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Prof.
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Agradeço a todos os meus familiares que durante essa trajetória acadêmica não me
deixaram desistir. Ao meu pai Antônio, minha mãe Gisele, meus irmãos Henrique, Gabriel,
Luiza e Pedro, que são a razão de tudo.
Difícil na verdade é agradecer a todos os colegas que passaram e de alguma forma me
auxiliaram a concluir esse curso, mas não posso deixar de agradecer principalmente as minhas
amigas Adriana, Giovanna, Gabrielle e Vanessa, cada uma na sua particularidade e
essencialidade, mas que estiveram nesta jornada comigo desde o início, pelo apoio,
companheirismo, risadas e broncas ao longo do curso e da vida.
Agradecer à Deus por nunca ter me deixado levar pelos pensamentos negativos, e nas
tantas vezes em que pensei em dar um fim na graduação não me deixou desistir.
Não esquecendo dos amigos de trabalho, Bruna, Carlos, Claudinha, Evelyn, Fernando e
Thiago, que mesmo na correria do dia a dia se preocuparam e me ajudaram nos afazeres para
que este trabalho fosse finalizado, e com certeza, pela confiança e amizade formada.
E agradeço ao meu professor orientador Marcelo, pelos ensinamentos dentro da sala de
aula e o interesse que me despertou sobre o tema do trabalho realizado, ao auxílio dado para a
realização do mesmo.
RESUMO
O trabalho realizado aborda o procedimento utilizado na oitiva das crianças que são
vítimas ou testemunhas do abuso sexual infantil. É avaliado o método comum utilizado na oitiva
das crianças e possíveis danos que podem ser causados a elas por esse procedimento não ser
adequado à sua realidade, a uma linguagem informal ao qual ela se sinta confortável para relatar
os fatos de acordo com o que presenciou, e até mesmo a falta de preparo e conhecimento por
parte dos agentes estatais para lidar com elas. Além de analisados os possíveis danos, dá-se
enfoque aos meios alternativos e que ainda não foram regulamentados para que essa oitiva
proceda de maneira menos invasiva a criança, minimizando ao máximo a vitimização
secundária causada pelos agentes estatais (tanto na fase de inquérito quanto na fase de processo
penal). Alguns desses procedimentos especiais já são utilizados por algumas cidades do país e
outros têm como base procedimentos utilizados no estrangeiro, mas que também visam a
proteção das crianças e de seus direitos.
The work deals with the procedure used in the hearing of children who are victims or witnesses
of child sexual abuse. It evaluates the common method used in the hearing of children and
possible damage that may be caused to them by this procedure do not be appropriate to their
reality, an informal language to which she feels comfortable to report the facts according to
what witnessed, and even the lack of preparation and knowledge on the part of state agents to
deal with them. In addition to analyzing the possible damage occurs approach to alternative
means and that have not been regulated so that this procedure has be less invasive way the child,
minimizing the maximum secondary victimization caused by state actors (both at the
investigation stage and in criminal proceedings phase). Some of these special procedures are
already used by some cities of the country and others are based on procedures used abroad, but
also aim to protect children and their rights.
Introdução...................................................................................................................................9
I. Vitimologia....................................................................................................................11
1.1 Vitimização primária, secundária e terciária..............................................................12
Conclusão..................................................................................................................................47
Referências Bibliográficas........................................................................................................49
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INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem a abordagem dos crimes sexuais que podem ser praticados
contra a criança, dando um foco maior na oitiva da mesma e os possíveis danos que podem ser
causados durante a coleta do seu testemunho sobre o crime e possíveis meios que façam com
que o dano causado seja minimizado.
Não podendo deixar de abordar a preocupação pela falta de regulamento específico e
preparo das autoridades do Judiciário Penal Brasileiro para tratar uma criança nessas situações
de abuso, tendo que a expor em procedimentos comuns de oitiva e um desgaste emocional e
mental acerca do tratamento e linguagem utilizados, deixando de observar os seus direitos à
proteção assegurados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e a Declaração Universal dos
Direitos Humanos.
Esse despreparo é uma grande preocupação quanto ao depoimento a ser realizado com
a criança, podendo ocasionar uma revitimização ou um dano maior do que o próprio delito em
si, por ter que a expor reiteradas vezes a pessoas desconhecidas para que ela apresente o que
sofreu.
É colocado para debate e conhecimento algumas formas alternativas para tentar
minimizar o sofrimento causado à criança quando ela se depara com o procedimento e
questionamento feito pelas autoridades judiciais. Estas autoridades, que por sua vez não tem
um preparo para proceder de maneira especial com a criança, necessitam de um auxílio de
profissionais qualificados e que possam instruir a criança de maneira adequada para retirar delas
informações necessárias e concisas sobre o delito penal.
Esses meios alternativos que buscam a proteção ou minimização máxima dos danos
causados a criança são trazidos no trabalho em seu capítulo final, todos eles já são aplicados
em casos no Brasil como em outros países, porém não possuem credibilidade suficiente no
Judiciário e Legislativo para se tornarem regra ou uma prática oficial para fazer a inquirição da
criança. O trabalho vem como forma de expor as características e conceitos de dois meios mais
abordados no Brasil, que são o Depoimento Especial e a Perícia Multidisciplinar.
Sobre a oitiva da criança, são analisados julgados que abordam esse depoimento especial
que deve ser realizado com a criança, e traz também a importância de ser feita essa oitiva pois,
ela é uma das peças fundamentais para se comprovar a materialidade do delito. Porém, esse
depoimento pessoal da criança sempre deve vir acompanhado e adicionado a outros meios de
prova e uma coerência entre os fatos apresentados e o depoimento das testemunhas, pois, as
10
práticas abusivas as vezes não deixam marcas físicas evidentes (ocasionada também pela
demora a procurar o judiciário) e são identificados através da entrevista no depoimento, que
mais uma vez, deverá ser feito em procedimento especial.
11
I. VITIMOLOGIA
Em um breve contexto histórico, o Direito Penal sempre teve como meta desde a Escola
Clássica o estudo da tríade “delinquente-pena-crime”, sendo deixada de lado a vítima. Porém,
com a evolução dos delitos praticados, a sua forma e proporção, o Direito Penal necessitou de
um auxílio para uma melhor análise do criminoso, da pena e do crime, assim, junto com outras
ciências a Criminologia passou a integrar esse grupo de estudos feitos.
O conceito de vitimologia passou a ser questionado e colocado em discussão pelo
criminólogo Hans Von Hentig (que foi o pioneiro nos estudos acerca da vítima) sendo
questionado e abordado também por Fritz Paasch, Franz Exner, Elemberger, Benjamim
Mendelsohn, entre outros estudiosos da época.
Contudo, a partir do ano de 1956 é que se sucedeu as ideias e formas definitivas que
concretizaram a vitimização, como apontam Newton Fernandes e Valter Fernandes em sua obra
(2012, p. 481):
A vitimologia nada mais é então, do que um braço da criminologia, uma área que
envolve não só o auxílio ao estudo das ciências penais e criminais, mas que visa entender as
consequências do crime na vida da vítima, a sua participação na ocorrência do delito, a sua
proteção jurídica e social, a sua relação com o agente causador do delito e os meios de
vitimização, mas abrange também a sociologia e psicologia criminal... não sendo apenas um
estudo sobre a vítima do delito.
