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Dentre as ciências sociais, a ciência política foi a que menos se ocupou durante um
tempo dos debates relacionados à infância, no entanto, vem ocorrendo um crescente
movimento em que se pauta pensar não somente os direitos das crianças, mas suas
possibilidades de atuações como cidadãs, quebrando um quadro em que só se pensava a
criança na política dentro de um processo de socialização à política ou politização, que
marcava a caminhada daquele indivíduo para a inserção dessas atividades. O preparo
para a votação.
Esse tipo de pensamento que se materializa em estruturas sociais que determinam quais
indivíduos possuem competência e maturidade para participar do processo político,
reforça a leitura que nos conta sobre o afastamento da criança das centralizações dos
debates e as decisões que deles surgem. A todo instante existe um esforço imenso não
somente para manter esses sujeitos afastados do ordenamento, mas também para
sustentar a construção do ‘‘mundo à parte”, aquele infantil, naturalizado como o mundo
em que as crianças devem fazer parte e que não corresponde ao mundo problemático e
cruel dos adultos, onde executam seus papéis que contam quais possíveis adultos elas
serão.
A antropologia afia seus olhares em relação à infância desde muito tempo, ela que se
ocupa em compreender o fenômeno em seu contexto social e cultural, busca na infância
e consequentemente produz uma vasta coleta de dados, analisar os atos performativos
das crianças que revelam significantes sobre a vida social e o que de fato é ser criança.
Desde a década de 1960, estudos inovadores permitiram que conceitos caros à área
fossem dilatados na medida em que eram postos à luz da infância. Conceitos como
cultura, que em investigações em lugares feitos para as crianças, foi possível perceber
como elas facilmente subvertiam os espaços, as brincadeiras, criando novos arranjos a
depender do contexto e provocando a consolidação dessas transformações. Construíam
uma auto realidade, uma realidade social a partir das representações sociais nas trocas
entre si. Pensar na elaboração de representações sociais, estudo que surge na psicologia,
nos fala sobre dois processos interessantes, a objetificação que possui a função de
corporificar uma ideia, e a ancoragem, que torna aquilo que é desconhecido em algo
familiar à compreensão dos indivíduos envolvidos, significando, portanto, que pensar
nas representações que as crianças constroem cotidianamente em suas realidades
sociais, é levar em consideração a relação entre sujeito e objeto. Facilmente foi
percebido por muitos antropólogos da infância, nos estudos de cognição social, que
quase que não existiam limites para o poder de criação daqueles indivíduos. O que nos
leva para outros dois conceitos, o da agência, que revelava que o indivíduo apesar de
estar submetido a regras e normas, existia em si um provocar capaz de subverter aquilo
já estabelecido, entreguem um brinquedo para um grupo de crianças e mesmo que elas
saibam ou não ler o manual, elas podem prontamente decidir criar suas próprias regras.
Considerando uma vivência em grupo, a ação social desses indivíduos demonstra o
modo como elas se relacionam entre si, de jeito a assumirem papéis que são
performatividade dos adultos quando diante de crianças menores assim como uma forte
coesão. Elas atritam entre si, mas são capazes de solucionar os seus próprios conflitos.
Percebendo isso, a antropologia tem revelado cada vez mais que diferente dos adultos,
as crianças se encontram em si e em outras crianças. Elas criam, recriam, estruturam,
subvertem, mas raramente são vistas por suas potencialidades. Os adultos só conseguem
enxergar os “adultos em potencial”, e não crianças como seres do presente.