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RAUL PLUS, S. J.

A Santidade Católica
*

Traduzido por
Ângelo Augustinho Antônio Ziôni

I 9 4 4
E D I T ó RA V O Z E S LI M I T ADA
Petrópolis, R. J.
Rio de Janeiro São Paulo
BIBLIOTECA DE CULTURA CATúLICA

VOLU:ME IV

EDITôRA VOZES LIMITADA


Petrópolis, R. J.
Rio de Janeiro São Paul()

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Imp r i m a - s e.

,Po r co missão especial do Exmo . e


Revmo . Sr. Bispo de Niterói, D. Jo sé

Pereira Alves.

PetrÓP.o lis, 20 de junho de 1944.

Fr. Atico Eyng O.F.M.

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS


INTRODUÇÃO

C
ONTA a história que certo Bispo de Varsóvia solici­
tara do Pa p a umas relíquias para a catedral e que
o Santo Padre lhe respondeu: "Inclinai-vos e recolhei
um pouco de terra, pois todo o solo de vossa Pátria é
uma relíquia".
Haverá por acaso alguma região, por pouco católica
que ·seja, à qual se não possam apl �car essas palavras.?
Diante do interêsse d a Igreja em dar Sanios ao. mun­
do, individuas há que, mostrando n o s lábios um sorriso
malévolo, repetem sem cessar: "Morreu a Igreja! E, se.
p0r acaso ainda vive, tem uma vida sem energia e não
tem o suficiente vigor para engendrar novos Santos .. . "
Ouçamos alguns dêsse· s imperturbáveis profetas. Cha­
mam-se PROUDHON, MICHELET, LÉoN �ENIS, AUl.ARD, GVI­
GNEBERT... Quando em 1860 apareceu a Vida de Jesus
de RÉNAN, PnunHON julgou de seu dever afirmar "que
as almas devotas se apressem em tomar de seus passa­
portes, p ois, dentro de dez anos, não haverá um só
sacerdot e para administrar os Santos óleos." No entanto,
a Vida de Jesus de RÉNAN não logrou acabar com as vo­
cações. Não obstante as perseguições e dificuldade5 de
tôda ordem, Cristo continua a contar com fiéis e minis­
tros. O Ev angelh o não abrandou nem uma sequer de
suas exigências, nem perdeu a menor das aptidões em
formar Santos.
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6 A SANTIDADE CATÓLICA

ViTOR HuGo acabava de publicar as Coptemplações,



quando MICHELET, in Ômodando..se ante o fragmento "Es­
crito aos pés de um Crucifixo", escreveu: "O mundo, meu
caro Senhor, pede-lhe que nêle pense um pouco. Creio,
mesmo, que lhe pediria sacrifica·s se os seis· versos dedi­
cados ao Crucificado. Quando o Cristianismo tiver dei­
xado d e ser um vampiro (nem morto nem vivo) e nada
mais ;fôr senão um morto honesto, plácido e tranqüilo,
Cfl.mo a índia, o Egito, ou Roma, então, somente então,
é que ·nós assumiremos a defesa d e quanto fôr digno d e
defesa. Antes disso não, pois êsse é o inimigo."
Dez dias mais tarde, a 15 dt> maio de 1856, :\hcHE­
LET volta a insistir: "Os próprios mortos não desejam
que pensemos demasiado nêles. E isto eu o aplico ao
passado cristão e a êsse grande defunto que é o Cris­
tianismo. Em sua esterilidade atual nos adverte sufi­
cientemente para que procuremos nov�s·' ,p;:tragens." Dei­
xeriws de lado a flagrante contradição em que inr.orre
ao apt:esentar o Cristianismo como se fôra um morto, �.
ao mesmo tempo sumamente temível, um vampiro . Po­
nhamos ·e m destaque, unicamente, a afirmativa da este­
rilidade. Até onde leva a cegueira I Que arbitrariedade
num historiad orll _

No prefácio da ,'.legunda Cristiani- smo e


edição de
Espiritismo (1920), LÉON DENIS formula, à bôca-cheia, lf
seguinte declaração: " A Igreja vai morrendo de um mal
orgânico, porquanto tem o centro vital afetado . . . H4
muito, parece, o espirito de Jesus abandonou a Igreja.
.
O fogo de Pentecostes não mais arde para ela e em der�

(1) No ditirâmbico elogio que, em h onra de MI­


CHELET e sob 0 altissonante titulo de O Eterno Evange­
lho M. G�ErrENNo acaba de publicar, seria .de desejar
fôssem incluídas a s imperdoáveis debilidades do h erói.

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INTRODUÇÃO 7

redor: extinguiu-se esta chama fecunda." A esta oração


fúnebre faz côro AULARD dizendo: "A fé religiosa está.
tão enfraquecida na França - escreve com ilimitada au­
dácia em Le Rappel, de 20 de março de 1923, o historia­
dor .da Sorbona - que até o próprio Oeus dos deístas,
o Deus de VoLTAIRE e de CousiN, não mais conta com
fiéis devotados. De minhá parte, _pessoalmente, .não co­
nheço a ninguém nessas condições."
Deixemos de lado a afirmativa referente ao deísmo
dos VoLTAIRE ·e CousiN; mas, não obstante o pensar de
AuLARD, não faltam cristãos verdadeiros. GuiGNEBER'r,
convencido de dizer uma grande verdade a respeito d a
França contemporânea, escreve: "Constituem infima mi­
noria DS franceses que vivem a própria religião."
E' êste um conceito viperino, conquanto não menos
injusto que os precedentes; Num artigo de L'Illustra­
tion, d� 31 de março de 1928, GUILHERME FERRERO de­
'
clara sem embargos: "Os Santos se tornam dia a dia mais
raro$. Complacentes, lemos a história dêles, precisamen­
te porque no.s não encontramos, par a par, com êles, n a
vida diária." O escritor atribui êste desaparecimento
de Santos ao "declínio do espírito ascético." 2

(2) Eis como, desejando corrigir as coisas, mai-s as


agrava: "Um cético poderia afirmar que, se não mais
existem Santos e o esp írito ascético se acha em decllnio,
se deve isto ao nosso tempo, à época, ao século que dêles
não mais _necessita. Precisamente porque liá,_ hoje, mais
rquilibrio e mais nrdt>m no mundo, as abnegações su­
blimes de que os Santos eram modêlo, não mais se tor­
nam nt>cessárias. Este ponto de vista, porém, é por de­
mais simplista." E com razão! A questão, por outra
p:�rte, infi-rma a prf"'llissa maior .do argumento em aprê­
ço, isto é, que na realidade ainda existem Santos.

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8 A SANTIDADE CATÓLICA

Supondo-se exatas es-sas aventuradas afirmativas,


como poderíamos explicar a floração dos Santos que, fe­
lizmente, ainda sobreabundam'/ Poderiam, por acaso,
ser um índice de uma fé, de uma abnegação decadente, ..
de um poder santificador a declinar no ocaso'/
Como não deixa de ser acertada a observação do
Padre DE FoRES TA: "Lamentam-se alguns de que não
mais existem Santos! Eu, pelo contrário, encontro-os por
tôda parte onde me encontre!" Com efeito, para o s que
têm a possibilidade d e se pôr em contacto com as almas,
uma evidência vai abrindo caminho até êles , chegando,
por fim, a se manifestar plenamente: não somente é falso
qu. e diminui .o número de Santos, mas, pelo conrtrário,
nunca a s almas escolhidas foram melhores... Jamais
se sentiram prêsas de mais ardente desejo de um cris­
tianismo vigoroso, de uma sêde - para granrle número
delas, escolhidas nos mais diversos e variados ambien­
tes - de santidade do mais puro quilate, de uma santi­
dade que, mesmo entre as crianças, elevar-se-á até a nde­
lidade mais estritamente fiel e ao heroismo. a

A frase de ORfGENES tem ampla aplicação mesmo em

nossos dias: "Incessantemente levantam-se contra Jesus


falsos testemunhos e, enquanto a malícia se aninhar no
coração dos homens, ouvir..se-ão, sempre, acusações con-·
tra Ele. :f:l�, porém, cala, como outrora. Não responde por

(3) Freqüentemente aplicaremos o qualificativo de


Santo a pessoas de eminente virtude e sôbre as quais s e
não pronunciou, ainda, o infalível ditame da Igreja.
Não pretendemos, assim, adiantar-nos às suas sanções, o
que seria contrariar as determinações do Papa Urbano
VIII. Assim o fazemos, tão-sõmente, para nos exprimir
em linguage � comum. Existe, com efeito, uma santi d a­
d e canonizada, a utenti�da, glorificada por um ato ofi-

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INTRODUÇÃO 9

meio de palavras, mas se defende com a· vida de seus


verdadeiros discírpulos, que fala uma linguagem clarís­
sima." 4
As palavras, e'Videntemente, não são inúteis; não po­
demos, mesmo, prescindir delas e por isso nunca se lou­
vará assaz o esfôrço representado em volumes, coleções
c dicionários, para colocar a "Boa Nova" ao alcance dos

investigadores. No ·entanto, mais pujante do que a lin­


guagem do papel impres- s o é a da história vivida.
Pois bem, que nos dJz essa história vivida?- Assina­
lemo-lo com tôda sinceridade e lealdade. Indiscutivel­
mente, estas páginas só apresentarão um esbôço, nem se
buscará algo mais nelas. Nosso pesar de não ter podido
proceder senão a grandes traços ver-se-á minorado se o
leitor, depois de as haver percorrido, se sentir ·impelido
a -recolher mai- s amplas informações e decidir estabelecer
contacto pessoal e íntimo, seja com o código da santi­
dade católica para melhor o es� udar, seja com as bio­
gra-fias dos Santos católicos, a fim de recolher, de sen­
tir a alma vivente, por meio de referências autênticas e·
apropriadas.
A finaJidade dêste trabalho consistirá, pois, em mos­
trar:

cial do Magistério infalível, e que é a santidade em sen­


tido formal; existe, outrossim, uma santidade de apre­
ciação, conceito público, sôbre a qual a Igreja talvez
nunca se há de pronunciar e que, sem embargo, desem­
penha função preponderante na difusão da Igreja, em
virtude de seu poder de edificação e exemplo. ·o pró­
prio título dêste opúsculo exige que nos refiramos a êstes
gêneros de "santidade."
(4) Contra CELso. MIGNE, Patrologia grega, XI;
III; 29.

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10 A SANTIDADE CATÓLICA

1.0) Os meios que a Igreja Católica oferece a 5eus


filhos , em pleno século XX, para que alcancem a santi­
dade, a própria santificação.
' 2.0) De quanto são capazes êsses meios naqueles que
se decidem � emprcgú-los com inteligência e entusiasmo.
Em seguida a uma ligeira referência doutrinária,
numa evocação rápida de pessoas e feitos que desejaria­
mos fôs·se a mais .sugP.stiva, trataremos:
Da santidade católica em seus princípios.
Da .santidade católica em seus resultados.
PRIMEIRA PARTE

FONTES DA SANTIDADE CATóLICA

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'!'entan.do enumer:ar as riquezas sobrenatu­
rais com que, e m pleno século XX, como nos

demais, ,a Igreja brinda a cada um de seus filhos,


a fim de os -auxiliar a•se ·transformarem em
Santos, logo fere noss6s olhos o seguinte fato:.
a Igreja, cam vistas à santid.OOe, oferece a todo
cristão um ideal sublime, acompanhado de uma
regra segura, uma doutrirut de a.dritirável coesão,
perfeitamente adaptada às necessidades huma­
nas, assirn como auxílios de incomparável efiCá­
cia.

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CAPÍTULO I

Um ideal sublime e uma regra segura

"A SANTIDADE do Evangelho fala a meu coração",


confessaya JEAN JACQUES RoussEA!U. Muito
gentil é o grande sonhador ao fazer esta declara­
ção. Não é preciso que nos coloquemos entre os
espécimes menos valorizados da humanidade para
que nos sintamos dominados pela pujança santifi­
cadora do Evangelho, principalmente se o estu­
darmos e nêle· nos aprofundarmos, de acôrdo com
a interpretação autêntica da Igreja Católica.
Qual é, com efeito, o ideal da religião do Sal­
vador? Ei-lo : " Sê de perfeitos". Segundo que mo­
dêlo? " Sêde perfeitos como o é o Pai celestial".
Não se diz preciso procurar reproduzir a virtude
de tal ou tal outro Santo. Não, porquanto seria
isso, apenas, um trabalho de aproximação. Só de­
vemos reproduzir a santidade do próprio Deus.
E, como ·O modêlo se nos poderia mostrar co­
mo excessivamente elevado, tornou-�e visível a
Santidade invisível. A palavra tornou-se exemplo.
Cristo,. Verbo incarnado, virá mostrar-nos de mo­
do humano como imitar a Santidade divina :
"Quem vê a Mim v ê ao Pai." Olhando atentamen-
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14 A SANTIDADE . CATÓLICA

t e para o Filho e r·eproduzindo suas virtudes esta­


mos certos de seguir pela estrada da semelhança
com o Pai.
Por isso é que, ch'a ntada no imponente e trá­
gico cimo do Calvál'io, ergue-se para o mundo a
imagem de Cristo. Mas é preciso que sej a vista
de todos os lados. Porém, à medida que essa mes­
ma Cruz se afasta no t·empo, diluir-se-ão o amor
por Cristo e o desejo de os homens viverem d e
acôrdo com seus divinos ensinamentos ? Seria êsse
um êrro crasso, pois "mil vêzes mais 'amado, mil
vêzes mais vivo depois de sua morte do que nos
dias de sua carreira mortal, Jesus Cristo se tem
firmado de tal forma qual pedra angular da hu­
manidade, que a pretensão de .excn.Iir seu nome
do mundo seria destruí-lo ·em seus fundamentos."
A quem pertencem ·estas palavras testemunh-ais ?
Não por certo a algum orador s-acro e muito me­
nos a um Padre da Igrej a, mas ao próprio RÉNAN.
No século XX, como nos anteriores, do mes­
mo modo que em épocas pretéritas, manifesta-se
Nosso Senhor como o ideal sublime que polariza as
almas generosas. Quanto m'ais santa fôr uma vida,
mais dotada será de substância evangélica. Em
que consiste a santidade, senão na assimilação
mais perfeita possível da lição das bem-aventuran­
ças ? Não seria, por acaso, uma verdadeira voca­
ção para todos os cristãos -a imitação do Mest!'e?
Evidentemente, mas acontece que, enquanto a

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IDEAL SUBLIME E REGRA SEGURA '.15

-
maior parte se detém a meio caminho, os S antos
J>rosseguem até o fim. Cristo amou até o fim e
também êles querem alcançar o confiro extremo
do amor. Algum dêles terá preferências em prati­
car esta virtude e não aquela, insistirá em deter­
minado detalhe evangélico ou ponto doutrinai, en­
llUaiito outro s·erá do número daqueles que nos
manifestam os· milhares de exemplos que podemos
admirar. No entanto, em meio a tanta variedade,
predomina, sempre, um traço comum, wn amor
ardente pelo Salvador cuja imagem desejam re­
produzir o mais perfeitamente possível.
Isso, porém, não é tudo. A Igrej a propõe e·
exige do cristão que não só imit.e a Jesus, seu Sal­
vador, mas que sej a um como prolongam.entp de
Cristo, uma duplicação, uma reprodução viva. Em
uma palavra, que se torne " outro Cristo". Cristo,.
com efeito, fêz-s� um dos nossos, não somente para
nos salvar, mas foi além, fazendo de cada um de
nós algo dÊle mesmo : "Eu sou a videira, vós os
sarmentos." A videira total, - plenarium corpus
Christi- para empregar a frase de Santo Agosti­
nho, não é somente o tronco. Tendo 'por tronco
11 Jesus Cristo, sustentará os ramos enxertados no
único tronco divino, isto é, todos os cristãos ·em es­
tado de graça. Cristo, que possui a plenitude da
vida; foi cravado sôbre o l·enho sangrento, no cume
do Calvário. Pela àbertura de suas chagas fomos
enxertados n�le mediante o santo Batismo e com

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16 A SANTIDADE CATÓLICA

�le e por ltle fomos chamados a participar .da vida


do Pai, do Verbo e do Espírito Santo.
Nossa vocação será, pois, viver qual porção
mtegrante de Cristo, em quem o divino Salvador
desej a prolongar-se tão perfeitamente quanto-pos­
sível, usque ad perf•ection.em retatis phenitudin�S·
Clzristi.
Como traduzir isto tudo na prática ? O cris­
tão, para que sej a verdadeiramente mn discípulo
de Cristo, deve reproduzir o mais realmente pos­
sível ao próprio Jesus Cristo. A isso tenderá o
Santo. Bem sabe êle que não será possível imitar
a todos os atos externos do Salvador; mas, tam­
bém, estâ ciente de que isto não lhe é exigido. Es­
forçar-se-á, porém, a fim de adquirir tudo quanto
constitui a essência íntima do Salvador, isto é; sua
disposição de absoluta submissão a todos os dtse­
JOS do Pai. Com efeito, não é o Salvador aquêle
em quem o duplo amor pelo Pai e pela humani.,.
ciade encontrou fôrças para dizer eternamente:
.. Pai, irei e sacrificar-me-ei" - "Ecoe venio" -·e
que, no tempo, ratifica essa expressão et·erna ? �e­
lém é a primeira etapa dessa descida : ecce infans;
a Paixão, ecce homo, eis o condenado da tôrre An­
tônia e o Crucificado do Calvário; a Eucaristia, eis
:a Vitima ocult� a se oferecer incessantemente na
obscuridade do tabernáculo, ecc.e Agnus D.ei.
Como definir melhor o. Sai1t!l.,.§enão por esta
·
palavra? Um ecce vivo. Como C�isto, uma imo-

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IDEAL SUBUME E REGRA SEGURA 17

luçi'b permanente nas aras do amor. Bastava a


Cristo conhecer l.lm desejo ou uma vontade do
Pui para, imediatamente, cumpri-la. por amor, por
umor ao Pai e por amo! à, vontade do Pai e por
nossa. redenção. O Santo em tudo trabaTh.a, em
tudo se esforça por agi·r como · 9 faria Cristo se
t•�o�livesse em seu lugar. 0- verdadeiro problema
c·ristão não consiste tanto em reproduzir os feitos
de Cristo, o que; de ordinário, é impossível, mas em
fuzer o que Jesus Cristo faria se estivesse em nosso
lugar. Nisso nada há de fictício, é uni a purá rea­
lidade. Nós somos "outros Cristos" e será preciso
executar o progr�ma �onstante dêsse formoso ti­
tulo.
Deduz-se, de tudo quanto foi exposto, que o
cristianismo é a morte da. má-vontade. João, o
Precursor, dizia: "E' preciso ·que Cristo cresça e
que eu desapareça". O Santo pensa COJ;!!O João
Bati�ta;. o eu passa a um segundo plano e, aos
poucos, Cristo o completará, o encherá de. si mes­
mo. ..Por fim, não se aplicará, tão somente, a p ala:
.
vra de João Batista, como também-a fórmula de
Silo Paulo: "Já não sou eu quem ·vive. Nada de
meu resta em mim; em Paulo nada resta de Pau­
lo, em Pauio só exis�e Jesus Cristo e nada mais do
C(lle- Jesus Cristo". -Assim o Santo, à semelhança
ele Cristo, assimilou a :vontade do Pai no ·amor, de
modo que nada mais vê fora essa vontade. Não
mais existe : o SJUe pensa, o que �a, o que deseja
_
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18 A SANTIDADE CATÓLICA

não -interessa. " Que pensa, que deseja; que ama


Deus? - Isto I - Pois bem, Senhor, ei-lo I A todo
instante, enquanto lho permitir a natureza, dá tu­
do quanto Deus recla�a, do mesmo modo como o
fazia Jesus, para O agradar e com �le se parecer.
Brilhanteme�te afirma HELLO: '.'Santo é aquêle
que deixou de existir, suplan,tado que foi por Deus."
Compreende-se perfeitamente o sentido real desta
palavra. L; BERTRAND não fala diversamente ao
tra�ar de Santa Teresa : "Para· chegar a essa
posse d a única realidade, que é o único Amor, é
preciso entregar-se por completo a êsse amor, re­
nunciar absolutamente ao amor das criaturas.
Ainda mais : deve negar ês�e mundo sensível e in­
teligível com tudo quanto po ssui e que nos apri­
siona por todos os lados, atrever-se a dar êste salto
no vácuo, renunciar aos prazeres imediatos· e cer­
tos, ainda que sempre incompletos e entremeados
doe. sofrimentos, por uma felicidade longínqua, da
qual a fé, só a fé, se nos apresenta como garantia.
Mesmo quando se tem a certeza absoluta de não
errar, qual não é o heroísmo que esta renúncia de­
ve supor. Que audácia esta negação I Nisto con­
siste, precisamente, a santidade.

ldeál magnífico, não resta dúvida. Muitas fo­


ram as almas que se entusiasmaram por esta re-­
produção fiel e íntima do Divino Salvador, ávidas

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'
IDEA;f. SUBLIME E REGRA SEGURA 19

por gravar com a ponta de fogo de seu .amor, mui­


Jus vêzes, mesmo, com o sangue, êsse poema da
IIHHimilação perfeita com Jesus Cristo, iniciado sem­
JII'C com tanto empenho e nunca terminado, todo
l't·içado de dificuldades -sem conta e invencivel­
mcnte atraente.
No entanto,. como se faz mister recear o p·erigo
1lus ilusões, os exageros do personalismo, as }an­
lnsias mais ou roEmos quiméricas que se podem
nprcsentar e, 'assim, perturbar as melhores boas­
vontades, Nosso Senhor, ao lado do Evangelho, e
t.•om o fito de explorar ·eficaz e s.egurament•e tôdas
os suas riquezas, estabeleceu o Magistério da
Igrej a.
Ter..:se-ia dado . e definiçãl? completa d3: santi::.
1lude católica só com afirmar que a mesma consis­
le no Evangelho de Nosso Senhor, vivido do modo
muis intenso possível ? Não. Para que essa defi­
nição seja completa é preciso acrescentar que essa
vida evangélica deve ser levada sob a égide da
nutoridade competente da Igreja.
Imitação, reprodução .entusiasta e por amor. a
.Jesus Crucificado, de conformidade com os exem­
plos e preceitos qu� �le nos deixou, ·pois Cristo é
llUem abre o caminho às mais audazes generosi­
dades e às mais elevad'3.s aspirações. Fidelidade,
KUbmissão respeitosa e dócil à Igreja. Sem dimi­
nuir elll: nada o·entusiasmo e as audazes virtudes,

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20 A SANTIDADE CATÓLICA

nos serve d e precaução . contra o iluminismo ou


contra J!.S infantis especulações de um Salavino. 1
Mas, possuiria d e fato o Evangelho, em 'si mes­
mo, tudo quanto é necessário para a formação dos
Santos ? Sem dúvida alguma, mas o Evangelho
deverá ser vivido e p�aticado por indivíduos hú­
manos, dotado, cada um, de temperam·ento próprio,
de sentimentos ·especiais, de coeficiente próprio de
entusiasmo. É , pois, necessária uma regra viva, ao
mesmo tempo dúctil e rígida a fim de seguir, no
detalhe das realizações evangélicas, as boas-vonta­
des humanas, sempre suJeitas, máxime quando de­
sejosas do bem, a interpretações ousadas, a atitu­
des imprudentes, a excessos arriscados. Para
quem se detiver um instante a refletir, o Evangelho
há . de lhe sugerir sem a menor dúvida a idéia da
Igrej a. Para que sua Igrej a se mantivesse pura e
incólume, Jesus Cristo quis um Magistério com­
petente e infalível, previu um Vigário, chamou a
Pedro. De muito pouca utilidade teria sido o
Evangelho sem uma autoridad·e à qual fôsse con­
fiada a sua aplicação. A fragmentação das seitas
protestantes é uma prova manifesta que vem cor­
roborar esta afirmativa.

(1) Obras de RoLANDO DoRGELÉS e de JoRGE Du­


HAMEL, em que \Se apresentam "santos" que não mostram
nenhum traço comum com os Santos autênticamente ca­
tólicos.

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IDEAL SUBLIME E REGRA SEGURA 21

E que faz a Igreja? Adaptaria a !ileus interês­


ACS o Evangelho? Seria isso um sacrilégio! Mo­
flificá-lo-ia então? De modo algum. Não lhe mo­
·clificará nem uma vírgula sequer. Pelo contrário,
esforçar-se-á - e nisto consiste sua magnífica fun­
�·íio, a única função, poderíamos dizer - por de­
l·crminar, de acôrdo com as necessidades e em to­
do momento; onde se encontra a verdade do Evan­
uclho. Aos que pecam por deficiência a Igreja,
Jncansàvelment·e e, custe. o .que custar, recordar­
lhes-á as exigências evangéHcas: há de prefer�r,
mesmo, a renúncia à conversão de todo· um povo,
um país, antes do que .diminuir, mesmo no míni­
mo, o rigor do sexto mandamento. Pelo contrá­
rio, aos que pecam por excesso. a Igreja há de lhes
(�hamar a atenção para a retidão ·necess�ria: nem
o montanismo que condenava o Matrimônio, nem
o jansenismo que tornava inaces
. sível a Comu­
uhão, obtiveram sua aprovaçã� e, mesmo que
fôsse obrigada a repudiar muitos de seus filhos,
haveria de os condenar a fim de permanecer in­
teiramente fiel à doutrina autêntica do verdadeiro
Evangelho.
_

Que teria sido do Cristianismo no decorrer


dos séculos, se não houvess·e existido a Igreja a fim
ele condenar as falsas interpretações de um Ario
ou de um Pelágio, de .um Jansênio ou de um La­
mennais, para condenar o qujetismo de uma se­
nhora Guyon ou o modernismo de um Loisy, para

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22 A SANTIDADE CATÓLICA

cont-er as intempestivas in--vestigações do " mara­


Yilhoso " na piedade, certa estranha inclinação até
o preternatural, para desmascarar uma filosofia
corrosiva do dogma e que muitas vêzes, sob apa­
rências especiosas, expõe a alma a graves ·riscos ?
Desde o momento em que Ela intervém os que se
vêem desmascarados, principalmente se privados
de sentimento cristão, acham pesadíssima a mão
da Igreja.
Não se dá assim, no entanto, porquanto mater;.
na é a mão da Igreja e com o andar dos anos, os
mesmos que mais abertamente se revoltaram contra
.ela e, na falta dêstes, os historiadores leais e since­
ros, devem reconhecer ql.Le a Igreja estava com a
razão. ,
E não seria esta, por acaso, a história que se re­
pete cotidianamente?

