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POR UMA SOCIOLOGIA DO

DESEMPREGO*

Nadya Araujo Guimarães

A reflexão que apresento a seguir resulta do mação social) da nova figura do “desempregado
interesse em enfrentar um desafio interpretativo, de longa duração”.
qual seja, o de entender os elos entre os fenôme- Segunda: compararei os desenvolvimentos
nos do emprego e do desemprego em contextos teóricos (voltados a entender este fenômeno) com
de intensa flexibilização do trabalho e de recons- os esforços empreendidos pela sociologia brasilei-
trução institucional e normativa dos padrões de ra do trabalho no sentido de interpretar a proble-
proteção ao trabalhador. Desenvolverei a minha mática do desemprego, a partir da análise dos
argumentação em três direções. elos desse fenômeno com a natureza da organiza-
Primeira: procurarei rastrear o movimento ção social e com os padrões de desigualdade vi-
de re-significação que se opera em torno da no- gentes em nosso país.
ção de “desemprego”, perseguindo, com a litera- Terceira: argumentarei em favor do valor
tura sociológica recente, a constituição (e legiti- heurístico de se recorrer a comparações contex-
tualizadas – à luz de achados recentes relativos à
fluidez entre fronteiras ocupacionais e ao trânsito
* Versão revista de comunicação apresentada ao entre situações no mercado de trabalho em outros
XXV Encontro Anual da Anpocs, Caxambu, 16-20 países – com o intuito de discutir a validade de hi-
de outubro de 2001, Seminário Temático “Traba- póteses desenvolvidas pela sociologia do desem-
lhadores, Sindicatos e Nova Questão Social”, Ses-
prego (na Europa e, sobretudo, na França) para
são “Teorias e Configurações da Classe Trabalha-
dora Hoje”. interpretarmos o caso brasileiro.

RBCS Vol. 17 no 50 outubro/2002


o
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Da sociologia do trabalho à sociologia do A primeira via procurou elaborar descrições