Neste sentido de conceituar o que é a vitimologia, o psicólogo Jorge Elói1 complementa
que:
1
http://www.psicologiafree.com/areas-da-psicologia/criminologia-vitimologia/
12
Estado do número de crimes cometidos. Essa omissão pode ocorrer por falta de confiança por
parte da vítima com o sistema penal, ou então com base na vitimização terciária e por falta de
apoio familiar a vítima não vai até as autoridades competentes. O medo de haver a reiteração
do delito ou até mesmo uma vingança por parte do infrator, auxiliam a concretização das cifras
negras.
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Para começarmos a falar os tipos dos crimes sexuais praticados contra as crianças,
primeiro devemos realçar a qualificação (conceito) dada as mesmas segundo a Lei nº 8.069, de
13 de julho de 1990, mais conhecida como o Estatuto da Criança e do Adolescente, que em seu
artigo 2º, traz:
Art. 2º. Considera-se criança, para os efeitos dessa Lei, a pessoa até doze anos de
idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.
Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto
às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade.
Vale ressaltar também que neste ano de 2016 foi sancionada a Lei nº 13.257, de 08 de
março, que traz em seus primeiros artigos uma aprofundada conceituação da idade estipulada
para as crianças, trazendo uma nomenclatura diferenciada para tal e, algumas alterações:
Art. 2o. Para os efeitos desta Lei, considera-se primeira infância o período que
abrange os primeiros 6 (seis) anos completos ou 72 (setenta e dois) meses de vida da
criança.
É considerável que, a maioria dos crimes sexuais praticados contra a criança ocorre em
âmbito intrafamiliar, onde o agressor vai ser um membro da mesma família, consanguíneo ou
não, ou ainda, uma pessoa que tenha contato frequente e intimo com a família da vítima.
Luciane Pötter2 (2016, p. 67) apresenta em sua obra um conceito que trata bem sobre a
desestruturação da família, onde estão presentes características que podem ser causadoras do
incesto intrafamiliar:
“Não podemos deixar de reconhecer que famílias não estruturadas, econômica e
psicologicamente, monoparentais, ou ainda a presença de crises conjugais, falta de
amor, subversão de normas, valores e expectativas socais, acabam fragilizando as
relações familiares e proporcionando a violência que amotina os membros da família,
em especial os mais vulneráveis.”
Começando pelo ESTUPRO, ele é tratado no Código Penal Brasileiro, em seu artigo
213 com a seguinte redação:
Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção
carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: (Redação
dada pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de
2009)
2
Obra: Vitimização secundária infanto-juvenil e violência sexual intrafamiliar por uma política de redução de
danos. 2ª Edição. Salvador: Editora JusPodivm, 2016.
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A pena do crime de estupro também pode ser aumentada de ¼ se o crime for cometido
em concurso de 2 (duas) ou mais pessoas (artigo 226, inciso I, CP) e, da metade se o agente for
ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor
ou empregador da vítima ou por qualquer outro título de autoridade sobre ela (artigo 226, inciso
II, Código Penal). A pena pode ainda ser aumentada da metade se do crime resultar gravidez
(artigo 234-A, inciso III, Código Penal) e, de um sexto até a metade, se o agente transmite à
vítima doença sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador (artigo 234-
A, inciso IV, Código Penal).
Tratando agora do ESTUPRO DE VUNERÁVEL, ele vem tipificado no Código Penal:
Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14
(catorze) anos: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
§ 1o Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém
que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para
a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer
resistência. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
§ 2o (VETADO) (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
§ 3o Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave: (Incluído pela Lei nº
12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos. (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
§ 4o Se da conduta resulta morte: (Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.(Incluído pela Lei nº 12.015, de 2009)
consideração que “a tutela do direito penal, no campo dos crimes sexuais, deve ser absoluta,
quando se tratar de criança (menor de 12 anos), mas relativa ao cuidar do adolescente (maior
de 12 anos)” (NUCCI, 2015, p. 866).
Em se tratando agora dos enfermos ou doentes mentais (art. 217-A, § 1o, CP), a sua
vulnerabilidade é relativizada, no meio em que o dispositivo aponta apenas aqueles não têm o
necessário discernimento (imprescindível a perícia para atestar a sua falta) para a prática do ato
sexual, ou seja, ainda que tenham precária esfera de conhecimento, eles podem evidenciar
capacidade suficiente para absorção do ato, e consentir com sua prática. Deste modo, é correto
afirmar que dependendo da deficiência mental do indivíduo, é possível seu consentimento
válido para a prática do ato sexual, sendo ilógico considerar o deficiente como vítima absoluta
do crime de estupro de vulnerável.
Tratando agora da última parte do §1º do artigo 217-A, temos a figura do vulnerável que
não tem discernimento suficiente ou que não possa oferecer resistência a prática do ato
libidinoso ou conjunção carnal. Deve haver uma atenção especial ao interpretar este caso, pois
o seu vasto conceito pode abranger inúmeras situações não previstas pelo artigo.
Assim, podemos incluir como sujeitos desse grupo de vulneráveis, por exemplo, as
pessoas viciadas em drogas, as que ingerem medicamentos devido tratamento médico
(antidepressivos), e as quais não poderiam manter relações sexuais (por conta de condições
pessoais que não permitam tal ato). Neste grupo, as vítimas não são capazes de consentir, então,
havendo resistência nula ou perturbação total, é configurado o art. 217-A, §1º, CP. O crime é
cometido por quem abusa da condição da vítima, e não por quem por ventura venha a deixá-la
sem resistência.
O tipo objetivo trazido no caput é o condicionamento da pratica de relação sexual
(conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso) com o menor de 14 anos. Aqui, o conceito
e a caracterização da relação sexual se igualam ao que já foi apresentado ao estupro (art. 213,
Código Penal). Se iguala também frente a consumação do delito, uma vez que para os menores
de 14 anos a vulnerabilidade é considerada absoluta pela maioria da jurisprudência. Em regra,
é pacífico o entendimento de que o delito se consuma com a prática de qualquer ato libidinoso
ofensivo à dignidade sexual da vítima menor de 14 anos.
E em recente decisão unânime da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, houve a
ratificação do conceito utilizado pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, que
considerou legítima a denúncia por estupro de vulnerável, mesmo sem contato físico do
agressor com a vítima. O número do processo não foi divulgado por correr em segredo de
justiça (trata-se de uma investigação de uma rede de exploração sexual de menores em MS e
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envolve políticos e empresários da região de Campo Grande), mas em seu voto o relator
ministro Joel Ilan Paciornik disse:
No mesmo sentido que já foi defendido aqui, e no caso da rede de exploração de menores
a cima, o Ministério Público Federal defende que “o ato de observar a criança nua preenche os
requisitos previstos na legislação para ser classificado como um caso de estupro, por se tratar
de menor sem chances de defesa e compreensão exata do que estava ocorrendo”. Desta forma,
pode-se concluir que para a consumação do estupro de vulnerável não é necessário o contato
físico entre os agentes, bastando que este ato libidinoso satisfaça a lasciva de quem está na
condição de ser o abusador.
