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O QUE
MOVE
VOCÊ? LER PENSAMENTO
Tecnologia permite exploração de
A motivação traz satisfação informações guardadas no cérebro
e favorece conquistas, ATENÇÃO
mas nem sempre é fácil Truque do cérebro ajuda a eleger
manter o entusiasmo. estímulo para evitar as distrações
Para cientistas, é indispensável OLFATO
entender o que está Cheiro de suor da pessoa amada
por trás de nossos objetivos diminui estresse e ansiedade
carta da editora
Os “porquês” de cada um
O
que faz você se levantar da cama a cada dia? Qual é a sua motivação? Quan-
do se trata de trabalho, é muito frequente que as pessoas respondam ra-
pidamente que o que as impulsiona é a necessidade de “ganhar dinheiro”.
Certo, mas para quê? Por que comprar coisas ou pagar contas, qual o objetivo mais
profundo de suas ações? Afinal, sabemos – mais ou menos claramente – que é onde
colocamos energia (entendida aqui como empenho de tempo, capacidade intelectual
e afetiva) que acreditamos, no mais íntimo de nós, que encontraremos satisfação.
Especialistas chegam a argumentar que a motivação – aquilo que move a ação –
pode ser até mais importante e determinante do que o talento. Claro, sempre é pos-
sível recorrer à didática pirâmide proposta por Abraham Maslow, de 1954, para falar
das buscas nas quais nos empenhamos ao longo da vida. Ele classificou necessidades
humanas, em ordem de prioridade, em fisiológicas, de segurança, de amor e atenção,
de estima e de autorrealização. Os dois textos sobre motivação, nesta edição digital de
Mente e Cérebro, mostram que atualmente a psicologia identifica “elementos críticos”
que oferecem suporte à motivação. Quando enfrentamos dificuldade, convém pergun-
tar o que está faltando. A resposta, em geral, se relaciona à ausência de autonomia,
sensação de que a tarefa é inútil ou dúvida sobre nossa capacidade. Pesquisadores ob-
servam que, quando o entusiasmo se esvai, o questionamento pessoal é fundamental
para avaliar objetivos e, eventualmente, rever escolhas.
Como enfatizam ensinamentos budistas, o mais importante não é a experiência
em si, mas o que restou dela após seu término. Ou seja: em quem você se trans-
formou após a tão sonhada viagem, a conclusão do curso, o sucesso da dieta, o
casamento ou chegada do bebê ou a promoção no trabalho? O que o motivou e
ainda continua a impulsionar suas atitudes? No final do dia, qual era mesmo o seu
“porquê”?
Boa leitura.
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sumário agosto 2019
6 Máquinas que
capa Motivação
leem pensamentos
Parece enredo de filme de ficção científica, mas
é realidade: técnicas de imageamento cerebral
já permitem a exploração de informações
12 O que move você? armazenadas do cérebro
O entusiasmo tende a nos tornar mais
comprometidos e alegres. Mas nem sempre
a dedicação é compatível com os resultados.
22 Truque cerebral
Novas pesquisas mostram a importância de para evitar distrações
rever objetivos e formas de alcançá-los Quando algo nos atrai em um momento
em que precisamos nos concentrar,
a mente “escolhe” apenas um estímulo
por vez para ser alvo de interesse
26 Pintinhos bons de
matemática
Assim como as crianças, filhotes de galinha
parecem ter preferência inata por algarismos
menores à esquerda e maiores à direita
CENTRAL DE
Mais de um século depois ATENDIMENTO AO LEITOR
Mente e Cérebro é uma publicação Para informações sobre sua assinatura,
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Máquinas
que leem
pensamentos
Nos últimos anos,
as técnicas de
imageamento cerebral
avançaram tanto que
se tornaram capazes
de perscrutar – e em
alguns casos alterar
– conhecimentos
guardados no cérebro
6
tecnologia
A
ideia de que a mente está completamente prote-
gida das intrusões externas persistiu por séculos.
Mas hoje essa suposição pode não ser mais válida.
Sofisticados equipamentos de neuroimageamento
e interfaces cérebro-computador detectam a atividade elétri-
ca de neurônios, o que permite a decodificação e até altera-
ção de sinais do sistema nervoso que acompanham proces-
sos mentais. Embora tais avanços tenham grande potencial
para as áreas de pesquisa e medicina, eles trazem um desafio
ético, jurídico e social: de repente se torna importante deter-
minar se, ou em que condições, é legítimo obter acesso à
atividade neuronal de outra pessoa ou interferir nela.
