dará, como tem dito, guardarás este culto. E
acontecerá que, quando teus filhos disserem: Que culto é este?
27
Então dirás: Este é o sacrifício da páscoa ao Senhor, que
passou as casas dos filhos de Israel no Egito, quando feriu aos
egípcios, e livrou as nossas casas.
Os outros passos da “moldura literária do mandamento”
são mais amplos, mas têm a mesma estrutura. Se falta a
expressão introdutiva se pode notar que tal moldura consiste
de duas frases condicionais deste tipo:
Quando tu estiveres na Terra da promessa então observa
este estatuto...
Quando teu filho te perguntar “por que isto?” então tu
responderás: ... (referência à origem do mandamento na
ocasião da libertação do Egito).
A expressão, portanto, indica uma situação referida a
Israel antes que tomasse posse da Terra: o interlocutor é
Moisés, ou um seu representante no culto. Na sua segunda
parte usa o ponto de contato
Pg. 59
da “pergunta do filho” para desenvolver a motivação
histórico-salvífica do mandamento.
Esta “moldura” forma ainda, sem dúvida, a estrutura de
suporte de nossa peça. Dt 6,10-15 forma a primeira frase
condicional, à qual corresponde a exposição do mandato em
Dt 6,12-15. Nestes versículos se encontram o centro do
capítulo inteiro. Isto é reconhecível inclusive do ponto de vista
estilístico, porque improvisadamente entra em cena o recurso
estilístico deuteronomista mais eficaz, a passagem do singular
ao plural e vice-versa. Enquanto que na perícope Dt 6,4-25 os
ouvintes são interpelados no singular (tu), em 6,14 (e de novo
em 6,16ss) improvisadamente o discurso usa o plural (vós). A
segunda frase condicional da “moldura do mandamento”,
introduzida com a “pergunta do filho”, claramente se
distingue em Dt 6,20-25. Como nós hoje temos uma ideia da
estrutura do prefácio na Santa Missa, e sabemos onde esperar
a alusão variável ao mistério de uma determinada festa ou de
um determinado período litúrgico, assim devemos supor que
também os israelitas tivessem sensibilidade para a estrutura
particular da “moldura do mandamento” e a função das suas
diversas partes.
Entorno das duas partes principais desta “moldura”
podem entrelaçar motivos ornamentais. Isto se vê em Ex
12,24; 13,1ss.9ss.16. A exortação à contínua atualização do
mandamento em Dt 6,6-9 tem os seus paralelos, em partes
literais em Ex 13,9.16. Também a exortação inserida antes (Dt
6,4ss) e entre as partes principais (Dt 6,16-19), amplia o
esquema de fundo sem realmente incomodá-lo.
O discurso todo vem introduzido com o convite dirigido
à assembleia cultual reunida: “Escuta, Israel!” (Dt 6,4a).
Pg. 60
Excursus sobre o Decálogo
Pg 61
válida da lei central da aliança. O “primeiro
mandamento” foi inserido no contexto da proclamação da lei,
qual nos é transmitida em Dt 5,11, somente depois da
composição dos capítulos 5-6.
O texto do Decálogo passou também por uma longa
história. No curso dos séculos ele foi muitas vezes ampliado e
completado. Algumas amplificações foram feitas inclusive
depois de sua inserção no texto de Dt 5. Podemos então
perguntar-nos como era na sua fisionomia original o “primeiro
mandamento” quando foi formado o Dt 5-6. Reportamos aqui
de imediato, sem justifica-lo, o texto reconstruído:
Eu sou o Senhor teu Deus.
Eu te conduzi para fora da terra do Egito, da casa da
escravidão.
Tu não deves ter deuses estrangeiros diante de mim.
Porque eu, o Senhor teu Deus, sou um Deus ciumento:
que pune os pecados daqueles que me odeiam, mas que é fiel
para com aqueles que me amam e que observam os meus
mandamentos.
O texto original continha então uma auto apresentação de
Deus, uma prévia da formulação do mandamento principal e
uma motivação para este. O mandamento principal era
formulado como proibição de adorar divindades estrangeiras
– na motivação tem uma exortação sobre isso com conceitos
de amor e “observância dos mandamentos”, ambos já
constituídos em Dt 10,12,11,17. A motivação do mandamento
principal é indicada como um alerta sobre o ciúme do Senhor,
talvez, melhor dizer, um santo ciúme do Senhor. No discurso
sobre o mandamento principal da aliança reportado em Dt 6,4-
25, este texto do Decálogo forma um substrato.