emprego? Mudanças estruturais e resig- cuidadosas sobre os trabalhadores “sobreviven-
nificação de conceitos tes”, seja no sentido de caracterizar as novas prá-
ticas de emprego, seja no de refletir sobre as
A intensa reestruturação produtiva que se ge- chances de reinserção (ou, as “condições de em-
neralizou pelos países industrialmente mais avança- pregabilidade”, para usar o jargão) dos que se en-
dos, a partir dos anos de 1980, tem sido especial- contravam fora dos postos de qualidade no mer-
mente estudada pelos seus efeitos na reconfiguração cado de trabalho. O pressuposto (nem sempre ex-
tecnológica e organizacional de ambientes produti- plícito) que norteia essa primeira via de análise é
vos, notadamente da indústria de transformação. que, em condições de ampla oferta de trabalho, e
Cuidadosas análises debruçaram-se sobre o cotidia- cabendo ao empresário o exercício soberano da
no da organização e gestão, tanto da produção seleção, era plausível acreditar que as característi-
quanto do trabalho, identificando mudanças que cas da mão-de-obra empregada expressassem,
apontariam para novos paradigmas de produção. primordialmente, os requerimentos das políticas
A literatura produzida pela sociologia do tra- patronais de recrutamento e seleção, os quais
balho desde cedo chamou a nossa atenção para (exatamente pela oferta quase ilimitada de traba-
significativas alterações: (i) das práticas de empre- lho) podiam se desvincular dos eventuais cons-
go, com impactos sobre o tamanho dos efetivos trangimentos impostos pelo perfil dos indivíduos
(administrativos e operacionais), dando lugar a no- em busca de trabalho.
vas formas contratuais que segmentaram mercados A segunda via procurou analisar as caracterís-
internos e externos de trabalho; (ii) do conteúdo ticas dos próprios desempregados. Volume e for-
dos postos e da divisão de tarefas na operação di- mas do desemprego, ao lado do perfil dos traba-
reta dos processos produtivos; (iii) da divisão do lhadores desocupados, seriam bons indicadores
trabalho na empresa, e da estrutura ocupacional para localizar e descrever aqueles grupos sociais
dela resultante; (iv) das relações de hierarquia e de com menores chances de inclusão. Por que chegar
autoridade, vale dizer, das novas formas de divisão até eles se já se disporia, com a primeira via, de
e circulação do poder nas organizações, com espe- uma boa aproximação aos requerimentos empre-
cial interesse para os mecanismos de produção de
sariais? Porque só assim seria possível dimensionar
consentimento em contextos sob intensa mudança
o hiato entre características pretendidas pelos em-
e restrição de antigos direitos.
pregadores e “ativos” de qualidades efetivamente
Uma vez que esses estudos tinham nos lo-
possuídos pelos que demandavam trabalho. Sem
cais de trabalho as suas unidades privilegiadas de
isso, ademais, seria impossível formular políticas –
observação, os seus resultados trataram, em espe-
cial, dos impactos das mudanças técnicas e orga- governamentais, sindicais e empresariais – com
nizacionais sobre aqueles que poderíamos chamar vistas à empregabilidade.
de os trabalhadores “sobreviventes” aos processos Qual o elo que articula essas duas vias de
de reestruturação. Nessa medida, a preocupação análise? O reconhecimento de que, no contexto
esteve dirigida para as formas de contratação e atual de reestruturação produtiva e de intensifica-
uso do trabalho que emergiam nos ambientes em da internacionalização das estratégias de negócios
processo de reestruturação. Como, então, partir das empresas, duas tendências repercutiriam so-
dessa reflexão para formular perguntas sobre os bre as oportunidades de emprego. Uma tendência
horizontes ocupacionais daqueles que não estão à convergência (e nesse sentido à homogeneiza-
incluídos, ou que até foram recentemente excluí- ção) e uma tendência à hibridação (e, nesse sen-
dos desses ambientes de trabalho? tido, à diversidade de formas locais). Assim, por
Duas vias de reflexão foram trilhadas pelos um lado (e sob o signo da globalização produtiva
intérpretes. Analisarei cada uma delas, chamando e financeira), manifestar-se-ia um movimento de
atenção não apenas para os resultados empíricos crescente convergência entre estruturas normati-
mas, em especial, para os estilos de análise. vas e institucionais, nacionais e supranacionais,
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que estruturaria a oferta de bens e serviços.1 Além para as pequenas e médias empresas viria acom-
disso, a ele se somaria uma tendência à conver- panhado de uma retração das formas de contrata-
gência também no que tange aos modelos norma- ção em tempo integral e protegida (pelos resulta-
tivos de cultura do trabalho (os já famosos “novos dos de negociações coletivas e pelo welfare públi-
paradigmas de produção” e suas best practices). co) e de um avanço nas formas chamadas “atípi-
Entretanto, seria igualmente possível reconhecer cas” de emprego,4 além de um aumento no traba-
um movimento em sentido contrário, uma contra- lho por conta própria. Este efeito de precarização
tendência, que promoveria a hibridação. Isto por- das relações de trabalho só se tornou possível,
que as normas e instituições que se difundem nos países centrais, por meio da flexibilização tan-
num contexto globalizado interagem com as espe- to do sistema de welfare quanto do sistema regu-
cificidades (nacionais e setoriais) características lador da contratação do trabalho. Esta última, por
dos contextos sociais em que essa difusão se ve- sua vez, nutriu-se do fato de que a contração dos
rifica, e onde o seu enraizamento se faz necessá- mercados internos de trabalho tomou de assalto,
rio. Como essas tendências se expressam em face a um só tempo, os trabalhadores assalariados (re-
dos padrões atuais de emprego e de desemprego? gidos por relações estáveis e protegidas de traba-
Observando pela ótica da tendência à con- lho) e os seus sindicatos, reduzindo as suas chan-
vergência, ganha corpo a hipótese da difusão (ir- ces de resistir às mudanças e, conseqüentemente,
resistível) de um novo padrão de contratação e alimentando-as. Isto significa uma terceira ordem
uso do trabalho, o chamado padrão flexível. de efeitos, aqueles que atingiram o próprio siste-
Como, neste contexto, se expressaria o elo entre ma de relações industriais, determinando as chan-
emprego e desemprego? O padrão fordista clássi- ces futuras de ampliação da flexibilização das re-
co – fundado nas negociações coletivas, no peso lações sociais de trabalho.
dos sindicatos e num sistema de proteção social – Este conjunto de observações talvez possa
teria se tornado inadequado às estratégias empre- ser resumido em duas grandes (e dramáticas) ten-
sariais contemporâneas, movidas pelo intuito de dências. Em termos quantitativos, ingressávamos
intensa racionalização (da produção e do traba- numa era em que o crescimento da produção pas-
lho), numa situação de acerba competição e de saria a se dar sem um aumento proporcional do
inusitada exposição a padrões internacionalizados emprego, levando a um crescimento daquela par-
de produção e consumo. “Focalização” e “desver- cela do desemprego aberto que pode ser entendi-
ticalização” estariam atrelados ao crescimento da da como desemprego estrutural.5 Em termos qua-
“subcontratação” e da “externalização” do traba- litativos, polarizavam-se os postos de trabalho em
lho. Desse modo, o esforço produtivo passaria a “bons” e “maus” empregos. De imediato, uma in-
ser o resultado da ação de firmas em redes, nas dagação se colocava: quem eram os trabalhadores
quais a grande empresa (“enxuta” e “focalizada”) beneficiados pelos assim chamados “bons” em-
estaria agora estreitamente imbricada a um núme- pregos? Em outras palavras, o que caracterizaria
ro seleto de fornecedores qualificados.2 aqueles trabalhadores que haviam logrado sobre-
Quais os efeitos no emprego? Alterar-se-ia a viver à reestruturação, mantendo-se nos postos de
distribuição dos postos de trabalho entre setores e trabalho de maior qualidade?
entre empresas, conforme o seu tamanho. Um À luz da perspectiva da convergência, uma
deslizamento intersetorial levaria a um aumento resposta tornou-se recorrente: os novos contextos
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do emprego nos serviços. Uma outra modalidade produtivos diferenciavam sobremaneira os traba-
de recomposição faria com que o peso relativo do lhadores por seus níveis de capital humano, fa-
emprego nas pequenas e médias empresas ga- zendo com que as chances de sobrevivência fos-
nhasse proeminência. Mas, além dessa redistribui- sem tanto maiores quanto maior e mais ampla fos-
ção dos postos de trabalho, verificar-se-ia uma im- se a qualificação individual. Nesse sentido, uma
portante alteração nas relações sociais de traba- primeira forma de equacionamento da questão su-
lho, pois o deslizamento do emprego das grandes geria que, quanto maior fosse a escolarização do
o
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trabalhador, maior seria a sua chance de reconver- assinaladas, longe de unívocas, encontravam-se
são profissional; maior, portanto, a sua “treinabili- constrangidas por importantes limites societais
dade” e, logo, maior o seu grau de mobilidade (Bénoit-Guilbot e Gallie, 1992).
profissional defensiva (intra-empresa ou entre em- Observando aquelas mesmas tendências,
presas) em face da reestruturação produtiva. mas sem as lentes da convergência, passou-se a
Maiores seriam, então, as suas chances de empre- explorar esses limites. Eles seriam, entre outros:
gabilidade (Alves e Soares, 1997). os distintos tipos de práticas de emprego adotadas
Mas, tal como destacaram alguns autores nes- e o maior ou menor peso do Estado nas políticas
sa linha de abordagem (como Amadeo et al., 1993), de emprego; as diversidades de amplitude e de
a flexibilidade ligava-se tanto à qualificação geral, formato (público ou privado) dos sistemas de wel-
quanto à qualificação específica dos trabalhadores. fare que se desenvolveram nos diferentes países;
Isto porque, por um lado, os trabalhadores com a variada natureza do sistema de relações indus-
mais capital humano geral acumulado eram os que triais e as conseqüências que dele resultam para
estavam em situação de vantagem comparativa em as negociações salariais e para as relações profis-
momentos de ajuste e reestruturação. Eles perce- sionais; além de determinantes de ordem cultural
biam e interpretavam melhor as mudanças econô- mais ampla, que conformam aquilo que D’Iribar-
micas, tendo maior capacidade de aprender novas ne (1990) apontou como “os códigos de legitimi-
técnicas a custos mais baixos; eram mais produti- dade” e suas concepções implícitas sobre os direi-
vos, além de terem a preferência em situações de tos individuais.6 Todos esses fatores sobredetermi-
retreinamento. Logo, concluía-se que aqueles que nam as estratégias de competição das empresas,
dispusessem de maior capital humano geral acu- as suas políticas de recursos humanos, bem como
mulado, tenderiam a ter também maior capital hu- a forma de inserção econômica dos diferentes paí-
mano específico acumulado. Mas, por outro lado, ses no novo cenário competitivo internacional.
o quadro se tornava complexo, visto que esses Tendo isto em mente, pelo menos três situa-
eram também os que, nos momentos de reestrutu- ções típicas poderiam ser trazidas à discussão para
ração produtiva, mais rapidamente perdiam capital pensarmos alternativas de explicação para as dife-
humano específico acumulado. Assim, ainda que o renças inter-societais e formas específicas de hi-
custo de reaquisição fosse mais baixo, a perda de bridação entre global e nacional (Demazière,
qualificação do tipo firm specific era mais acelera- 1995). A abordagem de tais situações nos permite
da nos contextos reestruturados. Por conseguinte, lançar luz sobre os modos pelos quais as socieda-
para se entender as chances de sobrevivência, a va- des nacionais, por suas características específicas,
riável-chave parecia ser, então, a quantidade de ca- reagem ao desafio que a reestruturação produtiva
pital humano específico em relação ao capital hu- coloca para os seus sistemas de emprego. Veja-
mano geral acumulado por cada trabalhador e des- mos inicialmente o caso do Japão. Ali, as taxas de
sa equação resultava o custo do ajuste para cada desemprego mantiveram-se, por longo tempo, re-
um dos tipos de trabalhador. lativamente baixas7 graças a duas principais válvu-
No entanto, observando-se a questão pelo las – de escape. Por um lado, a intensidade da
ângulo dos que não sobreviveram nos contextos subtilização do trabalho não se fazia transparente
reestruturados, verificava-se a ampliação do volu- na forma de desemprego aberto, dado o intenso
me do desemprego, fazendo deste um problema trânsito para a inatividade daqueles que eram de-
de ordem estrutural, mesmo nas economias avan- sempregados; isto se deu particularmente no con-
çadas. Entretanto, mais do que isto, alteraram-se tingente das mulheres, indicando o peso das es-
as formas do desemprego e o perfil dos desem- pecificidades culturais concernentes às relações
pregados. Tais alterações, contudo, não aponta- sociais de gênero na sociedade japonesa. Por ou-
vam numa única direção; ao contrário, na forma tro lado, a porção “sobrevivente” teria sido preser-
como se apresentam em diferentes países, elas su- vada nos “bons” postos de trabalho ao sujeitar-se
geriam que as tendências à convergência, antes a uma intensa flexibilidade salarial.8 Tal flexibilida-
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de se sustentara nas especificidades socioculturais luntária e ocasional do trabalho (e, como tal, juri-
do chamado “sistema japonês de emprego vitalí- dicamente reconhecido e estatisticamente mensu-
cio” e na forma de responsabilidade “na cadeia”, e rado) e passara a adquirir um caráter de extraor-
não apenas intra-firma, no que concerne à aloca- dinária permanência.
ção de trabalhadores em postos de trabalho; com E por que a permanência no desemprego
isto, um tipo de mobilidade predatória em direção parecia tão extraordinária aos olhos da literatura
aos elos mais distantes da cadeia assegurava a ma- que interpretava a realidade desses países capita-
nutenção dos níveis de ocupação, flexibilizando e listas? Porque, tal como conceituado até então, o
deteriorando as condições contratuais e de trabalho desemprego evidenciava dois componentes fortes
para parcela significativa dos trabalhadores (Hirata, do código de legitimidade instalado em nossas so-
1992; Hirata e Zarifian, 1994). ciedades. Primeiro, por ser ocasional, a privação
Os Estados Unidos talvez pudessem tipificar do trabalho eximia aquele a ela sujeito da pecha
uma segunda situação social no que concerne aos social de “preguiçoso” (de “ocioso”, de “fraco”,
efeitos da reestruturação sobre o desemprego. Nes- “ineficiente” nos seus intentos de obter ocupa-
se país uma organização extremamente flexível do ção). Segundo, por ser involuntária, a privação do
mercado de trabalho permitiu ampliar o número de trabalho era “sofrida” pelo indivíduo que, deste
postos ofertados e conter a elevação da taxa de de- modo, se diferenciava do trabalhador “indiscipli-
semprego (que, ainda assim, ultrapassou os 6% no nado”, “instável” e “irresponsável” que era, por
início dos anos de 1990).9 Seria essa uma solução isso mesmo, o agente último da sua própria exclu-
generalizável ou se trataria de mais uma equação são, na medida em que lhe faltavam (outra vez)
social particular? Análises de dados comparativos os valores da cultura normativa do trabalho assa-
que levavam em conta a realidade dos países da lariado.13 Sendo assim, o reconhecimento social da
OCDE (Demazière, 1995, e Dedecca, 1996) sugeri- legitimidade da situação de desemprego – defini-
ram que as experiências de desregulamentação, da como fenômeno transitório e involuntário –
fundadas na criação de empregos precários e de não punha em risco qualquer dos componentes
baixa remuneração, não estariam sendo capazes de normativos centrais à ética do trabalho como va-
fazer face ao crescimento do desemprego. Os ex- lor (Demazière, 1995a).14
perimentos de flexibilização levados a efeito em al- Ora, a invenção de uma nova categoria so-
gumas economias avançadas, como a do Canadá10 cial – a dos “desempregados de longa duração” –
e a da Inglaterra, haviam acabado por conduzir à aliada à força que esse fenômeno assumiu exata-
elevação das taxas de inatividade forçada encontra- mente naquelas sociedades capitalistas com maior
das entre homens no auge da sua idade ativa, isto tradição de regulação e proteção ao trabalho, é re-
é, entre 35 e 44 anos.11 veladora da novidade representada pela a ruptura
Finalmente, uma terceira situação poderia do nexo entre emprego e desemprego. Rompido
ser tomada de empréstimo da realidade de casos esse nexo, a subtilização do trabalho deixava de
como a França, a Alemanha e Itália, países cujas assumir a forma clássica e única do desemprego
economias se caracterizavam pela reduzida capa- aberto e passava, como se viu nas situações ante-
cidade de criação de empregos e que sofreram o riormente referidas, a se expressar em múltiplas
impacto do rápido crescimento das taxas de de- formas, tais como: o trânsito à inatividade de
semprego. Nesses casos, diante de um sistema de indivíduos no auge da sua vida ativa, as formas
welfare público ainda fortemente atuante,12 não precárias e/ou atípicas dos chamados “postos de
somente cresce a subtilização do trabalho, mas baixa qualidade”, além do desemprego de longa
esta assume uma nova feição, a do chamado “de- duração.
semprego de longa duração”. A novidade do fe- O que parece estar em jogo quando se toma
nômeno era notável e a própria forma de catego- em conta esta multiplicidade de formas de subtili-
rizá-lo evidenciava um paradoxo: o desemprego zação do trabalho? O fato de que o desemprego
deixava de ser codificado como a privação invo- não apenas aumenta o seu volume e diversifica a
o
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sua forma, mas atinge desigualmente os indiví- culos subseqüentes de trabalho, que os fazia can-
duos segundo as suas características de sexo, ida- didatos potenciais a novas situações de desempre-
de, categoria socioprofissional e escolaridade, go. Desapareceu, assim, a idéia da saída definiti-
variáveis tão caras à análise sociológica e sociode- va (ou, quando menos, duradoura) do desempre-
mográfica das desigualdades. Ou seja, o desem- go, por meio da aquisição de um novo emprego.
prego, além de involuntário, como queria o Estávamos diante de uma forte evidência da
nosso modelo clássico de cultura normativa do dissolução do vínculo, tido até então como “natu-
trabalho, é hoje fortemente seletivo, visto que as ral”, entre emprego e desemprego. E, assim sen-
chances de emprego estão desigualmente distri- do, o tempo de permanência no desemprego pas-
buídas entre os diferentes grupos sociais. sara a ser uma medida sensível, isto é, uma boa
Esta seletividade tornara-se particularmente antecipação das dificuldades futuras de (re)inser-
transparente na modalidade do “desemprego de ção profissional. “Tudo se passa como se o de-
longa duração”, tal como a mesma se exprimiu a semprego contribuísse para redistribuir os empre-
partir dos anos de 1980 nos países de capitalismo gos” (Demazière, 1995, p.52), na medida em que
mais avançado. Nesses, os handicaps que se tor- a degradação das condições contratuais revelava-
naram moralmente legítimos, e que justificavam as se uma característica comum a uma parte signifi-
dificuldades de acesso do trabalhador ao posto de cativa dos desempregados que se reinseriam.17
trabalho, já não eram tão-somente aqueles de or- Pois bem, se essa linha de argumentação
dem física, como no século XIX, tornando-se tam- mostrara-se sólida em sua capacidade de interpre-
bém handicaps de natureza social. Assim, no caso tar realidades onde a proteção social ao desem-
francês, por exemplo, dados colhidos entre 1983 prego fora eficiente, o que dizer do alcance deste
e 1989,15 momento crucial da expansão do desem- movimento do desemprego em realidades onde
prego de longa duração, permitiram identificar eram frágeis os regimes de welfare? Ou, para to-
um conjunto de fatores sociais de risco, que alte- marmos de empréstimo as idéias de Esping-An-
ravam as chances individuais de empregabilida- dersen (1990 e 1999) e de Gallie (2001), que se
de.16 Como ressalta Demazière (1995, p. 55), “a passou naqueles contextos onde eram pouco efi-
combinação mais favorável reúne os traços se- cazes os “sistemas de regulação pública voltados
guintes: sexo masculino, jovem, diplomado e com a assegurar a proteção aos indivíduos e à manu-
pouco tempo de desemprego (68% de chances de tenção da coesão social mediante intervenção
retorno ao emprego), e a mais desfavorável é (por medidas legais e distributivas) nas esferas
aquela representada pelos desempregados idosos, econômica, doméstica e comunitária” (Gallie,
não-diplomados, do sexo feminino e passivos na 2001: p. 2). Voltarei a esse aspecto institucional
sua busca de emprego (7% de chances de retorno mais adiante; por ora, vou me deter ainda, um
ao emprego depois de dois anos)”. pouco mais, na questão da seletividade e em suas
Ademais, um outro traço passou a caracteri- conseqüências para nossa agenda de pesquisa.
zar a organização contemporânea do mercado de Se concordarmos com o que foi exposto até
trabalho. A saída da condição de desemprego não aqui, a própria idéia tradicional de empregabilida-
se fazia mais pela obtenção de uma ocupação es- de precisa ser enriquecida.18 A probabilidade de
tável, num posto de trabalho de boa qualidade. obtenção do emprego passa a depender não ape-
Ao contrário, as evidências empíricas, reunidas a nas das medidas sociológicas clássicas de posição,
partir de tendências dos países capitalistas mais que documentam o perfil de características do de-
avançados, sugeriam que não apenas “ocorrem, sempregado que se habilita no mercado de traba-
ao mesmo tempo, uma tendência no aumento do lho (como sexo, idade, escolaridade etc.). Ela pas-
fluxo de entrada e uma redução no de saída das sa a requerer uma análise longitudinal, ou seja, o
pessoas da condição de desemprego” (Dedecca, conhecimento das trajetórias ocupacionais em-
1996, p. 14), mas, mesmo os que logram sair, preendidas, visto que as chances da (re)inserção
apresentam uma tendência à fragilização dos vín- profissional resultarão, em grande medida, das ex-
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periências anteriores de emprego e de desempre- cidades e/ou determinantes sociais do desempre-


