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CAPÍTULO 2

O CRISTO DE SANTA TERESA

Introdução
A experiência viva de Cristo acha-se no centro da espiritualidade de Santa Teresa de Jesus.
Os estudos realizados recentemente durante o IV Centenário da morte da Santa de Ávila e o
balizado testemunho do magistério de João Paulo II a respeito colocaram em realce a
centralidade do mistério de Cristo na mística teresiana. É ótimo que os estudiosos o tenham
feito. Ao acentuar o cristocentrismo encontra-se o fecho de abóbada de toda a espiritualidade
teresiana; que é assim libertada de toda a suspeita de misticismo exotérico e toda tentativa de
interpretação intimista. É claro que a oração permanece a mensagem central da Santa de
Ávila, a sua especialidade carismática na Igreja; mas não se pode esquecer que a oração é uma
procura de Cristo e um diálogo com Ele, para tornar-se imitação e para desabrochar, por dom
gratuito de Deus, na experiência mística de “vida em Cristo” que seu lógico desfecho no
mistério trinitário. A oração portanto é toda relacionada a Cristo, à comunhão com Ele, à
transformação nEle. O caminho da oração é um lento amadurecer da conformação a Cristo.

Se nos é consentido falar de uma “cristologia teresiana”, é somente na medida em que a


experiência de Teresa a respeito traz também um profundo conhecimento do mistério de
Cristo; mas os teresianistas preferem falar de uma “cristologia existencial” ou até de uma
“cristopathia”, para acentuar o fato da vida, da experiência, do viver em Cristo, da penetração
vital do mistério de Jesus.

A apaixonada pesquisa suscitada neste setor da doutrina teresiana é bem-vinda e oportuna


neste momento. A questão sobre Jesus acha-se no centro da pesquisa bíblica, da
hermenêutica, da teologia, da espiritualidade. Certamente Teresa de Jesus não pode resolver
os graves problemas dos teólogos, não oferece a chave da hermenêutica bíblica. Mas Teresa
de Jesus é testemunha de Cristo; fala-nos com competência da sua experiência a respeito. Fala
também com a paixão de uma vida vivida com Ele e por Ele; com a profundidade de quem
“viu” o Cristo e o “experimentou” na própria existência. O seu testemunho possui o toque
original de uma mulher que fala de Cristo com a sensibilidade que nela suscita o fascínio de
Jesus. E é a partir de Cristo que Teresa nos faz compreender o sentido da existência cristã, o
valor do homem, o sentido da Igreja.

A acentuação teresiana na cristologia e na cristopathia é a divina-humanidade do Senhor,


como ela o compreendeu na sua apaixonada procura juvenil, como a experimentou na sua
maturidade mística.

Queremos traçar as linhas essenciais desta pesquisa e desta irrupção mística para
compreender quão profundo seja no pensamento teresiano sobre a vida espiritual o cunho
cristológico.

1. Modernidade da experiência teresiana


Seja-nos permitido colher logo a modernidade de Teresa na sua cristologia existencial. E
modernidade neste campo não quer dizer o novo mas o verdadeiro, o tradicional e o sempre
jovem sentido da Igreja, a autêntica profissão de fé.

Não é difícil colher na visão teresiana de Cristo uma série de convergências doutrinais que
agora queremos apenas esboçar.

As fontes do conhecimento de Cristo para Teresa permanecem os Evangelho e as Cartas de


São Paulo. Apesar do seu conhecimento ser muito fragmentário a respeito, ela compreendeu o
essencial.

A. Na linha da revelação
Na linha dos Sinópticos, a cristologia teresiana é a procura e a complacente comunhão com
Jesus de Nazaré como aparece nos evangelhos, na sua qualidade de Mestre, na sua
inconfundível humanidade que, como se verá, foi determinante para salvação e a libertação de
Teresa como mulher. Um ponto de referência que se transmuda também numa relação de
seguimento, de imitação, de escuta que o torna próximo, contemporâneo através da Eucaristia
e a oração à experiência dos discípulos.

Na linha joanina Teresa soube colher alguns traços característicos do quarto evangelista: o
seu recurso às expressões-chave de João: Jesus é vida, verdade, caminho, luz, porta; o contato
vivo de Jesus com a Samaritana, o cego de nascença, Lázaro ressuscitado; a lembrança das
palavras mais altas de Jesus que se encontram no Evangelho: o amor fraterno, a promessa da
inhabitação, a oração sacerdotal, a paz do Ressuscitado, a consciência de que sem Cristo não
se pode nada. Um Cristo de quem se vive, com quem se vive.

Paulo porém permanece o ponto referencial mais próximo da experiência teresiana de


Cristo. Talvez porque Teresa se considera pecadora e se espelha no apóstolo. Sem dúvida
porque o Cristo da glória fez irrupção na sua vida como na de Paulo. Dele, devotíssima, Teresa
pegará emprestadas as palavras da experiência cristológica nos textos autobiográficos da carta
aos Gálatas, aos Filipenses, aos Colossenses, para dizer também como se vive e se morre em
Cristo.

