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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI

CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII


CURSO DE DIREITO
NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA
COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

INQUÉRITO POLICIAL:
uma análise acerca da aplicabilidade do princípio do contraditório

Monografia apresentada como requisito parcial para


obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob
orientação da Profa. Ana Paula Kich Gontijo.

ACADÊMICO: FABIANO DE SOUZA


FREITAS MARTINS

São José (SC), outubro de 2004.


UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR – CES VII
CURSO DE DIREITO
NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA
COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA

INQUÉRITO POLICIAL: uma análise acerca da aplicabilidade do


princípio do contraditório

FABIANO DE SOUZA FREITAS MARTINS

A presente monografia foi aprovada como requisito para a obtenção do grau de


bacharel em Direito no curso de Direito na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.

São José, 11 de novembro de 2004.

Banca Examinadora:

_______________________________________________________
Profa. Ana Paula Kich Gontijo - Orientador

_______________________________________________________
Prof. Esp. Hélio Callado de Oliveira - Membro

_______________________________________________________
Profa. MSc. Cláudio Gastão da Rosa Filho - Membro
DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho, com todo o amor, à memória


de meu vô Dica, minha vó Edi e de meu vô Darinho,
que deixaram no meu coração, saudades e boas
lembranças de um laço de amizade.
AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais Jorge Luiz Freitas Martins e Eliane de Souza Martins, pelo
amor, incetivo e confiança que depositam em mim desde o início da minha vida, incluindo
nesta, a minha jornada acadêmica.

Ao meus irmãos Jorge Augusto de Souza Martins “Guto” e Sérgio “Mudinho”,


assim como todos os meus familiares, pelo apoio e amizade.

À minha namorada Susann Aguiar Mondadori “Sú”, pela compreensão, pelo amor e
carinho que tem por mim, inclusive pela paciência, no momento de conclusão desta
monografia.

À minha orientadora Ana Paula Gontijo, com minha total admiração e especial
gratidão.

Aos professores Hélio Callado de Oliveira e Cláudio Gastão da Rosa Filho, por
terem prontamente aceito o convite para participação na banca deste trabalho.

Ao meu amigo Professor Mestre José Luiz Gonçalves, pelo apoio e pela grande
contribuição que prestou no desenvolvimento deste trabalho.

Ao meu grande amigo Marcelo César Bauer Pertille e seus familiares, no qual, tenho
um imenso carinho e gratidão pela amizade.

Aos meus amigos de universidade (André Ferreira, Carlos Eduardo Verzola,


Eduardo Damiani, Marcelo Mendes, Rodrigo Viviani, João Batista, Geraldo Vinícius,
Diogo Paulo, Fernando Coutinho, Luiz Roberto Lodetti etc...) que conviví durante 5 anos da
minha vida, no qual, proporcionaram-me muitos momentos de alegria.

À Deus por ter colocado todas estas pessoas maravilhosas presentes na minha vida.
“O senhor saiba: eu toda vida pensei por mim, forro, sou
nascido diferente. Eu sou é eu mesmo. Diverjo de todo o
mundo... eu quase que nada sei. Mas desconfio de muita coisa”
Guimarães Rosa
SUMÁRIO

RESUMO........................................................................................................................... viii
LISTA DE ABREVIATURAS.......................................................................................... ix
INTRODUÇÃO................................................................................................................. 01

1. PRINCÍPIOS BÁSICOS DO PROCESSO PENAL..................................................... 03


1.1 NOÇÕES GERAIS........................................................................................................ 03
1.2 SIGNIFICADO DA PALAVRA PRINCÍPIO ................................................................ 04
1.3 FINALIDADE DO PROCESSO PENAL ..................................................................... 04
1.4 PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE ...................................................................... 05
1.5 PRINCÍPIO DA VERDADE REAL ............................................................................. 07
1.6 PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA ....................................................... 10
1.7 PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE ................................................................................. 12
1.8 PRINCÍPIO DO FAVOR REI ....................................................................................... 14
1.9 PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE ..................................................................... 14
1.10 PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO .......................................................................... 16

2. INQUÉRITO POLICIAL ............................................................................................. 20


2.1 CONCEITO .................................................................................................................. 20
2.2 FINALIDADE............................................................................................................... 20
2.3 CARACTERÍSTICAS................................................................................................... 22
2.3.1 Escrito........................................................................................................................ 22
2.3.2 Sistemático................................................................................................................. 23
2.3.3 Sigiloso ...................................................................................................................... 23
2.3.1 Unidirecional.............................................................................................................. 26
2.3.1 Inquisitorial................................................................................................................ 27
2.4 NOTITIA CRIMINIS...................................................................................................... 28
2.5 INÍCIO DO INQUÉRITO POLICIAL ........................................................................... 29
2.5.1 Crime de ação penal pública incondicionada .............................................................. 29
2.5.2 Crime de ação penal pública condicionada ................................................................. 31
2.5.3 Crime de ação penal privada....................................................................................... 33
2.6 INDICIADO MENOR................................................................................................... 35
2.7 PRAZOS DO INQUÉRITO POLICIAL ........................................................................ 37
2.7.1 No caso de indiciado solto.......................................................................................... 37
2.7.2 No caso de indiciado preso......................................................................................... 39
2.7.3 Prazos especiais ......................................................................................................... 40
2.8 ARQUIVAMENTO ...................................................................................................... 41

3. ESTUDO REALIZADO ACERCA DA APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DO


CONTRADITÓRIO NO INQUÉRITO POLICIAL ....................................................... 44
3.1 SISTEMAS DO PROCESSO PENAL........................................................................... 44
3.1.1 Sistema inquisitivo ..................................................................................................... 44
3.1.2 Sistema acusatório...................................................................................................... 46
3.1.3 Sistema misto ............................................................................................................. 48
3.2 INQUÉRITOS EXTRAPOLICIAIS ............................................................................. 50
3.3 PROCESSUALIZAÇÃO DO INQUÉRITO POLICIAL ................................................ 53
3.4 ANÁLISE LITERAL DO ART. 5º, LV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988... 55
3.5 IMPORTÂNCIA DAS PROVAS COLHIDAS NO INQUÉRITO POLICIAL ............... 58
3.6 PARTICIPAÇÃO DO ADVOGADO E CONTRADITORIEDADE NA
INVESTIGAÇÃO CRIMINAL ........................................................................................... 59

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 63


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................. 66
ANEXOS............................................................................................................................ 68
RESUMO

O presente estudo teve como objetivo esclarecer a questão da aplicabilidade do princípio do


contraditório no inquérito policial, trazendo à luz a discussão doutrinária acerca do tema, a
partir das grandes correntes que dissertam a favor da contraditoriedade das partes na
investigação criminal. O método de pesquisa foi o de revisão de literatura, valendo-se da
forma dedutiva para apresentação do estudo, ou seja, partindo-se de um conceito geral para
um específico. A composição desta monografia sublinha uma versão oposta ao entendimento
majoritário acerca do tema, neste sentido, este trabalho monográfico está estruturada em três
capítulos: no primeiro são abordados os princípios básicos do processo penal; no segundo,
trata-se exclusivamente do inquérito policial; e no terceiro, o principal da pesquisa, expõe-se
todos os argumentos favoráveis à adoção do princípio do contraditório no inquérito policial.
Pode-se destacar que, para que se possa admitir o contraditório na fase preliminar, é
necessário que se afaste o caráter inquisitório do inquérito, deixando este de ser mera peça
informativa, com a aplicação desta garantia constitucional, as provas adquirem valor na
instrução, eliminando a obrigatoriedade de corroboração destas na fase judicial. Concluiu-se,
neste estudo, que os preceitos constitucionais devem ser observados, estando acima de
qualquer norma jurídica. Destarte, é essencial garantir o respeito à dignidade da pessoa
humana, distante do que se percebe no inquérito policial, que apresenta um sistema inquisitivo
onde o indiciado é muitas vezes tratado como figura subumana.
LISTA DE ABREVIATURAS

CPP Código de Processo Penal


CP Código Penal
CPC Código de Processo Civil
CF Constituição Federal
CF/88 Constituição Federal de 1988
STF Supremo Tribunal Federal
STJ Superior Tribunal de Justiça
MP Ministério Público
ONU Organização das Nações Unidas
CPI Comissões Parlamentares de Inquérito
OAB Ordem dos Advogados do Brasil
art. artigo
arts. artigos
nº número
Cf. conforme
1 INTRODUÇÃO

2 ESTA PESQUISA FOI DEDICADA A ESCLARECER A


QUESTÃO DA APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO NO
INQUÉRITO POLICIAL, TENDO EM VISTA A DISCUSSÃO DOUTRINÁRIA
ACERCA DO TEMA..

Pretende-se, nesta monografia, apresentar as grandes correntes que dissertam a favor


da contraditoriedade das partes na investigação criminal, valendo-se de que, tal estudo
apresenta-se de forma dedutiva, ou seja, parte-se de um conceito geral para um específico.
Antes da Constituição Federal de 1988, não existia qualquer dispositivo que
abordasse em sua letra a garantia do contraditório para os processos administrativos, porém, a
redação do art. 5º, LV, trouxe que, aos litigantes em processo administrativo será assegurado
o princípio do contraditório, com os meios e recursos a ele inerentes.
A chegada deste texto normativo consagrou o que muitos cientistas do direito já
questionavam, a garantia da contraditoriedade na fase preliminar; no entanto, em decorrência
da má redação deste dispositivo por parte dos legisladores, proporcionando uma discussão
ainda maior acerca do assunto, a questão ainda não é pacífica entre nossos doutrinadores.
A realização deste estudo surgiu, basicamente, à partir de alguns questionamentos,
formulados na seqüência: o legislador ao descrever “processo administrativo” no inciso LV,
do art. 5º da CF/88, quis, também, referir-se a procedimento administrativo? Se a intenção do
legislador foi abranger os imputados em geral, em todos os processos e procedimentos, não
estaria o inquérito policial protegido pela garantia constitucional do contraditório? O art. 5º,
LV, da CF/88, não estaria autorizando expressamente a aplicação do princípio do
contraditório na investigação criminal? Tais questionamentos serão devidamente sanados
durante a explanação do ponto 3, que trata especificamente do tema.
Esta monografia é estruturada em 3 (três) capítulos, da seguinte forma: no primeiro
são abordados os princípios básicos do processo penal; no segundo, trata-se exclusivamente
do inquérito policial; e no terceiro, o principal da pesquisa, expõe-se todos os argumentos
favoráveis à adoção do princípio do contraditório no inquérito policial.
O capítulo que abrange os princípios básicos do processo penal inicia-se com uma
breve noção, conceituando-o e expondo sua finalidade. Menciona-se os mais importantes
princípios referentes ao inquérito policial, quais sejam, o princípio da obrigatoriedade, da
verdade real, da presunção de inocência, da publicidade, do favor rei, da indisponibilidade e,
inclusive, o de maior relevância acerca do tema, o princípio do contraditório.
O inquérito policial foi explanado inteiramente no capítulo 2; é desta forma por
realmente ser de suma importância que o leitor obtenha uma boa noção a seu respeito, pois é
nele que se encontra a discussão doutrinária acerca da aplicabilidade do princípio do
contraditório. Esse capítulo é estruturado da seguinte forma: conceito; finalidade;
características; notitia criminis (notícia do crime); início do inquérito policial, em crime de
ação penal incondicionada, crime de ação penal condicionada, crime de ação privada;
indiciado menor; prazos e arquivamento do inquérito policial.
O terceiro capítulo é, certamente, o mais interessante. Trata do ponto fundamental da
pesquisa: a aplicabilidade do princípio do contraditório na investigação criminal. Neste,
expõe-se todos os argumentos favoráveis para a admissão de tal garantia constitucional. É
composto inicialmente pela abordagem aos sistemas do processo penal, que subdividem-se
em inquisitório, acusatório e misto; seqüencialmente trata-se dos inquéritos extrapoliciais;
processualização do inquérito policial; análise literal do artigo 5º, LV, da Constituição Federal
de 1988; importância das provas colhidas no inquérito policial e, por final, a participação do
advogado e contraditoriedade na investigação criminal.
A estruturação e composição da presente monografia visam, sobretudo, proporcionar
ao leitor a oportunidade de conhecer o lado oposto ao entendimento majoritário acerca do
tema, despertando, assim, o interesse pelo estudo de determinados assuntos que realmente
podem ser de grande importância no interesse da sociedade.

1 PRINCÍPIOS BÁSICOS DO PROCESSO PENAL

3 1.1 NOÇÕES GERAIS

Os princípios funcionam como pilares das normas jurídicas existentes, pode-se dizer
que constituem a base de todo ordenamento jurídico. São eles que estabelecem uma seqüência
ao direito, direcionando as normas num sentido lógico e necessário para suprir as
necessidades existentes na sociedade. Desta forma, expõe Flávio Medeiros, antes mesmo da
Constituição de 1988:
O princípios gerais de direito são regras contidas no ordenamento jurídico.
Informam o direito positivo, inspiram suas disposições e vivificam sua
unidade. São elementos demonstrativos do sentido para onde estão voltadas
as normas de direito. Constituem as bases e a estrutura da construção
jurídica.1

Os princípios são utilizados com extrema importância no preenchimento de espaços,


em assuntos que a lei por alguma falha omitiu, estes espaços são denominados lacunas da lei.
Sobre o assunto, e para asseverar o texto acima transcrito, esclarece José Aquino:

Princípios gerais de direito servem para suprir ou colmatar as lacunas da lei.


Não existe conceito definitivo sobre o que se deve entender por princípios
gerais de direito. Todo conhecimento sistematizado apoia-se sobre alicerces
genéricos, que dão sustento à estrutura sobre eles edificada. Existem, assim,
princípios gerais em cada ramo do direito, invocáveis no momento em que a
solução para o caso concreto se deva orientar nesse determinado sentido.1

O processo penal, assim como outros setores do ordenamento jurídico, são


estabelecidos por uma série de princípios legais, este que como já falado, informa o conteúdo
da norma, tratando de definir também, seu conteúdo material, os poderes jurídicos destinados
aos sujeitos da relação jurídica, e à sua finalidade imediata.2 Estes princípios muitas vezes
estão contidos na lei de forma expressa, mas podem aparecer também de forma implícita.

1.2 SIGNIFICADO DA PALAVRA PRINCÍPIO

Antes de analisar os princípios que regem o nosso Processo Penal, é de suma


importância expor a definição etimológica da palavra princípio.
Aurélio defini como o, “Momento ou local ou trecho em que algo tem origem; (...).
Causa Primária. Elemento predominante na constituição de um corpo orgânico. Preceito,
regra, lei.”3
Da mesma forma em relação ao significado da palavra princípio discorre José
Aquino:

1
MEDEIROS, Flávio Meirelles. Manual do Processo Penal. 1 ed. Rio de Janeiro: AIDE, 1987, p. 168.
1
AQUINO, José Carlos G. Xavier de. Manual de processo penal. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 52.
2
Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa, Processo Penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 37.
3
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1999, p. 1639
Princípio é a palavra que deriva do latino principium, principii, de princeps,
principis, com o significado de o primeiro. É forma sincopada de primiceps,
de primus, adjetivo superlativo de prae ou pro, por meio de pris, advérbio
com o sentido de antes, primeiramente, antigamente, e de capere,
significando captar, tomar, segurar, prender, conceber. Etimologicamente,
princípio seria compreendido como origem, começo, início de qualquer
coisa.4

As normas jurídicas de processo penal tem sua estrutura alicerçada nos princípio
gerais de processo penal, sendo estes o ponto de partida ou o início de uma evolução
dogmática que se desenvolverá cada vez mais de acordo com as necessidades sociais,
perdurando enquanto existir a sociedade.

1.3 FINALIDADE DO PROCESSO PENAL

A finalidade do processo penal pode ser mediata ou indireta, ou imediata ou direta.


A finalidade mediata visa a proteção da paz social e a finalidade imediata é a aplicação da
pretensão punitiva através do Estado, provocada pela prática de uma infração penal. Para
complementar o texto transcrito, versa Mirabete:

A finalidade mediata do processo penal confunde-se com a do Direito Penal,


ou seja, é a proteção da sociedade, a paz social, a defesa dos interesses
jurídicos, a convivência harmônica das pessoas no território da nação. O fim,
direto, mediato, é conseguir, mediante a intervenção do juiz, a realização da
pretensão punitiva do Estado derivada da prática de uma infração penal, em
suma, a realização do direito penal objetivo.5

O processo penal possui um objetivo prático, atual e jurídico, isto porque, visualiza a
apuração da verdade dos fatos, assim, surge o direito de punir em concreto aplicando-se da
devida lei penal para se obter a justiça.