Essa questão tem especial relevância porque muitas neu-
rotecnologias se desviaram de uma configuração médica
e passaram a fazer parte do domínio comercial. Tentativas
de decodificar informações mentais por meio do imagea-
mento também estão ocorrendo em processos judiciais em
tribunais, às vezes de modo bastante questionável cientifi-
camente. Há quase uma década, por exemplo, uma mulher
indiana foi condenada por homicídio e sentenciada à prisão
perpétua com base em um exame de varredura cerebral
que mostrava, de acordo com o juiz, “conhecimento expe-
riencial” sobre o crime.
O potencial uso de tecnologia neural como um detector
de mentiras durante interrogatórios ganhou atenção espe-
cial. Apesar do ceticismo de especialistas, empresas já es-
tão comercializando tecnologia baseada em imageamento
por ressonância magnética funcional e eletroencefalografia
para detectar mentiras. As forças armadas americanas tam-
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tecnologia
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tecnologia
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tecnologia
10
Coleção
LIGHT
História da Pedagogia
P i a g e t • Vi g o t s k i • Wal l o n • Fre i re • Ro u s s e a u • D e w e y
coleção
Realização:
O que
move
você?
Pessoas motivadas
procuram se superar e
buscar melhores resultados,
são mais entusiasmadas,
responsáveis, comprometidas
e, principalmente, mais
satisfeitas. O problema é
que nem sempre nosso
empenho está alinhado com
os resultados que obtemos.
Novas pesquisas indicam a
importância de rever rotas
capa • motivação
T
odo mundo que cursa psicologia – ou mesmo outras
formações na área de ciências humanas – em algum
momento assiste à aula sobre a famosa pirâmide de
Abraham Maslow (1908-1970). O psicólogo america-
no estabeleceu uma hierarquia, expressa graficamente, locali-
zando as necessidades mais básicas (como alimentação, por
exemplo) na base da figura geométrica. No topo, ficam aspec-
tos ligados à realização pessoal. Psicólogos e neurocientistas
acreditam, porém, que as coisas não são tão simples. O que
nos faz trabalhar, estudar, viajar, tomar banho, fazer ginástica,
correr riscos, iniciar e manter relacionamentos? Resolvidas as
necessidades básicas, o que nos move mesmo é uma exigên-
cia interna de autonomia, conhecimento, envolvimento e dina-
mismo. Fácil? Nem tanto. Em
Quando enfrentamos plena era da tecnologia, em
dificuldade, convém que as possibilidades se mul-
perguntar o que está tiplicam diante dos nossos
faltando; a resposta, em olhos, muitos pesquisadores
geral, se relaciona a falta de têm questionado ideias sim-
autonomia, sensação de que plistas sobre as necessida-
des e os anseios humanos.
a tarefa é inútil ou dúvida
Alguns estudiosos veem
sobre nossa capacidade
a maior fonte da motiva-
ção humana na ampliação
das próprias competências e falam de dois sistemas de
razões antagônicas que se formaram ao longo da evolu-
ção: curiosidade e medo, ambos repletos tanto de oportu-
nidades quanto de riscos. É o caso do psicólogo Clemens
Trudewind, pesquisador da Universidade de Bochum, na
Alemanha, que durante algum tempo estudou essa inte-
ração. Ele comprovou algo que muitos pais e educadores
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capa • motivação
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capa • motivação
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capa • motivação
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capa • motivação
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capa • motivação
O que
vale a
pena
buscar?
Neurocientista da
Universidade de Washington
mapeou centenas
de cérebros de animais
e constatou que o prazer
está muito mais em buscar
o que queremos
do que em conseguir.
Talvez isso explique
por que suportamos
postergar o recebimento
de recompensas
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capa • motivação
N
o começo da década de 50, o psicólogo James
Olds, professor da Universidade Mc-Gill, no Ca-
nadá, chegou à conclusão de que a busca pela
satisfação e a satisfação em si são processadas
na mesma região no cérebro dos ratos. Outras pesquisas
realizadas depois revelaram que o funcionamento men-
tal de seres humanos segue a mesma lógica. Isso explica
por que buscamos prazeres continuamente. Mas a maioria
das pessoas também consegue postergar a realização dos
seus desejos: na expectativa de viver algo que queremos,
nosso cérebro já nos dá uma
Nosso cérebro tem dois provinha da satisfação.
sistemas de recompensa, O professor de psicologia e
um que nos leva a querer neurociência da Universidade
e outro, à sensação de Michigan Kent Berridge,
vencedor do prêmio Grawe-
de satisfação. Sentimos
meyer de psicologia em 2018,
vontade de obter algo
fez uma descoberta funda-
e, na sequência, mental sobre motivação: nos-
a alegria da conquista so cérebro tem dois sistemas
de recompensa, um que nos
leva a querer e outro, à sensação de satisfação. Sentimos
vontade de obter algo e, na sequência, a alegria da con-
quista. Por estarem muito próximos, esses dois movimen-
tos mentais confundiram os cientistas, mas hoje se sabe
que eles podem funcionar separadamente.
