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Quando nasce um bebê, de certa forma, já tem como incumbência suprir certas expectativas, que já
existiam antes de seu nascimento. Portanto, fica claro que mesmo antes de o sujeito nascer, as
configurações vinculares já definiam certas características de sua personalidade. Os vínculos
significativos, que definem traços fundamentais na estruturação da personalidade, também continuam
influenciando a configuração do funcionamento do sujeito. Por essa perspectiva a frase de nossas
avós parece ganhar um grande sentido quando propõe: “diga com quem andas e eu te direi quem tu
és.”.
As relações influenciam na maneira como funcionamos, tanto de forma saudável quanto de maneira
nociva. Uma vinculação saudável pode propiciar a expansão do pensar e com isso um bom
desenvolvimento da personalidade. Por outro lado, um vínculo nocivo pode obstruir a ampliação do
pensamento dificultando o desenvolvimento da maturidade emocional e consequentemente
prejudicando a estruturação da personalidade. Isso deve ser tão comprometedor quanto mais tenra for
a idade do sujeito em desenvolvimento.
Sendo de uma maneira ou de outra, essa influência deve ocorrer essencialmente através de modelos.
Quando somos amados com sinceridade, por exemplo, aprendemos a amar a nós mesmos e com isso
nos qualificamos para amar o próximo. No entanto, enquanto a influência que combina amor e
sinceridade é poderosa, proporcionando a expansão e o desenvolvimento, a influência que esteja
permeada de ódio tem consequências desastrosas. Alguém mentalmente comprometido pode
ameaçar a saúde mental daquele que se encontra intimamente ligado. A desorganização na mente de
um desorganiza a mente do outro.
Sigmund Freud (1856 – 1939) alertou com propriedade sobre o que denominou “lucro secundário” nos
pacientes. Para Freud (1017) lucro secundário consiste no benefício em continuar doente, ou ainda, as
vantagens em sustentar uma suposta doença. Freud percebeu em inúmeros casos que o paciente
percebera uma vantagem em continuar doente “e raramente deixa de haver ocasiões em que se
comprova que a doença, repetidas vezes, se torna útil e adequada, e adquire, por assim dizer, uma
função secundária que reforça novamente sua estabilidade.”. (Freud, 1917).
No entanto, não é só o paciente que deve lucrar com o estado de sua enfermidade, mas aquele que
convive com ele também pode ter um benefício nisso. Muitas vezes aquele que se relaciona com um
sujeito adoecido ou mesmo fragilizado, seja fisicamente ou emocionalmente, pode encontrar uma
forma de se beneficiar dessa situação. Amiúde, o diagnóstico dado a uma pessoa é muito conveniente
também a aquele que com ela está vinculado, trazendo certos benefícios ocultos. Esse benefício pode
ser desde ordem financeira, até no âmbito emocional. A isso poderíamos chamar de “ganho terciário”.
Isso pode se estender para além das patologias, mas deve também ser aplicável às características
mais amplas de cada sujeito.
Manter-se vinculado a alguém emocionalmente imaturo, por exemplo, pode trazer ao sujeito a
impressão de ser muito amadurecido. Assim como, manter-se numa relação com alguém fracassado
pode trazer a ilusão ao sujeito, de ser bem sucedido. Nessa relação parasitária, o sujeito que se sente
inferior obviamente também tem o ganho de se manter num estado confortável de comodismo.
O fato de o sujeito se impor frente ao outro, infligindo uma forma dominadora de ser, não é um sinal de
saúde emocional. Por mais que muitas vezes a arrogância seja idealizada por dar ares de
superioridade, por detrás de um prepotente existe sempre um grande inseguro de si mesmo.
Muitas vezes o sujeito demonstra uma suposta habilidade em comandar o outro, no entanto, mal
consegue conduzir a si mesmo. Dessa maneira, muitas vezes o sujeito mais comprometido com
incapacidades emocionais pode se esconder atrás de uma suposta sensatez, que na realidade é
amparada por arrogância, dissimulando sua insegurança com prepotência. Esse sujeito dificilmente
busca ajuda, até porque não acredita precisar. Muitas vezes aquele que busca psicoterapia é
justamente o sujeito emocionalmente mais saudável da família.
Uma psicoterapia bem sucedida não favorece exclusivamente o paciente, mas também a aqueles que
com ele se relacionam.
BION, W. R. [1962]. “Uma teoria sobre o pensar.” In: BION, W. R. Estudos psicanalíticos revisados. Rio de Janeiro: Imago, 1994. p.127- 137.
Freud. S. O TEORIA GERAL DAS NEUROSES, ESTADO NEURÓTICO COMUM, CONFERÊNCIA XXIV, PARTE III. (1917 [1916-17]),Obras
Completas, Vol. XVI.
____. A QUESTÃO DA ANÁLISE LEIGA: CONVERSAÇÕES COM UMA PESSOA IMPARCIAL (1926), Obras Completas, Vol. XX.
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