1.4 PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE

4
AQUINO, José Carlos G. Xavier de. Manual de processo penal. p. 53.
5
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 15. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 40/41.
Tal garantia, também chamada de princípio da legalidade, tem como base o interesse
da coletividade na atuação do direito penal.
Na relação jurídica de direito penal presume-se, como contempla Medeiros, que todo
cidadão ocupa a posição de sujeito ativo perante o Estado, sendo inocente e detentor do
direito de liberdade. No entanto, havendo indícios de que determinada pessoa tenha praticado
um fato típico, antijurídico e culpável, estabelece-se a dúvida no que concerne à posição que
ela mantém com o Estado. O aclaramento dessa dúvida é de interesse público, tendo o Estado
o dever de esclarecê-la.6
A punição pela ocorrência de uma infração penal é praticamente indispensável,
sendo o Estado obrigado a promover o jus puniendi, sem que se conceda aos órgãos
incumbidos da persecução penal faculdades discricionárias para apreciar a conveniência da
instauração do processo ou do inquérito.
Assim, havendo indícios suficientes da prática e da autoria do crime, o órgão do
Ministério Público, em se tratando de crime de ação penal pública, é obrigado a apresentar a
respectiva denúncia. Consorte, o princípio também é aplicado nas investigações preliminares,
que verificando a existência de um fato aparentemente delituoso tem a autoridade policial o
dever jurídico de instaurar o inquérito.
Interessante elucidar o entendimento de José Aquino acerca da obrigatoriedade:

É a exteriorização do princípio da oficialidade, segundo a qual, tanto a polícia


judicial como o Ministério Público titularizam o dever de exercer a ação penal
pública de acordo com a lei. Não podendo inspirar-se em critérios políticos de
conveniência, oportunidade ou utilidade social.7

Logo, tanto o MP quanto a autoridade policial não podem transigir com o


cumprimento da lei, na apuração e investigação do fato delituoso (arts. 5° e 6° do CPP) e na
promoção da ação penal pública proveniente dele, independente de provocação.
No entanto, se as informações disponíveis não forem suficientes, o MP não
promoverá a ação penal, pois se o fizesse caracterizaria abuso de poder, já que colocaria o
cidadão, levemente suspeito, a mercê da inconveniência de se tornar réu de processo criminal.
Pelo mesmo motivo, em consonância com o elencado no art. 28 do CPP,
considerando improcedentes as razões invocadas, o órgão do MP, ao invés de apresentar a
denúncia, requererá o arquivamento do inquérito policial ou de outra peça informativa,
motivando a razão pela qual não está iniciando o processo.
Esse mesmo dispositivo legal posiciona o juiz como fiscal do princípio da
obrigatoriedade, pois poderá rejeitar as razões invocadas pelo promotor de justiça, devendo
remeter os autos ao procurador geral. Se este ratificar o arquivamento, o juiz estará obrigado a
atender a manifestação.
O princípio da legalidade não é absoluto no processo penal, configurando como
exceção a ele os crimes de ação penal pública condicionada à representação ou requisição e de
ação penal privada, que ocorrem sob o crivo da oportunidade, “segundo o qual o Estado
confere ao titular da ação penal dada parcela de discricionariedade para instaurar ou não o
processo penal, conforme suas conveniências e oportunidades”.8
Nesse sentido, interessante destacar o dito de Mirabete:

Tal princípio (o da obrigatoriedade), o mais difundido nas legislações


modernas, contrapõe-se ao princípio da oportunidade, em que o órgão estatal

6
MEDEIROS, Flávio Meirelles. Manual do Processo Penal. p. 176.
7
AQUINO, José Carlos G. Xavier de. Manual de processo penal. p. 65.
8
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 27.
tem a faculdade de promover ou não a ação penal, uma discricionariedade da
utilidade tendo em vista o interesse público. Funda-se este na regra minima
non curat praetor, ou seja, o Estado não deve cuidar de coisas insignificantes,
podendo deixar de promover o jus puniendi quando verificar que do exercício
da ação penal podem advir maiores inconvenientes que vantagens.9

De fato, é categórico o art. 24 do CPP, que assim dispõe: “nos crimes de ação
pública, esta será promovida por denúncia do Ministério Público, mas dependerá, quando a lei
o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou de representação do ofendido ou de quem
tiver qualidade para representá-lo”.
Neste compêndio, o exercício da ação penal fica sujeito ao ato de vontade de
particulares ou do Ministro da Justiça.
A Constituição Federal de 1988, conforme o art. 98, I, além de conferir
independência funcional ao MP, permitiu a instituição do procedimento sumaríssimo com a
criação dos juizados especiais para a apuração dos crimes de menor potencial ofensivo,
consentindo a transação penal.
Tal regra foi positivada com o advento da Lei 9.099/95 e conforme José de Aquino,
reduziu o campo de atuação do princípio aqui ponderado, pois permitiu a composição civil do
dano (art. 74) como causa de exclusão do processo; estabeleceu as hipóteses de aplicação
imediata de pena não privativa de liberdade, mediante transação penal ofertada pelo
Ministério Público (art. 76); e regulamentou o instituto da suspensão condicional do processo,
também derivada de proposta do MP, na forma do art. 89 da referida lei.(José Aquino)10

1.5 PRINCÍPIO DA VERDADE REAL

Este axioma jurídico é considerado como alvo primordial do processo penal, que
visa alcançar a satisfação da pretensão.
Preleciona, com êxito, Rangel, acerca do escopo de tal princípio:

Descobrir a verdade real (ou material) é colher elementos probatórios


necessários e lícitos para se comprovar, com certeza absoluta (dentro dos
autos), quem realmente enfrentou o comando normativo penal e a maneira
pela qual o fez. O caráter instrumental do processo demonstra que ele (o
processo) é meio para se aplicar o direito objetivo (a norma penal
incriminadora).11

Extrai-se da assertiva acima, que o principio da verdade real obriga à busca do


verdadeiro autor da infração, à exata delimitação da culpabilidade do agente e à punição desse
pelo fato praticado, como praticado.
Cristalizando o exposto, discorre Mirabete:

Com o princípio da verdade real se procura estabelecer que o jus puniendi


somente seja exercido contra aquele que praticou a infração penal e nos

9
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 47.
10
Cf. AQUINO, José Carlos G. Xavier de. Manual de processo penal. p. 66.
11
RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. p. 05.
exatos limites de sua culpa numa investigação que não encontra limites na
forma ou na iniciativa das partes.12

Destarte, a descoberta da verdade real caracteriza-se pela busca elementos de provas,


necessárias e lícitas, para se detectar, com nitidez incondicional, quem infringiu a norma e a
maneira pela qual o fez.
Analisando ainda o brocardo ora discorrido, existe uma discussão doutrinária acerca
da aplicabilidade do princípio da verdade formal (ou ficta) no processo civil e da verdade real
no processo penal.
Primeiramente, faz-se necessário esclarecer, em consonância com o entendimento de
Rangel, que a jurisdição, como função soberana do Estado, caracteriza-se por sua unidade,
não se admitindo que uma aplique a verdade real e outra, a ficta.13
Com bastante acerto, ponderara Manzini “que a declaração de certeza da verdade
real, em princípio, é, sem dúvida, de todo ordenamento processual, seja penal, civil, etc.”14
É essencial que se identifique a natureza do direito demandado.
Teoricamente, no civil, o litígio versa sobre direito disponível, onde as partes
transigem livremente sobre seus interesses, dispensando a busca da verdade real e dando ao
magistrado apenas o direito – e não obrigação – de investigá-la no Processo Civil, sem, com
isso, acarretar dano à relação jurídica.
O disposto no art. 130 do CPC cristaliza tal assertiva: “caberá ao juiz, de ofício ou a
requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo
as diligências inúteis ou meramente protelatórias”.
Verifica-se, desse modo, que o juiz cível não é um sujeito inerte na relação
processual.
Todavia, segundo Flávio Medeiros, se houver interesse público na lide a ser
decidida, o juiz cível não pode se satisfazer com a verdade advinda das partes. Neste caso,
existe o comprometimento judicial de investigar.15
Adequado discorrer, que as hipóteses, no processo cível, em que existe interesse
público, são aquelas onde há interesse de incapazes, referentes ao estado da pessoa, tutela,
curatela, pátrio poder, interdição, casamento, declaração de ausência, entre outras.16
Tratando-se do processo penal, a lide versa, sempre, sobre direito indisponível: a
liberdade de locomoção; raramente, o magistrado penal indispõe de formas para garantir a
verdade material, conformando-se com a verdade ficta.
No processo penal, vigora o princípio da verdade real, pois “há sempre interesse
público na justa solução dos litígios penais. Mesmo nos processos que tem por objeto a
decisão acerca de um crime de ação privada, está presente o interesse público, e deve o juiz
investigar a verdade”.17
O Código de Processo Penal Brasileiro explicita o princípio da verdade real em
diversos dispositivos - tais como os arts. 156, 196, 197, 209, 234, 502, caput e parágrafo
único, e 616 - apontando a necessidade de o juiz tomar certas providências, com intuito de
descobrir a veracidade dos acontecimentos.
A consagração do axioma jurídico torna-se evidente quando o CPP dá ao juiz a
capacidade de determinar, de ofício, diligências para esclarecer dúvida sobre ponto relevante
ou para sanar qualquer nulidade; quando autoriza o juiz a ouvir outras testemunhas além das

12
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 45.
13
Cf. RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. p. 09.
14
MANZINI, Apud. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. p. 41.
15
Cf. MEDEIROS, Flávio Meirelles. Manual do Processo Penal. p. 181.
16
Cf. MEDEIROS, Flávio Meirelles. Manual do Processo Penal. p. 182.
17
Cf. MEDEIROS, Flávio Meirelles. Manual do Processo Penal. p. 182.
indicadas pelas partes; possibilidade de o juiz, tribunal, câmara ou turma proceder a novo
interrogatório do acusado ou reinquirir testemunhas; e determinar, ex officio, a juntada aos
autos de documento essencial. De tal modo, a confissão do acusado passa a ter valor relativo,
sendo vista como prova comum e devendo ser confrontada com os demais elementos
probatórios do processo.
Considerando que a satisfação da pretensão - objetivo do processo - deve ser obtida
por meio da verdade judiciária, mas dentro de um devido processo legal determinado pelo
ordenamento jurídico, faz-se necessário esclarecer, de acordo com Rangel, que “não obstante
chamarmos de verdade real, nem sempre ela condiz com a realidade fática ocorrida. O sistema
do livre convencimento impõe-nos uma conduta: vale o que está nos autos do processo”. 18
A Carta Magna, ao priorizar o respeito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e
proibindo em nosso sistema as provas obtidas por meios ilícitos (art. 5º, LVI), limita a busca
da verdade real. O próprio Processo Penal, com as causas de extinção da punibilidade, limita,
também, a descoberta da mesma, ao proibir que, mesmo surgindo novas e concludentes
provas que versem sobre o agente, uma absolvição seja rescindida após o trânsito em julgado;
outro fator limitante é a permissão de transação com o perdão do ofendido nas ações penais
privadas; a perempção provocada por omissão ou inércia do querelante.
O princípio em tela, ainda, comporta outras restrições, como a impossibilidade de
juntada de documentos durante o prazo para alegações do Ministério Público e do defensor do
réu no procedimento dos crimes de competência do Tribunal do Júri (art. 406, § 2º do CPP); a
impossibilidade de exibir prova, que não tenha sido comunicada à parte contrária com
antecedência mínima de três dias, no plenário do júri (art. 475 do CPP); a recusa de depor de
parentes do acusado, ou os limites para depor de pessoa que, em razão da função, oficio ou
profissão, devam guardar segredo (arts. 206 e 207 do CPP).19
Entende-se, portanto, que o princípio da verdade real impõe ao julgador e às partes
que se empenhem para desvendar os fatos conforme se sucederam, a fim de permitir a justa
resposta estatal, embora essa busca se faça cercada pela limitação e falibilidade do homem.

1.6 PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

Em decorrência do princípio do devido processo legal, inseriu-se na legislação e


doutrina a garantia da presunção de inocência, também designada “estado” de inocência.
Tal brocardo foi acolhido na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão e,
posteriormente, reiterado pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, da ONU,
enunciando que todo homem se presume inocente até que tenha sido declarado culpado.
Interessante salientar algumas considerações acerca dessa denominação.
As presunções jurídicas, segundo Flávio Medeiros, tratam-se da “ilação que se tira
de fato conhecido para se aceitar verdadeiro outro fato desconhecido”. 20 Divide-se em dois
tipos: absolutas juris et jure - que são constituídas legalmente, não admitindo prova em
contrário e relativas juris tantum - também estabelecidas em lei, não são desfeitas até que
surjam provas adversas, como é o caso do princípio aqui discorrido.
Subtrai-se do art. 5º, LVII, que o acusado é inocente até que seja declarado culpado
por uma sentença penal transitada em julgado.

18
RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. p. 05.
19
Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 27.
20
MEDEIROS, Flávio Meirelles. Manual do Processo Penal. p. 234.
Nesse sentido, entende Mirabete, que o ideal é referir-se como o princípio da não-
culpabilidade, pois o acusado é inocente durante o curso do processo e “seu es tado só se
modifica por uma sentença final que o declare culpado”. 21
A presunção de inocência apresenta-se em três momentos do processo: a) na
instrução, como presunção legal juris tantum de não culpabilidade, invertendo-se o ônus da
prova, pois o réu não precisa provar sua inocência, e sim o Ministério Público tem que provar
que ele é culpado; b) na avaliação dos elementos probatórios, pois o juiz só pode condenar o
acusado quando convicto de que ele realmente praticou o delito e havendo dúvida, as provas
serão valoradas em favor do acusado (in dubio pro reo); c) no desenvolvimento da ação, ao
avaliar a necessidade da prisão processual.22
Analisando densamente o item “c” e o conteúdo dos art. 594, 393, I, 408, § 1º, todos
do CPP; art. 35 da Lei nº 6.368/76 (Lei de Tóxicos) e o § 2º do art. 2º da Lei nº 8.072/90 (Lei
dos Crimes Hediondos) – dispositivos legais, entre outros, que permitem a prisão provisória
decorrente de sentença condenatória recorrível (em face de não ter bons antecedentes e não
ser primário), de flagrante, pronúncia, e decreto de custódia preventiva – verifica-se que,
sendo o réu presumidamente inocente, sua prisão só será aceita como cautela.
A Constituição Federal estabelece que ninguém será preso senão em flagrante delito
ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente (art. 5º, LXI); nesta
linha, pondera-se que todas as decisões dos órgãos do Poder Judiciário devem ser
fundamentadas (art. 93, IX da CF). Assim, resta amparada a prisão cautelar e em nada fere o
princípio da presunção de inocência.23
Corroborando esta assertiva, o Supremo Tribunal de Justiça, já pacificou o assunto
com o advento da Súmula 9, que assim dispõe: “A exigência da prisão provisória, para apelar,
não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência”.
Destarte, quando ao acusado é aplicada uma condenação, presume-se sua culpa e
não sua inocência. E aquela pode ser desfeita com recurso defensivo do condenado, provido
pelo tribunal.

1.7 PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE

No direito pátrio vigora, teoricamente, o princípio da publicidade dos atos


processuais, que é próprio do processo acusatório.
Há que se apontar, no entanto, que a doutrina apresenta este princípio em duas
formas: a publicidade absoluta (geral, popular, plena) e a publicidade restrita (para as partes,
especial).
Na primeira hipótese, como regra do Processo Penal, conforme disposto em seu art.
792, as audiências, as sessões e a realização de outros atos processuais são abertas ao público
em geral. Convém elucidar que essa publicidade pode se dar de forma imediata, onde os atos
processuais estão ao alcance de todos e de modo mediato, quando os atos do processo se
tornam públicos através de certidão.
Oportuno destacar o posicionamento de Mirabete: “A regra geral da publicidade dos
atos processuais está em correspondência com os interesses da comunidade, sendo
considerada um freio contra a fraude, a corrupção, a compaixão e as indulgências fáceis”. 24

21
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 43.
22
Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 39.
23
Cf. RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. p. 24.
24
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 46.
Já na segunda forma - tratando-se da exceção trazida no parágrafo primeiro do
referido artigo - o juiz, tribunal, câmara ou turma determinará que o ato seja realizado a portas
fechadas, limitando o número de pessoas que possam presenciá-lo, se dele puder resultar
escândalo, inconveniente grave ou perigo de perturbação da ordem.
É evidente que a publicidade plena dos atos processuais pode trazer alguns
inconvenientes, como o desprestígio do réu ou da vítima, comoção social ou sensacionalismo
sobre o caso. Desse modo, o decoro ou no interesse social aconselham que eles não sejam
divulgados.
Nesse sentido, a Constituição Federal permite ao legislador restringir a publicidade
dos atos processuais para a defesa da intimidade ou do interesse social, consoante o disposto
nos arts. 5º, LX e 93, IX .
Destarte, são legítimas as restrições previstas no Código de Processo Penal, dentre
tantas, em se tratando de processo da competência do Tribunal do Júri, no que tange ao sigilo
na votação dos jurados (arts. 476, 481 e 486, todos do CPP); na retirada do réu da audiência se
o juiz verificar que a sua presença poderá prejudicar o depoimento de uma testemunha (art.
217 do CPP).
No caso do inquérito policial, a Lei nº 8.906/94 (Estatuto da OAB), em seu art. 7º,
XIV, estabelece como direito do advogado o exame em qualquer repartição policial, mesmo
sem procuração, dos autos de flagrante e de inquérito, findos ou em andamento, ainda que
conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos.
Brilhante a elucidação de Medeiros ao considerar que durante a investigação
criminal a publicidade fica a critério da autoridade policial, sendo que:

Cumpre a ela assegurar o sigilo que se demonstra necessário para a elucidação


do fato e da autoria, mas este sigilo, em nenhuma hipótese, pode ser ampliado
para dificultar o acesso do advogado aos autos do inquérito ou à comunicação
pessoal e reservada com seu cliente, mesmo que este esteja preso
incomunicável em estabelecimento civil ou militar.25

Ante o exposto, há que aplicar o princípio de acordo com a natureza do ato


praticado, para assegurar sua eficácia plena.

1.8 PRINCÍPIO DO FAVOR REI

O princípio do favor rei, ao passar dos tempos ganhou grande espaço no


ordenamento jurídico, pois, não existe Estado livre e democrático de direito que não possua
este dogma constitucional como estrutura jurídica básica.
Ocorrendo duas ou mais interpretações antagônicas de uma norma legal, deve o
Estado optar pela àquela que favoreça o réu, ou seja, havendo o conflito de interesses entre o
jus puniendi do Estado e o jus libertatis do acusado, a lei direcionar-se-á sempre em favor
rei.26

25
MEDEIROS, Flávio Meirelles. Manual do Processo Penal. p. 222.
26
Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa, Processo Penal. p. 69.
Paulo Rangel corrobora acerca do assunto, dispondo que:

O princípio do favor rei é a expressão máxima dentro de um Estado


Constitucionalmente Democrático, pois o operador de direito, deparando-se
com uma norma que traga interpretações antagônicas, deve optar pela que
atenda ao jus libertatis do acusado.27

O favor rei está implícito em alguns artigos do nosso processo penal, são eles o art.
386, VI; art. 615, § 1º; art. 617; art. 607; e o art. 621.
No art. 386, VI do CPP, o juiz não poderá condenar o réu se as provas forem
insuficientes para a sua condenação; o art. 615, § 1º, dispõe que no caso de empate de votos
no julgamento de recursos, prevalecerá a decisão mais favorável ao réu; no art. 617, ocorre a
proibição do reformatio in pejus, ou seja, a sentença não poderá ser reformada para prejudicar
o réu; o art. 607, que fornece exclusivamente a defesa o recurso de protesto por novo júri,
assim como no art. 621, que permite somente a defesa a utilização da revisão criminal.