Quando estamos muito ansiosos, estressados, ou sob o
efeito de drogas, por exemplo, a vontade de conseguir o
que almejamos é potencializada e a capacidade de escolha
fica comprometida. Talvez você mesmo já tenha se flagra-
do, em momentos de grande tensão e cansaço, compran-
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capa • motivação
Algo maior
Durante uma das mais comentadas palestras do TED, a
maior convenção de ideias do mundo, que acontece anu-
almente na Califórnia, o professor do departamento de
psicologia da Universidade de Chicago Mihaly Csikszent-
mihalyi fez uma pergunta à plateia: “O que faz a vida valer
a pena?”. Em 15 minutos de apresentação, ele chegou à
seguinte conclusão: Não podemos ter uma ótima vida sem
o sentimento de que fazemos parte de algo maior do que
nós mesmos.
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capa • motivação
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atenção
Truque cerebral
para evitar
distrações
Diante de uma situação em que
precisamos nos concentrar, mas vários
estímulos nos atraem simultaneamente,
“escolhemos” apenas um para nos ater
22
atenção
V
ocê está dirigindo por uma rodovia por onde não
costuma transitar e sabe que a saída está em algum
lugar desse trecho da estrada, mas nunca a utilizou
antes e não quer perdê-la. Enquanto olha atenta-
mente para um lado em busca do sinal de saída, numerosas
distrações se intrometem em seu campo visual: cartazes, um
conversível charmoso, o toque do celular.
Como o seu cérebro se concentra na tarefa que está rea-
lizando? Para responder a essa pergunta, neurocientistas em
geral estudam o modo como o cérebro reforça sua resposta
para o que você está procurando, condicionando-se com um
impulso elétrico especialmente forte quando vê o que pro-
cura. Outro “truque”
neurológico pode
Neurocientistas acreditam que a
ampliação dessa linha de pesquisa ser igualmente im-
portante: segundo
poderá ajudar a compreender o
um estudo divulga-
que ocorre no cérebro de pessoas do pelo periódico
com transtorno de déficit de científico Journal
atenção e hiperatividade (TDAH) of Neuroscience, o
cérebro enfraque-
ce sua reação deliberadamente perante tudo o mais, de modo
que, comparativamente, o alvo de interesse ganhe destaque.
E o mais curioso: fazemos isso sem sequer perceber.
Os neurocientistas cognitivos John Gaspar e John McDonald,
ambos pesquisadores da Universidade Simon Fraser, na Co-
lúmbia Britânica, Canadá, chegaram a essa conclusão depois
de pedirem a 48 universitários que fizessem testes de atenção
em um computador. Os voluntários deveriam identificar rapida-
mente um círculo amarelo isolado em meio a um conjunto de
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atenção
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inteligência
Pintinhos
bons de
matemática
Assim como as crianças,
filhotes de galinha
parecem ter preferência
inata por algarismos
menores à esquerda
e maiores à direita
26
inteligência
P
ense em um número. Agora imagine um maior.
Tente visualizar os dois na sua frente. Se você
enxerga o menor do lado esquerdo, apenas
confirma um dado encontrado frequentemente:
tendemos a posicionar números no espaço da esquerda
para a direita. Cada vez mais evidências, incluindo pes-
quisas com bebês lactentes pré-verbais, sugerem que
nascemos com essa tendência, que pode ser facilmente
influenciada pela cultura e alterada. O curioso é que um
estudo publicado pelo periódico científico Science , por
uma equipe de pesquisado-
Os resultados mostram res da Universidade de Tren-
que as escolhas dos to, na Itália, mostra que be-
bês de uma espécie comple-
animais dependem de
tamente diferente também
quantidades relativas,
preferem colocar os algaris-
e não de qualquer mos maiores nessa ordem.
preferência absoluta Os cientistas treinaram pin-
por algum número, tinhos de três dias de vida
e indicam que essa para andar em torno de um
predisposição é inata painel em busca de alimen-
to. Num primeiro momento,
alguns filhotes aprenderam a encontrar comida atrás de
uma divisão em que havia cinco pontos desenhados. Em
seguida, os cientistas, coordenados pela psicóloga cog-
nitiva Rosa Rugani, substituíram o painel por outros dois.