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CAPÍTULO 11

Doutrina de coesão e adaptação admiráveis

EMteseguida ao caráter divinamente transcenden-


da Religião de Nosso Senhor Jesus Cristo o
<JUe mais impressiona é sua perf.�ita coesão e o cla­
rividente equilíbrio dos vários pontos do dogina, • a o
mesmo tempo que sua surpreendente adaptação às
exigências da mais estrita psicologia.
Principalmente o equilíbrio. Eis, com efeito,
entre outros, alguns pontos : a Igreja proclama as,
benemerências do. sofrimento e da dor, reclaman­
do ao mesmo tempo uma alegria incessante. Pro­
fessa a absoluta igualdade de todos os homens e
mantém a desigualdade fundada na propriedade e
no poder. Exalta e defende a libe�dade, ao mes­
mo tempo que limft a essa mesma liberdade. Com­
bate as pretensões desmedidas da :razão enquanto
aprova suas legítimas aspirações, reivindicando os
(lireitos soberanos da razão. Prega a integridade
c a inamovibilidade da Revel-ação ao mesmo tein­
po que se empenha por se adaptar às contingências
da vida.
Na Igreja tudo é de tal modo ·entrosado que se
torna impossível variar um mínimo sequer da dou -

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24 A SANTIDADE CATÓLICA

trill'a, sem que desmorone todo o .edifício. Poderia


parecer que, às vêzes, fôsse inútil, sem importân­
cia, determinado detalhe ; mas, retirada essa pedra,
não mais se sustentará o pilar. Na maior p arte
das filosofias estranhas ao Evangelho, um sem
número de teses sãQ perfeitamente reversíveis e,
sem menoscabo do conjunto, poder-se-ia adotar a
contraditória das atitudes aceitas. No catolicis­
mo, p elo contrário, o todó se acha de tal forma re­
lacionado, que um detalhe representa a base de ou­
tro, um "vazio " corresponde a um " cheio ", pre­
cisamente o mesmo que ocupa êsse lugar por­
quanto nenhum outro poderia substituí-lo.
Isto, contudo, não diZ�er que todos os elem·en­
tos ·da doutrina gozem .de um mesmo gênero · de cer­
teza. No que se refere ao dogma é preciso distinguir
o que é simplesmente próximo à fé do que não pode
ser julgado ou discutido sem grave temeridade.
Pois existe todo um escalão de proposições. Afir­
mamos que cada uma das teses, no lugar que ocu­
p a e com a ·oerteza que lhe é própria, é exatamen­
·
te a tese necessária. Dizê-lo mais ou menos, ou
afirmá-lo de outro modo, não seria bem exato, pois
isso implicaria num êrro.
Em certas ocasiões - e é êsse o ponto de par-,
tida de todos os cismas ,e heresias - vê-se surgir
Jima doutrina que por vêzes, momentâneamente,
poderia parecer mais ampla ou verdadeira do que a
atitude católiéa : s ej a, por exemplo, todo constran-

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DOUTRINA DE COESÃO E ADAPTAÇÃO ADMIRÁVEIS 25
--

�imento em matéria educacional ou, em matéria de


erenças, o livre exame. �sse Galileu crucificado· é
excessivamente austero e pedimos um chefe mais
omável. .. Em que consiste o dogma do pecado ori­
ginal? A orig�� da humanidade est� isenta de
-
([ualqu�r mancha! Mesmo sem ter >em conta o va­
lor da verdade na discussão, aguardemos o julga:
mento da experiência e da vida: tudo isso não se
enquadra nas exigênCias de nosso destino. Exis­
te algo q�e não se ajusta; ali se· ·não encontrará,
s�m dúvida, '3. verdade.
Não somente coerência perfeita entre os d.iver­
sos pontos da doutrina, como perfeita adaptação
u psicologia huma,na. Esta, além disso, não é a �e­
nor das belezas .do catolicismo, pois, transcenden­
l·c como é, o catolicismo é a máis humana das reli­
giões. "É certo - exclamaV'3. o Padre AUBRY 1 -

que o cristianismo foi instituído para o homem, e


êste, para o cristianismo, assim como ambos pelo
mesmo Autor". ]j:ste mesmo conceito foi repetido
por um autor.moderno a propósito dos Sacramen­
tos (dos quais havemos de tratar mais adiante, mos­
trando-os quais -agentes os mais eficazes para nossa

( 1 ) Professor no Seminário Maior de Beauvais e


d�poi-s Mi.ssionár.io na China, onde morreu na mai�r mi­
séria em 1882. Deixou algumas obras; ainda que pouco
<:onhecidas, mas de in-estimável valor. Seu livro O Ra­
tiicalismo no SacrifíCio acaba de ser ;reeditado, assim
como muitos de .seus escritos.

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26 A SANTIDADE CATÓLICA

santificação) , dizendo que os mesmos "realizam


esta adaptação do divino e do humano, o que cons­
titui a obra-prima da Igreja e a causa essencial de
seus êxitos". .......
Recordemos neste ponto, destacando sua verda-
deira importância, como o programa de santifica­
ção oferecido pela Igreja Católica é adaptado e
adaptavel às necessidades e aos anelos essenciais
do composto humano, trate-se do corpo ou da al-
ma.

A Igreja - ouve-se falar repetidas vêzes


vota um ódio mortal ao corpo, pregando a necessi­
'
dade do cilicio, do j ejum, da discipIina.
É isso certo; não, porém, como se essas peni­
tências constituíssem um fim em si mesmas, mas
qual meio que, por conseguinte, há de ser empre­
gado na medida das_ necessidades, isto é, enquan­
to útil. Haverá alguém que ousará negar a ser­
ventia dêsses meios para a grande maioria, no meio
das desordens e exigências da sensualidade ? Ha­
veria alguém capaz de sustentar, nesse caso, que
-
seria inconveniente ou nocivo o uso dêsses meios ?
A Igreja, sem dúvida, prefere a alma ao corpQ
e, S'endo o caso, permite e mesmo exige o martírio.
Opõe-se, no entanto, ao duelo, à guerra injusta, ao
suicídio. Luta, e suas armas são as únicas efica­
zes contra o terrível fator de debilitação dos cor-

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pos que é a dissolução, exigindo honestida\Ie de vi­


do. e a ;mais absoluta pureza. Não se opõe -ao de­
�envolvimento harmônico do corpo, mas põe-se em
guarda contra o excessivo cuidado do corpo: culto
da carne, exibi�ões escandalosas, costumes degra­
dantes.
Não fêz Jesus, de tôda a .vida, um verdadeil'o
Calvário, e a Igreja não glorificou a austeridade
como o meio de santificação por excelência?
Quando Nosso Senhor Jesus .Cristo fala em
carregar a cruz, refere-se à abnegação necessária
para realizar em todo o sempre a vontade de Deus.
Está claro que a gravidade da obrigação será pro­
porcionada à importância dessa vontade divina.
Quebrantar um desejo divino de importância cons­
titui falta gràve, e venial, se o mesmo querer fôr
de matéria leve. Quando se não tratar de ·uma
ordem, mas de simples desejo, a infração :não mais
se deno�inàrá pecado, mas, simplesmente, imper­
feição. O Santo chega a evitar até a imperfeição,
enquanto lhe e possível.
A rigor, p-ara se não P'erder a graça, torna-se
nbsol�tamente indispensável a fidelidade em todos
os assuntos que implicam matéria grave. A Igre­
ja relaciona as exigências divinas na medida em
que a graça é. concedid-a a cada um. Nem tudo
comporta uma obrigação igual para todos, -ou me­
lhor, o tudo é para todos; mas a Igreja não impõe

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28 A SANTIDADE CATÓLICA

a todos, de modo igual, as exigências divinas.­


Com a reserva de um mínimo que será sempre in­
defectivelmente guardado, a saber, o estado de gra­
ça, abre-se o �ampo a tôdas as formas de generosi­
dade: omnes quidem currunt, non omn�s accipiunt
bravium. Existem os que correm à vanguarda; ou­
tros, em grupo; e finalmente alguns que seguem
na retaguarda.
Não deve causar espécie, portanto, que a Igre­
ja esHmule em todos a prática da austeridade de
vida e, para as ::limas mais generosas, os rigores da
'
penitência. Nós 'todos hav·eremos de viver a vida
da graça no meio do mundo pecaminoso. A bês­
ta selvagem que�e denomina concupiscência po­
derá despertar quando menos esperada: "üadà
um de nós l·eva, nos lábios, com a possibilidade
de o dar um dia, o beijo de Judas" 1• Não é êste
um argumento suficiente para legitimar a virtu­
de e as práticas de penitência. Acrescent-emos
ainda que, constituindo a Igreja um Corpo único,
é conveniente que muitos excedam a fim de equili­
brar �ssim, de certo modo, a indolência dos que
não trabalham suficientemente ; é preciso que al­
guns se privem de algo necessário para compensar
os que abusam do supérfluo. Torna-se necessário,
também, reconhecer que ...a prudência da Igreja

(1) MONSENHOR BENSON,

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nunca deixa de intervir para suavizar as práticas


c1ue se tornaram ex�essiv�ente penosas 2•
Por outra parte, a lgreju sabe perfeitamente
CJUe a aus�eridade tão pouco mal provoca no cor­
po, que os conventos opde maiS' rigorosa é a disci­
plina mantêm o recorde de iióngevidade de se).ls
membros. O cilício ocasiona menor número de
morte ·io que o dancing. Além disso, o esporte,
n moda, não têm exigências draconianas? Por
C(Ue, então� clamar quando a Igreja fala em morti­
ficações e calar, não ligar a nenhum dos r idículos
.
c daninhos caprichos .du moda, aos atavios anti­
higiênicos e aos jogos ·que exigem indumentária
sumária, não obstante os rigores do ambiente?
Ain�a que exija sempre que a alma exerça
sôbre o corpo, seu irmão, uma supremacia domi­
nadora e continuada, long·e está u Igreja de olvitlar
n frase que ela mesma sug.eriu a Pascal: "Quem
C(Uiser ser anjo, deverá ser animal", assim como não
cleixou de incriminar de modo constant·e, como in­
.
clign a dos homens, a espiritÜalidade exagerada que
medrava com a parte inferior do homem. E não
�ó defend•e 'a Igreja os restos humanos contra a pr�­
fanação da cremação, como também venera as re­
llquias. Pura ela o cemitério não é um_ local de

(2) Veja-se isto mais detaJhadamente em L. DE


GnANDMAISON: La Réligion Personnelle, c. IV; L'Effort
nscétique e, em particular, p. 122, texto e nota. (Gabalda. )

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30 A SANTIDADE CATÓLICA

apodrecimento - putneoli - conforme o cruel con­


ceito pagão, mas, como o diz a palavra, um lugar
•em que, reunidos os defuntos num "dormitÓrio"
comum, aguardam o chamado da ressurreição.
O programa da santidade católica adapta-se
perfeitamente às exigências do càrpo, tanto como.
às legítimas aspirações da alma.
Tomemos por exemplo três grandes prob!e­
mas: o do amor, da propriedade, e o da liberdade.
Ao falar do problema. do amor, ref•erimo-nos
ao amor conjugal, fundamento da famíiia.
A Igreja oferece ao cristão uma concepção
magnífica do amor humano. De modo algum pre­
tende entravar o amor; mas o r-egula, reclaman­
do para êle a unidade e a indissolubilidade. Esta
exigência que à pr:lmeira-vista poderia parecer ex­
cessivamente austera para a natureza, confere pelo
contrário a essa mesma natureza uma liberdade e
responde cabalmente à verdadeira noção do amor.
Aquêle que ama, ·ama de modo exclusivo: unida­
de. Quem ama, ama eternamente: indissolubili­
dade. Um amor dividido deixa de ser amor; um
amor que reserva a si próprio algo de si mesmo,
deixa de ser amor. Se há duas palàvras que o amor
modula e coloca por sôbre tudo, sob pena de se ani­
quilar, são, precisamente, "só a ti" e "sempre".
Para o cristão, no entanto, o. Matrimônio não cor­
responde únicamente a um contrato, mas é além
disso um Sacramento, isto é, um rito produtor da

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DOUTRINA DE COESÃO E ADAPTAÇÃO ADMIRÁVEIS 31

graça divina. Por êle, o cristão não será tão só­


mente um gerador da vida humana, mas também
um produtor da vida sobre-natural. O cristão, tô­
da vez que produz qualquer obra de vida, obede­
cendo aos preceitos divinos, intensifica em si mes­
mo a vida "divina e o ato que realiza tornu-se digni­
ficado com todo o simbolismo que encerra, tendo
o l\'iatrimônio a missão de nos comunicar, a nós
que ��mpre temos necessidade do sensível, a ima­
gem visível de uma união muito mais formosa, mas
que se realizu na esfera do invisível, isto é, a união
divina com cada uma de nossas almas pelo estado
de graça, a união de tôdas as almas em Cristo pela
vida nêle ·mesmo.
" O cristianismo --:- escreveu alguém, em nada
suspeito de parcialidade para com a doutrina da
lgreja, Proudlwn - fixou o conceito do amor cas­
to, do verdadeiro amor; concebeu a mulher não
mais como t1. associadu do homem, nem sua igual,
mas como parte indivisível da pessoa humana: Os
ossibus meis tet caro ex carn:e m ea, - -osso de
1CX

meus ossos e carne de minha carne;"- traçou uma


distinção entre o amor conjugal e os outros umôres:
enquanto o índio o confundia com o amor frater­
no, e o árabe o colocava em posição inferior ao
concubinato em razão da poligamia e da escravi­
dão, e o romano o assimilava ao amor paterno na
lei que fazia com que a mãe partidpas&e da suces·
são com parte igual a cada um dos filhos, o cris-

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A SANTIDADE CATÓLICA

tianismo revelou ao mundo a forma mais subiime


do amor na virgindade voluntária que não é, con­
fonne o ensinamento da lg:reja, outra coisa que a
união míslica da alma com Cristo i .•

Falando do Matrimônio cristão, Gonzaga Truc 2


que não é crente, não vacila em afirmar: "A Igre­
ja deu um golp·e de mestre com o restituir à fa­
mília êste valor sobrenatural, cuja l·emhrança Q.a­
via sido abandonada pelo costume e pela de,arada:.;.
ção dos cultos antigos. Transformou o mais ou­
s_ado dos contratos numa instituição sobrenatural
e, mediante o elemento divino, deu sol·idez a um
pacto que a natureza tende .a rescindir logo após
o haver feito. Abençoou e consagrou o encanto
passageiro que atrai reciproca·mente os dois sexos;
santificou o ato conjugal; inter.essou o próprio
Deus na conser.vação social concedendo aos esposos
e à descendência virtudes morais, conferindo-lhes,
além disso, a perpetuidade. Todo desejo, tôda von- ·

tade humana são fugazes, máxime quando relativos


ao amor. A sociedade não obteria a segurança da
união dos esposos com a argumentação de que ela
mesma necessitava dessa união. Na realidade, é
próprio do Ma-trimônio católico e a êle exclusivo
(1) PROUDHON, Systeme des Contradictions écono­
miques, ou Philosophie de la Misêre, t. li, Guillaumin,
1846, p. 495.
(2) Num volume -sôbre Los Sacramentos no qual
podemos assinalar mais de ruma afirmação discutível.
(Alcan.)
·

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DouTRINA DE COESÃO E ADAPTAÇÃO ADMIRÁVEIS 33

por fôrça de sua origem divina, subtrair os esposos


à crueldade de um egoísmo invencível para os unir
na busca de um beii\ comum superior, assim como
falar do porvir, a propósito do mais indelével dos
vínculos".
Formoso que seja o conceito do Matrimônio
cristão e por mais santificador que seja êsse •esta­
'do'para quem tenha intenção de·assumir-com leal­
dade as responsabilidades que êle acarreta, como
estrita fidelidade conjugal, uso legítimo, abnega­
ções paternas,- a Igreja, para os que anelam por
uma existência virginal, oferece um ideal de perfei­
ta castidad_e. Existem Santos que foram casados,
Santos no Matrimônio, mas bem mais numerosos
são os que sé contain no estado virginal. As iildi­
(·ações que mais adiante apresentamos no-lo mos­
trarão de modo evidente.
Um ponto particular a respeito do qual. as exi­
gências da Igreja Católica são taxadus de desme­
didas pelos seus adversários é o Celibato ecloesiás­
!ico. Vejamos como sôbre o sacramento da Ordem
se exprime o citado escritor e cujo critério e julga­
mento sôbre o Matrimônio vimos ser tão perfeita­
mente fundado: "Pertence à essência da função
sacerdotal tratar dÔ divino- elevando-se em razão
dêste niesmo contacto - e subtrair-se ao terreno,
orientar os costumes, cural' as almas, administrar
assuntos nos quais não seda capaz de int•ervir. :É
possível que cumpra muito mal suas obrigações e,
mesmo, é possível que seja indigno de sua missão;
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34 A SANTIDADE CATÓLICA

mas; apesar disso, será, naturalmente, o melhor


entre- os melhores e, delegado do céu, o primeiro
por sua posição e influência,.. sal da terra como o
declarou s-eu próprio Fundador.
Aos que pretenderem atacar o Celibato ecle­
siástico revidamos com esta sábia resposta: "A
incompreensão da maior parte dos leigos a êste
vespeito sobrepassn tôda medida. Mesmo sem ter
em conta que a mais elementar delicadeza inibe
do contacto com a Divindade as mãos que podem
tocar uma mulher e que o sacerdot-e casado é,
verdadeiramente, uma falta de bom senso, quem
se não aperceberia de como um pastor, pai de
fanúlia, apesar de parecer mais próximo de suas
ovelhas, perde, realmente, muito d·e sua autori­
dade ante as mesmas? Igualado ao comum _dos
mortais corre o perigo de condividir -suas infe­
licidades; reintegrado na massa comuin decai e
se anula. O sacerdote católico, pelo contrário,
pôsto em evidência em virtude de sua posição
social, só poderá infundir respeito."
Em seus ensinamentos com referência ao em­
prêgo dos bens da terra, como é sábia a Igreja,
,e como sabe conciliar a transcendência com oa
prudência I
Ao contrário das doutrinas socialistas, não
condena de modo absoluto a posse da proprieda­
de privada por mais considerável que se suponha.
A riqueza em si mesma não tem nenhum cunho

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DOUTRINA DE COESÃO E ADAPTAÇÃO ADMIRÁVEIS 35

imortal. O rico terá obrigações, deveres de jus­


tiça e deveres de caridade: o que lhe pert.ence
não é certamente para êle iznicamte:nbe. Mas, ao
mesmo tempo, também tem seus direitos, entre
os quais o principal é o de possuir e fazer fruti­
ficar seus bens uma vez legitimamente adquiri­
dos. Ao mesmo tempo, a quem possui riquezas
a Igreja o obriga a ser-lhes superior e que se colo­
que acima de seus tesouros e que não ligue, não
pre11da o coração à terra, a fim de manejar, usar
de seus bens como se os não tivera; em uma pala­
vra, a Igreja exige dos ricos que desprendam o
espírito de todo apêgo aos bens. .Não satisfeita
com exigir de todos esta pobreza de coração, glo­
rifica de modo extraordinário a pobreza voluntá­
ria. "Que devo fazer, Senhor, para alcançar a
perfeição? Já observo a lei, mas desejo ir além.
Que me aconselhais?"- "Vai, abandona teus bens
e segue-me." E assim, no meio de um mundo que
só vê o brilho do metal •e que em carreira desen­
freada se lança à posse dos bens terrenos, a Igre­
ja, mesmo reconhecendo nestoes bens uma justa
razão de ser e reivindicando para todos a lei do
trabalho, cuja grande finalidade humana é a me­
lhoria da condição comum da humanidade, assim
mesmo, proclama a superioridade do desprêzo das
riquezas, entoando loas à pobreza.
Resta-nos, agora, considerar .o maior bem que
enobreoe o homem: a liberdade.

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36 A SANTIDADE CATÓLICA

Que uso da liberdade a lgreja exigiria de


seus filhos, a fim de que os mesmos se santifi­
quem?
Que nunca venha a conspurcar, como se fôra.
escravo, o que vem a caracterizar sua condição de
homem: assim será proibido o hipnotismo e con­
denado o temor s·ervil. Na obediência não se deve
olhar para a pessoa cuja autoridade está a se im­
por, mas ao próprio Deus. Obedecer a uma cria­
tura constitui vil servilismo: só é grande quem se
dobra unicamente diante de Deus e que, no depo­
sitário da autoridade, seja quem fôr, sabe desco­
brir o próprio Deus.
A Igreja s·empre reivindicou os direitos sobe­
ranos da vontade livre, defendendo-a de todo
determinismo. Sustentou contra Calvino e os jan­
senistas que a salvação ou a condenação do ho­
mem qepende dêle mesmo, e nunca de bárbara
e fatal predestinação qu� faria de Deus um ver­
dugo e do homem um autômato. Contra as afir­
mativas do naturalismo e do sensualismo sustenta
que o homem não é prêsa dos instintos; que no
meio dos mn.iores desenfreias pode, querendo e
auxiliado pela graça divina, _que nunca lhe é ne­
gada, evitar à mal e praticar o bem, isto é per­
manecer ou: tornar-se Santo. Por outra parte,
dado que o cristão necessita de uma vontade fir­
memente fundada para permanecer bom� seja
em razão do pecado original, seja pelos erros

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DOUTRINA DE COESÃO E ADAPTAÇÃO ADMIRÁ�EIS 37

pessoais da liberdnde depravada que dá origem


ao hábito, seja também pelas mil ocasiões exte­
riores, a Igreja, notando isso tudo, não cessa de
trabalhar pela educação da vontade. Que são os
Exercícios Espirituais .de SANTO INÁCIO, o Comba te
Espiritual de ScúPOLI, a ascética cristã, senão um
código, uma série de ensinamentos e procedimen-·
tos para que o homem aprenda a se vencer, a
ceder, a I'eceher em si mesmo tôda n ação de Deus
Nosso Senhor? Além disso, exigindo um máximo
de esfôrço pessoal, a Igreja nunca deixa de ter
bem em conta que o hom•em, entregue a si mesmo,
nada pode fazer. Contra todos os pelagianismos
proclamou que, pri_vados da graça, os homens não
podem coisa alguma e contra os semi-pelagianos,
até a simples possibilidade de entrar nessa OI"dem.
Com suma exatidão psicológica Santo Inácio ex­
prime ê-sse ponto afirmando: "No momento de
agir, fazer com que o trabalho dependesse i:mica­
mente de mim, e -em s·eguida à ação proçeder como
se tudo dependesse de Deus." Impossível se
torna, pois, reivindicar de melhor modo a abso­
.
lurn soberania dos direitos divinos e a autonomia
soberana do livl'e arbítrio.
Ao cristão que deseja escalnr os cimos da
santidade, a Igreja não proíbe o uso das rique­
zas; mas ·exig·e o desapêgo afetivo das mesmas
e louva a pobrezn efetiva nos que a procuram.

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38 A SANTIDADE CATÓLICA.

Ao cristão que desejar a santidade, a Igreja


permite que manl'enha afetos humanos legítimos;
mas nos que se sentem capacitados em o fa��r e
preferem conservar-s•e virgens, louva a renúncia
às alegrias do lar, aos gozos da paternidade e da
maternidade.
Ao cristão que procura a santidade no terreno
das liberdades a Igreja permite a autonomia pes­
soal uma vez que o homem se submeta às leis
divinas, ainda que ela não deixe i:le reconhec-er
haja algo de mais glorioso para Deus do 'que o
exercício continuado da liberdade, a saber, o ofe­
recimento, por ato absolutam�nte livre, dessa
mesma liberda�·e, num compr?misso de obediên­
cia aos superiores legítimos. Como se não cx:iti- ·
·cou a Igreja por ter tolerado, aceito e aprovado
o voto de obediência ! Diminuição da personali­
dade, vociferam os pretendidos corifeus da liber­
dade humana. 1 Na realidade, o voto constitui
uma entrega magnífica e o mais formoso \mprê­
go da vontade humana. Se se tratasse de um
vínculo para o mal, ou em têrmos absolutos e sem
reservas de •e spécie alguma, poderíamos convir
com a imoralidade do voto de obediência; mas
ligar-se livremente sôbre pontos bem determina-

(1) Consulte-se a êste respeito o artigo Voeux no


úl!irno fascículo do Dictionnaire Apologétique de la Foi
Çatholi Cfue. (Beauchesne,)

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00UTR�A DE COESÃO E ADAPTAÇÃO ADMIRÁVEI'S 39

dos, res·ervando-se a , própria independência em


múltiplos aspectos com vistas ao bem, poderia
haver algo de mais confonne ao desenvolvimento
do ser humano? Por outra parte, nada se vê des­
prezado por êle; nunca os claustros anularam a
personalidade humana e, pelo contrário, quantos
não foram os que à sombra dos conventos pude­
ram ter pleno e total desenvolvimento I Santo
ToMÁS DE AQUINO ·era monge, assim como são
FRANcisco XAVIER, e como êstes, infinitos Missio4
nários, Irmãs · de Caridade, e Apóstolos da "juven­
tude ! Nunca se soube que o vo!o de obediência se
opôs, por menos que fôsse, ao desenvolvimento
de vigorosa p·ersonalidade. Aliás, haveria tanto
empenho no seguimento da vida religiosa, se a
mesma não produzisse a não ser entes. insignifi4
c:.antes e defidentes? A verdade nua e crua é que;
tendo renunciado de um só modo a tudo quanto
significa um impedimento, o religioso se sente
muito mais livre para as nobres funções· que as­
�ume. Como o soldado debaixo das ordens de
seus chefes, sempre se encontra disposto a correr
ao lugar que lhe é indicado a fim de estender o
Reino de Deus. Assim é o religioso o ser verda­
deiramente livr·e, ao passo que o mund_o e suas
tiranias engendram os verdadeiros escravos. Não
invertamos os papéis. Servir é reinar, .e quem
mais se. empenha em melhor servir, mais glorio4
sa:Qlen�e há de reinar.

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CAPÍTULO 111

Auxílios de singular eficácia

OFERECER uma doutrina rica em poder de san-


tificação, um ideal sublime a se harmonizar
com uma perfeita compreensão do ·ser· humano,
é bastante, é muito. Isto, porém, não seria sufi­
ciente se a Igrej a Católica não proporcionasse, ao
mesmo tempo, os auxílios requeridos para alcançar
essa vida de santidade que ela mesma propõe.
tsses auxílios existem e atuam eficazment•e naque­
les que os sabem empregar com retidão e ânimo.

O primeiro dêss·es meios é a oração : oração


pessoal e culto exterior.
Com referência à primeira, é de todos conhe­
cido o formoso trabalho - p ublicado com êss·e
título - do Padre LEôNpo DE GnANDMAISON 1, cuja
autoridade já temos invocado.

( 1 ) �ós também tratamos de mostrar as inefávei-s


riquezas da oração.
Vejam-se os dois pequenos volumes Como Orar Sem­
pre e Como Orar Bem, editados pelo Apos-tolado-- da Ora­
ção de Tolosa.
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AUXÍLIOS DE SINGULAR EFICÁCIA 41
(J
.