1.9 PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE

Na esfera civil predomina o princípio da disponibilidade, pois as pessoas são livres


para exercer ou não o seu direito, diferentemente do que ocorre no processo penal, pois este é
na sua grande maioria indisponível por se tratar de fatos que interferem na ordem e paz da
sociedade, ficando então a carga punitiva nas mãos do Estado.
Muito antes já dizia Flávio Medeiros sobre o assunto:

O processo penal é indisponível por razão indireta, sua indisponibilidade é


reflexa da de seu objeto. Há interesse público na determinação da real
relação jurídica de direito penal que vincula o Estado ao cidadão, e daí
decorre que as partes no processo não têm disposição sobre aquela
relação.28

O princípio em questão, além de compor nosso processo penal, também vigora na


fase de inquérito policial.
Na fase de inquérito este princípio encontra-se positivado primeiramente no art. 10
do CPP, que estabelece prazo para o término da investigação, em seguida no art. 17 do CPP,
dispondo que a autoridade policial não poderá arquivar autos de inquérito. Ocorrendo o
requerimento para arquivamento dos autos de inquérito por parte do órgão ministerial não está
obrigado o juiz a aceitar o pedido, este como fiscal do princípio da indisponibilidade remeterá
os autos ao Chefe do Ministério Público para que se manifeste, assim estabelece o art. 28 do
CPP.29
Acerca do tema escreve José Malcher:

Tal princípio se estende à fase procedimental de documentação


administrativa pela Polícia Judiciária: instaurado Inquérito Policial ou
lavrado Auto de Prisão em Flagrante, não pode a autoridade policial

27
RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 32.
28
MEDEIROS, Flávio Meirelles. Manual do Processo Penal. p. 179.
29
Cf. MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 48.
arquivar os respectivos autos, tendo o dever de submetê-los ao controle do
Poder Judiciário.30

Da mesma forma, o Ministério Público regulado por tal princípio, não poderá deixar
de instaurar ação penal pública, conforme previsto no art. 42 do CPP, nem tampouco desistir
de recurso que tenha interposto, este no art. 576 do mesmo diploma legal.
Pela presença deste princípio, conforme disposto no art. 385 do CPP, o juiz poderá
condenar o réu mesmo se o Ministério Público tiver requerido a absolvição do mesmo.
Observa-se através deste, que o magistrado não é vinculado ao órgão oficial da acusação.31
Quando acima falado que o processo penal na sua grande maioria é indisponível,
entende-se implicitamente que existe exceção. Essa exceção se dá na ação penal privada e na
ação penal pública condicionada à representação.
A ação penal privada não está sob a égide deste princípio pelo fato da pretensão
punitiva do Estado estar disponível ao interesse da parte ofendida, pois esta poderá dispor do
processo, pelo perdão, desistência, perempção ou renúncia.32
No caso da ação penal pública condicionada à representação, a parte ofendida
poderá dispor do processo através da retratação da representação. Para melhor esclarecer o
assunto transcrevo as palavras de José Malcher:

Nos crimes de ação penal pública condicionada a representação do


ofendido, também há disponibilidade, mas relativa. Como se verifica do
preceito do art. 25 do C. Processo Penal, o ofendido pode dispor do
processo, mediante retratação da representação: oferecida a denúncia,
entretanto, a ação penal se torna irretratável.33

Para complementar os dizeres de Malcher, acerca da disponibilidade do processo por


retratação à representação, expõe Tourinho Filho, especificando o modo como se dá tal
matéria de direito disponível:

Quanto aos crimes de ação penal pública condicionada à representação, tal


poder dispositivo somente será possível se a ofendida casar-se com o
agente, quando, então, se extinguirá a punibilidade, ou se a ofendida casar-
se com terceiro e “se ela não requerer o prosseguimento do inquérito
policial ou da ação penal no prazo de 60 (sessenta) dias a contar da
celebração”(...). 34

Após o estudo praticado neste tópico, ainda, vale dizer, que a recente criação dos
juizados especiais criminais através da Lei 9.099/95, para dirimir delitos de pequeno potencial
ofensivo, afasta também o princípio da indisponibilidade, pois, restando exitosa a transação
penal realizada pelo Parket, não haverá a instrução criminal.

1.10 PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO

30
MALCHER, José Lisboa da Gama. Manual de Processo Penal. 2. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1999, p.
60.
31
Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa, Processo Penal. p. 45.
32
Cf. MALCHER, José Lisboa da Gama. Manual de Processo Penal. p. 60.
33
MALCHER, José Lisboa da Gama. Manual de Processo Penal. p. 60/61.
34
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa, Processo Penal. p. 46.
O princípio do contraditório é com certeza um dos mais importantes, se não o mais,
do Processo Penal, este possui sua principal previsão no art. 5º, LV da nossa Magna Carta.
Muitos doutrinadores o consideram de grande importância por ser ele inerente a outros
indispensáveis princípios, quais sejam, o princípio da igualdade ou isonomia das partes e o
princípio do devido processo legal, o due process of law, sendo que este comporta todas as
garantias processuais.
É interessante expor que, José Aquino considera o princípio do contraditório como
sendo o mesmo da ampla defesa e inviolabilidade da defesa, estando preceituados no art. 5°,
LV da Lei Fundamental.35 Portanto, entende-se que a ampla defesa está contida no dogma
constitucional da contrariedade.
O art. 5º, LV, da Constituição Federal de 1988, dispõe que, “Aos litigantes, em
processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e
ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.”
Segundo a primeira parte de tal preceito constitucional, entende-se por assegurado o
contraditório no inquérito policial, por ser este uma peça administrativa onde de fato existe o
litígio, ou seja, interesses distintos entre partes distintas, para tanto, deve-se aplicar este
princípio, pois, conforme a constituição, as partes devem estar no mesmo plano de igualdade.
Acerca do assunto J. Canuto de Almeida diz que:

A verdade atingida pela justiça pública não pode e não deve valer em juízo
sem que haja oportunidade de defesa ao indiciado. É preciso que seja o
julgamento precedido de atos inequívocos de comunicação ao réu: de que
vai ser acusado; dos termos precisos dessa acusação; e de seus fundamentos
de fato (provas) e de direito. Necessário também que essa contrariedade seja
feita a tempo de possibilitar a contrariedade: nisso está o prazo para
conhecimento exato dos fundamentos probatórios e legais da imputação e
para a oposição da contrariedade e seus fundamentos de fato (prova) e de
direito.36

Pode-se dizer contraditório pelo fato de fornecer ao indiciado ou acusado o direito


de rebater toda e qualquer alegação feita contra sua pessoa, a parte contrária deve sempre ser
ouvida, decorre do brocardo romano audiatur et altera pars. Este visa manter as partes
conflitantes no mesmo plano de igualdade, se é dado um direito a um deve ser dado ao outro
também, jamais deve uma parte ser beneficiada ou prejudicada. Ocorrendo o inverso estaria o
princípio em testilha sendo inconstitucionalmente violado.
Tourinho Filho, a respeito do princípio do contraditório, escreve que:

(...) de acordo com tal princípio, a defesa não pode sofrer restrições, mesmo
porque o princípio supõe completa igualdade entre acusação e defesa. Uma
e outra estão situadas no mesmo plano, em igualdade de condições, e, acima
delas, o Órgão Jurisdicional, como órgão “superpartes”, para, afinal, depois
de ouvir as alegações das partes, depois de apreciar as provas, “dar a cada
um o que é seu”. 37

Tal princípio é característica principal do sistema acusatório, este que é adotado em


nosso ordenamento jurídico.

35
Cf. AQUINO, José Carlos G. Xavier de. Manual de processo penal. p. 61.
36
ALMEIDA, Apud. MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 44.
37
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa, Processo Penal. p. 49.
O defensor técnico é indispensável a defesa para a realização de um processo
contraditório, posto que a acusação é sempre técnica, é desta forma estipulado para garantir a
igualdade entre as partes. Se fosse permitido ao acusado defender-se por si só, não tendo este
qualquer conhecimento jurídico estaria ocorrendo um desequilíbrio, restando a defesa
prejudicada. Observa-se perfeitamente a garantia constitucional em questão, nos dispostos dos
arts. 261 e 263, ambos do Código de Processo Penal.
Sobre o assunto José Marques descreve:

Como o essencial ao audiatur et altera pars consiste em que “as partes


sejam postas em condição de se contrariarem”, são ainda inerentes ao
contraditório: 1) a obrigatoriedade de um defensor técnico ao acusado
(Código de Processo Penal, artigo 261), pois de outra forma se quebraria o
equilíbrio entre as partes, visto que técnico é sempre o órgão da acusação;
2) o direito de ambas as partes produzirem, em igualdade de condições, as
provas relativas a suas pretensões.38

O princípio do contraditório está consagrado na Constituição Federal, portanto


qualquer dispositivo de lei que o contrarie deve ser considerado inconstitucional.
Um exemplo grosseiro de violabilidade deste princípio constitucional é o art. 501 do
CPP, que dispõe: “Os prazos a que se referem os artigos 499 e 500 correrão em cartório,
independentemente de intimação das partes, salvo em relação ao Ministério Público”.
Este dispositivo fere a Constituição, pois determina a intimação pessoal apenas da
acusação, acerca do prazo para requerimento de diligências e alegações finais, enquanto a
defesa precisa possuir o dom de prever o dia em que o prazo foi aberto.39
Nesta situação ficou demonstrada a clareza da desigualdade existente entre a
acusação e a defesa, no momento em que o dispositivo permitiu a intimação apenas da
acusação ocorreu um desequilíbrio na relação jurídica, pois se foi atribuída ao Ministério
Público, deve ser também atribuída ao réu, devendo sempre as partes estar no mesmo plano de
direitos.

38
MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. v. 1. São Paulo: Bookseller, 1997, p. 90.
39
Cf. MEDEIROS, Flávio Meirelles. Manual do Processo Penal. p. 198.
2 INQUÉRITO POLICIAL

2.1 CONCEITO

A legislação brasileira passou a contar com o inquérito policial através da Lei nº


2.033 regulamentada por meio do decreto nº 4.824 de 1871, que a partir de então passou a
utilizar-se do feito com o nome que ainda hoje mantém.
Para entender o que é inquérito policial é necessário expor alguns conceitos:
Capez o conceitua como, “(...) o conjunto de diligências realizadas pela polícia
judiciária para a apuração de uma infração penal e de sua autoria, a fim de que o titular da
ação penal possa ingressar em juízo (CPP, art. 4º).”40
Mirabete de forma mais completa explica:

inquérito policial é todo procedimento policial destinado a reunir os


elementos necessários a apuração da prática de uma infração penal e de sua
autoria. Trata-se de uma instrução provisória, preparatória, informativa, em
que se colhem elementos por vezes difíceis de obter na instrução judiciária,
como auto de flagrante, exames periciais etc.41

Portanto, com o conceito estabelecido por estes doutrinadores pode-se dizer que, o
inquérito policial é um procedimento administrativo investigatório, presidido por uma
autoridade policial que objetiva esclarecer o delito e a autoria do mesmo, e embasar a
formação da opinio delicti do órgão acusador.

2.2 FINALIDADE

40
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 70.
41
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2001, p. 76.
O inquérito policial tem como finalidade apurar a existência de uma infração penal e
os indícios suficientes de sua autoria, para que o titular da mesma, quais sejam, o Ministério
Público em ação penal pública e a vítima ou seu representante legal em ação penal privada,
possam obter elementos necessários para promover a respectiva denúncia ou queixa, peças
fundamentais a inicialização da instrução criminal.
Paulo Franco, descreve sobre a finalidade da investigação criminal:

Através do inquérito policial a autoridade apura a infração penal e a sua


autoria e informa ao juiz sobre o que foi apurado. Fornece ao magistrado
todas as informações necessárias, que deverão estar contidas no relatório.
Através dessas informações é que o Ministério Público irá oferecer a
denúncia ou requerer o arquivamento dos autos, ao Juiz, se os elementos
neles contidos não possibilitarem o oferecimento da denúncia.42

Para cumprir as devidas finalidades, materialidade do delito e indícios de autoria, a


polícia judiciária desenvolve uma série de atos. São estes atos: exames de corpo de delito,
declaração da vítima, a ouvida de testemunhas, análise do instrumento do crime, realização de
buscas e apreensões, reconhecimento de envolvidos no fato, interrogatório do indiciado e
realização de acareações. É feito tudo que possível, com observância na lei, para o desenrolar
de uma futura ação penal.
O art. 41 do CPP, exige que na denúncia ou queixa deva conter a exposição do fato
criminoso, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a
classificação do crime, e ainda, se possível, o rol de testemunhas.
Caso não se reconheça a autoria ou a materialidade do delito, inexiste requisitos
essenciais para o oferecimento da inicial acusatória, devendo o juiz declarar a inépcia da
denúncia ou queixa.
A finalidade do inquérito pode ser classificada como mediata e imediata. A mediata
seria o fim futuro, o de fornecer subsídios para o órgão acusador promover a ação, já a
imediata consiste na apuração dos indícios de autoria e materialidade do delito durante as
investigações policiais.43
Verifica-se, que a finalidade do inquérito policial não consiste em só averiguar um
ato criminoso, também tem como finalidade verificar se o autor do ato agiu protegido de
alguma excludente de antijuridicidade ou excludente de culpabilidade, sendo estas,
posteriormente averiguadas para a correta confirmação, ou não.44

42
FRANCO, Paulo Alves. Inquérito Policial. São Paulo: Sugestões Literárias, 1992, p. 14.
43
Cf. MEDEIROS, Flávio Meirelles. Do Inquérito Policial. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1994, p. 23.
44
Cf. MEDEIROS, Flávio Meirelles. Do Inquérito Policial. p. 24.
É importante que o inquérito seja realizado com total atenção, no intuito de ser
analisado todas as possibilidades possíveis do acontecido, isto porque, não faz sentido remeter
um inquérito parcialmente concluído para que este em fase processual seja arquivado pela
ausência de provas.

2.3 CARACTERÍSTICAS

O inquérito policial, por carregar consigo tais finalidades expostas acima, adquire
características próprias tornando-se uma matéria singular e diferenciada no processo penal
brasileiro. Portanto, o inquérito deve ser escrito, sistemático, sigiloso, unidirecional e
inquisitorial.

2.3.1 Escrito

Tal característica atribui a formalidade do Inquérito Policial, sendo que as peças do


inquérito deverão ser reduzidas a termo, conforme preceitua o artigo 9º do Código de
Processo Penal, “todas as peças do inquéri to policial serão, num só processado, reduzidas a
escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade.”
A existência deste dispositivo se faz útil e notoriamente importante ao observarmos
a finalidade do inquérito de auxiliar o titular da ação, fornecendo informações adquiridas
através de investigações, ou seja, o titular da ação precisa receber o inquérito documentado
para com base neste tomar as providências que forem necessárias, como por exemplo, o
oferecimento da denúncia pelo representante do Ministério Público. Portanto não há como
proceder um inquérito da forma oral.
Ainda denota-se a importância da formalidade, tendo em vista que a autoridade
policial, o Delegado de Polícia, dever estar ciente de todos os atos ou investigações realizados
por seus agentes, afim de impedir qualquer prática comum e ilegal, sendo uma delas a
lavratura do auto de prisão em flagrante pelo escrivão de polícia, restando ao Delegado a
única função de assiná-lo.45

2.3.2 Sistemático

45
Cf. RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 85.
O nome já nos dá uma noção do que se trata
esta característica. É sistemático no sentido de obedecer
uma seqüência, um ato não pode anteceder o outro, há
uma conexão entre eles.
Rangel em sua obra:

Assim todas as peças devem ser colocadas em uma seqüência lógica, para
que possamos entender a ordem cronológica em que os fatos se deram, pois
o inquérito é um livro que conta uma história, história esta que tem início,
meio e fim.46

Entende-se ser desta forma para que, quem estiver manuseando a peça possa
facilmente entende-la, assim prevenindo à ocorrência de qualquer erro, sendo um deles o erro
de interpretação.
Não havendo a ordem sistemática o inquérito fica facilmente vulnerável a qualquer
tipo de vício, assim podendo atingir ou ferir o direito da vítima ou mesmo do acusado.

2.3.3 Sigiloso

A autoridade policial possui o poder discricionário acerca do sigilo no inquérito,


podendo decretá-lo conforme achar oportuno e conveniente. Sempre que achar necessário
poderá decretar tal ato, desde que, justifique nos autos de inquérito. Já dizia Mehmeri, “se à
autoridade policial é dada a faculdade de decidir sobre essa necessidade ou exigência, não se
lhe concede, por outro lado, o arbítrio de decidi-la sem justificar”. 47
O inquérito policial possui esta característica, por ser ela uma boa aliada da polícia
judiciária para a realização de diligências imprescindíveis a elucidação dos fatos, afastando
qualquer obstáculo que possa ser prejudicial a conclusão do inquérito.
O sigilo está preceituado no artigo 20 do Código de Processo Penal, dispondo que:
“A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo
interesse da sociedade”.
Délio Magalhães sobre o assunto cita em sua obra:

O processo do inquérito policial deve ser relativamente secreto, para que a


autoridade policial tenha a máxima liberdade para agir no desempenho das

46
RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. p. 85/86.
47
MEHMERI Adilson, Inquérito policial: dinâmica. São Paulo: Saraiva, 1992, p.18.
suas funções, o mais completo possível, e não veja a sua ação burlada pela
publicidade e tolhida pela intervenção de estranhos.48

Corroborando o entendimento, ilustra Paulo Franco:

Normalmente, nos casos em que esteja envolvida vítima de estupro, nos


crimes contra a honra e mesmo nos delitos relacionados com tóxicos, os
devem ser apurados com sigilo, e, para que o fato não seja ventilado e
explorado publicamente, para assegurar o sigilo, a autoridade deve decretá-
lo nos autos de inquérito, não podendo fornecer informações nem mesmo a
imprensa;49

Com o poder de decretar o sigilo, a autoridade afasta qualquer possibilidade de ter


suas investigações prejudicadas por qualquer dos envolvidos que, de algum modo, souberam
da instauração do inquérito, visto que o sujeito, autor do delito, ao saber do indiciamento
possa destruir todas as provas que o incriminem, dentre estas até mesmo as testemunhas. “O
sigilo é a essência do inquérito. não guardá-lo é muita vez, fornecer armas e recursos ao
50
delinqüente para frustrar a atuação da autoridade na apuração do crime e da autoria.”
Ao contrário do sigilo, tem-se a publicidade
das investigações, sendo esta de grande importância na
elucidação de fatos criminosos. Sobre a eficácia da
publicidade nas investigações, Flávio Medeiros aduz
que, “há hipóteses em que a publicidade é conveniente
na medida em que qualquer pessoa do povo pode vir a
contribuir para as investigações, fornecendo
informações de que tenha conhecimento.”51
A autoridade policial possui o livre arbítrio para decretação do sigilo, porém, quando
se fala em faculdade ou livre arbítrio não se quer dizer que não existe nenhuma obrigação por
parte da autoridade para decidir sobre tal instituto.
Então, para decretação do sigilo é imprescindível:

1- que ele seja necessário – o que significa que à autoridade se impõe o


dever de justificar a medida, por escrito, alegando sua imprescindibilidade
para a elucidação do fato;

48
MAGALHÃES, Apud. MEHMERI Adilson, Inquérito policial: dinâmica. p. 17/18.
49
FRANCO, Paulo Alves, Inquérito Policial. p. 20.
50
MEHMERI Adilson, Inquérito policial: dinâmica. p. 18.
51
MEDEIROS, Flávio Meirelles. Do Inquérito Policial. p. 88.
2- ou que ele seja exigido pelo interesse da sociedade.52

A questão do advogado acompanhar o inquérito policial quando decretado o sigilo é


bastante polêmica, aumentando-se a celeuma a cada dia.
Os doutrinadores que são contra, alegam que o inquérito é um procedimento
administrativo de caráter investigatório, o indiciado não passa de mero objeto de investigação,
pois não há acusação e, como conseqüência, não pode haver defesa.
Na outra esfera da discussão, a mais razoável, consiste na proibição do sigilo, pelo
fato de que ele constitui um cerceamento de defesa. É necessário que o indiciado saiba o que
está sendo apurado na investigação, a fim de se programar a defesa. Assim exposto no art. 7º,
XIV, do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil.
No entanto, se em relação ao advogado existe
esse confronto de entendimentos, o mesmo não ocorre
com o Ministério Público, que é titular da ação pública,
e ao magistrado, vez que ambos possuem o livre acesso
aos autos de inquérito.
É de notória importância mencionar o parágrafo único do artigo 20 do Código de
Processo Penal, acrescentado pela Lei nº 6.900, de 14 de abril de 1981, estabelecendo que
“nos atestados de antecedentes que lhe forem solicitados, a autoridade policial não poderá
mencionar quaisquer anotações referentes a instauração de inquérito contra os requerentes,
salvo no caso de existir condenação anterior.”
Tal preceito legal é reflexo do princípio jurídico da presunção de inocência, segundo
o qual ninguém pode ser considerado culpado senão depois de transitar em julgado a sentença
que o condenou.
Portanto, o atestado de bons antecedentes deve ser deferido, mesmo quando houver
inquérito ou processo criminal em andamento, sendo que não exista qualquer condenação.