Quando essas novas separações mostravam duas mar-
cações cada uma, os animais caminhavam inicialmente
para a marca da esquerda em 70% das vezes. Quando
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inteligência
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sentidos
Cheiro da pessoa
amada diminui
estresse
Em um novo estudo, os pesquisadores descobriram que as
mulheres que tinham cheirado a camiseta suada do parceiro
relataram ter menos estresse do que aquelas que sentiram o
cheiro de um estranho ou de uma roupa não usada
30
sentidos
E
stá ansioso com a situação caótica do país, com o
trânsito ou com o compromisso assumido de fa-
lar em público? Tente cheirar a camiseta suada da
pessoa amada. Estranho? Talvez, mas um estudo
experimental recente revelou que o odor do parceiro afetivo
pode reduzir os níveis de estresse psicológico e fisiológi-
co, mesmo quando a pessoa não está presente. Já o cheiro
de um estranho tende a aumentar os níveis de estresse, de
acordo um estudo publicado no periódico científico Journal
of Personality and Social Psychology.
“Muitas mulheres usam a camisa do parceiro e homens às
vezes preferem o lado que a companheira normalmente ocu-
pa na cama quando ela está fora”, diz a doutora em psicologia
Marlise Hofer, pesquisadora da Universidade de British Co-
lumbia. “Ao observar esses comportamentos, fiquei curiosa
para saber se traziam algum benefício efetivo”, conta Hofer.
Ela e outras três pesquisadoras recrutaram 96 casais hete-
rossexuais para participar do estudo. Os homens foram ins-
truídos a usar uma camiseta branca por 24 horas e evitar usar
desodorante, fumar ou comer alimentos como alho ou cebo-
la, que interferem diretamente no odor exalado. Após usarem
as peças durante cinco horas, as devolveram ao laboratório.
As camisetas foram dobradas e congeladas pelo avesso, em
embalagens individuais, com a área da axila voltada para cima
para preservar o aroma, e descongeladas duas horas antes do
início do teste de estresse. Aliás, há algo curioso no método:
congelar uma peça de roupa preserva o odor do usuário por até
dois anos, segundo as pesquisadoras. Os homens foram esco-
lhidos para usar as roupas porque costumam ter suor mais forte,
enquanto as mulheres tendem a ter um olfato mais apurado.
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sentidos
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sentidos
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linguagem
A forma
secreta
das letras
Os idiomas variam muito de uma
cultura para outra, mas raízes comuns
podem ser encontradas na maioria
deles. A ciência tem pistas sobre a
razão de associarmos certas letras com
formas redondas ou pontiagudas
34
linguagem
V
ocê sabe o que quer dizer bouba, takete, malu-
mi e kiki ? Se não tem ideia, não faz mal, pois de
fato as palavras não têm nenhum significado.
Apesar disso, por décadas os vocábulos têm
sido estudados por linguistas fascinados pela maneira
como esses termos podem transmitir significado em mui-
tos idiomas. Pesquisas da década de 1920 já demonstra-
vam que crianças e adultos, independentemente do idio-
ma que falavam, combinavam as palavras bouba e malu-
mi com formas arredondadas e kiki e takete com forma-
tos pontiagudos. O porquê
Consoantes parecem permanece um enigma.
carregar significado além Consoantes e vogais não
das palavras que ajudam têm nenhuma relação ine-
a formar; um estudo recente rente com o significado na
com 71 falantes de francês maioria das expressões.
mostrou associação de A letra “o” em “octógono”,
palavras com b, m e l com por exemplo, não está liga-
formas arredondadas da de maneira “natural” a
formas de oito lados, nem
azul ao tom, à cor que associamos à palavra, por exemplo.
Então, o que haveria de tão especial em bouba e takete ?