Pg 62
Em que forma se apresenta agora o texto do Decálogo em
Dt 6,4-25?
Pg 63
Precisamente depois da exortação inicial “Escuta, Israel”.
Pg 64
os pontos de contato com este texto são muito
significativos. Eles indicam que em Dt 6 duas tradições se
fundiram, mas que primeiro se desenvolveram
separadamente.
O compilador do nosso texto deve ter se encontrado numa
situação similar àquela de quem hoje deve organizar
subitamente o esquema de uma celebração litúrgica com a
participação igualitária de cristãos do rito latino e do rito
grego (prescindindo neste caso o problema da língua). Todos
os dois grupos de fiéis tem a mesma fé, mas esta para cada um
deles se exprime em estilo litúrgico diferente, com textos,
termos e conceitos completamente diferentes. Uma necessária
união se tornaria possível somente quando se tentasse unir as
duas tradições numa síntese, respeitando os direitos de cada
uma. Isto não é tão relevante para o nosso tempo, porque hoje
em dia tendemos a encorajar a diversificação dos ritos. Mas
noutras situações históricas, uma síntese similar poderia se
apresentar como necessária – este deveria ser o caso de Dt 6.
No culto da aliança de Israel a tradição litúrgica representada
em Dt 10-11 deveria estar unida com a “tradição do
Decálogo”, como talvez possamos dizer simplificando. Isto
acontece com a reestruturação do texto de Dt 5-6: em Dt 5 foi
inserido todo o texto do Decálogo e no capítulo 6, como
vimos, o mandamento principal do Decálogo foi comentado
com a ajuda de expressões tiradas da outra tradição. O antigo
texto de Dt 10,12-11,17 não foi eliminado, mas foi colocado
antes desse o novo texto reestruturado (neste contexto, os
capítulos intermediários podem ser negligenciados).
Nos daria alegria naturalmente conhecer a ocasião
concreta que provocou a unificação das duas tradições em
vista de anunciar o preceito principal da aliança. Mas é pedir
muito à
Pg. 65
crítica. Podemos constatar o fato da união das duas
tradições. Podemos admirar o esforço sempre renovado por
um justo e tempestivo anúncio em Israel do mandamento
principal, como se revela neste processo. Mas a falta de
informações precisas sobre a história da tradição litúrgica de
Israel nos impede de situar com precisão este processo num
determinado século, num determinado santuário ou festa. Nos
basta saber que este texto não informa os tempos das origens,
mas sobre tempos já avançados: falam das riquezas de muitas
tradições que se convergiram em uma, e que agora se
iluminam reciprocamente. Estes conhecimentos tornam
possíveis uma exegese adequada a este texto, que ainda hoje
é a oração recitada diariamente por cada judeu, como também
as palavras dos versículos 8-9 que na origem tinham sentido,
e que são seguidas literalmente pelos judeus fieis. E já que o
próprio Jesus assumiu a formulação dos versículos 5-6 como
sua formulação do mandamento principal (cfr. Mc 12,28-34;
Mt 22,34-40; Lc 10,25-28) poucos textos da Escritura nos
deveriam ser mais caros do que este, e deveríamos nos
esforçar continuamente para compreendê-lo da melhor
maneira possível.
O mandamento principal como mandamento do amor
Escuta, Israel! O Senhor, nosso Deus – é único Senhor.
Ama, portanto, o Senhor teu Deus com toda a alma, com toda
a intensidade e com todas as forças! (6,4ss).