go. Além disso, as estratégias de busca do empre- go, é fato, entretanto, que análises sociológicas de
go têm nas redes sociais constituídas, seja nas ex- cunho comparativo internacional ainda são raras
periências de trabalho, seja nos momentos de de- nesse tema; no mais das vezes, os estudos limi-
semprego, especialmente a partir do grupo fami- tam-se a construir séries estatísticas, baseadas em
liar, um outro importante fator de explicação do cálculos consistentes com normas internacionais
êxito na obtenção de um novo posto de trabalho. de mensuração (oriundas, sobretudo, das defini-
Assim, a empregabilidade, mais que mera ca- ções operacionais da OIT). Qualquer que seja o
pacidade individual, deveria ser apreendida como seu grau de sofisticação, tais análises estão impli-
uma construção social (Demazière, 1995 e 1995a; citamente fundadas na idéia – muito desconfortá-
Outin, 1990), pois a chance de uma ação indivi- vel para nós, sociólogos – de que o desemprego
dual bem-sucedida na busca do emprego tem os designa a mesma coisa nos distintos países a que
seus graus de liberdade definidos para além da se reportam as estatísticas coligidas.21
vontade e da conduta individuais. Isto porque – Ora, pelo que foi dito até aqui, uma análise
nos novos contextos produtivos, instabilizados por sociológica do desemprego não poderia deixar de
processos de acirrada competição entre empresas estar atenta para o fato de que a significação do
e de intensa reestruturação organizacional –, a tra- desemprego varia nos espaços nacionais. Afinal,
jetória ocupacional do trabalhador depende: da esse ponto de partida é o cerne da nossa aborda-
apreciação conjuntural e socialmente variável dos gem disciplinar!
atributos individuais que o caracterizam; da sua No caso, sabemos que os mecanismos de
“qualificação social”, de um capital (social) acumu- acesso a uma atividade profissional ou à obtenção
lado para, por meio de redes eficazes, localizar e de recursos materiais não são uniformes; ao con-
obter colocação num posto de trabalho, e, por fim, trário, eles variam em função dos contextos nacio-
de fatores estruturais absolutamente externos e nais e das características biográficas (sexo, idade,
não-manobráveis por sua ação, como são as estra- etnia). Bem assim, os sistemas de seguro-desem-
tégias locacionais e de investimento das firmas prego e os dispositivos de redistribuição de recur-
(DiPrete e Krecker, 1991). Dessa forma, a empre- sos dirigidos aos que estão em busca de trabalho
gabilidade passa a ser o resultado da interação en- são operacionalizados de formas distintas, apoian-
tre estratégias, individuais e coletivas, tanto dos do-se em critérios de elegibilidade igualmente di-
que buscam o trabalho assalariado, quanto daque- versos e socialmente determinados. Do mesmo
les que o empregarão (Outin, 1990).19 modo, é também variável o tipo de apoio institu-
Não sem razão a literatura internacional fun- cional que cada sociedade oferece aos seus de-
dada em estudos comparativos (ver, por exemplo: sempregados na procura de emprego (agências
Gallie e Paugam, 2000; Gallie, 2001) chama a governamentais de emprego, políticas de luta
atenção para o fato de que variam significativa- contra o desemprego, pequenos anúncios, coleti-
mente entre países os perfis dos grupos sociais vidades locais, redes informais etc.).
mais vulneráveis ao desemprego. Mesmo tomando em conta uma única socie-
dade, em diferentes momentos do tempo, tais for-
mas também variam. Observe-se o caso do Brasil.
Por uma agenda de novos temas para Na conjuntura recessiva do início dos anos de
uma sociologia do desemprego: as di- 1980, embora o fenômeno do desemprego tivesse
mensões normativo-institucional e bio- adquirido uma grande visibilidade social, a forma
gráfico-subjetiva20 de intervenção de agências estatais, ou os meca-
nismos do sistema público, eram muito menos de-
Em que pese certa convergência entre os es- senvolvidos e atuantes que o foram nos anos de
tudiosos no que concerne ao valor heurístico das 1990. A par disso, os sindicatos mostraram uma
comparações no processo de desvendar especifi- atuação importante em defesa dos “seus” desem-
o
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pregados, a sugerir tanto que, naquele momento, titucionalmente reconhecido, contabilizado e