Hoje os cientistas apresentam uma resposta parcial a
essa pergunta: consoantes parecem carregar significado
além das palavras que ajudam a formar. Em um estudo
recente com 71 falantes de francês publicado na Langua-
ge and Speech , pesquisadores europeus liderados pela
psicolinguista Mathilde Fort, da École Normale Supérieu-
re, em Paris, mostraram que os participantes associavam
consistentemente palavras com b , m e l com formas re-
35
linguagem
36
linguagem
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especial • inconsciente
Universos
além da
consciência
Há em nossa mente
significados codificados,
revestidos de metáforas
e imagens; sentimentos
reprimidos, porém,
reaparecem disfarçados
e deslocados, tanto
nos sonhos quanto
no cotidiano
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especial • inconsciente
O
inconsciente é por definição incognoscível. O psi-
canalista está, portanto, na posição infeliz de um
estudioso daquilo que não se pode conhecer”, es-
creveu Thomas Ogden, em The primitive edge of
experience, de 1989. Na verdade, podemos pensar o incons-
ciente sob duas ópticas. Como adjetivo, é possível associá-lo ao
que escapa à consciência, sem estabelecer discriminação entre
conteúdos dos sistemas pré-consciente e inconsciente. Para
melhor compreender, vale observar aqui que a concepção de
consciência parece semelhante à de atenção: estamos cons-
cientes daquilo para o que nos voltamos e inconscientes daquilo
com que não nos ocupamos.
Poderíamos, segundo essa
lógica, estar conscientes de
situações e fenômenos para
os quais voltássemos nossa
atenção – entraríamos então
no que Freud chamou de
pré-consciente. Aquilo para o que evitamos dar atenção por
acharmos que pode deflagrar perturbação e dor está no in-
consciente reprimido. É possível, nesse caso, falar do incons-
ciente como substantivo, no sentido tópico. Trata-se, assim, de
uma instância psíquica, faz parte da primeira teoria do aparelho
psíquico desenvolvida por Freud, constituído de material recal-
cado, não diretamente acessível à consciência.
A consciência pode ser comparada com o que está visível na
tela do computador. Temos acesso imediato a outras informa-
ções “pulando” para outra parte do documento ou mudando
de janela. Esse gesto seria análogo às partes consciente e pré-
-consciente da mente. Mas pode ser mais difícil acessar outros
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especial • inconsciente
41
especial • inconsciente
Estranhos
mundos
internos
Esse intrigante aspecto psíquico que
influencia escolhas organiza memórias e
experiências que preferimos esquecer ou dos
quais não queremos saber. E se revela em
sonhos, amores, desejos e fantasias
42
especial • inconsciente
G
rande parte dos nossos conteúdos psíquicos são
inacessíveis ao próprio conhecimento. E apesar
de “escondidos”, surgem disfarçados e influen-
ciam nossas escolhas. Recentemente, ao pesqui-
sar a ação de neurotransmissores, o psiquiatra Eric Kandel,
ganhador do Nobel de Medicina em 2000, comprovou que o
inconsciente tem também o papel de intensificar as emoções
e sensações de angústia que pareciam ocultas. O incons-
ciente freudiano não é apenas a inconsciência, no sentido da
não consciência ou no de uma outra consciência. Trata-se
de uma instância simultaneamente “descoberta e inventada”,
uma vez que é um sistema que organiza nossas memórias,
desejos e experiências que pretendemos esquecer ou dos
quais não queremos saber. Ele existiu desde sempre, desde
que sonhamos, amamos ou fantasiamos.
O psicanalista Jacques Lacan acrescentou que há incons-
ciente desde que falamos com os outros. Os animais não têm
inconsciente não porque não são racionais, ou porque não te-
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especial • inconsciente
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especial • inconsciente
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especial • inconsciente
A mente no
laboratório
Um século depois de Freud apresentar a teoria
de que habita em nós uma instância sobre a qual
não temos controle – mas se mostra em nossas
ações e pensamentos – muitos cientistas se
rendem a evidências e buscam estudá-la
47
especial • inconsciente
H
á mais de um século, quando o criador da psica-
nálise lançou a ideia de que temos em nós um
aspecto inconsciente, foi inevitável que fosse de-
flagrada a desconfiança dos cientistas, que se per-
petua ao longo de décadas. Não é para menos, a proposta de
Sigmund Freud é intrigante. Segundo ele, essa parte da mente
abriga pensamentos, desejos e lembranças que, por seu teor
excessivo, sexual ou violento, não suportamos manter por per-
to – e, por isso, são removidos para uma espécie de “porão”
psíquico para que não tenhamos de lidar com eles a cada ins-
tante. Apesar de nossos esforços para manter esses conteú-
dos recalcados, eles continuam vívidos e vez por outra retor-
nam mais ou menos disfarçados.