B. Na profissão de fé eclesial
A fé cristológica de Teresa é perfeitamente ortodoxa e eclesial; é claramente calcedônica. É
uma clara afirmação da divindade de Cristo e da sua humanidade. As fórmulas teresianas são
límpidas: “Sacratíssima humanidade”, “divino e humano juntamente”; até a última expressão
escrita no final do livro das Fundações, poucos meses antes de sua morte: “Ó meu esposo,
verdadeiro Deus e verdadeiro homem” (F 31,47). A insistência teresiana é motivada; não é
mera afirmação da fórmula dogmática; é a reação convicta contra as tendências, recorrentes
na história e presente no seu tempo, de um larvado “monofisismo”, de um neo-platonismo
espiritual que colocava na sombra a plena humanidade de Cristo. Hoje talvez, o perigo é
diferente: o “nestorianismo” larvado acentua a humanidade de Jesus, mas coloca na sombra a
sua divindade. Teresa porém é segura, firme na sua profissão de fé. Obviamente, nenhuma
dúvida sobre a divindade do Senhor, Filho de Deus igual ao Pai; nas suas visões trinitária frisa
com precisão esta comunhão na natureza e distinção das pessoas, com fórmulas de perfeita
teologia trinitária (R 16 e 33).

O perigo do seu tempo era de certo “docetismo teológico” a respeito da humanidade de


Cristo, afirmada nas palavras mas negada nas conseqüências. Para Teresa, pois, a humanidade
de Cristo é verdadeira, real, autêntica, é o princípio da sua salvação, a sua libertação; é a
condição perene e providencial de Cristo enquanto mediador e mestre, caminho e porta rumo
à Trindade. Combate com garra teológica, não sem vibração existencial e de sensibilidade
feminina, quantos querem subtrair a humanidade de Cristo do caminho da perfeição,
especialmente nos graus mais elevados da oração. E confirma com a sua experiência do
Ressuscitado que no centro da mística cristã está a sacratíssima humanidade, verdadeira, real,
embora gloriosa e glorificada; no seio da Trindade Cristo não é uma divindade que absorveu a
humanidade. A relação de Teresa com o Senhor Jesus é cheia de condescendência e
comprazimento por sua sensibilidade humana, como demonstrada nos Evangelhos; assim
acontece no início da sua oração. Mas no cume da mística o estupor e, também aqui, o secreto
comprazimento em ver que o Ressuscitado não é somente “divino e humano
simultaneamente” na sua companhia, mas que também as suas palavras, os seus gestos são
humaníssimos, em tudo semelhantes aos gestos realizados com os discípulos depois da sua
ressurreição Assim Jesus Ressuscitado reparte o pão para Teresa e a convida a aproximar sua
mãos do costado (cfr. Relação 15,6 e 26).

C. Na progressiva experiência cristocêntrica


A progressividade da experiência de Cristo, como é testemunhada autobiograficamente e
exposta doutrinalmente no livro das Moradas, segue o caminho clássico do itinerário
cristocêntrico do discípulo de Jesus, do batizado que toma consciência do mistério da própria
existência referida a Cristo. Primeiramente temos a procura de Cristo para o encontro com ele;
segue a escuta da sua palavra até as exigências mais profundas; a escuta torna-se seguimento
até a radicalidade de Jesus que requer a escolha total. A esta altura, a vida em Cristo, já
presente no batismo, tornou-se “atração” interior rumo ao Mestre; começa a manifestar-se
como graça de comunhão para permanecer nEle; a conformação interior torna-se a
experiência de estar escondidos com Cristo em Deus, conforme a fórmula paulina que Teresa
cita. A conformação e a comunhão desenvolvem todas as possibilidades até uma
transformação interior, uma “união” com Cristo na vida contemplativa e na vida apostólica;
uma assimilação ao Crucificado em que o místico reproduz os traços daquele servo e escravo
do desígnio de Deus Pai. Se a graça cristológica tem este dom para o discípulo, a sua
participação na “Koinonia” trinitária se torna evidente na experiência inefável da inhabitação
trinitária e na comunhão com as três divinas pessoas, como acontece com Teresa.

Todas as etapas da vida espiritual são cristológica desde o possível ponto de partida - o
pecado e a conversão - onde Cristo aparece com clareza, para mais esconder esta sua função
como Salvador e Redentor. Este, por exemplo, o itinerário do livros das Moradas onde Cristo
não só aparece com caminho e imagem do homem novo, mas também como Salvador e
Redentor, modelo e forma interior do cristão.

D. O sentido “teantrópico” da salvação


Na visão teresiana de Cristo e nas conseqüências da redenção e da vida em Cristo, o fato da
“divina-humanidade” não é marginal; é essencial. Talvez quem melhor intuiu a modernidade
de Teresa neste campo foi J. Moltmann que aplica com precisão o axioma teológico dos padres
da Igreja à doutrina teresiana. Escreve Moltmann: “Nos seus escritos didáticos Teresa segue o
antigo pensamento sobre a salvação da primitiva igreja: Deus torna-se homem, para que nós
homens participemos da divindade de Deus... O caminho da perfeição e o ingresso no castelo
da alma comentam a segunda parte deste pensamento: “para que os homens se tornassem
participan-tes da divindade”. Moltmann intui mas não prova. Todavia a intuição é válida e
merece uma explicação mais aprofundada.

O apego de Teresa a sacratíssima humanidade de Cristo, tornando-se tese forte da sua


doutrina nos momentos polêmicos dos seus escritos, como nos capítulos 22 da Vida e 7 das
7M do Castelo Interior, coincide coma primeira parte do axioma patrístico: Deus se tornou
homem; a humanidade de Cristo não é apenas aparência; é o princípio da própria salvação.
Neste princípio o fecho de abóboda da salvação humana: Cristo é modelo, e salvação e
redenção por meio de sua humanidade, é o mediador. Poderia sintetizar bem esta convicção
uma frase do pequeno poema de Natal onde Teresa diz: “Que ya el hombre és Dios” (O
homem já é Deus). É a descida de Deus ao homem, a sua condescendência, tão apreciada por
Teresa, de um Deus que encontra suas delícias com os filhos dos homens numa amizade que
se torna comunhão.