É d·ever do homem render um culto a Deus;


não fazê-lo seria desconhecer uma função �a
mais nobre de sua condição de criatura.
Além disso, a oração é uma necessidade para o
homem, uma tendência espontânea de seu ser, o
grito do necessitado que se sente dominado por
alguém que é mais Rico, mais Forte, Maior.
Não se julgue que a oração seja, unicamente,
um� súplica e um pedido. O pedido não é senão
um pluno inferior como o ensina o catecismo :
oração é a elevação da alma a n.eus para O ado­
rar, lhe agradecer, lhe implorar o perdão e pedir
as graças de que necessitamos. Ordinàrirunent•e,
porém, pela súpliC'a se alcançam as formas mais
elevadas e, note-se, a mais formosa dentre tôdas,
a oração desinteressada, a oração de adoração e
louvores.
Por outra parte, não devemos rezur tão-so­
mente por palavras (oração vocal) , mas coní nos­
sa atividade total, orienta�a para Deus péla pureza
e retidão de " intenção" (oração vital) . A ornção

por excelência, no entanto, aquela em que se alcan­


ça o máximo de união com Deus, é a oração men­
tal, ou melhor, " cordial". Sem receio de um
desmentido podemos impor esta regra absoluta :
aquêle ·que diàriament·e consagra algum tempo à
oração _: é excusado dizer que devotamente e em
tempo prolongado - êss� homem, se ainda não
- • ' I

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42 A . SANTIDADE CATÓLICA

é Santo, já se encontra, pelo menos, no melhor dos


cami:p.hos em demanda da santidade.
A oração é sempre acompanhada pelo culto
exterior ou público. " O P,omem - disse um humo­
rista - é um composto de corpo e alma, mas,
sobretudo, de corpo. " Isso é falso, pois deV'emos
dizer que é composto, sobretudo, de alma. Por
isso é que Nosso Senhor insiste n� idéia de que
o verdadeiro culto é um culto 'em. espírito e yer­
dade. O homem, porém, possui também um corpo
e por isso podemos v,er como o protestantismo en­
cerra, em si, um êrro psicológico. Necessitamos
ver •e tocar, sentir e imaginar; a Igreja é boa mes­
tra para deixar d·e of.erecer ao cristão, como ins­
trumento, meio de perfeição, cerimônias exteriores,
um culto comum e público e uma Liturgia. Não há
a menor dúvida d,e que o ess•encial é a alma, as
disposições da alma; mas ,esta reclama um auxí­
lio e sente a necessidade de se manifestar por for­
mas exteriores.
Muitos, sobretudo hoje-em.-dia, encontram, no
culto •externo da Igreja, um · recurso maravilhoso
para se elevarem a Deus ,e muitas são as almas
na Igreja Reformada (Protestantismo) que pro­
curam voltar a possuir o que com imperdoável
leviandade os iconoclastas contemporâneos de Huss
e Wiclef destruíram como se fôssem coisas absolu­
tilmente inúteis. Não_ seriam singularmente signi�

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AUXÍLIOS DE SINGULAR EFICÁCIA 43

ficativos a êste respeito as recentes dis.c ussões


inglêsas acêrca do Prayer book ? (O livro-de::-ora­
ções oficial do anglicanismo.)
No entanto, além dessas cerimônias cujo valor
imponderàvelmente santificador se firma no fato
de colocar-nos em contacto com as realidades inv-i­
síveis, ·de simbolizar os m:lstérios da vida ,e morte
)

de Nosso Senhor, os ritos dotados de particular


·eficácia para fazer do cristão que o desej ar um
Santo, êss·es ritos são os Sacramentos.
Nos Sacramentos se compendia uma verda­
deira maravilha. O homem é pobre, mau e en­
contra-s·e exposto a inúmeras quedas. Deus quis
auxiliá-lo e, em cada momento decisivo de nossa
vida, um rito, instrumento de graça, intervirâ pon­
do a nossa disposição o socorro necessário para
ser enfrentada a nova situação.
A seu ingresso na vida, oa lgreja recolhe o
recém-nascido e o convida ao Batismo. Nascido
à vida humana, deverá renàscer à vida divina.
Pelo pecado de Adão, o demônio adquiriu di­
reitos sôbre essa cdatura, pelo menos enquanto,
pelo pecado original, foi capaz de a privar da
graça santifi�ante. A Igreja vai arrancar êsses
direitos ao demônio. "Sai, retira-te, deixa o lu­
gar ao Espírito Santo I Ordena-te, espírito mal­
dito e condenado, Aquêle mesmo que ordenou a
Pedro caminhasse :por sôbre as ásuas." EDl se,-

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44 A SANTIDADE CATÓLICA.

guida, o sacerdote traça o sinal da cruz sôbre a


criança e manda aó demônio : "Nunca mais te
atrevas a violar êste sinal da cruz". Chega-se
logo ao rito essencial ; e, em seguida, cobrindo a
criança com um véu branco, diz-lhe : "Recebe
esta vestimenta imaculada e cuida de conservá-la
sempre intacta até o tribunal de Deus." Intacta :.
tôda pessoa batizada deveria ser um Santo.
O demônio, porém, expulso nesse momento,
jurou voltar a essa alma. Logo que o menino tiver
chegado à idade da razão, isto é, da tentação, o
inimigo do gênero humano fará brilhar suas mira­
gens, incitando-o ao pecado. Então, a fim de re­
�istir às malvadas sugestões interiores e ·exteriores,
o batizado vê_ que a Igreja lhe oferece, ao mesmo
tempo que com a Confirmação�'\) Pão cotidiano
sob a forma de Comunhão. O próprio Filho de
Deus, o Verbo inca:rnado, prolonga voluntàriamen­
te a sua vida na terra debaixo das 'aparências
dêsse diminuto fragmento de pão que é a hóstia, .
a fim d·e se nos dar tôda vez que fôr necessário,
para que continuemos a desfrutar da vida divina,
isto é, para que prolongg·emo.s o estado de graça.
Pode acontecer, ocorrer um desfalecim·e nlo
grave e, nesse caso também, a lgrej a nos propor­
ciona o m·eio para recuperar a amizade divina,
fechar o inferno, entrar de novo na posse do so­
brenatural .p erdido: êste meio é a Cofifissão.

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A uxíuos DÉ siNGULAR EFicÁCIA 45

Mesmo quando considerada unicamente sob o


ponto de vista psicológico, que admirável inven­
ção é a Confissão ! Como observa o autor do
mencionado ·estudo sôbre Os Sacramentos, "os
adversários da Igreja, em suas superficiais polê­
micas, recusam-se a admitir que esta prática, sô­
bre a qual se expressam com espanto, traduza
uma necessidade da natureza humana.'• Ainda
mais : "A Confissão responde a uma profunda
necessidade do indivíduo e acusa um rasgo de ta­
lento utilizar-se dela na forma em que o faz a
Igreja. '' Bem conhecida é a verdade desta 'afir­
mativa pelos que s·e confessam ; os outros nada
mais têm a faz·er senão ler "En rou te ", a confissão
de Huysmans, ou no Journal de Salavin de JoRGE
DUHAMEL, a confissão do estranho herói. 1
"A Igreja Católica �afirmam os que sabem
ver as coisas - é a única a conhecer a penitência
total. Entre os protestantes, êste Sacramento, re­
duzido aos efeitos morais, limita-s·e a uma corre­
ção práticn, a uma pedagogia. Não salva a todos,
e nisto consiste, precisamente, o vício inicial qe
sua instituição. O assunto adquire sua total am­
plitude ante o sacerdote roman o que, não só cor­
rig·e, mas também desliga, restabelece o canal da

( 1 ) Advirto que são estas a-s únicas páginas real­


mente boas do livro, e que tocam as raias da perfeição.

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46 A SANTIDADE CATÓLICA

graça, r�ata a comunicação com Deus e finalmente


r-estitui a única vida possív-el. O sacerdote esboça
o gesto do perdão e tudo se cumpre. A própria
·eternidade se associa, uma parte da vida se pre­
cipita em o nada e outra se orienta para um fu­
turo radioso."
Ao se colocar o problema da ·constituição de
um lar, sabendo a Igr.eja que os esp<;>sos, para po­
der carregar, juntos, os ·encargos conjugais, neces­
sitam de grand·es socorros divinos, lhes oferece o
Sacramento do Matrimônio.
E se, no jovem, ideais de índole sobrenatural
o inclinam . a se ocupar da salvação et-erna de s·eus
irmãos, ali está o Sacramento da Ordem para lhe
conferir os necessários poderes.
Chegado o cristão ao ponto de abandonar
esta terra, a Extre:�pa Unção o auxilia em sua ago­
nia, restituindo-lhe a saúde do corpo, se assim
aprouver a Deus, ou, pelo contrário, aumentando­
lhe as fôrças da a]ma.
Assim, do berço ao sepulcro, a Igreja sempre
vela, qual coração materno, santificando cada um
dos instantes da vida, auxiliando o cristão a viver
o mãis plenamente possível sua vida cristã, a
mariter-s·e na graça, ou, melhor ainda, a aprovei­
tar de suas riquezas sobrenaturais e acrescentar
sua receptividade santificante com absoluta fide­
lidade às inspirações do alto.

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AuxÍLIOS DE SINGULAR EFICÁCIA 47

- Não deveremos lançar ao rosto da Igreja,


nem de Deus, o fato de nem todos os cristãos al­
cançarem a santidade. A responsabilidade só de­
verá cair sôbre as debilidades e vilanias ineren­
tes à nossa núsera condição humana.

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S E G U N DA PART E

A SANTIDADE EM SUA PRÁTICA ATUAL


Àqueles qu,e se detiverem um instante em

refletir nas considerações ,anteriormente expos­


tas resultará, com luz meridiana, que a Igreja
no século XX, como nas demais épocas de sua
história, possui tu.do quanto é 1l€cessário para
produzir Santos.
As páginas anteriores constituem simples
diretivas, mas, avançando resolutamente pelas
avenidas traçadas por essas idéias gerais, veremos
aumentar-se o sentimento dessa certeza.
Passemos, a.gora, a outra questão, a outro
assunto: os Santos que a Igreja afirma ser capaz
de produzir, tê-los-ia feito tais na realidade?

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CAPÍTULO I

A Santidade "comum"

pooE-SE dizer que a santidade implica duas ca-


tegorias : num plano inferior, ainda que
mui formoso, a vida em permanente estado de
graça e, num plano superior, esta mesma vida,
mas vivida de forma transcendente e, por 1sso,
aformoseada por um valor de edificação mui sin­
gular: o valor do exemplo.
Na realidade, todo cristão deveria ser Santo
no primeiro sentido da palavra; fiel a seu Batis­
mo, deveria fazer questão de realizar integral­
ment-e as palavras de Nosso Senhor: "Procurai,
antes de tudo, o Reino de Deus, (o que vem a ser,
intimamente, a vid-a divina no intimo da alma) ,
e o mais vo-lo s·erá dado por acréscimo." Isto
passa a um segundo plano e, se preciso fôr, a um
último. Só uma coisa é -essencialmente impor­
tante : viver •em estado de graça. Isso obtido, o
mais já não contará.
Não se pense, porém, seja isso coisa fácil d·e
obter. Divinamente "dignificados" pela graça,
continuamos influ;enciados e .à mercê de nossa
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52 A SANTIDADE CATÓLICA

fraqueza. Nosso Senhor, que nos restitui a vida do


Padre, do Filho e do Espírito Sanlo, tão lamen­
tàvelmentc perdida por Adão por meio do pecado
original, não nos concedeu simultâneamente a
libertação das concupiscências desordenadas que,
desde o início do mundo, se rebelaram contra o
sobrenatural. Desde a fnlta original esta é a nos­
sa situação: divinamente solicitados para o Altís­
simo, pelos dons da graça, em nós radicados, sen­
timo-nos ao mesmo tempo dolorosamente atraídos,
e em particular em certos momentos, uns mais
do que outros, mas todos e em oportunidades di­
versas, pelos laços do mal e do menos bom. Vive­
mos no mundo do resgate, mas com a sobrevi­
vência condenada do mundo decaído. É necessário
ânimo forte para resistir e freqüentemente se tor­
na evidente que o "estado heróico é o estado da
graça ".
Agora, quem seria capaz de contar o número
de almas ocultas, desconhecidas, que vivem in­
timamente uma vida pletórica de graça ? O sem
número de comunhões cotidianas, para não citar
mais do que êste detnlhe que, enquanto nos .en­
contramo� na impossibilidade de esquadrinhar o
fundo dos corações, nos permite conhecer o estado
das consciências, não constitui um índice mani­
festo da uma vida mui santa, ainda que ignorada
por muitos?

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A SANTIDADE " COMU M " 53

Entre os que, por vêzes, sucumbem mas que


infatigàvelmente se esforçam por s·e levantar da
queda e praticar nos tempos de fidelidade as mais
formosas virtudes, nesses mesmos, não há audá-''
cia magnífica para um cristianismo vivido na pie- '·
nitude compatível com a fraqueza humana, u�,
esfôrço leal e glorioso para Deus, até a santid-ade?
Quando se afirma que a santidade da Igreja
é um traço, de seu caráter divino, não s·e faz alu­
são tão-somente à santidade supereminente de que
falaremos adiante, a santidade dos Santos beati­
ficados, canonizados ou postos em evidência na
massa dos fiéis ; fala-se, também, da santidade
anônima, da santidade mediana, do comum dos
fiéis. A Igl,'eja deve ser divina para dar à massa
dos fiéis, como o faz, .o meio para se manter nes­
te estado de valorização moral superior ao valor
moral de qualquer outra multidão análoga, no
seio de diversos agrupamentos. Isto mesmo, ex­
presso de outro modo, permitir-nos-á afirmar _q ue
a Igreja é santa, não somente porque zela pela
formação dos Santos, como também impede a
queda dos fiéis, pesando tôdas as debilidades hu­
manas, propondo uma conduta moral que igual
se não enéontra em parte alguma. À medida
que se estuda a história das religiões, torna-se fá­
cil estabelecer um paralelo entre a vida moral dos
verdadeiros católicos e a dos demais crentes : " O
islamismo - dizia AVERRÓIS - é uma religião de

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54 A SANTIDADE _CATÓLICA

porcos." Não falemos dos pagãos cujas divinda­


des são imorais. Mesmo povos dotados de certa
elevação em suas idéias morais como os budis­
tas, os confucionistas, bramanistas, como se não
acham afastados da verdadeira santidade ! Buda
morre de indigestão, o que, sem _dúvida, longe
está de glorificar a um fund"ador, e· os Discursos
d�e Mesa de LuTERO, como as numerosas mulheres
de MELANCHTON ou de HENRIQUE VIII, ou as cruel­
dades de Isabel, são uma nódoa para os membros
da Igreja Reformada que em seus pi'edecessores
procuram modelos a fim de se tornarem Santos.
Os próprios adversários do catolicismo reconhe­
cem o valor transcendente do catolicismo. Um re­
dator anglicano do Expository Times 1, ao ler num
livro do barão de Hugel esta afirmação: "Só 'a
Igreja romana possui Santos"� atrevia-se a dizer:
"Concordaremos com isto? Sim; convenhamos
que, para encontrar um Santo, devemos · recorrer
à Igreja romana."
Não pretendemos, com isto, susteni'ar que en­
tre os fautores do catolicismo se não devam lamen­
tar faltas e quedas - logo voltaremos ao assunto
- ou que ·entre os partidários de outras religiões
não possam florescer verdadeiras virtudes. O
homem, todo homem, falando de modo natural,

(1). Julho de 1922. pag. 145,

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A SANTIDADE "coMuM:" 55

mesmo quando afastado. da verdade, é capaz de


praticar o bem. A questão, portanto, como sàbia­
mente já o fazia notar o Padre DE BnoGLIE, não
consiste precisament·e em se saber se . em outras
religiões, m&xime neste assunto, haja s·emelhan­
ças, detalhe ql!e ninguém pretende julgar ou dêle
duvidar; mas se, em meio a essas semelhanças,
não se encontram diferenças de vulto, traços de
transcendência sufici·entes para demonstrar a in:::
terferência de uma causa sobrenatural.
Com referência a êste particular assinalarei
uma página saturada de profunda observação do
convertido CHESTERTON : A Igreja nunca preten:..
deu - diz êle - que os cristãos foram os únicos
em observar a moral. "Se desej ardes saber, com
exatidão, o que pretendemos dizer, quando oafir­
mamos que o cr.istianismo possui um poder de
virtude singular, vo-lo direi : A Igreja é a única
instituição na terra capaz de perpetuar um tipo
de virtude e criar algo mais do que uma moda."
Na diversidade das épocas foi dado obs·ervar tipos
de sabedoria e virtude puramente humanos. Mas,
qual é, na atualidade, o poder de convicção, de
proselitismo, de ex·emplo dêstes modelos ? São
"exemplares tão gelados como as montanhas da
lua. Assim é, e será, com respeito às noções
éticas que surgem em Fleet Street, enquoanto con­
fio estas linhas ao papel . . . Derrubam-se impé­
rios, as condições industriais modificam-se. Que

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56 A SANTIDADE CATÓLICA

permanecerá disso tudo ? Vou dizê-lo: só ficará


o Santo católico. " 2
Se fora da Igrej a Católica ·existem nlmas san­
tas - não só podem existir como exist·em de fato
- devem sua própria santidade ao que de cató­
lico ·se imiscui entre seus erros ou, melhor, ao que
prega e recomenda o catolicismo. Em outras pa­
lavrns, se essas almas se acercam da santidade,
nunca será em virtude d·e alguma coisa contrária
à vida católica, mas em virtude de algo que, ou
é iner·ente a essa vida, ou que a vida católica o
assimilou conforme a doutrinn de seu divino Fun­
dador. ADELIA KAMM, que fundou as Coccinelas
de que se originaria mais tarde a União Católica
dos Enf·ermos, pertence à Igreja Reformad a de
Losana e s un obra é uma negação absoluta do
postulado protestant·e : cada um para si, nada pode
merecer um favor de outros; a Comunhão dos
Santos é um mito. Pelo contrário, conjuntamente
ao dogma católico, afirma que somos solidários
uns com os outros e que o enfêrno pode associnr
s·eus sofrimentos aos do Divino Salvador até se tor-:
nar, dêste modo, R-edentor da humanidade junta­
mente com Cristo.
P·USEY e o doutor WARD, na época do Mo vi­
mento d·e Oxford, eram homens que elevavam aO'
mais alto pináculo a prática das virtudes. Escre-

(2) A Esfera e a Cruz, 'P· 123 e 125.

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A SANTIDADE '' coMuM" 57

via Ward a sua filha : "Não lembro de época


ulguma de minha vida em que .me tenha sentido
possuído de um ardente desejo de agradar a Deus."
l�stes dois homens, porém, e com ê1es muitos mais
no protestantismo, não foram e não são virtuosos
por mérito de algo especificamente protestante,
mas por graça de algo comum entre êles e os
católicos.
Do mesmo modo, se alguns ortodoxos se· •ele­
vam até a atps por vêzes heróicos de santidade,
não é isso em virtude de se oporem aos católicos.
Pode-se censurar a Nicolau· n, o último dos czares,
a habilidade no govêrno ; nada, porém, será adu­
zido para o�uscar, por menos que seja, sria vida
privada ou sua virtude. E de que fortaleza de
unimo deu provas na adversidade ! Ao pedir que
a �guns de seus cortesãos o acompanhem no des­
têrro, tem em resposta uma .recul'a quase geral;
um apr·esenta-se três dias mais tarde e desapa­
rece ; outros irão até a estaÇão, escapulindo-se em
seguida. Em Tsarkoie, ao despedir-se dos guar­
das, estende-lhes a mão e · êstes se recusam a aper­
tá-la. São conhecidas as atrocidades dos longos
dias de infame vigilância, de perseguições, a bru­
lalidade do .assassínio de tôda a familia imperial
no silêncio da noite. 3 Num caderno pertencente à \

(3) GILLIARD, Le tragique destin de Nicolas II. - So­


KOLOFF, Ef!-qu,ête sur l'assassinat de la famille impériale
russe. Em particular p. 21 e 32. (Payot.)

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58 A SANTIDADE CATÓLICA

grã-duquesa ÜLGA encontraram-se versos de escas­


so valor literário, mas de comevedora entoação:
"Dai-nos resignaç�o. Senhor, - Nos dias das
trevas e das tormentas, - Para suportar a pers·e­
guição do povo - E as penas que nos infligem nos-
·

sos verdugos.
Dai-nos fôrça, Deus de justiça - Para perdo­
ar as injúrias de nossos irmãos - E levar com
paciência, semelhant•e à Vossa, - A pesada, a
sangrenta cruz. - E no dia da agitação, - Quan­
do nossos inimigos nos desolarem, - Ajudai-nos,
Cristo, Salvador nosso, - A suportar as afrontas
e os ultrajes.
Senhor do mundo, - Deus do Universo, -
Escutai nossa oração, - Dai a paz a nossa alma,
- Na hora terrível e dolorosa. - E às bordas da
cova, - Infundi nos lábios de Vossos servos -
A fôrça sôbre-humana � D-e orar humildemente
pelos inimigos."
�stes sentimentos nada têm de especificamen­
te ortodoxo. São cristãos e, pelo que têm de cris­
tão, •elevam-se à resignação e ao espírito de cari­
dade dos mártires católicos.

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CAPÍTULO 11

A Santidade eminente

A LÉMmassa:
da santidade comum do conj unto, da
dos verdadeiros fiéis, é preciso desta­
car a santidade emine� te de alguns, de um gran­
de número, como veremos logo adiante.
Com ef·eito, é · esta a mais notável caracterís­
tica da s'à.ntidade católica na época de hoj e : sua
imensa fecundidade em S11ntos ; fecundidade maior,
sem dúvida - não custaria demonstrá-lo -
do que em qualquer outro perío<!o da história.
Num torvelinho se apresenta uma infinidade
de nomes : nomes de personagens autênticamente
beatificadas ou de indivíduos cuj a vida cristã os
separou da mediania e que, talvez, nunca terão as
honras dos altares; mas que, em sua passagem
pela terra, deixaram exemplos tão formosos de
virtude, que o povo cristão não se engana em os
considerar Santos e que, para a glória de Deus,
exigem a cons•ervação de sua memória.
Tôdas as classes sociais, tôdas as profissões,
tôdas as idades terão seus representantes. 4

( 4) Conforme o espirito desta coleção, omitiremos


quase que em absoluto as indicações b ibliográficas :
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60 A SANTIDAÍ>E CATÓLICA

J. Na vú:W religiosa-

Durante os séculos XIX e XX a santidade flo4


rescera espontâneament e na vida r·eligiosa, apesar
do ambiente muitas vêzes p ouco propicio, e da
perseguição sej a velada, S·ej a violenta.
Primeiramente os homens. Para começar com
um Santo que a Igrej a acaba de canonizar, assina­
lemos êsse j ov·em passionista italiano, êmulo de
São Luís Gonzaga, GABRIEL DA VIRGEM DoLOROSA,
falecido em 1862, com apenas 24 anos e que,
atraído à vida religiosa por uma vocação irresis­
tível depois de ter tomado parte em uma procissão
em honra de Maria Santíssima em Espolêto, põe­
s•e a honrar a Virgem das Dores : "Meu paraíso
são as Dores d e Maria ! "
Que figura extraordinária a dêste outro italia­
no, D. Bosco, de obras educativas tão fecundas,
fundador da 'Sociedade Salesiana e do Instituto
das Filhas de Maria Auxiliadora ! Em 20 de f•eve­
reiro de 1927, em presença do Sumo Pontífice, se
lia o decreto sancionando · a heroicidade das vir­
tudes do humilde sacerdote. Na vida do Cardeal
LAVIGERIE, refere monsenhor Baunard como em

seria nece·ssário estender-se demasiadamente, dada a


quantid ade de nomes apresentados como te�temunho.
Cada qual queira abeberar-se des.sa.s fontes e verificar,
nelas, a santidade das pessoas retratadas.