2.3.4 Unidirecional

52
MEHMRI, Adilson. Inquérito policial: dinâmica. p. 18.
O inquérito policial é procedimento investigatório informativo, pois serve de base a
inicialização de futura ação penal. Portanto, não pode conter qualquer conteúdo que venha a
interferir na opinião do órgão acusador e muito menos na decisão da autoridade judiciária.
Para compreender esta característica do inquérito, transcrevo os dizeres de Rangel:

O inquérito policial tem um único escopo: apuração dos fatos


objeto de investigação (cf. art. 4º, in fine, do CPP). Não cabe a autoridade
policial emitir nenhum juízo de valor na apuração dos fatos, como, por
exemplo, que o indiciado agiu em legítima defesa ou movido por violenta
emoção ao cometer o homicídio.53

A função de decidir cabe apenas ao juiz, não devendo a autoridade policial proferir
qualquer juízo de valor, o mesmo ocorre quanto a denúncia, esta que pertence apenas ao
Ministério Público. Na prática existe relatórios de delegados que são verdadeiras denúncias e
sentenças. Vale mencionar aqui, que o relatório conclusivo é a peça final do inquérito descrita
pelo delegado, esta deve constar a existência da autoria e da materialidade do delito.
Não obstante, existem policiais que entendem ser necessário sempre se invocar um
culpado para um crime em concreto, fazendo do inquérito policial um instrumento para tal
distorção.
Tal atitude é fruto da pressão social e até mesmo da hierarquia policial, conforme se
extrai do estudo de Mehmeri:

Isso tem levado a instituição, nobre por sinal e imprescindível,


alguma vezes ao descrédito judicial, pois forja confissões, fantasia provas,
altera depoimentos, no desesperado afã de ficar “numa boa” com os chefes
e com o próprio público. A imprensa, de alguma forma, também contribui
para isso, pois não admite a ocorrência do que ela chama “mais um crime
insolúvel” 54

Enquanto não existir uma fiscalização esse


problema não vai terminar, portanto, nada mais justo
que o advogado do indiciado acompanhe os atos da
polícia, assim como ter livre acesso aos autos de

53
RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. p. 86.
54
MEHMERI, Adilson. Inquérito policial: dinâmica. p. 17.
inquérito. A partir do momento que o policial altera
depoimentos, forja

confissões ou fantasia provas, estará incorrendo no


gravíssimo erro de ser o culpado de por um inocente na
prisão.
De tudo deve se evitar para que um inocente jamais pare dentro de uma penitenciária
junto com pessoas que sempre estiveram à margem da sociedade, pois, mais vale um culpado
solto do que um inocente na cadeia. Corroborando tal posicionamento, em nosso ordenamento
já está consagrado o princípio do indúbio pro réu, que se traduz em não havendo provas
suficientes para condenar o réu, este deverá ser absolvido.

2.3.5 Inquisitorial

O inquérito policial possui caráter inquisitivo. Ele tem essa característica pelo fato
da autoridade policial, o delegado de polícia, deter nas mãos o poder discricionário de presidir
as investigações criminais do jeito que achar melhor, desde que não contrarie qualquer norma
legal.
Segundo Ismar Garcia, a autoridade policial “não está obrigada a obedecer a um
procedimento predeterminado, podendo as investigações seguirem em diferentes sentidos,
visando sempre o esclarecimento da ocorrência criminosa.” 55
Capez, pondera de forma concisa:

Caracteriza-se como inquisitivo o procedimento em que as


atividades persecutórias concentram-se nas mãos de uma única autoridade,
a qual, por isso prescinde, para sua atuação, da provocação de quem quer
que seja, podendo e devendo agir de ofício, empreendendo, com
discricionariedade, as atividades necessárias ao esclarecimento do crime e
de sua autoria.56

O caráter inquisitorial do inquérito está demonstrado no art. 14 do Código de


Processo Penal, que dispõe: “O ofendido, ou seu repre sentante legal, e o indiciado poderão
requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo das autoridade.” A

55
GARCIA, Ismar Estulano. Inquérito - procedimento policial. 1 ed. Goiânia: AB, 1987, p. 8.
56
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 75/76.
discricionariedade, neste dispositivo legal, está consubstanciada pelo poder que a autoridade
policial tem de deferir ou indeferir qualquer diligência, exceto o exame de corpo de delito
conforme art. 184 do CPP, requisitada pelo indiciado, e ou ofendido ou seu representante
legal.
Verifica-se também o caráter inquisitivo do inquérito no artigo 107 do Código de
Processo Penal, que dispõe: “Não se poderá opor suspeição às autoridades policiais nos atos
do inquérito, mas deverão elas declarar-se suspeitas, quando ocorrer motivo legal.”
Tourinho Filho, esclarece acerca da suspeição de autoridade policial:

havendo motivo legal que torne a Autoridade Policial suspeita,


deverá ela abster-se de funcionar no inquérito, pois certamente, seria uma
rematado disparate que o Estado, procurando fazer justiça, fosse permitir
que a investigação policial ficasse a cargo de autoridade... suspeita,
podendo, com sua conduta, causar vexames aos indiciados ou, então, não
colher elementos probatórios sérios, que poderia ter colhido, criando
obstáculo à persecutio criminis in judicio.57

Este artigo demonstra claramente a discricionariedade que a autoridade policial


possui, pois lhe é permitido que decrete ou não a sua suspeição, ficando as partes interessadas,
impossibilitadas de interferir neste assunto.
Para concluir esta característica do inquérito, transcrevo texto citado por Álvaro
Lazzarini:

O ato de polícia é auto-executável pois independe de prévia


autorização do Poder Judiciário para sua concretização jurídico-material.
Não se trata, porém, de atividade arbitrária, estando submetida ao controle
jurisdicional posterior, que se exerce através do habeas corpus, mandado de
segurança e de outros remédios específicos.58

Portanto, o delegado de polícia tem certa liberdade para conduzir a investigação da


maneira que achar melhor, porém, esta deve ser realizada com observância na lei. A não
obediência aos preceitos legais pode caracterizar o abuso de poder.

57
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. p. 186.
58
LAZZARINI, Apud. MIRABETE, Júlio Fabbrini, Processo Penal. p. 81.
2.4 NOTITIA CRIMINIS

Trata-se da notícia do crime, oportunizando o início das investigações policiais.


A notitia criminis é o modo como a autoridade policial toma ciência de um fato que
possa ser criminoso. O conhecimento pode ser provocado ou espontâneo, procedendo com
base nestes a investigação criminal.
A notícia do crime se apresenta de três formas, a saber a) notitia criminis de
cognição direta, imediata ou espontânea; b) notitia criminis de cognição indireta, mediata ou
provocada; c) notitia criminis de cognição coercitiva.
A notícia do crime direta, se dá quando a autoridade policial toma conhecimento do
fato delituoso através de comunicação da vítima, por atividade rotineira ou por publicações
em jornais.59
A notitia criminis indireta, acontece por ato formal, ou seja, o delegado toma
conhecimento do fato criminoso através de algum ato jurídico. Pode-se mencionar a
requisição da autoridade judiciária; a requisição do Ministério Público (art. 5º, II do CPP); a
requisição do Ministro da Justiça (art. 7º, § 3º,b, e 141, I, c/c art. 145, parágrafo único, todos
do CPP); a delatio criminis – delação (art. 5º, II, e §§ 1º, 3º e 5º, do CPP); e a representação
do ofendido (art. 5º, § 4º do CPP).60
No caso da cognição coercitiva, a autoridade policial toma ciência do fato
juntamente com a apresentação do suposto autor do delito, é o exemplo da prisão em
flagrante.61
Para tanto, a notícia do crime se dá de formas diversas, porém estas visam um
mesmo objetivo, qual seja, a instauração do inquérito policial para apuração dos indícios de
autoria e materialidade do crime.

2.5 INÍCIO DO INQUÉRITO POLICIAL

As possibilidades de início do inquérito policial dependem do tipo de ação penal no


qual se submete o delito investigado. Podem ser a) ação penal pública incondicionada; b) ação
penal pública condicionada à representação; c) ação penal privada.

59
Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. p. 189.
60
Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 79.
61
Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. p. 189.
2.5.1 Crime de ação penal pública incondicionada

Nos crimes de ação penal pública incondicionada o órgão acusador oferece denúncia
sem que dependa de qualquer manifestação da vítima ou do seu representante legal, da mesma
forma, em tal ação, o inquérito policial pode ser instaurado de ofício ou por requisição da
autoridade judiciária ou requisição do Ministério Público.
O inquérito em determinados casos deve ser instaurado de ofício pela autoridade
policial. Explica Tourinho Filho em sua obra:

Se a Autoridade Policial souber, por meio das suas atividades de


rotina, da existência de um crime, cumprir-lhe-á de logo examinar se se
trata de ação pública incondicionada. Sendo-o, a Autoridade Policial terá o
dever jurídico de instaurar o inquérito, isto é, de determinar sejam feitas
investigações para se apurar o fato infringente da norma e sua autoria, e
isto, por iniciativa própria, sem necessidade de qualquer solicitação nesse
sentido, vale dizer, de ofício.62

Portanto, o delegado ao deparar-se com um


acontecimento que configure suposto fato criminoso
deverá iniciar as investigações, independente de
qualquer provocação.
Além da autoridade policial ter o dever de
instaurar o inquérito de ofício (art. 5º, I, do CPP),
quando legalmente autorizado, deve também instaura-lo
quando requisitado pela autoridade judiciária ou pelo
Ministério Público (art. 5º. II, do CPP).
A requisição é peça formal, no qual permite ao órgão acusatório ou ao juiz, a
possibilidade de requerer a inicialização do inquérito policial, quando por algum motivo
tomaram conhecimento de fato delituoso. O delegado não pode deixar de cumprir a referida
requisição, caso contrário estará incorrendo no delito de prevaricação, previsto no art. 319 do
CP. Vale ressaltar, que é função institucional do Ministério Público, dada a ciência de fato

62
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. p. 190.
criminoso, requisitar o início do inquérito, estando tal poder conferido pelo art. 129, VIII, da
nossa Carta Maior.63
O art. 40 do Código de Processo Penal, reflete
um exemplo que dá ao magistrado a fundamentação de
que, pode ele, ao tomar ciência de algum fato delituoso,
remeter os papéis ou documentos ao Ministério Público
para oferecimento da denúncia. “Todavia, se não
estiverem presentes os elementos indispensáveis ao
oferecimento da denúncia, a autoridade judiciária
poderá requisitar a instauração do inquérito policial
para a elucidação dos acontecimentos.”64
Durante tal estudo a impressão que possa ter
ficado é de que existe hierarquia entre autoridade
judiciária, Ministério Público e autoridade policial,
porém isto não é verdade. “A autoridade policial não
pode se recusar a instaurar o inquérito, pois a
requisição tem natureza de determinação, de ordem,
muito embora inexista subordinação hierárquica.”65
A autoridade policial, após receber o ofício requisitório, mandará autuá-lo e, já no
mesmo despacho, poderá determinar todas as diligências que achar necessárias para a
elucidação do fato.

2.5.2 Crime de ação penal pública condicionada

O crime de ação penal pública condicionada depende da vontade da vítima ou de seu


representante legal, ou ainda, de requisição do ministro da justiça. Não havendo manifestação
destes a autoridade policial não poderá abrir inquérito.
Têm-se como exemplo o crime de ameaça, previsto no art. 147, parágrafo único do
CP. Este é crime de ação penal pública condicionada á representação do ofendido, portanto,
sem esta a lei veda a abertura do inquérito policial pelo delegado.66

63
Cf. MEDEIROS, Flávio Meirelles. Do Inquérito Policial. p. 38/39.
64
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 80.
65
CAPEZ, Fernando, Curso de Processo Penal. p. 81.
66
Cf. FRANCO, Paulo Alves. Inquérito Policial. p. 3.
Neste tipo de ação o inquérito dependerá de representação para ser instaurado. “A
representação pode ser exercida oralmente ou por escrito, pessoalmente ou através de
procurador com poderes especiais, ao juiz, ao MP ou diretamente à autoridade policial.” 67 “A
representação oral ou sem assinatura autenticada deve ser reduzida a termo (art. 39, § 1º).”68
Para fortalecer este tópico, nada melhor que descrever o entendimento de Tourinho
Filho:

Tratando-se de crime de ação penal pública condicionada à


representação, diz o § 4º do art. 5.º: “O inquérito, nos crimes em que a ação
pública depender de representação, não poderá sem ela ser iniciado”.
Conclui-se daí que, se o crime for de ação pública, mas condicionada à
representação, a Autoridade Policial não poderá iniciar o inquérito por
iniciativa própria.69

Através do conceito acima citado, pode-se


perceber que sem a representação do
ofendido ou do seu representante legal, não existe a
possibilidade da autoridade policial iniciar qualquer
investigação. Da mesma forma, o Ministério Público
recebendo os autos de inquérito, não poderá oferecer a
denúncia se esta não estiver acompanhada da
representação, assim como, a autoridade judiciária não
poderá receber a denúncia sem a mesma. Portanto, a
representação, deverá ser apresentada à autoridade
policial, à autoridade judiciária e ao representante do
Ministério Público.
Nessa altura do texto, é de suma importância conceituar a representação, porquanto,
transcrevo as palavras de Tourinho Filho:

A representação (querela no direito italiano, plainte no Direito


Francês, antrag no Direito alemão, querella ou instância privada entre os
povos de línqua espanhola) outra coisa não é senão simples manifestação de
vontade da vítima ou de quem legalmente a representa no sentido de

67
MEDEIROS, Flávio Meirelles. Do Inquérito Policial. p. 39/40.
68
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 88.
permitir que o Estado, por meio dos órgãos próprios de persecução,
desenvolva as necessárias atividades jurídico – judiciárias tendentes às
investigações da ação penal, à apuração da respectiva autoria e à aplicação
da lei penal objetiva.70

O inquérito policial instaurado nos crimes de


ação penal pública condicionada à representação, só
poderá seguir em frente se acompanhada da mesma. A
representação conterá informações que ajudará na
elucidação do fato delituoso. Após o oferecimento da
denúncia, a representação se torna irretratável.
Nos crimes de ação penal pública
condicionada, o inquérito policial além de ser iniciado
mediante representação do ofendido ou de seu
representante legal, pode também ser iniciado mediante
requisição do Ministro da Justiça.
São os casos em que o Ministro da Justiça
requisita o início do inquérito policial:

É necessária a requisição, segundo o Código Penal, nos crimes contra a


honra praticados contra o Presidente da República ou chefe de governo
estrangeiro (art. 145, parágrafo único, primeira parte), e nos delitos
praticados por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil (art. 7º, § 3º). É
prevista também a requisição em determinados crimes praticados através
da imprensa (art. 23, I, c. c. c. art. 40, I, a, da Lei nº 5.250, de 9-2-1967), e
no entendimento para reger conflito ou divergência com o Brasil, praticado
por agente civil quando não houver co-autor militar (art. 122, c. c. art. 141,
do CPM).71

A lei não determina expressamente um prazo


para o encaminhamento da requisição pelo Ministro de
Justiça, desta forma, entende-se que esta pode ser feita
a qualquer tempo, enquanto não extinta a punibilidade
do agente. Vale lembrar que, de nada adianta a
requisição do Ministro da Justiça, se o acusado agiu

69
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. p. 199/200.
70
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. p. 200.
71
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 123.
protegido de alguma excludente de antijuridicidade ou
excludente de culpabilidade.
O Ministro da Justiça deverá encaminhar a
requisição ao chefe do Ministério Público o qual
poderá, desde logo, oferecer a denúncia ou requisitar
diligências à polícia. É interessante expor que, após
receber a requisição, o Ministério Público não tem
obrigação de propor a ação, submetida esta apenas ao
princípio da obrigatoriedade.72
Portanto, em determinados crimes é vedado
por lei a autoridade policial instaurar inquérito de
ofício, como é o caso em tela, no qual o mesmo deve ser
aberto somente mediante a representação do ofendido
ou do representante legal, ou a requisição do Ministro
da Justiça.