Há também o outro aspecto: “para que o homem participe da natureza de Deus”. O


caminho da oração é um processo lento para tornar-se, como diz Teresa, “da condição de
Deus”. A lei da amizade e da comunhão que estão à base mesma da oração no seu aspecto de
transformação, garantem esta visão da participação; a oração é caminho de “deificação” numa
lenta e progressiva maturação e transformação. No vértice desta transformação encontram-se
as expressões da “união com Deus” que é união e comunhão com Cristo e com a Trindade,
descrita com traços vigorosos nas sétimas moradas, recorrendo a textos da Escritura e
simbolismos da natureza. Uma síntese nós encontramos também na ousada oração da
Exclamação 17; aqui encontramos as frases mais altas que dizem “deificação” do homem,
embora mantenha a distinção pessoal entre o homem e Deus: chegar a ser “naturalizado com
a própria vida do teu Deus”, “entranhados” neste “sumo bem”, tornando-se “participantes da
divina natureza” (“particioneros de la divina naturaleza) (Exclamação 17, 4-5).

Mas o equilíbrio do “teandrismo” da salvação também se pode constatar com outras


expres-sões teresianas. Se é verdade, como já afirmamos, que a humanidade de Cristo não é
absorvida pela divindade e que Teresa faz questão de frisá-lo a partir da fé e da própria
experiência, é também verdade que o caminho da deificação não representa para o cristão
uma reabsorção da sua humanidade, uma negação do corpo e da sensibilidade e muito menos
das atitudes humanas do verdadeiro amor do próximo; melhor, é na humanidade do cristão,
transformado em Cristo, que a graça adquire densidade histórica, social, exprime-se em gestos
e atitudes humanas. No rosto do cristão que seguiu o caminho da oração delineiam-se com
clareza os traços humaníssimos de Jesus de Nazaré até a humanidade suma que aparece no
Crucificado (cfr. 7M 4,4-8).

Por isso o caminho da oração é cristocêntrico e “teândrico” ou “teantrópico”, divino-


humano, uma experiência em que o homem deixa espaço para Deus tornar-se nele o princípio
do viver e do agir. A oração é a busca de Cristo que torna-se presença interiorizada, e depois,
ainda, vida emergente do mistério da comunhão com Ele, como documenta claramente toda a
doutrina teresiana e toda a sua pedagogia do encontro, da escuta, da comunhão vital.

Resumindo as convicções profundas da Santa se pode afirmar que a fé lúcida de Teresa, a


sua confissão sem titubeios da divina-humanidade no Cristo, se estabelece sobre este duplo
princípio:

- sem a humanidade de Cristo, não há salvação para o humano, não há modelo de perfeição
para o homem, não existe possibilidade de uma comunhão perfeita com Deus; com a
humanidade de Cristo tem-se a fonte da graça, a porta que conduz ao Pai, o modelo da
existência redimida e transformada;

- sem a divindade de Cristo, não há possibilidade de elevação, de deificação, de graça que


desde dentro muda e transforma.

Na sacratíssima humanidade temos o princípio da salvação e a medida da transformação,


da “deificação”; o modelo de uma santidade na qual resplandece também o rosto humano do
Filho de Deus.

Esta premissa oferece-nos a chave de leitura da singular experiência cristológica teresiana


na qual queremos frisar os traços divino-humanos do Senhor Jesus, amigo, esposo e salvador.

2. Um encontro decisivo em três tempos


Podemos afirmar que o encontro de Teresa com Cristo aconteceu em três tempos
característicos: a procura, a crise, a presença. O livro da Vida pode ser lido nesta chave. Há
uma primeira parte da vida teresiana que é toda ela o momento inicial cristocêntrico: Teresa
procura Cristo; temos depois a parte final em que prevalece outro aspecto: Cristo procura
Teresa; seria, pare entendermos, a primeira fase ascética que se estende da juventude à vida
religiosa; e a segunda fase mística que segue à “conversão”.Mas entre essas duas fases faz-se
mister colocar um período de crise que se resolve na “conversão” e que supõe uma singular
experiência de salvação e de redenção. Mas não se deve esquecer que esta visão da própria
existência é marcada pelo encontro com o Cristo ressuscitado, é interpretada à luz daquela
“experiência pascal” que condiciona também nela a capacidade de exprimir-se para transferir
por escrito a narração da própria história. Vejas brevemente estes três tempos.

A. A procura do Cristo do Evangelho

Podemos dizer que uma verdadeira procura de Cristo na vida de Santa Teresa se pode
documentar desde os primeiros anos da sua juventude, após a crise afetiva da adolescência
que provocou o seu forçado retiro como aluna interna no mosteiro das agostinianas de Ávila. É
aqui que emergem as primeiras lembranças de uma fé conscientemente endereçada ao
encontro com Cristo através da leitura do Evangelho ou com referências a episódios
evangélicos. O exemplo de uma sua mestra, Maria de Briceño, é determinante. É o seu
testemunho pessoal que a põe em contato com o texto do Evangelho: “muitos são os
chamados mas poucos os escolhidos” (V 3,1). Experimenta ler a paixão do Senhor, mas a sua
insensibilidade a coloca em crise: “o meu coração era então tão duro que seria incapaz de
derramar uma lágrima sequer lendo por inteiro a Paixão do Senhor: o que muito me afligia”.
Típica reação de uma adolescente em crise de vida e de fé. Abrem brecha no coração os bons
livros e as boas companhias. Teresa fala claramente da “força que exerciam no seu coração as
palavras de Deus quer lidas quer escutadas” (V 3,5). Aquele coração duro, agora inicialmente
amolecido pela força da Palavra de Deus, responde generosamente. A decisão por Cristo
transforma-se numa escolha de vida monástica; aos possíveis medos e incertezas,
compreensíveis numa jovem do seu tempo, responde com o seu olhar fixo em Cristo:
defendia-me chamando à mente o que Cristo tinha sofrido, e que não era certamente grande
coisas que eu sofresse algo por Ele, muito mais que a sua ajuda não teria certamente faltado”.
Mas Teresa já sentia que o Senhor estava atuando na sua vida (V 3,6 e 3).