Nestes versículos 6,4ss a exigência do amor pelo Senhor
deriva da afirmação da unicidade do Senhor. Nesta expressão
a língua hebraica em um certo sentido toca os limites das suas
capacidades expressivas. O termo que nós traduzimos
normalmente como “Deus”, isto é, ’elohim não era
absolutamente capaz
Pg. 66
De expressar a ideia de um Deus único. No mundo do
politeísmo isso só poderia referir-se a muitos seres. Por
’elohim se entendia também aquelas potências que nós
chamamos “anjos”. Assim não existia em prática nenhum
termo a disposição para exprimir a absoluta unicidade de
Deus. Por isto o nosso texto recorre a um paradoxo. Toma o
nome próprio do Deus de Israel (Javé, o nosso Deus) e
exprime assim a sua singularidade: "Javé é um Javé". Esta
afirmação é colocada no início de todo o discurso, e dela
deriva imediatamente o mandamento principal formulado
como o mandamento do "amor". “Amor” já era uma obrigação
do rei vassalo em relação ao seu senhor nos tratados de
vassalagem antigos orientais, nos quais, de acordo com a
história das formas, se baseia a aliança de Israel com Deus. O
Deuteronômio não tomou então o conceito do amor de Deus
antes de tudo em Oseias, como frequentemente se diz. Antes
Dt 6,5 o encontrou nas tradições anteriores, no Decálogo e em
Dt 10,12-11,17, como foi visto. A exigência de amar o Senhor
deve ter sido desde o início uma formulação do preceito
principal da divina aliança. Aqui esta adquire uma nova
profundidade, porque resulta em certo sentido do fato de que
Javé, o Deus de Israel, é “único Javé”. Este é o ponto de
partida para que o termo "só" tivesse um papel tão grande na
boca dos místicos e teólogos.
A continua atualização da aliança
Estas palavras (da aliança) que hoje te ordeno, estejam na
tua alma. Inculque-as aos teus filhos. Fala-lhes disso quando
estiveres em casa e quando caminhares pela estrada, quando
te deitares e quando te levantares. Liga-as como um sinal na
tua mão, estejam como pendentes entre os teus olhos. Escreve-
as nos umbrais das casas e nas portas da cidade (6,6-9).
Pg. 67
A exortação para atualizar continuamente a aliança não
se refere somente ao preceito do amor, mas a “todas as
palavras que eu hoje te ordeno”. “Hoje”, vale dizer à
assembleia cultual, na celebração da renovação da aliança,
quando se proclama este texto. A palavra anunciada no culto
deve então penetrar na vida inteira, e estar presente ao israelita
em todas as situações, em todo o tempo e em todo o lugar. As
várias determinações dadas nestes versículos têm a intenção
de enfatizar urgentemente que a palavra de Deus deve estar
presente na vida diária. Certamente nem todas devem ser
entendidas no sentido literal, sobretudo as últimas; mas ao
menos as primeiras não eram simples imagens. Aqueles que
realmente carregam a palavra de Deus dentro de si mesmos
nunca deixarão de falar dela, e estarão preocupados em
introduzir, sobretudo, seus próprios filhos no mundo da
palavra de Deus.
Pg. 68
... não foi construída por Israel, como é continuamente
sublinhado. Ele vive no contexto da salvação que Deus
preparou, num contexto que o Senhor há muito preparou para
o seu povo, desde o seu juramento aos Patriarcas. Israel, numa
palavra, vive no âmbito da pura graça. - Só depois de Deus ter
feito tudo por Israel é que o preceito divino se aplica a Israel,
que ele nunca deve esquecer.
Guarda-te, que não te esqueças do Senhor, que te tirou da
terra do Egito, da casa da servidão. O Senhor teu Deus temerás
e a ele servirás, e pelo seu nome jurarás. Não seguireis outros
deuses, os deuses dos povos que houver ao redor de vós;
Porque o Senhor teu Deus é um Deus zeloso no meio de ti,
para que a ira do Senhor teu Deus se não acenda contra ti e te
destrua de sobre a face da terra (6,12-15).
O aspecto mais importante deste texto já foi dito. Aqui se
comenta o primeiro mandamento do Decálogo, inspirando-se
na tradição da proclamação do preceito principal como é
perceptível em 10,12-11,17.
Mas há também outras expressões, como no início do
pedido de "não esquecer". Aqui a expressão ainda tem o
caráter de uma fórmula de transição. Mas Dt 8 o retomará e
aprofundará, como veremos no próximo capítulo, onde
falaremos em particular do "esquecimento".
O Senhor é caracterizado, com as formulações do início
do Decálogo, como Aquele que "tirou Israel da terra do Egito,
da casa da escravidão". A ação salvífica do Senhor é
considerada com categorias jurídicas como uma "libertação da
escravidão", expressão que retorna ainda mais tarde, em
6,21ss.