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A SANTIDADE EMINENTE (I) 61

1883 o fundador, também Santo, dos Padr.es Bran­


cos quis um dia, em São Pedro de Gros Caillou,
apresentar aos fiéis o humilde sacerdote turinês.
O Cardeal havia, então, organizado sua brilhante
campanha ·em favor da liberdade dos escravos ; a
sociedade que acabava de fundar vinha de presen­
tear o céu com seus dois primeiros mártires : os
Padres DENIAUD e PAS CAL Mosenhor LAVIGERIE
.

tomou '3. palavra. Todos os olhaves convergiam


sôbre D. Bosco, sentado diant•e do púlpito. Que­
riam vê-lo e ouvi-lo. Durante sua permanência
em Paris as ruas circunstantes à casa em que se
alojava, estavam cheias de pe�so'as que brigavam
para se avizinhar do Homem d e Deus. O próprio
VíTOR Huao, que então contava 83 anos, quis entre­
vistar o Santo. Um sonho misterioso havia il"eve­
lado a D. Bosco as proj-eções de sua futura missão.
Antes de receber o subdiaconato, o venerável
J()ÃO CLÁUDIO COLIN redige, em espíritp, as regras
de sua futura Sociedade de Maria e com o olhar
da alma chega a conhecer seus primeiros cola­
boradores.
Taihbém fundador de um instituto docen_t e,
igualmente consagrado a. Nossa Senhora, " condis­
cípulo e êmulo do Cura d·e Ars" como o indica o
título de sua biografia, MARCELINO CHAMPAGNAT,
cura do i nterior, criou primeiramente, além das
obras rurais sàbiamente ·organizadas, uma famí­
lia religiosa, o Instituto dos Irmãos Maristas, que

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62 A SANTipADE CATÓLICA

conta atualmente com mais de seis mil membros,


a cujos cuidados estão confiados mais de cem mil
alunos.
Há poucos anos a Igrej a beatificou o funda­
dor dos Padres de Betarram, MIGU EL GARCOITIS, e o
fundador dos Irmãos ·e das S.ervas do Santíssimo
Sacramento, Padre JuLIÃo EYMARD (181J-1868) .
SILVANO GIRAUD, sacerdote secular e · orador
muito apreciado, sente-se invencivelmente arras­
tado para a vida -religiosa; p ensa nos .Padres Ca­
puchinhos; em 1865 recebe de um jovem subdiá­
cono de Aix, sua diocese, uma medalha da Salette.
No ano seguinte decide fazer um retiro no cimo
da montanha e desce inflamado de amor pela
Virgem e pela peregrinação ; pouco depois resolve
ingressar entre os Missionários da Safette funda­
dos eni 1852 por Monsenhor de BRUILLARD e que
então acabavam de emitir os votos religiosos.
Conhecidas são suas obras e é difícil encontrar
outras mais apropriadas para se obter a santida­
de : a União com Deus em sua vida de vítima ; o
Espírito e a vida de sacrifício no testado rteligioso;
a Vida de Lmião com Maria,· J.esus Cristo Sacer�
dote e Vitima e, finalmente, ·sacerdobe ae Hóstia.
O Padre GIRAUD manifesta-se todo através de seus
livros que revelam de modo admirável as .efusões
da alma de um Santo.
Exercem influência distinta, mas de conside­
ráveis alcances : o Padre BAILLY, dos Agostinianos

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A SANTIDADE EMINENTE (I)" 63

da Assunção, que, aos vinte anos, membro das


Conferências Vicentinas, não vacila •em carregar
aos ombros, até os tugúrios por êle visitados, os
feixes de lenha distribuídos p ela Conferência ;
será, mais tarde, u m dos primeiros propagandis­
tas do p·eriodismo católico de grande envergadura
e das p eregrinações à Terra Sanla. O Padre
MARIA ANTÔNIO, apóstolo da região de Tolosa e
cuj as originalidades não constituem óbice p ara a
conhecida austeridad e de sua . vida. Falando dêle,
duranle a guerra, dizia certa vez o deputado La­
sies : "Em minha vida não tive senão duas gran­
d·es .e irresistíveis devoções : minh a mãe e o Padre
MARIA ANTÔNIO. " Não poderiamos tecer melhOL·
elogio em honra d e Lasies ao mesmo tempo que
ao ilustre capuchinho.
Também não são V'erdadeiros S antos os Pa­
dres GINHAC, DoYLE, AUFFROY, HANRION e o mara­
vilhoso LENOIR, capelão do quarto regimento colo­
nial ? Um excelent·e conhecedor, Padl"e RAMIERE,
dizia do primeiro : "Encontram-se religiosos e
sacerdo�es de preclara virtude e ouve-se ponderar :
Que santo sacerdote I Que santo diretor ! Que
·
santo homem I Mas, do Padr-e GINHAC, prescin­
dindo-se dos epítetos, diz-se : Que S anto I Porque
êle o é na maior amplitude do têrmo." Os Padres
DoYLE e AUFFROY durante muito tempo haviam
suplicad o a Deus a glória insigne do martírio e
ambos morreram na guerra : o Padre DoYLE en-

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64 D
A S ANTI ADE CATÓLICA

quanto se dirigia às primeiras linhas em busca de


um oficial inglês ferido, e o Pa<;lre AuFFROY numa
estrada perto de Rethel nas mãos de um soldado
que o havia feito prisioneiro e que, com um ponta­
pé, o arrojou em wn fôsso depois de l�1e haver dis­
parado um tiro de revólver na bôca, à queima­
roupa.
O Padre DoNCOEUR publicou uma formosa e
útil biografia 1 que, pode�os afian Çá-lo, produziu
ótimos frutos de santificação, acêrca do Padre ALE­
XIS HANRION, religioso d e uma serenid ade sempre
sorrident•e em meio de uma continua impotência,
resultante de uma saúde doentia que o impedia de
desprender o vôo de seus preciosos dons intele­
ctuais.
Do Apóstolo da Eucaristia no exército, o Padre
LENOIR, pôde escrever uma testemunha ocular :
"tste sing·elo j esuíta havia adquirido tanta influ­
ência sôbre as tropas coloniais que é preciso tê-la
comprovado pessoalmente para dela se ter uma
idéia exata. Era tal que levava à mente as grandes
correntes espirituais passando por entre as popula­
ções no sulco bendito de alguns dos grandes San­
tos de outrora. Eis regimentos, brigadas, uma
divisão de soldados que, p·enetràdos do influxo do
sobrenatural •e de pureza que emanava do Padre
f
i

( 1 ) Ainda assim, precioso diário para exercícioS.


(Apostolado da Oração.)

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A SANTIDADE EMINENTE (I) 65

LENOIR, em poucas semanas haviam operado o pro­


dígio da transformação em massa. Essas almas
rudes e muitas vêzes transviadas do reto caminho,
freqüentemente ignorantes de tôda noção religiosa,
permeáveis a seu influxo pela caridade de um San­
to, entregavam-se tardiamente à graça . com a
ânsia de um neófito resolvido a morrer. �sses ho­
mens já não voltavam às trincheiras nem se lan­
çavam ao assalto s•em haver previamente comun­
gado. "
Espontânea saiu da pena do cronista a p alavra
"Santos". Para melhor dar a conhecer a maravi­
lhosa formosura desta alma apostólica, destaque­
mos uma passagem de seus apontamentos num
retiro durante a campanha : " A morte. A planí­
cie, durant·e a batalha, ou a trincheira ou um
refúgio bmilbardeado, ou uma sala de hospital como'
aqui. Sofrimentos ? É provável. Darei conta do
recado ? Não é certo, mas, com o auxílio de meu
bom Mestre, ·espero estar disposto . . . Só uma
coisa me inquieta ou me inquietaria neste mo­
mento : terei cumprido os planos concebidos por
Deus· à meu respeito ? Encontrar-me-ei no ponto
que :êle terá . desej ado ? Terei salvado - tôdas as
almas que :ê1e esperava d·e mim ? A não ser por
�st e motivo de apostolado, a morte seria tão doce
para mim ! . . . Mas as almas por salvar, o reina­
do de Jesus Hóstia ll espalhar sôbre a terr a ! . . .
Só por :êle quisera ·eu viver até a consumação dos

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66 A SANTIDADE CATÓLICA

séculos, l).O meio de qual9.uer sofrimento. Por Êle,


também, temo a morte, pois receio não ter: chegado
ao término de minha missão. Porém, pensando
bem,- tenho confiança. " O Pudre LENOIR morreu
dando a absolvição e a Comunhão aos moribun­
dos no campo de batalha do Vardar. " Para fazer
do 4.° Colonial um ;regimento de S antos � tinha
escrito - estaria eu disposto a oferecer minha
vida. Dá-la-ia por um só soldado." E manteve
a palavra.
Quantas outras figuras se apresentam I Sem
querer ser exclusiv�sta e pensando que cad� f'ami­
lia reLgiosa teria títulos análogos se não melhores
para registar e só para citar de preferência nomes
do instituto mais intimamente conhecido, o autor
não pode prescindir de mencionar o Padre SEN­
E -
GL R, ilustre educador e autêntico Santo que havia
feito o voto de fazer, sempre, o que j ulgara mais
perfeito ; o Padre DE ScoRAILLE; cuja vida foi es­
crita pelo Padre DuoóN e que d.eixou n a memória
de quantos com êle trataram a lembrança de uma
grandeza de alma fora do comum ; o Padre DE
MAUl\UGNY, que passou quase a totalidade da vida
n a formação espiritual de sacerdotes, prestes a
iniciar o ministério apostólico. Espírito original
e de cativante virtud·e, cuj a derradeira açãó de
graças a Deus, antes de abandonar definitivamen­
te esta terra, foi por lhe h aver da� o trinta-e-cinco
anos de padecimentos. O Padre CRos, homem

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A SANTIDADE EMINENTE (I) 67

original, excessivamente mesmo, às vêzes, como


afirmam alguns, mas eminentemente religioso e
destaca4o apóstolo de Maria Imaculada e da Eu­
caristia ; o Padre LoNGHAYE, humanista ilustre e
homem de Deus cuj a silhueta o Padre LHANDE
fêz reviver com acentuados traços e acendrada
virtude. 1
Tôdas· oas farnilias religiosas teriam uma ladai­
nha de nomes gloriosos. Os cisbercienres J.eri:tbra­
riam o p adre JuAN, Abade de Font-froide (1815-
1895) , o Padr·e FRANcisco RÉGIS, fundador e pri­
meiro Abade da trapa de STAOUELI, ou o austero
Abade de Santa Maria do Monte des Cats ou D .
RICHEBÉ. Os maristas recordariam , o generoso
Padre LIMAGNE, Superior do Colégio de Montluçon,
idealizador ·e propagandista do ensino da econi:>mia
doméstica, esclarecido Capelão Militar, cuj a morte
foi uma perda sentidíssima. A Ordem de São Do­
mingos citada os Padres CHOCARNE, JEANDEL, CLE­
RISSAC, sem olvidar o Padre DmoN, personagem
discutida, mas de vigoroso relêvo e que soube acei­
tar uma terrível desgraça como só o sabem fazer
os homens de Deus ; o Padre VuiLLERMET, que con­
tra uma terrível crise cardíaca, repetida em todos

(1) Entre os j esuítas belgas s erá preciso dar lugar


proeminente ao Padre PETIT, cuja vida de singular união
com Deus foi escrita pelo Padre LEVEILLE. ( Lovaina,
Museu Lessiano.)

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A SANTIDADE CATÓLICA

os invernos, combateu desprezando-a e pregando


a Quar-esma em Santo Honorato de Eylau, enquan­
to dizia : "Morrerei dentro de um ano e repenti­
namente, já o sei, mas quero morrer na brecha."
Dizia isto poucos dias antes d·e ir a Paris, onde
a morte o esperava. A cidade de Lila p erdeu
nêle um Apóstolo de primeira grandeza, Diretor
prudente, orador profundo e homem totalmente de
Deus.
No decurso destas páginas teremos a oportu­
nidade de citar muitos filhos de São Bento.
Mencionemos, agora, D. GuERANGER e seu sucessor
D. DELATTE, assim como D. PITRA, amigo de Luís
VEUILLOT e de Monsenhor PIE. . A lgr·ej a quis ele­
var D. PITHA ao cardinalato : tal era seú respeitoso
amor pelo Vigário de Jeus Cristo que nunca se
apresen�ava ao Papa sem, anteriormente, haver
pedido a absolvição ao confessor.
Do Padre MUARD (1809/1854) , fundador . dos
benteditinos de la PiÚI'Ie qui vire, depois de ter
sido Cura de A vallon e pregador diocesano de
Sens, dizia Montalembert : "Não creio ter visto,
j amais, pessoa alguma que mais vivamente tenha
suscitado em minha alma 'a idéia da santidade."
Austero quase ào •exagêro, recebeu de Deus vádos
dons extraordinários. Mas, sobretudo, a bondade
- uma das fontes da fama, s·egundo São Frnn­
cisco de Sales� confirmou sua reputação. Certo
dia declarou-se um in cêndio em Pontigny; acorre
_
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A SANTIDADE EMINENTE (J) 69

o Padre MuARD que se apressa em retirar do sinis­


tro os feixes de feno. "Assim vai atear o fogo em
outra parte" - grita um bruto ·enquanto com vi­
brante golpe o lança contra a parede. Para não
ver a quem o maltratava, o Padre cerra os- olhos,
recusando-se a qualquer inv·estigação posterior.
Num lar numeroso e santo, no qual de seis
filhos varões quatro se tornaram religiosos, nasce­
ram os dois Padres redrentoristas ALBERTO e HEN­
RIQUE PAYEN. Um, confessor infatigável e por
todos conhecido com o título de "santo"; outro,
após uma carreira de superior e pregador, morre
de um lúpus no rosto, no meio d·e atrozes sofri­
mentos e de uma paz que não podia deixar de ser
o prenúncio da paz celestial.
Bastante edificantes são, também, as vidas dos
Padres DESURMO::-<T · e BERTHE, êste último autor
de ponderada biografia do preclaro e santo Pr·esi­
dente do Equador, GARCIA MoRENO.
Entre os Irmãos das Escolas Cristãs, quão
formosa não foi a figura do Irmão JosÉ, fundador
dos "Franco-Burgueses". Anteriormente j á bri­
lhara o Irmão FILI PE, Superior Geral pelo espaço
doe trinta-e-seis anos, fundador das escolas notur­
nas para adultos, cooperador silencioso de Mon­
talembert e de Falloux, dotado, segundo o diz.er
de um grande homem de Estado, de "pasta para
dêle fazer um ministro ", organizador das ambu�

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70 A SANTIDADE CATÓLICA

lâncias e hospitais de 1870. Deve-se ler, em sua


biografia, o capítulo intitulado " O Santo". Nêle
se reconhec·erá ó religioso que Horácio Vernet re­
presentou ao pé de uma pared e enfeitada, tão
somente, por um Crucifixo. Como São Paulo,
Irmão FILIPE não conhecia senão Jesus e Jesus
Crucificado. Seus filhos espirituais viviam de
seu exemplo e s·eus sucessores não desm·ereceram,
com certeza, sua ínclita memória.

As mulheres rivalizaram em santidade com os


homens e, mesmo, podemos dizer que os supera­
ram. Mais espontâneamente generosas (com efei-.
to, enquanto Verônica livremente se adiantou até
o Mestre, o cireneu foi obrigado a ajudá-lo a car­
regar a Cruz) , e mais orientadas, indinadas, para
a oração por temperamento, sabendo amar muito
mais e melhor 'do que os homens, quando o fazem
santamente, menos calculistas, menos egoístas •e,
para o dizer num:l única palavra, mais " alma''
do que os homens, segundo a feliz expressão de
Monsenhor Dupanloup, as mulheres, máxime quan­
do regra rígida e f·e cunda souber exigir de sua
abnegação o máximo de eficácia, as mulheres al­
cançaram a santidade com assinalado domínio e
vantagem.
A floração oarmelita
. é ·de sobejo conhecida
para que sejamos obrig ados a entrar em d-etalhes.
TERESA DO MENINO JESIUS, IsABEL DA TRINDADE, do

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A SANTIDADE EMINENTE (1) 71

üarmelo d� Dijon, MADRE TERESA DE JEsus, funda­


dora de Paray, MARIA AMADA DE JEsus, do Carmelo
da avenida de Saxe, MADRE XAviER DE MAISTRE,
MADRE TERESA DE SÃo JosÉ, do C armelo de Tours,
cuj a vida foi escrita p elo Padre MERCIER ; lRtVIÃ
SÃo PEDRO, do mesmo üarmelo •e que tão admirà­
velmente dirigida pelo santo varão de Tours, Pa­
dr·e DuPONT, propagou o culto da Santa Face ;
IRMÃ MARIA ANGÉLICA DE JEsus, de Pontoise (1893/
1919) . Eis uma série de nomes que pertencem à
história da santidade e mais de wn simplesmente
à história !
Quantas instituições antigas não deram, eni
nossa época, como o vimos com o Carmelo, almas
de virtude excelsa !
Como não haveríamos de r�cordar entre as
religiosas de Santa Clara, por exemplo, MARIA
CELINA DA APRESENTAÇÃO, tão interessant� na histÓ­
ria da devoção reparadora, e a singular MARIA SIN­
CLAIR, do Edimburgo, a TERESA Do MENINO JEsus
escocesa que, jovem ainda, leva constantement-e
sôbre o ·corpo frágil uma cruz guarnecida de pre­
gos e vive em união tão íntima com o Divino Sal­
vador que, ao interrogá-la o confessor, a êsse res­
peito, pôde responder-lhe : "Nosso Senhor ? Está
sempre a meu lado e me trata como se estivess·e
brincando comigo. "
Entre as visitandinas SABINA DE SEGUR, tão prê­
sa v elo desej o de penitência 'e da mortifica �ã o

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72 A SANTIDADE CATÓLICA

pessoal, à qual Deus res·ervou provas de singulnr


rigor e severidade. Mons·enhor DE SEGUR, seu ir­
mão, ia ao locutório para ler suas produções as­
céticas e ela lhe sugeria oportunos e prudentes
conselhos ; com o o Santo Prelado, também perdeu
a vista e logo foi afetada nos pulmões. Morreu
aos trinta-e-nove anos, no meio de indizível ale;
gria motivada pelo pensamento d·e ir gozar de seu
Deus. FRANCISCA CHAMBON, ·ou Irmã MARIA MAR­
TA, de Chambéry, que, à simples vista de um Cru­
cifixo, caía em êstase de três dias contínuos e que
parecia ter sido suscitada por D-eus a fim de rea­
vivar em nossos tempos a devoção às Santas Cha­
gas do Senhor ; Irmã BENIGNA CoNSOLATA FERRERO,
a quem Nosso Senhor ordenou a propagação (con­
seqüência evidente da devoção genuína ao Sagrado
Coração) do culto da confiança : "Se quiseres
amar-me, confia-te em mim ; se quiseres amar..,me
ainda mais, confia-te mais ainda e se quiseres
amar-me superlativamente, confia-te em mim su­
perlativamente. "
As 'Filhas da Caridadle não cedem por nada na
generosidade pela virtude. ISABEL SET� N, protes­
tante episcopali'a na, converteu-s·e pelo desej o de
Comunhão. Primeira Superiora das Filhas da Ca­
ridade nos Estados Unidos, costumava dizer :
" Não olho nem para a frente, nem para trás, mas
somente ao alto."
A CATARINA LABOURÉ deu a Santíssima Virgem

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A SANTIDADE EMINENTE (I) 73

a graça da aparição da medalha milagrosa n a ca­


p ela da Rua de Baco, ;em Paris. Soror Ros�LIA
deu-s·e a conhecer durant e a comuna de 1870 : a
CoNDÊSSA DE SÃo MARCIAL referiu em Vers lies Som­
mets e En Haut seus heróicos esforços para conse­
guir sua encantadora vocação .
últimarnente voava até Deus, a fim de rece­
ber a recompensa celeste, SonoR MILCENT, a incom­
Iiarável educadora dos meios operários. Seu ir­
mão, Luís MILCENT, havia sido um dos colabora­
dores de ALBERTO DE MuN na Obra dos Cír­
culos Católicos e dos sindicatos agricolas. Ela, a
valente Filha da Caridade, depois de uma perma­
nência de quinze anos muna escola da Rua Can­
laincourt e de outros cinco (1897/1902) na Rua de
B aco, ·entregue à impressão d e livros escolares,
funda, em 1902, na Rua da Abadia, os primeiros
sindicatos femininos p ara que a ação da escola ;e
do internato se complete com a formação profis­
�;ional. As 20 mil senhoras que, ho}e, fazem parte
do sindicato da Rua d a Abadia são as beneficiá­
rias do esfôrço tenaz de Soror MILCENT; a distinção
que lh e foi conferida no Instituto Nacional das Pu­
pilas da Nação veio sancionar os trabalhos sociais
que ela havia r·e alizado em favor da organização
do trabalho feminino.
Os instituto s que, tão numerosos, foram fun­
dados nos dois últimos séculos torn ar-se-ão novos
seminários. Suas fundadoras foram freqüente-

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74 A SANTIDADE CATÓLICA

mente santas e, sempre, almas de acrisolada vir-


tude. iT;�il:if ,fi:
'
Urna delas foi MADALENA SOFIA BARAT, can�ni:
zada em 1 923, fundadora do Instituto das Damas
do Sagrado Coração, onde é ministrada uma edu- '
cação profunda e de tão lisonjeiras projeções
cristãs.
Sua companheira, FILIPINA D UCHESNE, q!Je
devia p artir p ara o Novo Mundo,. era, como ela,
uma verdadeira Santa 1, e em dois recentes volu­
mes podemos ler as biografias, cheias d·e tão �o­
cantadores traços, de algumas das filhas da Santa
Madre Barat. O espírito da fundadora se conser­
va em sua primitiva pureza e os frutos de santifi­
caçã o perduram maravilhosamente abundantes e
ótimos.
Outras instituições oferecerão, também, for­
mosa floração de almas santas. As Damas de Na­
zaré, só p ara citar um nome, têm, depois de IsA­
_
BEL. RoLLAT, sua primeira superiora e fundadora
com a duquesa D e DouDEAUVILLE, na fundadora
Madre VITORINA HELOT (1813/1900) segunda Su­
periora Geral e, na Madre MARIA NATIVIDADE
(1824/1908) , duas vidas de humilde irradiação e
:�·.:�-.�-·r
.,
( 1 ) Repetimos uma vez ainda que - ao empregar êste
têrmo não entendemos, de modo algum, antecipar-nos às
decisões da Igreja. Tomamos esta exp - ressão em sentido
corrente, comum,

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A SANTIDADE EMINENTE (I) 75

de absoluta fidelidade, vidas ocultas mas de extra­


ordinária fecundidade !
As Irmãs da Caridade de N.e vers coube a dita
de contar entre .seus membros BERNARDETE SouBI­
nous, a privilegiada de Lourdes, fão ávida de ser
" como as demais", de "fazer como todos" •e que na
vida religiosa desconheceu as revelações místicas
dos grandes contemplativos . . . " Não sei meditar"
dizia da com tôda humildade. Bastava, porém,
vê-la fazer o Sinal da Cruz, como a Virgem lho
havia ensinado, para compreender a profundida­
de de sua união com Deus.
Na Bélgica, EMILIA DE ÜULTREMONT, Condêssa
de Hoogswort, funda o Instituto de Maria Re­
paradora, atualmente disseminado pelo mundo to­
do. Forçada a acompanhar o espôso ao teatro,
oculta um cilício entre as roupa� ; Deus concede­
lhe comunicações inefáveis, particularmente n a
capela d o castelo d e Beauffes ; viúva, não vacila
em reproduzir o gesto heróico de Chantal, aban­
donando os filhos que sagazmente havia -provido,
a fim de poder seguir o chamado divino com a
aprovação das competent-es autoridades.
lVIARIA ANA HERVÉ BAZIN, SIMONA DENIEL, VA­
LENTINA RIANT são suas filhas, filhas que honram
a propria mãe.
Entre as Religiosas d.e Nossa Senhora da
,- África, fundadas, como os .Padres Brancos, pelo
':ardeal Lavigerie, se encontram as irmãs lVIARIA.

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76 A SANTIDADE CATÓLICA
CLÁVER e MARIA SANTO ANSELMO. Esta última se
oferece para "sofrer qu-alquer padecimento e hu­
milhação a fim de desagravar um poúco a Jesus
pelos pecados e a falta de amor das almas a êle
consagrad-as." Em 1917 determina "ql!e cada dia
confiaria a s-eus cuidados a alma de um sacerdote
ou religiosa infiel à vocação ,e que por ela respon­
deri::�:." Para cemitério, dizia ela, é preciso a areia
ardente do deserto ou o estômago de um negro an­
tropófago. Morreu de esgotamento em Rennes,
cuidando dos feridos, durante a guerra.
Almas santas aom tôda certeza e das quais em
mais de um caso se introduziu a cansa de beatifi­
cação, podemos apontar TERESA CouDERC, funda­
dora, com seu santo Diretor espiritual, Padre TER­
ME, do Cenáculo e que, por muito tempo desconhe­
cida e combatida, maravilha de humildade e de
abnegação, triunfa de tôdas as dificuldades pela
paciência, 'chegando a criar uma congr·e gação ex­
traordinàriamente florescente. TEoDOLINDA D u­
BOUCHE, fundadora da Adoração Reparadora; MA­
.
DALENA ULRICH, fundadora do Instituto das Servas
do Coração de Jesus; JúLIA ADÉLIA DE GEiliN RICARD,
fundadora das Irmãs Vitimas do Sagrado Coração
'e que, em união com suas primeiras companhei­
ras, redigiu esta ata : "Nós consagramo-nos sem
reserva a quanto Deus de nós exigirá em sua mi­
·sericórdia e em sua justiça ; consentimos em S'er ví­
timas de nossos pecados e daqueles de tôda

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A SANTIDADE EMINENTE (I) 77

a França, em união de Jesus Crucificado." MA­


DALENA DE SMET, a quem o 'Santo Cura de Ars ani­
mou em seus projetos e que fundou as Auxiliado-­
ras do Purgatório, tão fecundas ·em obras e genero­
sas em virtrid·es 1 ; JoANA JuGAN, fundadora das Ir­
mãzinhas dos Pobres. Não era Máximo dei Cam­
po que, assombrado ao ver essas mulheres, mui­
tas delas de linhagem ilustre, consagradas durante
a vida tôda ao c_u idado de v·elhos. p obres, pedia
uma explicação à Superiora e esta, _ levando o in­
frédulo à capel-a, mostra-lhe o tabernáculo e lhe
diz : "Eis, aí está o que nos dá o necessário alen­
to ! " São · palavras que evocam a s d e um Irmão
das Escola-:� Cristãs que em 1871 t·r ata dos empes­
tados de varíola : "Eu não faria o que fazeis, nem
por dez mil francos ! " � "E ·eu n em por cem mil
- r·espondeti o irmão. - F·aço-o por Jesus Cristo ! "
Eis ninda outros nomes e ·em número não de
todo desprezível : MARIA PosTEL, canonizada simul­
tâneamente com 'a Madre BARAT, santa MA­
RIA DE SANT� EuFRÁSIA PELLETIER, fundadora do
Bom Pastor de Angers; a Bem-aventurada JoANA
ANTIDA Tl!OVRET, das Irmãs da Caridade. de Besan-

( 1 ) Belissima a biografia de uma :religiosa d o Ce­


náculo, ANTONIETA TARUT ( 1873/1 904) , aparecida sob O
título �Sugestivo d e Pequena Hóstia e devida à pena d e
uma Teligiosa da mesma Congregação.

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78 A SANTIDADE . €ATÓLICA

çon ; Madre MARIA EuGÊNIA DE JEsus, primeira Su­


periora das Religiosas· da Assunção, cuj a vida se
encontr{l em íntima comunhão com a de sacer­
dotes eminentes e de Santos com o o Padre CoM­
BALOT que deveri'a ser mais conhecido, ·e o Padre
D'ALZON; a Madre MARIA PoussEPIN, fundadora das
Irmãs Dominicanas da Caridade; JO ANA IsABEL B1-
,

CHIER DES AGEs, do Insiituto das Filhas da Cruz,


..

falecida em 1888 e cuj a calJ_sa de beatificação foi


introduzid'a �m maio de, 1891 ; VITÓRIA TERESA
C H UPIN a quem o marquês Co sTA DE BEAUREGARD
,

chamava d e " sublime mendiga" e o povo de " a .


Boa Madre" 2, com apenas :vinte ...e-dois anos aceita
a incumbência . proposta pelo Prefeito de Polícia
de Paris p'ara se ocupar das pobres jovens perdi­
das, da prisão d e SAINT LAZARE. Logo adota a re­
gr� de São Domingos e funda, em Chatilloiz sous
Bagneux (Sena) a Congnegação de Nossa s.enhora
da Graça, com a finalidade de se ocupar das obras
de preservaçã<? : , E depois as duas jovens religio­
sas das Irmãzinhas da A ssunção, as P.ern·etana:;;
como por vêzes são chamadas devido ao nome de
seu fundador, o Padre PERNET 3, e cujas vidas fo­
ram escritas por Monsenhores LANDRIEUX e LIOBET.

(2) Um delicioso livro do Padre Do NCOEUR : Venire


florentes/ Soror Maria Inácia, (Art. Catholique, , 1 926.)
(3) Vida escrita pelo Padre MoRTIEn, O. P. Pre­
fácio de HE NRIQUE BoaoEAux. ( Soe. de Santo Agostinho.)