a chance de retorno a um outro emprego no mes- considerado como tal, mas, ao mesmo tempo, im-
mo setor permanecia no horizonte (tão logo amai- porta em, subjetivamente, definir-se, reivindicar-se
nasse a crise), como que os sindicatos detinham e considerar-se como tal.
uma legitimidade social suficiente para arrecadar Por isso mesmo, os estudos comparativos
recursos (transitórios que fossem) para os fundos tornam-se um bom método para descrever e com-
de suporte aos “seus” desempregados. No campo preender as formas (e as transformações) assumi-
político, os movimentos de desempregados eram das pelo desemprego em distintos contextos so-
agentes centrais da demanda por um sistema de cietais (D’Iribarne, 1990). A despeito da existência
regulação pública mais eficaz, sendo indicativos de convenções de mensuração, base das estatísti-
de que a condição de desempregado não era um cas que apóiam as nossas habituais comparações
estigma que desonrasse; ao contrário, ela podia internacionais, um olhar sociológico sobre o fenô-
ser assumida como um sinal diacrítico, portador meno não deve perder de vista que as fronteiras
de uma identidade, mesmo sendo esta construída entre o desemprego, a atividade e a inatividade
a partir de um estatuto transitório. Naquelas con- são relativas, na medida em que essas resultam de
dições do início dos anos de 1980, o trabalhador construções sociais próprias a cada realidade. Por
a par de “desempregado” se mantinha, por exem- isso mesmo, há que se ter em conta as formas ins-
plo, como “metalúrgico”; ou seja, sua origem ocu- titucionais, os sistemas de regras, as dinâmicas
pacional seguia sendo provedora de auto-reco- normativas, que, diferindo de país a país, pesam
nhecimento e de reconhecimento pelos outros de maneira específica sobre os contornos do em-
(notadamente pelo seu sindicato). Isto se tornava prego e do desemprego, mas também sobre as
possível dada a crença nas chances do retorno ao formas da atividade, sobre as categorizações que
“setor de origem”; e esta resultava da modalidade os indivíduos fazem de sua situação, sobre os
de estratégia de gestão do trabalho, baseada no seus percursos biográficos, sobre os universos e
turn-over dos trabalhadores. Tal construção subje- os valores profissionais. As comparações entre so-
tiva e o seu correlato institucional perderam sen- ciedades (ou entre momentos de tempo, numa
tido nos anos de crise da década seguinte (a dé- mesma sociedade) permitem elucidar as lógicas
cada de 1990) no Brasil. institucionais em jogo e seu papel configurador
Assim sendo, a variação na significação do do desemprego, do emprego e da inatividade.
desemprego – que até aqui procurei ilustrar, ain- Nesse campo, há ainda muitos caminhos por
da que rapidamente – se expressa tanto no plano investigar numa possível agenda para uma socio-
normativo, das instituições que intervêm, de ma- logia do desemprego. O primeiro consiste na
neira variável, junto às populações designadas identificação dos atores institucionais que partici-
como desempregadas, quanto no plano subjetivo, pam da regulação do emprego e na análise de sua
das experiências vividas pelas pessoas colhidas legitimidade, tendo em conta os diferentes tipos
pela situação de desemprego. Com isto, estou de instituições intervêm neste processo: o Estado,
chamando a atenção para o fato de que uma so- naturalmente (embora não apenas ele); institui-
ciologia do desemprego deve ter a responsabilida- ções públicas não-estatais (como sindicatos ou
de de analisar, conciliando, duas dimensões que centrais sindicais) e seus parceiros sociais (ONGs,
são caras (porque constitutivas) da nossa tradição por exemplo); mas também a família (fundamen-
disciplinar: por um lado, a construção institucio- tal na estruturação dos papéis, divisão de respon-
nal e normativa do fenômeno; por outro, a sua sabilidade no provimento da sobrevivência e or-
significação subjetiva, tecida ao longo dos percur- denamento de estratégias para os seus membros
sos no mercado de trabalho e resignificada pela face ao mercado de trabalho); bem como o con-
interpretação subjetiva das biografias individuais. junto das redes de ajuda mútua (fundadas, seja na
Nesse sentido – e percebido em seu sentido socio- consangüinidade, como as redes familiares, ou em
lógico forte – ser desempregado significa ser ins- outros tipos de identificação comunal, permanen-
POR UMA SOCIOLOGIA DO DESEMPREGO: 111

te, como origem regional ou étnica, ou transitória, tado, interesses da empresa e demandas do traba-
como a vizinhança ou o culto). lhador. O princípio do five dollars a day tornou-se
Entretanto, sendo que o desemprego é uma a expressão mais conhecida desse compromisso,
construção subjetiva, muitas vezes a variação en- onde o maior acesso ao consumo era apenas uma
contrada nas estatísticas do desemprego (se as face externa da cidadania alcançada no âmbito da
comparamos com contextos sociais diversos) re- produção. Aqui, pelo contrário, nem o movimento
sulta de que, para serem socialmente reconhecidos sindical chegou a se constituir um interlocutor legí-
(e contabilizados) como desempregados, é neces- timo para negociar as condições de uso e remune-
sário que os indivíduos se auto-reconheçam como ração do trabalho, nem o trabalhador alcançou a
tais e acorram às instâncias de reconhecimento sua centralidade como consumidor, sobre a qual se
institucional do desemprego. Para entender, se, assentaria a produção em massa.
quando e como essa auto-identificação se produz, Ademais, as relações de trabalho caracteriza-
é imprescindível a análise das experiências biográ- vam-se pela elevada instabilidade no emprego,
ficas, o estudo dos percursos profissionais dos de- por escalas salariais com grande diferenciação de
sempregados, bem como do sentido subjetivo atri- níveis, pela maior rigidez na definição dos postos
buído à condição do desemprego pelos indivíduos de trabalho, além da ausência de tradição de tra-
que a vivenciam. balho organizado em equipes. Em nossa socieda-
Essas diferentes dimensões da experiência de, a cultura política jamais favoreceu a estabilida-
do desemprego estão, por sua vez, inscritas em de das regras de negociação salarial, a inviolabili-
quadros normativos, culturalmente diversos e que dade dos acordos trabalhistas ou a legitimidade da
são imprescindíveis de serem resgatados quando ação reivindicativa dos trabalhadores. O alto nível
se pretende construir uma sociologia das manifes- de desemprego e a ausência de tradição de inter-
tações do desemprego. venção negociada dos trabalhadores na introdu-
ção de novas tecnologias compuseram um mode-
lo de sistema de relações industriais em tudo con-
Pensando comparativamente: trastante com o que prevalecera nos países onde
o Brasil à luz de outras realidades se originaram os paradigmas pós-fordistas de or-
ganização do trabalho (Ferreira et al., 1991).
Em países como o Brasil, a questão do desem- Alie-se a tudo isto a ausência de um sentido
prego se coloca de maneira particularmente crítica. universalista e republicano nas ações sociais do
Ora, nesse tipo de contexto, nem a estruturação do Estado, o que levou à constituição de um arreme-
mercado de trabalho generalizou a relação salarial do de welfare público (se comparado ao caso
estável como a forma dominante de uso do traba- francês, por exemplo), sem o correspondente de-
lho, nem a produção em massa se sustentou num senvolvimento compensatório de um welfare pri-
movimento de extensão da cidadania e de proteção vado (se considerada a experiência japonesa).
social na forma de um welfare público, socialmen- Este tornou-se aqui perfeitamente desnecessário,
te eficaz na proteção do trabalho. Como bem anali- substituído por um paternalismo autoritário erigi-
sou Silva (1990), as especificidades do nosso mer- do num contexto em que ainda era o velho des-
cado de trabalho e das relações industriais, aliadas potismo de mercado a base para a produção do
ao autoritarismo da relação Estado-sindicatos, fize- consentimento.
ram com que, no Brasil, a organização da produção A reestruturação produtiva encontra-se, assim,
rígida de massa viesse a se impor livre das contra- às voltas com problemas sociais que afetam tanto
partidas sociais que a legitimaram, diferentemente os “sobreviventes” deste processo, quanto os que
daquilo que historicamente se verificou no que Bo- dele parecem estar sendo “excluídos”. Diferente-
yer denominou “fordismo genuíno”. mente dos países capitalistas centrais, onde (como
Nos Estados Unidos, tais contrapartidas sol- assinalei acima) podiam ser muito facilmente esta-
daram o compromisso entre política social do Es- belecidos os limites (simbólicos e materiais) entre o
o
112 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 N 50