2.5.3 Crime de ação penal privada

No crime de ação penal privada, o inquérito


policial deve ser instaurado somente à requerimento do
ofendido ou de seu representante legal, a autoridade
policial não poderá iniciar de ofício, nem mesmo se o
juiz ou o representante do Ministério Público
requisitarem.
O art. 5º, § 5º, do Código de Processo Penal,
diz que: “Nos crimes de ação privada, a autoridade
policial somente poderá proceder a inquérito a
requerimento de quem tenha qualidade para intentá-
la.”
Sobre o início do inquérito policial em crimes
de ação penal privada, esclarece Flávio Medeiros:

Nos crimes de ação privada, o inquérito só pode ser aberto diante de


requerimento de quem tenha legitimidade para apresentar a queixa. A

72
Cf. MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 123.
queixa, nos crimes de ação privada, assemelha-se à denúncia. É dirigida ao
juiz. O que é dirigida à autoridade policial não é propriamente a queixa
mas um requerimento de abertura de inquérito. Esse requerimento, ou
queixa, dirigido ao delegado, não interrompe o prazo decadencial de seis
meses para o oferecimento da queixa em juízo (prazo do art. 38 do CPP).
Assim, o requerimento de abertura de inquérito, em se tratando de crime de
ação privada, há de ser feito perante a polícia dentro do prazo de seis
meses, sob pena de ser indeferido.73

Paulo Franco, acertadamente em sua obra,


ilustra tal hipótese:

Para se dar início ao inquérito policial nos crimes de ação privada, a


vítima ou seu representante legal deverá requerer. Ver o § 5.º do art. 5.º do
CPP. P. ex., o crime de difamação, prescrito no art. 139, do CP, é de ação
privada e depende de queixa crime para a ação ser intentada, conforme
prescreve o art. 145 e parágrafo único do mesmo diploma legal. Para ser
instaurado o inquérito que apura essa infração penal, o ofendido deverá
requerer à autoridade policial.74

A figura do representante legal se faz


necessário para o início do inquérito policial, visto que,
quando trata-se de menor de 18 (dezoito) anos, este não
pode requerer o início da investigação criminal, tendo
que fazer por ele o seu representante legal. Antes do
novo Código Civil, o ofendido, maior de 18 (dezoito)
anos e menor de 21 (vinte e um) anos ou seu
representante legal poderiam requerer a inicialização
do inquérito. Após a entrada em vigor do novo Código
Civil (Lei nº 10.406 de 10-01-02), a maioridade civil foi
reduzida para os 18 (dezoito) anos, neste caso portanto,
cabe somente ao ofendido o requerimento de
instauração do inquérito, visto a caracterização da sua
plena capacidade.
A respeito da maioridade civil conferida ao
maior de 18 anos, explica o criminalista Mirabete:

Com a entrada em vigor do novo Código Civil, instituído pela Lei nº


10.406, de 10-01-02, que reduziu para 18 anos a idade em que se atinge a

73
MEDEIROS, Flavio Meirelles. Do Inquérito Policial. p. 40.
74
FRANCO, Paulo Alves. Inquérito Policial. p. 5.
plena maioridade civil (art. 5º do CC), tornou-se inócuo o último
dispositivo. Não havendo mais que se falar em representante legal, em
razão da idade, do maior de 18, somente a este cabe a titularidade da
queixa e, conseqüentemente, também a iniciativa para a instauração do
inquérito [...].75

É interessante abordar neste tópico o


requerimento para instauração de inquérito policial
por mulher casada. O art. 226, § 5º da CF/88, não
recepcionou o art. 35 do CPP, portanto, a mulher
casada tem o direito de requerer a instauração do
inquérito sem que necessite de outorga marital.
Conforme o art. 5º, § 1º, do CPP, este requerimento não
exige qualquer formalidade, porém, deve conter todos
os elementos indispensáveis para a sua instauração.76
Transcorrido o prazo decadencial, extingui-se
a punibilidade do indivíduo, sendo vedada a
instauração de inquérito policial. Vale lembrar, que o
prazo decadencial só se interrompe com o oferecimento
da queixa, desta forma, a instauração do inquérito não
supre tal necessidade.77
Conforme estabelece o art. 19 do CPP, após a
conclusão do inquérito policial, este será remetido ao
juízo competente para que aguarde a manifestação da
vítima ou de seu representante legal. “O inquérito
policial deve ser instaurado em um prazo que permita a
sua conclusão e o oferecimento da queixa antes do
prazo decadencial do art. 38 do Código de Processo
Penal."78
Destarte, quando se trata de ação penal
privada, a vítima ou seu representante legal, poderão
retirar os autos de inquérito, desde que esteja
encerrado, se não o fizer, a autoridade policial remeterá

75
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 89.
76
Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 83.
77
Cf. MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 89.
os autos ao juízo competente, este então, aguardará a
manifestação do ofendido.

2.6 INDICIADO MENOR

Quando se fala em indiciamento de réu menor,


considera-se este, maior de 18 e menor de 21 anos.
Para todo indiciado menor é necessário que a
autoridade policial nomeie um curador, assim diz o art.
15 do Código de Processo Penal: “Se o indiciado f or
menor, ser-lhe-á nomeado curador pela autoridade
policial.
Para ingressar neste estudo é de suma
importância definir a figura do curador, desta forma,
conceitua Barbosa:

Curador segundo vocabulário jurídico de Plácido Silva, deriva “do latim


curator do verbo curare, possui o sentido etimológico de indicar a pessoa
que cuida, que cura ou que trata de pessoa estranha e de seus negócios. Na
técnica jurídica outra não é sua acepção desde que é tido para designar a
pessoa a quem é dada a comissão ou encargo com os poderes de vigiar
(cuidar, tratar, administrar) os interesses de outra pessoa, que tal não pode
fazer por si mesma.79

O indiciado quando menor de 21 anos, terá o


dever de assistência de um curador, podendo ser o
próprio advogado, que será nomeado pela autoridade
policial. No tocante a expressão menor de 21 anos, quer
se dizer entre 18 e 21 anos. É importante este
esclarecimento, pelo fato dos menores de 18 anos
estarem submetidos à Lei nº 8.069, de 13.7.90 (Estatuto
da Criança e do Adolescente).
Sobre a pessoa do curador, escreve Paulo
Franco:

78
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 83.
79
BARBOSA, Manoel Messias. Inquérito Policial. 2 ed. São Paulo: eud (editora universitária de direito), 1991,
p. 18.
O curador poderá ser qualquer pessoa, desde que seja idônea. O que
aconselhamos é que as autoridades nomeiem, sempre que possível um
Comissário de Menores* para assistir o menor de 21 anos, indiciado, porque
esse funcionários, que são vinculados à Justiça, normalmente freqüentam as
Delegacias atendendo os casos relacionados com menores abandonados ou
infratores. São eles quem normalmente acompanham esses menores até o
Juizado de Menores na Delegacia, qualquer outra pessoa, desde que maior
de 21 anos e idônea, poderá ser nomeada. Ver art. 15 do CPP.80

O curador pode ser qualquer pessoa capaz e


idônea, não é necessário que este seja profissional
habilitado, porém, é importante que deva sê-lo. Tem
como função, acompanhar o indiciado menor em todos
os atos da investigação criminal, observando, para que
ao indiciado seja garantido o pleno exercício de defesa.
O analfabeto é impedido de exercer tal atribuição.
A figura do curador é de grande importância
no inquérito policial, portanto, este deve realmente
assistir o menor, estando presente em todos os atos
realizados pela polícia, tais como: depoimentos,
acareações, reprodução simulada do delito,
reconhecimento e outros. Deve acompanhar as
diligências do início ao fim, principalmente em se
tratando de depoimento pessoal do menor. 81
A finalidade do curador, a grosso modo, é
oferecer uma certa segurança ao indiciado menor, para
que o mesmo em nenhum momento se sinta indefeso. “A
nomeação de curador ao indiciado menor destina-se a
complementar sua capacidade.” 82
O fato de não ser nomeado curador para
indiciado menor, não gera a nulidade do inquérito, mas
provoca o relaxamento do flagrante.
Flávio Medeiros, pondera a respeito da falta
de nomeação de curador:

80
FRANCO, Paulo Alves. Inquérito Policial. p. 22.
81
Cf. MEDEIROS, Flavio Meirelles. Do Inquérito Policial. p. 79.
82
BARBOSA, Manoel Messias. Inquérito Policial. p. 18.
Não há nenhuma conseqüência para o processo em razão de não nomeação
de curador na fase do inquérito. Nulidades do inquérito não afetam a
validade da relação processual. O artigo 564, III, c, do CPP, é aplicável
apenas ao processo. A jurisprudência que reconhecia a nulidade do
processo em razão da ausência de nomeação de curador na fase do
inquérito foi abandonada no início da década de 70.83

Diante todo exposto, observou-se que o


curador representa um instrumento de defesa do
indiciado, protegendo este de abusos de poder
freqüentes em repartições policiais. A falta de curador
não acarreta nulidade, porém, no caso de prisão a falta
do mesmo resulta no relaxamento da custódia, sem
prejuízo no desenrolar do inquérito.

2.7 PRAZOS DO INQUÉRITO POLICIAL

O inquérito policial, assim como qualquer


outro procedimento, deve respeitar prazos que a lei
determina. Dessa forma o art. 10 do Código de
Processo Penal dispõe que:

O inquérito deverá terminar no prazo de 10 (dez) dias, se o indiciado tiver


sido preso em flagrante, ou estiver preso preventivamente, contado o prazo,
nesta hipótese, a partir do dia em que se executar ordem de prisão, ou no
prazo de 30 (trinta) dias, quando estiver solto, mediante fiança ou sem ela.

O artigo supra citado não deixa nenhuma


dúvida a respeito do prazo no encerramento do
inquérito, sendo um dispositivo taxativo, vez que fixa o
prazo de conclusão da investigação criminal.

2.7.1 No caso de indiciado solto

Conforme a Segunda parte do artigo 10 do


Código de Processo Penal, acima transcrito, é

83
MEDEIROS, Flavio Meirelles. Do Inquérito Policial. p.80.
conferido a autoridade policial o prazo de 30 dias para
o término do inquérito em caso de indiciado solto. Após
a conclusão do mesmo, este deve ser remetido a justiça
para serem tomadas as devidas providências.
O prazo começa a contar a partir do
conhecimento do fato delituoso por parte da autoridade
policial. Tal conhecimento se dá por requisição, a
requerimento ou de ofício.
Acerca do prazo no caso de indiciado solto,
esclarece o criminalista Tourinho Filho:

O prazo de 30 dias, estando o indiciado solto, começa a fluir da data em


que a autoridade policial receber a requisição, o requerimento, ou, então,
do dia em que tiver conhecimento do fato. Poder-se-ia dizer da data da
portaria. Na prática, leva-se em conta a data da expedição da portaria, isto
porque, de regra, a Autoridade Policial determina seja baixada portaria no
mesmo dia em que o fato chegar ao seu conhecimento. Pode acontecer,
entretanto, que a Autoridade Policial, tendo conhecimento do fato a 1.º de
janeiro, venha a baixar a portaria a 4 de maio. Se tal acontecer e
dependendo do fato concreto, poderá a Autoridade Policial ser
responsabilizada, em face dos prejuízos que, em tese, seriam acarretados à
administração da Justiça.84

A autoridade policial, constatado seja o fato


de difícil elucidação e não sendo suficiente
o prazo de 30 dias para conclusão do inquérito, poderá
remeter os autos à autoridade judiciária para que a
mesma determine a dilação do prazo. É o que diz o art.
10, § 3º do Código de Processo Penal: “Quando o fato
for de difícil elucidação, e o indiciado estiver solto, a
autoridade poderá requerer ao juiz a devolução dos
autos, para ulteriores diligências, que serão realizadas
no prazo marcado pelo juiz.”
Mehmeri numera as condições para que possa
o magistrado determinar a dilação do prazo:

84
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. p. 235/236.
O § 3.º do dispositivo em comento permite prorrogação do prazo para
remessa do inquérito policial em condições excepcionais. São três essas
condições:
1.ª) somente nos casos de indiciado solto;
2.ª) somente nos casos de difícil elucidação;
3.ª) somente dentro do prazo concedido pelo juiz.85

A autoridade policial, deparando-se com um


fato de difícil elucidação, poderá requerer ao juiz a
dilação do prazo, desde que o indiciado esteja solto. O
inquérito será remetido a juízo acompanhado de
despacho motivado.
É importante ressaltar que a autoridade
judiciária é quem deverá determinar o prazo para
terminação do inquérito, devolvendo os autos ao
delegado de polícia para efetuar as investigações
necessárias.86
Há uma celeuma em torno da necessidade de
se ouvir o Ministério Público, após o requerimento de
dilação de prazo, disposto no art. 10, § 3º, do CPP, vez
que este omite se o juiz deve ouvi-lo ou não.
Tourinho Filho é quem bem esclarece essa
necessidade:

Ali não se fala na ouvida do Ministério Público e, muito menos, do


querelante. Todavia é curial que assim proceda. O titular da ação penal,
lendo os autos inconclusos, poderá chegar à conclusão de que já possui
elementos para a sua propositura e, então, a promoverá. Poderá, por outro
lado, concordando com a devolução, sugerir esta ou aquela diligência...87

Na maioria das vezes esta é a providência


tomada, posto que, o Ministério Público verificando
existirem os requisitos necessários para propositura da
ação penal, poderá promovê-la.
Caso o juiz entenda ser desnecessário novas
diligências no inquérito, não pode ele indeferir o

85
MEHMERI, Adilson. Inquérito policial: dinâmica. p. 303.
86
Cf. TORNAGHI, Hélio. Curso de Processo Penal. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 33.
87
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. p. 236.
retorno dos autos à autoridade policial, pois estaria
incorrendo em error in procedendo e ficaria sujeito ao
recurso de correição parcial. O juiz deverá remeter os
autos ao procurador-geral de justiça, para que este
ofereça a denúncia ou repasse para outro promotor
oferecer ou determine o arquivamento da mesma. Neste
caso utiliza-se o artigo 28 do CPP por analogia. Vale
dizer que esta regra não poderá estender-se ao titular
da ação penal privada.

2.7.2 No caso de indiciado preso

Existem duas possibilidades de indiciado


preso, quais sejam, o preso em flagrante e o preso
preventivamente.
Quando o indiciado estiver preso em flagrante,
o prazo para a conclusão do inquérito policial é de 10
dias, contados á partir da data da prisão. Tal prazo
começará a contar em qualquer dia, mesmo sendo
sábado, domingo ou feriado. Este caso está previsto na
primeira parte do art. 10 do CPP.
Capez, sobre o prazo no caso de indiciado
preso, descreve:

Tal prazo, em regra, é improrrogável, todavia não configura


constrangimento ilegal a demora razoável na conclusão do procedimento
investigatório, tendo em vista a necessidade de diligências imprescindíveis
ou em razão do grande número de indiciados.88

Se a prisão ultrapassar o prazo legal sem


justificativa relevante, o indiciado ou qualquer outro
por ele, poderá através do recurso de habeas corpus
(art. 648, II do CPP) requerer sua soltura.

88
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 92.
No tocante a prisão preventiva, o prazo para o
encerramento do inquérito é de 10 dias. O prazo deverá
começar a contar a partir da data que se executou a
ordem de prisão, ou seja, quando o indiciado for
realmente preso.89
Flávio Medeiros versa a respeito da prisão
preventiva:

Estando o indiciado preso preventivamente, a jurisprudência tem se


posicionado no sentido de que descabe a devolução dos autos à polícia e
pela seguinte razão: se existiam elementos para prender preventivamente
(prova da existência de crime e indícios suficientes de autoria) deve haver,
por certo, elementos suficientes para a apresentação da denúncia (indícios
razoáveis da existência de crime e de autoria).90

Para se decretar a prisão preventiva é


necessário haver a existência da materialidade do crime
e suficientes indícios de sua autoria, não havendo, se
torna impossível decretar tal prisão. Não deverá o
inquérito ser devolvido à polícia para novas diligências,
pois se houve indícios e materialidade do crime para
prender preventivamente, consequentemente existem os
requisitos para oferecimento da denúncia.
Ao final das investigações, a autoridade
policial deverá encaminhar os autos de inquérito com o
respectivo relatório, observando-se suas exigências.
Este constará todos os atos realizados e, ainda, poderá
conter o nome de testemunhas que não foram inquiridas
na fase preliminar, mencionando-se o respectivo local
onde possam ser encontradas.

2.7.3 Prazos especiais

Além dos prazos falados acima, existem


também os prazos estabelecidos por leis especiais, que

89
Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. p. 237.
ocorrem: nos crimes de competência da Justiça Federal
(art. 66 da Lei 5.010/66), Lei Antitóxicos (Lei 6.368/76)
e crimes contra a economia popular (Lei 1.521/51).
Conforme dispõe o art. 66 da Lei nº 5.010/66,
o prazo para conclusão do inquérito na justiça federal é
de 15 dias, podendo ser prorrogável por mais 15 dias.
Deve ser feito mediante requerimento fundamentado,
pela autoridade policial ao juiz competente.91
Com relação ao indiciado preso em crime
envolvendo tóxico, “A Lei 6.368/76, em seu art. 21,
determina que, estando o indiciado preso, os autos
deverão ser remetidos à Justiça em cinco dias.” 92
Nos casos de crime contra a economia
popular, previsto na Lei 1.521/51, o prazo é de 10 dias,
independendo se o indiciado estiver preso ou solto,
assim determina o art. 10, § 1º desta lei.93

2.8 ARQUIVAMENTO

A autoridade policial, como já estudado,


possui a única finalidade de apurar a materialidade do
crime e seus indícios de autoria. Não poderá ela
fornecer qualquer juízo de valor ao final das
investigações e muito menos requerer o arquivamento
dos autos de inquérito, assim dispõe o art. 17 do CPP,
“A autoridade policial não poderá mandar arquivar
autos de inquérito.”
Capez, aduz acerca do requerimento de
arquivamento do inquérito pela autoridade policial:

90
MEDEIROS, Flavio Meirelles. Do Inquérito Policial. p. 65.
91
Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. p. 235.
92
MEDEIROS, Flavio Meirelles. Do Inquérito Policial. p. 65.
93
Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 93.
A autoridade policial, incumbida apenas de colher os elementos para a
formação do convencimento do titular da ação penal, não pode arquivar os
autos de inquérito (CPP, art. 17), pois o ato envolve, necessariamente, a
valoração do que foi colhido.94

O Ministério Púbico, em se tratando de ação


penal pública, é quem deverá requerer o arquivamento
do inquérito ao magistrado, caso o juiz entender
procedente o pedido determinará o arquivamento, mas
se o mesmo não concordar com o respectivo
requerimento deverá encaminhar os autos ao
Procurador Geral, que por sua vez, poderá oferecer a
denúncia, remeter os autos a outra promotoria para
oferecimento da mesma ou prosseguir no arquivamento
do inquérito. Ocorrendo a última hipótese o juiz nada
poderá fazer a não ser arquivar o inquérito policial,
conforme disposto no art. 28 do CPP.95
Complementa Mirabete dizendo que, “O
inquérito policial referente ao crime de ação penal
pública não pode ser arquivado pelo juiz, ou pelo
tribunal, sem a manifestação do Ministério Público.
Caso tal ocorra, cabe do despacho correição parcial ou,
no tribunal, agravo.” 96
Após o arquivamento do inquérito a
autoridade policial poderá realizar novas investigações,
desde que as provas possam dar outro rumo a ação.
Dispõe o art. 18 do CPP: “Depois de ordenado o
arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária,
por falta de base para a denúncia, a autoridade policial
poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas
tiver notícia”. Neste sentido, o STF já se manifestou
elaborando a Súmula 524, que dispõe: “Arquivado o
inquérito policial, por despacho do juiz, a requerimento

