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Hudson Vieira de Andrade1

O objetivo de nosso trabalho é investigar o posicionamento do psicanalista francês


Jacques Lacan diante do surgimento da ciência moderna e suas implicações à psicanálise. Essa
pesquisa foi suscitada pelo relativo consenso que existe atualmente nas discussões
psicanalíticas que lhe concebe como campo autônomo diante de outras disciplinas, sobretudo
em relação à ciência. O posicionamento predominante afirma que o dispositivo clínico da
psicanálise deriva da experiência clínica, deixando de lado qualquer reflexão mais profunda
sobre sua relação diante da ciência.
Desse modo, o nosso tema de investigação constituísse do diálogo entre psicanálise e
ciência, resta saber qual método usar para realizar esse trabalho. Nossa proposta é usar o método
de desleitura, pensado por Ricardo Goldenberg em seu livro Desler Lacan2. Por sua vez, esse
conceito foi criado pelo crítico literário Harold Bloom no seu livro A map of misreading, quando
trata da influência que os textos exercem uns sobre os outros. Vejamos como isso nos ajuda.
Para o nosso propósito, o método de desleitura serve para afirmar que não existe o
fundamento último que determine o sentido de um texto, visto que ele depende da posição do
leitor. O sentido do texto não é unívoco e qualquer leitura depende da posição do leitor para
estabelecê-lo sua significação. Mas não é apenas isso, o modo como determinado texto é lido
também é influenciado pelos demais comentadores que fazem parte do campo discursivo e que
buscam estabelecer o sentido do texto. Assim, o “desleitor” se encontra duplamente advertido:
está ciente que não existe leitura unívoca e também que o campo discursivo que pertence busca
determinar o sentido do texto.
Acreditamos que o lugar de destaque atribuído ao leitor diante do sentido do texto e do
contexto discursivo, torna o método de desleitura uma ferramenta potente para o tipo de
pesquisa que se espera no ambiente acadêmico. Pois o leitor/pesquisador além de estar
advertido que não existe sentido unívoco, precisa justificar sua interpretação levando em
consideração o contexto teórico que pertence. A partir desse método, o pesquisador não é um
mero comentador de textos, mas o intérprete que precisa argumentar diante de seus
predecessores o sentido que empregou em sua leitura. Vejamos como isso se aplica na nossa
pesquisa.

1
Discente no Programa de Pós-Graduação de Psicanálise: clínica e cultura pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul.
2
Goldenberg, R. Desler Lacan. São Paulo: Instituto Langage, 2018, pp. 30-58.
A obra de Jean-Claude Milner é de suma importância no diálogo entre psicanálise e
ciência, sua interpretação impacta de maneira bastante profunda o modo como esse assunto é
tratado atualmente. A respeito disso, ele afirma que Freud buscou sustentar sua descoberta
tomando o modelo da química e da física presente no seu contexto histórico. Essas disciplinas
seriam tomadas como modelo de ciência ideal que sustentaria o edifício teórico freudiano.
Todavia, o autor comenta que Lacan não tomou qualquer ciência como ideal, mas, pelo
contrário, buscou mostrar o que há de irredutível no objeto da psicanálise diante dela. Para
Freud teríamos um modelo de ciência ideal, enquanto que para Lacan teríamos um ideal de
ciência que preservasse o que há de específico na psicanálise. O autor comenta o seguinte:

Não faz, portanto, sentido perguntar em que condições a psicanálise seria uma
ciência. Tampouco faz sentido apresentar alguma ciência bem constituída
como um modelo que a psicanálise teria de seguir. Em outros termos, já que
não há ideal da ciência em relação à psicanálise, tampouco há para ela ciência
ideal. A psicanálise encontrará em si mesma os fundamentos de seus
princípios e métodos. Melhor, ela se verá suficientemente segura para poder
questionar a ciência.3