desemprego e o pauperismo, tendo um e outro po- namento e qualificação da força de trabalho. As-
líticas e instâncias institucionais bem diversas a sim, diante da alta probabilidade de perda desse
atendê-los, no caso brasileiro, carecia-se de políti- investimento, somente dispêndios específicos e
cas de empregabilidade e de assistência social.22 indispensáveis eram realizados e, portanto, quan-
Entretanto, mesmo no que diz respeito ao to menos qualificado fosse o trabalhador, menor a
pequeno contingente dos possíveis “sobreviven- sua oportunidade dentro da firma e menor o seu
tes”, destaca-se, de imediato, o grave déficit de salário. Para a firma, a estratégia ótima passou a
educação, expresso na baixa escolaridade da po- ser aquela que buscava retirar o máximo do em-
pulação brasileira em geral e no conjunto dos tra- pregado enquanto ainda o tivesse como contrata-
balhadores, em particular, e na quase destruição a do, evitando comprometer-se com o seu futuro, e
que foi submetida a rede escolar pública.23 daí o pouco investimento em capital humano (es-
Como este “fordismo à brasileira” marcou as pecialmente quando se trata de trabalhadores me-
características do nosso sistema de formação pro- nos qualificados) e elevada rotatividade da força
fissional? Diferentemente da quase totalidade das de trabalho entre empregos.
experiências nacionais, aqui o sistema de formação Quão mais clara essa imagem sobre o caso
profissional desenvolveu-se com completa autono- brasileiro se nos afigurará se a compararmos a ou-
mia vis-à-vis o sistema educacional. Mas, contraria- tras experiências de construção institucional do
mente a outras realidades tomadas como virtuosas, emprego e do desemprego?
como é o caso, por exemplo, do modelo alemão, Tem sido corrente encontrarmos autores que
essa autonomia se fez presente também ante o pró- assumem ser a inscrição da análise em perspectivas
prio Estado e os sindicatos de trabalhadores. Dis- comparativas seria uma estratégia produtiva para
tante do Estado, pela compreensão corrente de que bem descrever os processos de conformação do
a sua fonte de recursos (encargos sobre a folha de desemprego. Comparam-se cadeias produtivas;
salários) é de natureza essencialmente “privada”, dentro delas, complexos; nestes, firmas. Nas nossas
tampouco o sistema de formação profissional este- análises (Cardoso, Comin, Guimarães, 2000; Cardo-
ve próximo das representações de trabalhadores so, 2000; Guimarães, 2002) já havíamos chegado a
que, até muito recentemente, não entendiam que a reconhecer que, da forma como institucionalizado
questão da qualificação pudesse ser parte da sua o mercado de trabalho e as formas de proteção (o
agenda política (Fogaça e Salm, 1995). nosso regime de welfare), o movimento de reestru-
Este quadro completa-se com a falta de um turação das firmas deixava um legado de enorme
forte envolvimento empresarial com a formação desorganização nas trajetórias ocupacionais dos
profissional e o treinamento. De fato, os baixos trabalhadores que a elas haviam pertencido. Ao
níveis de investimento em capital humano marca- tempo em que rompiam seus elos com os antigos
ram o crescimento capitalista brasileiro (Carvalho, empregadores, rompia-se igualmente o elo com o
1992). Ao que tudo indica, o grande número de mundo do trabalho registrado e minimamente pro-
fatores institucionais que regulam o mercado de tegido. E, não importa como e onde observásse-
trabalho no Brasil (CLT, FGTS, seguro-desempre- mos, esta se mostrava a tendência dominante – a
go, regras de reajuste salarial) acabou por produ- desafiar mercados internos de trabalho, carreiras
zir um sistema que não incentivou os trabalhado- profissionais, identidades coletivas, políticas públi-
res a investir em seus empregos e nem as firmas cas e estratégias individuais pelas quais se amea-
a investir no treinamento e qualificação dos seus lhava algum capital de qualificação.
empregados. Os dados de Amadeo et al. (1993) A intensificação do trânsito no mercado de
sugerem que ou os custos de demissão no Brasil trabalho, a perda dos elos com um destino profis-
foram historicamente muito baixos, ou os incenti- sional anterior, levava a que os estudos de trajetó-
vos do FGTS muito fortes de forma a contrabalan- rias de trabalhadores segundo os seus setores/ca-
çar esses mesmos custos. Nisto residem, talvez, as deias de origem virtualmente perdessem sentido.
razões do pouco investimento empresarial no trei- Ou quando menos perdiam sentido para aquela
POR UMA SOCIOLOGIA DO DESEMPREGO 113

parcela formada pelos trabalhadores cujo destino Além disso, cada país tinha uma trajetória so-
confluente e mais visível era o de perderem os cioeconômica singular: passagem de uma econo-
elos com o seu passado, sendo lançados de volta mia agrária e rural a uma industrialização e urba-
ao mercado de trabalho, em percursos que tinham nização rápidas no curso da segunda metade do
como marca principal a recorrência duradoura do século XX, no Brasil; terceirização de uma econo-
desemprego. Havia que matizar, entre nós, o peso mia industrial muito antiga, no caso francês; de-
da figura do desemprego de longa duração; este senvolvimento econômico sem precedentes de-
supõe um sistema que ancora (e redes sociais que pois dos anos de 1950, no Japão. Diferenças tão
protegem) o desempregado, retendo-o nessa si- consideráveis obrigavam-nos a examinar de ma-
tuação e com tal identidade. neira mais precisa as condições de uma compara-
Em condições de recorrência do desempre- ção entre esses países. Isso nos levou a sublinhar
go, e estando o trabalhador sujeito a movimentos tanto os traços comuns como as particularidades.
de inserção e re-inserção, é no mercado de traba- A despeito das grandes diferenças que carac-
lho que se trata de buscar o entendimento das terizavam o Brasil, a França e o Japão nos planos
suas possibilidades de mobilidade; o seu passado econômico, social e cultural, os três se inscreviam
profissional pouco explica do seu futuro ocupa- em um contexto de globalização das trocas, de
cional. As instituições do mercado de trabalho, e desregulamentação fragilizadora das autoridades
notadamente aquelas que regulam, institucionali- públicas, de padronização das normas de gestão,
zando, o desemprego, tornam-se focos de primei- da produção e do emprego. Mesmo tendo histó-
ra hora para novas interpretações. rias muito contrastadas, esses países estavam ins-
Nesse sentido, as comparações intra-nacio- critos em um processo de internacionalização ca-
nais, entre cadeias, perdem o estatuto de cami- racterístico do período contemporâneo. Mais pre-
nhos de abordagem de elevado poder discrimina- cisamente, eles conheciam um fenômeno comum,
dor, cedendo-o às comparações entre sociedades, mas de amplitude e de temporalidade variáveis,
de modo a identificar-se as formas de instituciona- marcado por uma ameaça às normas de emprego,
lização normativa e as conseqüências destas para com o rápido desenvolvimento de modalidades
os sujeitos. Que dizer, então, do caso brasileiro, se ditas “atípicas” de emprego, se tomamos como re-
sobre ele refletimos tendo em mente duas realida- ferência a norma de assalariamento.
des bastante distintas por terem sido constituídas Esse processo, entretanto, se traduz de ma-
sobre regimes de welfare (público, numa; priva- neira diferente em cada um dos contextos nacio-
do, noutra) sustentados em outra estrutura norma- nais. No Brasil, observou-se a intensificação da
tiva, como o caso da França e do Japão?24 E por mobilidade entre formas de ocupação com dife-
que comparar o Brasil exatamente com esses dois rentes estatutos (empregos registrados e não-re-
outros países? Vamos por passos. gistrados, trabalhos regulares e “bicos” etc.), mas
À primeira vista, esses três países estão mui- também um trânsito intenso entre condições de
to distantes tanto pela situação do desemprego atividade, isto é, entre desemprego e inatividade,
como pelas características de sua economia. Ade- ou entre ocupação e inatividade. Na França, viu-
mais, cada um se distingue pelo nível de desem- se o crescimento de formas particulares de empre-
prego (medido conforme convencionado pelas go concernentes tanto à duração e estabilidade do
normas de comparação internacional, da OIT). contrato de trabalho como ao tempo de trabalho.
Assim, a França apresentava (no momento em Já no Japão, houve o recuo do modelo do chama-
que formulávamos nossas idéias iniciais para um do “emprego vitalício”, característico da grande
estudo comparativo) a taxa de desemprego mais empresa e aparição de formas de emprego precá-
elevada (10,9%, em 1998); o Japão, a mais fraca, rias ou atípicas ao lado da difusão de empregos
embora aumentando de modo persistente (4,5%, não-titulares de um estatuto formal, freqüente-
em 1998); o Brasil, uma curiosa situação interme- mente em tempo parcial e desprovidos de qual-
diária (7,6%, em 1998). quer proteção social.
o
114 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 N 50

As transformações das formas de emprego e, lariado formalmente registrado e as atividades não


por conseqüência, do desemprego afetaram seja registradas e protegidas. As estratégias defensivas
os modos institucionais de regulação da relação que foram desenvolvidas passaram a se apoiar na
salarial, seja as trajetórias profissionais. É por isso combinação desses dois tipos de situação, seja
que se tornava estratégico, para pensar sociologi- para um mesmo indivíduo (acumulação, alternân-
camente o processo em curso, centrar o foco do cia), seja no seio do grupo familiar. A maioria das
interesse analítico na articulação de sistemas insti- mulheres ativas trabalha em ocupações precárias
tucionais e normativos que conformavam a gestão ou informais, que são igualmente ocupadas em
do emprego e do desemprego, bem como nos grande parte pelos ativos mais jovens. É evidente
percursos biográficos que se desenvolviam nesses que tais mecanismos sociais de distribuição de
contextos em mutação. Ou seja, cada um dos paí- formas de emprego têm efeitos estruturais sobre
ses poderia ser caracterizado por uma convenção, as reações subjetivas ao desemprego e, mais glo-
por uma norma social própria que definiria (insti- balmente, sobre a trajetória e as atividades profis-
tucionalizando e criando um quadro de referência sionais. A construção social do desemprego está
para a experiência subjetiva) a atividade ou a ina- marcada, aqui, pela ruptura da equivalência en-
tividade, o emprego ou o desemprego. tre a privação do emprego e o desemprego. Ade-
No Brasil, a institucionalização do desempre- mais, onde a fronteira entre o desemprego e o
go era, ao mesmo tempo, fraca e recente. A debi- emprego se faz tão mais permeável, ganham for-
lidade da proteção social e das ajudas públicas ça outras categorias de identificação subjetiva e
aos desempregados, bem como o seguro-desem- política (desabrigados, “sem-teto”, “sem-terra”,
prego, conduziram a uma importante subdeclara- por exemplo), sendo tanto mais utilizadas quanto
ção das situações de privação de emprego. Isso mais eficazes (que o desemprego) se mostrem
acarretou uma nebulosidade significativa sobre as para negociar a proteção social. Não sem razão os
fronteiras entre os estatutos sociais (emprego, de- fortes movimentos de desempregados do início
semprego e inatividade), que se manifestou, in- dos anos de 1980 cederam lugar a movimentos
clusive, publicamente nas questões polêmicas em sociais onde outras identidades coletivas formam
torno dos números do desemprego.25 As condi- a argamassa que liga os interesses individuais. E,
ções de emprego são aqui muito heterogêneas, mesmo que a maioria dos “sem-teto” possa ser
abrangendo desde espaços ocupacionais forte- também “sem-emprego”, não é a identidade sub-
mente enquadrados por normas jurídicas e por jetiva de “desempregado”, coletivamente partilha-
uma proteção social a outros onde uma economia da, que está na base da ação.
informal, submersa, aparece como particularmen- Na França, ao contrário, o desemprego é for-
te desenvolvida e diversificada. Em um contexto temente institucionalizado. As instituições públi-
de forte diminuição dos empregos formalmente cas de recolocação cobrem o território nacional
registrados e protegidos, notável sobretudo no se- com uma malha fina, de há muito constituída. Por
tor industrial no decurso dos anos de 1990, as ati- isto mesmo, podemos entender que a taxa de de-
vidades ocupacionais não registradas (como a dos semprego na região de Paris (cerca de 11%) fosse
assalariados sem registro em carteira e dos traba- mais alta que a de São Paulo (cerca de 8%), no
lhadores por conta própria) asseguraram o essen- ano-base que tomamos para as comparações. E
cial da flexibilidade do emprego (representando não sem razão; as pessoas privadas de emprego
mais da metade dos empregos), alimentando, ao tendem – animadas pela forma como se institucio-
mesmo tempo, o crescimento das atividades de naliza o sistema de proteção social e de emprego
serviços e dos “bicos”. – a se declarar como desempregados, inscreven-
Assim, num contexto onde o assalariamento do-se (tão logo privadas de emprego) junto à
da população ativa é “limitado” (Lautier, 1987), a ANPE (Agence Nationale pour l’Emploie). Só as-
desestabilização das condições de emprego pro- sim farão jus ao ingresso na malha fina do sistema
vocou uma aceleração das transições entre o assa- de welfare.26
POR UMA SOCIOLOGIA DO DESEMPREGO 115