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A SANTIDADE EMINENTE (I) 79

Onde iremos p araD? O quadro amplia-se.


Para urna simples enumeração não bastariam as
páginas dêste opúsculo. Perdoem-nos aquêles que
foram por nós esquecidos, pois urna enumeração
provoca sempre urna situação perigosa, visto que
s·e corre o risco de atrair as iras dos que por mero
esquecimento ficam relegados ao silêncio. Neste
,.caso, s�ndo " Santos " êsses esquecidos, o au­
tor nada tem a t-emer e antecip �dament·e conta
com o p erdão . . .

Numa obra -de 1868, ALEXA...'fDRE D uMAs (p ai) quis p ero­


rar a causa dos Refúgios. A apóstrofe final é interessan­
·
te para quem quiser traçar um paralelo entre os Santos
e as pessoas vugares : "Pelo que lhe diz respeito, ó
homem meu 5emelhante, a você que conheço em mim e
por mim , animal grotesco, d etestável e sublime criatura,
capaz de tudo, até do bem, ainda que "sej a causa dêste
mal, faça como eu : trate de reparar!"

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CAPITULO fi
,

A Santidade eminente
( CoNnNUAÇÃO}

11: Na vida missionária.

EM dizia
discurso pronunciado em Malinas em 1862,
:Monsenhor "Filósofos e cri­
DuPANLOUP :
ticas I Vinde, e, para o bem da humanidade so­
fredox:a, tende a gentileza de publicar êste aviso na
ultima página de vossos jornais : Necessita-se de
quinhentos mil heróis dos dois sexos, a fim de en­
sinar a rezar e i:p.iciar nas primeiras letras criaturas
sujas, sendo quê êsses heróis devem ser castos, pa­
cientes e perseverantes ; trabalharão dez horas, diá­
riamente, por 30 cêntimos e receberão calúnias
p9r suplemento de salário, devendo, além disso,
abandonar até mesmo os prazeres lícitos. - Pon­
de êste anúncio em vossos diários que eu mesmo hei
de me encarregar da despesa . . . Rides com minha
idéia ? Tendes razão . . . e ao mesmo tempo estais
enganados. f:ste exército sublime, com efeito, é l
uma realidade� Um único Senhor pôde criá-lo
e inspirá-lo, e f:le mesmo é quem o recruta. Ar­
m a-o e o chefia há dezoito séculos . . E êste 'exér-
.

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A SANTIDADE EMINENTE (li) 81

cito nada mais pede de seu Chefe a não s·er um sor­


dso e uma bênção. �ste Senhor é Jesus Cristo ".
Monsenhor DuPANLOUP não estabelecia distin­
ções entre os trabalhadores das cidades, dos
pampos e de terras longínquas. Se é necessá·
rio haj a uma especial generosidade para se consa­
grar à humanidade sofredora dentro do próprio
País, quanto mais se não há de exigir para aban­
donar a Patria e ir habitar .em terras ingratas, vi­
ver em climas tórridos ou árticos, lutar com a di­
ficuldad e dos idiomas por vêzes dificílimos, cos­
tumes por vêzes brutais, consagrar-se para mostrar
·
Cristo aos povos que vivem escondidos nas trevas I
Alguns Missionários morrem durante a viag-em,
como o Padre ATANÁSIO VANHOYE, assuncionista,
que, em 1919, ao tocar a Chaouia com uma mina
no Estreito de Messina, faz um rombo no casco,
afundando em plena noit.e e arrastando p ara os
abismos a três Irmãos Oblatos e cinco Irmãos das
Escolas Cristãs. Recusando todo auxílio humano
em favor de . outros, êsse Padre permanece na co­
berta do navio, caindo vítima de seu heroísmo.
Em j aneiro de 1920 o Bispo JALABERT, nove
Padres do Espírito Santo, sete Irmãos das Esco­
las Cristãs e uma Irmã d,e São José d,e Cluni diri­
gem-se a Brazzaville para prosseguir viagem até
Dacar. Foram tragados pelo mar cóm o naufrá-
,
gio do Africa numa noite de tormenta.

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82 A SANTIDADE CATÓLICA
.

Voltarão os que partem? Na maioria não ! . . .


Mas não faz mal ! Qrt<e alegria a dos Missionários ! 1
Uma Religiosa AuxiLIADORA é repentinamente con­
vidada a partir para a China em substituição a ou­
tra que, à ultima hora, vê-se impedida de partir.
Não vacila nem mesmo por um instante. Eis a car­
ta que em 31 de março de 1926, no momento de
partir, nos envia de Marselha. A valorosa mulher
há de nos perdoar que a citemos. Ao par dos exem­
plgs de santidade que encontramos nos livros, ·êstes
modelos, encontrados na vida �otidiana, se nos
deparam com maior poder demonstrativo. Eis a
cart'a :
" Reverendíssimo Padre :
O Divino Mestr-e me chama para a graça sin­
gular das Missões. Antes de abandonar a França
quero recomendar-me a suas orações. Minha vo­
cação de Missionária é nova prova de que as maio­
res graças de O.eus costumam seguir a um ato de
fidelidade aparentemente insignificante. O pensa­
mento de que nesta partida tão imprevista tudo
responde à vontade divin a é, para mim, de gran­
de consôlo. O sacrifício que .d·evo fazer é grande,
mas é outra oportunidade, e for�osa, para demons:._
trar a· Deus que o amor a êle está acima de tudo.

( 1 ) E' preciso ler as páginas emocionantes qu e L.


VEUILLOT consagra à partida dos .Missionários em Ça et
la, livro XVII ; ou em De la nob lesse, com o títul o : Os
"
nobres cavalheiros de Deus.

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A SANTIDADE EMINENTE (11) 83

Por outra parte, tudo abandonar para encontrar


a Deus é tão pouca coisa I . . . "
Caract erística de certas Missões é a lepra. Em
26 de j ulho de 1925 morria em Antony, atacada
por essa enfermidade, uma valorosa alsaciana per­
tencente às Irmãs de São José de Cluny 2• D uran­
te treze anos se consagrou ao cuidado dos ·enfer­
mos em Caiena.. Em 1907 foi preciso fazer com
que voltasse à pátria, porquanto a lepra dela se
havia apoderado, fazendo-a sua vítima. De iní­
cio não p ercebeu o que lhe acontecia, ou melhor,
não quis entender. Logo depois exclamava : " S e
Deus me tivess•e deixado a saúde, ·eu só teria tra­
balhado em uma Missão ; doente, porém, ocupar­
me-ei de tôdas." Orava e aceitava seus padeci­
mentos pela salvação de todo o mundo. Aos pou­
cos foi preciso proibir-lhe o a é esso à tribuna de on­
de assistia a o Santo Sacrifício 'e podia ver o Ta­
bernáculo. - Reclusão completa. "Meu ôlho direito
declara-se em greve : Jesus, tende compaixão de
mim, deixai-me ao menos um e vamos como bons
Amigos ". Paulatinamente Nosso Senhor a convida
a s·e entregar por inteiro : "Eis uma santa, - decl'a­
rava o Assistente Geral da Congr-egação do Espí­
rito Santo, Padre LENA, após sua morte. - Ide re-

(2) Instituto que tem por fundadora a venerável


Madre JAVOUHEY, alma ·s anta entre as mais santas.

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84 A SANTIDADE CATÓLICA

zar sôbre s·eu túmulo, pois a mim não estranharia


que se pusesse a operar milagres ".
Vitimados pela lepra como Soror LEOPOLDA e o
prec.l aro Missionário belga, o Padre DAMIÃO, mor­
reram em Madagascar 'o polonês Padr·e BEYZIM, Je­
suíta como o Padre DuPUIS, antigo Capelão Mili­
tar da coluna expedicionári'a francesa. E assim,
muitos mais. A perspectiva dos leprosos ne que
deverão cuidar, ao invés de amedrontar os Após­
tolos, estimula-os e sobrenaturalmente os encanta ;
·
assim, por exemplo, o Padre FELIX MILAN , Reitor
de um Colégio espanhol, e que vive a pedir para ser
enviado às Missões, é destinado às Filipinas, na ilha
de Culã, até então chamada a ilha da morte : é
transformada por êle na ante-sala do paraíso.
Após 11 anos de trabalhos af'anosos entra os insu­
lares; cujos dialetos se vê forçado a aprender, mor­
re no meio dos seuS leprosos a quem prodigava
paternais ternuras.
Em 25 de dezembro de 1924 embarcava em
Marselha, com destino ao leprosário de Taiti, o Pa­
dr.e D'ORGEVAL, primeiramente Vigário d·e São Jor­
ge, em Paris, e em seguida pregador diocesano
durante vinte-e-cinco anos e que, no início da guer­
ra de 14, envidou todos os esforços para ser acei­
to como Capelão. Com cinqüenta e um anos de
i dade, anelando pela vida missionária na Oceânia,
professa no Instituto dos Sagrados Corações de
Jesus e Maria, onde, três anos antes, o conde de

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A SANTIDADE EMINENTE (11) 85

Elbéia tambem professara. O Padl'e D'Orgeval


encontra-se ainda entre os leprosos da Oceânia.
Não se pense sejam isolados esses casos. Em
um noviciado das Franciscanas de 1lf aria 3 se lê uma
carta de um Bispo da China a solicitar quatro irmãs
para cuidar dos leprosos. As irmãs são qua�enta
e não se pede senão quatro. No entanto quarenta
mãos se ,erguem solicitando o favor e a honra de
partir 4•

Mesmo quando 'a vida missionária não sej a


acompanhada dêstes sácrificios que tocam as raias
do heroismo, quantos sofrimentos não comportam !
Sofrimentos corporais quando os recursos envia­
dos pela Propagação da Fé e pela O bra da Santa
Infância só podem cobrir as necessidades d e ' qua­
tro meses num ano . . . Sofrimentos de aclimação :
alimentos, roupas, agasalhos, alojamento, trans­
porte, temperatura, ambiente . . . Sofrimentos de
ineficácia e impotência : a dificuldade da con-

(3) Com o título Une grande âme, une grctnde


oeuvre, o Padre HYGONET, O. F. M., publicou a vida d a
fundadora, HELENA DE CHAPPOTIN DE NEUVILLE. "0 minis­
tério entre os leprosos - dizia ela - forma parte de
nossa vocação de vítimas."
( 4 ) Em 24 de·-julho de 1 924, iniciou-se o processo
da beatificação de Soror MARIA AssUNÇÃO que, sai n do um
dia d a Itália, foi morrer em Chansi, onde atualmente r� ali­
za milagre�.

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86 A SANTIDADE CATÓLICA

quista das almas . . . " Como se torna difícil a con­


quista das almas, � escreve um Missionário no
Jap_ão, - quanto custa fazer um cristão ! Verda­
deiras mul tidões se nos escapam ! Como são pvu­
cos os católicos em comparação com os infiéis ! No
Japão s·omos apenas 193 sacerdotes catolicos con­
tra 90 mil sacerdotes sintoístas ! Se, ao menos, a
Europa nos auxiliasse ! . . . Mas, pelo visto, se des­
conhece por lá, em absoluto, todos os nossos es­
forços ! . . " Sofrimentos íntimos do coração : se
crermos no livro de ABEL BoNNARD, En Chine, um
Missionário ljie haveria confiado : "Nos primei­
ros tempos freqüentemente me acontecia de chorar
durante a noite, mas no sétimo ano comecei a me
habituar . .. . ",
Apesar dêsses sofrimentos todos, ou quiçá por
causa dêles mesmo, as Missões têm extraordinário
poder de atração.
JusTo DE BRETENNIERES era ainda criança quan­
do, às bordas de um poço no -j ardim de sua casa,
ouve o chamado dos pagãos : " Ouço os chineses
que me chamam".
Henrique Bordeaux conta-no� como uma de
suas irmãs, religiosa de São Vicente de Paulo, par­
tiu há muitos anos. Era professôra numa aldeia,
mas tinha a obsessão da China. Um dia se foi. O
escritor acompanhou-a até o limiar da povoação.
Logo foram obrigados a separar-se. "Volvi os
olhares uma infinidade de vêzes até que u�a volta

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A SANTIDADE EMINENTE (11) 87

do caminho a ocultou de minha vista. Havia-se


detido, imóvel, diante de um crucificado, as mãos
juntas, perdidas dentro das grandes mangas do
hábito, no gesto habitual das religiosas. Sua tou­
ca branca luzia em meio à escuridão que s·e fa­
zia com o descer da noite. Percebia-se, tão somen·
te, a silhueta da cruz. Essa é a visão que perdura
em mim. Nunca mais haveria de vê-la. Numa
tarde de fim de dezembro, em 1917, um aviso do
Ministério das Relações Ext·eriores informava que
minha irmã havia falecido em Pequim". Acres­
centa Bordeaux : "Esta noticia provocou em mim
uma como febre, um desejo de melhor agir, por­
quanto existe uma espécie de contágio com êstes
exemplos em que se p ercebe uma fé absoluta, tão
superior a nossas incertezas e à s•empiterna confu­
são de nossas ações".
Estranhas torturas maltratam, por vêzes, o Mis­
sionário : cá a mosca cecê, acolá a intolerável in­
vasão de animalejos de tôda espécie.
Monsenhor CLUT, evangelizando o Atabasca­
Maquênzie, refere que em 1872, no Forte Rae, tôdas
as vêzes que se iniciavam as confissões, começa­
va um suplício, pois os p enitentes descarregavam
sôbr·e êle, com seus pecados 'e falhas morais, co­
piosa profusão de hóspedes os mais variados.
Um Vigario Apostólico da mesma região, per­
tencente aos Oblatos d1e Mar(a Imaculada. Mons·e·

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88 A SANTIDADE CATÓLICA

nhor GRANDIN, narra a angústia que o oprimia du­


rante a visita que fazia aos Missionários, ao verifi­
car a espantosa nudez ·em que se encontravam mui­
tos dêles. Em certas ocasiões, par� obter um pou­
co de alimento deviam pescar debaixo do gêlo. O
Padre DucHAussms, em seu interessante livro Nos
Gelos Polares, premiado pel a Academia France­
sa, assegura que e ssa pesca constitui um verdadeiro
suplício : "Antes de mais nada é preciso ir lon­
ge, pois nessa ocasião os peixes s·e refugiam na
profundidade dos grandes lagos e a menor di�tân­
cia até o lugar da pesca é de pelo menos dois db.·
de viagem. Assim, dois de nossos Padres se vêem
obrigados a se afastar, durante quatro ou cinco
meses, vivendo isolados numa tenda de peles. Se
ao menos tivessem lenha suficiente para resistir
com um bom fogo às temperaturas que descem
até 35 graus abaixo de zero ! No entanto, coita­
dos, não a têm. Pense-se, além disso, no trabalho,
ou melhor, no martírio que representa o ficar o dia
todo num frio dêsses sôbre imensa planície de gê­
lo, sem proteção alguma, expostos a ventos gelados
e a uma nev e que cega . . . abrir buracos no gêlo,
de cinco ou seis pés de espessura e que na manhã
seguinte será preciso refazer, visto que o frio da
noite ter-se-á encarregado de os tapar. Além dis­
so é preciso, durante horas seguidas, manter as
mãos nuas dentro da água e do gêlo, os pés imo­
bilizados sôbre a neve, o que, por vêzes, ocasiona

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A SANTIDADE EMINENTE (li) 89

dores insuportáveis. O pescado obtido à custa d e


tanto sacrifício é preciso levá-lo a t é onde nos en­
contramos. Pàra isso, ·e somente isso, são necessá­
rios dois Padl'es e dois trenós puxados por cães e
que ficam em viagens constantes só para êsse fim.
Sem d íÍvida alguma, não são essas, viagens de pra­
zer ! Louvado seja D eus se, ao menos, a pescaria
tiver sido aproveitosa ! , Acontece, com efeito, que
nada se obtém . . . Que fazer, então ? Imagine-se
nesse caso, o valor do peixe ! . . . Nada ter com
que acalmar os estímulos da fome ! . . . Felizmen­
te, vela por nós a Providência de D-eus que nos
deixa, sempre, o recurso da oração . . .
Na obra Recordações de Meus Sessenta Anos
de Apostolado no Atabasca-Maquenzie, Monsenhor
GROUARD descreve essas Missões he1:óicas do
país dos esquimós no qual, em certas épocas do
ano, o frio cheg a aos 50 graus abaixo de zero e
onde, durante nove longos m eses, uma neve ine­
xorável o cobre totalmente.
Quando o autor de Epopéia Branca, Luís FRE­
DERICO RouQUETIE, comissionado pelo Govêrno fran­
cês para colocar a fita da Legião de Honra sôbre
a sotaina roxa do :Vigario Apostólico de Atabasca,
condecorou Monsenhor Grouard, teve ocas i ão de
pronunciar estas . palavras : "Desde sua chegada
ao Canadá em 1860 ali sempre ficou ; fêz conhe­
cido e amado o nome da França •em Alberta e até os
confins Nórdicos ; graças a êle constituem multi-

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90 A SANTIDADE CATÓLICA

dão os nomes geográficos franceses du região. S a­


cerdote z eloso, Missionário infatigavel, navegador,
geógrafo, .explorador, fundador d e cidades, arqui­
teto, pintor, compositor, escritor, agricultor; aos
·
oitenta-e-cinco anos . continua sendo o mais intré­
pido cuudilho do N orte. Recolheu os meninos e
meninas órfãos em instituições francesas por êle
fundadas, salvou a vida de Monsenhor CLUT em
circunstâncias memoráveis, com o risco evidente da
própria vida, protegeu as mulheres índias expos­
tas à brutalidade dos maridos, cuidou dos enfer­
mos e deu alento aos moribundos, publicou livros
sôbre religião em oito i diomas indígenas . . . "
Sacrifícios semelhantes notam-se sob outros
céus. O Officitel de 27 de fevereiro de 1927 anun­
ciava a agregação à Legião de Honra, na lista refe­
rente às colônias, de Monsenhor GENDREAU e de
Monsenhor LE CAMUS com menção das seguintes
benemerências : "Monsenhor GENDREAU (PEDRO
JoÃo) Vigário Apostólico do Tonquim ocidental.
Magnífico exemplo de desinteressada abnegação
.oferecido ao povo anamita durante cinqüenta-e­
três anos. Prestou os maiores serviços à causa
francesa no Extremo Oriente, da qual é um dos
mais conspícuos defensores.
s
Monsenhor LE CAM:US ( AiuGu To JoÃo) , Bispo
de Fort de France, Martinicu. Durante mais d e
cinqüenta:-e-três anos em que vem exercendo o mi­
nistério, deu provas da maior abnegação em prol

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A SANTIDADE EMINENTE (II) 91

dos interêss·es da Martinica. Distinguiu-se durante


várias epidemias que assolaram a colônia ·e mui
particularmente por ocasião das erupções do vulcão
Pelé, que ·e m 1902 destruiu a cidade de São P.edro".
Ao lado dêsses preclaros nomes como não le�­
brar o grande . "Bispo dos antropófagos", Monse­
nhor AuGOUARD, morto de esgotamento em 1921 de­
pois de ter passado 43 anos na África Equatorial,
assim como os nomes de todos os trabalhador·es dos
tró;í cos, J1esuitas do Congo, por ·exemplo, o Padre
VAN HEXTOVEN, cuj a vida acaba de ser publicada, o s
Padres Brancos dos grandes lagos, LoURDEL e
ACHTE ! Ambos foram atraídos para as Missões
com a leitura da vida d e �eófanes Veiiard, mártir
do Tonquim.
- Quem · de vocês gostaria de partir para as
Missões ? - p ergunta a senhora Achte que segura
nos joelhos o décimo primeiro filho.
- Eu, eu - exclama Agostinho ..
- Quem de vocês quereria ser mártir? - per-
gunta aos seminaristas o velho professo!.
- Eu, eu ! - exclama o jove:{Il Lourdel. :r;:ste,
no entanto, não é um entusiasmo infantil, passa­
geiro ! Mais tarde, quando lhe querem fazer al­
gum presente diz : " Comprem-me um Crucifixo
para o levar, sempre, ao p eito. Sej a, porém, bem
forte e tal que, passado pelo p escoço não mais
possa sair a não ser cortando-me o pescoço".

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92 A SANTIDADE CATÓLICA

Atravessemos o estreito de Moçambique : Mada­


gascar ! Leia-se, por ·exemplo, a vida do Padre
BouTELANT escrita pelo Padre SuAu, ou a 'do Padre
DELPECH. Ambas farão com que apreciemos as ab­
negações impostas pela grande ilha e o valor de que
são capazes seus apóstolos.
Passemos ao Oceano Índico. A vida d1e Hele­
á
n Touvé, Soror ANDREIA DE MARIA IMACULADA, cate­
quista missionária, é instrutiva e alrnmente �ifi­
cante, como também a de Monsenhor RosSILLON.
Alguns interessantes volumes dêste último, Os Ca­
valeiros da Selva; A Sombra das Palmeiras de Co­
romandel, nos fazem aperceber algo sôbre a evan­
gelização do lndostão ·e das maravilhas ali reali­
zadas pelos abnegados pregadores de Jesus Cristo.
Mostremos tão-somente um episódio. " Conhe­
ci um Missionario valente como poucos, o Padre
JoÃo MARIA DESEAUBES, recentemente falecido. Co­
mo é freqüente na índia, certo dia foi obrigado a
empreender uma longa viagem, a p é. Partiu an­
tes de �urgir o sol, deJl4lis de haver celebrado a San­
ta Missa, e caminhou tôda a manhã. Ao meio-dia
s·e deteve à �ombra de frondosa árvore e, confor­
me o costume da região, ajuntou três pedras para,
sôbre elas, cozinhar um pouco de arroz. Termi­
nada a frugal refeição, reiniciou a caminhada, bei­
j ado por um sol de quarenta graus, sem parar por
tôda a tarde ! . . . Chegad a que foi a noite, vencido
p-e la fadiga, com as vestes ·empoeiradas, o sangue

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A SANTIDADE EMINENTE (11) 93

em ebulição pelos efeitos da viagem e do calor, al­


cançando a modesta choça onde devia pernoitar,
deitou-se ao solo só com fôrças para exclamar :
"Sem dúvida, para se fazer uma viagem destas é
preciso ser santo ou maluco".
Deus, no entanto; aliençoa e torna fecundos ês­
tes p adecimentos. índios, chineses, malgaches, con­
gos, aos poucos se deixam conquistar p·elo apostc:J­
lado e pelo ·exemplo. No momento, como é difí­
cil, e quem poderia medir, calcular, as abnega­
ções postas em j ôgo para a conversão de um úni­
co pagão ! Nós que permanecemos em _terras ci­
vilizadas saudamos com religiosa unção a nossos
irmãos que o apostolado levou para regiões longín­
quas. Se em algum lugar existem Santos, será,
sem dúvida, entre êstes.
CAPITULO
. ,

IV

A Santidade eminente
(CONTINUAÇÃÓ)

III. Na vida sacerdotal.

inj ustos pretendendo que os San-


NÃotossejamos
floresçam, exclusivamente, em países de
Missão. Os sacerdotes de nossas ci dades ·e de nos­
sas vilas mostram-nos mais de um exemplo de san­
tidad-e. Agradava a BARRÉs citar esta frase de
PsiCHARI ao P·adre TouRNEBIZE : " Costuma-se per­
guntar se nos -d·i·as d·e hoj e •existem Santos e, em
caso afirmativo, onde se encontram. Volvamse os
olhos ao redor, pelas cas-as paroquiais ·e aí veremos
como flore·scem em grande número." PsiCHARI
não se ·enganava com esta afirmação.
A.s recentes indagações do Padre LHANDE sôbre
Cristo nos Arrabaldes Vermelhos não falam com
notavel ·eloqüência acêrca dos méritos dêsses sacer­
dotes perdidos na periferia parisiense e que, pri­
vados de recursos, d·e aloj amentos, realizam pro­
dígios, uriicamente por fôrça da santidade pessoal
e pelo ardor apostólico ?
Heferindo-se à Espanha, Monsenhor GoNZALEZ
y GARCIA escreveu sua obra O que Pode um Vigário

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A SANTIDADE EMINENTE (111) 95

Moderrw. Traduzido p·ara o francês, o volume con­


serva, íntegro, seu significado original. Para nos
convencermos de que são capazes nossos sacerdo­
tes, bastará abr-ir os olhos. Isto não somente em Pa­
ris. Tôdas as regiões nos .apresentam tipos perfei­
tos de santidade sacerrlo � al, nem todos vazado s num
mesmo molde, s·eguram·ente, mas (e isto torna
mais compreensível a demonstração) segundo a
idiossincrasia particular de cada temperamento.
La Bresse evoca a figura magistral de JoÃo
BATISTA VIANNÉY, o Santo maravilhoso do qual re­
cente tese doutoral dp Padre Francisco Trochu aca­
b$1 de pôr em evidência novos traços imortais. A
região de Auvergne orgulha-se do bom Padre SER­
REs (1827/1904) , primeiramente Pároco em Mau­
riac, Missionário-nato, fundador de um orfanato,
de uma -escola para surdas-mudas, de uma cóngre­
gação de irmãos d·estinados ao ensino, de um insti­
tuto de irmãzinhas para o tratamento dos enfermos,
de um asilo em Aurillac, Cônego contra a própria
vontade e que recusa obstinadamente o episcopado
até morrer, por fim� no retiro de pobres de Salers,_
deixando por fortuna, a se_u s herdeiros, seus instru­
mentos de suplício.
No Cl-ero de Orleans contamos com ALBERTo
IIETSCH, médico protestante convertido ao catoli­
cismo e feito sacerdot-e ; a região do Norte conta
com os Padres THIBAUT e HENRIQUE LESTIENNE, ca-

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96 A SANTIDADE CATÓLICA

pelães militares mortos pela França. O primeiro,


Capelão desde antes d a guerra de 14, venerado
pela guarnição de Cambraia, o segundo (1870/!
1915 ) , fundador das cidades-jardins de Lila e or­
ganizador de um sem número de instituições ope­
rárias.
Quantos nomes aind� ! O Padre BuATHIER,
nasci �o na vila natal do Santo Cura d e Ars, autor
do maravilhoso livro O Sacrifício e de quem o San­
to VIANNEY havia dito : "Tratem com cuidado
dêste menino porque fará grande hem." O Padre
HENRIQUE CHAUMONT (1838/1896) , fundador de três
.
sociedades e grande diretor de alunos ; o Padre
DÉBRABANT, Pároco em Marchiennes, em São Tia­
go de Douai, Vigário de Vred, fundador do
Colégio de Tombe em Kain perto de Tournai
e, princip'almenl-e1 da próspera congre�ação da
Santa União. O Padre CLÁUDio BouvmR, pro­
fessor na escola São Mauricio de Viena e que
tem seu fecundo apostolado perpetuado pelos
livros A Educação Sacerdotal e A Educação Reli­
giosa. �sse Padre, por suas simplicidade e humil­
dade, não se podia acomodar às honras eclesíás­
tic'as e dizia : "Com o sacerdócio alcançamos a
meta." Era irmão do Padre F.REDERico BouviER,
conhecido por seus trabalhos apologéticos e estu­
dos sôbre a História das Religiões e que, mortal­
mente ferido em Vermandovillers, teve fôrças
para se arrastar até outro moribundo a fim de o

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A SANTIDADE EMINENTE (111) 97

absolver e morrer, logo após, com os braços ·e m


cruz.
Mortificado como SÃo VIANNEY, tão absoluta­
mente pobre ·e piedoso com êsse Santo, foi o Padre
CHEVRIER, primeiramente Vigário em Guillotiere,
de ilimitada abnegação por ocasião das famosas
inundações d·e Lião. Em meio d·e inconcebíveis
dificuldades e com incrível confiança n·a D ivina
Providência, funda a Obra do Prado em favor dos
meninos dos bairros mais abandonados. Sempre
s�nhor de si, recolhido� em todos dava a impressão
de um grande amigo de Deus. O povo no meio
do qual vivia, não se enganava a seu respeito.
" S e o Senhor - dizi a u � a mulher do p�voado ­
é tão bom como o Padre CHEVRIER, não me preo­
cuparei em ser por êl'e j ulgada no último dia." 1
Grande amigo do povo foi também o Padre
PLANCHAT, que devia morrer durante a Comuna.
Teve seu campo de ação nos tugúrios operários.
Uma tard e se dirige para visitar um moribundo.
Lançam-no à rua. Estava-se no coração do inver­
no e, assin1 mesmo, tranqüilam·entc senta-se na

( 1 ) Além da vid a do Padre Ghevrier por VIi.LE­


FRANCHE, consulte-se La. Biographie e um volume de
Lettres pelo Padre CHAMnoTs. Veja�se também Le Prêtre
selon l'Evangile ou Le véritable disciple de N. S. J. C.
(Vitte) , livro composto 'pelo Padre CHEVRIER para a
formação de seus colaboradores nã Obra do Prado.