94
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 95.
95
Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. p. 244/245.
do promotor de justiça, não pode a ação penal ser
iniciada sem novas provas.”
A partir do momento que a autoridade policial
tome conhecimento de novas provas, esta poderá
reabrir o inquérito policial e seguir nas investigações.
Desta forma, esclarece Capez:

Arquivado o inquérito por falta de provas, a autoridade policial poderá,


enquanto não se extinguir a punibilidade pela prescrição (CP, arts. 109 e
107, IV), proceder a novas pesquisas, desde que surjam outras provas, isto
é, novas provas que alterem o “panorama probatório dentro do qual foi
concebido e acolhido o pedido de arquivamento do inquérito."97

Corroborando este entendimento, descreve


Paulo Franco:

Após o arquivamento do inquérito policial, a autoridade policial poderá


continuar investigando os fatos a ele relacionados. No caso de obter novas
provas, deverá oficiar ao Juiz solicitando a devolução dos autos á
Delegacia para a conclusão das investigações. Nesse caso os autos serão
desarquivados e enviados á autoridade solicitante.98

Se durante o inquérito policial ocorrer


qualquer das formas de excludente da punibilidade,
previstas no art. 107 do CP, como por exemplo o
falecimento do indiciado, sendo o atestado de óbito
juntado aos autos, a autoridade policial não precisará
fornecer o relatório ao Judiciário, mas sim um
despacho circunstanciado pedindo o arquivamento do
inquérito. 99
No caso de inquérito instaurado para a
apuração de crime de ação penal privada, basta o
ofendido não oferecer a queixa no prazo legal para que
os autos da investigação sejam arquivados, porém se o
ofendido, mesmo assim, pedir o arquivamento ao juiz

96
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 102.
97
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 95.
98
FRANCO, Paulo Alves. Inquérito Policial. p. 23.
99
GARCIA, Ismar Estulano. Inquérito: procedimento policial. p. 19.
antes do término do prazo, este ato será considerado
equivalente à renúncia, sendo assim o indiciado terá
sua punibilidade extinta pelo juiz.
Mirabete, pondera a respeito do assunto:

Tratando-se de inquérito policial que verse sobre crime que se apura


mediante ação penal privada, os autos aguardarão a iniciativa do ofendido
ou de seu representante legal, ou serão entregues ao requerente, se o pedir,
mediante traslado. A vítima deverá oferecer a queixa dentro do prazo legal,
sob pena de ser decretada a extinção da punibilidade pela decadência, caso
em que os autos serão arquivados. O pedido de arquivamento por parte do
ofendido equivale à renúncia tácita, também causa extintiva da
punibilidade.100

O despacho de arquivamento fornecido pela


autoridade judiciária é irrecorrível, salvo nos crimes
contra a economia popular ou contra a saúde pública
que deverão ser feitos de ofício pelos juízes prolatores
da respectiva decisão.

3 ESTUDO REALIZADO ACERCA DA


APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DO
CONTRADITÓRIO NO INQUÉRITO POLICIAL

100
MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. p. 102.
Neste capítulo, será abordado a necessidade
de se implantar a garantia constitucional do
contraditório na investigação criminal, tendo em vista,
os ditames legais do art. 5º, LV, da Constituição
Federal de 1988.

3.1 SISTEMAS DO PROCESSO PENAL

O processo penal durante a evolução histórica


sofreu mudanças em seu sistema, mudanças estas,
visando cada vez mais resguardar os direitos da pessoa
humana.
Para compreender o significado de sistema
processual penal é importante expor sua definição,
portanto, Paulo Rangel conceitua como sendo, [...] o
conjunto de princípios e regras constitucionais, de
acordo com o momento político de cada Estado, que
estabelece as diretrizes a serem seguidas para a
aplicação do direito penal a cada caso.101
Desta forma, o processo penal é uma
seqüência lógica, designado por princípios e regras, a
fim de abranger cada caso conforme suas
peculiaridades.
Assim, com seu desenvolvimento histórico e
seus princípios e regras norteadores, o processo penal
apresentou três sistemas, o acusatório, o inquisitivo e o
misto, cada um deles com suas características próprias.

3.1.1 Sistema inquisitivo

101
RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. p. 43.
O sistema inquisitivo surgiu após o sistema
acusatório, a partir do século XV, iniciou-se na fase
imperial romana e alastrou-se pelo continente europeu
durante a Idade Média, período em que obteve maior
força.
Tal sistema é extremamente oposto ao sistema
acusatório, pois o Estado detém em suas mãos o poder
de acusar, defender e julgar. Não há distinção entre as
partes. Este sistema foi implantado com a finalidade de
tirar do poder do particular a função de acusar, pois o
particular somente a exercia quando desejasse,
prevalecendo a impunidade.
Vélez Mariconde, retrata a imperfeição do
sistema inquisitivo:

A personalidade do homem, sua liberdade e dignidade não são já


ingredientes do novo ideário, que parece elevar-se e consolidar-se sobre o
temor ao pecado e ao delito. O Estado se agiganta e prescinde quase
absolutamente do interesse do ofendido; surge a figura do inquisidor,
substituindo-se à do juiz, que atua de ofício, por iniciativa própria para
castigar o pecador ou o delinqüente, o acusado deixa de ser uma pessoa de
direitos e se converte em objeto de severa persecução; a tortura se justifica
plenamente, como meio de arrancar a confissão do inquirido; [...]. o
processo penal é instrumento de castigo. A idéia de justiça parece
obnubilada por uma concepção autoritária e despótica do Estado de
polícia. Todo meio é legítimo para defender a sociedade. (grifou-se)102

Pelo texto acima, verifica-se como o sistema


inquisitivo é deficiente, sem qualquer escrúpulo, senso
moral ou demonstração de caráter. Este sistema é
sigiloso e escrito, o réu é tratado como mero objeto de
persecução, desta forma, era freqüente as práticas de
tortura para se obter a confissão.
O inquisidor, aquele que acusa e julga, ao
realizar as investigações torna-se um órgão
inteiramente parcial, pois, colhe provas para seu
próprio convencimento, julgando o suspeito antes

102
MARICONDI, Apud. AQUINO, José Carlos G. Xavier de. Manual de processo penal. p. 12.
mesmo do momento adequado. Como pode-se confiar
num sistema em que o próprio órgão que investiga é o
mesmo que pune.
José Marques assevera o disposto acima:

No processo inquisitivo o inquisidor não busca se convencer, ou ser


convencido; busca na realidade convencer os outros de uma convicção
íntima já formada. Não há, assim, no processo um julgamento; o que
ocorre nele é um pré-julgamento, exercido por uma das partes.103

Neste sistema, não existe os princípios


constitucionais para um devido processo legal, sendo
ele incompatível com os fundamentos de garantias
individuais do indivíduo. As partes não se encontram no
mesmo plano de igualdade.
Através de todo o exposto, pode-se enumerar
as principais características do sistema inquisitivo.
Assim, lista Paulo Rangel:

a) as três funções (acusar, defender e julgar) concentram-se nas mãos de


uma só pessoa, iniciando o juiz, ex officio, a acusação, quebrando, assim,
sua imparcialidade;
b) o processo é regido pelo sigilo, de forma secreta, longe dos olhos do
povo;
c) não há o contraditório nem a ampla defesa, pois o acusado é mero
objeto do processo e não sujeito de direitos, não se lhe conferindo nenhuma
garantia;
d) o sistema de provas é o da prova tarifada ou prova legal [...] e,
consequentemente, a confissão é a rainha das provas.104

Deste modo, observa-se que no sistema


inquisitivo não existe o actum trium personarum, autor e
réu, que em pé de igualdade conflitam perante o juiz,
que é órgão imparcial na relação jurídica, formando
assim a tradicional pirâmide. Neste, autor e juiz estão
juntos para acusar e julgar, formando uma relação
processual linear, não possuindo o réu uma
possibilidade decente de defesa, pois quem o acusa e

103
MARQUES, Apud. MALCHER, José Lisboa da Gama. Manual de Processo Penal. p. 55.
104
RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. p. 44/45.
julga é o próprio responsável pela sua defesa. O
processo penal brasileiro, ferindo nitidamente o art. 5º,
LV da Lei Maior, admite o sistema inquisitivo no
inquérito policial.

3.1.2 Sistema acusatório

O sistema acusatório teve origem na Grécia e


em Roma, alguns autores ainda afirmam que este
também iniciou-se no direito germânico.
O sistema acusatório consiste na divisão de
funções, funciona como uma pirâmide, ficando as partes
na mesma plataforma, mantendo-se assim, a igualdade
entre elas, o outro pólo consiste no Estado-juiz, que está
acima da pirâmide, cabendo-lhe a tutela jurisdicional. É
importante dizer que este último é órgão imparcial na
relação jurídica.
Sobre o sistema acusatório, explica José
Marques:

No sistema acusatório, autor e réu encontram-se em pé de igualdade,


sobrepondo-se a ambos, sobre órgão imparcial de aplicação da lei, o
titular da jurisdição, ou juiz, tal como o consagra o direito brasileiro. A
titularidade da pretensão punitiva pertence ao Estado, representado pelo
Ministério Público, e não ao juiz, órgão estatal tão-somente para da
aplicação imparcial da lei para dirimir os conflitos entre o jus puniendi e a
liberdade do réu.105

Através do conceito supra citado, observa-se


que o sistema acusatório é imparcial, contraditório e
público, possuindo funções distintas entre acusação,
defesa e juiz.
Nesse sistema, a acusação é detentora da
pretensão punitiva, tendo legitimidade para ingressar
com a ação penal. O autor da ação pode ser o órgão do
Ministério Público, no caso de ação penal pública, ou o
ofendido, no caso de ação penal privada. Por sua vez, a
defesa resiste à pretensão punitiva do Estado,
resguardando o seu direito de liberdade, podendo
utilizar de todos os recursos existentes desde que
previstos em lei.106
O juiz tem a função de julgar, dirimindo os
conflitos de interesse entre autor e réu. Ele é figura
imparcial na relação jurídica, portanto está vedada sua
participação nas investigações criminais. Funciona
desta forma para impedir que o mesmo tenha sua
imparcialidade afetada.
Não é permitido ao juiz dar o impulso inicial
ao processo, posto que este é função do Ministério
Público ou do ofendido, no entanto ao magistrado é
conferido o poder de impulsionar o processo. Este
impulso processual não configura a inquisitoriedade,
pois é feito desta forma para a obtenção da formação da
certeza para posterior condenação do autor ou
posterior absolvição do réu. O impulso realizado pelo
juiz no processo em nada afeta sua imparcialidade.107
Giovanni Leone, expõe como traços marcantes
do sistema acusatório:

a) o poder de decisão (jurisdição) pertence a um órgão estatal


(magistrado);
b) o poder de iniciativa, ou de acusação, competia a pessoa distinta do
juiz. Primeiramente, só ao ofendido e aos seus parentes. Depois, a qualquer
cidadão [...];
c) não se forma processo penal sem a acusação, o que importava na
impossibilidade absoluta de o magistrado intervir, sem prévia acusação
privada;
d) porém, uma vez investido na acusação, o magistrado não estava
condicionado, no ulterior desenvolvimento do processo, pela iniciativa ou
vontade do acusador, de maneira que, mesmo no caso de voluntário
abandono da acusação, não decaía esta e as investigações continuavam;
e) o juiz não detinha liberdade de investigação nem de seleção das
provas [...];

105
MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. p. 71.
106
Cf. MALCHER, José Lisboa da Gama. Manual de Processo Penal. p. 56.
107
Cf. MALCHER, José Lisboa da Gama. Manual de Processo Penal. p. 57.
f) o processo se desenvolvia segundo os princípios do contraditório,
com evidente posição de igualdade entre ambos os contendores, da
oralidade e da publicidade do debate;
g) preserva-se a liberdade pessoal do acusado até a sentença
irrevogável.108

O sistema acusatório ganhou força após a


revolução francesa, introduzindo-se definitivamente na
França e na Inglaterra, deste momento para frente, tal
sistema passou a fazer parte tanto politicamente como
juridicamente da maioria dos países americanos e
europeus. O direito brasileiro é um dos países que adota
o sistema acusatório para o processo penal.

3.1.3 Sistema misto

O sistema misto, também chamado de sistema


acusatório formal, surgiu inicialmente na França,
porém foi regulamentado e sistematizado pelo Código
de Napoleão de 1808. Seu auge foi no século XIX, no
qual a maioria dos países da Europa Continental o
adotaram. Atualmente ele vigora em alguns países da
Europa e na América do Sul compondo o sistema
processual penal da Venezuela.
O sistema em testilha possui o mesmo
propósito do sistema inquisitivo, acabar com a
impunibilidade. Tem essa finalidade, pelo fato do
ofendido muitas vezes deixar de comunicar o fato
criminoso por desinteresse, ou por não ter condições de
arcar com as despesas processuais, assim o Estado,
representado pelo juiz tomou parte nas investigações
criminais, afetando inteiramente sua imparcialidade,
pois ele formava seu próprio convencimento para

108
LEONE, Apud. AQUINO, José Carlos G. Xavier de. Manual de processo penal. p. 11/12.
proferir o seu próprio julgamento, desta forma
tornando-se parcial na decisão.109
Além das duas formas citadas no parágrafo
superior, no qual irresignavam o Estado por dar
margem a impunidade, existia ainda um terceiro fator
que não o agradava, seria este a entrada em juízo de
pessoas motivadas apenas pela vingança. Esta não é
aceitável por ferir o significado da justiça, que visa, dar
a cada um o que é seu, estabelecendo uma
proporcionalidade entre o dano e a reparação.
O sistema misto é a fusão do sistema
inquisitivo com o sistema acusatório. A figura do
Ministério Público, o órgão acusador, compõe tal
sistema. Este é dividido em duas fases, inicia com a
investigação com caráter todo inquisitorial, imperando
o sigilo e a não contrariedade, este é realizado pelo juiz,
e na fase final. Então, após todas as provas estarem
carreadas nos autos é dado ao réu todas as garantias do
sistema acusatório, quais sejam, o contraditório,
publicidade, etc.
Sobre a divisão do sistema misto, esclarece
José Malcher:

A forma mista do processo surgiu, primeiramente, na França, após e sob o


influxo da Revolução Francesa, quando a Assembléia Constituinte dividiu o
processo em duas fases; a primeira (fase de instrução), realizado sob forma
inquisitória, secreta, mas pelo juiz; e a segunda (fase de julgamento), com a
oralidade, característica do processo acusatório, admitindo o contraditório
entre as partes e a publicidade (Código de Instrução Criminal de 1808).110

A imperfeição do sistema misto é notória,


posto que a investigação está a cargo do magistrado,
desta forma torna-se parcial para julgar o feito.

109
Cf. RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. p. 48.
110
MALCHER, José Lisboa da Gama. Manual de Processo Penal. p. 57.
Assim como nos demais sistemas é importante
arrolar suas características próprias, portanto Paulo
Rangel é quem expõe da melhor forma:

a) a fase preliminar de investigação é levado a cabo, em regra, por um


magistrado que, com o auxílio da polícia judiciária, pratica todos os atos
inerentes à formação de um juízo prévio que autorize a acusação. [...];
b) na fase preliminar, o procedimento é secreto, escrito e o autor do fato
é mero objeto de investigação, não havendo contraditório nem ampla
defesa, face à influência do procedimento inquisitivo;
c) a fase judicial é inaugurada com a acusação feita, em regra, pelo
Ministério Público, onde haverá um debate oral, público e contraditório,
estabelecendo plena igualdade de direitos entre a acusação e a defesa;
d) o acusado, na fase judicial, é sujeito de direitos e detentor de uma
posição jurídica que lhe assegura o estado de inocência, devendo o órgão
acusador demonstrar a sua culpa, através do devido processo legal [...];
e) o procedimento na fase judicial é contraditório, assegurada ao
acusado a ampla defesa, garantida a publicidade dos atos processuais
[...].111

Existe um atrito entre alguns autores acerca


do real enquadramento do processo penal brasileiro. De
um lado está o entendimento de que o nosso sistema é
acusatório, do outro lado entende-se que o nosso
sistema é de forma mista.
A tese usada para os defensores do sistema
acusatório no nosso processo penal brasileiro é a de
que, o inquérito policial, a fase investigatória, não é
considerado processo, isto porque, as provas colhidas
no inquérito não são utilizadas para convencimento do
magistrado. Estas tem a mera função de fornecer
subsídios para o oferecimento da ação penal, realizado
pelo órgão do Ministério Público ou pelo ofendido. O
inquérito é considerado inquisitivo, por ser ele sigiloso,
secreto, não permitir a presença do advogado e não
amparar o contraditório.112
Na outra esfera da discussão, a que entende
ser o nosso processo penal brasileiro ordenado pelo

111
RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. p. 49.
112
Cf. AQUINO, José Carlos G. Xavier de. Manual de processo penal. p. 14.
sistema misto, apresenta o argumento de que o inquérito
policial é considerado processo, portanto, tem-se a
fusão dos dois sistemas, sendo a parte da investigação
policial inquisitiva e a parte da persecução penal
acusatória, pois neste admite-se todas as garantias
constitucionais do processo penal e naquele não vigora
o princípio constitucional do contraditório.
Flávio Medeiros é um dos que defende
piamente o sistema misto no processo penal brasileiro,
sendo assim explicita:

Entre nós, vigora o sistema misto. O sistema repressivo penal brasileiro


realiza-se em duas fases ou etapas. A primeira fase é o inquérito policial,
tipicamente inquisitivo: o indiciado pode não saber do que é acusado, há
possibilidade de ser feito em sigilo, não há contraditório, são amplos os
poderes da autoridade para investigar o fato, etc... A segunda etapa se
aproxima mais do sistema acusatório: há contraditório, são encarregadas
pessoas distintas para defesa, a acusação e para julgar, a acusação é
anterior à defesa, publicidade, etc...113

Acerca dos dois entendimentos, observa-se que


a celeuma encontra-se no inquérito policial, pois é neste
que existe o conflito. O que determina o sistema
repressivo penal brasileiro, depende exclusivamente se
o inquérito é processo ou não. Sendo ele processo, o
sistema é misto, não sendo ele processo, o sistema é
acusatório.