Entretanto, no caso francês, o desemprego para entendimento das políticas institucionais de


se banaliza à medida mesma que se pluralizam as gestão do desemprego e da mão-de-obra.
formas de vivenciá-lo. Mas, sobretudo – e essa é No Japão, o desemprego é sem dúvida me-
a característica sociologicamente mais saliente – o nos institucionalizado, mas por razões muito dife-
desemprego aparece cada vez menos sob a forma rentes daquelas do caso brasileiro. É certo que os
de uma ruptura abrupta no meio de uma carreira níveis de desemprego foram sensivelmente redu-
profissional contínua. E, nesse sentido – e esse é zidos até muito recentemente. Ademais – e esta é
outro achado teoricamente importante – as formas uma diferença notável –, a gestão do emprego es-
(ou configurações institucionais) do desemprego tava entregue às empresas (normalmente grandes
dependem e expressam as formas (ou configura- empresas), mais do que ao Estado. Só recente-
ções institucionais) do emprego. Ora, na França, mente é que as grandes empresas passaram a de-
essas últimas diferenciaram-se bastante no curso mitir em maior escala, revertendo a política prévia
dos últimos anos, abrindo-se o leque das chama- de reter a mão-de-obra excedente, administrando
das “formas particulares ou atípicas de empregos”, sua alocação nas redes de firmas cooperantes.
todas excepcionais ante a norma salarial. Essa ex- Não sem razão, portanto, para os trabalhado-
cepcionalidade exprime-se em dois planos. No res cultural e subjetivamente formados sob o sig-
que concerne à duração e à estabilidade do con- no do sistema de “emprego vitalício” – e que são
trato de trabalho, institucionalizam-se os Contra- quase exclusivamente os homens –, a experiência
tos de Duração Determinada (CDD), os contratos do desemprego esteve (e ainda está) marcada
temporários e os estágios. No que concerne à du- pela vergonha social, pelo sofrimento subjetivo da
ração da jornada de trabalho, ganha espaço o tra- humilhação. Por isso mesmo, a inscrição nas
balho em tempo parcial. Em meados dos anos de agências de emprego é percebida como desonro-
1990, no mercado de trabalho francês, cerca de sa. O desemprego não apenas é estruturalmente
2,5 milhões de contratos (num total de 22 mi- menor, mas a sua “subenumeração” (se quisermos
lhões) diziam respeito a indivíduos ocupados em reduzir o assunto à sua dimensão estatística) seria
regime de tempo parcial. Os jovens, ingressantes incompreensível fora de um quadro cultural que
no mercado de trabalho, eram os mais absorvidos afasta o indivíduo do novo sistema de proteção
pelos empregos sob contratos precários; já as mu- que está se constituindo. Por certo, os empregos
lheres eram as candidatas primeiras aos cargos em atípicos também se multiplicam (22% da popula-
tempo parcial (85% desses empregos em 1998). ção assalariada em 1998) e também sob formas di-
Entretanto, as taxas de atividade das mulhe- versas: o contrato temporário (arubaito), concen-
res permaneciam muito elevadas, e conviviam trado entre os jovens; o emprego não-titular (sho-
com uma composição por gerações no acesso ao kutaku) que atinge os ativos mais idosos; e, por
trabalho assalariado (Gaullier, 1999), de modo fim, o chamado part-timer (aliás, muito mal deno-
que o ingresso na vida ativa se faz cada vez mais minado, pois ele implica freqüentemente uma du-
tardio e marcado pelo desemprego (ou por situa- ração de trabalho comparável ao tempo integral,
ções intermediárias, de transição cada vez mais mas sem os benefícios de seguridade social), que
freqüente, entre o desemprego e o emprego). Já a abrange 95% das mulheres ocupadas, em grande
interrupção da vida profissional é cada vez mais parte retomando uma atividade depois de ter cria-
precoce (desemprego de trabalhadores idosos, do os filhos.27 Ademais, para as categorias de mão-
mas também uma política de aposentadoria ante- de-obra que não detêm um emprego registrado,
cipada e de dispensa de procura de trabalho para as fronteiras entre o desemprego e o emprego, e
os empregados mais idosos). Assim, as variáveis mesmo entre atividade e inatividade, são mais
de gênero e de geração aparecem como particu- descontínuas e incertas, pois no Japão (à diferen-
larmente importantes, seja para a análise das tra- ça da França) as interrupções de emprego não são
jetórias profissionais e das relações subjetivas vis- sistematicamente categorizadas e reconhecidas
à-vis os diferentes tipos de estatutos sociais, seja como desemprego, especialmente quando elas
o
116 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 N 50

não dão direito a uma indenização. Uma das ra- tucionalizado. Por isso mesmo, propugnam para
zões freqüentemente evocadas para explicar o fra- que se reconheça um leque de formas de desem-
co nível de desemprego durante os períodos de prego mais amplo que o simples desemprego
crise é que as mulheres, tendo perdido o seu em- aberto, uma vez que este último é o outro apenas
prego precário, não se lançariam à procura de um da relação salarial clássica. O contraste com a rea-
novo emprego (Freyssinet, 1984). As normas de lidade das chamadas economias periféricas alerta-
atividade e os comportamentos em relação ao de- ria, então, para a existência, nesses países, de
semprego e ao emprego são muito diferenciados distintos padrões de estruturação do mercado de
em função do gênero, mas também da posição no trabalho e da relação de emprego e, por conse-
ciclo de vida (Sugita, 2002). guinte, para distintas formas do desemprego. O
Essas observações, ainda provisórias e ini- desafio para a inteligência analítica e para a polí-
ciais, já nos mostram o interesse em estruturar tica pública passa a ser não o chamado (e parado-
uma comparação entre Brasil, França e Japão pela xal, como vimos) “desemprego de longa dura-
lente das diferenças (e/ou especificidades) na for- ção”, mas o fenômeno novo da “recorrência do
ma de manifestar, definir e viver o desemprego desemprego”. Esta forma de reagir ao problema
em cada um desses países. chama, assim, a atenção para a necessidade de
É certo que alguns poderiam seguir satisfei- que a teoria e a prática não tenham em mente
tos, lidando analiticamente com as maneiras habi- apenas aqueles dois clusters de situações concre-
tuais de tratar o assunto. Por certo, àqueles policy tas – o do emprego estável e o do desemprego
makers (que se satisfazem com as formas assentes institucionalizado –, mas que se debrucem sobre
na tecnocracia da ação pública) pode parecer su- uma zona ampla, que se estende entre estes dois
ficiente não apenas medir (e a medida lhes pare- pólos, quantificando-a e fazendo dela um (senão,
cerá de univocidade indiscutível) como reter, “o”) endereço legítimo para políticas públicas.
numa definição normativo-institucional indisputá- O objetivo deste texto foi o de trazer à baila
vel, aqueles dois clusters que, por certo, são os essa zona ampla e cinzenta que desafia o nosso
que mais assomam à visão mais ligeira: de um ideal de modernidade, de universalismo e de inclu-
lado, emprego estabilizado e, de outro, o desem- são, e que, portanto, carece ser bem medida, mas
prego institucionalizado. E, com efeito, por muito também ser bem teorizada (até para que a medida
tempo, as nossas diretrizes de política pública não perca a especificidade na busca obsessiva por
apenas tiveram olhos para esses dois agregados. É quantidades, novamente “jogando fora a criança
certo que esse era o espelho de um modelo civi- com a água do banho”). Essa zona está longe de
lizatório que tinha na relação salarial o seu core e ser apenas uma forma de “brasilianização” (para to-
que postulava – por fortes razões intelectuais, po- mar um dos possíveis adjetivos em voga e aquele
líticas, mas também morais – que a universaliza- que mais de perto nos toca), termo que alude, para
ção dessa norma era uma expressão da moderni- ser provocativa, à transposição de um modelo de
dade e, por isso mesmo, um norte construtor da certa forma espúrio ante os sistemas sociais de for-
ação política, da intervenção governamental e do te tradição regulatória, protecionista e republicana.
refinamento acadêmico. Isso justificava situar as Ao contrário, a recorrência do desemprego pode
análises entre dois pólos, tipificados (cada um de- ser produzida, conforme sugerido acima, em distin-
les) em uma única forma de expressão. tos contextos societais, a partir de fatores também
Mas, uma outra maneira de lidar com o as- diversos. Tampouco se resolverá a questão, creio
sunto também existe – mais sensível, eu diria –, eu, retomando-se os termos do velho debate sobre
mas que tem instaurado a disputa no campo do a marginalidade que tanto furor fez entre latino-
“bem medir”, sob o argumento de que, na estru- americanos e brasileiros, no sentido de indicar a
tura dos mercados de trabalho em sociedades de forma como a inserção das nossas sociedades no
industrialização tardia, o outro do emprego esta- capitalismo cindia o universo social e criava dois
bilizado não pode ser apenas o desemprego insti- circuitos de reprodução.
POR UMA SOCIOLOGIA DO DESEMPREGO 117