O autor afirma que já que não existe relação com qualquer ideal de ciência em Lacan,
também não haveria qualquer modelo de ciência para ser seguido. Nesse sentido, é no próprio
campo da psicanálise que são encontrados os fundamentos de seus princípios e métodos. A
extraterritorialidade da psicanálise lhe asseguraria não apenas enquanto campo autônomo
diante da ciência, como também essa posição lhe tornaria capaz de interrogá-la.
A partir do método da desleitura podemos questionar se o modo como Jean-Claude
Milner interpreta o diálogo entre psicanálise e ciência é realmente condizente com o que Lacan
sustenta. A extraterritorialidade da psicanálise diante da ciência seria algo sustentado pelo
próprio Lacan ou já seria uma interpretação de Milner? Vejamos o que o psicanalista francês
diz sobre isso.
Ao fazer o seu diagnóstico da situação da psicanálise no ano de 1954, Lacan afirma o
seguinte:

Primeiro, a curiosa postura de extraterritorialidade científica pela qual


iniciamos nossos comentários, e o tom magisterial com que os analistas a
sustentam quando têm que responder ao interesse que sua disciplina desperta
nos campos circunvizinhos.4

3
Milner, J-C. A obra clara: Lacan, a ciência, a filosofia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1996, p. 31.
4
Lacan, J. Situação da psicanálise em 1956. Em: Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998, p. 492.
Ele comenta que os analistas se colocam numa posição extraterritorial diante da ciência,
assim como argumentado por Milner, mas ele não diz que também sustenta essa posição. Lacan
complemente dizendo que os analistas respodem com um tom professoral o interesse suscitado
pela psicanálise nos campos vizinhos. Passamos para outra citação onde ele comenta novamente
o caráter extraterritorial da psicanálise.

Talvez pareça suficiente o lampejo de evidenciar que a extraterritorialidade


oculta de que provém a psicanálise, para ser abarcada, sugere ser tratada à
maneira de um tumor, pela exteriorização.5

A extraterritorialidade da psicanálise diante de outras disciplinas é apresentada de forma


mais taxativa, sugerindo que deve ser tratada como um tumor e ser extraída. Nessas duas
citações podemos notar que Lacan não apenas é contrário à extraterritorialidade científica da
psicanálise como também ela é tratada como uma doença que deve ser extirpada. Já que Lacan
não sustenta essa posição de extraterritorialidade, cabe perguntar como ele percebe o diálogo
entre psicanálise e ciência.
No momento que inaugura o seu ensino em 1953 com o Discurso de Roma, Lacan
busca organizar os conceitos da psicanálise e orientar o seu edifício teórico através do campo
da linguagem. Lacan compreende que o lugar da psicanálise não está concernido no campo da
arte, da magia ou da religião, mas no campo da ciência. E que esse lugar apenas será assegurado,
quando for resolvido os problemas no fundamento teórico da psicanálise.

A psicanálise desempenhou um papel na direção da subjetividade moderna, e não


pode sustentá-lo sem ordená-lo pelo movimento que na ciência o elucida. É esse o
problema dos fundamentos que devem assegurar a nossa disciplina seu lugar nas
ciências: problema de formalização, na verdade muito mal introduzido. 6

Notamos com isso que Lacan não sustenta uma posição extraterritorial como também
alinha seu programa de investigação no campo científico. Isso possibilita que nossa
interpretação caminhe na direção contrária daquela sugerida por Milner, ou seja, possibilita uma
desleitura sobre o sentido que foi introduzido por ele no texto. O método de desleitura
possibilita que seja realizado o trabalho crítico sobre o modo no qual vem sendo discutida
algumas questões no nosso campo de investigação, mantendo acesso o ambiente de
investigação do campo.

5
Lacan, J. Variantes do tratamento-padrão. Em: Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998, p. 331.
6
Lacan, J. Função e campo da fala e da linguagem em psicanálise. Em: Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
1998, p. 285.
Ainda resta perguntar qual modelo de ciência que Lacan está buscando aproximação e
o que isso representa para o dispositivo psicanalítico. Nossa investigação prosseguirá o caminho
delineado pelo próprio Lacan7 e utilizará como guia o filósofo e historiador da ciência moderna
Alexandre Koyré.

7
“Koyré é nosso guia aqui, e sabemos que ele ainda é desconhecido”. Ver em: Lacan, J. A ciência e a verdade.
Em: Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998, p. 870.

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