3.2 INQUÉRITOS EXTRAPOLICIAIS

A palavra inquérito, geralmente nos remete a


idéia de investigação policial, muitos pensam que este é
o único instituto do gênero, porém, o parágrafo único
do art. 4º do CPP, deixa bem claro que qualquer outra

113
MEDEIROS, Flávio Meirelles. Manual do Processo Penal. p. 143.
autoridade administrativa tem o poder de instaurar
inquérito.
Dentro dos inquéritos extrapoliciais podemos
citar: o inquérito policial militar (IPM); o inquérito
judicial; as Comissões Parlamentares de Inquérito
(CPI); o inquérito civil público, criado pela Lei n.
7.347/85; inquérito instaurado pela polícia federal,
solicitado pelo ministro da justiça, com objetivo de
expulsar estrangeiro do país; e outros.114
Os inquéritos extrapoliciais possuem a mesma
finalidade do inquérito policial, que consiste em apurar
os indícios de autoria e a materialidade do fato
criminoso.
O inquérito policial militar é presidido pelas
autoridades militares, visa apurar os indícios de autoria
e a materialidade de crimes cometidos exclusivamente
por militares. No desenrolar das investigações existe a
possibilidade do juízo competente ser do procedimento
Comum, desta forma, o inquérito militar será remetido
ao Ministério Público, sendo que, servirá de base para
o respectivo órgão acusador oferecer a denúncia.115
Temos também o inquérito realizado para
apurar crimes falimentares, conhecido como inquérito
judicial. É regulamentado pelos arts. 103 ao 108 da Lei
de Falências (Decreto-lei nº 7.661/45).
Para tornar melhor o entendimento,
primeiramente, é conveniente expor o conceito de
falência, que assim o descreve, muito bem, Fernando
Pedroso:

Caracterizadas a impontualidade e a insolvência presumida do devedor


comerciante, por não haver pago, no vencimento, obrigação líquida,
constante de título – devidamente protestado pela inadimplência – que

114
Cf. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. p. 73.
115
Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. p. 173.
legitime o processo de execução, ou por ocorrente qualquer das outras
hipóteses elencadas na lei própria (cf. arts. 1º. e 2º. Do Dec.-lei 7.661/45),
declarar-lhe-á o juiz a falência.116

Ocorrendo a falência, instaura-se processo,


que tramitará normalmente em juízo para suprir suas
devidas necessidades, no entanto, constatando-se a
existência de crime falimentar, instaura-se inquérito
judicial, no qual, tramitará paralelamente aos autos da
ação de falência. O inquérito judicial, diferente do
inquérito policial, é presidido pelo próprio juiz da vara
onde tramita a ação de falência e não pela autoridade
policial da respectiva circunscrição.
No inquérito judicial, assim como no inquérito
policial, existe divergência entre os doutrinadores, no
que diz respeito a presença do princípio do
contraditório nesta fase.
Rogério Tucci é um dos juristas que tende para
o lado da aplicação do contraditório na fase de
investigação falimentar. Então, acerca do assunto,
expõe com propriedade:

Percebe-se, [...], a indispensabilidade de estabelecer-se o contraditório


desde o momento determinado para a iniciação da atividade instrutória,
que se realiza, sob a direção de órgão jurisdicional, mesmo sendo ele
incompetente para instrução e julgamento de causas penais.117

O art. 106, da Lei de Falências, é um


dispositivo que incorpora o contraditório no inquérito
judicial, pois este estabelece um prazo de cinco dias
para que o falido conteste as alegações feitas nos autos
de inquérito contra sua pessoa, podendo também,
requerer provas a seu favor.

116
PEDROSO, Fernando de Almeida. Processo penal: O direito de defesa: repercussão, amplitude, e limites.
3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 87.
117
TUCCI, Rogério Lauria. Persecução penal, prisão e liberdade. São Paulo: Saraiva, 1980. p. 51.
Fernando Pedroso, em sua obra, faz um apelo
para que o prazo de cinco dias não corra em cartório de
maneira contínua e peremptória, mas que, respeitando-
se os freqüentes julgados a favor, passe a transcorrer
somente após a intimação pessoal do falido.118
Paulo Rangel discorda deste entendimento,
pois, alega que não existe acusação na fase de inquérito
judicial. O prazo de cinco dias para contestar,
estabelecido pelo art. 106 da Lei de Falências, corre em
cartório e não sendo apresentada a contestação não
acarreta nenhum vício que contamine a ação penal,
desta forma, não configura a existência de
119
contrariedade nas investigações.
Apesar de toda discussão sobre o assunto,
entende-se que o inquérito judicial deve conter a
indispensável importância do contraditório. Além deste,
o inquérito instaurado pela polícia federal, a pedido do
ministro de justiça, visando à expulsão de estrangeiro,
também admite o contraditório.
Findo o inquérito em tela, deverá ser este
remetido ao órgão ministerial para oferecimento da
denúncia.
Existe ainda, o inquérito instaurado e
presidido pelo órgão do Ministério Público, conhecido
como inquérito civil. Este é regulamentado pela Lei nº
7.347/85 e adquiriu esta nomenclatura porque é peça
investigatória com finalidade de embasar futura ação
civil pública. Tal inquérito é responsável pela colheita
de provas referentes a danos causados ao consumidor,

118
Cf. PEDROSO, Fernando de Almeida. Processo penal: O direito de defesa: repercussão, amplitude, e
limites. p. 90.
119
Cf. RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. p. 142/143.
ao meio ambiente, a bens e direitos de valor artístico,
histórico, estético, paisagístico e turístico.120
Não se pode deixar de abordar, entre estes
enumerados, as Comissões Parlamentares de Inquérito,
representados pela sigla CPI. Tal inquérito é
desempenhado por membros do Poder Legislativo,
dentre este poder estão, o Senado Federal, a Câmara
dos Deputados, ou ainda, as Assembléias Legislativas
pertencente a cada unidade federativa.
A CPI, também conhecida como inquérito
parlamentar, possui caráter investigatório e
informativo, tendo como função apurar crimes
relacionados as funções parlamentares. Pietro Virga,
com sabedoria define inquérito parlamentar: “[...]
entende-se por inquérito parlamentar toda e qualquer
investigação levada a efeito por uma comissão
escolhida por uma ou ambas as Câmaras, para a
cognição de fatos ou inquisição de dados necessários ao
exercício das funções parlamentares.” 121
Averiguando-se a existência de crime de
competência da justiça comum, deverá os autos de
inquérito parlamentar ser remetido ao órgão do
Ministério Público, para que este com base nas
investigações realizadas durante o inquérito ofereça a
denúncia.
Os inquéritos arrolados neste tópico são
alguns exemplos de inquéritos extrapoliciais existentes
no ordenamento jurídico brasileiro. Através do amplo
esclarecimento dado a cada um verificou-se que todos
possuem basicamente a mesma finalidade, qual seja,
colher provas acerca de um fato criminoso.

120
Cf. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. p. 173.
121
TUCCI, Rogério Lauria. Persecução penal, prisão e liberdade. p. 56.
3.3 PROCESSUALIZAÇÃO DO INQUÉRITO
POLICIAL

Como já foi objeto de estudo neste trabalho, o


inquérito policial é peça presidida por uma autoridade
policial, detém um caráter informativo e preparatório e
tem como finalidade obter provas para solucionar um
fato criminoso, sendo que, consiste este na apuração
dos indícios de autoria e materialidade do delito. O
inquérito, além destas finalidades, serve de
embasamento para a formação da opinio delicti, para
que posteriormente, acarrete, ou não, no possível
oferecimento da denúncia pelo órgão do Ministério
Público.
Existe uma celeuma acerca do inquérito
policial. Alguns autores opinam pela sua extinção por
ser ele um procedimento inútil, alegam que as provas
colhidas durante as investigações são relativas,
necessitando posterior confirmação em juízo para sua
validade; desta forma, não havendo a devida
confirmação o réu deve ser absolvido. Na outra esfera
da discussão, o inquérito é considerado um
procedimento de grande importância, pois a maioria
das decisões são fundamentadas nas provas angariadas
na fase investigatória. Por esta argüição e pelo amparo
da Constituição Federal em seu art. 5º, LV, deve ser
instaurado o princípio do contraditório no respectivo
inquérito.122
A processualização do inquérito policial é
imprescindível para a obtenção da garantia
constitucional do contraditório, pois, “A

122
Cf. JORGE, Higor Vinícius Nogueira. A processualização do inquérito policial: é possível o contraditório
no inquérito? Jus Libertatis. Disponível em: http://www.higorjorge.hpg.com.br/artigo-doip.html.
processualização do inquérito policial consiste no
afastamento do mecanismo inquisitorial do inquérito,
admitindo o contraditório. A processualização enseja a
não repetição em Juízo das provas obtidas no
procedimento investigatório.123
Entende-se que é inútil haver a repetição das
provas em juízo. Aplicando-se o contraditório na fase de
investigação, as demandas serão julgadas com mais
celeridade, pois dispensará a referida confirmação das
provas.
O art. 5º, LV, da nossa Carta Magna, assevera
a existência de tal princípio na fase investigatória,
dispondo que: “aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e ampla defesa, com os
meios e recursos a ela inerentes”.
Os cientistas do direito, a favor da
aplicabilidade do contraditório no inquérito policial,
encontraram neste dispositivo constitucional o
fundamento jurídico necessário para fortalecer suas
teses, pois a Constituição trouxe tal axioma também
para os processos administrativos.
No ponto a seguir faremos uma análise ao art.
5º, LV, da Constituição Federal de 1988, descrevendo
as correntes favoráveis a aplicabilidade do princípio do
contraditório na investigação criminal.

123
JORGE, Higor Vinícius Nogueira. A processualização do inquérito policial: é possível o contraditório no
inquérito? Jus Libertatis. Disponível em: http://www.higorjorge.hpg.com.br/artigo-doip.html.
3.4 ANÁLISE LITERAL DO ARTIGO 5º, LV, DA
CONTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988.

A aplicabilidade do princípio do contraditório


no inquérito policial é um tema de relevante
importância, sendo que, vem de algum tempo a
discussão acerca de sua admissão. A Carta Maior
anterior não mencionava em seu livro qualquer
dispositivo acerca do assunto, porém, com grande
influência da Sexta Emenda à Constituição Norte
Americana de 1791, nossa atual Constituição conjugou
respeitáveis garantias à pessoa humana, dentre elas, o
art. 5º, LV.
O artigo supra citado dispõe em sua letra que:
“aos litigantes, em processo judicial ou administrativo,
e aos acusados em geral são assegurados o
contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a
ela inerentes”.
Esta redação constitucional é o fundamento
principal utilizado pelos doutrinadores que defendem o
contraditório na investigação.
A questão da admissão, ou não, do
contraditório na primeira fase da persecutio criminis
reside em admitir-se a existência de litigantes na
investigação, em decorrência do conflito de interesses; e
a confirmação de que o legislador, ao redigir o inciso
LV, quis dizer procedimento administrativo ao invés de
processo administrativo, tornando-se tal argumento
relevante, dado a confusão feita pelos nossos
legisladores acerca da diferenciação entre processo e
procedimento. Observando-se tais questionamentos é
interessante que se faça um estudo literal de tal
dispositivo constitucional.
Sobre a celeuma existente entre processo e
procedimento, conforme descrito no parágrafo superior,
Tucci pondera da seguinte forma:

Essa referência, porém, evidencia reiterada confusão terminológica, e até


mesmo conceptual, entre processo e procedimento, que se tradicionalizou
em nosso País, falando-se num, quando, na realidade, se quer cogitar de
outro: a própria Constituição Federal, como, visto, expressa “ processo
administrativo”, quando está aludindo a procedimento administrativo
(qual seja, entre outros, o inquérito policial – “procedimento
administrativo - persecutório de instrução provisória, destinado a preparar
a ação penal” 124

Corroborando a assertiva supra citada,


Medauar descreve:

[...] dada a ausência de técnica do legislador no ato de edição normativa,


muito bem seria possível “a utilização do vocábulo processo para designar
procedimento”, enquadrando -se aí o procedimento administrativo que é o
inquérito policial, inserindo desde esta etapa a figura do “acusado” e,
portanto, admitindo o contraditório, na medida em que existe a
dispositividade da determinação da atuação do defensor do indiciado que
não pode ser confundida, à evidência, com a contrariedade real, ínsita à
efetiva assistência.125

Como é sabido, os legisladores não gozam de


conhecimento técnico, no caso o conhecimento jurídico;
desta forma, ao redigirem as letras dos artigos que
compõem nosso ordenamento jurídico, equivocam-se,
trocando termos que, a primeira vista, parecem ter o
mesmo sentido, porém, na realidade, seus significados
são completamente diferentes.
Ocorre que, quando confundidos, provocam
uma tempestade na doutrina, pois oferecem margem a
múltiplos entendimentos, como é o caso do art. 5º, LV
da nossa Constituição Federal, que implanta o
contraditório no inquérito policial, mas pela sua má
redação ainda existe uma discussão duradoura a

124
TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro. São Paulo: Saraiva,
1993. p. 380.
respeito do assunto, pois os estudiosos anteriores a
Constituição de 1988 se negam a admitir tal evolução
em nosso direito, doutrinando, ainda, no sentido da não
aplicabilidade do respectivo axioma.
Além deste entendimento, Tucci ainda
interpreta outros pontos duvidosos no dispositivo em
questão. Quando o texto fala de acusados em geral está
se referindo de forma ampla, alcançando todos aqueles
imputados por algum fato ilegal, mesmo que não
formalmente concretizado. Obtêm-se certeza na
afirmação ao constatar-se que, se essa não fosse a
intenção do legislador ele apenas refereria-se a
acusados, restando desnecessário a colocação da
palavra em geral.126
É nítido que o dispositivo procurou alcançar
todos aqueles, sem distinção, que por algum motivo
transgrediram a lei e, por conseqüência, sofreram
imputação penal.
Outra questão a ser dirimida é a existência de
litigantes na fase de investigação. A corrente adversa
defende que no inquérito policial não há conflito de
interesses, por tratar-se de mero meio de apuração de
provas, portanto não figura litigantes. Logo, a corrente
que navega a favor do contraditório na investigação
alega que há conflito de interesses, ocorrendo, assim, a
presença de litigantes.
Existem autores que dizem ser o inquérito
policial um procedimento administrativo onde figura um
acusado no pólo passivo. Fortes Barbosa é um destes
autores:

125
MEDAUAR, Apud. CHOUKR, Fauzi Hassan. Garantias constitucionais na investigação criminal. 2. Ed.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001. p. 127.
126
Cf. TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro. p. 381.
Calcado na mesma idéia de ser o inquérito policial um procedimento
administrativo onde existe um “acusado”, conclui pela existência do
contraditório já nesta fase, colocando o tema como pauta para a revisão
constitucional de 1993, vez que parece de cristalino entendimento, referente
à necessidade do contraditório no inquérito policial, com a presença
obrigatória do defensor, do indiciado, ou como quer que se chame.127

Tal dispositivo constitucional admite a


garantia do contraditório na investigação criminal,
posto que, existe conflito de interesses, entre Estado e
indiciado, caracterizando-se assim, a existência de
litigantes. O artigo em tela é claro quando versa que,
aos litigantes em processo administrativo é assegurado
o contraditório, sendo assim, emerge a obrigação de
serem estabelecidas as garantias pertinentes ao
processo.128
O art. 5º, LV, da CF/88, possui uma aplicação
geral a qualquer imputado por fato criminoso, desta
forma, Tucci acerca da amplitude de tal preceito legal
impõe o dever de:

“reconhecer que o dispositivo procurou ser de extrema abrangência, no


tocante aos seus destinatários” (fato tido como assaz louvável); e aduzindo,
verbis: “com efeito, além de tornar c erto que o preceptivo se volta aos
litigantes em processo judicial, conferiu igual destinação aos envolvidos em
processo administrativo. Esta inclusão foi extremamente oportuna porque
veio consagrar uma tendência que já se materializava em nosso direito,
qual seja: a de despertar essas garantias aos indiciados em processo
administrativo”. 129

Diante deste estudo, observou-se que a nossa


Magna Carta conferiu aos indiciados o justo direito de
contraditoriedade, posto que, o inquérito policial, visto
como procedimento administrativo, está inserido neste
ditame constitucional. Admitindo-se o inquérito neste
texto legal admite-se o contraditório a todos os
indivíduos que nele figuram.

127
CHOUKR, Fauzi Hassan. Garantias constitucionais na investigação criminal. p. 127/128.
128
Cf. JORGE, Higor Vinícius Nogueira. A processualização do inquérito policial: é possível o contraditório
no inquérito? Jus Libertatis. Disponível em: http://www.higorjorge.hpg.com.br/artigo-doip.html.
3.5 IMPORTÂNCIA DAS PROVAS COLHIDAS NO
INQUÉRITO POLICIAL

As provas colhidas no inquérito são de grande


importância, pois, são essenciais na preparação do juiz
para formulação da sentença. Pode-se dizer que as
provas obtidas na investigação são responsáveis pela
maior parte das condenações.
Ocorre que as provas adquiridas nesta fase só
podem ser consideradas válidas se confirmadas em
juízo, caso contrário não servem como suporte de
condenação, restando ao réu apenas sua absolvição.
Procede-se desta forma, por não estar tal fase sob a
égide do princípio do contraditório.
Há correntes que não admitem ser o inquérito
policial mera peça informativa. O respaldo para tal
entendimento está nos exames periciais, pois estes
quando realizados, na fase investigatória, não precisam
ser repetidos em juízo, claro, desde que processados
conforme a lei determina.130
Bismael Moraes é um dos que defende esta
corrente, não admitindo o inquérito como mera peça
informativa, porquanto dispõe:

Peça de competência da Polícia Judiciária – diz ele – tem o inquérito


policial elementos de inegável efeito judiciário, destacando-se – como bem

129
TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro. p. 382.
130
Cf. MEHMERI, Adilson. Inquérito policial: dinâmica. p. 13.
o demostrava o Prof. Cândido Mendes – os autos de prisão em flagrante
delito, os exames de corpo de delito, as prestações de fiança etc.131

O procedimento atual, que consiste na


corroboração em juízo das provas colhidas na
investigação, proporcionam uma lentidão na resolução
do litígio deixando os litigantes com uma sensação de
insatisfação. O autor vê seu direito se perder no lapso
temporal, e o acusado, quando inocente, depara-se com
sua liberdade e sua moral extremamente abaladas.
Com a aplicação do contraditório na fase
preliminar elimina-se a necessidade de corroboração
das provas no juízo criminal, isto vale para todos os
meios probatórios existentes no ordenamento jurídico.
Adotando-se este procedimento ter-se-á uma justiça
mais célere e eficaz.
Sobre a magnitude que tem as provas
realizadas na investigação, Bismael Moraes descreve:

Mittermaier, mostrando que a sentença sobre a verdade dos fatos da


acusação tem por base a prova, conclui que é sobre esta que versam as
prescrições legais mais importantes em matéria de processo criminal. E
perguntamos: entre nós, onde são colhidas as provas materiais, em geral,
perenes e imutáveis, senão no inquérito policial?132

Observa-se que no texto supra citado, o autor


menciona a grande importância das provas colhidas na
investigação, ao formular tal questionamento clama por
uma solução, esta que só se poderá suprir-se com a
aplicabilidade do princípio do contraditório no
inquérito policial.
A aplicabilidade deste axioma torna-se
imprescindível na investigação criminal, tendo em vista
que, os elementos colhidos nesta fase são difíceis de se
obter na instrução judiciária. Com a aplicabilidade do

131
MORAES Apud. MEHMERI, Adilson. Inquérito policial: dinâmica. p. 13.
132
MORAES, Apud. MEHMERI, Adilson. Inquérito policial: dinâmica. p. 13.
mesmo as provas obtidas na fase preliminar terão
validade e eficácia sem a obrigatoriedade de
corroboração em juízo.

