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Perseguir cultura e arte é agredir a nação

Ataque do governo Bolsonaro à produção artística e cultural tem de ser contido em nome da
democracia

Editorial
22/12/2019 - 00:00 / Atualizado em 22/12/2019 - 12:21

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Não se esperava de Jair Bolsonaro um início de governo tranquilo. O estilo


agressivo demonstrado em 28 anos de trajetória como deputado do baixo clero
na Câmara prenunciava tempos difíceis no relacionamento do presidente com
atores políticos, organizações de representação social, pessoas e instituições
que divergem dele. A intolerância com a diversidade já era notória.

Na campanha eleitoral os territórios de enfrentamentos foram sendo


delimitados. ONGs, defensores do meio ambiente como um todo, índios,
minorias em sentido amplo e tudo o que ele identificasse como esquerda
estariam na mira. Neste sentido não houve surpresas. Mas o ataque à cultura e
às artes chama especial atenção.

Não basta ocupar os espaços que eram dos “inimigos”. O aparelhamento de


segmentos do Estado pelo bolsonarismo nada fica a dever ao PT e aliados. Mas
não basta preencher vazios deixados pela saída de servidores do último
governo e de “petistas” remanescentes.

É preciso destruir, desmontar as cadeias de produção artística e cultural,


apagar qualquer marca, qualquer registro do passado. O mesmo desejo
autoritário de reescrever a História observado em diversas épocas no mundo
em vários países.

Neste sentido, é sugestivo que o presidente interino da Agência Nacional do


Cinema (Ancine), Alex Braga, tenha mandado retirar das paredes da sede da
instituição cartazes de filmes brasileiros antigos. Entre eles, “Deus e o diabo na
terra do sol”, de Glauber Rocha, e “O bandido da luz vermelha”, de Rogério
Sganzerla, pontos de referência do moderno cinema brasileiro na década de
60. O objetivo é apagar um passado de produções artísticas. Mas o presente e o
futuro também, pois foi retirado do site da Ancine o espaço da relação de
novas produções. Atos como este evocam crimes cometidos por regimes
antidemocráticos de direita e esquerda contra artistas e suas obras.

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É algo que vai além da censura. Esta já havia sido esboçada com o anúncio de
que projetos de filmes “inadequados” no aspecto moral, religioso e político não
teriam apoio da própria Ancine. Em julho, Bolsonaro se referiu à necessidade
de “filtros”. Um sinônimo de censura. O governo Bolsonaro deu dois passos à
frente da própria ditadura militar, que censurou a arte e a imprensa, mas não
fechou todos os guichês de apoio à produção de cineastas, por exemplo. Criada
em 1969, um ano após a edição do AI-5, a estatal Embrafilme financiou e
distribuiu filmes de artistas opositores do regime. Isso não o fez menos
ditatorial, mas indicou que houve, em alguns momentos, rasgos de bom senso.
Bolsonaro tem o mesmo DNA da ditadura, mas seu ataque institucional à
cultura e a artistas, na democracia, ultrapassa limites até mesmo respeitados
naqueles tempos. A sanha contra a produção artística apareceu na limitação à
Lei Rouanet. Depois, houve uma atenuação para não alijar de vez os musicais
do teatro brasileiro. Mas a semana acabou ainda com incertezas sobre a
revisão das regras. O certo é que reduzir aporte incentivado de empresas a
projetos de produção artística se traduz em menos emprego e menos renda em
uma ampla linha de produção.

O golpe contra o Microempreendedor Individual (MEI), para atingir


escritores, jornalistas, artistas de diversos campos, foi tão brutal e
inconsequente que o governo também recuou. A medida inviabilizava a
prestação de serviços de um número incontável de pessoas, não apenas no
“trabalho intelectual”, de que o bolsonarismo tem ojeriza. Havia passado do
ponto. O tiro atingia trabalhadores de muitos outros setores. É característica
deste governo sempre testar limites. Recuos nada significam. São táticos.

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Há uma lógica destrutiva nos movimentos bolsonaristas contra a arte e a


cultura, seja em palavras e atos. Talvez em busca de repercussão nas redes
sociais, a favor ou contra, não se mede o alcance de declarações e de ações
estapafúrdias. Na agressão gratuita à atriz Fernanda Montenegro pelo diretor
da Funarte Roberto Alvim — “sórdida”, “mentirosa” — ou no acionamento da
embaixada brasileira em Montevidéu para retirar um filme sobre Chico
Buarque do 8º Festival de Cinema do Brasil, na capital uruguaia. Não teve
sucesso, mas a iniciativa não pode ser esquecida.

Chega a ser anedótico o comportamento de alguns agentes do bolsonarismo


colocados no setor artístico. O maestro Dante Mantovani, escalado para a
Funarte, pontificou que “os Beatles combatem o capitalismo” e que o rock leva
a drogas, sexo e à indústria do aborto. Se o objetivo é agitar as redes sociais,
mantendo uma claque de militância de extrema direita mobilizada, funciona.

Funciona como peça de um marketing do escândalo para manter a tensão em


torno da agenda da chamada “guerra cultural” que bolsonaristas travam contra
a esquerda, ou o que supõem ser esquerda. Quando este tipo de visão fica
circunscrito a bandos de radicais anticultura, inimigos da arte em suas
diversas expressões, isso pode ser visto como algo exótico a ser contido pela
força da lei. Mas se este tipo de visão de mundo chega ao Palácio do Planalto e
se infiltra no Estado, a sociedade precisa se precaver e buscar proteção das
instituições republicanas.

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O caso pode ser bizarro, mas a destituição de Sérgio Nascimento de Camargo,


da Fundação Palmares, pela Justiça, a pedido do Ministério Público, é um
exemplo. Assumir esta entidade com declarações racistas, preconceituosas,
requer mesmo a intervenção de organismos de Estado.

Todo este movimento que parece ser coordenado a partir de um plano carrega
a doença do patrimonialismo que contamina a vida pública brasileira. Faz o
governo achar que o dinheiro público é seu, e não é. Precisa prestar contas do
que faz com ele no estratégico setor da produção cultural.

Por trás desses desvarios fica exposta a falta da percepção de que a cultura e a
arte são de todos os brasileiros, sem demagogia.

Quando Bolsonaro, família e apaniguados tratam de colocar amarras no


processo que permite que o patrimônio cultural brasileiro inspire músicas,
filmes, teatro, livros e tudo o mais, eles agridem a nação e suas raízes.

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