A fórmula do Decálogo "Você não deve ter deuses
estrangeiros antes de mim" é alterada
Pg. 69
na proibição de "seguir" deuses estrangeiros. Assim, retoma
um conceito que veio originalmente da esfera militar e
política, segundo o qual se decide a favor de um líder e o
segue. Muito em breve, no entanto, fala-se também na
sequencia nos confrontos de uma divindade. Neste sentido, o
Senhor exige de Israel que ele não siga nenhuma divindade
estrangeira dos povos vizinhos, mas somente Ele. Em relação
a ele. Israel sempre se vê obrigado a escolher entre o Senhor
que vive "no meio" do povo, e os deuses estrangeiros dos
povos que o rodeiam. A vontade do Senhor, de que Israel
pertença exclusivamente a ele, tem algo em si mesmo
inexorável. O Senhor é o Deus dos ciúmes para com os deuses
estrangeiros. Se este ciúme se acende, o Senhor pode tornar-
se um Deus irritado com Israel, aniquilando-o. Não pode
haver dúvidas sobre a seriedade do que o Deus da Aliança
exige.
Todos os mandamentos
Não tentes o Senhor como o tentaste em Massá (6,16).
A referência ao Senhor que habita "no meio" de Israel
recorda os acontecimentos em Massá no deserto, onde este
motivo é de grande importância (cf. Ex 17, 7). A memória dos
acontecimentos em Massah pertence de maneira muito
especial ao contexto do anuncio do preceito primário, como
atestam os Salmos 78,56 e 95,8. “Provar” Deus significa,
afinal, entrar numa disputa com Ele, exigir Dele que Ele se
justifique em sua fidelidade ao pacto, que Ele traga as provas.
Mas se Israel realmente vive no "temor do Senhor", confia
n’Ele, sem fazer perguntas; pois vive somente d'Ele. Esta frase
introduz na exortação geral de
Pg. 70
seguir todos os mandamentos, inseridos entre as duas
partes do "quadro literário do mandamento".
Diligentemente, guardarás os mandamentos do
SENHOR, teu Deus, e os seus testemunhos, e os seus estatutos
que te ordenou. Farás o que é reto e bom aos olhos do
SENHOR, para que bem te suceda, e entres, e possuas a boa
terra a qual o SENHOR, sob juramento, prometeu dar a teus
pais, lançando todos os teus inimigos de diante de ti, como o
SENHOR tem dito. (Dt 6,17-19)
Assim como a ameaça da ira do Senhor se conecta com a
deserção de Israel, assim a promessa da bênção de Deus (18
ss.) se conecta com a fidelidade do seu povo (17 ss.). Estas
bênçãos soam-nos muito estranhas. Talvez que o anúncio do
mandamento não diga respeito a Israel, que já se encontra na
Terra Prometida? Porque só nessa situação é que deve cumprir
os mandamentos. Agora, porém, a possibilidade de entrar na
Terra Prometida e possuí-la é-lhe oferecida sobretudo como
uma "recompensa" pela observância dos mandamentos. Ser-
se-ia tentado a falar de "contradição" e a assumir aqui
diferentes camadas literárias. Mas isso seria errado. Mesmo
que tradições formais diferentes se sobreponham neste
capítulo, isso não esclareceria tudo. É justamente nesta
aparente contradição que se deve advertir de novo a situação
cultual particular da pregação deuteronômica. Quando Israel
escuta este texto em sua liturgia, ele já está na Terra. Ao
mesmo tempo, a abolição cultual do tempo e do espaço traz as
pessoas de volta ao limiar desta Terra. Então Israel já está de
posse da sua terra, e ainda não está lá. Israel vem da bênção.
A graça de Deus é o pré-requisito para o que Ele pede e é, ao
mesmo tempo, a recompensa prometida pela observância do
seu pedido. A misteriosíssima e no fundo para nós homens
indecifrável
Pg. 71
dialética entre "graça" e "mérito" entre a ação divina e a
liberdade humana já emerge nestes textos deuteronômicos.
Pg. 72
entrar no espaço reservado do santuário e estar diante de Deus
na liturgia. Só quem é reconhecido “justo” pode receber no
culto o dom da “vida”. Para Israel, porém, “justiça” (v. 25) e
vida (v. 24) são bens condicionados a observância das
prescrições da aliança. Por que esta dependência? É
necessário demonstra-la, e se demonstra deste modo. Dt 6,21-
24 afirma que as exigências da aliança do Senhor com Israel
emanaram no contexto histórico da libertação de Israel do
Egito e da sua introdução na Terra da promessa. E no
versículo 22, de especial importância, com a fórmula “diante
aos nossos olhos” se faz notar que Israel podia ser em todo
momento chamado como testemunha ocular do agir do
Senhor, e que logo as intervenções do Senhor aqui recordados
eram fatos demonstráveis com o mais rigoroso critério
jurídico. Assim fazendo, Israel teria também admitido que o
Senhor decretou suas leis com pleno direito, pois primeiro Ele
adquiriu este direito com suas obras de salvação. A
demonstração é ainda mais rigorosa. Antes de mais nada, é
apontado que Israel era "escravo" do Faraó. Depois o Senhor
tirou Israel do Egito. Este verbo na linguagem jurídica do
antigo Oriente pode também significar “libertar um escravo”.
Mas quando alguém libertava um escravo, por exemplo
através do resgate, ele se tornava por sua vez senhor do
escravo, e podia colocá-lo diante de se, termos também estes
que podem significar “tornar alguém escravo”. De fato, o
senhor “introduziu” (v. 23) Israel na Terra onde o seu povo
agora deve servi-lo. Ele tem então pleno direito de impor as
suas leis a Israel. E Israel somente quando responde às
exigências do Senhor se encontra em estado de “justiça” e só
então pode receber a “vida”.
Pg. 73
Como se vê aqui, em um discurso sobre o mandamento
principal, de uma antiga profissão de fé cultual foi feita uma
demonstração convincente do direito absoluto de Deus à
obediência de Israel.
O mandamento e os mandamentos
Temer o Senhor
Pg. 74
pedido como o culto exclusivo do Senhor neste sentido é uma
formulação "provisória". A essência do mandamento
principal é definir a atitude fundamental do homem diante de
Deus. Vejamos brevemente este segundo tema da nossa
passagem.
Como interpretação decisiva do mandamento
principal, o nosso texto usa o termo “temer o Senhor”. Este
termo está em Dt 6,13; mas é o único elemento de 6,13 que
depois é retomado em 6,24. Além disso, no texto completo,
que também inclui o Capítulo 5, o termo já é conhecido. O
capítulo 5 traduz em termos narrativos o temor do Senhor. Na
teofania do Sinai os israelitas não ousam subir a montanha por
“temor” (Dt 5,5), atingidos do santo terror diante ao
mysterium tremendum. Através deste temor Israel
experimenta como o homem diante de Deus está entre a vida
e a morte (Dt 5,23-26); eis porque pediram a Moisés para fazer
a mediação junto ao Senhor (Dt 5,27). O Senhor acolhe este
pedido (Dt 5,28) e exprime a sua compaixão por esta atitude
de “temor do Senhor” com estas palavras: “poderiam
permanecer assim: temer-me e observar sempre todos os meus
preceitos, para que eles e seus filhos fossem felizes para
sempre!” (Dt 5,29). Na economia da introdução a todo o
discurso sobre o mandamento principal, o texto contém mais
uma vez o termo "temor do Senhor" (6,2). Sem dúvida,
portanto, para Dt 5,6 o mandamento principal é entendido
essencialmente como um apelo a essa atitude fundamental de
adoração diante do Deus que se revela, que a linguagem
teológica do antigo Oriente define como "temor a Deus".
Se tal texto foi redigido porque duas diversas tradições
cultuais de Israel poderiam estar ligadas liturgicamente, a
ocasião foi um motivo puramente externo.
Pg. 75
Mas o compilador deste texto tinha igualmente alguma coisa
para dizer sobre o preceito primário da divina aliança. Ele
realizou sua função entre as diversas tradições não só através
de uma simples manipulação externa e literária, mas deduziu
o sentido principal do mandamento em si, que ele interpretou
como “temor do Senhor”, que derivava da experiência da
teofania do Senhor.
Pg. 76