3.6 PARTICIPAÇÃO DO ADVOGADO E


CONTRADITORIEDADE NA INVESTIGAÇÃO
CRIMINAL

O advogado na fase preliminar é de grande


valia, pois é ele quem estabelece o caráter contraditório
na relação entre Estado e indiciado. Ele tem o dever de
fornecer assistência técnica ao indiciado, participando
de todos os atos praticados pela autoridade policial e
seus agentes, ou seja, deve atuar profissionalmente
como representante legalmente habilitado. A partir do
momento que exerce sua ampla função de defensor, está
introduzindo a tal fase o dogma constitucional da
contraditoriedade.
No inquérito policial o indiciado é tratado
como mero objeto de investigação, ficando vulnerável a
diversos métodos ilícitos utilizados pelas autoridades
despreparadas e desonestas, tais como, a tortura, as
humilhações, a antecipada manifestação da imprensa e
outros, assim desrespeitando um dos mais valiosos
fundamentos da nossa República, a dignidade da pessoa
humana.133
Fauzi Choukr, expõe seu pensamento acerca
da presença do advogado para o indiciado:

O acompanhamento das diligências e a faculdade de requerimento junto ao


titular da investigação certamente são sinais de preocupação com a
dignidade do suspeito e o colocam como sujeito da investigação, e não seu

133
Cf. FURTADO, Renato de Oliveira. O advogado e o inquérito policial. Disponível em: http// www.ambito-
juridico.com.br/aj/dpp0020.html.
objeto. Esta postura claramente se filia à matriz acusatória do processo
penal e vai ao encontro das modernas tendências reformistas em curso na
Europa e América Latina.134

É importante expor neste trabalho os dizeres


de Carlos Edwards, no qual são ensinamentos
originários de países mais cultos. Portanto, já a muito
tempo vem doutrinando o que segue:

Dentro del cuadro de situación descripto, com un preponderante


protagonismo policial en la investigación y un mínimo control judicial, se
hace imperioso el imputado tenga asistencia letrada en la prevención, y que
pueda ejercer plenamente en dicha sede su derecho de defesa. Partimos de
una premisa fundamental en nuestra análisis: el imputado debe contar com
asistencia letrada em sede prevencional, es decir con un defensor técnico
que lo asista y asesore jurídicamente en todas las diligencias que se
practiquen durante la prevención.135

Com a exposição de tais ensinamentos torna-


se claro a necessidade e importância da presença do
advogado, como profissional técnico, no inquérito
policial. “Em sua constitucional missão (art. 5º, LXIII,
C.F./88) afigura-se o advogado, para o indiciado ou
preso, qual tábua de náufrago em bravio mar.” 136 Nesta
expressão quis-se dizer do apoio que o advogado deve
prestar ao investigado, livrando-o do arbítrio da
autoridade policial.
“Para a autoridade policial, especificamente
quando esta mostra-se arredia aos cânones
constitucionais e moralmente refratária, o que esta vê
são apenas os pregos desta tábua.” 137 Dando

134
CHOUKR, Fauzi Hassan. Garantias constitucionais na investigação criminal. p. 130.
135
EDWARDS, Apud. TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro.
p. 388. Tradução: dentro do quadro da situação descrita, com um preponderante protagonismo policial na
investigação é no mínimo controle judicial, se faz imperioso que o imputado tenha assistência técnica na
prevenção, e que possa exercer plenamente em tal sede seu direito de defesa. Partimos de uma premissa
fundamental em nossa análise: o imputado deve contar com assistência técnica em sede prevencional, é contar
com um defensor técnico que o assista e assessore juridicamente em todas as diligências que se pratiquem
durante a investigação.
136
FURTADO, Renato de Oliveira. O advogado e o inquérito policial. Disponível em: http:// www.ambito-
juridico.com.br/aj/dpp0020.html.
137
FURTADO, Renato de Oliveira. O advogado e o inquérito policial. Disponível em: http:// www.ambito-
juridico.com.br/aj/dpp0020.html.
continuidade, nesta frase Furtado menciona a
infelicidade do delegado de ter sua privacidade
fiscalizada, impedindo-o de realizar atos ilícitos na
procura pela prova incriminadora.

É errado o entendimento de que o advogado


ao participar no inquérito estará bisbilhotando as
investigações, ou seja, atrapalhando os procedimentos
policiais de modo a prejudicar a resolução do fato
criminoso. Tal afirmação é frágil desculpa para afastar
o contraditório da investigação criminal,
proporcionando-lhes o livre arbítrio longe de qualquer
sanção.
Não entende-se o motivo desta aversão a
aplicabilidade do princípio do contraditório no
inquérito policial se existe conflito de interesses entre
Estado e cidadão e a nossa Constituição prevê tal
garantia em seu art. 5º, LV. Vale ressaltar que, não
havendo a contraditoriedade está se permitindo que as
autoridades policiais abusem de seu poder, tratando o
investigado como um simples objeto e não como um
sujeito de direito, que é como este deveria ser
recepcionado.
Antônio Duarte sobre a afastabilidade das
fórmulas sigilosas, inquisitoriais e arcaicas do inquérito
policial, expõe:

O que se quer é o equilíbrio, é o meio, é a luz, sempre asséptica, sobre


provas carreadas pela investigação. [...] o inquérito policial diante dos
princípios e garantias constitucionais hoje vigentes, não pode sobreviver às
fórmulas sigilosas, inquisitórias e arcaicas ainda empregadas e defendidas
pela mais respeitável doutrina.
Estamos desprezando importantíssimas garantias conquistadas em lutas
obstinadas travadas ao longo da história das relações sociais do povo
brasileiro. nós que de alguma forma militamos com o Direito devemos ter
sempre em mente que o fim de toda atividade estatal é o homem, e que “o
homem e a sociedade não se escravizam a um direito; o direito é que deve
ajustar-se e orientar-se no sentido do fato social. 138

Para finalizar este trabalho, é de grande valia


abordar a entrada em vigor da Lei nº 10.792/03, que
modificou a parte do interrogatório no processo penal.
O art. 185 da antiga lei não referia-se ao
advogado em sua letra, realizando-se assim, o
interrogatório, até mesmo em juízo, sem a presença do
mesmo.
Com o advento da Lei nº 10.792/03, o art. 185
do Capítulo III do Título VII do CPP, passou a dispor
que, o acusado seja interrogado na presença de seu
defensor, constituído ou nomeado.

Desta forma, ao analisar o art. 6º, V do CPP,


dispondo que a autoridade policial deverá “ouvir o
indiciado, com observância no que for aplicável, do
disposto no Capítulo III do Título VII, deste Livro [...]”;
observou-se que, o investigado no momento do
interrogatório deverá estar acompanhado de um
advogado para prestar sua defesa técnica, podendo no
entanto formular questionamentos.
Tourinho Filho sobre a questão do
interrogatório do indiciado esclarece:

[...] Como acentua o inc. V do art. 6º do CPP, deverá a autoridade policial


observar o disposto no Capítulo III do Título VII do Livro I, isto é, os arts.
185 e s. do CPP. Com tal expressão, quer o legislador dizer que o
interrogatório do indiciado deverá ser realizados dentro daquelas mesmas
normas e garantias que norteiam o interrogatório levado a efeito pela
Autoridade Judiciária [...].139

138
FURTADO, Renato de Oliveira. O advogado e o inquérito policial. Disponível em: http:// www.ambito-
juridico.com.br/aj/dpp0020.html.
139
TOURINHO FILHO Apud. FERNANDES, Fernando Augusto Henriques. Interrogatório contraditório no
inquérito policial. Boletim IBCCRIM. São Paulo, v. 12, n. 138, p. 6-7, maio 2004.
Caso não seja observado tal dispositivo legal,
o interrogatório deverá ser considerado ilícito,
resultando na sua nulidade.
O direito processual penal constitucional
moderno, implantou no inquérito policial a garantia do
princípio do contraditório, conforme visto durante este
estudo, portanto não devemos fechar os olhos diante de
tais garantias, se assim o fizermos estaremos rasgando
a nossa Constituição da República.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para apontar-se a conclusão alcançada ao final desta pesquisa, faz-se necessário


transcrever, inicialmente, de forma breve, a respeito de cada capítulo.
Primeiramente abordou-se os princípios básicos do processo penal, tendo em vista
sua indispensabilidade na formação inicial do entendimento sobre o assunto, posto que,
fornece um conhecimento básico e geral indispensável para o prosseguimento da pesquisa,
sendo que, sem ela, não se obteria a compreensão total do tema. Os princípios são a base do
nosso ordenamento jurídico, estabelecem uma seqüência ao direito, direcionando as normas
num sentido lógico e necessário para suprir as necessidades existentes na sociedade.
Aprofundou-se um pouco mais o tema no capítulo referente ao inquérito policial,
pois este possui caráter mais técnico, residindo nele a questão acerca da aplicabilidade do
princípio do contraditório. A investigação criminal é presidida por uma autoridade policial e
visa a apuração dos indícios de autoria do fato criminoso e a materialidade do delito. É peça
preparatória, no qual, serve de embasamento para a formação da opinio delicti do órgão
acusador para que este ofereça ou não a denúncia.
No terceiro capítulo é feito um estudo acerca da aplicação do princípio do
contraditório no inquérito policial. Neste são apresentados todos os pontos favoráveis para a
admissão de tal axioma jurídico.
Para que se possa admitir o contraditório na fase preliminar é necessário que se
afaste o caráter inquisitório do inquérito, deixando este de ser mera peça informativa. Com a
aplicação desta garantia constitucional as provas adquirem valor na instrução, eliminando a
obrigatoriedade de corroboração destas na fase judicial.
Como foi objeto de estudo no capítulo 3, o art. 5º, LV, da CF/88, é o dispositivo
responsável pela inserção do contraditório na investigação criminal. Este artigo dispõe em sua
letra que: aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
É certo que nossos legisladores não gozam de conhecimentos técnicos próprios para
elaborar um dispositivo jurídico, sendo assim, cometem inúmeros erros de redação por
confundirem termos técnicos. É o que ocorre entre processo e procedimento; estes vocábulos,
para um leigo, podem possuir a mesma significação, mas para os estudiosos do direito são
termos com sentidos completamente diversos, que quando confundidos podem causar um
transtorno imenso no ordenamento jurídico. É o que acontece com o art. 5º, LV, da CF/88, o
legislador, ao invés de “processo judicial e administrativo”, quis dizer “processo judicial e
procedimento administrativo”. Ainda, se esta não fosse a intenção, não haveria a necessidade
da expressão “acusados em geral”, apenas se falaria em “acusados”.
Outro argumento utilizado contra a inquisitoriedade é a importância das provas
colhidas no inquérito policial. Com a incidência do contraditório, estas provas adquirem força
judicial, não havendo a necessidade de corroboração destas em juízo, tornando a prestação
jurisdicional mais célere e eficaz.
O mais forte dos argumentos é a atuação do advogado no inquérito policial, pois é
ele quem realmente estabelece o caráter contraditório na fase preliminar. O indiciado deve
contar com um defensor técnico que o assessore juridicamente em todas as diligências que se
pratiquem durante as investigações.
A presença de defensor no inquérito transmite ao imputado uma maior segurança,
posto que, existem policiais que utilizam meios ilícitos para a obtenção de provas que possam
condenar o indiciado. Autoridades policiais despreparadas são capazes de proceder de tal
forma para não cair em descrédito seus superiores, com a imprensa ou com a sociedade.
Dentre as provas obtidas por meios ilícitos, pode-se citar, como melhor exemplo, a confissão
adquirida mediante tortura.
A Lei nº 10.792/03 alterou a redação do art. 185 do CPP (Capítulo III do Título VII
deste Livro), dispondo atualmente que, o acusado seja interrogado na presença de seu
defensor, constituído ou nomeado. Da análise do art. 6º, V, do CPP, verifica-se que, a
autoridade policial deverá ouvir o indiciado, com observância no que for aplicável, do
disposto no Capítulo III do Título VII do CPP; conseqüentemente, está consagrado, através
destes ditames legais, que o advogado deve assessorar o indiciado no que for preciso durante
o inquérito policial.
Vale esclarecer que, ao advogado está assegurado o direito de tomar conhecimento
das provas produzidas na investigação, o direito de contrariá-las, arrolar testemunhas e
promover perguntas.
O indiciado não pode mais ser tratado como mero objeto de investigação, e sim como
sujeito de direito.
A constituição existe para ser cumprida, ela está acima de qualquer norma jurídica,
devendo ser respeitado tudo que nela constar. É hipocrisia falar que a cada momento
buscamos o respeito à dignidade da pessoa humana se, no inquérito policial, figura um
sistema inquisitivo onde o indiciado é muitas vezes tratado como figura subumana.
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TUCCI, Rogério Lauria. Persecução penal, prisão e liberdade. São Paulo: Saraiva, 1980.

TUCCI, Rogério Lauria. Teoria do direito processual penal: jurisdição, ação e processo
penal (estudo sitemático). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
ANEXO

INQUÉRITO POLICIAL

FLUXOGRAMA

A B E R T U R A D E IN Q U É R IT O P O L IC IA L

A Ç Ã O P E N A L P Ú B L IC A A Ç Ã O P E N A L P R IV A D A

P O R T A R IA R E Q U IS IÇ Ã O R E Q U E R IM E N T O N O T ÍC IA S
AUTO DE
a rt. 5 º, I, d o d e a u to rid a d e d o o f e n d id o ou d e REPRESEN C o m u n ic ad o p or REQUERI
FLAG R AN T E
CPP ju d ic iár ia o u q u e m te n h a TAÇÃO e s c r ito d e MENTO
A r ts . 3 0 1 e
C o m u n ic ad o do M P q u a lid a d e p a ra ( A rt. 5 º, § 4 º q u a lq u e r d o p o vo A r t. 5 º, § 5 º d o
s e g u in te s
ve r b a l ( ar t. 5 º , II, r ep r e s e n tá -lo do C PP ) ( ar t. 5 º , § 3 º d o CPP
CPP
( ar t. 5 º , § 3 º) CPP) ( ar t. 5 º , II, C P P ) CPP)

C o m u n ic aç ã o a o ju iz q u e
A U T O D E P R IS Ã O E M m an te rá o u r e la xa rá a p r is ã o DESPACHO
F L A G R A N TE
( C F a rt. 5 º , L X V )
- A p re s e n ta ç ã o d o p re s o à
a u t o rid a d e p o l ic ia l p e l o c o n d u to r;
- D e p o i m e n to d o c o n d u to r;
- D e p o i m e n to s d a s te s te m u n h a s ; N o ta d e c u lp a
- D e c l a ra ç õ e s d o o fe n d id o (s e
p o s s íve l)
- C ie n t ific a ç ã o d o s d ire ito s
c o n s tit u c io n a is d o c o n d u z id o P r o s s e g u e - s e c o m a c o lh eita
- In te rro g a t ó rio d o c o n d u z i d o d a s d e m a is p ro va s P R O V A S IN F O R M A T IV A S P R O V A S M A T E R IA IS
in f or m a tiva s e m a te ria is - D e c la r aç õ e s d o o fe n d id o - a p r ee n s ã o d e in s tr u m e n to s
( ar t. 6 º , IV e 2 0 1 d o C P P ) e o u tr os o b je to s r ela c io n a d o s
- d e p oim e n to d e c o m a o c o r rê n c ia (a r t. 6 º, II
te s te m u n h a s do C PP )
( ar t. 6 º , III e 2 0 3 d o C P P )
- in te r ro g ató r io d o d o P E R ÍC IA S E M G E R A L
L ib er d ad e p ro vis ó ria c o m in d ic iad o - e xa m e d e lo c a;l
L ib er d ad e P r ov is ó r ia f ia n ç a : ( ar t. 6 º , V , e 1 8 8 d o C P P ) - M é d ic o - le g a l;
s e m f ia n ç a - a r b itra m e n to - a c a r ea ç ã o - b a lís tic a;
( ar t. 3 2 1 , I e II, C P P ) (a r t. 3 2 5 , 3 2 6 , 3 3 2 C P P ) ( ar t. 6 º , V I e 2 2 9 d o C P P ) - to xic o ló g ic a;
- r e c o lh im e n to - r e c o n h e c im e n to d e - a va lia ç ã o ;
( ar t. 3 3 1 d o C P P ) p e s s o a s ou d e c o is a s ( a rt. - e xa m e s d e d o c u m e n tos ;
- te r m o d e f ia n ç a 6 º, V I e 2 2 6 ) - e xa m e d e a rm a s e
( ar t. 3 2 9 C P P ) - r e la tór io d o a g e n te p o lic ia l in s tr u m e n to s u s a d o s n a
- in tim a ç ã o d as o b rig a ç õ es (a r t. 6 º , III) in f ra ç ã o
( ar ts . 3 2 7 e 3 2 8 C P P )

P R O V A S C O M P LE M E N T A R E S
- in f o rm a ç õe s s o b r e a vid a p r e g re s s a d o
in d ic iad o
( ar t. 6 º , IX , d o C P P )
- r e p ro d u ç ã o s im u la d a ( a rt. 7 º d o C P P )

B O L E T IM IN D IV ID U A L

R E L A T Ó R IO D O
D ELEG AD O

RETORNO PARA
R E M E S S A A O J U D IC IÁ R IO
D IL IG Ê N C IA S

D E N Ú N C IA

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