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98 A SANTIDADE CATÓLICA

soleira da porta e, debaixo da neve, põe-se a rezar


o têrço. À meia-noite ainda lá se encontrava
qu,ando, de súbito, surge uma mulher com -a sem­
bl'ante transfigurado a lhe rogar que voe a ver o
enfêrmo, o qual, em poucos instantes, entrega a
Deus a alma purificada. O Padre PLANCHAT acos­
tumara-se a f�itos semelh'antes. De onde proce­
dia, no en tanto, tanto zêlo ? A resposta no-la dá
seu historiador : " Somente o intimo dos Santos
nos pode dar a chave dos S'eus P!"odígios. Se o
Padre PLA.."'lCHT não tivesse tido senão uma ativi­
dade de acôrdo com seu temP'eramento, suas fôr­
Ç'aS não teriam podido resistir durante vin.te anos
ao acúmÜlo de serviços 'e trabalhos que tinha. Sua
alma retemperava-se inc·essantemente na fonte
eterna da caridade, no próprio Deus. Nesta fo­
gueira de amor e de c'alor se iluminaram 'esta vida
,e esta morte. "
Por algum tempo o Padre PLÀNCHAT se insta­
lou em Arras, a fim de auxiliar as obras do Padre
D'HALLUIN, como êle, nessa época, agregado aos
Irmãos de São Vic.ent,e de Paulo. O Padre
D'HALLUIN deve ser consi derado outro amigo dos
humiMes e que deixou, n a região de sells traba­
lhos, um renome universal e virtudes esp·eciais.
Nessa mesma cidade viveu outro sacerdote
consideradõ por todos como um verdad·eiro santo :
o Padre BELLANCER.

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A S�TIDADE EMINENT;f: (111) 99

Qual n diocese que não poderia enumerar


outras tantas glórias ?
Certa vez a irmã do Padre PLANCHAT, religiosa
em Constantinopla, expressa a su�prêsa de que,
sendo o irmão tão apaixonado pela evangelização
dos selvagens, não se tenha feito j esuíta ou laza­
rista : "Então já não t·ens mais os sentimentos de
outrora quando ao ler as atas dos mártires me
dizias : Como são felizes ! Que graça insigne I -

Se fôsses Missionário, poderias esperar uma graça


igual. " Responde-lhe o humilde apóstolo dos ar­
rabaldes, explicando-lhe a que mart!rio D eus o
chama. Estaria prevendo que, no coração de
Paris, como os mártires da China ou da Coréia,
também daria, um dia, o sangue por Cristo ?
A. glória do nome não impede ao sacerdote
de Jesus que se incline para a dor dos irmãos m e­
nos fe.Jizes. O Padre DE PREVILLE em Boulogne­
sur-Mer, o Cônego CosTA DE BEAUREGARD em Cham­
bery 2, Monsenhor de SEGUR, o Prelado cego, total­
mente entregue a seus pequenos aprendizes p a­
risi·e nses, podem dar fé do que afirmamos. D e­
tenhamo-nos um poúco com êstes últimos.
CAMILO CosTÁ, que devia fundar o orfanato
de Bocage, tinha nov·e irmãos e irmãs. Cansa-

(2) Sua biografia leva <> títul<> de Uma Alma de


Santo.

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100 A SANTIDADE CATÓLICA

grado sacerdote, assim explana o proMema : " Po­


de-se - de·i xou escrito - dar a vida de duas
maneiras : ou num instante, deixando-se matar por
aquêles a quem desejamos salvar, ou, pelo contrá­
rio, lentamente, dia a dia, empregando as fôrças,
o tempo, tudo quanto se poss_u i, em favor daque­
les a quem se ama. Escolhi êste s·egundo mo­
do . . . " Uma infinidad•e de e·pisódios de sua vida
dir-se-ia copiada de uma vida de São FRANCISCO
DE SALES, escreve HENRIQUE BoRDI!AUX. Não é di­
zer bastante, muito mesmo ? No entanto, não é
de mais. Lembra, também, outra figura : São
VICENTE DE PAULO. Uma imagem do grand•e ami­
go dos pobres decora o túmulo do Cônego CoSTA
e diante de seu restos se reúnem as pessoas, -
acrescenta o comentarista - como ante o sepulcro
d e um Santo.
Mais conhecida é a vida de mons·enhor DE
SEGUR. É preciso ler as magistrais páginas do
marquês de Vogué, descrevendo a morte do Pre­
lado cego. Tôda Paris só tinha um me-smo comen­
tá�io. O sentimento ·era unânime. Aquêle que
acabava de desaparecer era um Santo, não no
sentido amplo que por vêzes se atribui à palavra,
mas um Santo no sentido exato e preciso da pala­
vra. A Igrej a sorriu ante o p•edido de introdução
de sua causa. Por ocasião do Congresso Euca­
rístico de Lurdes, em 1914, dirigiu-se uma súplica
nesse sentido a Pio X, assinada por quarenta Ar-

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A SANTIDADE EMINENTE (111) 101

·cebispos e Bispos. A solicitação •expre-ssavn o


desejo de ver glorificado aquêle que com o Padre
o'ALZON organizou COJ?l. o caráter de Obra Cató­
lica Internacional para a defesa da cons•ervação
da Fé, a grande ·e interessante Associação de São
Francisco de Sales ; aquêle que foi, com a senho­
rinha TAMISIER, o iniciador dos congre-ssos euca�
rísticos ; um dos precursores e mais ardentes após­
tolos da Comunhão freqüente ; aquêloe que, sem
cessar, prodigalizou sua palavra ardente . e seu
ministério de confessor à juventude francesa e a
quem tantos ·e tantos cristãos são devedores da
própria perseverança e tantos sacerdotes a pró­
pria fidelidade ao chamado dos altos ; aquêle que,
no Congresso ' de Nevers, em 1871, propunha a
união das organizações trabalhistas tão queridas
a soeu coração constantemente inclinado aos pe­
quenos e deserdados da terra ; aquêle que, depois
de hav·er solicitado ao S enhor, no mesmo dia de
sua ordenação, a enfermidade santificadora, su­
portou-a com · uma paciência que nada foi capaz
de alterar ; aquêle que, malgrado à cruel cegueira,
realizou uma larga série de obras que alimenta­
ram, consolaram 'e converteram milhares de almas ;
aquêle que se apresentou diante ·de su a geração
qual modêlo de preclara virtu.d� e de formosura
sobrenatural, a prolongar o benefício de seus
exemplos sôbr� os que ,estudam sua vida . . . "

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102 A SANTIDADE CATÓLICA

Se passarmos a considerar o alto apostolado


intelectual, harmonizado com uma vida de bri­
lhante virtude, poderemos citar os Padre·s PER­
REYVE, DE BnoGLIE, Monsenhor D'HULST, os Padres
DE TounviLLE, MonEL, Monsenhor BAUNARD e, num
quadro mais mo�esto mas não meuos fecundo -
a cripta de ,Santo Agostinho � o Santo Padre
Huv�LIN, que Deus levaria ao encontro de CARLos
DE FoucAULD para transformar o ardoroso oficial
de caçadores d e África no apóstolo infatigável dos
tuaregues, e em mártir autêntico.
Mais próximo de nós, o Card·eal MERCIER, tão
eminentemente pobre e desprendido, tão amante
"da verdade e da concórdia e da caridade. En­
fêrmo, nada mais sabia dizer senão isto : "Como
é pouca coisa a dor física ! " Só se interessava
pelas almas, as almas com suas necessidades so�
brenaturais. Moribundo, fará um g.esto maravi­
lhoso : dar seu anel pastoral ao grande amigo lorde
HALIFAX, um dos chefes da Igrej a Reformada d e
Inglaterra, com o qual freqüentemente havia tra­
tado acêrca da União das Igrej as. Conhecida é
a comovedora carta que o ilustre purpurado es­
creveu a seu Clero na clínica de Bru:x:elas, a fiin
de o estimular, pela derradeira vez, à santidade
da vida : "18 de j aneiro de 1926. Meus amadis­
si:lpos Irmãos ng-,. sacerdócio : Durante minhas
horas de meditação, ao ver que se desvaneciam,
uma após outra, lentamente, tôdas as ·esperanças

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A S AN TIDADE EMINENTE (111) 103

humanas e que minha alma ficava, só, diante de


D eus, meu pensamento voava a se unir �ais in�
timamente convosco. Convosco vivi ·em comunhão
espiritual ininterrupta. Em vós vejo o sacerdócio.
Privado da felicidade de celebrar o santo sacrifí­
cio da Missa, por todo o d·i a me associava à Mis­
sa que o Sumo Sacerdote, Nosso Senhor Jesus
Cristo, incessantemente oferece por meio de seus
ministros em todos os altares do mundo. A meus
olhos a Missa tomava um caráter de re-alidade
excepcionalmente encantadora, porque o sacrifício
do Calvário, cuj a réprodução ela ·encarna, se me
representava sob um aspecto tangível, ao qual me
erà dado aderir mais ativa e diretamente do que
de costume. Por isso julguei que vos devia tor­
nar participe-s desta graça que o Senhor em sua
bondade me deparava, convidando-vos, nestas
horas que talvez sejam as últimas de minha vida,
a que sempre celebre·is a Liturgia da Missa, como
se efetivamente vos encontrásseis no cimo do Cal­
vário, nêle depositando todo o fervor da fé e da
devoção de que sois capazes."
Em 6 de outubro de 1845 RENAN d-escia as esca­
das do seminário de São Sulpício para não mais as
escalar. No dia 10 do mesmo mês e do mesmo
ano, NEWMAN ·escrevia de Littlemore a seus amigos
mais íntimos : "Esta noite espero o Padre Do­
MINGOS (:passionista) . É um homem simples e

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104 A SANTIDADE CATÓLICA
.... -

santo. Hei de pedir-lhe me receba no único redil


de Cristo." E, no único redil de Cristo, o grande
NEWMAN foi um Santo a seu modo. Traçando um
paralelo com outro ilustre convertido , SoLOVIEF,
um Newman russo, com o Cardeal inglês, Mon:­
senhor D'JfERBIGNY pôde dizer sem temor de ser
desmentido : "Ambos, antes mesmo da conversão,
amaram a castidade até se votarem ao celibato
perpétuo ; amaram a Jesus Cristo até quebrar, para
o seguir por tôda parte, as mais puras amizades;
ambos amaram a Igr�jn universal e a pátria até
se imolarem quais vitimas voluntárias, a fim de
, impetrar, de Deus, que ambas cheguem, um dia,
a uma união perfeita�" .
D epois de passnr pelos graus inferiores da
hierarquia, por que não haveriam de galgar os mais
elevados ? Citamos sacerdotes ; mais adiante, ao
lembrar a grande guerra, virão agrupar-se novos
nomes: , Citamos Prelados. Quantos e quão for­
mosos e·p isódios não encontraremos em vidas como
as de Monsenhores PIE, GAY, DuPONT DE LaGES, dos
Cardeais RICHARD, AMETTE, GumERT. Dois Arce­
bispos de Paris, Monsenhores AFFRE e DARBOY, são
assassinados ao tratnr, cm� risco da própria vida,
a paralisação da revolta nas ruas da Capital. A
vida de -ambos talvez possa ser j ulgada com seve­
ridade, mas, COI_!l tôda certeza, um sentim·ento
unânime 11ão pode deixar de reconhecer em sua&
mortes um ;:1to do mais puro heroísmo.

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A SANTIDADE EMINENTE (111) 105

No ápiC'e da hierarquia se ·encontra o Papa.


Será canonizado em bre·ve o Pap a Pio X ? Mui­
tos o crêem. Em 15 de março de 1927, a fôlha
envenenada que leva por título L'impartial franr­
çais (0 Imparcial Francês) criticava a Santa Sé
por elevar um grande número de pessoas à honra
dos altares : "De tempos para· cá a Igrej a vai
criando Santos às centenas e •em série. Trata-se,
agora, de be·atificar o cardeal RICHARD . . como
.

Lambém o Pap a Pio X." Difícil S'erá um enten­


dimento. A Igrej a - repete-se por tôda parte �
já morreu .e j á não apresenta novas formas de
santidade. No dia seguin t·e grita-se sem mais : a
Igrej a fabrica Santos às centenas. Contanto que
com isto não se queira dizer que Roma canoni­
za qualquer pessoà, pois, en_tão, responderíamos,
mandando 'a êsses demagogos que reparasse·m nos
fatos. 1 que comparasS'em, por exemplo, um Pio

( 1 ) Quanta severidade, pelo contrário, ·no julga­


mento da Igreja em matéria de autentificação oficial d a
santidade I Indiquemos, brevemente, o processo se·guido
nestes a ssu n t os
. O Bis p o do luga·r começa por instruir
llm processo minuciosissimo a respeito d a pessoa. Se o
conjunto de testemunhos o autoriza, remete-se o processo a
Roma. A Congregação dos Ritos nomeia um postulador
e um advogado e logo se rprocede a u m exame detalhado
d os escritos do candidato. ·Um Promotor da fé executa
as f u n ções do ministério público e começa seu trabalho
de ce nsura1 constituindo-se, como se costuma dizer vul-

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106 A SA..'II;fTIDADE CATÓLicA

X com ANATOLE lt'RANCE, e dissessem ·em qual


dêles se achava a · virtude : pelo que nos interessa,
ficamos com Pio X. De origem humílima, sim­
ples Vigário de aldeia, por sua inteligência e
impar virtude, JosÉ SARTO chega ao patriarcado
de Veneza e, na morte de � eão XIII, é designado
pelo Conclave para suceder a êste no trono ponti-

ga·r mente, o Advogado do J:?iabo. D epois de uana série


de d ebates contraditórios, iniciam-se, ou não, os proces­
BOS denominados apostólicos com a mira à beatificação :

exame das virtudes e dos milagres dos quais se reque­


rem ao menos dois. Um protestante inglês censurava,
certo dia, a um Prelado da Congregação dos Ritos a
excessiva facilidade com que a Igreja de Roma proce­
dia à aceit a ção d e certas curas, atribuindo-lhes um ca­
ráter milagroso. Corno única resposta o Prelado limi­
tou-se a enviar ao domicílio dêsse senhor dois grossos
volumes de um processo pendente de .aprovação. A
Ieiturà impressionou vivamente o protestante que, a o
devolver o s volumes, d eclarou que, sendo possível provar
todos os milagres com a clareza dos que estavam contidos
nos volumes acima, -não teria tido o menor inconvenien­
te em se retratar. "Pois bem - respondeu o Prelado -'­

saiba que êsses milagres, que lhe parecem tão fortes


de fazer fé, tão documentados, não .foram ac�itos pela
Co n gregação."
·
se, depois de quanto foi dito, se produzem novos mi­
l agres por intercessão do Bem-aventurado, inicia-se novo
processo apo·stólico, com idêntico lJroced imento e igual
número de .reuniões. Se o ditame resultar .fa·vorável, o
Papa, em bula dirigida ao mundo ·católico, proclama a
santidade do Beato, decr�ta a canoniza ç ão e assinala a
data da festa,

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A SANTIDADE EMINENTE (111) 107

fício. Será o Papa da comunhão freqüente e da


luta contra o modernismo. Diz-se que, mesmo
em vida, op·erou milagres ; vários foram compro­
vados, após a morte. O povo cristão não abriga
a menor dúvida a respeito da santidade do Papa
Pio X.2

(2) Veja-se na Coleção Flammarion : "Os grandes


Corações", sua vida pDr R. BAZLN,
CAPÍTULO V

A Santidade eminente
(CONTINUAÇÃO)

JV. Na vida leiga.

ADA d e surpreend·ente se encontrem Santos


N ·entre o Clero e as Comunidades que repre­
sentam o elemento destacado no seio da Igreja.
Pelo' contrário, seria estranho que assim não fôsse.
No entanto, novas riquezas nos esperam se nos
dermos ao trabalho de e xmninar os exemplos de
perfeita vida cristã e ?e excepcional virtude que se
encontram escondidos no meio das massas.
Aí vemos r·epresentadas tôdas as idades e cate­
gorias sociais. Seria intérmina uma enumeração,
mesmo incompleta. Só nos é possível dar alguns
exemplos e, por assim dizer, lembrados ao acaso.
Deixamos à boa-vontade do leitor rJcorrer
às fontes oferecidas pelas biografias que diària­
mente vêm à luz e mostram, até à evidência, quan;..
to é amado Nosso Senhor Jesus Cristo, como é
servido e como, em meio de um mundo incréu,
agitado, pervertido, podemos encontrar oásis e
m�nanci�is � e santidade. Pa�eceria tudo ·escuro,
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A SANTIDADE EMINE:NTE (lV) 109

envolto nas trevas da noite, mas basta levantar


a fronte para se ver uma infinidade de pontos
dourados dissipando as trevas. No firmamento cin­
tilam inúmeras estrêlas.

Encontramos Santos no ·e stado matrimonial :


MARIA LúciA VRAU, IsABEL LESEUR, a senhora D E AR­
RAS, . LúCIA CRISTINA, CARRÉ DE MALBERG, MADALENA
SEMER : " Sinto-me possuída da verdade e vejo sua
luz " - dizia esta em seu leito de morte, em 7 de
maio de 1919. Era esta a fórmula de vida de tô­
das as outras.
Numerosíssimas são as Santas entre as j ovens.·
" Sofrer e morrer, mas fazer . algum a coisa", dirá
MARIA PAULET, uma pequena flor da V•e ndéia. E
é mais ou m·enos nos mesmos têrmos a reflexão d e
LuísA D E BETTIGNIES, postulante do Carmelo. Ao
rebentar a guerra de 1 914, consagra sna vida ao
serviço do p aís em tais .condições que nada devería
ignorar : "Sei perfeitamente como isto há de ter­
minar, dizia a uma das colaboradoras mais íntimas,­
mas terei a satisfação de haver prestado serviços.
Apressemo-nos e trabalhemos intensamente antes
que nos prendam . "
Sentimentos análogos alentavam uma j ovem
apóstola de vinte-e-três a.nos, dos subúrbios d e
Liége, n a Bélgica, MARGARIDA LEKEUX, MAGGY, que
se havia .oferecido por vítima a fim de obter a pro­
teção divina em favor dos irmãos soldados. GE-

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110 A SANTIDADE CATÓLICA

NOVEVA HENNET DE GouTEL que, por um instante, e


em conseqüência de se haver e·n tregue a leituras
desordenadas, experimenta indecisões na fé, mas
que logo atraída pelo Sn:.LON, nos inícios da guer­
ra, volla à Romênia, a fim ·de se ·entregar ao tra­
tamento dos feridos. "Ainda não trabalhei _suficien­
teinente para poder voltar. Entrego-me a Deus.
Não tenho outro ideal que· não sej a a vida e-terna.
Tódos os dias fico à sua espera e sei que dia a dia
me aproximo da mesma. A vida é muito curta. "
Dizia também : "Não quis·era morrer ante-s d·e ter
feito algum a coisa ! " Aspirações magníficas, as
dessas almas tôdas, tão diferentes umas das ou­
tras e, ao m·esmo tempo, tão sem·elhantes !
Acusa um caráter religioso mais acentua do
MARIA DE LA FRVGLAYE que, no mundo e com a auto­
rização de seu Diretor, Padre RoNSIN, aos vinte-e­
-seis anos de idade faz o voto de sempre fazer tudo
do modo mais perfeito. Ingressará mais tarde no
mosteiro Des Oiseaux. (Congregação de Nossa
Senhora.) Estando ainda no mundo recebia esta
indicação do Padre RENA:ULT : " Fazei tôda oração
que puderdes, mas tratai, sobretudo, de vos mau­
terdes unida à vontade de Deus presente em vós
pela graça. " Ela obedecia fielmente.
Belga pela linhagem paterna e francesa pela
materna, MATILDE DE NEDONCHEL vai até Ars. Mo­
vido por sobrenatural iluminação, o S�nto· Cura
peroebe que tem diante de si uma alma predes-

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A SANTIDADE EMINENTE (IV) 111

tinada a uma santidade altíssima e lhe dá conse­


lhos de acôrdo com a sabedoria divina. Dir-se-ia
que a partir dêsse dia o Espírito Santo infunde em
sua alma e quase que em grau semelhante, as vir­
tudes do santo sacerdôte, especialmente a humil­
dade, a mortificação, o zêlo ardente pe·las almas
e a imensa chama de amor para com Deus. MA­
TILDE faleceu aos vinte-e-cinco anos, nas vésperas
de ingressar no Carmelo. Os milagres e dons
extraordinários com que Deus se serviu glorificá­
la permitem esperemos que também ela, se·g uindo.
as pegadas do Santo Cura de Ars, alcance as hon­
ras dos altar·es.
Na Bélgica; LuísA LATEAU, a m aravilhosa esti­
gmatizada de Bois d'Haine, a princípio discutida
e- sôbre cuj o valor místico parece não mais caber
a menor dúvida, "verdadeiro crucificado vivo, por
Deus pregado no madeiro, na metade do século
XIX, a fim d e convidar os viandantes a levantar
os corações até as coisas sobrenaturais", como s e
exprimem o s historiadores, viveu durante do.2;e
anos sem provar o menor alim�nto nem conciliar o
sono e tôdas as sextas-feiras sentia, reproduzidas
em si mesma, as agonias da Paixão.
De misticismo menos maravilhoso, mas de in­
comparável abnegação, a senhorinha BoNNEFDis, de
Dardilly, no Ródano, tendo em mira a evangeliza­
ção dos habitantes dos subúrbios, concebe a idéia
de uma 'escola circulante e ·esgota a p rópria . vida

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112 A SANTIDADE CATÓLICA

no apostolado dos campos de férias, p ara morte·r


num asilo de Picpus, em 1914. Igualmente, PAU­
LINA JARICOT a quem se deve a obra, leonesa na
origem ·e hoj-e mundial, da Propagação da Fé, e da
qual, interrompendo certo dia o sermão, o Santo
Cura de Ars pôde •exclamar : - "Ah ! irmãos,
conheço uma pessoa que sabe aceitar perfeita­
mente as cruzes, cruzes muito pesadas, e as suporta
com . amor : é a senhorinha JARICOT. " No testamen­
to da corajosa jovem se pode l·er a e·xpressão dêste
desej o : " Ao aliandonar a vida sentiria tanto não
poder continuar a adorar Jesus Cristo sob os véus
eucaristicos em qu e é tão desconhecido e olvidado,.
.
de modo que não vacilaria u m instante sequer
permanecer sôbre a terra até ao fim dos séculos,
se soubesse que o am aria com o fervor dos Santos
e nunca ofenderia com o pecado.·�
Também foi anjo da eucaristia JoANA MARIA
FABRE, que viveu de 1891 a 1922 •e cujos escritos
são radioso poema de amor. A idéia que os une
- escreveu o Cardeal MERCIER - é o encadeamen­
to de uma ação continua da Providênci a que guia
uma alma privilegiada, desde os primeiros instan­
tes em que se abre à graça, até o momento em que,
aos trinta anos, se prostra aos pés do altar, a ofe­
rece·r a própria vida a D eus, em holocausto pela
salvação das almas e, especialmente, pelo sacer­
docio.
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A SANTIDADE EMINENTE (IV) 113

Muito semelhante a esta, pelo espírito de ge­


nerosidade que acompanha sua oferta, é SERAFINA
PERET. PAULA FLE!URY DIVES escreveu sua biogra­
fia sob o título sugestivo Na alegria A tr::wés a
Cruz e mostra-nos a correspondência e o diário
desta alma vítima e hóstia, d e origem humilde
mas de sublime generosidade. ··

Não é estranho encontrar Santos entre as · jo­


Yens, mas também os temos ·entre os jovens. Ve­
jam-se, com efeito, os anais, crônicas e livros de
'
ouro dos cstabelecirnento s educacionais e Colé­
gios : a seleç? o mostrar-se-á copiosíssima. Nem
tudo será enqu:J.drado dentro da denomin ação
usual de santidade, mas para muitos dêles não' se
poderia achar têrmo mais apropriado e que me­
lhor se lhes aplicass·e.
Além disto e en' re as biografias puhlicadas,
que me·sse magnífica ! Veja-se, por exemplo, em
A lmas de Jo u.en.s Normandos as r·eferências acêrca
1
rle BERNARDO e JosÉ MILCENT de uma família de
treze irmãos, sobrinhos da Irmã de Caridade que
teve uma atuação social tão destacada e da _qual
nos ocupamos anteriormente. Veja-se também
MAURÍCio RETOUR, cuja correspondência do período
de noivado traduz urna alma profundamente cris-

( 1 ) Sua biografia completa foi publicada com o tí­


tulo L'un d'eux, pelo Padre BARON. (Téqui.)