Pelo contrário, acredito que essa zona (que a expansão econômica, a taxa de desemprego [aber-
pode ser quantificada, com mais precisão, intro- to] na zona da OCDE poderá se manter elevada –
próxima a 7% no ano 2000. Taxa que será ainda
duzindo-se novas categorias e formas de desem-
superior à registrada antes da última recessão” (p.
prego e/ou de emprego) tem uma origem, um 18; grifos meus).
fundamento, uma representação normativa, uma
6 Os sistemas nacionais de seguro-desemprego são
construção institucional e uma introjeção subjeti-
fartos em exemplos destes códigos específicos de
va que devem ser buscadas em cada caso, não legitimidade, na medida em que lhes cabe definir
sendo tomadas exclusivamente como um epifenô- em que condições os trabalhadores recebem os be-
meno de uma certa “globalização” ou “mundiali- nefícios previstos e por quanto tempo. Maruani e
zação”. Pois, apesar das recorrências (que nos le- Reynaud (1993) apontam um exemplo eloqüente:
vam a colocar o ônus da explicação no plano glo- em diversos países, prevalece um tipo de código de
legitimidade que produz o entendimento de que a
bal), os fenômenos, quando bem entendidos em mulher casada deverá fazer jus a um valor de segu-
suas dimensões normativa, institucional e subjeti- ro menor que a mulher solteira (tal norma estaria vi-
va, não apenas variam entre países (e seria acacia- gente em países como a Alemanha, a Inglaterra e a
no parar por aqui), mas só adquirem sentido, só Holanda, por exemplo). Este é, muito provavelmen-
podem ser explicados e efetivamente compreen- te, um fator não desprezível de elevação do trânsi-
to à inatividade entre mulheres casadas, expostas a
didos em toda a sua extensão, se estudados com-
situações de espera prolongada de trabalho, e que
parativamente, isto é, tendo em conta as especifi- resulta do modelo vigente de representação coleti-
cidades dos seus quadros societais. va das relações sociais de gênero. Voltarei a esse
Estarei com isso desafiando o estatuto inter- tema em seguida.
pretativo de uma economia do trabalho? Nem de 7 Sua elevação constante levou-as ao patamar de 5%
longe. Apenas busco, com esse tipo de argumen- em 2001, percentual extraordinário para a média ja-
to, avançar numa sociologia do desemprego, pela ponesa onde, mesmo quando apresentava taxas em
qual urge propugnar e sobre a qual o acúmulo de alta, elas eram inferiores a 3% da população econo-
reflexão comparativa, temática, teórica e metodo- micamente ativa.
lógica se faz urgente. 8 Notadamente por meio do mecanismo dos prêmios
de produção.
9 A flexibilidade no mercado de trabalho se ancoraria
NOTAS em características tais como: facilidade nos procedi-
mentos de demissão, seguro-desemprego de valor
1 Perceptível, por exemplo, nas regulações do comér- pouco atraente, salário-mínimo bastante reduzido,
cio e dos direitos de propriedade. dentre outras, todas elas apontando para um con-
texto social que aliava práticas de emprego (tradi-
2 Deliberadamente recorri, nesse parágrafo, a uma
cionalmente desreguladas) à importância crescente
coleção típica de categorias oriundas do jargão que
de um welfare privado (ancorado nas políticas de
se tornou corrente. Meu objetivo é chamar a aten-
benefícios diretamente outorgadas pelas empresas).
ção para o fato de que tal convergência se inscreve
também nos esquemas interpretativos, produzindo 10 Cuja taxa de desemprego teria dobrado nas décadas
um léxico e uma gramática próprios (porque desen- de 1970 e 1980, alcançando 9% em 1990.
volvidos para retratar o que se acreditava serem as
11 Estas alcançavam 6%, equivalendo ao dobro do
novas tendências do trabalho reestruturado em con-
caso francês, por exemplo (Demazière, 1995).
textos de globalização).
12 Expresso nas normas mais rígidas que cercam as de-
3 Muitas vezes sem correspondente aumento de pro-
missões, em salários mínimos relativamente eleva-
dutividade (o que, nos termos atuais, acarreta uma
dos e em valores de seguro-desemprego que permi-
redução do rendimento do trabalho).
tem condições mínimas de subsistência.
4 Como o emprego por tempo determinado ou o em-
13 De fato, a única forma de desemprego de longa du-
prego de tempo parcial. ração moralmente aceita era aquela dos indivíduos
5 Dedecca (1996) refere o alerta da OCDE, formulado tornados fisicamente incapazes para o trabalho, seja
em 1995, no sentido de que, “mesmo que prossiga por doenças (decorrentes ou não do exercício pro-
fissional), seja por acidentes (decorrentes ou não da
o
118 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 N 50

atividade de trabalho). Apenas a estes se estendia, até so olhar interpretativo das conotações conjunturais
o fim dos “anos dourados”, o benefício da segurida- e do debate político que esse conceito despertou
de social; os demais eram computados como inati- entre nós, no Brasil dos anos de 1990, para reter e
vos, e não mais como desempregados. Não é de es- refletir sobre a pertinência e valor heurístico daque-
pantar que esta concepção tenha vigorado durante o la formulação original do conceito (cf. Ledrut,
mesmo tempo em que a relação de emprego era re- 1966), como sendo “a probabilidade, mais ou me-
presentada, nessas mesmas sociedades, pela forma- nos elevada, de que uma pessoa, à procura de em-
padrão do assalariamento estável e protegido. prego, logre obtê-lo”. Por vezes, embora difícil, esse
é um útil exercício, especialmente num ramo disci-
14 Para uma análise da introdução, em nosso sistema
plinar como o da sociologia do trabalho cuja agen-
de representações coletivas, da categoria “desem-
da de reflexão é tão profundamente devedora da (e
prego”, ver Salais, Bavarez e Reynaud (1986) e To-
emula tão fortemente com a) pauta dos agentes so-
palov (1994).
ciais do denominado “mundo do trabalho”.
15 Provenientes das pesquisas sobre emprego condu-
19 Pretendo aqui chamar a nossa responsabilidade
zidas pelo INSEE (Institut National de la Statistique
para alimentarmos, no Brasil, um debate acadêmico
et des Études Économiques).
em torno de um conceito que tem trajetória não
16 Considerada aqui no sentido que lhe conferira Le- desprezível no campo dos estudos do trabalho, mas
drut (1966): chance de permanecer empregado, ou que assomou recentemente a cena do debate brasi-
de obter um novo posto de trabalho, se demitido. leiro marcado pela polarização ao redor dos argu-
mentos que sustentaram as políticas públicas de
17 Faço um intervalo nessa linha principal da minha qualificação e emprego a partir de 1995.
argumentação apenas para uma reflexão em parale-
lo, que me parece interessante. Essa resignificação 20 Nesse item minha reflexão é fortemente devedora da
(estrutural e simbólica) do fenômeno do desempre- forma de problematização que venho recentemente
go é intelectualmente percebida de modo distinto desenvolvendo com outros colegas, e cuja primeira
em diferentes comunidades acadêmicas que a rece- formulação conjunta se encontra disponível em De-
bem e processam. Na França, por exemplo, mani- mazière, Guimarães, Hirata, Pignoni e Sugita, 2000.
festa-se uma polarização entre uma “sociologia do
21 Apenas muito recentemente os estudos têm avança-
trabalho” e uma “sociologia do emprego” (que re-
do questionamentos a esta suposta similitude, pon-
constroem suas raízes, linhagens e lealdades de
do-a em xeque mesmo quando considerados ape-
modo sistemático; ver, por exemplo, Maruani, De-
nas países relativamente similares em termos da na-
mazière em suas reflexões recentes). Já no Brasil, a
tureza do seu desenvolvimento capitalista (cf. Gallie
sociologia do trabalho pouco a pouco passa a apro-
e Paugam, 2000).
ximar o ponto de vista dos estudos dos locais de
trabalho (dominante em nossa tradição de análises 22 Acompanhar a história de vida dos conceitos pode
do processo de trabalho e mobilizações sociais, que ser uma forma de perceber a maneira de deslindar
nasceu no final dos 70, deu a tônica aladora nos 80 os problemas. Assim, não deixa de ser significativo
e se manteve ainda forte na primeira parte dos 90), que só muito recentemente a noção de “empregabi-
ao ponto de vista dos estudos sociológicos sobre os lidade” tenha sido erigida à posição central no dis-
mercados de trabalho (importante nos anos de 1960 curso que informa as políticas sociais; ora, de há
e 1970, sob a égide das análises acerca do desenvol- muito ela estava disponível no cardápio da burocra-
vimento, modernização e marginalidade ocupacio- cia estrangeira, fazendo parte do universo discursi-
nal, mas eclipsados do mainstream da sociologia vo das agências internacionais (vide Comunidade
nos anos de 1980, momento em que coube aos eco- Econômica Européia) e, com muito mais razão, sua
nomistas do trabalho manter viva tal tradição de es- presença teria cabimento num discurso governa-
tudos). O compromisso parece estar sendo tecido mental em realidade como a brasileira, de intenso
em torno de uma nova agenda temática, da qual trânsito ocupacional. Quanto às políticas de assis-
destacaria apenas alguns pontos: as análises sobre tência, é notória a dívida social acumulada e escapa
estratégias de reestruturação das firmas e seu nexo aos objetivos deste texto fazer a análise da mesma.
com destinos ocupacionais dos trabalhadores; os es-
tudos sobre reespacialização das firmas (greenfields, 23 Para uma análise de dados relativos à população
estratégias de negócios em cadeias globalizadas) e ocupada na indústria, ver Carvalho, 1992.
impactos sobre mercados regionais de trabalho; 24 Na reflexão que compõe essa parte final novamen-
análises sobre privatização e estratégias de gestão te recupero argumentos e hipóteses do projeto que
de desligamento e mobilidade de trabalhadores de- ora desenvolvo “Desemprego: abordagem institu-
mitidos no mercado de trabalho. cional e biográfica – Uma comparação Brasil, Fran-
18 Nesse ponto, apelo ao leitor no sentido de que pro- ça Japão” (Demazière, Guimarães, Hirata, Pignoni,
curemos (ao menos momentaneamente) despir nos- Sugita, 2000).
POR UMA SOCIOLOGIA DO DESEMPREGO 119