O estupro de vulnerável tem a sua forma qualificada quando da conduta resultar lesão
corporal de natureza grave (§ 3º) e, se da conduta do agente o menor vier e falecer (§ 4º). As
suas causas de aumento serão as mesmas incorridas ao crime de estupro, onde serão aplicados
os artigos 226, I (concurso de pessoas) e II (agente que possui poderes sobre a vítima) e, 234-
A, III (resulta gravidez) e IV (agente transmite à vítima doença sexualmente transmissível),
ambos os artigos do Código Penal.
Tratando agora sobre o estupro e o estupro de vulnerável, ambos os artigos são citados
na Lei número 8.072, de 25 de julho de 1990, a Lei dos Crimes Hediondos, essa Lei tem como
definição serem repugnantes os delitos praticados, ao conhecimento dos seres humanos, que
são cometidos com crueldade e sadismo. Segue abaixo o artigo 1º que traz o rol dos tipos penais
considerados hediondos – precisamente os delitos estudados:
Como colocado ao caput do artigo 1º, os crimes são hediondos tanto na sua forma
simples quanto na forma qualificada, como podemos ver em dois julgamentos abaixo:
Desta forma, pode-se finalizar apontando que o crime hediondo é aquele que possui uma
penalidade mais contundente, destacando os delitos mais graves que são praticados com mais
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frieza e que causam maior aversão à coletividade. É previsto para esses crimes, que a sua
punição comece a ser cumprida em regime fechado, com a possibilidade de progressão da pena
conforme o artigo 2º, §§ 1º e 2º, da Lei 8.072/1990:
Ao tratar do abuso sexual infantil, não se pode deixar de apontar as principais espécies
de provas a serem realizadas no curso da ação penal. A prova no processo penal é a busca da
verdade, a demonstração da certeza do que se alega, com isso “a produção da prova objetiva-se
demonstrar os fatos e as circunstâncias, de modo a convencer o magistrado a decidir com base
em fatos e não em processos intuitivos” (PÖTTER, 2016, p. 153).
Os destinatários das provas (atividades que demonstrarão a verdade dos fatos que são
relevantes para o julgamento) em regra são para aqueles que devam ter a sua convicção formada
e, de modo geral são produzidas para o órgão jurisdicionado (magistrado ou tribunal) que tem
competência de julgar o delito.
Por elemento da prova, explica Renato Brasileiro (2015, p. 575) que “são todos os dados
objetivos que confirmam ou negam uma asserção a respeito de um fato que interessa à decisão
da causa. Elemento de prova é representado por aquilo que, introduzido no processo, pode ser
utilizado pelo juiz como fundamento da sua atividade julgadora”.
Os sujeitos da prova são os meios em que ela é derivada, podendo ser eles reais ou
pessoais. A real é objeto em si que demonstra as informações sobre o delito (o ferimento) e, a
prova pessoal é aquela que vem da afirmação de um ato de conhecimento.
O modo pelo qual as provas serão apresentadas em juízo, podem ser nas formas:
testemunhal, documental e material. O autor Renato Brasileiro (2015, p. 576) traz:
do crime, etc. Por fim, testemunhal é a prova que consiste na manifestação pessoal
oral. A prova testemunhal é espécie do gênero prova oral, que é mais abrangente, já
que inclui os esclarecimentos de perito e assistente técnico, bem como eventuais
declarações da vítima.”
A fonte da prova, seu meio de prova e a maneira pela qual ela é obtida estão interligadas,
onde a fonte da prova é manejada para indicar as pessoas ou coisas que se consegue a prova,
dando-se a classificação como fontes pessoais (testemunha, acusado, ofendido e peritos) e as
fontes reais (documentos variados). As fontes surgem através do fato delituoso, elas são a
introdução ao processo penal. Os meios de prova são a maneira pela qual as fontes de provas
vão ser introduzidas ao processo, onde as partes e o magistrado vão tomar seu conhecimento,
lembrando que elas podem ser lícitas ou ilícitas (o artigo 1573 do CPP traz a inadmissibilidade
das mesmas). Por fim, a obtenção das provas regula certos procedimentos das provas regulados
em lei, que não precisam necessariamente ser realizado pelo Juiz (por exemplo, busca
domiciliar ou pessoal).
Adentrando agora sobre as provas a serem produzidas no caso de criança vítima ou
testemunha de abuso sexual, deve-se lembrar que poderá ocorrer uma produção antecipada de
provas, com base no artigo 155 do Código de Processo Penal em que é prevista sua produção
antes mesmo do início da fase investigatória do processo.
Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em
contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos
elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares,
não repetíveis e antecipadas. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)
Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições
estabelecidas na lei civil. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)
Os ilícitos sexuais infanto-juvenis necessitam quase que sempre dessa antecipação, para
que seja preservada as mínimas características do delito praticado na memória da criança e as
marcas físicas deixadas pelo acusado no momento de impor contra a criança algum tipo de lesão
corporal, também para que não seja veiculada a sua revitimização fato de ela ter que passar por
diversos agentes públicos que tomarão o seu depoimento, evitando que em uma segunda
inquirição ela sinta medo ou não queira falar. Caracterizados também os requisitos de
relevância, urgência e proporcionalidade, fica mais claro que com a antecipação da prova
3
Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as
obtidas em violação a normas constitucionais ou legais. § 1o São também inadmissíveis as provas derivadas das
ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem
ser obtidas por uma fonte independente das primeiras. § 2o Considera-se fonte independente aquela que por si só,
seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao
fato objeto da prova. § 3o Preclusa a decisão de desentranhamento da prova declarada inadmissível, esta será
inutilizada por decisão judicial, facultado às partes acompanhar o incidente. § 4o VETADO.
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testemunhal é benéfica ao processo, ao passo que ela poderá determinar se ocorreu ou não o
delito, podendo desfigurar algum possível acusado.
O amparo legal que essa medida está firmada foi colocada cuidadosamente por Luciane
Pötter (2016, p. 155 e 156) em sua obra, não cabendo alterações ao que foi escrito por ela e que
traz dispositivos legais das mais variadas legislações brasileiras:
“O amparo legal da medida, está no artigo 156, inciso I, e por extensão ao ar. 225,
ambos do CPP. No Estatuto da Criança e do Adolescente, cujos artigos 1º e 3º já
enfatizam o dever de aplicação do Princípio da Proteção Integral à Criança e ao
Adolescente às situações em que se vislumbra a possibilidade de algum dano, físico
ou psíquico, a essa categoria de pessoas. Outroassim, o artigo 4º do ECA positiva o
Princípio da Absoluta Prioridade à Infância e à Adolescência, preceito que se
harmoniza integralmente com o artigo 227 da Constituição Federal, que define o dever
do Estado, ao lado da família e da sociedade, de assegurar a efetiva e prioritária
proteção dos direitos das crianças e dos adolescentes pondo-as a salvo de todo tipo de
violência, institucionalizada ou não, notadamente a violência de cunho sexual. De
acordo com o artigo 156, inciso I, do Código de Processo Penal, é permitida mesmo
antes de iniciada a ação penal, a produção de prova considerada urgente e relevante,
observada a sua necessidade, adequação e proporcionalidade, ou seja, ainda no curso
do inquérito policial, busca-se realizar a tomada do depoimento da
criança/adolescente, cujo valor de prova definitiva, poderá embasar a ação penal.