Os primeiros anos de vida religiosa foram marcados também por especial fervor
cristocêntrico. Viveu sua profissão como um “casamento” com Cristo. E a sua vida estava toda
ela endereçada ao Senhor mesmo através de detalhes como o desejo de mandar pintar a sua
imagem. A sua oração era também tipicamente cristocêntrica: “O meu método de oração
consistia em fazer tudo para ter presente dentro de mim Jesus Cristo nosso bem e Senhor. Se
meditava uma cena de sua vida procurava representá-la na alma...”. Mesmo quando não
conseguia representar-se a humanidade de Cristo sentia a sua presença (V 4,7).

Nesse longo período de procura podemos colocar a descoberta de muitos textos


evangélicos que Teresa cita, de tantos episódios do Evangelho aos quais é particularmente
afeiçoada. A leitura pessoal que faz do Evangelho e de Cristo parece ser guiada por algumas
diretrizes originais:
- sente-se em particular sintonia com alguns episódios evangélicos nos quais são
protagonistas as mulheres e identifica-se com suas experiências;

- interpreta com particular sensibilidade feminina algumas passagens da vida do Senhor;

- fixa ao olhar nos sentimentos humanos de Cristo, na sua profunda e verdadeira


humanidade.

Baste para ilustrar essas afirmações recordar alguns temas e alguns textos.

a) Entre as mulheres do Evangelho prefere a samaritana de quem meditou longamente seu


relacionamento com o Cristo até se tornar para ela modelo e tipologia da oração e da graça da
água viva. São-lhe também familiares as duas irmãs de Betânia, Marta e Maria; fala com
freqüência, revelando assim certa predileção, de Marta que defende sempre, invertendo uma
exegese muito negativa a respeito do serviço de Marta que ao contrário, Teresa aprecia e
louva. Maria Madalena, a pecadora que segue depois o Cristo até a cruz e à ressurreição, é
uma personagem muito amada por Teresa que se considera também pecadora e que por
muito tempo meditou sobre o episódio do evangelho que fala do perdão que Jesus lhe
concede na casa de Simão.

b) São muitos os episódios evangélicos nos quais Teresa se personifica e dos quais oferece a
sua original interpretação. Baste pensar até que ponto conseguiu mergulhar na meditação da
oração do horto, episódio que marcou a sua oração e sua participação no mistério de Cristo (V
9,4). Curiosa também a exegese quase apócrifa, mas significativa, que desde jovem faz do
ingresso de Jesus em Jerusalém: Teresa imagina a pouca delicadeza dos que o acolheram em
triunfo mas não o convidaram para comer, tendo o Senhor de retornar a Betânia (?). Esta
ingênua interpretação cria porém em Teresa forte participação que o Senhor recompensa um
dia com uma visão cheia de condescendência (Relação 26).

c) Finalmente, é característico da Santa o contínuo recurso aos sentimentos humanos do


Senhor como aparece no Evangelho. Sejam suficientes dois textos entre tantos: “Cristo é
sempre um boníssimo amigo e nos é de grande companhia porque O vemos homem como nós,
sujeito às nossas mesmas fraquezas e sofrimentos...”; “Compreendia que se Deus é também
homem e que, como tal, não só não se admira da fraqueza humana, mas sabe também que
esta nossa natureza cai muitas vezes, por causa do primeiro pecado que Ele veio reparar” (V
37, 5.8).

Esta original meditação do evangelho cria pouco a pouco em Teresa profundas convicções e
desencadeia com o passar do tempo experiências libertadoras. A sintonia com a humanidade
de Cristo, a apaixonada defesa da oração como meditação do Evangelho e encontro com o
Cristo na sua humanidade sacratíssima tem algo de visceral, de profunda ressonância humana
e também de certo aspecto polêmico feminino. É fácil intuir em Teresa essas duas
fundamentais convicções que amadurecem nela como experiência de alegria libertadora num
particular contexto ambiental que se espelha na teologia e na espiritualidade, na vida
ordinária.

1) Teresa aparece na sua autobiografia profundamente humana, sensível capaz de amar e


de acolher a amizade. Os seus sentimentos humanos nem sempre encontraram equilibrada
expressão. Ela mesma pode constatar em seu mosteiro, e experimentará na sua crise pessoal,
que a sua humanidade até a sua corporeidade ou é assumida pela graça ou escorrega em
perigosas repressões ou indevidas e morbosas aberrações. O profundo apego a Cristo é
também descoberta libertadora que não deve envergonhar-se do humano que está nela, e
juntamente que somente Cristo pode reequilibrar com a sua presença e o seu exemplo a
própria humanidade. Cristo deverá relevar e reerguer quanto caiu na humanidade e nos
sentimentos, mas não sufoca a humanidade, não a mortifica; simplesmente a salva. É a
libertação do humano, a possibilidade de uma integração no caminho da santidade; sem
ignorá-lo, porque “não somos anjos”; sem nos ufanarmos do humano, visto que temos
necessidade redenção.

2) Os ares tipicamente femininos com que Teresa se identifica com as mulheres do


evangelho tem por de trás de si uma profunda descoberta libertadora da qual Teresa vai dizer
alguma coisa somente no momento oportuno. Poderia resumir-se nestas palavras: Jesus
demonstrou que estava do lado das mulheres, e as mulheres demonstraram estar do lado dele.
O antifeminismo teológico e espiritual que surdamente ou abertamente podia expressar-se ao
redor de Teresa, torna-se contraditório a uma simples leitura evangélica. Embora os teólogos
fossem contra as mulheres, principalmente teólogos como Melchior Cano, os espirituais eram-
lhe favoráveis, como caso de Pedro de Alcântara. Mas, em todo ocaso, Jesus não pensava
assim. A sua condescendência e abertura, a sua delicadeza com as mulheres que aparecem no
Evangelho, a sua aberta defesa das mulheres desautorizava de repente tantos antifeminismos
dos teólogos. E também por isso Teresa sentia uma profunda gratidão por Jesus na sua
humanidade, cheia de amor pelas mulheres; amor pelo qual Teresa sentir-se-á também
profundamente envolvida, como a Samaritana, Maria de Magdala ou as irmãs de Betânia. Não
nos maravilhará a sua reação em defesa das mulheres e também a sua resposta de profundo
amor e serviço eclesial para o Senhor e Mestre (cfr. C 3,7, nota e R 19).

Nesses dois elementos a ponte que une as duas margens: da humanidade de Teresa à de
Cristo. Uma experiência esta, na qual são amadurecidas profundas convicções espirituais.

B. As crises e conversão

A procura teresiana de Cristo passou pelo cadinho de uma crise complexa. Foi uma crise da
oração e também da vida religiosa que Teresa conta com acentos dramáticos no capitulo 7 da
autobiografia. De um lado, uma perseverança na oração comprometida somente por um breve
período de abandono, em que não logra nada; simultaneamente temos uma crise de tibieza da
vida religiosa, provocada especialmente pelo chamado de Deus a uma vida mais generosa e
empenhada. O abandono da oração foi recordado por Teresa como princípio da tentação de
Judas: subtrair-se ao olhar de Jesus.

Mas, a raiz de tudo, para que tenha havido uma crise cristológica apenas acenada pela
santa. Ter-se-ia tratado de um temporário esfriamento com o Cristo e a sua humanidade, bem
no momento em que a sua sensibilidade mais necessidade tinha, para ir à procura de novas
experiências de oração sobrenatural. O pesar teresiano transparece em certas páginas
autobiográ-ficas: “Sempre fui muito devota de Cristo. Foi somente nesse tempo que
abandonei a sua sacratíssima Humanidade... Será possível, meu Senhor, que tenha estado por
um instante no meu pensamento a idéia de que me havíeis de impedir alcançar o maior bem?”
(V 22,4). Sem este ponto de equilíbrio, toda a psicologia e toda a vida religiosa de Teresa
ressentiram as conseqüências: aridez, fraqueza, certa esquizofrenia espiritual”, numa
dicotomia entre vida de oração que queria voar rumo a horizontes espirituais inalcançáveis, e
uma medíocre vida religiosa para o que podiam ser as suas aspirações, ou os “gemidos do
espírito” que anunciavam os tempos de uma vida nova.

Nesta crise recebe um suplemento de graça. Uma providencial manifestação de Cristo, não
sobrenatural , mas fortuita, a contemplação de uma imagem dele, provoca uma conversão que
torna-se o ponto decisivo na sua subida rumo a “vida nova”. Anuncia-se a mudança, a inversão
de marcha: Cristo vem à procura de Teresa (V 9,1-3). O encontro da conversão, prolongado no
novo fervor de vida e de oração, carrega também o sinal de uma experiência particular de
Cristo na sua divindade-humanidade: Jesus é o Salvador de Teresa; diante dele se prostra como
a Madalena pedindo perdão e salvação; o efeito desse encontro constitui também o início de
uma vida nova que Teresa experimenta como vida para Cristo, polarizada já por uma atração
irresistível que a coloca no órbita de Deus. De fato ela realiza um retorno à sacratíssima
humanidade, e Cristo começa a fazer sentir sua presença ao tomar a iniciativa do encontro: Ao
passo que fazendo oração eu procurava colocar-me ao lado de Cristo, como disse, e às vezes
enquanto lia, sentia ser invadida improvisamente por uma sentimento tão vivo da divina
presença que não podia de modo algum duvidar que estivesse Deus em mim e eu nele” (V
10,1).

A crise resolveu-se numa conversão e no in´cio de uma graça de vida em Cristo; mas a crise
é salutar; aprofunda em Teresa o senso da pobreza, da humildade; supõe transferir a confiança
em si mesma para Deus, para o Cristo; foi uma ressurreição, uma libertação do mais subtil dos
laços, o do egoísmo e da excessiva confiança em si mesma: “Seja bendito Aquele que me
manteve em vida para fazer-me sair de morte tão mortal...”; “Seja bendito o Senhor que me
libertou de mim mesma...” (V 9,8; 23,1). Trata-se de uma fundamental graça cristã, a da
libertação e da redenção, percebida claramente como graça e como necessidade absoluta;
graça que marca para sempre a consciência que Teresa tem da sua condição de pecado e de
dívida de eterna gratidão para com Deus. Também aqui o Cristo na sua condescendência
desceu até o pequeno inferno de Teresa, para libertar com o seu amor cheio de humanidade
uma humanidade que tinha profunda necessidade de ser salva e curada.

C. “O Encontro pascal”
Até este momento prevaleceu no itinerário de Santa Teresa, a procura pessoal, mesmo que
obviamente apoiada e precedida sempre por uma graça na qual Deus está sempre presente,
“desejoso” (“ganoso”) de receber o sim livre e consciente da sua existência aflita. Prevaleceu
também a imagem do Cristo homem na moldura evangélica das suas leituras, das imagens que
prefere, da oração com que o acompanha e o “representa”, no sentido de “torná-Lo presente”.
Com a conversão inicia uma nova etapa na qual prevalece, mas sem que se percam as riquezas
do primeiro encontro, a graça de Cristo que toma agora a iniciativa de “tornar-se ele mesmo
presente”. Ademais, ao Cristo do evangelho e ao Cristo da Paixão sucede agora uma
consciência mais clara do Ressuscitado, do Cristo pascal, esplendente pela luz da divindade e
do poder da vida nova, que emerge da experiência da graça como vida própria de Teresa, até
tornar-se Aquele-que-a-vive desde dentro.

As etapas progressivas desta nova experiência poderiam ser avaliadas teologicamente


tendo presente os conteúdos num crescente característico:

a) Revelação de Cristo como Livro vivo e mestre interior do qual Teresa torna-se discípula
beneficiada. Na famosa repressão cultural realizada pela Inquisição em 1559, quando foram
censurados muitos livros em língua vernácula, entre os quais a Bíblia, Jesus fê-la ouvir estas
palavras significativas: “Não te aflijas porque eu te darei livro vivo...” Os efeitos foram nítidos:
“O Senhor instruía-me com tanta ternura e em diversas maneiras que quase não tive mais
necessidade livros... Então para aprender a verdade não tive outro livro além de Deus. E
bendito esse livro que tão bem impresso o que se deve ler e praticar que não se esquece
jamais!” É a revelação do Verbo Encarnado, Palavra definitiva do Pai, ou do Cristo Mestre que
instrui secretamente os seus discípulos após a Ressurreição (V 26,5).

b) Revelação de Cristo como Luz, numa experiência que recorda a do Tabor. É a progressiva
manifestação de Cristo como rosto luminoso, corpo glorioso, revelador do amor do Pai. É a
primeira visão clara que a deixa pasma mas que a coloca em profundo estado de alegria pela
manifestação do corpo de glória do Senhor. Trata-se de uma visão que se repete e da qual
Teresa custa descrever os pormenores mas onde é abundante o tema da luz, da visão tabórica
do Cristo que é “Luz da Luz”: “E uma luz que não ofusca, um candor cheio de suavidade, um
infuso esplendor que encanta deliciosamente a vista sem cansá-la... luz sem ocaso que nada
pode perturbar porque eterna...”. Mas não estamos na visão platônica onde tudo de se
dissolve e desaparece. Quem aparece a Teresa é o Cristo da glória, com um clarão semelhante
à luz que Paulo percebe no caminho de Damasco, mas sempre o Cristo Ressuscitado
verdadeiro Deus e verdadeiro Homem: “Não é um morto que vejo, mas o mesmo Cristo vivo
que se deixa ver como Homem-Deus no modo como ressuscitou, e não como estava no
sepulcro”.

É interessante a insistência na divina-humanidade que lhe é manifestada no Cristo da


glória; divina-humanidade que se exprimirá também em gestos e palavras humaníssimas,
cheias de amor condescendente (V 27,2; 28,3.5.8).

c) A revelação de Cristo na plenitude dos seus mistérios. A revelação torna-se presença


contínua, convivência, comunhão com o Ressuscitado. Cristo é testemunha silenciosa de cada
obra dela. No Cristo glorioso vê inscritos, na sua carne glorificada, os mistérios da sua bem-
aventurada paixão: “Em geral o Senhor se deixava ver por mim Ressuscitado, assim como me
aparecia na Hóstia sagrada. Porém alguma vez, querendo encorajar-me nas minhas
tribulações, mostrava-me as suas chagas, às vezes a cruz, ás vezes o horto, ou sob o peso da
cruz, raramente com a coroa de espinhos, sempre em conformidade com as minhas
necessidades ou com as de outras pessoas. Mas sempre com a carne glorificada” (V 29,3-4). A
precisão teológica é irrepreensível.

d) A efusão de amor no Espírito Santo. O efeito próprio desta comunhão com o


Ressuscitado é uma efusão de amor que abrasa-se na caridade que primeiramente é
escatológica: desejo de ver a Deus; e depois torna-se diaconal-eclesial: ardente vontade de
servi-Lo. “Sentia que o meu amor por Ele crescia dia após dia... pouco depois o Senhor, como
me prometera, começou a dar-me a entender melhor que era Ele ao fazer arder no meu
coração tão alto amor de Deus, que não sabia de onde proviesse, totalmente sobrenatural e
não procurado por mim. Sentia-me morrer pelo desejo de ver a Deus: Ele era a minha vida e
compreendia que não poderia possui-Lo a não ser com a morte...”. Este amor sobrenatural
constitui singular participação no Pentecostes do amor pelo dom inefável do Espírito Santo,
graça singular que aparece na assim dita “transverberação” (V 29,8-14).

A procura tornou-se encontro e comunhão. Cristo procurado na sua humanidade retorna


agora no poder da sua divindade. O Cristo do Evangelho apresenta-se a Teresa como o Cristo
da Páscoa. A oração torna-se vida em Cristo, e o seguimento um ser “agarrada pelo Senhor
Jesus. A parábola está concluída. O resto será progressivo crescimento, manifestação total do
mistério do Senhor.

Estamos no início da vida mística de Teresa - pelos anos 1561-1562, quando se abre para
ela a maturidade da vida de fundadora e de mestra. Plenitude de vida que não se pode
compreender a não ser na luz desta realidade interior do Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro
Homem que, tomando-a de dentro, a plasma à sua imagem.

3. Perspectivas de experiência espiritual e de doutrina


Da altura de sua experiência espiritual do mistério de Cristo, Teresa move-se com liberdade
para a plenitude de vida da qual brotam convicções profundas a nível doutrinal. O valor destas
intuições é perene e hoje de particular atualidade. Vale a pena assinalar alguns traços
emergentes.

A. De Cristo para a Trindade e para a humanidade


A progressiva manifestação do mistério de Cristo que se expande poderosa até a morte de
Santa Teresa durante uns vinte anos com autêntica plenitude, parte obviamente da
contemplação existencial do mistério de Cristo à qual prestamos a nossa atenção nas páginas
precedentes. E é na divina-humanidade que encontramos a chave de abóbada para
compreender o evoluir-se da vida de Teresa num crescendo de experiências místicas e numa
vertiginosa ação em prol da Igreja.

Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem, torna-se caminho ao Pai, porta aberta para o
mistério trinitário; os primeiros clarões da luz trinitária onde o Verbo Encarnado e glorificado
está no seio do Pai, são já percebidas nas experiências que coram o livro da Vida e remontam
ao período de 1562-1565, data da redação final do livro. Mas a revelação do mistério trinitário,
qual compreensão da pericorese das três pessoas” numa só natureza, a percepção da
inhabitação trinitária na alma em graça, particulares luzes sobre o mistério trinitário como se
revela na Eucaristia já estão presentes do decênio 1570-1580. Vê-se claramente no suceder-se
das experiências que Cristo é o revelador do mistério trinitário e aquele que introduz a alma na
perfeita participação da vida divina da Trindade. Entretanto intensificaram-se as comunicações
cristológicas que chegam em 1572 à graça do “matrimônio espiritual”, justamente, numa
maravilhosa revelação da Humanidade gloriosa do Senhor, depois da comunhão eucarística. O
testemunho que sobre o mistério trinitário nos oferece Teresa é plenamente ortodoxo,
confronta-se com os textos das Escritura e com as afirmações teológicas de textos veneráveis
como o assim dito “Símbolo de santo Atanásio”, Quicumque vult. Mas na Trindade a
Humanidade de Cristo não desapareceu, não foi absorvida; é como a revelação de um Deus em
três pessoas que no rosto de Cristo recupera também uma face e uma figura- não meros
símbolos” - para o Pai e para o Espírito Santo.

Quando a vida de Teresa está chegando ao ocaso, na última Relação, que remonta a 1581,
permanecem fundamentais as duas experiências místicas da humanidade de Cristo e da
Trindade, tão originalmente características da vida sobrenatural do cristão. No último instante,
através da Eucaristia, presença de Cristo glorioso, Teresa alcança, enfim, sem véus a plenitude
da vida trinitária.

Desde a outra margem da divina-humanidade o Cristo revela e comunica a Teresa o seu


prolongamento na Igreja e nos homens.

A descoberta lógica que segue à revelação do mistério de Cristo é a da Igreja , corpo de


Cristo, Esposa de Cristo. Sem poder encontrar fórmulas dessa profunda identificação nos
escritos teresianos, encontra-se uma lógica continuidade entre Cristo e a Igreja em dois
pormenores:

1) A mudança sensível realizada em Teresa a partir da revelação do Senhor; num primeiro


momento a forte concentração da esperança escatológica que lhe faz ansiar por “estar com
Cristo” na glória; é o desejo de morrer para ver a Deus. Depois este desejo transforma-se em
concentração de energias, mas também em novíssimas possibilidades, para “servir o Senhor”;
portanto não mais desejo de morrer mas sim de viver de dar a vida mil vezes la própria vida
pelo Reino de Cristo, pela obra da salvação, para cooperar com Cristo. A visão de uma Igreja
lacerada acentua com força esta mudança de perspectivas (V 40,15.20.23; C 1,3).

2) Há uma identificação entre o Cristo da paixão que foi condenado e a nova paixão da
Igreja na qual novamente se quer condenar o Cristo: “os ímpios, por assim dizer, anseiam
condenar ainda Jesus Cristo, levantam contra Ele uma infinidade de calúnias e se empenham
em mil maneiras para destruir a sua Igreja” (C 1,5). A identificação é bem mais tocante
enquanto o ponto de encontro entre Cristo e a Igreja é a Eucaristia. Profanar a Eucaristia ou o
sacerdócio é atentar contra o próprio Cristo e contra a própria Igreja (C 35,3-5).

Neste prolongamento Cristo-Igreja a resposta de amor de Teresa, qual esposa que sente
que as coisas de Cristo são suas, torna-se incansável obra de renovação e de reconstrução da
Igreja na sua santidade. Vai fazê-lo com a incansável obra das fundações que é a melhor
contribuição que lhe é oferecida para servir o Cristo e Igreja.

Mas não é somente a Igreja prolongamento de Cristo. A sua presença está também em
cada cristão, melhor em cada ser humano, criado à imagem e semelhança de Deus. A
lembrança das palavras do Senhor: “O que fizestes ao mais pequeno, fizeste-o a mim”, o
primado da caridade e a prioridade do amor fraterno, a afirmação granítica “Quem não ama o
próximo não vos ama Senhor” (Exclamação 2,2; F, 5,3). São outra convicções teresianas que
levam ao amor por Cristo nos irmãos. Pode compreender-se então o desejo de servir o
próximo, a sua especial caridade pelos pobres e os doentes, a sua ampla visão da dignidade do
ser humano que não deve ser pisado porque imagem de Deus, a morada de Deus, uma criatura
chamada a comunhão com o Senhor. Este amor por Cristo presente nos irmãos, mesmo nos
pecadores, que fere o coração de Teresa e a faz exclamar em ardentíssimas orações pela
salvação universal (Exclamação 8-10).