25 Outra vez, o recurso à história das disputas pela vidade das mulheres (ver Bruschini, 1998; Lavinas,
construção dos conceitos e das medidas é eloqüen- 1998) acompanha uma mudança no perfil daquela
te. A polêmica em torno da medida do desempre- que está no mercado: em vez de jovem, solteira e
go, no Brasil, surgiu no bojo de uma ampla crise de sem filhos, são as de mais idade, casadas, e com fi-
crescimento e de emprego, a do início dos anos de lhos as que sustentam o crescimento das taxas de
1980, mas também de uma crise de legitimidade po- atividade (Bruschini, 1998; Guimarães, 2001).
lítica dos governos militares, como demonstra a am-
pla vitória oposicionista nas eleições de 1982. Nes-
se exato momento, o índice oficial, produzido pelo
IBGE com base na norma OIT, passou a ser desafia- BIBLIOGRAFIA
do por uma outra forma de medida, testada numa
pesquisa sindical sobre condições de vida em São ALVES, Edgard Luiz Gutierrez & SOARES, Fábio Ve-
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ceria por uma instituição intersindical (o Dieese) e
por um órgão de governo local (governo, então
AMADEO, Edward; BARROS, Ricardo Paes de;
oposicionista, de Franco Montoro), a Fundação Sea- CAMARGO, José Márcio; MENDONÇA,
de, organismo ligado à Secretaria de Planejamento Rosane; PERO, Valéria & URANI, André.
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do em metodologia distinta, introduz duas outras tment process”. IPEA, Série “Textos para
formas de desemprego, além do clássico desempre-
Discussão”, 317, out.
go aberto: o desemprego oculto pelo trabalho pre-
cário e o desemprego oculto pelo desalento. Só BASTIN, N. (1987), “De la gestion déliberée du
para exemplificar, segundo essa mensuração alter- paradoxe”. Grand Angle sur l’Emploi, 2,
nativa, a taxa de desemprego, em 1998 (ano toma-
apud Demazière, 1995.
do como referência, visto que era o último para o
qual tínhamos informação quando, em 1999, inicia- BÉNOIT-GUILBOT, Odile & GALLIE, Duncan
mos a refletir com vistas à comparação internacio-
(eds.). (1992), Les chômeurs de longue
nal), não seria de 7,6%, mas de 18,3%.
durée. Actes Sud, Arles, apud Demaziè-
26 É certo (e pesquisas empíricas o demonstraram) que re, 1995.
os indivíduos em posições sociais mais fragilizadas
ou aqueles mais pauperizados tendem a fazê-lo em
BRUSCHINI, Cristina. 1998. “Gênero e trabalho fe-
menor proporção. É certo também que o prolonga-
mento da duração do desemprego pode conduzir minino no Brasil: novas conquistas ou
ao desalento (que implica na suspensão da procura persistência da discriminação? Brasil,
ativa de trabalho – elemento central de definição da 1985 a 1995”. Comunicação apresentada
figura do desemprego) e, com isto, pode acarretar a no seminário “Trabalho e Gênero: Mu-
interrupção dos benefícios e a desqualificação para
danças, Persistências e Desafios”,
o sistema institucional de proteção. Mas não são es-
ses os motores principais que dão sentido à condu- ABEP/NEPO, Campinas, 14-15 abr.
ta da “clientela” vis-à-vis o sistema francês de insti- CARVALHO, Ruy de Quadros. (1992), “Projeto de
tucionalização do desemprego. Por isto mesmo, es-
primeiro mundo com conhecimento e
tima-se que mais que 80% dos desempregados ins-
crevem-se na ANPE. trabalho do terceiro?”. Comunicação
apresentada ao GT “Processo de Traba-
27 Nesse país as curvas em “S” ainda são um bom mo-
lho e Reivindicações Sociais”, Encontro
delo para representar o movimento das taxas de
participação feminina. Para estudo cuidadoso e rico Anual da Anpocs, Caxambu.
em detalhes, ver Sugita (2002). Na França (como na CARDOSO, Adalberto. (2000), Trabalhar, verbo
Europa, em média), elas tendem a aproximar-se das
curvas de atividade masculina (no caso francês isto
transitivo: destinos profissionais dos de-
é evidente; ver Maruani, 2000), e mesmo no Brasil serdados da indústria automobilística.
o crescimento recente e impactante das taxas de ati- Rio de Janeiro, Editora da FGV.
o
120 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 17 N 50

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RESUMOS / ABSTRACTS / RÉSUMÉS 183

POR UMA SOCIOLOGIA FOR AN UNEMPLOYMENT POUR UNE SOCIOLOGIE


DO DESEMPREGO SOCIOLOGY DU CHÔMAGE

Nadya Araujo Guimarães Nadya Araujo Guimarães Nadya Araujo Guimarães

Palavras-chave Keywords Mots-clés


Desemprego; trajetórias ocupacio- Unemployment; Occupational Chômage; trajectoires occupation-
nais; Brasil. Trajectories; Brazil. nelles; Brésil.

O artigo busca refletir sobre os elos The article aims at reflecting on the L’article propose une réflexion sur les
entre os fenômenos do emprego e links between the phenomenon of liens entre les phénomènes de l’em-
do desemprego em contextos de in- employment and unemployment in ploi et du chômage dans des con-
tensa flexibilização do trabalho e de an intense made flexible work con- textes d’intense flexibilisation du tra-
reconstrução institucional e normati- text as well as the institutional and vail et de la reconstruction institu-
va dos padrões de proteção ao traba- normative reconstruction of the tionnelle et normative des valeurs de
lhador. Para tanto, a argumentação se standards of workers’ protection. In protection du travailleur. Pour cela,
desenvolve em três direções. Em pri- doing so the arguing unfolds in l’argumentation se développe en
meiro lugar, acompanha o movimen- three directions: Firstly, it studies the trois directions. En premier lieu, elle
to de re-significação da noção de movement to redefine the notion of accompagne le mouvement de re-
“desemprego”, perseguindo, com a “unemployed,” pursuing, using the signification de la notion de ìchô-
literatura sociológica recente, a cons- recent sociological literature, the mage”, tout en poursuivant, avec la
tituição, e legitimação social, da nova constitution and social legitimacy littérature sociologique récente, la
figura do “desempregado de longa making of the new idea of the “long- constitution et la légitimation sociale
duração”. Em segundo lugar, compa- term unemployed.” Secondly, it com- du nouvel aspect du “chômage de
ra desenvolvimentos teóricos volta- pares theoretical developments that longue durée”. Ensuite, il compare
dos a entender este fenômeno com have tried to understand such phe- les développements théoriques qui
os esforços empreendidos pela so- nomenon with the efforts made by cherchent à comprendre ce phéno-
ciologia brasileira do trabalho no the Brazilian labor sociology to mène grâce aux efforts entrepris par la
sentido de interpretar a problemática interpret the problem unemploy- sociologie brésilienne du travail dans le
do desemprego. Em terceiro lugar, ment. Finally, it claims the heuristic sens d’interpréter la problématique du
argumenta em favor do valor heurís- value of contextualized comparisons chômage. Finalement, il soutient la
tico de comparações contextualiza- to test, for the Brazilian case, hypoth- valeur heuristique de comparaisons
das para testar, para o caso brasilei- esis developed by the so-called unem- contextualisées en vue de tester, pour
ro, hipóteses desenvolvidas pela so- ployment sociology in Europe, above le cas brésilien, les hypothèses dévelo-
ciologia do desemprego na Europa e, all, France. ppées par la sociologie du chômage
sobretudo, na França. en Europe et, surtout en France.

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