Poderá ser a primeira e única vez que a criança/adolescente seja ouvida. No entanto,
salientamos, é possível a reinquirição da suposta vítima a qualquer tempo, reservado
ao juiz da ação de conhecimento deliberar sobre a conveniência e utilidade dessa
medida. E, se houver concreto cerceamento de defesa, o processo poderá ser anulado
e repetido. ”
Sobre os meios de prova em espécie, podemos dar uma grande ênfase às provas
contraídas mediante o exame de corpo de delito e perícias relacionadas.
O corpo de delito em si seria o conjunto de vestígios deixados após a infração penal.
Não necessariamente os vestígios devam estar no corpo de uma pessoa, mas são os vestígios
ligados a materialidade do delito, que são percebíveis ao conhecimento do homem.
As perícias relacionadas ao exame de corpo delito, são aquelas cujo o seu conhecimento
não está ao alcance do Juiz, que necessita de ajuda de especialistas específicos de várias áreas
distintas para que se possa esclarecer sobre o fato delituoso praticado.
Renato Brasileiro (2015, p. 642) conceitua o laudo pericial como sendo “a peça técnica
elaborada pelos peritos quando da realização do exame pericial”.
O laudo pericial, além de ser aquele que apura no corpo da vítima se este contém marcas
da violência contra ela praticada, possui uma vertente que é o laudo pericial psicológico.
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Nos casos de abuso sexual infanto-juvenil nem sempre vão restar vestígios no corpo da
criança ou então essas marcar podem desaparecer caso a perícia física no corpo demore a ser
realizada. Assim, as análises e avaliações realizadas por psicólogos podem gerar um ótimo
laudo que reflete as marcas gerais deixadas pelo agressor, necessitando serem objetivos ao
fornecer as informações ao magistrado, sendo elas precisas e de relevância para o processo.
As perícias feitas incluem uma entrevista com as vítimas e seus responsáveis/familiares,
onde o psicólogo deverá analisar os relatos por parte da vítima, comparando com o que foi dito
pelos familiares, o comportamento da vítima diante das perguntas mais incisivas ao abuso e ao
falar do suposto acusado, deve verificar também se existe a indução por parte de algum familiar
para a criança estar relatando o ocorrido (alienação parental, por exemplo).
4
http://www.scielo.br/pdf/ptp/v28n2/11.pdf
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Art. 212. As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, não
admitindo o juiz aquelas que puderem induzir a resposta, não tiverem relação com a
causa ou importarem na repetição de outra já respondida. (Redação dada pela Lei nº
11.690, de 2008)
Parágrafo único. Sobre os pontos não esclarecidos, o juiz poderá complementar a
inquirição. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)
Mais uma vez, pela situação do delito sexual praticado contra o menor ocorrer quase
que sempre de maneira discreta e sem presença de testemunhas, é de suma importância a oitiva
daqueles que de alguma maneira tenham notado um comportamento diverso por parte da
criança, ou visualizado alguma marca em seu corpo. Dessa forma, quando da oitiva das partes
e da testemunha e a sua harmonia com os fatos alegados, tem-se um conjunto probatório eficaz
capaz de comprovar ao Juiz a materialidade do delito, mesmo que sem a presença de um exame
de corpo delito.
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A tomada das declarações do ofendido durante a instrução penal não pode ser
confundida com a oitiva das testemunhas do processo, uma vez que as testemunhas são
obrigadas a prestar compromisso de dizer a verdade durante o seu depoimento e o ofendido não
possui esse compromisso, porém nada impede que a vítima seja ouvida.
O valor probatório das declarações do ofendido é relativo, todavia, naquelas infrações
penais praticas na clandestinidade, as declarações do ofendido ganharão mais importância (não
quer dizer que serão absolutas). Os delitos realizados na clandestinidade são aqueles que
ocorrem longe das vistas de qualquer cidadão.
O artigo 201 do Código de Processo Penal traz a previsão da prova por meio das
declarações do ofendido:
Art. 201. Sempre que possível, o ofendido será qualificado e perguntado sobre as
circunstâncias da infração, quem seja ou presuma ser o seu autor, as provas que
possa indicar, tomando-se por termo as suas declarações. (Redação dada pela Lei nº
11.690, de 2008)
§ 1o Se, intimado para esse fim, deixar de comparecer sem motivo justo, o
ofendido poderá ser conduzido à presença da autoridade. (Incluído pela Lei nº 11.690,
de 2008)
§ 2o O ofendido será comunicado dos atos processuais relativos ao ingresso e à
saída do acusado da prisão, à designação de data para audiência e à sentença e
respectivos acórdãos que a mantenham ou modifiquem. (Incluído pela Lei nº 11.690,
de 2008)
§ 3o As comunicações ao ofendido deverão ser feitas no endereço por ele
indicado, admitindo-se, por opção do ofendido, o uso de meio eletrônico. (Incluído
pela Lei nº 11.690, de 2008)
§ 4o Antes do início da audiência e durante a sua realização, será reservado
espaço separado para o ofendido. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)
§ 5o Se o juiz entender necessário, poderá encaminhar o ofendido para
atendimento multidisciplinar, especialmente nas áreas psicossocial, de assistência
jurídica e de saúde, a expensas do ofensor ou do Estado. (Incluído pela Lei nº 11.690,
de 2008)
§ 6o O juiz tomará as providências necessárias à preservação da intimidade, vida
privada, honra e imagem do ofendido, podendo, inclusive, determinar o segredo de
justiça em relação aos dados, depoimentos e outras informações constantes dos autos
a seu respeito para evitar sua exposição aos meios de comunicação. (Incluído pela Lei
nº 11.690, de 2008)
Mesmo não obtendo uma norma específica que regulamenta de maneira adequada a sua
oitiva, a palavra da criança nesses crimes é de essencial relevância, posto que a sua oitiva na
maioria das vezes vai ser a única afirmação sobre o fato delituoso e em coerência com
depoimentos de testemunhas e laudos médicos, deve ser dada a devida credibilidade e aceitação.
Segue agora algumas jurisprudências que realçam a importância da oitiva da vítima:
Nesse sentido é apontado que a linguagem utilizada para instruir e colher o depoimento
da criança não vai ser adequada a sua idade ou posição diante o processo criminal. Os
operadores do judiciário se deixam levar pela obsessão da busca da verdade sobre o fato e
esquecem que diante deles existe uma criança que já veio reprimida e com medo, que necessita
de uma atenção especial e um diálogo de “igual para igual” – só que nas circunstâncias em que
elas se encontram – que as deixem mais confortável e transmita segurança para que possam
falar sobre o delito em si e trazer características específicas capazes de comprovar a sua
materialidade e autoria.
5
Complemento colocado pela autora na sua obra e reproduzido também pela citação exposta: “o inquiridor ao
evitar ou não falar sobre o abuso sexual pelo constrangimento que o tema cria ou para tentar proteger a
criança/adolescente, pode transmitir a mensagem de que está negando ou rejeitando o abuso e dessa forma acaba
por rejeitar a própria vítima que acredita que não desejam ouvi-la ou que sua experiência não tem importância”.
31
Essa escassez do diálogo semelhante entre as partes processuais faz com que a criança
se reprima na hora de contar ao Juiz (que é uma pessoa estranha a ela, e aparenta não ter tanto
interesse assim pela sua fala ou que demonstra não acreditar na mesma – as vezes o magistrado
opta por não fazer a oitiva da criança visando a sua proteção, mas na verdade ele está
evidenciando a ela a sua falta de interesse pelo que ela tem a dizer) os fatos que presenciou, e
a vitimizando mais uma vez (vitimização secundária/revitimização), por essas circunstâncias
pode a criança viciar o seu depoimento pelo “dano adicional” sofrido. Podem ser eles a
apresentação ao Juiz de fatos sem conteúdo relevante para a busca da materialidade do delito,
ou então incorrer na Síndrome do Segredo6 e se manter calada na tomada do depoimento.
Outra maneira pela qual a criança pode se sentir lesada (proporcionando o dano), são
pelas atitudes dos entes públicos com relação ao proceder de seu encaminhamento dentro do
Fórum, onde na maioria das vezes a criança chega e deve permanecer ou passar pelo acusado.
Isso causa um certo constrangimento à criança, podendo, mais uma vez, fazer com que ela se
mantenha calada no depoimento ou até que negue as acusações feitas ao acusado, prejudicando
totalmente a busca da verdade, uma vez que seu depoimento é uma prova quase que essencial
para comprovar o delito.
Uma das mais incisavas causas da vitimização secundária que a criança sofre, são as
reiteradas vezes em que ela deve dar o seu depoimento para as autoridades. Seja ao início do
inquérito policial, ao Delegado, ao Conselho Tutelar, ao Magistrado... todas essas vezes em que
a criança fica recordando e revivendo o episódio do abuso, é uma maneira cruel e violenta de a
revitimizar, causando um dano que pode até ser mais grave do que o próprio abuso em si.
Em pesquisa por julgados que demonstrem a falta de técnicas especiais para tratar do
menor abusado, encontrei um curioso caso onde demonstra veemente o despreparo das
instâncias formais de controle social que deveriam agir em defesa e proteção do abusado, mas
que na verdade apenas comprovam o que já foi narrado neste capítulo:
6
A Síndrome do Segredo pode ser caracterizada por ameaças de violência ou morte, por uma alienação parental,
ou até mesmo pelo fato da criança se sentir culpada pelo abuso sexual, fazendo com que ela se mantenha quieta
sobre o ocorrido ou minta para preservar o acusado (que pode ameaça-la dizendo que se contar a sua família irá
se desintegrar). Essa síndrome pode ter a ela relacionada a Síndrome da Adição.
32
ocorrência. - Vale registrar a lição de Ernst Beda1, de acordo com o qual, para que a
noção de dignidade não se desvaneça como mero apelo ético impõe-se que seu
conteúdo seja determinado no contexto da situação concreta da conduta estatal e do
comportamento de cada pessoa humana. - No caso concreto tantos foram os erros
do ente público quantos os prejuízos causados ao menor: a começar pela
transferência desarrazoada - sem qualquer motivação - de uma criança para
uma casa voltada somente para o trato com adolescentes. E, sem embargo da
inobservância do dever de cuidado do Município de inserir um menor em
ambiente totalmente inadequado, desconsiderou a municipalidade por completo as
necessidades especiais do mesmo, portador de demência psíquica e limitações
físicas. - Se isso não bastasse, permitiu o Município que o menor convivesse com
o seu agressor nas dependências da Casa de Acolhimento, sem que houvesse
qualquer vigilância, o que foi determinante para o cometimento do abuso e para
transferência do adolescente para o Instituto Padre Severino. - Quantum
indenizatório fixado a título de dano moral, que se mostra aquém do dano suportado,
porém, incabível a sua majoração haja vista a ausência de apelo neste sentido.
RECURSO DESPROVIDO, FAZENDO-SE PEQUENO REPARO DE OFÍCIO NO
QUE CONCERNE A INCIDÊNCIA DOS JUROS DE MORA. (sem grifos no
original)
(TJ-RJ - REEX: 00151107920128190045 RJ 0015110-79.2012.8.19.0045, Relator:
DES. FLAVIA ROMANO DE REZENDE, Data de Julgamento: 17/06/2015,
DÉCIMA SÉTIMA CAMARA CIVEL, Data de Publicação: 23/06/2015 14:55)
33
“Os programas de atuação junto a crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual são
respaldados por normas penais e processuais a fim de minimizar a revitimização a que
7
Depoimento Especial
34
8
ROYO, Jordi Bajet i. Rol del psicólogo forense em la exploración judicial.
35
No Canadá, por exemplo, eles adotam um programa de preparação das crianças que vão
depor na Justiça. Esse programa consiste em trabalhar individualmente com as crianças, para
que elas compreendam o procedimento e a linguagem utilizada judicialmente. São trabalhados
com as crianças exercícios de relaxamento muscular, respiração e reestruturação cognitiva, e
isso ajudou para que fossem reduzidos os índices de medo e intimidação dos serviços judiciais
comuns.
Diante dessas amostras de legislações de diversos países, podemos constatar a
demonstração de preocupação com a redução dos danos causados às crianças vítimas e
testemunhas de abuso sexual, garantindo assim, a efetividade do artigo 12 da Convenção
Internacional de Direitos da Criança9 que traz no seu teor:
Artigo 12
1. Os Estados Partes assegurarão à criança que estiver capacitada a formular seus
próprios juízos o direito de expressar suas opiniões livremente sobre todos os
assuntos relacionados com a criança, levando-se devidamente em consideração
essas opiniões, em função da idade e maturidade da criança.
2. Com tal propósito, se proporcionará à criança, em particular, a oportunidade de
ser ouvida em todo processo judicial ou administrativo que afete a mesma, quer
diretamente quer por intermédio de um representante ou órgão apropriado, em
conformidade com as regras processuais da legislação nacional.
Não esquecendo da Chilhood Brasil10, que possui como tema “informar para educar,
educar para prevenir”, e tem como objetivo a defesa dos direitos da criança e adolescentes e
apoia programas que visam a sua proteção (física, moral, psicológica) focando na violência
sexual.
A visão da organização é de ser reconhecida pela sua luta em favor das crianças
ameaçadas e violadas na sua dignidade e integridade.
Os seus valores são a multiplicação dos conhecimentos e experiências, a cidadania e
responsabilidade social, a qualidade e compromisso com os resultados e a comunidade, a ética,
transparência e integridade com os trabalhos realizados.
E os verbos que podem definir a atuação da Childhood Brasil são: educar (mobilizando
e orientando a dedicação dada pelas organizações, governos e empresas para resultados mais
eficazes contra a violência sexual infantil), informar (por meio de campanhas e atividades que
9
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D99710.htm
10
Criada em 1999 pela Rainha Silvia da Suécia com o objetivo de proteger a infância e “garantir que as crianças
sejam crianças”, a Childhood Brasil é uma organização brasileira que faz parte da World Childhood
Foundation (Childhood), instituição internacional que conta com mais três escritórios: Estados Unidos, Alemanha
e Suécia. O trabalho nos outros escritórios, no entanto, é diferente do realizado no Brasil. Os escritórios
estrangeiros concentram suas atividades no apoio financeiro a projetos de organizações locais em mais de 16
países. Disponível em: http://www.childhood.org.br.
36
divulguem a sua causa) e, prevenir (por meio de grandes projetos que fortaleçam as instituições
que protegem as crianças em risco).
A Childhood Brasil possui vários programas11 de inclusão e proteção à criança e ao
adolescente, são exemplos desses programas que já foram criados: Programa na Mão Certa;
Programa Refazendo Laços; Concurso Tim Lopes de Investigação Jornalística; Programa
Turismo; Programa Grandes Empreendimentos; entre outros, mas como objeto de pesquisa,
vale a penar citar três que já foram conceituados por Luciane Pötter (2016, p. 262 e 263), que
se encaixam de uma maneira mais precisa ao trabalho:
11
http://www.childhood.org.br/programas
37
Por fim, não podendo deixar de realçar a importância da Convenção dos Direitos da
Criança12 que regulariza a maior gama de direitos da criança e à sua proteção, sendo aceita em
mais de 116 países.
E traz em seu preâmbulo que a falta de maturidade física e mental da criança faz com
que ela necessita de proteção e cuidados especiais. Cuidados esses que em relação ao tema do
trabalho serão tratados de uma maneira mais aprofundada.
Inicialmente, o projeto era denominado como “Depoimento sem Dano”, foi “inspirado
no trabalho monográfico de Veleda Dobke, Abuso Sexual: a inquirição das crianças – uma
abordagem interdisciplinar” (PÖTTER, 2016, p. 229) e idealizado pelo Desembargador Doutor
José Antonio Daltoé Cezar13. O projeto-piloto foi implantado no ano de 2003, no 2º Juizado da
Infância e Juventude de Porto Alegre/RS, assumindo em 2004 caráter institucional.
A ideologia do Depoimento Especial é a de proteger a criança ou adolescente que foi
vítima ou testemunha de abuso sexual, tentando evitar a sua revitimização, como: o seu contato
com o abusador nas dependências do Fórum, no despreparo pelos agentes que não possuem
qualificação adequada para o ato de tomar o depoimento infantil, ou ainda, na falta de estrutura
nas dependências competentes onde as vítimas e testemunhas serão ouvidas, podendo acarretar
em uma maior intimidação pela vítima.
Sobre o cuidado que os profissionais devem ter com o depoimento, após o projeto-piloto
em 2003, e seguindo a linha de proteção e direito a um tratamento digno às crianças, foi
implementada uma Recomendação editada pelo Conselho Nacional de Justiça, de número 33,
de 23 de novembro de 2010, que traz em seu teor:
12
http://www.unicef.org/brazil/pt/resources_10120.htm
13
Autor da obra: Depoimento sem Dano. Uma alternativa para inquirir crianças e adolescentes nos processos
judiciais. Porto Alegre: Ed. Livraria do Advogado, 2007.
38
RESOLVE:
RECOMENDAR aos tribunais:
I – a implantação de sistema de depoimento vídeogravado para as crianças e
os adolescentes, o qual deverá ser realizado em ambiente separado da sala de
audiências, com a participação de profissional especializado para atuar nessa prática;
a) os sistemas de vídeogravação deverão preferencialmente ser assegurados
com a instalação de equipamentos eletrônicos, tela de imagem, painel remoto de
controle, mesa de gravação em CD e DVD para registro de áudio e imagem,
cabeamento, controle manual para zoom, ar-condicionado para manutenção dos
equipamentos eletrônicos e apoio técnico qualificado para uso dos equipamentos
tecnológicos instalados nas salas de audiência e de depoimento especial;
b) o ambiente deverá ser adequado ao depoimento da criança e do adolescente
assegurando-lhes segurança, privacidade, conforto e condições de acolhimento.
II – os participantes de escuta judicial deverão ser especificamente
capacitados para o emprego da técnica do depoimento especial, usando os princípios
básicos da entrevista cognitiva.
III – o acolhimento deve contemplar o esclarecimento à criança ou
adolescente a respeito do motivo e efeito de sua participação no depoimento especial,
com ênfase à sua condição de sujeito em desenvolvimento e do conseqüente direito
de proteção, preferencialmente com o emprego de cartilha previamente preparada para
esta finalidade.
IV – os serviços técnicos do sistema de justiça devem estar aptos a promover
o apoio, orientação e encaminhamento de assistência à saúde física e emocional da
vítima ou testemunha e seus familiares, quando necessários, durante e após o
procedimento judicial.
V – devem ser tomadas medidas de controle de tramitação processual que
promovam a garantia do princípio da atualidade, garantindo a diminuição do tempo
entre o conhecimento do fato investigado e a audiência de depoimento especial.
Publique-se e encaminhe-se cópia desta recomendação aos Tribunais de
Justiça dos Estados e o do Distrito Federal e Territórios.
Essa recomendação colocada pelo CNJ traz um serviço especial para o procedimento da
abordagem feita à criança ou adolescente que vai depor em juízo. Esse procedimento consiste
em uma abordagem da criança em uma sala separada da sala de audiência normal, onde ela vai
conversar com um profissional especializado (e não o magistrado), com gravação áudio e
39
visual. Lembrando que é uma recomendação, e não uma imposição, os juízes seguirão essa
recomendação de acordo com o seu ideal.
De acordo com a organização elencada por Luciane Pötter 14, o Depoimento Especial
possui uma dinâmica separada por três etapas, sendo elas o acolhimento inicial, a entrevista
forense propriamente dita e o acolhimento final.
O acolhimento inicial procede com a intimação da criança/adolescente para comparecer
à audiência com pelo menos 30 minutos de antecedência, junto com o seu representante legal.
Esse tempo que vai anteceder o início da audiência serve para que a técnica responsável do
depoimento possa explicar para a vítima/testemunha e o seu representante como procederá o
processo de colheita do depoimento e o motivo de estarem em uma sala separada, explicar o
papel das autoridades e parte presentes na sala de audiência, e também, de analisar o
comportamento da criança. Nesse momento, a técnica já vai ter analisado o processo e vai estar
a par dos fatos apresentados e do grau de parentesco da criança e do réu.
Esse acolhimento serve também, para evitar o mais recorrente dos problemas, que é o
encontro do acusado com a criança nas dependências do Fórum, ocasião que pode causar um
abalo psicológico na criança e fazer com que ela não dê o seu depoimento.
O depoimento/inquirição/entrevista forense propriamente dita é a audiência de
instrução realizada nas formas da Lei, com o Juiz a presidindo, e possuindo em média uma
duração de vinte a trinta minutos, para a inquirição da criança.
Neste momento vão estar na sala especial somente a criança e a técnica especializada,
junto com os equipamentos ligados à sala comum de audiência, por meio de TV e áudio. Para
o início da coleta do depoimento, o magistrado verifica se todos os equipamentos estão
corretamente ligados e se comunica com a técnica para confirmar se pode começar os atos do
interrogatório. Após a sua confirmação é perguntado a criança se ela se incomoda que o réu
esteja na sala comum de audiência, para ouvir o seu depoimento, se ela comunicar que se sente
incomodada com a presença do acusado, este deve se retirar da sala (conforme art. 21715 do
CPP).
As perguntas são inicialmente feitas pelo Juiz, depois pelo representante do Ministério
Público, seguido dos advogados de defesa, e essas perguntas são feitas diretamente a técnica
14
Obra: Vitimização secundária infanto-juvenil e violência sexual intrafamiliar por uma política de redução de
danos. 2ª Edição. Salvador: Editora JusPodivm, 2016, p. 274 a 276.
15
Art. 217. Se o juiz verificar que a presença do réu poderá causar humilhação, temor, ou sério constrangimento
à testemunha ou ao ofendido, de modo que prejudique a verdade do depoimento, fará a inquirição por
videoconferência e, somente na impossibilidade dessa forma, determinará a retirada do réu, prosseguindo na
inquirição, com a presença do seu defensor. Parágrafo único. A adoção de qualquer das medidas previstas no caput
deste artigo deverá constar do termo, assim como os motivos que a determinaram.
40
que vai prontamente fazê-la a criança, só que de maneira específica ao seu linguajar e de modo
que a criança se sinta à vontade para falar, sem forçar a sua memória, deixando-a falar de acordo
com o que lembra.
No acolhimento final é feita uma conversa com a criança, seus responsáveis e familiares
e a técnica, com uma duração de trinta minutos. Nesse bate papo, não existe mais a presença do
equipamento audiovisual, e é colocado em questão os sentimentos que a criança teve na coleta
do depoimento, se existe algum tipo de raiva, tristeza, medo, vergolha... para que se necessário
sejam feitos atendimentos junto à rede de proteção física e mental da família. Afastando a ideia
de que o depoimento da criança foi utilizado apenas como um objeto processual.
Ao termino de toda a instrução processual, os depoimentos são todos gravados em um
DVD e anexados ao processo, para que se evite uma nova tomada de depoimento das crianças
e para que se necessário em fase recursal os julgadores tenham acesso às informações e emoções
contidas no depoimento. As declarações gerais da audiência ficam consignadas em ata assinada
pelo magistrado, porém, contendo apenas o que ele achou que fosse necessário para julgar o
fato delituoso.
Os técnicos acima mencionados são profissionais especiais capacitados para tomar o
depoimento da criança sem que ela se sinta pressionada ou com medo, ele (técnico) vai retirar
aquela formalidade toda apresentada pelo Juiz e não deve, em hipótese alguma, forçar o
depoimento da criança e verificar se ela está apta emocionalmente para falar.
Por ser o mediador entre o magistrado e a criança vítima ou testemunha, este técnico
deve possuir uma qualidade de trabalho quanto à eficiência na coleta e pós testemunho, na
qualidade acerca dos relatos e na transparência de confiança para com a criança. Diante desses
motivos, são elencados alguns aspectos16 que devem ser levados em conta pela equipe técnica
que auxilia o Depoimento Especial (PÖTTER, 2016, p. 277 e 278):
16
Orientação indicativa de Curso da Escola Nacional de Formação de Aperfeiçoamento de Magistrados.
Depoimento Especial de Criança e Adolescente em Situação de violência. Curso EAD 2013. Brasília-DF.
41
Por fim, o que se espera dos técnicos e operadores do direito é que eles tenham o mínimo
de conhecimento sobre as áreas envolvidas no delito a ser apurado, que tenham capacidade de
apurar as situações dentro de suas peculiaridades e buscar a solução mais concreta para as
necessidades apresentadas pelas crianças, deixando a coleta do depoimento mais sucinta e
transparente o possível.
Sobre os técnicos profissionais, é importante fazer uma última observação, onde o novo
Código de Processo Civil (Lei 13.105 de 16/03/2015) também traz uma previsão de
acompanhamento da instrução do depoimento com um profissional especializado, frisando a
preocupação por parte do legislador com a criança e o adolescente, poupando-as de perguntas
que possam ser inadequadas, conforme o artigo 699:
Art. 699. Quando o processo envolver discussão sobre fato relacionado a abuso ou a
alienação parental, o juiz, ao tomar o depoimento do incapaz, deverá estar
acompanhado por especialista.
17
http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=visualiza_noticia&id_caderno=&id_noticia=131306
18
Directiva 2011/92/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Dezembro de 2011, relativa à luta contra
o abuso sexual e a exploração sexual de crianças e a pornografia infantil, e que substitui a Decisão-Quadro
2004/68/JAI do Conselho. http://www.dgpj.mj.pt/sections/noticias/directiva-2001-92-ue
43
Para que se possa de fato proteger a vítima infanto-juvenil que sofreu violência sexual,
deve-se investir em alternativas para lidar com ela no procedimento de inquirição e processo
penal. Algumas alternativas já foram apresentadas nos primeiros dois pontos deste capítulo, e
uma outra alternativa é a perícia multidisciplinar, que consiste em um meio de prova por uma
perícia técnica em assuntos específicos.
Na perícia multidisciplinar são exigidas habilidades específicas por parte dos peritos,
pois variados são os danos e comportamentos apresentados pelas crianças vítimas do abuso
sexual. Deste modo, será necessária uma equipe com uma diversidade de profissionais (tratado
no artigo 159, §7o do CPP19) que atuem em áreas diferentes, para que possam auxiliar o
magistrado (enriquecendo de informações o conjunto probatório do processo) e assim fazer as
entrevistas em suas respectivas áreas, compondo a perícia.
O autor Renato Brasileiro (2015, p. 679) traz também a ideologia da perícia:
Este laudo apresentado pelos peritos deve conter o máximo de informações sobre a
vítima, descrevendo detalhadamente cada relato por ela apresentado, sem deixar passar nenhum
detalhe e, devem sempre trazer respostas aos quesitos apresentados pelas partes (artigo 16020,
caput, do CPP). Caso o laudo apresentado necessite de complementação, as partes poderão
requerer esclarecimentos sobre o que foi apresentado ou, requerer a oitiva do perito (artigo 159,
§5º, I, do CPP21).
19
Art. 159. O exame de corpo de delito e outras perícias serão realizados por perito oficial, portador de diploma
de curso superior.
§ 7o Tratando-se de perícia complexa que abranja mais de uma área de conhecimento especializado, poder-se-á
designar a atuação de mais de um perito oficial, e a parte indicar mais de um assistente técnico.
20
Art. 160. Os peritos elaborarão o laudo pericial, onde descreverão minuciosamente o que examinarem, e
responderão aos quesitos formulados.
21
§ 5o Durante o curso do processo judicial, é permitido às partes, quanto à perícia: I – requerer a oitiva dos
peritos para esclarecerem a prova ou para responderem a quesitos, desde que o mandado de intimação e os quesitos
ou questões a serem esclarecidas sejam encaminhados com antecedência mínima de 10 (dez) dias, podendo
apresentar as respostas em laudo complementar;
44
Ao terceiro capítulo deste trabalho foi abordado a forma de vitimização secundária por
parte do estado com a vítima infanto-juvenil e, como forma de prevenção dessa revitimização
o autor Eduardo Cambi22 (2014, p. 544 apud MISAKA, 2014, p. 119 e 120) elenca:
Os pontos colocados pelo autor são as características esperadas dos peritos e mais ainda,
uma preparação por parte do Estado com os seus servidores, para que eles estejam e sejam aptos
a reconhecerem a necessidade de se ter uma oitiva e um tratamento diferenciado para a criança,
que saibam como se portar para se comunicar no mesmo nível do menor ofendido.
E uma capacitação maior ainda por parte do magistrado que irá determinar e analisar
esses laudos periciais multidisciplinares, estes por sua vez que não irão apontar apenas se houve
o abuso físico da criança, mas irão apontar também como ela foi traumatizada
psicologicamente, se houve algum dano emocional e se ela está preparada ou não para depor
novamente na fase de instrução processual. Determinando também se a criança realmente
sofreu o abuso, se foi induzida ou fantasiou sobre os fatos, o que será fatal para o julgamento
do caso, determinando a condenação ou não do acusado e se ocorrer um erro por parte do
judiciária nesta fase, será fatal para qualquer uma das partes, levando a condenação de um
inocente ou a sobrevitimização da criança.