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1 14 A SANTIDADE CATÓLICA

lã e que morreu capitão com vinte-e-seis anos, em


Tahure, em 27 de setembro d� 1915.
Como nã o são preciosas as facêtas da alma
de HENRIQUE DELATTRE que nos mostram essas Me­
ditações Sôbre o Padre-Nosso publicadas pelo Pa­
dre THONE e que11 deixnm transluzir uma fé e um
amor fora do comum aos vinte anos !
Não conta muito mais do que essa idade
PEDRO PoYET, quando com seu fervor, com o ar­
dor de s�as convicções e a generosidade avas­
saladora de seu exemplo, cria na Escola Normal
o partido Tala. dos que assistem à Missa. Tam­
bém êste devia morrer em plena mocidade, mas
algo dêle não morreu : a lembrança d e sua ativi­
dad·e e a san tidade de sua existência. �um dis­
curso pronunciado nas j ornadas sociais de Limo­
ges, em 1909, exclamava : " Meus queridos cama­
radas, propaguemos a CRISTO com-nossos atos, com
nossas p alavras e com nossa vida . . . Mas, por fa­
vor, não esqueçamos nunca : de modo algum po­
deremos levar Cristo às almas s·e antes o não pos­
suirmos em nós mesmos. " Ern esta sua grande
preocupação : " Possuir em si mesmo uma "alma
atormentada pelo afã da ausência divina . . . Es­
eutar no próprio íntimo a voz interior de Deus e
conformar-se com e la sem vacilar. " A um ami­
go : "Ocupa_J esus Cristo, em você, o lugar que lhe
compete ?"

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A SANTIDADE EMINENTE (IV) 115

Também é chamado a f'azer um bem conside­


rável, não por meio do apostolado oral, mas com
a publicação póstuma de sua correspond �ncia de
guerra, um jov·em extraordinário, DEHIVAL, filho
de pobre burgo alsacian o e que, moço ainda, se
entl"ega à oração e à austeridade,.; ferido no início
da guerra como cavalariaoo, parte com a artilha­
ria para S alonica, de onde escreve cartas que se
elevam a quanto de mais sublime escrever-am um
LENOIR ou um Fo;u cAULJ'. A s Etapas d,e Dehival
na Senda do Amor constituem um dos mais lin­
dos livros espirituais que se tenham escrito. "A
jntensidade da vida interior na alma dêste sol­
dado é simplesmente notável", deixou escrito um
grande Bispo.
Não p-or certo inferior em a intensidade de
vida interior e o ardor dos anelos de perfeição em
G u iLHERME DE MoNTFERRAND, do qual se de·ve ler
a biografia escrita pelo Padre Rouz1c. Educado
em Florenes, no período anterior à guerra, pelo
singular Padre DE GIRONDE, que ao p artir para as
fileiras, em 2 de agôsto de 1914, escrevia : " Ser
heróico até o ponto de impedir p ara o futuro uma
nova ·expulsão dos j esuítas", GuiLHERME DE . MONT­
FERf\AND, depois de hav·er optado de início p ela
carreira militar, decide-se pela vida religiosa,
morrendo, porém, antes de ver realizado s·eu de­
sej o.

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116 A SANTIDADE CATÓLICA

Estupenda a figura de Jos uÉ BoRsi d e quem


felizmente se traduziram os Colóquios. Grande
admirador de DANTE, confirmado em agôsto de
1 915 p �lo Cardeal MÃFFI, t·erce·iro franciscano, sub­
tenente estimado, morto apenas chega"do à frente,
nestes têrmos se exprimia, animando-se para nada
recusar a Deus : "Enquanto me limito às pa'lavras
perco o tempo, pois ninguém crerá 'em mim ; mas,
se proceder por meio de obras, não haverá no
mundo eloqüência capaz de resistir à muda vee­
m ência de meu gesto. Os homens necessitam de
exemplos e não de palavras, pois compreendem
que sem exemplos vana .est neligio - a religião
é então absolutamente vã." Dizia também : " O
ünico rem édio consiste e m subir mais para rima."
E, para dar com êle, a morte foi obrigado a es­
calar os mais altos cimos.
Mas que representam êstes poucos exemplos
em meio a uma legião que conta com BLONDINO
UE SAINT HILAIRE, ALEIXO VILLIÉ, os dois GAILLARD
.
BANCEL, HENRIQUE DE 1\V : .. u DUIT nu PLESSIS e uma
infinidade de outros ? Mais adiante, ao tratar do
capítulo referente à guerra, v·eremos ampliar-se
·esta lista.

O valor cristão não olha para o curso dos


anos. A santidade, ordinàriamente flor da matu­
ridad�, mudar-se�á, com mais facilidade do que
em outras épocas, em flor precoce ·e j ov·em. "Ha-

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A SANTIDADE EMINENTE (IV) 117
..

verá Santos entre as crianças ! " Esta expressão


é de Pio X, p erfeitaniente compenetrado das gene­
rosidades cristãs de que é ca·paz a prática da Co­
munhão freqüente desde a mais tenra infâ�cia.
Primeiramente devemos atribuir à Comunhão êste
impulso de assombrQsa valentia e intensa pieda­
de, em épocas e idades que não podem deixar de
desconcertar e assombrar nossa maturidade um
tanto anquilosada.
"As crianças nos tensinam!" - pode-se dizer,
e com todo acêrto. A criança é o pai do homem ;
num sentido mui exato, na ordem da santidade, as
crianças nos dão inúmeros exemplos. Liçõ-es de
fidelidade ao dever como ANA DE GVIGNÉ, IsABEL
BESLIER e JoA.."'"A GABRIEL; lição de· amor ao sacrifí­
cio como SIMONE DE V. e MARIA CLOTILDE; lições
de abrasado amor pela Sagrada Hóstia como GER-
1\IANA HEMERY ·e liçõ-es de extraordinário espírito
de fé e terna confiança ·em Deus que nos deu, por
exemplo, G um o DE FoNGALLAND.
Ouçamos algumas palavras dêsse menino en­
cantador, que o _ pintam ao vivo. Ouçamo-lo fa�ar
durante a última enfermidade que o devi a levar
ao túmulo, quando· só contava onze anos : " Quan­
do aos sete anos fiz minha Primeira Comunhão,
o Menino Jesus disse-m e : Meu querido Gumo, vi­
rei buscar-te logo. Hás de morrer jovem ! � Em
Lurdes, no verão passado, e na gruta, a Virgem
cop.fiou-me um segrêdo : Gumo, não demorarei
'

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118 A SANTIDADE CATÓLICA

em vir buscar-te para te levar ao céu. � Não cho­


re, mamãe, pois morrerei em seus braços e dêlés
passarei aos da Virgem Santíssima. Ela prome­
teu-me que irei diretamente ao céu." - " Quando
o coração me doi muito, agitando-se com tal vio­
lência que parece querer saltar, digo a Jesus : Cal­
mai-o Vós que nêle habitais." - "O céu ! Não
sei fazer uma idéia dêle, pois para mim o céu é
Jesus." - "Eu queria ser Padre, mas Jesus quer
fazer de mim um Anjo."· - "Nada temo, nem
mesmo a morte, porque ela é a porta do céu ! ''
Outro menino, fal·ecido com dezesseis anos, e
cuj o nome nos não foi comunicado, dizia : " Queto
ser sacerdote. Serei sacerdote, antes de tudo, por­
que o Menino Jesus mo d1sse no dia da Primeir�
Comunhão, e devo fazer quanto diz. Será logo,
pois devo ser como São JoÃo, o apóstolo que o
amou mais do que· os outros ! " Assim fala-xa aos
oito anos. Vinte-e-quatro m-eses mais tarde : "Sou
demasiadament·e pequeno para fazer o s:;tcrifício
de minha vida com uma intenção altíssima ? · Sou
muito pequeno para ter méritos em favor do§ que
amo ?" Antes de cair enfêrmo : "Sendo pequeno,
fiz o sacrifício de minha vida : sei o ·que me es­
pera, mas não vacilarei. O que acontecer será a
vontade ·de Deus. Pessoas há qú'e d evem expiar
e resgatar os demais." Sua virtude preferida era,
com a generosidade, a simplicidade : "Não posso
compreender que- se vá por meio de tantos cami-

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A SANTIDADE EMINENTE (IV) 119

nhos oblíquos até Nosso Senhor : quando os San­


tos O viam na terra, prosternavam-se a s·eus pés
para os beijar : eu, porém, tanto O amo que, se
chegasse a vê-Lo, saltaria no seu colo, para O
.abraçar."
Entre os homens, também encontramos exem­
plos de santidade. Acaba de ser •escrita a vida de
LEÃO HARMEL, o bom pai de Vai des Bois.
"A facêta sobrenatural, mística, desta alma,
nos dá a razão do êxito de seu apostolado ", obser­
va EuGÊNIO FLORNOY; o conde de Mun, bem com­
p·enetrado de sua virtude fala da "heróica santi­
dade de sua vida . . . da qual será suficiente dizer
que chegou à concepção de uma -associação fun­
- dada sôbr·e a base do sacrifício e do sofrim ento EO­
licitados a Deus como um favor. Conhecido por
todos é o cbnceito. social dêsse apóstolo. No dia
de hoje, porém, muitos discutem seu valor, mas se­
rá êle o conceito do porvir : " O bem do op�rário
por me-io do operário e com o OP'erário, nunca, po­
rém, sem êle e, com maior razão, jamais contra
êle. " Jovem ainda, havia sonhado com o sacerdó­
cio, mas seu Diretor o havia aconselhado a que
permanecesse no mundo. Em setembro de 1870
enfermou a espôsa : " Meu querido, devo decla­
rar-te uma coisa que muito me custa afirmar : há
três anos venho oferecendo, dfa a dia, minha vida
a Deus para que a tua nãe sej a truncada. " Ao

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120 A SANTIDADE CATÓLICA

preço dêste sacrifício, possivelmente, foi que Leão


Harmel tev-e a carreira que pôde cumprir.
Outro industrial, M. D UTILLEUL. Políticos :
O'CoNNELL, CnESNELONG, LELIEVRE, DE MuN, PAu­
LO LEROLLE, HENRIQUE BAZIRE. Na Bélgica o gran­
de católico conde WoESTE. Numa oração anexa­
da ao testamento havia escrito : "Bendito sejais,
Senhor, pela multiplicidade d e graças e benefícios
com que m·e cumulasteos e, se por acaso mal cor­
respondi a isso, p·e rdoai-me . . . BenditÔ sejais por
haverdes querido colocar-me em condições de po­
der trabalhar p·elo bem e serv!r a lgrej.a, mas, &e
tiver COITespondido mal a êsse favor, perdoai-me,
Senhor." As últimas palavras do intrépido luta..
dor, aos oitenta-e-cinco anos, foram : " Ofereço mi­
nha vida por minha pátria e pela causa• católica."
Um ministro belga, VYVERE, -e�n- 1915, acom'-
panhado por sua espôsa, vai assistir à tomada de
hábito de uma filha em Delivrande, perto de Caen.
Na noite precedente à c·erimônia a espôsa falec·e
repentinamente no hotel. Que faz·er? Adiar a ce-­
rimônia ? De - modo algum., A filha, em lugar cJ.e
se chamar MARIA GoNZAGA, a pedido do p ai, foi
1
chamada MARIÁ DA Cn uz .

Oficiais : SoN IS PAQUERON, JoÃo nu PLESSIS, os


,

alferes da marinha PAULO HENRIQUE e AuGUSTO


CoNORT, o zuavo pontifício ARTUR · GUILLERMIN, (}
subtenente de marinha DuPOUEY, a cuj a simples

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A SANTIDADE EMINENTE (IV) 121

vista conv·erteu-se GHEON, ou, pelo menos, sen­


tiu-se atraído a Cristo. 1
Universitários : poderá haver algo de mais
acentuadamente ,cristão do que a oração do gran­
de AMPE RE no leito de morte da espôsa : " Meu
üeus, agradeço-Vos por me haverdes criado, redi­
mido e iluminado com Vossa divina graça, fazen­
do-me nascer no seio da Igrej a Católica. Agrade­
ço-Vos, também, por me terdes chamado a Vós de­
pois de meus desvarios ·e por me haverdes p er­
doado êsses desvios. Compreendo que não que­
reis que viva senão pnra Vós e Vos consagre todos
meus instantes. Privar-me-eis de todo prazer nes­
ta terra ? Vós sois o Amo, Senhor; minhas faltas
merece·rarn êste castigo. Confio, porém, em que
ouvireis a voz de Vossa misericórdia. Multa fla­
gella peccatoris; sperantem autem in Domino,
misericordia circumdabit. Espero �m vós, D eus
meu, e submeto-me a Vosso di vino beneplácito,
sej a qual fôr, ainda que tivesse preferido a morte.
Eu, porém, não merecia o céu e vós, no entanto,
não quisestes sepultar-me no inferno. Dignai-Vos
ajudar-me a fim de que uma vida passada na dor
se torne m·erecedora de uma boa morte, da qual
me tornei indigno. Senhor, Deus das misericór­
dias, dignai-Vos reunir-me no céu àquela que qui­
sestes amasse na terra".

(1) E. GHEON : L'homme né de la gúel're.

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122 A SANTIDADE CATÓLICA

Eis a regra qu e se impunha para cumprir,


na plenitude do espírito católico, o dever de seu
estado : "Trabalha com espírito de oração. Es­
tuda as coisas dêste mundo, pois êsse é o dever de
teu estado, mas não fixes nêle mais do que um
olhar para que o outro estej a s·empre voltado para
a Luz eterna. Ouve os sábios, mas com um ouvi­
do, somente : o outro e•s teja sempre disposto a per­
ceher os suaves acentos do Amigo c·e lestial. Não
escrevas a não ser com uma mão. Com a segun­
da .segura-te• às vestes divinas, como a criança se
agarra às roupas do pai. Recorda, constant·emen­
te, a expressão de SÃo PAuLo : Utilizai dêste mun­
do como se dêle não usásseis ! - Que minha alma,
a partir dêste dia, permaneça unida a Deus •e a
Jesus Cristo ! "
" Quem fala dêste modo ? - pergunta um crí­
tico. - Seria um Santo a redigir novo capítulo do
livro da Imitação de Cristo ?" Que honra para Am­
pére haver dado ocasião a tal pergunta !
Não foi inh�oduzida a caus1 de beatificação de
Ozanam, o ilustre fundador das Conferências Vi­
centinas ? Durante o último passeio f·eito às cos­
tas italianas do Mediterrâneo, seu irmão sacerdo­
te, vendo-o derramar algumas lágrimas, lhe disse :
- Tranquiliza-te, po.is logo veremos a França.
- Ah !, meu caro irmão, não se trata disso !
Quando penso em meus pecados, pelos quais Nos-

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A SANTIDADE EMINENTE (IV) 123

so Senhor tanto sofreu, como p osso conter as lá­


grimas ?
Em outra oportunidade, enquanto fala e cho­
ra, uma doC'e voz sussurra-lhe :
- Meu filho, pão conh�ces a santidade de
Deus !
Figuras de extraordinário relêvõ as de ToNJO-·
LO na Itália, de ÜLLÉ LAPRUNE, AMADEU GuiRARD,
FILIPE GoNAl\D, CLAUDIO LEFILLEUL, na França, de
quem, após a morte, diziam os colegas : " Era um
Santo e um Herói", e que resumia seu ideal d e b a­
talha ..nestes têrmos : . . . " sorrir por de·v er d·e após­
tolo, mostrar-me intrépido por obl"igação ,e infun­
dir ânimo aos demais, mesmo quando não o tiver
eu mesmo".
Mencionemos, ainda, DE LoTTE, fundador do
Boletim dos Prof•essôres Católicos da Uniu.ersida­
de, amigo íntimo do estranho e · shnpaticíssimo
PEGIUY 1 de alma tão católica, mas que, devido à
educação normal do tempo •e à originalidade do
caráter, não chegou a se integrar no catolicismo
integralmente vivido.
;Faríamos mal em recordar os últimos quinze
anos da vida de J. K. HuYSMANS (1892/1907) ? Des­
de sua entrada na Igrej a, o escritor não variou o
estilo, mas que diferença se produziu em sua vi-

(1) JERÔNIMo e JoÃo · THARAUn : Notre cher Pe-


guy. (Plon.)

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124 A SANTIDADE CATÓLICA

·da ! Só tratará de temas religiosos, viverá à som­


bra dos claustros, levará vida beneditina no meio
do mundo, exercitar-se-á na oração e quererá mor­
rer vestido com a libré dos "sblatos ". Não era
essa uma simples fórmula lírica, mas uma ardente
e sincera oração, êsse grito da alma : " Ah !, meu
Deus, concedei-nos a graça de nos esquecermos
para sempre de nós mesmos, de vive•r, enfim, não
importa onde, contanto que sej a longe de nós mes­
mos e perto de Vós !".
Por ocasião da morte de TONIOLO, professor de
direito em diversas universidades italianas, Da
scuol a Cattolica (nov. 1918) rendia-lhe êste m�g­
nífico testemunho : "A alma de ToNIOLO foi a de
um Santo. Longe de nós adiantar-nos aos auto­
rizados •e infalíveis Juízos da Igreja que propõe
a santidade supe·reminente ao culto e à imitação
dos fiéis. Limitamo-nos, tão-somente, a tomar o
vocábulo no sentido cristão que, ao confr<?ntar as
perfeições ·evangélicas com uma vida humana e
fazendo-as completamente conformes a essa mes­
ma vida, expressa seu próprio j ulgamento; sua ad­
miraçãQ e sua vener'ação numa só palavra : era um
Santo ! ".
AMADEU GuiARD, cuja divisa será " mui hu­
mildemente", vacila por um mom·ento entre o sa­
cerdócio e a santificação no estado leigo. Escre­
ve-lhe um irmão sacerdote : " Não chego a te com­
pree-nder. Dizes-me que des·ej as praticar o bem :

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A SANTIDADE EMINENTE (IV) 125

entra, pois, como operariO e não como simples


amador na imensa fábrica de hem que é a Igrej a.
Dizes-me que queres converter e agitar as almas :
recebe, pois, � Deus, a missão e o poder dos após­
tolos que se chama : sacerdócio. " Amadeu respon­
de-lh é : "Também os leigos têm uma determi-·
nada missão. A Igrej a além dos sacerdotes preci­
sa de poetas, escritores, profcssôrcs, oradores, que
cóm a pena, a palavra e o exemplo, lutem por da
no meio do mundo e se lancem a iluminar os lu­
gares onde o sacerdote não chega".
A este respeito dizia HENRIQUE DE ROIURE :
" Pode ser haj a vocações leigas que, debaix o de
uma diversidade· de formas, exijam uma abnega­
ção tão íntegra e absoluta como a vocação religio­
sa". Essa palavra deve ser bem interpretada pa­
ra que tenha um sentirlo exato, mas mostra o dese­
jo de Deus em ver brilhar Santos ·em tôdu.s as esfe­
ras da vida.
Em sua obra famosa, O Ensino Católico na
•França Contemporâne.a, o Cardeal B.\UDRILLARD,
com o título "Um santo universil úrio " dedica um
precioso artigo a LEÃO LEFEVRE, morto •em 1900,
quando aluno no Liceu de Lila. "Ao notar � es­
crevi a - que não> tinha virtud�s suficientes p ara
o sacerdócio, pensei que o Apostolado Leigo não
deixava de ter seus méritos · C que eu poderia, por
exemplo, fazer o bem a algumas almas de boa-von­
tade e que, educando de modo cristã,o filhos que

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126 A SANTIDADE'. CATÓLICA

D eus me concedesse, poderia formar homens hon­


rados que, por sua vez, contribuiriam, à medida
de suas fôrças, para melhorar a nova geração de
que a França tanto necessita ! "
À sua noiva : " Sabe você, Senhorinha, que
sou matemático. Pois bem, por causa de seus
estudos, nenhum matemático ignora que qualquer
quantidade finita é z2ro diante do infinito . . .
Convenci-me, portanto, com matemática evidência,
de que na ordem moral tudo será posposto à sal­
vação ; que tôda verdade natural é de pouca im­
portância ao lado· das verdades da fé e, enfim,
que uma vida que, dentro d o possível, não tem a.
Cristo por modêlo, não pode ser boa". Outra p a­
lavra : "Aspiro ao amor perfeito de Nosso Senhor;
consagrei-lhe minha vida e ofereço-lhe quanto sou
ou posso valer para fazê-lo conhecido e amado de
quantos me cercam".
Entre os homens de ação poderíamos citar o
santo homem de Tours, DuPONT, MAURICIO LE G.>.T­
TELIER, p Barão de LIVOIS, ADOLFO BAUDON, Presi­
·
dente Geral das conferências vicentinas em segui­
da a Ozanam, o Doutor MICHIAiux, criador da f,ed·e­
ração d,esportiva dos patronatos de França, de uma
bondade e humildade legendárias. Disse alguém
a respeito dêle : "Nunca encontrei uma fé tão
comu nicativa ·em meio. de tão poucos recursos
o�atórios." Ao morrer, deixa 55 uniões regionais,
2300 sociedades e 30 mil membros ativos.

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A SANTIDADE EMINENTE (IV) 127

Ao recorrer a êstes nomes lembramos uma


santidad·e de elevado quilate.
Fácil é ler as biografias que existem. Mas,
apesar dessa superabundância, não se pe·ns·e que
aí estej a contida tôda a santidade, pois não deve
'causar estranheza que os maiores Santos passem
desperc-ebidos. Mui freqüentemente o leigo os
desconhece. Feliz o sacerdote a quem é, dado pe­
netrar no intimo das almas e contemplar de per­
to as maravilhas que freqüentemente nelas op·era
a graça divina.
Indubitàve•lmente é preciso se evitem canoni­
zações prematuras, se exaltem virtudes e se come­
morem •e celebrem com exc·essiva antecipação ou
exageradamente uma generosidade que aos verda�
de•iros conhec-edores do assunto se apreS'enta como
simplesmente medíocre.
A o propor ao público 'a alma de um Santo, é
preciso evitar, ao .mesmo tempo, a rudez a e os lu­
gares-comuns. É preciso faze� fôrça para que se­
jamos artistas, "afastando-nos dêss·e s enormes li­
vros biográficos, escritos monótonos, sobre-carre­
gados de minúcias e insuficientemente depura­
dos", nem suficientemente sintéticos ·e nos quais
se pre.fend·e nbarcar tudo quanto se refere ao bio­
grafado. Mesmo quando o talento de apresenta­
ção não se destaque como de primeira ordem, o
henefício para o leoitor pode ser igualmente apre-

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128 A SANTIDADE CATÓLICA

ciável. Lamentam-se muitos de que as vidas se


multipliquem excessivamente.O número delas,
no entanto, nunca s·erá excessivo. Com .efeito, p a­
ra se ter um a lembrança d·e Tutáncamom ou dos
habitantes de Pompéia e Herculano, lança-se mão
de re·cursos custosos, e p ara se propor à luz do
dia uma virtude esclarecida não se deixará fazer
nada ? As coisas mais formosas logo se esque
cem. Honra aos que, tendo descoberto uma pé­
roln de verdadeira santidade·, não guardaram p ara
si sós êsse precioso tesouro ! Todo �acerdote de­
verb s.er um biógrafo. Por causa dessa absoluta
...
inércia, o mais belo da a'ção divina na intimida-
de das almas pe·rmanece oculto.
Por vêzes é dado a um leigo 'apreciar de per·
to as magnificências de algumas s antidades ocnl
t as. Como s·e extasiam com elas ! Todos os anos
por ocasião da distribuição anual dos prêmíos à
virtude, chegam à Academi a Frnncesa informa­
ções verdadeiramente ·e<Íificantes. Que formosas
surprêsas aguardam o membro designado para a
hela missão de selecionar as abnegações, de render
uma homenngem pública às generosidades coroa­
das com a mais elevada das virtudes : a modéstia.
"É vontade dos fundadores de nossos prêmios -
dizia na sessão de 18 de novembro de 1909 o m ar­
quês de Vogué - que procuremos os premiados
entre os que, por estranha inversão de têrmos, se
designam os p·equenos, quando em j ustieJa, na re'a-

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A SANTIDADE EMINENTE (IV) 129

lidade, deve·riam ser chamados os grandes do mun­


do. Constituem a fôrça, a honra, o consôlo da P a­
tria. Digamos melhor : p ara os caracterizar só h á
uma palavra q u e quadra perfeitamente, a mes­
ma em todos os idiomas da cristandade : são San­
tos e Santas. E acrescentava : Sei que atualmên­
te, . nos inícios do século XX, ·em nossa pátria, o
elemento canonizúvel, por assim dizer, é tão abun­
dante como pôde sê-lo no fervor das épocas legen­
dárias ! . . . ''

Êsie elemento canonizável p ertence quase


sempre à virtude católica até o ponto que os inimi­
gos da Igreja, observando que aos Santos leigos
não eram dad as honras iguais, começaram a ch a­
mar a cúpula da Academia com a alcu.nha de " cal­
deirinha inve·rtida". Vemos que é absolutamente
inútil censurar a Academia por êste ato ou de­
f·ender a santid-ade católica contra " seus rivais ".
Nas ruas, praças, são colocadas estátuas dos gran­
des homens. O povo não se engana : fre•qüente­
mente ignora totalmente de quem se trata e p or
vêzes reconhece, através daquelas linhas, um· sá­
bio, um grande político, quiçá um perseguidor,
mas nunca passa na i déia dess a multidão acer­
car-se dessas estátuas. As canonizações ci vis nã9
admitem comp aração com as dn Igrej a e de há
muito os ilustres pequenos - grandes homens de
uma época - ter-se-ão sepultado no olvido, en­
quanto por outra p arte continuar-se-á a honrar,

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130 A SANTIDADE CATÓLICA

em todo o mundo, a uma j ovem monj a falecida


abs vinte-'e-seis anos : TERESA DE LISIEUX, ou a um
velho cura de aldeia : o Santo Cura de Ars. Só
a lgrej a conhece o segrêdo das glórias imarces­
civeis 1•

Tal é o poder de s-antificação d a Igrej a que


em qualquer terreno é capaz d e fazer germ�nar
flores de incomparável virtude. Nem a idade,
nem. o sexo, é um óbice para -alcançar a santidade.
Tampouco as condições sociais. Encontram-se·
Santos nos ambientes ap ar·entemente mais humil­
des e não se pense sejam êstes, ne•m os menos nu­
merosos, nem os menos formosos. B-asta recor­
dar AGosTINHO BoDIN, filho de um socialista d e
Ivry, que, e·x pulso de casa p elo p a i a o saber que
o filh o havia ido ao oratório católico, passa tran­
qüilamente a noite entre os muros dns fortifica­
ções da cidade, pois assim lê na Imitação que aca­
ba d e abrir, ao resplendor de um bico de gás :
"Ainda não sofrestes até derramf!.r o snngue". -
"Essas pnlavras pareciam escritas para mim. D e­
pois disso não mais sofri ". - Um dia, s·eus compa­
nheiros de oficina colocam em sua banca de traba­
lho wn Crucifixo que compraram a fim de o es-

(1) Sôbre Os santos do L'ivre-pensamento. Ensaio


infrutífero de_ canonização leiga, consulte-se a Revue des
Objeclions. ( Set.-Out. 1 92 6 . ) Reproduzido em La Do­
.cumentalion Catholique, junho de 1927, col. 1501-1555.