Como esse aspecto não é, por definição, facilmente acessí-
vel, não é simples estudá-lo – embora se apresente inúmeras
vezes por meio de atos falhos e no conteúdo dos sonhos, por
exemplo. Depois de muitas abordagens buscarem negar ou
ignorar essa instância – o que, aliás, é compreensível, visto que
parece realmente desconfortável ter um “estranho morando
dentro de nós” –, a ciência tem se rendido e procurado com-
preendê-la melhor.
Atualmente, o domínio da
inconsciência, descrito mais
genericamente no âmbito da
neurociência cognitiva como
qualquer processo que não
permita a ativação da cons-
ciência, é rotineiramente estu-
dado em centenas de labora-
tórios que usam técnicas psi-
cológicas objetivas baseadas
em análises estatísticas.
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especial • inconsciente
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especial • inconsciente
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especial • inconsciente
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especial • inconsciente
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especial • inconsciente
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livro | lançamento
O oráculo da noite – A
história e a ciência do
sonho. Sidarta Ribeiro.
Companhia das Letras,
2019. 472 págs. R$ 79,90.
E-book: R$ 39,90.
Do misticismo
à psicobiologia
Livro de Sidarta Ribeiro trata do sonho,
uma atividade mental governada por emoções
e processos neuroquímicos, que nos permite
simular futuros possíveis, esquecer,
criar, ensaiar comportamentos e aprender
A
o longo da história, as experiências oníricas guiaram decisões de líderes
e várias culturas, e ainda hoje muitas pessoas fazem escolhas (como
adiar viagens, por exemplo) com base nos sonhos. Em linhas psicote-
rápicas que valorizam o papel da instância inconsciente, como a psicanálise
e a psicologia analítica, essas manifestações noturnas são recursos importan-
tes para compreender desejos e processos mentais nem sempre óbvios. Em O
oráculo da noite, o neurocientista Sidarta Ribeiro, pós-doutor pela Universidade
Duke, se pergunta – indagações que certamente já passaram pela cabeça de
muita gente: o que é o sonho, afinal? Qual seu propósito? Como compreender
suas mensagens simbólicas e detalhes tantas vezes intrigantes?
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livro | lançamento
Para oferecer respostas, de forma instigante e inteligente, o professor de neu-
rociência, fundador e vice-diretor do Instituto do Cérebro da Universidade Federal
do Rio Grande do Norte (UFRN), busca embasamento em consistentes informa-
ções antropológicas, psicanalíticas e literárias, além das mais recentes referências
sobre biologia molecular, neurofisiologia e medicina. O neurocientista assinala,
por exemplo, que experiência onírica foi provavelmente a primeira demonstração
para nossos ancestrais de que a percepção sensorial pode ser apenas um teatro
de ilusões. No momento em que foi possível experimentar vividamente a riqueza
dessa formação psíquica, e lembrar-se disso na vigília, tornou-se possível perceber
que nem tudo que é pensado deve corresponder a uma percepção ou ato motor na
vida real. Daí para a imaginação consciente (incluindo o planejamento do futuro
e a lembrança do passado, articulados)
Desvendar os mecanismos e funções pode ter sido um pulo.
oníricas esclarece muito sobre a Colunista de Mente e Cérebro du-
rante 12 anos, Ribeiro recorre a histó-
origem da consciência humana;
ria, filosofia, narrativas sobre amores,
o uso do sonho como tecnologia monges e demônios para compor um
psicológica e pedagógica é um panorama atraente e ao mesmo tempo
recurso pessoal poderoso aprofundado. Ele ressalta que, hoje, a
ciência sabe que sonhar – uma ativi-
dade mental governada por emoções, motivações e processos neuroquímicos –
nos permite simular futuros possíveis, esquecer, criar, ensaiar comportamentos.
E aprender durante a noite sem nos submetermos aos riscos da realidade.
O ato de compartilhar essas experiências por meio da linguagem talvez te-
nha inaugurado a religião, confirmando para todos os membros da tribo que
além dessa realidade há outras, fato atestado por todos ao despertar de manhã.
Desvendar os mecanismos e funções oníricas esclarece muito sobre a origem
da consciência humana. Embora numa época em que se dorme tão pouco os
sonhos muitas vezes sejam desacreditados, menosprezados ou simplesmente
esquecidos, seu uso como tecnologia psicológica e pedagógica se torna cada vez
mais poderoso, à medida que adquirimos conhecimento sobre a melhor forma
de dormir e sonhar.
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Coleção
LIGHT
História da Pedagogia
P i a g e t • Vi g o t s k i • Wal l o n • Fre i re • Ro u s s e a u • D e w e y
coleção
Realização: