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ALINE COSTA GIL

FUNÇÕES PSÍQUICAS, SUAS ALTERAÇÕES E A DINÂMICA DO SUJEITO EM


PROCESSO DE HOSPITALIZAÇÃO

Palhoça, 2006
1

ALINE COSTA GIL

FUNÇÕES PSÍQUICAS, SUAS ALTERAÇÕES E A DINÂMICA DO SUJEITO EM


PROCESSO DE HOSPITALIZAÇÃO

Relatório de pesquisa apresentado na disciplina


de Trabalho de Conclusão de Curso II, como
requisito parcial para a obtenção do título de
psicólogo.

Universidade do Sul de Santa Catarina

Orientadora Profª. Drª Maria do Rosário Stotz

Palhoça, 2006
2

AGRADECIMENTOS

Agradeço em especial aos meus pais Henrique e Iara pela oportunidade que me deram de
realizar um dos meus maiores sonhos. Pela dedicação, amizade e compreensão durante todo o
curso. Vocês são meus exemplos e minha força. Amo muito vocês!

A minha querida irmã Luciana, que mesmo de longe sei que sempre torceu por mim.

Ao meu namorado Arthur Rosa, companheiro de batalhas e conquistas. Te amo!

Meus agradecimentos a minha orientadora Professora Maria do Rosário Stotz, pelas horas de
dedicação e ensinamentos.

Ao Hospital de Caridade pela oportunidade de permitir a realização desta pesquisa. E


agradeço também aos pacientes I., V., e S. pelas entrevistas concedidas.

Ao meu mestre e amigo Professor Adriano Henrique Nuernberg, que sempre acreditou em
mim, me ajudando, auxiliando e incentivando. Abrindo portas e oportunidades ao longo desta
caminhada. Muito obrigada.

A Professora Maria Angela Giordani Machado, por compartilhar seus conhecimentos, pelas
muitas risadas nas supervisões de estágios e por sua amizade.

As minhas amigas Ana Carolina, Juliana, Gláucia e Renata, em que juntas chegamos a mais
uma conquista entre muitas que virão.

Aos queridos amigos de sempre: Nora, Lívia Cruz, Thays, Alexandre, César, Claúdia, Gerusa,
Andréia Colombo, Henrique e Mariana.
3

RESUMO

O presente trabalho apresenta como tema as funções psíquicas e a hospitalização. Utilizou-se


como referencial teórico a psicopatologia e trabalhos já desenvolvidos em hospitais gerais. O
trabalho tem como objetivo verificar quais são os principais aspectos alterados das funções
psíquicas afetividade e pensamento, observáveis através do discurso de pacientes internados no
Hospital de Caridade. Para que este objetivo fosse alcançado, foram entrevistados três sujeitos
internados no hospital de Caridade, durante o período de maio de 2006. O trabalho é classificado
como uma pesquisa exploratória, bibliográfica e qualitativa. Quanto ao delineamento é um estudo
de caso e se utilizou de um roteiro de entrevista semi-estruturada para a coleta de dados. Buscou-
se com essa técnica obter informações acerca de questões que envolvem esta problemática. Os
dados coletados foram analisados através da técnica de análise de conteúdo. Ao fim deste
processo, constatou-se que os aspectos alterados das funções psíquicas afetividade e pensamento,
encontrados foram: hipotimia, humor triste, angústia de morte e pensamento mágico.

Palavras-chaves: afetividade; pensamento; hospitalização; funções psíquicas.


4

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................6
2 MARCO TEÓRICO........................................................................................................11
2.1 HISTÓRIA DO HOSPITAL.................................................................................................... 11
2.2 PSICOLOGIA DA SAÚDE E PSICOLOGIA HOSPITALAR.......................................................... 14
2.3 A DINÂMICA DO SUJEITO EM PROCESSO DE HOSPITALIZAÇÃO ......................................... 18

2.4 FUNÇÕES PSÍQUICAS ........................................................................................................ 24


2.4.1 Afetividade .................................................................................................................. 27
2.4.2 Pensamento.................................................................................................................. 33
3 EXPOSIÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS........................................................39
3.1 INSTRUMENTOS E PROCEDIMENTOS PARA A COLETA DE DADOS ...................................... 39
3.2 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS ........................................................................... 41
3.2.1 Caso 1 .......................................................................................................................... 41
3.2.2 Caso 2 .......................................................................................................................... 45
3.2.2 Caso 3 .......................................................................................................................... 48
3.3 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS .......................................................................................... 50
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS..........................................................................................53
REFERÊNCIAS .................................................................................................................56
ANEXOS .............................................................................................................................58
Anexo A – Roteiro de entrevista semi-estruturada .........................................................59
Anexo B – 1ª Entrevista......................................................................................................60
Anexo C – 2ª Entrevista .....................................................................................................65
Anexo D – 3ª Entrevista .....................................................................................................70
5

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Dados de Identicação..................................................................................41


Tabela 2 – Categoria Afetividade.................................................................................50
Tabela 3 – Categoria Pensamento................................................................................50
Tabela 4 – Categoria O sujeito e a hospitalização......................................................51
6

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como tema de pesquisa a dinâmica do sujeito em processo de


hospitalização e as alterações das funções psíquicas que podem vir a ser desencadeadas durante o
processo de internação hospitalar.
A partir de algumas leituras feitas e do estágio curricular obrigatório realizado no Hospital
de Caridade, observou-se que, durante o processo de adoecimento com internação hospitalar,
além da perda da saúde, o processo de hospitalização também pode ser um fator desorganizador,
levando a alterações na esfera psíquica, o que acentua ou traz alguns conflitos emocionais que até
então não foram ativados ou identificados.
De acordo com estas considerações, o presente trabalho propõe a questão de pesquisa a
ser respondida: quais são os principais aspectos alterados, das funções psíquicas afetividade e
pensamento, observáveis através do discurso, em pacientes internados no Hospital de Caridade,
no período compreendido entre os meses de março a maio de 2006?
Esta pesquisa apresenta: introdução, marco teórico, exposição e análise dos resultados e
considerações finais. A introdução contém informações sobre o problema de pesquisa, a
justificativa, o objetivo geral, os objetivos específicos e método. No item marco teórico estão
aspectos sobre a história do hospital, conteúdos sobre a psicologia da saúde e hospitalar. Foram
realizadas também explanações teóricas sobre o sujeito em processo de hospitalização e
conteúdos sobre as funções psíquicas: afetividade e pensamento. Posteriormente, os instrumentos
e procedimentos para a coleta de dados, apresentação e análise, discussão dos resultados e
7

considerações finais. Em anexo, encontram-se as entrevistas realizadas com os pacientes,


conforme descrito na metodologia para que possa ter acesso aos dados coletados.
Esta pesquisa apresenta relevância social, no sentido em que a perda da saúde, o adoecer,
faz parte da vida e que em algum momento ou em alguns casos pode requerer internação
hospitalar. Desta forma acredita-se que a condição do sujeito de estar doente e hospitalizado,
pode afeta-lo emocionalmente, causando “dor psíquica”. Considerando está “dor” como uma
“dor” pela perda da condição de sadio e não pela doença orgânica propriamente dita, mas sem
deixar de considera - lá. Neste sentido, esta pesquisa desenvolveu-se com a perspectiva de
conhecer melhor esta “dor pela perda da saúde” e as suas possíveis alterações no psiquismo
humano.
Segundo Camon, muitos sujeitos durante o processo de hospitalização, “[...] têm o
reequilibrio orgânico prejudicado devido ao processo de despersonalização do doente, que, ao
sentir sua desqualificação existencial, pode concomitamente, muitas vezes, abandonar seu
processo interior de cura orgânica e até mesmo emocional [...]” 1.
Em relação a relevância científica desta pesquisa, acredita-se poder contribuir na prática
dos profissionais da área da saúde, principalmente às pessoas que trabalham diretamente com
sujeitos hospitalizados, bem como subsidiar dados a outras pesquisas relacionadas ao assunto.
Segundo Baptista e Dias,
[...] a pesquisa em Psicologia da Saúde é fundamental para avaliar, inclusive, a eficácia
de programas de intervenção. [...] a pesquisa é fundamental para adaptar programas de
saúde em populações específicas [...] além da compreensão objetiva do porquê esse
profissional está procedendo de tal ou qual maneira, aonde se quer chegar e qual o
problema em questão, deve-se avaliar o ser humano como um todo biológico,
estruturado com base em sua herança e experiência individual, relacionando-se com o
meio ambiente. 2

Desta forma buscou-se pesquisar materiais e trabalhos já realizados e, através do que se


teve acesso, não encontrou-se material científico sobre a temática alterações psíquicas e
hospitalização. O que se encontrou foram matérias tais como: por exemplo, a criança e a
hospitalização; roteiros de avaliação psicológica sobre o paciente hospitalizado e temas
específicos de determinadas enfermidades como câncer, problemas cardíacos, renais crônicos e
outras.

1
CAMON, Valdemar A. (org.) Psicologia hospitalar: teoria e prática. São Paulo: Pioneira, 2002, p.18.
2
BAPTISTA, Makilim; DIAS, Rosana. Psicologia hospitalar: teoria, aplicações e casos clínicos. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2003, cap. 1, p. 2.
8

A opção pelo tema deve-se também por acreditar que a Psicologia, através das
contribuições da Psicologia da Saúde e da Psicologia Hospitalar tem se renovado como ciência,
pois os profissionais da área da saúde tem competência técnica para compreender a dor de forma
mais humana e escutar a angústia, o sofrimento e as alterações psíquicas que podem ocorrer
durante o processo de hospitalização.
De acordo com Fongaro e Sebastiani, com o passar dos anos pode-se observar um maior
interesse por parte dos profissionais da área da saúde na investigação e compreensão dos aspectos
psicodinâmicos do adoecer, tornando mais familiar a estes profissionais as reações emocionais do
paciente e suas relações com o processo de adoecer. Auxiliando-os nas suas relações com o
sujeito doente, visando a qualidade de vida, o processo de hospitalização e o tratamento. 3
A relevância acadêmica e pessoal desta pesquisa é justificada pelo interesse em
compreender as alterações psíquicas, mais especificamente as alterações das funções afetividade
e o pensamento, que pode ocorrer em sujeitos internados em instituições hospitalares. Sendo que
está pesquisa foi realizada juntamente com o estágio curricular obrigatório no Hospital de
Caridade, por alunos da nona e décima fase. Desta forma, outros alunos poderão, a partir do
presente trabalho, vir a estudar e aprofundar a temática.
O objetivo geral desta pesquisa é verificar quais são os principais aspectos alterados das
funções psíquicas afetividade e pensamento, observáveis através do discurso de pacientes
internados no Hospital de Caridade, entre os meses de março a maio de 2006.
Os objetivos específicos são:
- Identificar, na teoria, o significado do processo de hospitalização na vida dos sujeitos.
- Investigar teoricamente pontos fundamentais sobre as funções psíquicas: afetividade e
pensamento.
- Articular cientificamente pontos sobre a dinâmica do sujeito em processo de internação e
as possíveis alterações das funções psíquicas afetividade e pensamento.
- Realizar coleta de dados a partir de uma entrevista semi-estruturada em pacientes
internados no Hospital de Caridade.
- Analisar e discutir os dados coletados a partir do recorte teórico.

3
FONGARO; SEBASTIANI IN CAMON, Valdemar A. (org). E a psicologia entrou no hospital. São Paulo:
Pioneira Thomson Lerning, 2003.
9

Esta pesquisa caracteriza-se como qualitativa, pois tem o ambiente natural como sua fonte
direta de dados e o pesquisador como seu principal instrumento. Preocupa-se com questões
particulares, aprofundando-se nos significados das ações e relações humanas, que não podem ser
quantificadas. A pesquisa qualitativa busca compreender o significado que as pessoas dão às
coisas e à sua vida, na tentativa de capturar a “perspectiva dos participantes” 4.
Quanto ao corte trata-se de uma pesquisa vertical, significando ser uma pesquisa que tem
tempo determinado, pois foi realizada em dois semestres.
A metodologia utilizada nessa pesquisa caracteriza-se como exploratória, pois,
[...] têm como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a
torná-lo mais explicito ou a constituir hipóteses. Pode-se dizer que estas pesquisas têm
como objetivo principal o aprimoramento de idéias ou descobertas de intuições. Seu
planejamento é, portanto, bastante flexível, de modo que possibilite a consideração dos
mais variados aspectos relativos ao fato estudado. Na maioria dos casos, essa pesquisa
envolve: levantamento bibliográfico, entrevistas com pessoas que tiveram experiência
prática com o problema pesquisado e análise de exemplos que “estimulem a
compreensão [...] 5.

Quanto ao delineamento, caracteriza-se por ser uma pesquisa bibliográfica e um estudo de


caso. Bibliográfica porque é desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído
principalmente de livros e artigos científicos, tendo como finalidade reunir, estudar, classificar e
analisar as bibliografias relacionadas ao tema proposto.
E estudo de caso porque “[...] consiste no estudo profundo e exaustivo de um ou poucos
objetos, de maneira que permita seu amplo e detalhado conhecimento, tarefa praticamente
impossível mediante outros delineamentos já considerados [...]” 6.
O estudo de caso procura explorar situações da vida real cujos limites não estão
claramente definidos. No estudo de caso preserva-se o caráter unitário do objeto estudado e
descreve a situação do contexto em que está sendo feita a investigação. A pesquisa proporciona
uma visão global do problema ou identifica possíveis fatores que o influenciam ou são por ele
influenciados.
Esta pesquisa foi realizada em um dos locais de estágio curricular obrigatório dos
estudantes da nona e décima fase do curso de Psicologia da Universidade do Sul de Santa
Catarina, UNISUL, sendo o estágio realizado na Instituição Irmandade do Senhor Jesus dos

4
MINAYO, Maria Cecília S. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes, 1994, p. 21.
5
GIL, Antonio C. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 2002, p. 45.
6
Ibid., p. 54.
10

Passos e Hospital de Caridade, localizada no município de Florianópolis, estado de Santa


Catarina.
11

2 MARCO TEÓRICO

O presente trabalho apresenta como base teórica alguns textos sobre psicologia da saúde,
psicologia hospitalar, aparecem também considerações sobre hospitalização e sobre as funções
psíquicas: afetividade e pensamento.
Primeiramente far-se-á uma breve exposição sobre a história do hospital e posteriormente
seguirão alguns pontos teóricos relacionados ao tema proposto.

2.1 HISTÓRIA DO HOSPITAL

Esta breve apresentação sobre a história do hospital tem como finalidade mostrar o
surgimento desta instituição como um instrumento terapêutico, que atua sobre a doença e o
doente de forma que possa produzir a cura. A apresentação deste item deve-se ao fato de que esta
pesquisa tem como foco a dinâmica do processo de hospitalização e as alterações psíquicas.
Sabe-se que a instituição hospitalar, assim como ela se apresenta nos dias de hoje, foi constituída
através de muitas mudanças e quebra de paradigmas. Ainda é certo que existe muito a ser
mudado e construído. Desta forma, pensou-se na importância em resgatar historicamente o
surgimento do hospital e quais as mudanças que ocorreram com o passar do tempo, com a
finalidade de aumentar a compreensão do funcionamento institucional, do processo de
acolhimento do sujeito doente e das pessoas que trabalham dentro destas instituições, para
12

posteriormente, tentar entender quais os reflexos, ou seja, as alterações, da dinâmica do processo


de hospitalização no funcionamento do psiquismo humano.
A partir do estudo de alguns textos, verificou-se que, em torno de 1780 o hospital surge
como um novo campo de práticas, que pode e deve ser uma via destinada a curar, deixando assim
de ser uma simples figura arquitetônica.
Anteriormente, pode-se dizer que as instituições hospitalares “não curavam” tanto quanto
poderiam e nem eram considerados como instituição médica, pois a medicina era uma prática
ainda não hospitalar. O hospital até então era considerado uma instituição de assistência aos
pobres, de separação e exclusão, com o propósito de proteger os outros do perigo de contágio. O
paciente poderia encontrar naquele local o suporte material necessário para seus últimos
cuidados, sendo o hospital considerado um “morredouro”.7
Segundo Campos, o hospital era uma espécie de instrumento misto de exclusão,
assistência e transformação espiritual, em que a função médica não aparecia, as pessoas que
cuidavam dos doentes eram religiosos e leigos8.
Ainda, de acordo com Campos, naquela época, século XVII e XVIII, a medicina aparece
como individualista, ou seja, estuda o corpo humano como uma “máquina”, no que diz respeito a
parte do médico, qualificado como tal e assegurada pela própria corporação dos médicos.
A partir de algumas observações realizadas por pesquisadores na época sobre os possíveis
efeitos negativos do hospital na saúde das pessoas, teve início um processo de mudança desta
perspectiva, na tentativa de anulá-los.
Desta forma, neste processo de mudança, foi constatado que estas instituições traziam
para o estado uma desordem econômica, é exemplo disto os pacientes das Forças Armadas, pois
nesta época, o sujeito passa a ter um valor muito alto para a sociedade, pois o exercito e a
marinha formavam soldados para o manuseio de armas avançadas e não poderiam perder estes
sujeitos, com suas capacidades e aptidões tão essenciais. Dizia-se que quando se formava um
soldado não se podia deixá-lo morrer. Se ele morresse deveria ser em plena forma, como soldado
na batalha e não de doença. Com isto os hospitais, principalmente os militares e marítimos,
iniciaram um processo de reorganização. Sendo assim, foi necessário procurar algo, alguma

7
CAMPOS, Terezinha.C. Psicologia hospitalar. São Paulo: EPU, 1995.
8
Ibid.
13

técnica que ajudasse a combater a perda de homens por motivo de doença ou epidemia. Surge
assim, segundo Campos, uma tecnologia política chamada disciplina9.
“A disciplina é uma técnica de poder que implica uma vigilância perpétua e constante
sobre os indivíduos. Não basta olhá-los às vezes ou ver se o que fizeram é conforme a regra. É
preciso vigia-los durante o tempo da atividade e submetê-los a uma perpétua pirâmide de
olhares”.10
Desta forma, o hospital se disciplina por razões econômicas, para evitar a proliferação de
doenças e com isso evitar baixas humanas. Esta disciplina acaba por afetar a medicina que sofre
alterações no saber médico, surgindo neste momento uma medicina hospitalar, dando origem ao
hospital médico.
Com toda esta transformação o sujeito passa a ser visto como ser “individual” que
necessita de cuidados, do qual o médico especializado pode cuidar. Através desta nova
perspectiva, os doentes são distribuídos em espaços que possam ser vigiados, registrados todos os
acontecimentos e controlados. Fica marcado, neste momento, o poder médico, em que este é a
principal figura responsável pela organização hospitalar.
Algumas modificações ocorridas nesta época são mantidas até os dias de hoje, como por
exemplo, o sistema de registro permanente contendo identificação do doente, com nome e
discriminação da doença. Também uma série de registros que transmitem informações de entrada
e saída, a sala que ele se encontra e os cuidados que ele recebe, todas estas informações,
atualmente, estão contidas nos Prontuários Médicos.
Esta nova prática traz como conseqüência uma rígida disciplina hospitalar, um grande
avanço técnico/científico na área da saúde e para o saber médico, modificando a qualidade dos
atendimentos disponíveis.
Segundo Riechelmann11, esta nova prática médica trouxe bons e maus frutos, bons no
sentido que geraram enormes e indispensáveis quantidades de saberes sobre os mecanismos
fisiológicos e patológicos envolvidos na saúde e na doença. E maus em relação à questão médico-
paciente, reduzindo-se a que chamou de “cientista-objeto”, sendo que esta relação sofreu um forte

9
CAMPOS, 1995.
10
Ibid., p. 106.
11
RIECHELMANN IN CAMON, Valdemar A. (org). Psicologia da saúde: um novo significado para a prática
clínica. São Paulo: Pioneira, 2002, cap. 5.
14

empobrecimento pelo modelo de relação técnico cientista-máquina no exercício da medicina


clínica.
Entretanto é preciso considerar que o ser humano não é apenas um corpo “objeto” e sim
uma pessoa que possui também aspectos psicológicos, sociais e ambientais que interferem na
saúde e na doença e que devem ser trabalhados conjuntamente.
Neste sentido, o hospital, um lugar provedor da saúde, deve buscar a humanização do
atendimento durante o período de hospitalização. Assim como, a psicologia hospitalar,
acreditando que a humanização da abordagem hospitalar é possível e real, e que a fala do
paciente sobre a sua dor e “angústias” possa ser escutada e compreendida.

2.2 PSICOLOGIA DA SAÚDE E PSICOLOGIA HOSPITALAR

Acreditando no processo de humanização no contexto das instituições médicas e


hospitalares, a Psicologia da Saúde vem modificando e aumentando cada vez mais os estudos
nesta área. Com objetivo de ampliar a prática clínica em psicologia, começam a surgir novos
campos e perceptivas de atuação do psicólogo.
A Psicologia da Saúde é definida de várias maneiras por autores diferentes, segundo
Camon, a Psicologia da Saúde é uma prática que compreende a saúde mental e física do paciente,
de forma integrada, considerando a doença como um desequilíbrio que está entre o físico, o
emocional e as questões social que envolvem a realidade do paciente. 12
De acordo com Baptista e Dias, a Psicologia da Saúde refere-se aos ambientes
hospitalares, centros de saúde ou a quaisquer programas que venham a enfocar a saúde coletiva,
como, por exemplo, programas preventivos, abarcando tanto a saúde física quanto a mental.13
Segundo Iñesta, a Psicologia da Saúde “[...] compõe um campo vasto, que acaba por se
inter-relacionar com diversas outras profissões e áreas de atuação, sendo que nem sempre é clara
a sua distinção de outras áreas ou interdisciplinas”.14

12
CAMON, op. cit. , cap. 1.
13
BAPTISTA; DIAS, 2003, cap. 1.
14
IÑESTA, 1990 apud BAPTISTA; DIAS, Psicologia hospitalar: teoria, aplicações e casos clínicos. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2003, cap. 1, p. 2.
15

Pode-se dizer então que trata-se de um saber psicológico que leva em conta a
interdisciplinaridade e que tenta resgatar o ser humano em sua condição existencial e totalitária,
procurando compreender seu sofrimento psíquico, integrado com a saúde física e social.
Torna-se fundamental, então, que a psicologia tente articular a sua prática profissional
com outros níveis de saber também profissionais relacionados à área da saúde, buscando uma
nova dimensão de interdisciplinaridade.
Desta forma, verifica-se que a área de atuação do psicólogo, no que diz respeito a
psicologia da saúde é bastante ampla e que envolve vários níveis de atendimento aos sujeitos,
podendo ir desde campanhas, cursos, palestras, atendimentos ambulatoriais, até atendimentos
durante internações hospitalares.
De acordo com os autores Baptista e Dias, é de fundamental importância que, além dos
profissionais da psicologia da saúde atuarem nestas diversas instâncias, se realizem pesquisas
voltadas à área da Psicologia da Saúde, o que traz muitos benefícios, tanto para o profissional
quanto para a população em geral. Acreditam os autores que é função do psicólogo da saúde,
através de uma boa formação e pesquisas sérias, demonstrarem o que esta área tem para oferecer
e contribuir às instituições públicas e privadas, que trabalham diretamente com a saúde podendo
favorecer ganhos em nível de qualidade e custos.15
Um destas áreas de atuação do psicólogo tem sido o contexto hospitalar, que apesar de
não ser inovadora em sua concepção filosófica, ainda não estão muito claras e definidas algumas
questões sobre a prática do psicólogo neste contexto. Mas alguns profissionais da ária da saúde
vem tentando delinear uma nova especialidade na área, vêm tentando sistematizar esta prática.
Muitos destes profissionais concordam em dizer que ainda são claras as lacunas teóricas nesta
área que acabam por determinar dificuldades na tarefa profissional diária do psicólogo na
instituição hospitalar, bem como na relação com outros profissionais da saúde.16 Apesar disto,
segundo Camon “[...] as perspectivas da Psicologia Hospitalar são bastante promissoras e
alentadoras. Promissoras porque determinam a própria trajetória de suas conquistas e realizações.
Alentadoras por tratar-se de uma prática que iniciou sem um determinismo [...]”.17
O objetivo principal da Psicologia Hospitalar é a minimização do sofrimento provocado
pela hospitalização, as seqüelas e decorrências emocionais. É necessário também que se estenda à

15
BAPTISTA; DIAS, op. cit.
16
Ibid.
17
CAMON, Valdemar A. (org.) O doente, a psicologia e o hospital. São Paulo: Pioneira, 2002. p. 24.
16

compreensão de considerar a doença como um fator determinante de conseqüências negativas


deste processo de hospitalização.18
De acordo com Penna, “[...] as condições absolutamente únicas e originais do tipo de
pessoas a serem atendidas, das relações interpessoais que se desenvolvem e do ambiente onde se
faz o atendimento merecem uma reflexão mais detalhada”.19
Desta forma, o psicólogo deve se libertar do modelo de consultório, ou de uma sala em
um determinado andar dentro de uma instituição. Em hospitais gerais o que normalmente
acontece, é o psicólogo abordar o paciente em seu próprio leito, diferentemente de pacientes que
não estão internados e procuram a psicoterapia para um auxílio ou suporte emocional.
Geralmente as abordagens aos pacientes são feitas por indicações ou encaminhamentos de
médicos, enfermeiros, técnicos ou pelos próprios psicólogos que identificam a necessidade do
atendimento através de uma avaliação geral do paciente.
O psicólogo no contexto hospitalar, ao se deparar com o paciente enfermo em seu leito,
vai lidar com o sofrimento físico sobreposto ao sofrimento psíquico, com uma série de angústias
e sofrimentos, o que pode levar o profissional a sentir-se sem referencial, fora de seu campo de
atuação. Na medida em que o hospital surge como sendo uma realidade institucional com
características bem definidas, o psicólogo deve procurar se adaptar a esta nova realidade e torna-
se necessária também a adoção de alguns referenciais teóricos.
Quando um paciente é internado e precisa de uma intervenção psicoterápica, na grande
maioria, estas intervenções acontecem de forma brevíssima, no sentido de que pode ocorrer em
apenas um encontro, ou dependendo do tempo de internação do sujeito por um tempo maior.
Assim, acredita-se que a Psicoterapia Breve passou a ser utilizada como prática de
intervenção dentro das instituições hospitalares por ser mais adequada à situação apresentada,
pois se caracteriza como emergencial e focal.20 A Psicoterapia Breve pode ser definida pela
especificidade de algumas sessões de tratamento e pela utilização de técnicas características para
a consecução de um fim terapêutico específico.
A teoria e a técnica da Psicoterapia Breve desenvolveu-se nas décadas de 40 e 50, a partir
da teoria psicanalítica e da teoria de crise.21

18
Ibid.
19
PENNA, 1992 apud CAMON, 2002, p. 93.
20
CHIATTONE, IN CAMON, 2002.
21
DEWALD, Paul. Psicoterapia: uma abordagem dinâmica. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989, cap. 7.
17

Surge com o propósito de tentar ampliar as possibilidades de intervenção em


atendimentos considerados “emergenciais”, que até então estavam restritos aos settings
psicanalíticos ou psiquiátricos.
Esta técnica, que vem sendo utilizada dentro dos hospitais gerais, pode ser adotada de
formas diferentes, com relação à atuação do psicólogo e também dependendo da estrutura e
situação na qual o paciente se apresenta.
De acordo com o autor Paul Dewald, as psicoterapias de inspiração psicanalítica estão
classificadas dentro de uma graduação. Num dos extremos dessa graduação temos a psicoterapia
de apoio e, no outro, o que o autor chama de psicoterapia dirigida ao insight.22
A psicoterapia de apoio tem como objetivo principal o alívio ou melhora dos sintomas,
sem que se espere mudanças na estrutura subjacente do caráter ou a solução dos conflitos básicos.
A psicoterapia dirigida ao insight tem objetivos um pouco mais ambiciosos e sua intenção é a de
ajudar o paciente a adquirir maior auto-conhecimento e algum grau de alteração do
funcionamento da personalidade. 23
Para Penna, a forma mais didática de expor as diferentes tendências em Psicoterapia
Breve, realizadas em hospitais gerais, é a proposta feita por Kaplan (1981), que as divide em dois
grandes grupos: psicoterapias breves supressoras de ansiedade e psicoterapias breves indutoras de
ansiedade.24
As técnicas incitadoras de ansiedade têm como objetivo mudanças psicodinâmicas
duradouras e as mais extensas possíveis, pois se compreendem os conflitos subjacentes às
dificuldades do paciente como estando localizados fora da área de consciência, onde são
mantidos por mecanismos defensivos que, ao serem trabalhados, suscitam ansiedade. É indicada
a pacientes motivados a mudar e a se compreender e não apenas a obter alívio de sintomas. A
atividade do terapeuta nesta técnica é de ser ativo nas interpretações, fazendo clarificações
transferenciais precoces e mantendo as intervenções dirigidas a um foco psicodinâmico.
As técnicas supressoras de ansiedade têm como objetivo o alívio dos sintomas e da
ansiedade, a alteração de padrões mal-adaptativos de comportamento e relações interpessoais, e
promover a expansão e integração das habilidades do paciente na resolução de seus problemas.

22
Ibid.
23
Ibid.
24
PENNA IN MELLO FILHO, Julio (org.). Psicossomática hoje. Porto Alegre: Artmed, 1992.
18

As técnicas supressoras de ansiedade são indicadas a pacientes com poucos recursos


egóicos e com pouca capacidade de lidar com problemas vivenciais e com relações interpessoais.
O terapeuta é mais ativo devendo clarificar percepções distorcidas, informações errôneas e
fantasias, de modo a obter insights cognitivos. Também desencoraja a regressão emocional e
tenta manter as intervenções em torno de um foco psicodinâmico. Desta forma, a função do
terapeuta é de instrumentalizar o paciente a utilizar suas funções egóicas de forma mais estáveis
através de intervenções de reforço do ego.
Assim, de acordo com os autores acima citados a teoria e técnica da Psicoterapia Breve
pode ser utilizada dentro de duas perspectivas, sendo elas, uma com o objetivo mais ativo
centrado no alívio de sintomas e a outra com objetivos mais audaciosos no que diz respeito a
intervenção do psicólogo em relação ao paciente, objetivando uma mudança de aspectos da
personalidade.
Desta forma, verifica-se, através do que foi dito acima, que a Psicoterapia Breve em
hospitais gerais visa à melhoria dos problemas emocionais ligados à doença e à hospitalização, de
forma a auxiliar o paciente em situações mais focais.

2.3 A DINÂMICA DO SUJEITO EM PROCESSO DE HOSPITALIZAÇÃO

Como foi visto no marco teórico da presente pesquisa, as noções de saúde e doença foram
gradativamente sendo modificadas. Através do pequeno retrospecto, pode-se dizer que houve
uma modificação na qualidade dos atendimentos, feito pelas equipes de saúde, mas que ainda as
atenções por parte de alguns membros da equipe de profissionais da área da saúde estão voltadas
para uma atuação curativa, quando o doente é visto e tratado como peça de uma máquina que está
desajustada e necessita de reparo. Assim, algumas vezes os profissionais fazem uso de algumas
formas de atendimento que dificultam no tratamento do sujeito doente, que necessita de cuidados
e de hospitalização.
Quando o sujeito adoece e o quadro requer hospitalização, vários fatores podem levar a
sofrimentos emocionais e psíquicos. Por este motivo, neste item, falar-se-á sobre alguns destes
fatores, apresentando de forma breve comentários sobre esta temática.
19

O sujeito ao chegar em uma instituição hospitalar apresenta uma concepção de si e do


mundo mais ou menos pré-estabelecida e organizada. Ao ser internado inicia-se um processo
sistemático de reformulações de algumas destas concepções, muitas vezes, de forma não
intencional. Como diz Camon, “[...] o estigma de doente ou de paciente irá fazer com que exista a
necessidade premente de uma total reformulação dos seus valores e conceitos de homem, de
mundo e relação interpessoal em suas formas conhecidas” 25. Fazendo referência ao processo de
despersonalização ou o chamado de hospitalismo, conforme será visto posteriormente.
O sujeito hospitalizado passa a ter que se adaptar às regras gerais da instituição, sendo que
este processo deve ser compreendido com um significado singular e particular de cada um.
Com relação ao processo de hospitalização, pode se dizer que este deve ser entendido não
apenas como um mero processo de institucionalização hospitalar, mas, como um conjunto de
fatos decorrentes deste e suas implicações na vida do paciente.
Neste sentido, o paciente internado em uma instituição hospitalar passa a conviver com a
sua condição de doente e de uma pessoa hospitalizada, sofrendo uma série de processos inerentes
a esta dinâmica do processo de hospitalização e a outros que podem vir a contribuir e influenciar
nas conseqüências da internação.
Chiattone, autora que trabalha com crianças hospitalizadas no Hospital Brigadeiro,
localizado na cidade de São Paulo e que já publicou diversos artigos sobre este tema, considera
que alguns aspectos inerentes ao processo de hospitalização (neste caso válido também para os
adultos), devem ser destacados e podem ser definidos da seguinte forma26. Primeiramente, o
afastamento da família, que na maioria dos casos traz uma sensação de abandono e como
conseqüência um agravamento dos sintomas por parte do paciente internado. Quando a família
está próxima ao doente, esta pode desempenhar um papel de estimulador, incentivando-o em suas
conquistas, animando-o a prosseguir.
O medo do desconhecido é outro fator que dificulta o ajustamento da pessoa à situação de
hospitalização e à doença, pois, em geral, a realidade hospitalar é nova e desconhecida. Muitas
vezes esta situação é estimulada pela equipe de saúde ao negar informações ou simplesmente
ignorá-las, pois esse clima de suspense aumenta as fantasias e os temores.

25
CAMON, 2002. p. 16
26
CHIATTONE IN CAMON, Valdemar A. (org.). A psicologia no hospital. São Paulo: Pioneira Thomson
Learning, 2003.
20

Outro fato relevante é a sensação de punição ou culpa, percebido em alguns sujeitos


hospitalizados que podem vir a encarar a doença como uma agressão externa, ou punição,
relacionando a doença a algum erro cometido durante a sua vida e que agora está sendo punido.
A limitação de atividades e de estimulação também é mais um fator a ser observado. O
espaço físico limitado, a falta de estimulação e a própria rotina diária da enfermaria geram uma
diminuição de atividades.
Verifica-se ainda o aparecimento ou intensificação do sofrimento físico, pois o sujeito
hospitalizado muitas vezes passa a sentir dores ou tem intensificado o seu sofrimento físico em
conseqüência de exames ou de condutas agressivas.
E, por último, Chiattone, assim como Camon, Fongaro e Sebastiani acreditam que quando
um sujeito é hospitalizado, sofre um processo de despersonalização decorrente da internação, a
pessoa deixa de ter um nome próprio e passa a ser um número de leito ou com uma determinada
patologia. Isto implica em perda dos referenciais individuais, pois o sujeito é despido de sua
condição de pessoa com suas particularidades, é destituído de seus objetos pessoais e seus
hábitos, como por exemplo, o sono, a alimentação, a higiene pessoal, o lazer, o trabalho, os
estudos, laços afetivos, entre outros. O sujeito passa a receber ou a obedecer ordens da
instituição, ou seja, passa a seguir as regras do hospital. Desta forma, muitas vezes, o hospital
coloca uma barreira entre a pessoa e o mundo externo.
Outros autores como, por exemplo, Spitz e Escardó também desenvolveram estudos
relacionados ao processo de hospitalização e os aspectos psicológicos dos sujeitos nesta
condição. Escardó definiu este processo como sendo “[...] a soma dos prejuízos que a pessoa
humana recebe pelo fato de permanecer internada num hospital que leva em conta sua condição
de enfermo, paciente ou condutor de doenças, porém marginalizada a determinantes de sua
unidade estrutural bio-psicossocial” e Spitz denominou como “hospitalismo”. 27
Além destes fatores mencionados referentes aos aspectos inerentes à hospitalização, não
se pode deixar de considerar que existem outros que também contribuem ou agravam todo este
processo, como por exemplo: é necessário levar em conta a estrutura psicoafetiva do sujeito no
momento do aparecimento da doença e da hospitalização, considerar como era o relacionamento
entre o sujeito e sua família, a personalidade – conhecer a estrutura de personalidade, as

27
CHIATTONE, 2003, p. 27 - 28.
21

diferenças individuais - as características próprias, a capacidade do sujeito em enfrentar situações


novas e desconhecidas.
Cabe ficar atento também a como a equipe de saúde desenvolve seu trabalho no hospital,
se a rotina hospitalar é feita de forma invasiva ou há rigidez profissional, se o sujeito teve outras
experiências de internação (positivas ou negativas), que tipo de internação é a atual, se de
emergência ou previamente planejada.28
Outra questão importante a ser observada, são as manifestações psíquicas e
comportamentais que o paciente apresenta em decorrências das suas relações com a doença,
tratamento e hospitalização. Desta forma, segundo Fongaro e Sebastiani, será descrito a seguir
algumas características destas manifestações e comportamentos encontrados no Hospital Geral. 29
Uma das manifestações psíquicas observadas é a negação, que se apresenta como um
mecanismo de defesa, assim como os outros mecanismos, em que sua principal função é de
preservar o “ego” de situações que ameacem sua integridade, podendo atuar de forma positiva ou
negativa. No caso, a negação é caracterizada pela “[...] não inclusão de afetos ameaçadores à
30
estrutura egóica do individuo diante de uma situação atual” . Segundo Kubler-Ross é uma
reação típica de pacientes que descobrem uma doença grave. 31
A raiva consiste na manifestação da agressividade, direcionada à proteção do sujeito em
situação considerada ameaçadora. Podendo ser, “[...] a sensação de invasão imposta pela
hospitalização e tratamento”. 32 De acordo com Kübler-Ross, é o estágio que substitui a negação
por sentimento de raiva, revolta e ressentimento. Pacientes que se encontram neste o estágio,
podem criticar a comida, o tratamento, os exames, as regras do hospital e outros. Esta raiva pode
estar relacionada com o sentimento de impotência e falta de controle da própria vida. 33
A hostilidade apresenta-se como um comportamento impulsivo do paciente diante do
meio ambiente e das pessoas as quais têm contato mais próximos. Interage com os outros de
maneira agressiva, na tentativa de esconder uma fragilidade emocional, utilizando uma resposta
reativa a situações consideradas pelo paciente como ameaçadoras.

28
CHIATTONE, 2003.
29
FONGARO; SEBASTIANI, 2003.
30
Ibid., p. 43.
31
KÜBLER – ROSS, Elisabeth. Sobre a morte e o morrer. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
32
FONGARO; SEBASTIANI, 2003, p. 44.
33
KÜBLER – ROSS, 1998.
22

As fantasias, para os autores Fongaro e Sebastiani, são outro tipo de manifestações


psíquicas que normalmente ocorrem em situações de expectativas relacionadas a algum tipo de
exame ou procedimentos técnicos. O paciente elabora psiquicamente uma forma de se estruturar,
administrando sua ansiedade, através da fantasia. Aparecem também as fantasias mórbidas, que
trazem conteúdos mórbidos, revelados pelos temores.
A frustração aparece como uma reação normal do sujeito diante de perdas ou privações
de prazer. No sujeito hospitalizado observa-se sentimentos relacionados à “situações de recidiva
de doenças crônicas, insucesso de condutas de tratamento ou a projetos de vida comprometidos
pela perda da saúde”. 34
Impotência é a “[...] condição encontrada frente à impossibilidade de reação à situação
vivenciada” no momento pelo paciente, acompanhada por auto-estima baixa e sentimento de
menos-valia. 35
O sentimento de fracasso é outra manifestação psíquica que aponta uma insatisfação do
paciente em relação a si próprio, através da diminuição da auto-estima e sentimentos de menos-
valia.
Regressão é o “[...] aspecto comportamental de retorno a uma forma de se relacionar com
36
o meio ambiente, do ponto de vista de maturidade emocional”. Muitas vezes, espera-se que o
paciente regrida um pouco, para que deixe ser cuidado pelos técnicos e enfermeiros. Mas essa
regressão deve ser moderada e observada, a fim de não prejudicar o paciente.
De acordo com Laplanche e Pontalis, a regressão num processo psíquico designa-se por
um retorno em sentido contrário, partindo de um ponto já atingido até um ponto situado
anteriormente a este. “No sentido formal, a regressão designa a passagem a modos de expressão e
de comportamentos de nível inferior do ponto de vista da complexidade, da estruturação e da
diferenciação”. 37
O isolamento é uma “[...] manifestação considerada como forma de retirada, de
retraimento do sujeito quanto ao convívio social”. 38
Esperança é a manifestação psíquica que demonstra a permanência de projeto de vida e
expectativas.

34
FONGARO; SEBASTIANI, 2003, p. 44.
35
Ibid., p. 45.
36
FONGARO; SEBASTIANI, loc. Cit.
37
LAPLANCHE E PONTALIS. Vocabulário da psicanálise. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
38
Ibid., p. 46.
23

O estresse psicorgânico é um estresse identificado por alterações importantes nas esferas


físicas e psicológicas do sujeito hospitalizado, que surgem normalmente após uma cirurgia,
quimioterapia, diálise ou situações como perdas abruptas, vivências traumáticas e internações em
UTIs.
Medo Real define-se como uma emoção ligada a um evento interno ou externo, como a
vivência da possibilidade de morrer, por exemplo.
O comportamento fóbico revela-se como a “[...] atitude de evitação ou franca fuga de
situação, que desencadeia ansiedade incontrolável e temor intenso [...] As fobias induzem a
determinados atos, as chamadas condutas de fuga”. 39
O conflito quanto à privacidade é uma alteração na condição de intimidade. Segundo
Fongaro e Sebastiani, pode ser em decorrência da despersonalização gerada pela internação.
Trata-se de uma perda da sensação de particularidade seguida da sensação de invasão.40
Todos estes aspectos são muito importantes durante o processo de hospitalização. A
compreensão destes e a atuação adequada por parte da equipe de profissionais da área da saúde
(médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, fisioterapeutas, psicólogos, assistentes sociais e
outros) junto aos pacientes, tornam-se fundamentais na objetivação, principalmente na
diminuição do sofrimento em relação à internação, a doença e ao adoecer.
Também é papel do hospital e de seus profissionais, além de promover a saúde, ampliar a
sua atuação de atendimento no sentido de buscar a humanização durante o período de
hospitalização do sujeito doente, sendo que são várias as medidas preventivas e humanizadoras a
serem adotadas na tentativa de diminuir o sofrimento.
Segundo Camon, não se pode simplesmente através de um determinismo aceitar que o
problema do sujeito doente se inicia com uma determinada patologia e se encerra com a
hospitalização41. É necessário humanizar o atendimento hospitalar, enquanto o sujeito encontrar-
se dentro da instituição e ao receber alta orientar o paciente e a família para a vida fora do
hospital, os cuidados e as condutas a serem seguida caso seja necessário encaminhá-lo para
outros procedimentos externos, como por exemplo, uma psicoterapia.

39
FONGARO; SEBASTIANI, 2003, p. 49.
40
Ibid.
41
CAMON, 2002.
24

2.4 FUNÇÕES PSÍQUICAS

Considerando ser fundamental para a compreensão do tema da pesquisa, este tópico


apresentará um breve comentário sobre as funções psíquicas e dar-se-á ênfase as funções a serem
particularmente pesquisadas: afetividade e ao pensamento.
Embora as funções psíquicas sejam muito estudas e utilizadas no saber psicológico pelas
áreas da psicologia, da psiquiatria e em outras áreas ligadas à saúde dos seres humanos, ainda é
um conceito difícil de ser encontrado.
Por isso, procurou-se resgatar a definição de outros conceitos, tais como “função” e
“psiquismo”, relacionados às funções psíquicas na tentativa de tentar definir este fenômeno
psicológico, que se busca estudar e aprofundar, fundamentando teoricamente esta pesquisa.
Segundo o dicionário eletrônico de psiquiatria da USP o termo ‘psiquismo’ expressa a
atividade da vida mental dos seres humanos, incluindo tanto os processos conscientes quanto os
inconscientes. Sendo o resultado das experiências perceptivas vivenciadas e influenciadas por
diversas variáveis, entre elas o meio social, a constituição da pessoa e as vicissitudes ocorridas no
42
início do desenvolvimento da criança e de sua vida posterior. E de acordo com o Dicionário
Aurélio o termo ‘função’ significa “ação própria ou natural dum órgão, aparelho ou máquina.
Unidade, uso, serventia [...]”.
Desta forma, para efeito dessa pesquisa define-se “funções psíquicas” como um conjunto
de áreas distintas da atividade mental dos seres humanos, que interagem entre si (consciência,
memória, atenção, pensamento, linguagem, afetividade e outras), possibilitando o indivíduo
perceber o mundo externo e interno, de forma consciente ou inconsciente.
O exame psíquico torna-se fundamental na viabilização de um diagnóstico principal e de
um diagnóstico diferencial, independentemente da abordagem. Embora cada abordagem tenha
suas particularidades, o que vai diferenciar é a forma de trabalho do profissional.
De modo geral, o exame das funções psíquicas realizado em hospitais gerais, busca
investigar a vida psíquica tal qual ela se apresenta e se manifesta, através do comportamento

42
AMARO, J. Dicionário médico para o público: psiquiatria. In: Hospital das Clínicas de Medicina da
Universidade de São Paulo. Disponível em: <http://www.hcnet.usp.br/dicionario/psiquiatria.htm> Acesso em: 24
mar. 2006.
25

perceptível e nas expressões verbais. Com o objetivo de verificar como está psicologicamente o
sujeito internado em relação ao adoecer e ao seu processo de hospitalização.
A conduta clínica de um psicólogo prevê já nos primeiros contatos com o paciente o
Exame do Estado Mental ou Exame Psíquico que, embora seja um dado momentâneo, revela o
funcionamento das Funções Psíquicas. Sabe-se que o psiquismo não funciona de forma
fragmentada e o sujeito deve ser avaliado em seu todo, mas, a esquematização em funções
psíquicas especificas, permite ao psicólogo identificar questões pontuais, tendo em vista que o
estudo das funções psíquicas revelam o funcionamento do aparato psíquico nas vivências
subjetivas do indivíduo relativas ao seu mundo externo e também ao seu mundo interno. As
principais funções psíquicas são: consciência, memória, afetividade, pensamento, linguagem,
atenção, sensopercepção, vontade e outras.
Segundo Fongaro e Sebastiani, em um exame psíquico, o papel do psicólogo no hospital,
primeiramente, é levantar dados sobre o que a pessoa conhece sobre sua doença, o motivo da
hospitalização e sobre o tratamento. Posteriormente, o psicólogo coleta dados sobre a história de
vida do sujeito e sua estrutura psicodinâmica. Estes dados darão subsídios para que o profissional
tenha uma visão geral de como está este sujeito e quais os aspectos psicológicos estão mais
alterados em relação a doença e a hospitalização. A partir disto o profissional pode escolher uma
determinada técnica, que é baseada num corpo teórico, com determinados objetivos, para uma
intervenção eficaz. 43
Como já foi visto, sabe-se que o sujeito deve ser avaliado em seu todo, mas, para facilitar
a compreensão e a avaliação das funções psíquicas segue a apresentação didática, de forma
separada dos elementos que compreendem este conjunto psíquico, destacando a afetividade e o
pensamento.
A consciência pode ser definida por pelo menos três aspectos diferentes.
- Definição neuropsicológica: Trata-se especificamente do nível de consciência, no
sentido de estado vigil, no estado de estar desperto, acordado, vigil, lúcido.
- Definição psicológica: é a soma total das experiências conscientes de um indivíduo em
um determinado momento.

43
FONGARO; SEBASTIANI, 2003.
26

- Definição ético-filosófica: significa tomar ciência dos deveres éticos e assumir as


responsabilidades, direitos e deveres. 44
Verificado o fato de se ter na rotina hospitalar, o critério médico de avaliação de
consciência procura-se diferenciar dois subtipos de consciência: “consciência clínica ou
quantitativa” e “consciência do eu”. 45
A Consciência Clínica é aquela avaliada dentro dos parâmetros quantitativos, de acordo
com os critérios médicos de avaliação de consciência, em que, segundo Fongaro e Sebastiani,
destacam-se oito níveis, sendo eles: normal, torpor, turvação, obnubilação, coma I, coma II, coma
III e morte cerebral.46
Consciência do Eu é a consciência dita qualitativa, avaliada sob critérios psicológicos,
cujo objetivo é verificar a consciência da “vida psíquica”, que se dá a partir de um sofisticado
processo de interação da criança recém-nascida com o mundo, a capacidade de diferenciação dela
e do mundo, que mais tarde irá complementar a estrutura do “eu físico”, compondo, então, o “eu
self”. 47
A atenção é a direção da consciência, processo psíquico que concentra a atividade mental
sobre um determinado setor, envolvendo um determinado esforço mental.
A Sensopercepção compreende a capacidade sensorial e perceptiva do sujeito, ou seja,
como os órgãos do sentido, estão captando e interpretando as impressões que o meio externo ou
interno emitem48. Aqui é importante lembrar que esta função psíquica, quando está alterada,
juntamente com alteração do pensamento, pode indicar um caso de estrutura psicótica.
Memória caracteriza-se como a capacidade de registrar, manter e evocar os fatos já
ocorridos. Segundo Paim, “[...] a memória propriamente dita é considerada por alguns psicólogos
como um processo puramente fisiológico, enquanto a capacidade de fixação e a evocação das
49
lembranças são tidas como atos psíquicos, pelo fato de serem vividos pelo indivíduo”.

44
DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e Semiologia dos transtornos mentais. Porto Alegre: Artes
Médicas Sul, 2000.
45
FONGARO; SEBASTIANI, 2003.
46
Ibid.
47
Ibid.
48
BASTOS, Cláudio L. Manual do exame psíquico: uma introdução prática à psicopatologia. Rio de Janeiro:
Revinter, 1997.
49
PAIM, Isaias Curso de Psicopatologia. 11. ed. revisada e ampliada. São Paulo: EPU, 1993.
27

Vontade ou Volição define-se pela capacidade de cada sujeito determinar-se50. A vontade


expressa a relação entre intenção e ação na realização dos desejos, se existe coerência entre o
desejo interno e a capacidade de operacionalizá-lo. Sobre esta função é importante avaliar se o
sujeito hospitalizado deseja e operacionaliza, se ele deseja e não operacionaliza, ou se não
deseja51.
A linguagem é a atividade especificamente humana e é o principal instrumento de
comunicação dos seres humanos. Define-se pela expressão de sentimentos e pensamentos
verbalizados através da comunicação verbal direta, voluntária e de forma simbólica. Em uma
avaliação dentro de uma instituição hospitalar observa-se os processo de comunicação verbal e
não-verbal-faciais, posturais, gestuais - manifestos pelo paciente. Avalia-se, neste sentido o
discurso do sujeito doente e não só o discurso sobre a doença.

2.4.1 Afetividade

O estudo da afetividade abrange as emoções, os sentimentos em geral, o humor ou estado


de ânimo, afetos, paixões e suas repercussões no psiquismo e no corpo. 52
Segundo Dalgalarrondo,
[...] a vida afetiva é a dimensão psíquica que dá cor, brilho e calor a todas as vivências
humanas. Sem afetividade a vida mental torna-se vazia, sem sabor. O termo afetividade
é genérico, compreendendo várias modalidades de vivências afetivas como o humor, as
emoções e os sentimentos. 53

De acordo com Paim, sentimento “[...] é um estado afetivo acentuado, estável, duradouro
e organizado com maior riqueza e complexidade do que os elementos representativos”. E
segundo Schneider, os sentimentos são considerados com “estados do eu, não podem ser
controlados pela vontade e que são provocados por nossas representações, pelos estímulos
procedentes do mundo exterior ou por alterações sobrevindas no interior do organismo”. Os

50
BASTOS, 1997.
51
FONGARO; SEBASTIANI, 2003.
52
BASTOS, 1997.
53
DALGALARRONDO, 2000, p. 100.
28

sentimentos, muitas vezes podem ser confundidos com as sensações, devido os sentimentos
sensórias encontrarem-se muito próximos a partes do corpo, como o “desânimo”. 54
A emoção “[...] é um estado afetivo intenso e complexo, proveniente de uma reação ao
mesmo tempo psíquica e orgânica, do indivíduo inteiro contra certas excitações internas e
externas”. 55
Segundo Störring, “[...] o estado afetivo fundamental de um indivíduo (alegria, bem-estar,
júbilo, felicidade, angústia, tristeza, desespero) depende inteiramente das circunstâncias pessoais
da vida, dos sujeitos, inclinações e especialmente do estado de sua vida física.” 56 E que segundo
Paim, “[...] influi consideravelmente na direção de nossa conduta e no curso do pensamento”.
A importância em avaliar a função psíquica afetividade é verificar que sentido e qual a
importância da afetividade na vida do paciente, pois de modo geral quando a afetividade está
alterada todas as outras funções psíquicas também se alteram. Pode-se dizer que a função
psíquica afetividade é aquela que, juntamente com o pensamento, conduz a vida psíquica dos
seres humanos, sendo diferente para cada tipo de sociedade e particular para cada sujeito.
Ao ser avaliada a afetividade, encontram-se algumas dificuldades técnicas, pois em
psicologia vários termos são utilizados e, dependendo da abordagem, terão o mesmo sentido com
nomes diferentes ou ainda com nomes semelhantes, com outro sentido. Pode-se citar, por
exemplo, a psicanálise. Em psicanálise o termo que se utiliza é ‘afeto’, significa “[...] a expressão
qualitativa da quantidade de energia pulsional e das suas variações”. 57 O afeto, em psicanálise, é
um dos elementos representativos da pulsão. Pulsão é um conceito,
[...] situado na fronteira entre o mental e o somático, como representante psíquico dos
estímulos que se originam dentro do organismo e alcançam a mente, como uma medida
da exigência feita à mente no sentido de trabalhar em conseqüência de sua ligação com
o corpo. 58

Assim, pode-se dizer que cada abordagem da psicologia vai ter uma qualificação
diferente, já na visão médica podemos encontrar, o que é bastante comum, o termo humor. O
humor, de acordo com Bleuler “[...] consiste na soma total dos sentimentos presentes na
consciência em dado momento”. 59

54
SCHNEIDER, 1973 apud PAIM, 1993, p. 220.
55
PAIM, 1993, 220 – 221.
56
STÖRRING, 1955 apud PAIM, 1993, p. 219.
57
LAPLANCHE E PONTALIS, 2001.
58
FREUD, Sigmund. Repressão. IN: Obras Psicológicas Completas (1914 – 1916). Rio de Janeiro: Imago, vol. XIV.
59
BLEULER, 1973 apud PAIM, 1993, p. 219.
29

Mas, independentemente do termo que se utiliza e da a abordagem adotada, esta função


psíquica pode ser considerada como um “termômetro” de como está o paciente. Por vezes, pode-
se encontrar pacientes internados com alterações importantes no seu estado afetivo, e o que vai
ser fundamental estar avaliando e verificando é o contexto em que se apresenta esta alteração,
pois, algumas destas alterações são perfeitamente compreensíveis e respondem de maneira
adequada a situação apresentada.
Desta forma, entre as alterações da afetividade, podemos encontrar:
A hipertimia como sendo um estado de ânimo morbitamente elevado, a hipotimia que em
geral apresenta-se através de uma diminuição do estado geral da afetividade, e a distimia, de
acordo com Dalgalarrondo “[...] é o termo que designa a alteração básica do humor, tanto no
sentido da inibição quanto no da exaltação” 60.
Apatia: a apatia é caracterizada por uma diminuição afetiva, “[...] no sentido de que a
61
afetividade esteja completamente abolida” . De acordo com Dalgalarrondo “[...] os pacientes
queixam-se de não poderem sentir nem alegria, nem tristeza, nem raiva, nem nada [...] Na apatia,
o indivíduo, apesar de saber da importância afetiva que tal experiência deveria ter para ele, não
62
consegue sentir nada.” O que se percebe é uma alteração qualitativa dos processos afetivos
causando sentimentos inadequados. 63
Humor Triste: segundo Dalgalarrondo, está relacionado com o humor depressivo, que
geralmente está associado a desesperança e muito angústia.
Ideação Suicida: está relacionada à “[...] idéias com a morte, em que o sujeito gostaria de
morrer para acabar com o sofrimento; idéias suicidas, que o sujeito pensa em se matar; planos
suicidas, aqui o sujeito planeja como iria fazer; os atos, em que o sujeito diz que comprou
remédios, veneno, corda ou revólver e tentativas de suicídio”. 64
Euforia: diferente da ‘hipertimia’, a euforia é o humor morbidamente exagerado, um
estado de alegria intenso e desproporcional. 65

60
DALGALARRONDO, 2000, p. 105.
61
PAIM, 1993, p. 223.
62
DALGALARRONDO, p. 108.
63
PAIM, 1993.
64
DAlGALARRONDO, p. 105.
65
Ibid.
30

Hipomodulação de afeto: “[...] é a incapacidade do paciente em modular a resposta afetiva


de acordo com a situação existencial, indicando rigidez do indivíduo na sua relação com o
mundo”.66
Inadequação do afeto: enquanto na hipomodulação o paciente não consegue construir uma
relação mais flexível com o mundo, na Inadequação do afeto o paciente mostra-se completamente
“[...] incongruente a situação existencial ou a determinados conteúdos ideativos” 67. Por exemplo,
alguém ter um ataque de riso frente a notícia de um ente muito querido.
Embotamento afetivo: ocorre em sujeitos que apresentam um esvaziamento afetivo, por
exemplo, não expressam afeto na hora de relatando algum fato.
Anedonia: é a ausência ou diminuição da capacidade de sentir prazer total ou parcial com
determinada atividade e experiência da vida, a perda do prazer com algo que antes em sua vida
era muito prazeroso, isto dentro de um determinado contexto de vida, pois em momentos de luto
isso é comum e não deve ser avaliado como alteração patológica.
Labilidade Afetiva: é revelada por estados afetivos nos quais ocorrem mudanças súbitas, o
sujeito oscila de forma abrupta, rápida e inesperada. De acordo com Dalgalarrondo, isto ocorre
quando um paciente está contando algo e, por exemplo, começa a chorar compulsivamente,
passando logo a seguir a sorrir tranquilamente. 68
Ambivalência Afetiva: ocorre quando as reações do individuo frente a eventos e vínculos
é dúbia. É um termo utilizado por Bleuler para descrever sentimentos opostos em relação ao
mesmo estímulo. Segundo Paim “[...] o doente com freqüência não pode unir ambas as
tendências; ama e odeia ao mesmo tempo, sem que ambos os sentimentos ajam entre si ou se
debilitem”. 69
Irritabilidade Patológica: de acordo com Bleuler é uma predisposição especial ao
desgosto. Os enfermos manifestam inapetência, irritabilidade, apresentando uma atitude
explosiva, diferente da tenacidade afetiva.70.
Tenacidade Afetiva: esta alteração da afetividade, diz respeito a permanência anormal de
alguns estados afetivos, uma fixação prolongada de alguns sentimentos desagradáveis, por
exemplo o ‘rancor’. 71

66
DALGALARRONDO, 2000, p. 108.
67
DALGALARRONDO, loc. cit.
68
Ibid., p. 109.
69
PAIM, 1993, p. 234.
70
Ibid., p. 228.
31

Irradiação Afetiva: “[...] é a capacidade que o indivíduo tem de transmitir, irradiar ou


contaminar os outros com seu estado afetivo momentâneo”. 72
Incontinência emocional: “[...] forma de alteração da afetividade que se manifesta pela
facilidade com que produzem as reações afetivas, acompanhadas de certo grau de incapacidade
73
para inibi-las”. Segundo Paim, a incontinência emocional é um sintoma que aparece
geralmente quando há perturbação psíquica devido a lesões orgânicas do cérebro, à uma extrema
facilidade para emocionar-se e tendências fáceis ao choro.
Puerilismo: é utilizado pela psiquiatria para designar alterações caracterizadas pela
regressão da personalidade adulta ao nível do comportamento infantil. Algumas vezes pode-se
encontrar pacientes hospitalizados que adotam, de forma inconsciente, atitudes, linguagem e
estado afetivo regredido, igual de uma criança.
Neotimia: nome utilizado para designar “[...] sentimentos e experiências afetivas
inteiramente novas vivenciadas por pacientes em estado psicótico. São afetos muito estranhos e
bizarros para a própria pessoa que os experimenta”. 74
Angústia: segundo Dalgalarrondo, a angústia “[...] relaciona-se diretamente à sensação de
aperto no peito e na garganta, de compresão, de sufocamento. Assemelha-se muito à ansiedade,
75
mas tem conotação mais corporal e é mais relacionada ao passado”. Para Karl Jaspers, a
angústia não tem objeto. E de acordo com Fongaro e Sebastiani, pode-se destacar duas formas,
frequentemente encontradas em hospitais: a Existencial e a de Morte.76
A Angústia Existencial enquadra-se em todos os processos de angústia que o indivíduo
pode enfrentar ao longo da vida. No contexto hospitalar, as perdas, os sentimentos de impotência,
de abandono, etc. são os mais freqüentemente desencadeadores desse processo.
A Angústia de Morte está associada à vivência específica da experiência de morte
iminente. Muitas vezes essa angústia se dá através da experiência de morte do outro, ou seja, de
algum colega de enfermaria, por exemplo.

71
PAIM, 1993.
72
DALGALARRONDO, 2000, p. 102.
73
PAIM, 1993, p. 203.
74
DALGALARRONDO, 2000, p. 109.
75
Ibid., p. 107.
76
FONGARO; SABASTIANI, 2003.
32

Ansiedade: de acordo com Dalgalarrondo, a ansiedade é definida “[...] como estado de


humor desconfortável, uma apreensão negativa em relação ao futuro, uma inquietação interna
desagradável” 77. Destacam-se também sob duas formas: a reativa e a neurótica.78
Ansiedade Reativa: manifestação de expectativa, medos, fantasias que podem ocorrer à
pessoa hospitalizada devido à situação vivencial concreta de doença, tratamento e internação.
Ansiedade Neurótica: é aquela advinda do próprio processo neurótico, onde há sensação
de que “algo errado vai acontecer”, sem ter fatores externos desencadeantes.
Medo: não é uma emoção patológica, é estado emocional de insegurança e angústia frente
a uma situação real e perigosa.
Fobia: é um medo de um objeto que não pode causar danos, é um sentimento
desproporcional e incompatível com as possibilidades de perigo real. Pode-se destacar alguns
tipos de fobias mais freqüentes: fobia social, agorafobia, claustrofobia. 79
Pânico: “[...] é uma reação de medo intenso, de pavor, relacionado ao perigo imaginário
de morte iminente, descontrole ou desintegração” 80. É uma resposta fisiológica do organismo à
sensação de medo que não tem objeto. Manifestam-se como crises de pânico, em que são intensas
crises de ansiedade e medo de morrer, acompanhada por sintomas somáticos (tremores, dor no
peito, náuseas, sensação de falta de ar e outros).
Fazem parte da afetividade também, algumas manifestações psíquicas e comportamentos,
anteriormente citados no processo de hospitalização, como: a raiva, a sensação de abandono, o
medo do desconhecido e real, o comportamento fóbico, a despersonalização ou hospitalismo,
estresse psicorgânico, frustração, impotência, sentimento de fracasso, regressão, isolamento,
hostilidade e esperança.

77
DALGALARRONDO, 2000. p. 107.
78
FONGARO; SABASTIANI, 2003.
79
DALGALARRONDO, 2000.
80
Ibid., p. 110.
33

2.4.2 Pensamento

O pensamento é uma das atividades mentais mais sofisticadas que o sujeito possui. Diz
respeito à capacidade de elaborar conceitos, articular juízos, constituir raciocínio e ter a
capacidade de síntese e propor uma solução adequada para um problema.
De acordo com Dalgalarrando, “[...] o pensamento se constitui a partir de elementos
sensoriais, que, embora não sejam propriamente intelectivos, podem fornecer substrato para o
processo do pensar: são imagens perceptivas e representações”. 81
Os elementos propriamente intelectivos do pensamento podem ser distinguidos por alguns
elementos constitutivos, em que autores se utilizam, sendo eles: o conceito, o juízo e o raciocínio.
Segundo Dalgalarrondo, o conceito forma-se a partir das representações, sendo
propriamente cognitivo e intelectivo, exprimindo-se apenas as características mais gerais dos
objetos e fenômenos. 82
O juízo representa “[...] o processo que conduz ao estabelecimento de relações
significativas entre os conceitos básicos” e que tem “[...] por função formular uma relação
unívoca entre um sujeito e um predicado”. 83
E o raciocínio, segundo Paim, é usado em dois sentidos: lógico e psicológico. No sentido
lógico, o raciocínio consiste em “[...] orientar os dados do conhecimento, tendo como objetivo
alcançar uma integração significativa, que possibilite uma atitude racional ante as necessidades
do momento” e no sentido psicológico tem o mesmo sentido de pensar. 84
O pensamento é uma das funções psíquicas mais importantes para avaliar em uma
primeira entrevista, pois em casos graves como a psicose é a uma das funções que estará alterada
e sua avaliação auxilia na hora de um diagnóstico diferencial. Mas é sempre importante lembrar
que um componente do aparelho psíquico não funciona isoladamente, mas, para que haja

81
DALAGALARRONDO, p. 124.
82
Ibid.
83
Ibid., p. 125.
84
PAIM, 1993, p.115.
34

adequação do pensamento, há a integração com a linguagem, a afetividade, a sensopercepção


entre outras funções.
De acordo com Sebastiani, quando um paciente internado encontra-se com o pensamento
alterado, não importa o grau, geralmente é uma tentativa simbólica de negar o conflito real, pois
em geral, tem um objetivo ligado a da satisfação de um desejo, como o de criar fantasias e
crenças que são diferentes, ao contrário, da situação atual.85
Quando se faz uma avaliação do pensamento em um paciente internado, é importante
estar atento à situação real do paciente, do momento atual que este sujeito está vivenciando,
sempre verificar qual a doença e principalmente o tratamento, pois substâncias tóxicas
introduzidas no organismo, bem como a febre alta, podem produzir alterações importantes.
Caso verifique-se que há uma alteração do pensamento em um paciente, como por
exemplo, o delírio, o profissional deve procurar verificar qual o sentido desta alteração, mesmo
que ela apareça de forma “bizarrra”. Desta forma, após ser verificado, encontrado e reconhecido
o sentido, poderá auxiliar no curso do tratamento desse paciente.
Segundo Sebastiani, inúmeros pacientes portadores de patologias graves, após passarem
por um período anterior de extremo sofrimento físico e emocional, entram em quadro de
dissociação, com alterações importantes na afetividade, consciência e pensamento. Muitas vezes
este paciente que se encontra em um momento de confusão psíquica passa a incomodar a equipe
de saúde, principalmente no hospital geral, em que grande parte desses profissionais não tem
preparo, ou não sabe o que fazer com estes pacientes. Isto de alguma forma acaba por afastar a
equipe de profissionais da saúde do contato com este paciente, e pode causar uma sensação de
desconforto e até mesmo de hostilidade. Por este motivo, considera-se tão importante a avaliação
psíquica e o diagnóstico, para que tente evitar um elemento a mais, que agrave a situação do
sujeito internado, já que este se encontra afastado de todas as coisas que mantêm o seu bem-estar
mental, como a ausência do seu lar, da sua cama, dos objetos pessoais e do convívio familiar. 86
O pensamento pode ser analisado através do processo de pensar, em que, frequentemente,
é utilizado em uma avaliação psicológica nos hospitais gerais, assim como esta pesquisa pretende
analisar através do discurso dos pacientes. Desta forma, o pensamento pode-se dividir em três
componentes:

85
SEBASTIANI IN CAMON, Valdemar A. (org). Psicologia Hospitalar: teoria e prática. São Paulo: Pioneira,
1995, cap. 2.
86
SEBASTIANI, 1995.
35

- Curso: identifica a velocidade em que o pensamento ocorre, se normal, acelerada ou


lentificada.
- Forma: verifica a estrutura do pensamento propriamente dita, ou seja, se o pensamento
possui ordenação (começo, meio e fim).
- Conteúdo: avalia a substância do pensamento, sua coerência e grau de concordância
com a realidade. Aquilo que corresponde à temática do pensamento.
De acordo com Dalgalarrondo, o pensamento de um sujeito que não possui nenhum tipo
de doença mental, normalmente é apresentado de maneira lógica, mas muitos sujeitos tendem a
utilizar estereótipos, em que muitas vezes decisões são tomadas sem evidências concretas,
concluindo algo que aparentemente são ditas como certas. Com isso, o autor coloca que é “[...]
difícil discriminar entre o pensamento normal e patológico, principalmente no que concerne aos
tipos de pensamento e o estilo de pensar”. Mesmo assim, pode-se verificar uma série de
alterações do pensamento, assim como: 87
Pensamento mágico: esse tipo de pensamento normalmente se apresenta em crianças e
não é considerado patológico. Em adultos verifica-se uma “relação puramente subjetiva de
idéias” que são associadas a fatos objetivos. O pensamento mágico, segundo Dalgalarrondo, fere
os princípios da lógica formal, não respeitando indicativos da realidade. Geralmente o
pensamento mágico aparece como desejos, fantasias e temores do sujeito, consciente ou
inconsciente, adequando-se a realidade ao pensamento. 88
Pensamento concreto: o pensamento apresenta-se de tal forma que o sujeito não consegue
metaforizar, o pensamento está pautado no concreto. O seja, o sujeito não consegue “[...] fazer a
distinção entre uma dimensão abstrata ou simbólica e uma dimensão concreta e imediata dos
fatos”. 89
Pensamento derreísta: este tipo de pensamento assemelha-se com o pensamento mágico, a
diferença é que, o pensamento, somente obedece à lógica e à realidade naquilo que interessa ao
desejo do sujeito, distorcendo a realidade para que se adapte aos seus anseios. 90
Pensamento demencial: o pensamento mostra-se empobrecido, há uma limitação dos
conceitos, uma diminuição dos elementos representativos e uma dificuldade de encontrar as

87
DALGALARRONDO, 2000.
88
Ibid.
89
Ibid., p. 127.
90
DALAGALARRONDO, loc. cit.
36

palavras adequadas. O paciente geralmente apresenta uma narrativa pobre, de forma lenta e com
dificuldade para passar de um assunto a outro. 91
Pensamento vago: de acordo com Dalgalarrondo, o pensamento vago apresenta-se quando
o paciente expõe um pensamento muito ambíguo, mostrando-se obscuro. Há uma imprecisão de
raciocínio, relativos às relações conceituais e a formação de juízo. 92
Pensamento prolixo: quando o sujeito apresenta dificuldade de chegar a conclusões sobre
um determinado tema, mostra uma dificuldade em construir um pensamento direto, claro e
acabado, com uma incapacidade de síntese.
Pensamento confusional: um pensamento incoerente, com dificuldades marcantes em
fazer os vínculos entre os conceitos e juízos, devido à turvação da consciência. 93
Pensamento desagregado: trata-se de um pensamento incoerente, em que o paciente ao
falar não comunica nada ao “interlocutor”, uma “salada de palavras”. 94
Pensamento obsessivo: são idéias ou representações que impõem-se à consciência do
sujeito de modo persistente e incontrolável. De acordo com Paim, “[...] o pensamento obsessivo
se acompanha de certo grau de tensão, que pode ‘cristalizar’ num estado de dúvida permanente.
O estado afetivo permanente do enfermo é de apreensão e ansiedade” 95.
Desintegração dos conceitos: segundo Paim “[...] a palavra se desprende por completo de
sua significação propriamente dita: simultaneamente podem corresponder-lhe as significações
heterogêneas; até os próprios conceitos se modificam [...] ou acontece que os conceitos se
desfazem e uma mesma palavra ter significados cada vez mais diversos”. 96
Condensação dos conceitos: o pensamento mostra-se condensado quando o sujeito está
relatando algo e duas ou mais idéias são condensadas ou se fundem em um pensamento. Bleuler
exemplifica: “Deus é uma nave do deserto”, neste caso foram condensadas idéias relacionadas
com a bíblia, com Deus, com deserto e com camelo; segundo o autor o camelo é vulgarmente
denominado ‘nave do deserto’. 97

91
PAIM, 1993.
92
DALGALARRONDO, 2000.
93
DALAGALARRONDO, 2000.
94
Ibid., p. 129.
95
PAIM, 1993. p. 133.
96
Ibid., p.79.
97
BLEULER, 1955 apud PAIM, 1993, p.79.
37

Taquipsiquismo: é quando curso do pensamento apresenta-se de forma muito acelerada,


uma idéia se sucede à outra rapidamente, podendo perder a capacidade de articular linguagem e
pensamento.
Bradipsiquismo: ao contrário do taquipsiquismo, no bradipsiquismo o pensamento é lento,
apresenta-se de forma dificultosa, o paciente não consegue articular idéias.
Bloqueio ou interceptação do pensamento: “[...] verifica-se o bloqueio do pensamento
quando um paciente, ao relatar algo, no meio de uma conversa, brusca e repentinamente
interrompe seu pensamento, sem qualquer motivo aparente”. 98
Fuga de idéias: de acordo com Paim, “[...] a fuga de idéias é uma perturbação da
expressão do pensamento, caracterizada por uma variação incessante do tema e uma incapacidade
absoluta de levar o raciocínio a uma conclusão”. 99
Idéias Prevalentes: são idéias que, por terem uma importância afetiva grande para o
sujeito, adquirem uma predominância maior sobre os demais pensamentos e se conservam
obstinadamente na mente do sujeito. As idéias prevalentes diferenciam-se das obsessivas, por
100
terem sentido para o paciente. É importante destacar que nem todas as idéias prevalentes
podem ser consideradas patológicas. De acordo com Paim, “o paciente portador de idéias
prevalentes se encontra impossibilitado para se subtrair a sua influência e revela uma tendência a
associa-lás a novas vivências”. 101
Dissociação do pensamento: o pensamento não consegue seguir uma seqüência lógica e
organizada. 102
Afrouxamento das associações: neste caso há um afrouxamento das associações, parecem
mais livres, estão expostas de maneira lógica, mas não muito bem articuladas. 103
Descarrilhamento do pensamento: o descarrilhamento do pensamento acontece quando o
sujeito está falando e de repente o pensamento é desviado de seu curso normal, começa a falar
sobre outra coisa e de repente volta novamente. 104

98
DALGALARRONDO, 2000. p. 129.
99
PAIM, 1993, p. 118.
100
DALGALARRONDO, 2000.
101
PAIM, 1993, p. 131.
102
DALGALARRONDO, 2000.
103
Ibid.
104
Ibid.
38

Desagregação do pensamento: “[...] profunda e radical perda dos enlaces associativos,


total perda da coerência do pensamento. Sobram apenas ‘pedaços’ de pensamento, conceitos e
idéias fragmentadas, muitas vezes irreconhecíveis [...]”. 105
Uma alteração importante do pensamento e que deve ser observada é o delírio, definido
como “[...] pensamentos afastados da realidade e formados por idéias incompreensíveis,
106
inamovíveis, irredutíveis, incorrigíveis, impenetráveis e não-relacionados a fatores causais” ,
mediante uma lógica apresentada pela realidade. No que diz respeito aos delírios existem
inúmeras classificações, de acordo com Dalgalarrondo, os frequentemente encontrados são 107:
- Delírio religioso: acontece quando o sujeito, por exemplo, passa a afirmar ser um novo
Messias, ou quando acredita ter poderes místicos.
- Delírio persecutório: o sujeito acredita que está sendo perseguido por alguém,
geralmente pessoas desconhecidas e que querem prejudicá-lo.
- Delírio de referência: apresenta-se quando um sujeito acredita que os outros estão
constantemente falando dele, que ele é alvo freqüente de referencias depreciativas e caluniosas.
- Delírio de culpa: ocorre normalmente em casos graves de depressão, em que o sujeito
afirma ser culpado de tudo de ruim que acontece no mundo e na vida das pessoas. E também que
devem ser punidos por seus pecados.
- Delírio hipocondríaco: o sujeito acredita que tem uma doença grave, incurável. Mesmo
que este sujeito faça exames, que o médico constate que ele não apresenta nenhuma doença, não
é possível remover este pensamento.
Constam também, algumas manifestações psíquicas e comportamentais ligadas ao
processo de hospitalização do sujeito, que estão relacionados com o pensamento, sendo eles:
negação, aparecimento ou intensificação do sofrimento, fantasias, culpa e limitação das
atividades.

105
DALAGALARRONDO, 2000, p. 130.
106
BASTOS, 1997. p. 127.
107
DALGALARRONDO, 2000.
39

3 EXPOSIÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

3.1 INSTRUMENTOS E PROCEDIMENTOS PARA A COLETA DE DADOS

A presente pesquisa teve como instrumento, para a coleta de dados a entrevista semi-
estruturada, que permitiu ao pesquisador utilizar um “guia” de temas a serem explorados durante
o transcurso da entrevista. As questões desenvolvidas tiveram como base o “roteiro de avaliação
psicológica aplicada ao hospital geral” dos autores Fongaro e Sebastiani. 108
De acordo com Fongaro e Sebastiani,
[...] a utilização desse roteiro terá função terapêutica em muitos momentos, à medida
em que essa possibilidade ao paciente a verbalização, manifestação, reflexão e
confrontamento com diversas questões que lhe são pertinentes ao processo de vida,
doença, internação e tratamento, podendo favorecer, assim, melhor elaboração e
conseqüentemente, adaptação à condição de Ser e Estar doente [...] 109.

Segundo esses autores, o roteiro foi criado através do trabalho de muitos psicólogos
hospitalares, que já vem há algum tempo desenvolvendo um primeiro roteiro, para contribuir
como um instrumento de trabalho mais adequado e específico aos profissionais da Psicologia
Hospitalar.
Para que se pudesse realizar a coleta dos dados, foi necessário obter um termo de
aprovação do Comitê de Ética da Unisul, universidade da qual a pesquisadora é acadêmica, e uma

108
FONGARO; SEBASTIANI IN CAMON, 2003.
109
Ibid., p. 8.
40

autorização da Assessora da Provedoria do Hospital de Caridade, lugar onde foram realizadas as


entrevistas, conforme já mencionado anteriormente.
A princípio, tinha-se a idéia de que as autorizações necessárias e o início da coleta de
dados aconteceriam a partir do mês de março, porém, somente no início do mês de maio é que as
entrevistas puderam ser realizadas.
Para as entrevistas, foram selecionados, de forma aleatória, três pacientes internados na
Ala Nossa Senhora das Graças, ala destinada à pesquisadora realizar o estágio curricular
obrigatório, respeitando e verificando a possibilidade de verbalização, independente do gênero,
idade ou patologia. Foram excluídos da seleção aqueles pacientes que se encontravam na ala
somente para exames rápidos.
As entrevistas aconteceram nos quartos da ala junto ao leito dos entrevistados, onde
outros pacientes também estavam presentes, sendo realizadas nos dias do estágio curricular
obrigatório, sem terem sido marcadas antecipadamente.
No momento das entrevistas, a pesquisadora apresentou o termo de consentimento pós-
informado, o qual foi assinado pelos participantes autorizando a realização. As entrevistas foram
gravadas e posteriormente transcritas pela pesquisadora.
A análise dos dados foi realizada de forma qualitativa, através da análise de conteúdo, que
é uma técnica de pesquisa cujo objetivo é a busca dos sentidos de um texto, através de
indicadores quantitativos ou qualitativos, interpretando os valores semânticos dos conteúdos e
classificando-os logicamente.110
Para Minayo, a análise de conteúdo é a descoberta do que está por trás dos conteúdos
manifestos, indo além das aparências do que está sendo comunicado.111
De acordo com os objetivos desta pesquisa, foram definidas duas categorias a priori,
sendo elas “pensamento e afetividade” e uma categoria a posteriori, denominada “o sujeito e a
hospitalização”. Em seguida, foram criadas as subcategorias e analisadas.
Desta forma, procurou-se articular pontos do discurso do paciente e do referencial teórico
apresentado nesta pesquisa.

110
MINAYO, 1994.
111
Ibid.
41

3.2 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

Neste subitem, apresentar-se-á os dados extraídos das entrevistas realizadas com os três
pacientes entrevistados no período do mês de maio.
Segue abaixo uma tabela com os “dados de identificação” dos sujeitos entrevistados,
ressaltando que todos os nomes dos entrevistados no decorrer do trabalho foram omitidos para
garantir o sigilo ético.

Tabela 1 – Dados de Identificação


Sujeitos Sexo Idade Diagnóstico Médico Data da Internação
1 Feminino 67 Câncer Meta Óssea/ HAS 17-04-2006
2 Masculino 72 Aneurisma abdominal e Cirurgia 21-04-2006
RM coronariana
3 Masculino 21 ICC Congênito 19-04-2006

Como o objetivo desta pesquisa é verificar quais são os principais aspectos alterados das
funções psíquicas afetividade e pensamento, observáveis através do discurso de pacientes
internados no Hospital de Caridade. Inicialmente, serão expostos os dados coletados e analisados
através de duas categorias a priori, afetividade e pensamento, e uma categoria a posteriori, como
já relatado anteriormente, traçando um paralelo entre os dados obtidos e o recorte teórico
utilizado neste trabalho. E, por conseguinte, a discussão de todos os casos.

3.2.1 Caso 1

O Sujeito 1 é do sexo feminino, 67 anos, está internada no Hospital de Caridade há mais


ou menos um mês, com diagnóstico de Câncer Osseo. A paciente possui um grau de dependência
total, sendo que não pode se locomover devido aos riscos de fraturas. É natural da região Sul de
Santa Catarina e está acompanhada da filha mais velha, dentre quatro irmãos. A paciente possui
histórico de internações anteriores, sendo uma na cidade de Porto Alegre-RS para tratamento de
42

câncer de mama, e outra na cidade de Florianópolis-SC, para tratamento de fraturas e exames


investigativos, quando chegou-se ao diagnóstico atual.
Durante a entrevista do sujeito 1, com relação a categoria afetividade, pode-se perceber
que esta apresenta alterações relativas aos sentimentos, visto que o sujeito apresenta em sua fala
tristeza, como pode ser verificado na seguinte fala:
“É tristeza, desânimo, tem dias que eu choro dia todo, a noite toda. Tem dias que eu fico
que não tenho vontade de nem conversar. Eu por mim... fiquei revoltada”. (E27)
Observa-se também nesta fala acima que a paciente encontra-se num estágio de raiva,
segundo Kübler-Ross (1993), ao dizer que ficou revoltada.
Pode-se dizer que a paciente apresenta-se com hipotimia, revelada pela fala:
“... eu acho uma humilhação. É muito diferente, eu nunca, nunca,... agora tem que os
filhos limpa a gente, lava e troca, faz favor... é muito triste”. (E39)
E ao dizer que:
“Entrei em depressão e agora não sei. Tem dia que eu tenho mais vontade de morrer do
que viver, daí me lembro que tenho outros filhos e marido e meus netos que eu adoro...”. (E25)
Apresenta também uma alteração no humor, quando acha que é uma humilhação. Como
foi visto na fundamentação teórica, o humor consiste numa totalidade de sentimentos presentes
na consciência. Pode-se dizer que a paciente nesta última fala apresentada, mostra-se com humor
triste.
Verifica-se, no relata acima, que a paciente apresenta idéias relacionadas à morte, com
vontade de morrer e revela ter sentimentos relativos a depressão. Idéias essas que podem ocorrem
na ideação suicida segundo o autor Dalgallarrondo, como visto no marco teórico, o sujeito
gostaria de morrer para acabar com o sofrimento.
O medo é outro aspecto da afetividade encontrada no relato do sujeito 1, em que diz:
“Mexer eu mexo e caminhá não. Eu tenho medo, pode causar outras fraturas. O Dr.
Fulano disse que se eu quisesse podia tentar... Eu até podia tentar porque sou meia teimosa, mas
tenho medo...” (E40)
Segundo Paim (1993), o medo não é considerado patológico, significa um estado
emocional de insegurança e angústia frente a uma situação real e perigosa. No caso do sujeito 1, a
situação de perigo é real, pois, conforme dito anteriormente a paciente tem risco de fraturas,
43

motivo pela qual se encontra com grau elevado de dependência, podendo fazer somente pequenos
movimentos.
Na categoria pensamento, podemos observar um bradipsiquismo, presente na fala:
“... nos estamos em maio, né? ... É maio? .... Dia 17 de abril”. (E9)
Isto pode ser observado pelo curso de seu pensamento, visto que durante a entrevista
falava de forma lenta e dificultosa, como na fala em que a paciente apresenta dificuldade de
articular sua idéia e seu pensamento mostra-se desorientado.
Quando a paciente relata como foi diagnosticada sua doença, aparece um bloqueio no
raciocínio, que interrompe de forma brusca o pensamento, conforme o relato:
“... Dói muito também assim no meio dos osso. Mas ainda comecei a brincar com ela...
disse isso é doença de velha mesmo né Dra. Ela disse não, não é não. Mas aí vim fiquei acho que
um ano em casa bem tudo, só com dor na coluna, na certa é bico de papagaio e não sei o que... E
depois eu peguei e começou a me doer muito...”. (E16)
Pode-se verificar ainda, idéias prevalentes, como por exemplo:
“... não tem nada que me tire da minha cabeça, nada, nada. Nada o que você me dizer vai
adiantar”. (E27)
Nesta fala a paciente demonstra uma idéia que se impõe à consciência, a de que nada vai
lhe tirar da cabeça a morte de sua filha. Um pensamento marcante relacionado aos seus afetos e
presente em seus relatos.
Em outros momentos, aparece de forma clara o pensamento mágico, em que a paciente
diz:
“... eu disse: Meu Deus, por quê eu fiquei toda quebrada em cima de uma cama, porque
foi minha filha, porque não fui eu? [...] Deus que me perdoe, mas eu fiquei... revoltei. Mas Deus
queria que ‘era ela’. Mas disse não, por favor né, fazer o quê, ninguém vai se não chegar a hora
né?” (E27)
“Para mim não mudou nada, eu já mais ou menos sabia que podia acontecer isto... eu
tinha impressão assim que ia me acontecer mais alguma coisa. Eu sempre falei lá em casa. Eu
disse: ‘olha eu não vou ficar só por esta não, vai me aparecer outra”. (E35 e E36)
O pensamento mágico, no caso da paciente 1, apresenta-se sob forma de tentar dar um
sentido para tudo o que está acontecendo, tanto no caso da perda abrupta e significativa quanto ao
retorno de sua doença.
44

Na categoria “O sujeito e a hospitalização” pode-se destacar o seguinte.


Durante a entrevista, a paciente 1 demonstra por um lado saber de sua doença, porém, por
outro lado, em alguns momentos de sua fala, apresenta incertezas, como nas seguintes falas:
“Sei, problemas nos ossos. Eu creio que seja câncer nos ossos... eu tenho quase certeza
porque eu fiz quimioterapia...”. (E1 e E2)
“... pelo menos eu penso que seja... eu não sei...”. (E4)
“... aqui comigo está tudo bem, eu não tenho nada, não tenho...” (E10)
“... eu acho que risco de quebrar tem, mas o Dr. ........ disse que é difícil, mas pode
ocorrer”. (E13)
“... ia passar para o CEPON pra mim fazer uma avaliação não sei o quê”. (E20)
Estas falas apresentam uma manifestação psíquica de negação, a paciente, ao relatar que
não sabe, não tem certeza e que está tudo bem, mostra-se negando. Ao utilizar a negação como
mecanismo de defesa, a paciente tenta se proteger, preservar o “eu”, ao mesmo tempo quando diz
que “pelo menos eu penso que seja”, mostra um contato com a realidade da doença.
A paciente 1, ao relatar que,
“... E o Dr. ........ disse que vai ficar aqui comigo uma porção de tempo, eu não sei
quantos dias. Eu disse para ele: tô boa de fugir”. (E22)
Além de apresentar um pensamento mágico, por pensar em fugir, em que a realidade não
é esta, demonstra também um comportamento fóbico, no sentido de não querer encarar a
situação, conforme Fongaro e Sebastiani (2003).
Em outro momento, manifesta um comportamento, o qual muitos autores, como Chiattone
(2003), Camon (2002), Fongaro e Sebastiani (2003) chamam de despersonalização, quando
relata:
“... a gente tem que estar se mostrando para as gurias (técnicas de enfermagem), para
todas, para as filhas é uma humilhação, muito ruim. Tem que dá banho na gente, colocar a
“comadre”. E eu começo a pensar se isso é vida.... Sabe nem o meu marido já me viu nua, nem
no escuro e agora eles (técnicos de enfermagem e filha) pega a gente, coloca a coisa aqui... eu
acho uma humilhação. É muito diferente eu nunca... nunca, nunca, agora tem que os filhos limpa
a gente e lava e troca. , faz favor... é muito triste”. (E39)
45

Observa-se também um conflito quanto à privação e a limitação de atividades, visto que a


condição de intimidade é alterada devido à despersonalização gerada pela internação, assim como
o desamparo relatado nesta pesquisa.

3.2.2 Caso 2

O Sujeito 2 é do sexo masculino, 72 anos, está internado no Hospital de Caridade desde o


dia 21 de abril, com diagnóstico de aneurisma aorta abdominal. O paciente não possui
dependência, consegue se locomover sozinho, mas se sente muito fraco e, por isso, costuma
levantar-se do leito com pouca freqüência. É natural da região Sul de Santa Catarina e está
acompanhado da nora. O paciente foi internado pela emergência, com dor abdominal há dois
dias, quando foi realizado um exame de ultra-som e encaminhado à internação. Realizou a
cirurgia de aneurisma na manhã do dia seguinte. Posteriormente, passou sete dias na UTI. Até a
data da entrevista, o paciente encontrava-se em seu leito, com a possibilidade de uma nova
cirurgia, desta vez cardíaca.
Durante a entrevista com o paciente 2, pode-se perceber a afetividade bastante alterada.
Mostrou-se por diversas vezes bastante angustiado, como podemos verificar nestas falas:
“... eu vim às pressas”. (E3); “Foi às pressas”. (E5); “... que tinha que ser as pressas...”
(E7) ou ainda “... essa não deu tempo de nada....” (E29)
Nestes relatos, percebe-se uma angústia existencial, mostrando que o paciente passou por
momentos difíceis durante as situações pré e pós-cirúrgicas. E ainda angústia de morte,
percebidas nas seguintes falas:
“... Foi operação de urgência”. (E16)
“... foi porque foi de urgência... Se ela estoura eu vou...” (E17)
Além destes sentimentos de angústia, o paciente apresenta um outro sentimento e uma
experiência afetiva nova, chamada, por Dalgalarrondo (2000) de neotímia. Mostra-se também
com incontinência emocional e irradiação afetiva. Podendo ser verificado nos seguintes relatos:
“... não sabe dizer ao certo, nessas hora a gente está fora de si. Não guarda nada. Só sei
que eu gritava muito, metia os pés em tudo, aí eles me amarraram... Quanto estava na UTI... eu
46

não lembro de nada... eu via coisa do outro mundo... eu via coisa que eu nem posso te dizer, eu
cheguei a meter os pés na Dra., daí me amarraram.” (E9, E11, E12, E 13)
“Eu não sei lhe explicar, eu não sei, eu não estava em mim...”. (E14)
A hipotimia e a tristeza também se fazem presentes em alguns momentos da entrevista,
quando o paciente relata:
“... Quando a operação não sai boa, não é bem sucedida, é sofrimento”. (E15)
“... Só que a minha fraqueza é muito grande...”. (E21)
“... a outra eu sofri menos do que esta...”. (E35)
“... Pensamento mais, que quando a gente tem família (chora muito), quando a gente tem
família tem pensamento... (silêncio)... saudades dos filhos. (chora)”. (E36 e E37)
“... esta aqui que me ‘agüenta’ sempre, é meu filho e ela”. (E41)
Durante o decorrer do discurso, outras questões relacionadas à afetividade foram
surgindo. Questões como: ansiedade e humor triste.
A ansiedade pode ser verificada quando o paciente diz:
“Não, aí eles me trouxeram de madrugada, me deixaram dormir dois dias na cadeira. Aí
no terceiro dia, eles tiveram que me operar. Mas eu tava mais fraco do que agora. Agora eu tava
forte...” (E31)
“Embora que eu saia daqui eu não vou fazer mais nada. Muito velho... o que eu devo
esperar, além disso...”. (E48)
Na primeira fala, embora o paciente esteja contando algo que já aconteceu, nota-se com
este relato certa ansiedade com que ele está vivenciando e o que ainda irá vivenciar. Na segunda,
percebe-se uma apreensão negativa em relação ao futuro.
O humor triste aparece quando o paciente mostra-se com o afetividade baixa, com
desesperança e angústia. Na fala,
“Antes eu passeava e acabou... depois de tanto trabalho acabou... Tudo é bom, quando se
tem saúde”. (E47 e 48)
E por fim, mostra-se com uma diminuição da capacidade de sentir prazer com coisas que
fazia antes, denominado anedonia. Quando diz:
“... Uma casinha, tenho um carrinho que dá de andar, mas acabou o prazer”. (E47)
Com relação ao pensamento, o paciente 2 apresenta uma dissociação do pensamento que,
conforme visto no marco teórico, pacientes portadores de patologias graves, após passarem por
47

um período de sofrimento físico, podem apresentar dissociações, com alterações importantes.


Podendo ser verificado na seguinte fala:
“Ah, essa teve, não sei... o que aconteceu. A outra eu não tive... essa eu cheguei a ficar
amarrado”. (E8)
Pode-se pensar também em uma alteração em nível de desagregação do pensamento,
quando diz: “... quando a gente ta na UTI, a gente ta morto né. Na UTI entrou lá, dormindo”.
(E12)
Aqui o paciente mostra uma perda da coerência do pensamento, com idéias fragmentadas
e incompreensível.
Em outro momento, mostra-se com afrouxamento das associações, em que se consegue
compreender o que o paciente relata, mas aparece de forma pouco articulada. Como mostrado a
seguir: “... parece que estava entupido. Mas não era, era o ‘cascão’ do remédio. Isso aqui fura
uma faixa de quinze a vinte vezes por dia a barriga, aqui só comprimido, comprimido, que nem
se fala. Tem dia que tomo mais de vinte. O que tomo de ‘força’ de comprimido por dia...”. (E22)
O pensamento mágico é outro tipo de pensamento presente no discurso do paciente, em
que diz: “É Deus é que sabe, só Deus é que vai dizer o que vai ser”. (E49)
Durante a entrevista, o paciente manteve-se bastante preocupando com relação a esta
pesquisa. Antes de iniciar a gravação, o paciente perguntou se ele poderia ser prejudicado no
hospital com o que ele dissesse. Respondi falando sobre o sigilo ético e lendo para ele o termo de
consentimento. Em alguns momentos o paciente expõe sua opinião no que diz respeito a ele e a
hospitalização e, logo em seguida, fala que não pode reclamar, parecendo se dar conta da sua
preocupação inicial.
Mesmo assim, pode-se perceber que o paciente encontra-se em estágio de raiva, conforme
descrito no marco teórico, em que parece apresentar uma sensação de invasão por parte da
hospitalização e do tratamento. O paciente critica a comida, o tratamento e as regras do hospital,
mostrando-se relacionada a falta de controle da própria vida. Desta forma, o paciente revela estar
com alguns aspectos relacionados com o chamado de despersonalização ou hospitalismo,
conforme Spitz. Ficando claro no momento em que diz:
“... Só sei que na primeira operação não houve isso que houve agora... me amarraram”.
(E12 e E13)
48

“... só comprimido, comprimido, que nem se fala. Tem dia que tomo mais de vinte. O que
tomo de ‘força’ de comprimido por dia...”. (E22)
“... alimentação que eu posso, eu não posso comer. Por exemplo, se eu quiser comer um
pastelzinho quente, eu não posso...”. (E24)
“É, que eles dão é tudo ‘insosso’, tudo. A comida vem e volta, vem e volta, vem e volta”.
(E25)
“... Mas eu não posso reclamar deles, não”. (E26)
Os sentimentos de frustração e impotência também aparecem na seguinte fala:
“Embora que eu saia daqui eu não vou poder fazer mais nada Muito velho, né? Setenta e
três anos, vou fazer setenta e três anos. O que devo esperar, além disso... Tudo é bom, quando se
tem saúde”. (E48)
Assim, como o sentimento de fracasso que o paciente diz:
“... depois de tanto trabalho acabou”. (E47)
O estresse psicorgânico aparece, quando relata os momentos que esteve na UTI, conforme
dito pelo paciente a seguir.
“... só que essa foi pior que a outra... (E7)... a outra eu não tive... essa eu cheguei a ficar
amarrado” (E8)
“Eu não sei lhe explicar, eu não sei, eu não estava em mim. Eles acham que era por
causa da morfina... Quando a operação não saí boa, não é bem sucedida, é sofrimento”. (E14 e
E15)

3.2.2 Caso 3

O Sujeito 3 é do sexo masculino, 21 anos, está internado no Hospital de Caridade desde o


dia 19 de abril, com diagnóstico de Insuficiência Cardíaca Congestiva Congênito (ICC). “A ICC
significa a condição caracterizada por congestão dos tecidos corporais. Devido à incapacidade do
coração de bombear uma quantidade suficiente de sangue para suprir as necessidades metabólicas
49

112
dos tecidos”. O paciente não possui dependência, consegue se locomover sozinho. É natural
da Serra de Santa Catarina e atualmente mora em São José-SC.
Até o dia da entrevista, o paciente encontrava-se em seu leito, com cirurgia cardíaca
marcada, a ser realizada dois dias depois.
Com relação à afetividade, durante a maior parte da entrevista, o paciente mostrou-se
calmo, tímido. Tendo apenas, em um único momento, final da entrevista, demonstrando angústia
de morte, conforme o seguinte relato:
“... o cara nasce sem nada, quando morre não leva nada. Me deu um desespero...” (E52)
Na categoria pensamento, com relação o que foi observado no discurso do paciente 3,
apresentou ordenação, coerência e velocidade normal do pensamento. Foi constatado somente,
em duas falas, o pensamento mágico, conforme relato abaixo.
“É morreu um bem aí. O desespero dele na hora, tudo. Presenciei tudo, a pessoa muda”.
(E49).
“... a pessoa muda quando vê isto”. (E51)
O pensamento mágico, nesse caso do paciente 3, pode-se verificar que é resultado de
idéias subjetivas, relacionadas às fantasias e aos temores do paciente perante ao fato ocorrido.
Cinco dias antes da entrevista, um de seus colegas de quarto, que ficava no leito ao lado, foi à
óbito, deixando o paciente 3 como expectador do acontecimento, conforme seu relato.
Quanto ao processo de hospitalização do paciente 3, percebe-se que ocorrem
manifestações inerentes ao processo de despersonalização, em que o paciente mostra-se um
pouco incomodado, mas tentando adaptar-se. Verifica-se isso, quando perguntado sobre a sua
hospitalização, através das seguintes falas:
“Sei lá, tem que ter paciência né. Ta meio ruim né, ta longe de casa... a liberdade que
tinha... de castigo aqui”. (E28, E30 e E33)
“... to meio enjoado já de comida de hospital”. (E41)
“... mais ou menos... Oh! Berra a noite toda. Multiplica por três do que ta agora. Esses
dias fui dormir era de manhã... Berrava a noite inteira” (E42 e E43)
Apresenta-se também o que Fongaro e Sebastiani (2003) chamam de Medo Real,
conforme marco teórico. Quando diz:

112
PARADISO, Catherine. Fisiopatologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1995, p. 26.
50

“... É morreu um bem aí. O desespero dele na hora, tudo. Presenciei tudo, a pessoa
muda... me deu um desespero...”. (E49 e E52).

3.3 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Para uma melhor visualização dos resultados obtidos através da análise realizada no
tópico anterior, colocou-se duas tabelas com as categorias afetividade e pensamento, com
objetivo de mostrar os principais aspectos alterados encontrados nos casos analisados.

Tabela 2 – Categoria Afetividade


Subcategorias Ocorrências Sujeitos
Hipotimia 2 1–2
Humor Triste 2 1–2
Angústia Morte 2 2–3
Angústia Existencial 1 2
Medo 1 1
Ideação Suicida 1 1
Sentimento de Revolta 1 1
Neotimia 1 2
Incontinência Afetiva 1 2
Ansiedade 1 2
Anedonia 1 2

Tabela 3 – Categoria Pensamento


Subcategorias Ocorrências Sujeitos
Pensamento Mágico 3 1–2–3
Afrouxamento das Associações 1 2
Bradipsiquismo 1 1
Idéias Prevalentes 1 1
Bloqueio do Pensamento 1 1
Dissociação do Pensamento 1 2
Desagregação do Pensamento 1 2

A partir do que foi visto nos relatos dos pacientes, analisados e apresentados nas tabelas
acima, conclui-se que, nos casos estudados os principais aspectos alterados da função psíquica
afetividade é a hipotimia, o humor triste e a angústia de morte.
51

Na hipotimia verifica-se que, nos relatos, há uma diminuição da afetividade relacionados


com a dependência, com perdas (adoecer e familiar) e tratamento (cirurgias e medicações). O
humor triste está vinculado ao adoecer. E a angústia de morte, associada a própria possibilidade
próxima de morrer. Então, o que pôde ser verificado é que as alterações psíquicas estão
relacionadas a situação de perda da saúde, ou seja, deixar de ser uma pessoa que possuí saúde
plena e ter que se deparar ainda com algumas questões, do tipo, depender de outros, ou a
possibilidade de morte.
Na função psíquica pensamento, os principais aspectos alterados encontrados foram:
pensamento mágico e afrouxamento das associações.
Observa-se que o pensamento mágico, presente nestes casos, não é considerado como
patológico, que foi utilizado pelos três entrevistados. Revela uma tentativa dos sujeitos em tentar
compreender, dar um sentido, as situações que foram se apresentando.
E o afrouxamento das associações presente no sujeito 2 revela que houve um
flexibilização no curso do pensamento. No sujeito 2 mostra estar relacionado com a afetividade.
No caso não há como saber se a causa, pela qual o pensamento se apresenta dessa forma, é
devido ao processo de hospitalização dos sujeitos.
Outra categoria que surgiu a posteriori e que foi denominada “O sujeito e a
hospitalização”, foi criada com objetivo de verificar como se dá a dinâmica do sujeito em
processo de hospitalização e qual o significado deste na vida do sujeito. Visto que se apresenta
nos objetivos específicos deste trabalho.

Tabela 4 – Categoria O sujeito e a hospitalização


Subcategorias Ocorrências Sujeitos
Despersonalização ou hospitalismo 3 1–2-3
Raiva 1 2
Comportamento Fóbico 1 1
Limitação de Atividades 1 1
Frustração 1 2
Impotência 1 2
Fracasso 1 2
Estresse Psicorgânico 1 2
Medo Real 1 3

De acordo com que foi visto na análise dos dados apresentados e na tabela acima, pode-se
perceber que todos os pacientes entrevistados apresentam algum tipo comportamentos e aspectos
52

psicológicos relacionados com a despersonalização ou hospitalismo. Mas não se pode dizer que
estes sujeitos estão com hospitalismo.
A raiva apresentada por apenas um paciente, mostra-se como conseqüência da
hospitalização, tratamento e adoecer. Assim como o comportamento fóbico, do sujeito 1,
desencadeado pela permanência prolongada no hospital.
A limitação de atividades apresentada pelo sujeito 1, está relacionada a pouca mobilidade
e por não poder realizar algumas tarefas, como por exemplo, tomar banho sozinha e ir ao
banheiro.
As outras subcategorias, frustração, impotência, fracasso e estresse psicodinâmico,
apresentado pelo sujeito 2, mostra a sua relação com a doença e o tratamento.
A partir dessas considerações feitas, pode-se constatar que, apesar de muitas mudanças
terem ocorrido desde o surgimento do hospital até os dias de hoje, ainda a hospitalização é um
fator que afeta emocionalmente e psiquicamente o sujeito internado. Um fator que não é
predominante, ou seja, que não se sobrepõe a outras questões, como a doença orgânica e a
condição da perda da saúde, mas que contribui para alterações na esfera psíquica, como muitos
autores já citados no marco teórico, que descrevem sobre isto.
Pode ser verificado também que, apesar de todo o sofrimento orgânico e psíquico vivido
por parte dos pacientes, mostram que estão sendo tratados adequadamente, como apresentadas
em algumas das falas, e que não é a conduta dos profissionais da saúde que está dentro do fator
que afeta psiquicamente, salvo algumas exceções. E sim, o próprio processo de reformulação dos
valores de cada um, por exemplo, hábitos, que são impostos ao sujeito e determinados pelas
regras gerais da instituição e tratamentos (exames, dietas e outros).
53

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este Trabalho de Conclusão de Curso teve como propósito estudar e refletir sobre o
sujeito hospitalizado e as alterações na esfera psíquica.
O tema surgiu a partir do interesse da pesquisadora, como já comentado na introdução
deste trabalho, em compreender o funcionamento das funções psíquicas e suas alterações em
pacientes internados, bem como verificar se existia alguma relação entre estas alterações e o
processo de hospitalização.
Desta forma, o objetivo geral se constituiu em verificar quais eram os principais aspectos
alterados das funções psíquicas afetividade e pensamento, apresentados por sujeitos internados no
Hospital de Caridade. Para que esse objetivo pudesse ser atingido, foram traçados objetivos
específicos.
O primeiro objetivo específico foi compreender, através da teoria, o significado da
hospitalização na vida dos sujeitos internados. Para isso buscou-se referenciais teóricos sobre a
história do hospital e trabalhos já desenvolvidos por profissionais da saúde em hospitais gerais.
O objetivo foi alcançado, visto que, a partir do estudo sobre os temas acima, foi possível
compreender que o sujeito, ao ser internado, passa por uma modificação e reformulação de
concepções que tem de si e do mundo externo, passando a ter que se adaptar às regras gerais do
hospital e a conviver com a condição de doente e hospitalizado.
Foi possível verificar que outros fatores tais como, o afastamento da família, o medo do
desconhecido, a limitação das atividades, podem acentuar a condição de paciente, de enfermo e
de hospitalizado. Fatores também como a conduta e a atuação por parte da equipe de
54

profissionais da saúde para com o sujeito internado, tornam-se fundamentais na contribuição de


uma melhora do estado geral do paciente.
Para que haja promoção da saúde é necessário ampliar a compreensão do atendimento ao
sujeito hospitalizado, pois precisa de atendimento e cuidados durante a internação hospitalar, e
que possa ser também preparado juntamente com a família para o pós-internação.
Estudar as funções psíquicas, especialmente a afetividade e o pensamento, foi o segundo
objetivo específico desta pesquisa, sendo alcançado através dos estudos sobre a psicopatologia e
do “roteiro de avaliação psicológica” de Fongaro e Sebastiani (2003).
Estas leituras possibilitaram um maior entendimento sobre o exame psíquico e como,
através deste recurso, é possível verificar o estado psicológico do paciente, dando uma noção
geral dos aspectos psíquicos alterados que podem ser encontrados em hospitais gerais, revelando
também qual a importância de avaliar a afetividade e o pensamento.
A afetividade abrange as emoções, os sentimentos, o humor do individuo e, ao ser
avaliada, irá dar uma noção de como este sujeito está emocionalmente em relação as questões
ligadas ao seu adoecimento e a situação de internação. De modo geral pode-se dizer que, quando
a afetividade está alterada, todas as outras funções psíquicas também estão.
O pensamento indica como o paciente está elaborando, construindo todas estas questões
relacionadas a hospitalização e a doença, principalmente a forma através do qual o sujeito pensa e
lida com tudo isto.
Quando um paciente encontra-se com o pensamento alterado, geralmente é uma tentativa
simbólica de negar o conflito real e vários são os pacientes que, ao passarem por situações ou
doenças graves por um período prolongado de sofrimento, sofrem alterações importantes na
afetividade, pensamento e consciência.
Estas leituras proporcionaram a compreensão da dinâmica do funcionamento psíquico,
dando suporte para a realização também dos demais objetivos específicos.
Dessa forma, foi possível alcançar o terceiro objetivo, articular pontos da dinâmica dos
sujeitos em processo de internação e as possíveis alterações na afetividade e pensamento.
Juntamente com o quarto e quinto objetivo específico que era realizar a coleta de dados, analisar
e discutir a partir do recorte teórico presente nesta pesquisa.
55

Para compreender e articular pontos sobre o sujeito internado e as funções psíquicas,


foram entrevistados três pacientes internados no Hospital de Caridade, no período destinado ao
estágio curricular obrigatório.
Após a análise das entrevistas constatou-se que houve alterações no funcionamento
psíquico dos sujeitos entrevistados e que estavam relacionados tanto com a perda da condição de
sadio, quanto com a hospitalização em si, que a internação é um fator que acentua esta condição.
Apresentando constantemente esta realidade, impondo ao sujeito “ser paciente” e portador de
uma doença.
Verificou-se também que os atendimentos feitos por parte da equipe de profissionais da
área da saúde, que aparecem de forma não evidente, não despersonalizam o sujeito, conforme
dito no marco teórico. O que se pôde constatar nos relatos e no que foi apresentado na discussão
dessa pesquisa, é um enquadramento dos procedimentos feitos com o sujeito hospitalizado que
proporciona o chamado “hospitalismo”.
Através de tudo que foi exposto neste trabalho fica explícito que vários são os fatores
inerentes à hospitalização e que contribuem para alterações psíquicas. Neste sentido pode-se
perceber que há um vasto campo de trabalho para os profissionais da psicologia hospitalar, que
podem desenvolver trabalhos junto aos pacientes hospitalizados, proporcionando a verbalização
dos sujeitos, o que viabiliza a diminuição do sofrimento inerente à internação e a doença. E que
estes profissionais possam contribuir com pesquisas voltadas à área da Psicologia da Saúde e
Hospitalar, beneficiando os profissionais e a população.
Assim, ao fim deste processo e da trajetória realizada para atingir os objetivos específicos,
foi possível verificar quais foram os principais aspectos alterado, das funções psíquicas
afetividade e pensamento, observados através do discurso dos pacientes, sendo eles: hipotimia,
humor triste, angústia de morte e pensamento mágico.
Desta forma, do que foi exposto acima, responde o problema de pesquisa e também
auxilia outras pesquisas que possam ser desenvolvidas relacionadas a temática.
Como sugestão coloca-se a possibilidade de abertura do estudo para as outras funções
psíquicas e ampliação do número de entrevistados.
56

REFERÊNCIAS

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Medicina da Universidade de São Paulo. Disponível em:
<http://www.hcnet.usp.br/dicionario/psiquiatria.htm> Acesso em: 24 mar. 2006.

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BASTOS, Cláudio L. Manual do exame psíquico: uma introdução prática à psicopatologia. Rio
de Janeiro: Revinter, 1997.

CAMON, Valdemar A. (org.) A psicologia no hospital. São Paulo: Pioneira Thomson Learning,
2003.

______. E a psicologia entrou no hospital. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2003.

______. O doente, a psicologia e o hospital. São Paulo: Pioneira, 2002.

______. Psicologia da saúde: um novo significado para a prática clínica. São Paulo: Pioneira
Thomson Learning, 2002.

______. Psicologia hospitalar: Teoria e Prática. São Paulo: Pioneira, 2002.


57

______. Psicologia hospitalar: Teoria e Prática. São Paulo: Pioneira, 1995.

CAMPOS, Terezinha. C. Psicologia hospitalar. São Paulo: EPU, 1995.

DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. Porto


Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.

DEWALD, Paul. Psicoterapia: uma abordagem dinâmica. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.

FREUD, Sigmund. Repressão. IN: Obras Psicológicas Completas (1914 – 1916). Rio de Janeiro:
Imago. Vol. XIV.

GIL, Antonio C. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Altas, 2002.

KÜBLER-ROSS, Elisabeth. Sobre a morte e o morrer. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

LAPLANCHE E PONTALIS. Vocabulário da psicanálise. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

MELLO FILHO, Julio (org.). Psicossomática hoje. Porto Alegre: Artmed, 1992.

MINAYO, Maria Cecília. S. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes,
1994.

PAIM, Paulo. Curso de Psicopatologia. 11. ed. revisada e ampliada. São Paulo: EPU, 1993.

PARADISO, Catherine. Fisiopatologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1995.


58

ANEXOS
59

Anexo A – Roteiro de entrevista semi-estruturada

Avaliação Psicológica

Nome:........................................................... N° do Registro:....................................

Idade:.............Sexo:.............Estado Civil:............... Religião:....................................

Data da Internação:.............................Ala:.................................................................

Diagnóstico Médico:...................................................................................................

Data do atendimento:.........................................

Apresentação do pesquisador e da pesquisa ao paciente.


Assinatura do termo de consentimento pós – informado pelo paciente pesquisado e pelo
pesquisador.

Perguntas:

1- Você está aqui no hospital por qual motivo?


2- O que você sabe sobre a sua doença?
3- O que você imagina que esteja acontecendo? (caso a pessoa não saiba sobre sua doença)
4- Como surgiu a doença? Como foi descoberto o diagnóstico?
5- Qual o tipo de tratamento você está recebendo?
6- Você já foi hospitalizado antes? Como foi?
7- Como você está em se sentido em relação a hospitalização?
8- Você acredita que alguma coisa na sua vida mudou após o diagnóstico da doença?

Perguntas auxiliares para clarear dúvidas durante a entrevista:


- Você mora aonde, qual sua cidade?
- Como a sua família é composta?
- Você trabalha? O que faz?
- O que costumava fazer nas horas de lazer?
60

Anexo B – 1ª Entrevista

1ª Entrevista : Sujeito 1
Data: 03-05-2006
Horário: 14:30

Dados do Prontuário
Idade: 67 anos Sexo: Feminino Estado Civil: Casada
Religião: Católica
Ala: Nossa Senhora das Graças
Diagnóstico: CA Meta Óssea / HAS Área: Oncologia

Apresenta: Úlcera de pressão: grau II


Risco de Fratura no úmero direito e fêmur esquerdo

Evolução Clínica: Neo mama e Meta óssea difusa

Entrevista

Legenda:
P= pesquisadora
E= entrevistado

P1 - Por qual motivo a senhora esta internada aqui no Hospital?


E1 - Sei. Problema de Ossos. Eu creio que seja câncer nos ossos.
P2 - Mas a Senhora não tem certeza?
E2 - Eu tenho quase certeza porque eu fiz quimioterapia. Três sessões de quimioterapia e acho
que vou ter que fazer mais e vou faze radioterapia, estou fazendo fisioterapia.
P3 - Já fez alguma sessão?
E3 - A radio eu ainda não fiz. E a quimioterapia eu já fiz três sessões lá no CEPON.
P4 - E aqui no Hospital de Caridade ainda não?
E4 - Aqui não, aqui eu não sei se o Dr. ............ vai autorizar para eu fazer aqui ou fazer lá. Mas a
Radioterapia vai ser aqui e a fisioterapia também estou fazendo aqui todos os dias. Começou está
semana parece... e pelo menos eu penso que seja. E porque eu tive muitas fraturas, na perna nos
dois braços, fratura assim sem eu fazer nada, nas duas clavículas e eu não sei mas acho que estou
com um ou dois trincados na bacia.
Eu acho que sim.
P5 - Mas a senhora disse que estava no CEPON, mas porque a senhora veio para o Hospital
de Caridade?
E5 - Lá é uma clínica, lá só faz o tratamento e o Dr. ............ achou melhor eu vir para cá, porque
ele disse que aqui tinha tratamento e eu moro longe.
P6 - Onde a senhora mora?
E6-Eu moro em Sombrio.
P7 - É natural de Sombrio?
61

E7 - Sou. E achou melhor eu vir para cá, porque não dá para vir todo o dia, é muito difícil. Ele
disse para eu baixar aqui umas quatro semanas para fazer esta radioterapia, os exames
necessários, para ver se... ele me disse que quer me botar de pé.
P8 - Há quanto tempo a Senhora está aqui no Hospital?
E8 - Aqui neste?
P9 - É.
E9 - Eu vim dia 17 de.... agora nos estamos em maio, né? É maio? Dia 17 de abril.
P10 - Hoje é dia 3 de maio.
E10 - É hoje é 3 de maio... mas eu, aqui comigo está tudo bem, eu não tenho nada não tenho
reclamação nehuma.
P11 - E em relação a hospitalização como a Senhora se sente?
E11 - Tudo muito bem, muito bem tratado, muito bem, não tenho queixa nenhuma. O médico é
um exemplo de médico, os enfermeiros, todo o pessoal aí, as companheiras de quarto, todo
mundo.
P12 - Como a Senhora se sente desde que internou até o momento?
E12 - Eu me sinto melhor.
P13 - Como assim?
E13 - Eu me sinto melhor porque até agora eles tinham até medo de botar a mão em mim né.
Medo de quebrar. E agora não, dois guris me pegam botam aqui, no lençol, pegam pela perna
pelo aqui. O J. (enfermeiro da ala) mesmo sozinho me pega bota aqui... hehe. Então eu acho que
risco de quebrar ainda tem, mas o Dr. .......... disse que é difícil, mas que pode ocorrer.
P14 - Que agora está melhorando?
E14 - Tá, ta mais forte, eu fiz muito tratamento desde o começo fazendo tratamento toda a vida,
toda a vida.
P15 - E a Senhora sabe como foi diagnosticado está doença, que a Senhora acha que é
câncer?
E15 - Eu comecei com dor na coluna, porque eu já fiz tratamento para câncer em Porto Alegre,
tirei um seio.
P16 - Mais ou menos há quanto tempo?
E16 - Faz 25 anos e fazia 23 anos que eu estava lá na PUCRS e a Dra. Veio conversar comigo e
disse... A Senhora tá curada. Eu disse... é espero que sim, também 23 anos Dra. Ela disse, não lhe
deram alta?Não, mandam eu “vim” todo ano, eu venho. Daí, por nós tá liberado, tá mais eu disse
e essa minha coluna, tá me doendo muito?Dói muito também assim no meio dos ossos? Mas
ainda comecei a brincar com ela... disse isso é doença de velha mesmo né Dra.. Ela disse não, não
é não. Mas aí vim fiquei acho que um ano em casa bem tudo, só com dor na coluna, na certa é um
bico de papagaio e não sei o que. E depois eu peguei e começou a me doer muito está perna
direita, muito dor. Fiz fisioterapia lá em Sombrio, não resolveu nada e depois eu tava em casa
sentada, quebrei este braço aqui sentada no sofá (braço esquerdo). Aí vim para Araranguá e eles
mandaram eu vir outro dia para ...só imobilizar e aí deixaram.
P17 - A Senhora colocou gesso?
E17 - Não, só imobilizaram. Depois e pra mim no outro dia, que era domingo né? E eu “vim”
segunda-feira para eles “engessá” e fazer raio-x, quando eu fui subir no carro para vir para
Araranguá eu quebrei a perna, só no botar em cima do carro a perna, ela partiu, aqui em cima. E
aí já veio a ambulância para me levar para Araranguá, porque de carro não dá para vim. Fiquei
treze dias no Hospital de Araranguá, fiquei mais trinta e dois ou trinta e três no Hospital
Florianópolis, onde eu fiz a cirurgia.
62

P18 - Mas lá em Araranguá a Senhora recebeu.....


E18 - Eu recebi atendimento. Todo o atendimento.
P19 - Mas o que eles lhe falaram lá?
E18 - Não, não falaram nada. Só disseram que meus ossos estavam muito fracos.
P20 - E como a Senhora veio para o Hospital Florianópolis, de Araranguá?
E20-De Araranguá foi o meu médico de lá o Dr. ........, não o Dr. ...... , que tinha um amigo dele
que trabalhava no hospital Florianópolis ortopedista que perguntou se eu queria ir para
Florianópolis. Eu disse... não doutor eu queria ir para Porto Alegre que a minha gente mora tudo
lá, e lá eu já estou acostumada. Mas ele disse que em Porto Alegre, nós não encontramos vaga...
daí, eu disse “tá”, se acha que é melhor eu ir para lá eu vou. Ele disse meu amigo é uma pessoa
muito boa e tal, e é um bom ortopedista. Aí ele pegou e disse “então ta”, aí pegou ligou para ele.
Ele disse então pode mandar ela. Eu vim para cá no dia 3 de novembro de 2001...2004...2005,
não 2004, ai não lembro. É foi 2004 sim. Dia 3 de novembro eu vim par o Hospital Florianópolis,
é o Dr. ........ que me tratou ali, ortopedista.
E perguntei para ele no CEPON. Daí ele mandou o Dr. ........... (médico atual – oncologista) ir lá
conversar comigo. O Dr. .......... foi lá conversou comigo tudo, disse que ia passar para o CEPON
pra mim fazer uma avaliação não sei o que.
P21 - Mas não lhe falaram nada?
E21 - Não. Eu perguntei. Disse Dr. eu não gosto de ser enganada, eu tenho muito “abuso” destas
coisas de “tá” enganando.O que eu tenho nos meus ossos é câncer? É ele disse assim, é
infelizmente eu acho que sim. Acho ou tem certeza? Mas pelo tratamento que eu estou fazendo,
eu não sou boba Dr., eu já fiz uma vez. Posso não ter muito estudo, mas não sou tão burra assim.
Aí ele disse assim: “é eu sei que não, você é muito inteligente”. É, inteligente com certeza eu sou,
mas a gente mais ou menos pelo que já passou né (sic). E volta de novo a passar é porque o caso
não é muito bom. Mais eu não tenho queixa de lá, nossa fiz muita amizade lá. Foi todo muito
bom lá.
P22 - Mas então a Senhora teve três internações?
E22 - É, três... em Araranguá, no “Florianópolis” e agora aqui. E o Dr. .......... disse que vai ficar
aqui comigo uma porção de tempo, eu não sei quantos dias. Eu disse para ele: tô boa de fugir.) (tb
pensamento junto com a frase abaixo) Ele mas a Senhora não pode fugir.
P23 - Ficou com vontade de fugir?
E23 -... (silêncio) Mas tá tudo muito bem, tá o tratamento tudo, o atendimento (e afetividade).O
pessoal “tudo” aí muito gente fina mesmo, não tenho nada o que reclamar, nada mesmo.
P24 - E a Senhora hoje tá só deitadinha hoje?
E24 - Não eu já tive na cadeira ali. Depois já tava com muita dor nas costas e daí peguei e vim
para a cama, mas a dor nas costa ainda continua e a depressão... eu cai em depressão desde que ...
até que eu estava bem animada no começo da minha doença.
P25 - Tava animada?
E25 - Tava, eu não tinha assim depressão nada. Eu fazia tudo com a maior naturalidade. Depois
de cada três meses (sic) faleceu uma filha minha das três a mais nova, ai entrei em depressão...
(paciente começou a chorar) aí não prestou mais... (silêncio)... deu infarte fulminante, 38 anos,
daí me revoltei fiquei muito revoltada. Entrei em depressão e agora não sei. Tem dia que eu tenho
mais vontade de morrer do que viver, daí me lembro que tenho outros filhos e marido e meus
netos que eu adoro... (silencio)... é isso aí. (continua chorando e mais silêncio).
P26 - O que a senhora considera como depressão?
E26 - Como?
P27 - Assim, tristeza....
63

E27 - É tristeza, desânimo. Tem dias que eu choro dia todo, a noite toda. Tem dia que eu fico que
não tenho vontade de nem conversar. Eu por mim... eu fiquei muito revoltada. Agora não, agora
eu ando mais calma porque conversando com as psicólogas e outras pessoas que vem conversar
com a gente tudo né. Mas não tem nada que me tire da minha cabeça, nada, nada. Eu disse para
Dra: Dra. a senhora desculpe a minha expressão, disse para uma psicóloga, mas nada o que você
vai me dizer vai adiantar. Porque eu me sinto assim, não tem palavras, não tem... ela disse
assim.. “eu sei que não tem, mas a Senhora tem que pensar na Senhora também, a Senhora tem
outros filhos também”. Eu adoro meus netos, meu marido é muito... bom, faz 46 anos de casada,o
já deu para ver que nós “se aturamos” né? Aí ela disse, então. Eu disse: Não, é uma falta assim
que não tem volta... (silêncio). Deixou a menina com 12 anos, marido, eu me revoltei, eu disse...
Meu Deus, por quê eu fiquei toda quebrada em cima de uma cama, porque foi minha filha,
porque não fui eu? Me revoltei mesmo, Deus que me perdoe, mas eu fiquei.... revoltei. Mas Deus
queria que “era ela”. Mas disse não, por favor né, fazer o quê, ninguém vai se não chegar a hora
né?
P28 - E quantos filhos a Senhora têm?
E28 - Eu tenho quatro filhos meu mesmo e eu criei um neto, vai fazer 23 anos agora dia 30 de
maio. Ele mora em Porto Alegre, meu neto.
P29 - A Senhora têm uma filha que mora aqui?
E29 - Tem uma que mora comigo em Sombrio.
P30 - Quem mora com a Senhora em Sombrio?
E30 - É esta que está aqui comigo.
P31 - É a mais nova, a mais velha?
E31 - É a mais velha.
P32 - Então mora a Senhora, a mais velha...
E32 - E duas meninas dela e mais o meu marido e o marido dela que trabalha em Porto Alegre,
mas final de semana ele vem. O meu neto trabalha em Porto Alegre.
P33 - Quantos netos a Senhora têm?
E33 - Sete. Cinco meninas e dois meninos. De filho homem eu tenho só um, o mais novo. E o
neto que eu criei, que pra mim é igual filho.
P34 - Então é a mais velha...
E34 - É tem mais duas, mais uma que mora em Porto Alegre e a outra que morava lá também,
que faleceu. (silêncio)
P35 - E em relação ao adoecer, o que a Senhora acha que mudou na sua vida antes e depois
do diagnóstico?
E35 - Para mim não mudou nada, eu já mais ou manos sabia que podia acontecer isto.
P36 - Como assim?
E36 - Eu tinha impressão assim que ia me acontecer mais alguma coisa. Eu sempre falei lá em
casa. Eu disse: “olha eu não vou ficar só por esta não, vai me aparecer outra”.
P37 - Por esta qual?
E37 - Da doença... sei que eu tive. Eu perguntei para o medico se era seqüela que ficou. Ele disse
que não, disse que era outra coisa, que acontece mesmo.
P38 - Quanto tempo se passou entre a cirurgia do seio e agora essa doença?
E38 - Faz agora faz 25, vai fazer 26, em agosto.

Desliguei a gravação e depois recomecei.


64

A paciente começou a chorar quando desliguei o gravador e eu perguntei o que havia


acontecido que ela estava triste quando cheguei ...
E39 - Chorando a paciente começa a relatar:... a gente tem que estar se mostrando para as gurias,
para todas, para as filhas é uma humilhação, muito ruim. Tem que dá banho na gente, colocar a
“comadre”. E eu começo a pensar se isso é vida.
Sabe nem o meu marido já me viu nua, nem no escuro e agora eles pega a gente, coloca a coisa
aqui... eu acho uma humilhação. É muito diferente eu nunca... nunca, nunca, agora tem que os
filhos limpa a gente e lava e troca. , faz favor... é muito triste.
P40 - Não está conseguindo caminhar e nem mexer a perna então?
E40 - Mexer eu mexo e caminhar não. Eu tenho medo, pode causar outras fraturas. O Dr. .........
disse que se eu quisesse podia tentar, “com duas pessoas te segurando tenta”. Eu até podia tentar
porque sou meio teimosa, mas tenho medo, pois se acontece de quebrar e eu vou sofrer mais, vou
dar mais trabalho para os outros ainda, então me deixa sossegada no meu canto.
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Anexo C – 2ª Entrevista

2ª Entrevista : Sujeito 2
Data: 10-05-2006
Horário: 14:00

Dados do Prontuário
Idade: 72 anos Sexo:Masculino Estado Civil: Viúvo
Religião: Católica
Ala: Nossa Senhora das Graças
Diagnóstico: aneurisma aorta abdominal e cirurgia RM coronariana
Área: Cirurgia Vascular e Cardiologia

Evolução Clínica: Revascularizado há 8 anos, aneurisma aorta abdominal 6,2 cm, cirurgia
cardíaca.

Entrevista

P1 - Por qual motivo o senhor está no hospital?


E1 - Eu estou aqui porque comecei a sentir uma dor, tinha problema de “ox...”.
P2 - De que?
E2 - Eu fiz uma operação há oito anos atrás e quando foi agora eu peguei senti uma dor daqui
para baixo, da cintura para baixo. E há uns três anos o médico me disse que eu tinha problema de
“orta”, mas perante a minha idade não era bom “operá”.
P3 - Certo.
E3 - Quanto foi agora apareceu aneurisma, quase estourando. Quando eu vim às pressas para
operar.
P4 - Aqui no Hospital de Caridade.
E4 - Aí, eu operai aqui dia 21. Mas aí apareceu um problema, que acusou que estas três pontes
que eu tinha trocado, elas estão querendo estourar. Então eles estavam fazendo a previsão para
ver se eu podia operar, ou não. Então hoje que eles estão vendo o resultado dos exames.
Terminaram os exames hoje. Amanhã ou depois de amanhã que eles irão me dizer, mas uma Dra.
já me adiantou que acha que vai operar semana que vem.
P5 - Então o senhor veio para fazer a operação no aneurisma....
E5 - Foi às pressas.
P6 - E agora descobriram que...
E6 - Que estas três veias aí tão presas querendo arrebentar.
P7 - O Senhor falou que já trocou elas?
E7 - Foi, troquei elas a oito anos atrás, vai fazer dia quinze de setembro, dia quinze de agosto vai
fazer oito anos que eu troquei. Fiz lá no Regional.
E agora lá não tinha lugar, o único lugar que tinha que ser as pressas era aqui. Então eu operei
aqui.
Só que essa foi muito pior que a outra.
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P8 - Esta? Porque?
E8 - Ah essa teve, não sei... o que aconteceu. A outra eu não tive... essa eu cheguei a ficar
amarrado.
P9 - Ficou amarrado. O Senhor sabe por quê?
E9 - A gente assim... não sabe dizer ao certo, nessas horas a gente está fora de si. Não guarda
nada. Só sei que eu gritava muito, metia os pés em tudo, aí eles me amarraram.
P10 - Isso foi depois da cirurgia?
E10 - Isso foi depois da cirurgia.
P11 - Quando o senhor estava no quarto?
E11 - Quando estava na UTI.
(Acompanhante): - Ele enfartou, depois da cirurgia ele teve um enfarto. Foi onde ele teve a dor, a
dor forte, ele começou a bater.
P12 - Mas tava tomando alguma medicação?
E12 - Eu não me lembro de nada, quando a gente tá na UTI, a gente ta morto né. Na UTI entrou
lá, dormindo. Só sei que na primeira operação não houve isso que houve agora. Não houve esse
“problema” de eu ficar, eu via coisa do outro mundo.
P13 - O Senhor via coisa do outro mundo?
E13 - É, na minha imaginação... eu via coisa que eu nem posso te dizer, eu cheguei a meter os pés
na Dra., daí me amarraram.
P14 - O Senhor sentia dor?
E14 - Eu não sei lhe explicar, eu não sei, eu não estava em mim. Eles acham que era por causa da
morfina. Só que eles falam pra gente, mas quando a gente ta operado tudo que vem falar, porque
demora, não sabe mais nada, a gente não guarda.
P15 - Quando? Lá?
E15 - Em qualquer lugar. Quando você não está bem, não adianta porque você troca as coisas...
você sonha, você delira, você tem tudo. Quando a operação não saí boa, não é bem sucedida, é
sofrimento.
P16 - Mas a operação do aneurisma foi boa, o que aconteceu foi o enfarto? Foi durante ou
foi depois da operação?
E16 - Não. Foi durante a operação
Acompanhante: - Foi depois do cateterismo. Eles fizeram o cateterismo na UTI.
-Exato, foi na UTI mesmo. Foi operação de urgência.
P17 - Quanto tempo faz que o Senhor veio para cá?
E17 - Foi dia 21 que eu cheguei aqui.
E aí já entrou direto para o centro cirúrgico?
- Cheguei aqui numa sexta-feira. (Acompanhante: - Foi operado no sábado de manhã) Foi. Foi
porque foi de urgência, na... Teve que operar que tava querendo sangrar. Se ela estoura eu vou...
P18 - Como foi descoberto o aneurisma?
E18 - Foi descoberto na hora que... Tinha feito um exame lá em Laguna, que eu um dia tava lá na
casa deles (filho e nora - acompanhante) e eu senti aquela dor aqui, daqui para baixo. E meu filho
já tinha esse problema de aneurisma aqui, passou muito mal de uma. Aí ele telefonou para o
..........., que já era o meu médico. Aí o Dr. ............ disse: “se o teu pai está nesta situação não
perde tempo, trás imediatamente, o mais rápido que puder”. Então só acabamos de almoçar e
viemos embora.
P19 - Então, vocês vieram de lá no mesmo dia, dia 21?
E19 - Na mesma hora. De manhã cedo já tiveram que operar.
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P20 - Quanto tempo o Senhor ficou na UTI, lembra?


E20 - Uns três dias, não foi? (perguntou para a acompanhante). Não me lembro.
P21 - E depois veio para o quarto?
E21- Vim para o quarto, só que aqui é bom. Só que a minha fraqueza é muito grande né. Eu não
comia, já tava dias sem comer, só abaixo de remédio. A língua e a boca parece que tava tudo
cheio de coisa, não comia. (chora)
P22 - A língua cheia de coisa, como assim?
E22 - Não tinha gosto, a comida não entrava. Parece que estava entupido. Mas não era, era o
“cascão” do remédio. Isso aqui fura uma faixa de quinze a vinte vezes por dia a barriga, aqui só
comprimido, comprimido, que nem se fala. Tem dia que tomo mais de vinte. O que tomo de
“força” de comprimido por dia....
P23 - E o senhor sabe quais os comprimidos que o Senhor está tomando? Para quê?
E23 - Humm, eles não dizem. Como eu vou te dizê....uns é para pressão, infecção, pra dores, é
um monte de comprimido, a gente nem sabe.
P24 - E o senhor agora está conseguindo se alimentar?
E24 - Pouquinho, só porque agora eu como muita fruta. Mas, alimentação que eu posso, eu não
posso comer. Por exemplo, se eu quiser comer um pastelzinho quente, eu não posso. Se eu quiser
comer....só fruta, fruta, fruta, fruta.
P25 - Essa é a dieta que eles lhe deram?
E25 - É, que eles dão é tudo “insosso”, tudo. A comida vem e volta, vem e volta, vem e volta. A
única coisa que eu como aqui é só mamão, laranja, pêra.
P 26 - Mas são comidas do hospital ou que trazem de fora?
E26 - Não, não, ele vem também, mas eu mando buscar para mim. Mas eu não posso reclamar
deles, não. Vem tudo, eles mandam muito mamão. Se eu pedir eles mandam. Hoje ela ainda disse
que, se eu quiser alguma coisa e só pedir que a gente manda. É, então eu tenho ela (nora) aqui do
meu lado, de vez em quando tô “beliscando”, um pouquinho de laranja, de mamão.
P27 - Qual o tipo de tratamento que o senhor está recebendo agora?
E27 - Já tomei soro, dizem que eu tomei sangue, que eu não me lembro... ela (nora) sabe. Ontem
eu fiz raio-x. Eles tão fazendo alguns exames para ver se eu tenho possibilidade de operar, vão
esperar alguns dias para eu ficar mais forte.
P28 - O senhor contou que já foi operado antes, antes dessa cirurgia da aorta, a cirurgia do
coração?
E28 - Isso foi a oito anos atrás, internei no São José, no Regional.
P29 - E como foi esta outra internação?
E29 - Aquela foi boa. Foi uma operação, que eu vinha fazendo tratamento, então deu tempo. E
essa não deu tempo de nada. Essa eu me relaxei também, porque fazia dois anos que eu não via o
meu médico. A outra não, a outra eu já estava mais prevenido, tava forte. Mas também não tava
tão forte. A outra é porque tinha perdido a minha mulher com câncer e eu sofri muito (começou a
chorar).
P30 - O Senhor perdeu a sua esposa, quando fez a cirurgia?
E30 - Foi. Ela morreu dia cinco de agosto e eu operei dia 15 agosto. Eu tive dois, três enfartos.
Um atrás do outro.
P31 - E aí lhe levaram para o hospital?
E31 - Não, aí eles me trouxeram de madrugada, me deixaram dormir dois dias na cadeira. Aí no
terceiro dia, eles tiveram que me operar. Mas eu tava mais fraco do que agora. Agora eu tava
forte. Eu brincava com eles, eu fazia exercício, fazia tudo, eu não tinha nada. Só sentia dor
aquele dia. Só que estava vindo com um problemazinho, que eu dizia para eles: “ô eu não tô
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bem”. E que eu não estava fazendo as fezes bem, nem urinando bem. E hoje eu não estou
urinando bem e nem fazendo as fezes bem. Não tô.
P32 - Agora não está?
E32 - Não, muito mal. O que, depois que tô aqui, eu fiz três vezes. Eu tenho cólica, vou ao
banheiro, mas não consigo fazer nada. À noite eu tenho medo e mando botar fralda e mesmo que
nada. (está com sonda)
P33 - O Senhor já conversou com o médico sobre isto?
E33 - Já, o resultado que eles estão fazendo, tudo.
P34 - Certo. E como o Senhor está se sentido hoje, em relação à hospitalização?
E34 - Acho que boa, não posso reclamar de nada, não.
P35 - E comparando a sua hospitalização de agora com a de oito anos atrás, o Senhor vê
alguma diferença?
E35 - Eu acho que a outra foi mais fácil do que está, a outra eu sofri menos do que esta. Só que
essa eu fui me restabelecer de ontem - dontem para cá. De três dias para cá eu melhorei muito.
P36 - Em que sentido?
E36 - Assim, de mais alegria (falava com pouco entusiasmo, muito lento e de cabeça baixa).
Pensamento mais, que quando a gente tem família (chora muito), quando a gente têm família tem
pensamento.....(silêncio).
P37 - Que pensamentos o senhor têm?
E37 - Saudades dos filhos. (chorando)
P38 - Quantos filhos o Senhor têm?
E38 - Eu ainda tenho uma menina com um ano e sete meses. (começa a chorar mais)
P39 - O Senhor têm uma menina de um ano e sete meses, é dela que o senhor sente mais
falta?
E39 - É.... (silêncio). Ela é muito grudada comigo.
P40 - Quantos filhos o Senhor tem mais, além dela?
E40 - Ah.. eu tenho o marido desta, que me ajuda, me leva para tudo quanto é lado e os outros
você sabe né, tudo mundo trabalha longe.
P41 - Quantos ao todo?
E41 - Ah.. eu tenho uns doze. Que dizer todo mundo tem seus problemas, trabalha tudo. Tem que
estar se locomovendo de lá para cá. Está aqui que me “agüenta” sempre, é meu filho e ela. Ela
fica dia e noite aqui.
P42 - O Senhor tem parentes aqui em Florianópolis?
E42 - Tenho, mas o problema é o seguinte: eu sou separado da minha primeira mulher quarenta e
dois anos, então são seis filhos, só tem um que não me larga, os outros não....não dão....não tem
relacionamento nenhum. Casei-me com uma moça que tem vinte e cinco anos, tenho uma filha,
hoje com 26 anos, com essa que morreu de câncer, depois eu me juntei com essa outra que tenho
a menina.
P43 - Então o Senhor está com outra esposa?
E43 - Não, eu estava junto com esta outra, tive esta menina, mas não deu certo.
P44 - E o Senhor fazia o que antes, trabalhava?
E44 - Eu era aposentado.
P45 - Há quanto tempo?
E45 - Faz quarenta....entre encostado e aposentado faz trinta e oito anos.
P46 - E o que o Senhor gostava de fazer antes?
E46 - Ah... eu trabalhava na Reunidas, eu inaugurei todos os roteiros da Reunidas. Eu era
motorista, viajava toda a noite. Só à noite, naquele tempo não tinha asfalto.
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P47 - O que o Senhor pensa que mudou antes e agora?


E47 - O que mudou? (começou a chorar) antes eu passeava e acabou... depois de tanto trabalho,
acabou. Uma casinha, tenho um carrinho que dá de andar, mas acabou o prazer.
P48 - Porque o Senhor acha que acabou?
E48 - Embora que eu saia daqui eu não vou poder fazer mais nada. Muito velho já né? Setenta e
três anos vou fazer setenta e três anos. O que eu devo esperar, além disso.
Eu não bebo, não fumo, a minha vida era pacata. Tudo é bom, quando se tem saúde.
P49 - O Senhor está fazendo tratamento...
E49 - É Deus é que sabe, só Deus é que vai dizer o que vai ser.
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Anexo D – 3ª Entrevista

3ª Entrevista : Sujeito 3
Data: 10-05-2006
Horário: 15:50

Dados do Prontuário
Idade: 21anos Sexo: Masculino Estado Civil: Solteiro
Religião: Evangélica Ala: Nossa Senhora das Graças
Diagnóstico: ICC Congênito
Área: Cardiologia

Entrevista

P1 - Por qual motivo você está hospitalizado?


E1 - Porque eu vou ter que operar o coração. Vou colocar válvula metálica e aproveitar, o médico
vai aproveitar a anestesia e trocar a bateria do marcapasso.
P2 - Desde quando você está com o marcapasso?
E2 - Desde os 15 anos, que eu já fiz a cirurgia.
P3 - Fez cirurgia aonde?
E3 - Em Curitiba.
P4 - Você é de Curitiba?
E4 - Não. Sou da Serra, de Alfredo Wagner. Fica entre Rancho Queimado e Bom Retiro.
P5 - Onde você mora atualmente?
E5 - Eu moro em Forquilhinha.
P6 - Faz quanto tempo?
E6 - Já faz cinco anos.
P7 - Você foi para Curitiba quando? Quanto tempo ficou lá?
E7 - Eu fui para fazer a cirurgia. Fiquei no máximo uns dez dias.
P8 - Ficou internado?
E8 - Não. Fiquei na casa da tia, nas correria para fazer alguns exames, aí teve a internação, daí eu
fiz a cirurgia e depois fui liberado.
P9 - A cirurgia foi agendada então?
E9 - Não, daí, fiquei mais uns dias na casa da tia e depois fui embora.
P10 E está cirurgia que você vai fazer agora foi programada ou você entrou pela
emergência?
E10 - Foi programada. Foi, porque eu estava em casa uns dias ruins, eu tinha pegado uma água,
que eu fui fazer umas entregas e daí acabei ficando uns dias ruim.
P11 - Pegou chuva?
E11 - Peguei. Daí fui na emergência do Regional, disseram que era pneumonia. Daí a mãe se
preocupou. Fiquei uns dias em casa, não comia, só vomitava direto. Só parava sentado no sofá.
Aí um dia ela pegou a Dra., consultou e ela disse que não era nada disso. Daí era onde a válvula
em vez de “bobear” o sangue pelas veias, tava jogando para o pulmão.
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P12 - E quanto depois do diagnostico de pneumonia você levou para ir consultar?


E12 - Não lembro. Fiquei uns quinze dias em casa.
P13 - E depois da consulta você veio para o Hospital de Caridade?
E13 - Daí foi a médica que trouxe eu para cá, me internou direto.
P14 - Faz quanto tempo que você está aqui no Hospital?
E14 - Faz uns vinte dias. Fiz uma bateria de exames e último exame que fiz apontou que tinha
que ser trocada. Tem que colocar a válvula metálica e essa nunca mais troca.
P15 - Você já conversou com o médico sobre isto?
E15 - Já.
P16 - O que ele falou?
E16 - Que é uma cirurgia que vai demorar umas cinco, seis horas. Eu já fui até no consultório
dele.
P17 - A cirurgia será quando, você já sabe?
E17 -Sexta-feira.
P18 - Então, já está marcado?
E18 - É, sexta de manhã.
P19 - Já foi lhe explicado os procedimentos pós e pré– cirúrgicos?
E19 - É, eu vou ficar depois da cirurgia de três a quatro dias.
P20 - Então você ficou sabendo que ia ter que operar aqui no Hospital e quanto a bateria do
marcapasso?
E20 - A bateria, está acabando a durabilidade dela.
P21 - Ela têm um período de durabilidade então. Você sabe de quanto tempo?
E21 - Ela de fabrica vem com cinco anos e ela já vai fazer quase sete anos. Ele disse para mim,
que ele já trocou esse tipo de bateria com sete anos já.
P22 - Você nunca trocou então?
E22 - Não vai ser a primeira vez. Bateria de marcapasso é que nem caixa preta, marcava até o dia
da última consulta, até o que fizeram.
P23 - Você já conhecia?
E23 - Não, ele botou lá o negócio e deu o último dia que eu fiz exame, a data certinha.
P24 - Aonde?
E24 - Lá no consultório dele. Aí mostrou tudo a última data, o que fizeram, se mexeram, tudo.
P25 - Mas como fizeram isto?
E25 - Eles colocam um aparelho aqui (mostrando a barriga) e aponta no computador. Que nem
uma caixa preta de avião.
P26 - E há quanto tempo faz isso?
E26 - Foi terça, eu fui ao consultório dele.
P27 - E a tua família quem são?Com quem você mora?
E27 - Eu moro com meu pai, minha mãe e minha irmã mais velha (24 anos).
P28 - Como você em relação a sua hospitalização?
E28 - Sei lá, tem que ter paciência né. Ta meio ruim né, tá longe de casa.
P29 - Sente saudades de casa?
E29 - Bastante, né.
P30 - O que mais você sente falta?
E30 - A liberdade que tinha.
P31 - Liberdade?
E31 - Ah, ia para tudo que é lugar. Saia direto.
P32 - O que você fazia?
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E32 - Ia para o banco, saia com os amigos, não parava em casa.


P33 - E agora esta parado no hospital.
E33 - De castigo aqui.
P34 - Você estava trabalhando, estava fazendo alguma coisa?
E34 - Eu ajudava meu pai.
P35 - Fazia o que?
E35 - Ele tem um mercadinho, uma mercearia.
P36 - Trabalhava no que?
E36 - Ajudava em tudo.
P37 - Estava fazendo o que quando ficou doente?
E37 - Estava entregando compras, foi onde eu peguei água.
P38 - Você estava de moto?
E38 - Estava de carro, mas choveu. Não foi uma entrega só não, foi cinco.
P39 - E aqui no hospital, que tipo de tratamento você está recebendo?
E39 - Só medicamento por enquanto.
P40 - Que tipo de medicamento você sabe?
E40 - Só sei que um é para a pressão, tem uma injeção na barriga, tem um rosinha e umas
gotinhas para aliviar a tosse.
P41 - E como está tua alimentação?
E41 - Tranqüila. To meio enjoado já de comida de hospital.
P42 - E o sono?
E42 - Mais ou menos (aponta para o paciente da frente).
P43 - Não te deixa dormir?
E43 - Oh! Berra a noite toda. Multiplica por três do que tá agora. Esse dias fui dormir era de
manhã, só ouvi um barulho, quando vi era a copera botando o café, aí já veio a enfermeira com o
remedi, aí já me acordei. Berrava a noite inteira.
P44 - Ele esta a quantos dias aqui?
E44 - Já faz uma semana.
P45 - E ele ta assim a uma semana?
E45 - Faz uma semana.
P46 - E você não consegue dormir direito a uma semana?
E46 - Não, mas aí a gente da um jeito para dormir né, bota o travesseiro em cima e se vira.
P47 - Você está tomando medicação para dormir?
E47 - Não.
P48 - Você falou que sente falta de casa, falta de sair. O que você acha na tua vida antes e
agora?
E48 - Oh! Vi cada coisa aqui, que mudou tudo né.
P49 - Você viu cada coisa?
E49 - É morreu um bem aí. O desespero dele na hora, tudo. Presenciei tudo, a pessoa muda.
P50 - Como assim?
E50- Sei lá. Faleceu às 6h da manhã. Começou às três horas da manhã e as seis faleceu. Eu tava
aqui sentado como eu tô. A tava tentando enfermeira, veio o médico de plantão, tentaram da uma
injeção na veio e ele: - “Meu Deus do céu, meu Deus do céu, nossa senhora...”. Sentou na cama,
com as mãos assim (mãos na cabeça), caiu duro na cama, ficou roxo e enfermeira saiu correndo,
veio a equipe, mas nada pode ser feito.
P51 - Isto te chocou?
E51 - Oh... a pessoa muda quando vê isto.
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P52 - O que você acha que mudou?


E52 - Se lá né. A gente tem que ser mais simples, né. Não adiante ser egoísta, o cara nasce sem
nada, quando morre não leva nada. Me deu um desespero. Quando eu cheguei aqui ele tava
conversando aí, até fiz amizade com ele, né.
P53 - Quando foi isto?
E53 - Foi sexta passada.
P54 - E como você está sentindo para a cirurgia?
E54 - Tô tranqüilo. Depois da conversa que eu tive com o médico, a gente se acalma um pouco.

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