Por isso o magistrado deve se atentar e buscar o auxílio de todos os meios possíveis.
Analisando esse julgado abaixo, pode-se notar que a perícia é um meio de prova
indiscutivelmente relevante para o processo (não absoluta) – em conjunto com outros meios,
que irão demonstrar e ajudar o magistrado em seu julgamento e, a sua primeira
avaliação/entrevista feita (pode ser gravada por áudio e vídeo) impede uma possível
revitimização pelo fato da vítima ter que relatar repetidas vezes o abuso, segue:
22
CAMBI, Eduardo. Neoconstitucionalistmo e neoprocessualismo: direitos fundamentais, políticas públicas e
protagonismo judiciário. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.
45
23
SOARES, Sandra Cristina; OLIVEIRA, Rodrigo Grassi. Instrumentos de avaliação do abuso sexual na infância.
In FERREIRA, Maria Helena Mariante; AZAMBUJA, Maria Regina Fay de Azambuja (org). Violência sexual
contra crianças e adolescentes. Porto Alegre: Artmed, 2011.
46
a maneira como ela se porta ao falar de certos assuntos ou situações, e também é nessa hora que
o perito deverá interpretar o máximo de informações possíveis e detalhadamente. Ele deve
tomar cuidado com as perguntas feitas, para não induzir a criança a uma resposta. Uma boa
tática a ser seguida é a de pedir para a criança contar uma história de sua vida, sempre
demonstrando interesse ao que é dito.
Por fim, as escalas e questionários que consiste basicamente em um questionário feito
pelo perito, sob determinados assuntos, que é feito à vítima. E no final, ao juntar todas as
respostas o perito consegue um chegar a uma conclusão concreta a respeito do delito.
Um dos exemplos desses questionários (que se enquadram à primeira parte deste
capítulo, como uma política internacional para amenizar os danos) é o Childhood Trauma
Questionnaire24, que busca a compreensão por meio de questionário25 das experiências
traumáticas na infância, como a morte, o divórcio, violência, abuso sexual, doença, entre outros.
Existe também o Child Sexual Behavior Inventory (CSBI) que é descrito no seu site como um
“desenvolvimento voltado para avaliar crianças abusadas sexualmente ou suspeitas de terem
sido abusadas. A medida destina-se a ser preenchida por um cuidador do sexo feminino. É uma
das medidas mais amplamente utilizado de comportamentos sexuais. ”26
O que se pode concluir e é defendido por essa ideia de redução de danos é que a
conclusão dada pelos laudos periciais será mais concreta do que os outros meios de redução de
dano aplicados isoladamente no Brasil por esses laudos serem realizados por profissionais
específicos e especializados nas áreas em que estão atuando, são merecedores de uma maior
capacidade de apuração e investigação.
24
Disponível: http://www.midss.org/content/childhood-trauma-questionnaire
25
Questionário disponibilizado: http://www.midss.org/sites/default/files/trauma.pdf
26
Disponível: http://www.nctsn.org/content/child-sexual-behavior-inventory-csbi
47
CONCLUSÃO
Para finalizar o trabalho, não posso deixar de concluir que a vitimização secundária
exposta no Brasil é de grande preocupação, uma vez que as instâncias formais de controle
parecem não ter responsabilidade para lidar com o abuso sexual de menor, e na maioria das
vezes sempre vai ser caracterizada a sobrevitimização, independente de qual instância a
conduziu.
Acredito que a falta de preparo dessas não ocorra por má vontade, já que em diversos
Fóruns já está ocorrendo a mudança para se obter uma Vara Especializada para acolher o menor,
mas seria de interesse da coletividade como um todo que alguma norma fosse regulamentada
logo para começarmos a evitar desde a denúncia que haja reincidência da vitimização.
A respeito dos delitos penais que podem ser praticados contra o menor não existe dúvida
ou incerteza, ocorre que o meio pelo qual vai se comprovar o abuso não são concretos. Dessa
maneira, o meio pelo qual vai se formar o conjunto probatório fica corrompido, assim, o
magistrado deve sim buscar o auxílio com profissionais competentes e com carreira
especializada para poder conversar com o menor, buscando amenizar o máximo possível as
diferenças de linguagem e superioridade existente.
Não se pode deixar acontecer igual no rito comum de oitiva, onde o magistrado utiliza
da sua superioridade para intimar quem vai depor, para que digam a verdade, aí volta mais uma
vez ao despreparo dos agentes públicos, onde o magistrado em ocasiões diversas, por tentativa
de preservar a criança ou não conseguir se comunicar com ela de forma igualitária, deixa de
colher o seu depoimento. Essa conclusão que ele tem de não colher o depoimento da vítima faz
com que ela pense que o que ela tem para falar não é interessante, ocorrendo a revitimização.
Sobre a vitimização secundária da criança, depois das pesquisas feitas, pode ser
abordado sobre a sua oitiva as incessantes vezes que ela deve se comunicar e contar todo o
caminho do abuso para pessoas que são estranhas para ela; ou então, por não ter um
procedimento especial para a sua oitiva, a sua permanência no mesmo ambiente que o acusado,
essas e algumas outras formas descritas acima no trabalho, só fazem com que a criança fique
revivendo tudo, atormentando a sua mente, causando um dano “em dobro”. É inaceitável que
isso ocorra.
A conclusão que pode-se tirar de tudo o que foi apresentado e estudado até aqui é que
deve sim ser concretizada alguma forma legal para trabalhar com a criança vítima de abuso
sexual infantil, sendo por meio do Depoimento Especial, que já traz várias comprovações pela
48
aplicabilidade dada no Estado do Rio Grande do Sul e em outras cidades do Brasil, ou pelo uso
da perícia multidisciplinar, que trata da criança de uma maneira mais psicológica, mas que deve
ter a forma especial.
Esse procedimento especial deve vir pautado na importância da oitiva da criança, pois
a sua palavra sobre o abuso é de suma importância, tendo vista que na maioria dos casos de
abuso sexual infantil ocorre “às escuras” e sem nenhuma testemunha.
Desta forma, a inquirição correta da criança, buscando a verdade, mas sem a desrespeitar
deve ser a prioridade; deve-se usar de meios que façam com que a criança se sinta segura para
contar e sim, tudo gravado por sistema audiovisual, para não colocar a criança na revitimização.
Acredito também ser importante que essas inquirições sejam feitas pelo respaldo do
magistrado e com ele acompanhando o procedimento, para ele garantir os direitos da criança e
o seguimento conforme os dispositivos da Lei Penal Brasileira.
49
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVES, Leonardo Barreto Moreira. A Ação Penal nos crimes contra a dignidade sexual após
a lei 12.015/09. Disponível em: <http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI99401,61044-
A+acao+penal+nos+crimes+contra+a+dignidade+sexual+apos+a+lei+1201509>
BRASIL. Lei nº 13.257, de 8 de março de 2016. Dispõe sobre as Políticas Públicas para a
primeira infância.
BRASIL, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. ACR: 70049133788 RS. Relator: Ícaro
Carvalho de Bem Osório. Sexta Câmara Criminal Data de Julgamento: 22/08/2013. Data de
Publicação: Diário da Justiça do dia 30/08/2013.
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