Identificada com Cristo, Teresa abre-se para o divino até à Trindade; impulsiona-se para o
humano, para a Igreja e a humanidade.

B. O perene valor da Humanidade de Cristo para a salvação


Com esta formula que recorda um famoso artigo de K. Rahner, se pode definir a tese
fortemente sublinhada por Teresa em alguns textos de suas obras. O primeiro, a nível
autobiográfico e doutrina, o do livro da vida capítulo 22; mas também o capítulo 37, onde a
ilustração deste princípio é venada por fino humorismo. O segundo, a nível de proposta
doutrinal, mas não priva de elementos autobiográficos, nos capítulos 7 e 8 das sextas
Moradas.

Contra qualquer tentativa neoplatônica que visa obscurecer a presença de Cristo Senhor,
temos uma afirmação articulada de sua absoluta necessidade. Teresa emprega com clareza
em todo o seu discurso os textos joaninos que falam do Cristo, caminho, verdade, vida; parte
também da extrema necessidade da pessoa humana de ser salva por Cristo verdadeiro Homem
e verdadeiro Deus. Inspira-se na liturgia da Igreja que celebra os mistérios do Senhor na carne;
recorda multidão dos Santos que na Idade Média descobriram com grande devoção o mistério
da sacratíssima humanidade. Chega até , em subtil dialética, a afirmar que todo atentado
neste campo poderia colocar em perigo a fé e a devoção pela Eucaristia; de fato, quem
quisesse prescindir da Humanidade de Cristo poderia logicamente prescindir também da
mediação da Igreja e da estrutura sacramental da comunicação de Cristo na Eucaristia (V 22;
37; 6M 7,5-14).

Assim, a afirmação do mistério do Senhor Jesus na sua Humanidade, fonte da graça e das
graças, salvaguarda o verdadeiro relacionamento com Deus na Igreja e nos sacramentos,
contra todo o espiritualismo que poderia desembocar numa absorção panteísta. Mas, ao
mesmo tempo, o relacionamento com a Humanidade do Senhor garante o verdadeiro sentido
da vida cristã como vida em Cristo na plenitude da vida humana dos fiéis. E nisso Teresa
oferece também o exemplo de uma santidade e de um misticismo permeados por profunda e
terna humanidade.
C. O cristocentrismo da salvação cristã
Uma última reflexão sobre o cristocentrismo teresiano permite-nos colher alguns traços
significativos.

1) A cristologia teresiana acentua o para nós da encarnação, da paixão e da ressurreição,


próprio na insistência com que acentua a presença da Humanidade de Cristo como
condescendência misericordiosa de Deus com o homem. É toda a força da misericórdia e do
perdão que desemboca na vida de graça.

2) Na mesma linha manifesta-se na Humanidade de Cristo o mistério da presença em nós,


da sua companhia. O Cristo de Teresa não é distante; é amigo presente, testemunha silenciosa,
“companheiro nosso no Santíssimo Sacramento”. Teresa experimentou a múltipla presença do
Senhor na força da sua palavra, na Eucaristia, no íntimo da alma, nos irmãos e entre os que se
reúnem no seu nome, qual pequeno “Colégio de Cristo”. A presença torna-se comunhão de
vida (Cfr. V 16,5; 34,17; 35,12; CE 20,1; CV 17,6).

3) Enfim, a grande insistência na perfeita Humanidade de nosso Senhor, junto com a


afirmação da sua Divindade, coloca em realce antes o como nós da identificação na
encarnação; mas depois o como Ele da graça, da vida em Cristo e da união com o Senhor que
tem como termo último e media a unidade das divinas pessoas, como Teresa diz ao invocar os
textos de João na oração sacerdotal de Jesus (7M 4,7-8).

4) Deste modo, com os olhos fixos sempre em Cristo , como aconselha freqüentemente
Teresa, o caminho do cristão é traçado; a companhia de Cristo é garantida; a santidade terá de
medir-se com os sentimentos de Cristo Jesus até o cume da doação sobre a cruz. O vértice da
santidade consistirá em ser semelhantes a Cristo Crucificado (7M 4,4-8).

Conclusão
Quisemos oferecer uma leitura sintética da cristologia teresiana insistindo particularmente
sobre o tema da divindade-humanidade de Cristo, tema particularmente sublinhado por
Teresa no seu ensinamento.

A espiritualidade teresiana tão atenta ao primado de Deus aparece-nos assim aberta ao


mistério do homem. Os místicos são aqueles que melhor e mais profundamente conhecem o
mistério da humanidade e com maior impulso se aplicam em servir o desígnio de Deus em prol
do homem.A união com Cristo conduz à adoração do Deus Trino; o amor pela sua humanidade
prolonga-se num grande afeto pela pessoa humana, venado pelos mesmos sentimentos do
coração de Cristo. O sentido e o valor do serviço dos homens é medido pela obra mesma do
Cristo: conduzir ao Pai todos os filhos dispersos; revelar a cada pessoa a sua dignidade de filho
de Deus, criado à sua imagem e semelhança, tornado templo e morada de Deus, chamado à
comunhão com Ele. Teresa aprendeu tudo isso e o repete para nós com os olhos fixos em
Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem

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