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A SANTIDADE EMINENTE (IV) 1 31

carnecer. AGOSTINHO toma-o nas mãos, abraça-o


_e, empunhan do pregos e martelo, prega-o na p a­
Iede sem nada dizer, no meio do aplauso cerr�do
dos colegas. Morreu j ovem, ·enquanto se prepa­
rava para ingressar na vida religiosa 2.

Ntiín domingo, 7 de j unho de 1925, morre re­


pentinamente, num a rua de DubHn, na Irlan da,
quando se dispõe a entrar na igrej a do Santíssi­
mo Salvador, um operário quase septuagenário.
Debaixo das roupas, descobrem instrumentos de
tortura incrustados em suas carnes. Quem seria
êss·e morto misterioso ? Um modesto operário.
Há quare-nta anos dormia sôbre tábuas e só toma­
va quatro horas de repouso por dia. Ás duas da
madrugada iniciava suas orações e apenas se
abrem as igrejas, corre a ouvir Missa até a hora
de iniciar as tarefas diárias. Alimenta-se de joe...
lhos. Nada evidencia sua santidade durante sua
vida. Morre e começa a odisséia. Nos s·eis pri­
meiros meses após seu falecimento, vendem-se 120
mil ex·emplares de uma breve biografia publica­
da em inglês. O nome dêsse operário? MATT TAL­
DOT.
Um bom tecelão acaba de fazer o retiro anual
em Nossa Senhora de Hautmont, perto de Lila, e

(2) Biografia escrita pelo Padre l.ALA.NoE. ( Ap ost .

Oração-Tolosa.)

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132 A SA...�TIDADE
.. CATÓL_ICA

mostra ao prega'dor seu regulamento de vida. Ei­


lo : "Pela mahhã, apenas soa a hora de levantar,
às cinco e meia, o Sinal da Cruz e Divino Cora­
ção de• Jesus . . . Disponho o necessário para os
filhos c p ara mim mesmo. Descem os filhos e
juntos fazemos a oração. Logo p edem a bênção e
cada qual sai para suas ocupações. Chegado ao
trabalho faço o Sinal da Cruz, bem grande, dizen­
do : " Meus Deus, todo êste trabalho sej a por Vosso
amor, pela conversão dos operarias desta fábri­
ca, pelas autori dades e por todos quantos me in­
sultam". À noi te, até às oito, cei a ; os filhos logo
p edem a bênção e cada qual se retira a descansar.
Enquanto possível, aos domingos ouvimos duas
Missas. Comunhão tôdas as S'emanas e· tan:lbém
mais freqüentemente. Pela manhã, até meio-dia,
visi ta às famílias pobres. " �mula dês te tecelão,
que costuma assistir aos exercícios do Norte, é um
guarda alfandegário belga, santificado p elos exer­
cícios de Fayt les Manage. Atacado de gastrite aos
25 anos, é aconselhado a fazer uma p eregrinação.
Parte, mas, no m,eio do caminho, pensa que êsse
padecimento é um benefício p ara êle e sem mais
volta ao lar. Consti tuem sua biblioteca as Visitas
ao Santíssimo Sacramento, de Santo AFONSo MARIA
DE LIGamo, que lê e relê perto de trezentas vêzes e
que nêle criam o hábito da Comunhão espiritual
quase contínua. Vive castamente, não tem inimi­
gos, faz todo o bem que pode. De seu sôldo dá uma

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A SANTIDADE EMINENTE (IV) 133

parte ao pai, outra aos pobres e, de tempos em


tempos, dest·i na cem francos para as Missões.
Se há Santos entre os operários, existem tam­
bém entre as operárias, entre as modestas empre­
gadas domésticas. Que excelsa virtude permite
imaginar esta participação recente : " Convidà-se a
assistir ao •entêrro da senhorinha AMADA LESFLEUR,
ex-presidente da Congregação das domésticas
cristãs de Rennes e que estêve, até à morte, ao
serviço Ia família de Bellevue durante 66 anos . "
Outra dessus modestas j ovens, n ã o contando
com os meios para fazer esmolas, pediu o favor
de se ocupar da roupa branca d� um dos futuros
Missionários que se preparavam no seminário.
'
Uma jovem de Calais, a quem a mãe havi a
proibido levantar-se cedo para comungar, desce as
escadas com os pés d e·scalços e v ai receber a
Comunhão. A mãe, ao despertar,. ·encontra-a plà­
cidamente deitada n o leito.
Quem se importará com êsses falo ? No en­
tanto, não falam eloqüentemente da generosi dade
da alma católic a ? Mas a santidade não se encon­
tra tão-somente nas oficinas, nas fábricas ou n os
simples lares.
Em 1924, coni a jovem i dade de trinta anos,
morria a grã-duquesa MARIA ADELAIDE, que por pou­
co tempo foi a soberana de seu p aís, LuxBmURGO.
Havia consagrado a Deus sua virgindade ·e sonhava
com o Carmelo quando, em 12 de jm�ho de 1912,

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134 A SANTIDADE CATÓLICA

viu-se obrigada a cingir a coroa. Nestá ocasião


o Presidente do Conselho, contra o costume, pen­
sou poder sil·enciar o nome d e D eus. A grã-du­
queS'a declarou que nunca se teria apresentado
nas sessões se não se relevasse a omissão. Ouvia
Missa •e comungava diàriamente. Apesar de resis­
tências decidiu entronizar o Sagrado Coração no
palácio grãoducal. Sua gestão, durante a guerra,
foi obstaculada por mil dificuldades e·, finalmente,
viu-se obrigada a abdicar. Não experimentou
nenhum d�sagrado nisso e em 14 de setembro de
1920 foi ac·eita no mosteiro do Carmelo de Módena.
D ebilitada p elos afazeres, foi obrigada a sair e
solicitou sua admissão entre as pensionistas das
Irmãzinhas dos Pobres. Ali iniciou nova vida de
abnegação em favor dos desgraçados. Chamada
a seu pais para dirigir um hospital, viu avizinhar­
se o fim. Depois de haver solicitado a sua mãe a
licença de· morrer, entregou a alma ao Criador.
Em seu túmulo se lêem estas únicas palavras :
"Fe·lizes os corações puros, porque êles verão
a D eus."

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CAPÍTULO VI

Qualidades da Santidade Católica em


nossos tempos

MPOSSÍVEL se torna desconhecer o valor numé-


I rico da santidade católica de nossos dias. Mas,
enfim, que representa êsse· valor ? Deveremos
prestar fé a RENAN e a sua perspicácia aguda ao se
tratar de assuntos eclesiásticos ? " Há ou não v er­
dadeiros Santos ou só existem miniaturas de
Santos?"
No terceiro volume da vida de Luís Veuillot,
escrita pelo Irmão EuGÊNIO, pode-se ler a b ela
re-sposta do grande periodista a êste respeito. A
melhor refqtação é oainda- a dos fatos. Mesquinha
a santidade de nossos dias ? Quiç:í não poderá
incorrer em êrro mais colossal quem se julga
historiador.
O que pode·rá impression·ar um observador
superficial nas· comparações en lre as vidas de
Soantos escritas hoj e e aquelas de ontem ê a mar­
cada tendência - certamente mui feliz - em se
insistir Ifiuito menos que a santidade consiste em
�xtases e dom; extraordinários ; a separar, nest�
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136 A :sANTIDADE CATóLicA

ordem de idéias, com e-spírito crítico mais ilustra­


do, a história do que é lend a ; em destacar e levar
ao primeiro plano o elemento autêntico da santi­
dade, isto é, a fidelidade absoluta ·e evidente no
hero"i smo, a todos os desejos divinos. Daí a im­
pressão de que os Santos de hoj•e se ach'am mais
perto de nós. Ne-ste sentido, está bem � mas só
neste senti do ! Os Santos dos nossos dias não são
inferiores aos dos tempos passados e, no meio da
imens'a va ne�ade de formas, o que· rn,ais impres­
siona é sempre o notável valor do metal. De uma
coisa se terá convencido o leitor : se notável é a
.quantidade, üão o s·erá menos a qualidade.
D everemos acrescentar novos nomes aos' que
já foram anunciados ?
Poderá haver maior valor do que êst.e episó­
dio referi do pelo Padre LHANDE ao ênceiTar o r-e­
latório sôbre o arrabalde vermelho ?
" Uma tarde de fins de outubro de 1896, enor­
me surprêsa provo'cou a presença de um eclesiás­
tico p elo déd'alo de ruelas que então constituíam
o bairro de Cavenne, em Saint Ouen. À memória
de homem, j amais. se havia visto uma batina por
aquela região. Indiferente às rodinhas reunidas
nas portas ou nos pátios dos cortiços, surdo aos
motejos e às conj U}''aS supersticiosas de que era
alvo, o sacerdot.oe continuava tranqüilamente a sua
caminhada. De repente, numa esquina: aparece
um grupo de moleques. À vist� de um sacerdote

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QUALIDADES DA SANTIDADE CATÓLICA 137

a lguns dêl-es, presos de pânico, põem-se a correr


a tôda velocidade, exclrunando : "Um corvo ! "
Um dêle·s, porém, mais coraj oso, para e fixa os
olhos sôbre o inimigo, olhando�o de modo que
encerra tôda a eloqüência de um desafio. Incli­
nando-se, apanha uma pedra e a lança com tôd a
fôrça contra -o intruso. Alcançando em cheio o
alvo, o proj etil vai ferir o eclesiás tico no rosto,
<:ausando-lhe uma ferida. Sem dúvida o " corvo "
irá vingar-se, p ois abaixou-se p ara tomar algo n o
chão. Mas, enquanto o valent•e busca a salvação
na fuga, ouve uma voz que o chama ·e se detém.
O sacerdote não se mexeu. Ao invés de tentar
revidar ao ataque, mostra-lhe simplesmente a
pedra manchada com seu sangue. " Amigo - diz­
lhe - agradeço-lhe . . . esta pedra que jogou con�
tra mim. Será a primeira para a construção de
uma igrej a que levantarei aqui . . . " O sacerdote
cumpriu a promessa e a pequena pedra lançada
por êle no cimento da grande er formosa igrej a
do Rosário foi a pedra angular do ·edifício."
"' Por ocasião d a morte da admirável S o ro r
SANTA MARGARIDA, de quem Luís AR�OiULD escreveu
com verdadeiro amor as in dústrias, os gestos so­
brenaturais de que se serviu para libertar a alma
prisioneira de uma jovem cega, surda e muda,
chamada MARIA HEURTIN, o historiador denota sua
emoção com estas palavras : "É preciso conhecer
..esta história nunca ouvida, que deveria ser lida

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1 38 A SANTIDADE CATÓLICA

de j oelhos e que vem acrescentar mais um capí­


tulo à lenda de ouro. Diz...se que não mais há
milagres ! No entanto, eis um ! . . . Uma existên­
cia como a de Soror MARGARIDA é suficiente para
mostrar a de Deus . "
Num recente volume intitulado Pobres Vidas,
um periodista, certo JoÃo DE VICENEs, esboça esta
linda cena, copiada do natural. Duas irmãzinhas
dos pobres foram ter ao mercado p ar a pedir es­
mola e êle as interroga. Parece que há gente
generosa : repolhos, cenouras, nabos, frutas são
dadas prazeirosamente pelos comerciantes.
- D ão de muito boa vontade.
Os que não dão ?
- Oh ! isso é nada ! Eu só reparo nos outros !

" Em meu paraíso à la Carlyle - escreveu


HENRIQUE GHEON - não h ::tvia previsto os Santos ;
os heróis da Vida não queriam saber dêles. Sem
negar, contudo, que ,em certas condições a santi­
dade pôde florescer neste mundo, relegava-a às
idades anteriores. Através de GIOTTO e FREI AN­
GÉLICO, que me haviam entreaberto furtivamente
o céu, através da arte medieval a santidade se
de·p arava quase que sem valor, desligada · de nos­
sos tempos, cem vêzes mais inimaginável do que
aquela beleza helênica que um atleta moderno
pode realmente demonstrar. Aceitava e respei­
t�,v� () c:rist&o ; Illas o Santo era, :pa�a :p1im, u�

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QUALIDADES DA SANTIDADE CATÓ LICA 139

estóico� Admirava apaixonadament e todos os ·ex­


cessos do amor e do sacrifício ; mas na terra e
dentro dos limites da ordem humana."

Se há uma época em que floresceram de mo­


do especial os rasgos da mais sublime virtude, é;
sem dúvida, a da última guerra de 1914. Tudo
era grande, então, •e, se de um lado abundam as
abnegações profanas inspiradas num amor e n um
conceito absolutamente leigo do dever, - pois
devemos concordar •em que _a natuJ.'Ieza por si mes­
ma é capaz de atos nobilíssimos ---.,- por outro,
quanto mais abundantes não foram os heroismos
especificamente cristãos ! Lembramos o Padre
LENOIR a morrer nos trigais de Vardar, enquanto
corria a assistir os feridos dos campos de batalha
de Salonica ; é mister recordar· o dominicano Pa­
dre BERCHON de quem se ocup'a GAUDY .em Agonia
"
do Mont.e Renaud e que, c_pm o risco da própria
vida, se adianta para confortar as sentinelas d a
primeira linha e l·evar a Sagrada Comunhão até
às" linhas avançadas. O Padre DE CHABROL, ferido,
enquanto com o Crucifixo na mão, de pé sôbre
o p arapeito, abençoaw as tropas de assalto que
abandonavam as trincheiras no ataque contra o
1mm1go. Soror JúLIA, religiosa de São Carlos d e
Nancy, que protegeu heroicamente o s feridos d e
Gerbeville e com perigo d e vida salvou das cha­
mas a âmbu,la sagrada. .(\NTELMQ DE GIBERGUE��

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140 A SANTIDADE CATÓLICA

digno sobrinho do santo Bispo de Valência e em


cuj a j aqueta d e aviador encontrou-se êste testa­
mento :
•• se um dia, no azul do firmamento, quebra­
das as asas, precipi tar-me por terra para vo·ar
até Deus, levem estas linhas a minha mãe e a meu
pai, os últimos pensamentos,, os últimos desej os
do filho muito amado.
" Quando o avião mortalmente ferido se re­
.
cusar a obedecer ; quando o cumprimento de minha
missão se tornar de tod o impossível, e meu tra­
balho, na terra, tiver chegado a seu ponto final,
ao precipi tar-se a queda, a poucos metros apenas
do fragor da batalha, invadir-me-á uma -paz infi­
nita, há muito anelada, e com tônas as fôrças de
minha alma, cantar·ei o r. toria in. .excelsis D eo ! . , .
Oh !, êsses breves se,gundos diant:e do sofrimento
e d a morte, que ao mundo são causa de tanto hor­
ror que os procura ocultar como abomináveis,
vós haveis de os bendizer, êstes poucos instantes,
porque serão um novo favor que o Soberano J uiz
nos há de oferecer. À medi d a que meu corpo
estremecido se precipitar para o solo, minha alma
subirá, mais veloz ainda, para alturas inconcebí­
veis e a separaçã o tornar-se-á vitoriosa. Será a
realização do Magnifical : a oração ·de adoração
ao único Deus, grande e miS'ericordioso, a oração
de ação d� graças pelo que me foi concedido com
tanta largueza, a oração de expiação mais pelo

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QuALIDADES DA SA:"�"TIDADE CATÓLICA 141

que foi omitido do que feito. Logo o chamado


súplice que nã o pode s·enão ser ouvido, solicitando
a vida eterna, a força e o consôlo p ara os que deve­
rei abandon'ar, a misericórdia •e a glória p ara a
França muito querida, a chegad a até o Reino de
Deus : adv.� niat regnum tu um! Esta oração fica­
rá tão impregnada de vós, meus queridos p ais,
porque de vós a aprendi em meio de p'alavras e je
exemplos, durante 28 anos. Se·rá serena e tra n­
quila apesar das aparências, e dela brotarão a paz
e a confi'ança."
Um sub-secretário de Estado, d e opiniões mui­
to avançadas, tendo visto no trabalho o jesuíta
LUCIANO CHABORD, "herói e místico", não pôde
deixar de tecer um elogio entusiasta •e freqüen­
temente reproduzido.
O Padre DE DARAN, falecido no naufrágio do
Provcnce ll, no Mediterrâneo, abençoa e absolve,
até o último instante, os que vão d0Saparecer
devorados pelas ondas do mar.
YvEs DE JoANNES, clérigo minorista, gravemente
ferido em Fere-Champenoise, é hospitalizado em
Troyes ; à mãe que lhe diz : "Filho, estás grave­
mente fe·r ido, seria convenient·e recebei a Extrema
Unçã o ", responde : " D everas ? Que bela surprê­
sa ! Quer diz·er que não hei de sofrer mais do
que isto ? Como Deus é bom ! Vou ao Céu sem
o h'aver merecido ! "

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142 A SANTIDADE CATÓLICA

A NDRÉ LEROLLE, mortalmente ferido na granj a


de Beauregard, ·em t .o de outubro de 1 914, expira
um mês depois, com trinta-e-nove anos ; pai de
oito filhos, podia ter ficado ll'a secção de aprovi­
sionamento e recusou-se a t anto. Antes de partir
p ara a fre·n t·e escreveu em seu testamento : " Sou
católico e suplico a meus queridos filhos que nunca
esqueçam ser a religião católica a únic'a verda­
deira e que continuem amando a Nosso Senhor
Jesus Cristo COII).O até hoJe ; que não abandonem a
prática d a Comunhão freqüente, mas que ao con­
trário, sendo-lhes possível, comunguem diàriamen­
te : é êste o único meio de gozar a p az na terra e
re:>istir às tentações que mais cedo <�lll mais tarde os
hão de assaltar. Agora, com tôda confiança, me
coloco ·sob a proteção da Virgem Santíssima."
Em seus apontamentos se lê esta resolução : " Fa­
zer 'a vontade de Deus se.m se empenhar em levar
a cabo coisas extraordinárias ; fazer aquilo que a
Deus agrada no estado em que nos colocou. " E
esta lindíssima oração : " Meu Deus, f'azei-me amar
Qsofrimento e que · não somente me resigne a êle,
mas que o ame com o mesmo ardor com que vós
o amastes."
Como deixar de mencionar a BouRJADE o OcE­
NICO, como o chamava KERILLIS, um dos antigos
companheiros de esquadrilha ? Religioso d'a Socie­
dade do Sagrado Coração de Issoudum, LEÃO
BouRJADE ·conta apenas vinte-e-cinco anos ao esta-

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QUALIDADES DA SANTIDADE CATÓLICA 143

lar a guerra. Aviador, merecerá quatorze citações


e registará vin te-e-quatro vitórias autênticas sôbre
o adversário. Em n ovembro de 1 918 o Aéreo
Clube de França lhe conf,ere a grande Medalha
de Ouro, destinada à aviação de caça. Terminada
a guerra, embarca p ara a Nova Guiné onde o es­
p eram os pobres negros, pelos quais ofereceu a
vida. Aos trinta-e-dois anos morria digno de
recolher a recompensa eterna.
Sobrepassando os limites assinalados a suas
obrigações, a seu dever, ouvindo, unicamente a
VOZ do céu, o Padre MARIA A T DUCLOT,
J��É M RGO
'

Missionário de Nossa Senhora de Laus, Capelão


Militar, voa em socorro de um oficial mortalmente
ferido e cai diante âo inimigo no forte de Froide­
Terre. A êste sacrifício, que se consuma em 24
de junho de 1916, devemos acresc,entar um episó­
dio comovedor q ue transforma o Capelão em novo
Tarcísio. " Detalhe que faz de sua morte um caso
u nico entre os de todos · os sacerdotes caídos no
campo da honra : a bala que o f.ere em pleno
peito atravessa, antes, as Sagradas Espécies que
leva ao peito ,e, na p arte anterior do estoj o, osten­
ta-se o busto de Jesus entre os discípulos de
Emaús, atravessado p elo proj.etil fatal."
A família cristã é o laboratório em que fre­
qüentemen t e Deus se c9mpraz em plasmar seus
santos : Luís e ANTÔNIO CoLLARD,
dois jovens b el­
gas tflmbados debaixo das balas do invasor n a

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144 A SANTIDADE CATÓLICA
cidadela de Liége, em 18 de j ulho d e 1918, sorve­
ram no lar doméstico, com a valentia patriótica,
o valor cristão. Piedade e pureza sobressaem do
livro que· lhes foi consagrado e que leva um pró­
logo escrito pelo Bispo de Namur, Monsenhor
HEYLEN.
Vê-se, portanto,- como não somente entre os
sacerdotes, religiosos - ou seminaristas, mas tam­
bém en�re os leigos ·e j ove_,ns se mostra, radioso, o
vigor cristão. Os grandes acontecimentos podem,
ou bem suscitar grandes almas, ou tão-somente
manifestá-las. Algumas nece'Ssitam dêss·es dias
sombrios para ap"arecer na plenitud-e da própria
luz, sem o que essa vida teria passado desperce­
bida. Outras t·eriam sido grandes, mesmo sem a
guerra, mas est a per�itiu que se destacasse a
envergadura tôda especial delas : assim um CL R­ E
M:ONT TONNERRE, pertencente a uma família que à
Igrej a ofereceu onze Santos, discípulo e amigo do
Conde dé MuN ·e que, não satisfeito com exprimir
seu profundo amor p elas classes populares nas be­
las páginas intituladas Por que Somos Sociais, con­
sagra-se na região da Picárdia a multiplicar os
sindicatos agrícolas; ao ·estalar a guerra recusa
ingressar no estado maior, procuran � o confundir­
se com a trop a : " O homem que cumpre com o dever
- diz � não merece o menor elogio e é um cana­
lha se o não cumpre ; só ·é credor de •elogios quan­
do vai além dêsse dever." Morrerá comandante

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QUALIDADES DA SANTIDADE CATÓLICA 145

de zuavos depois de oito citações. Como era


amado ! Um d·e seus 'ciclistas é ferido na cabeça.
Mas, ao invés de se fazer cuidar imediatamente.
quer, antes, chegar até seu oficial : "Meu capitão,
fique ciente de que · nunca teria consentido em me
retirar sem, antes, despedir-me do senhor." -
"Ferido como estava e com a cédula que o auto­
rizava a s·e retirar, atravessava por duas vêzes as
linhas de fogo, e que linha I - escreveu o mesmo
CLERMONT TONNERRE - simplesmente por gratidão
e por um pouco de bondade que ·eu lhe havia
demo:p.strado."
ldênticà fôrça de fé e valor cristão demons­
tra JosÉ ÜLLÉ LAPRUNE, filho do conhecido filó­
sofo. Troca o Estado Maior pela tropa em ativi­
dade, sabendo a que riscos s·e expõe. " Sacrifi­
quei-me por D eus sem a menor restrição. " Tôdas
as manhãs reiter a o sacrifício, especialmente
quando lhe era dado ouvir Missa •e comungar.
'' Oferecendo-se - diz seu historiador - como
hóstia em união com a Hóstia perfeita, tendo
obtido, das vidas dependentes da sua (sua espôsa
e mãe) a renovação da mesma oferta sublime."

Encontramo-nos, porém, demasiadamente p er­


to dessa guerra para avaliar tôdas as sublimações
de alma a que deu ocasião: Quando m�is tarde
forem exumados os arquivos dêste heróico periodo,
não se poderá conter a admiração por s·e ver até

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146 A SANTIDADE CATÓLICA

que ponto, e em todos os exércitos, resplandeceu o


esplendor calóli� o.

O sacrifício adquire, sem dúvida, caracteres


magníficos qu�ndo, por espírito de dever cristão
- e êsse foi o cas o para muitos - se oferece a
vida pela pátria. Mas quanto mais sublime, quan­
do, por fidelidade pela próp_ria fé, se aceíta e en­
frenta o martírio !
O Padre DE FoucAULD sabia qlJe nenhwn
tuaregue haveria de se converter a não ser depois
de uma cen�ena de anos ; mas também sabia q ue
de sua vida sepul lada nos areiais do deserto e -

atrevia-se a esperar - )'do d erramrunento de seu


sangue, haveriam d e germinar, um dia, as messes
em pleno coração do Saara.
Quem não visitou, em Paris, no S·eminário das
Missões Es trangeiras, essa estranha e eloqünte
Sal a dos Mártires, onde fo:ram recolhidos os res­
tos venerados de alguns d aqueJ.es que ·em nossos
dias deram a vi da por Cristo : os Bem-aventurados
PERBOYRE e CLET, lazaristas ; os veneráveis PEDRO.
DuMOULIN BoRIE, AuGUSTO CHAPDELAINE, CARLos CoR­
NAY, FRANCISCO JACCARD e ou tros mais ; o Padre
CHICHARD que, j ovem ainda, ficou perplexo diante
de três carreiras a seguir : monge, bandido, ou
cavalheiro ; ou o incomparável TEÓFANES VENARD,
decapitado aos trinta-e-um anos, no Tonquim, em.
� de fevereiro de 1 861, e cujas cartas aos pais.,

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QuALIDADES DA SANTIDADE CATÓLICA 147

escritas na prisão de' ferro, à espera do martírio,


são uma maravilha de elevação lírica, de ardor
de fé, de amor filial e fraternal, de entrega abso­
luta a D eus Nosso Senhor?
Vej a-se com que heróica simplicidade JoÃo
CARLOS CoRNAY, membro da Sociedade das Missões
Estrangeiras de Paris, ·escrevia vinte-e-quatro anos
antes e em meio aos suplícios :
" D o �úrcere, em 18 de agôsto de 1837.
Meus queridos pais :
1\ileu sangue já se derramou em tormentos e
voltará a ser derramado outras duas ou três vêzes
antes de eu ter os quatro m·embros e a cabeça
decepados. A d or que haveis de experimentar ao
s aber êstes detalhes j á me fêz derramar muitas
lágrimas, porém consolei-me com o pensar que,
ao chegar esta a vossas mãos, já m·e encontrarei
diante de Deus intercedendo por vós. Não cho­
reis o dia de minha morte, pois será o mais feliz
de minha vida, uma v·ez que porá têrmo a meus so­
frimentos e assinalará o comêço de minha felicida­
de. . Os proprios tormentos não são absolutamente
cruéis ; não serei atormentado a não ser depois
que tiver sido curado e restabeleci do das primei­
ras feridas. Não serei aguilhoado nem despeda­
çado como MARCHAND ; mas, mesmo nesse caso,
mesmo que me cortem os quatro membros, fá-lo-ã o
simultâneamente quatro homens, enquanto um
quinto cortará a cabeça, de modo que não hei de

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148 A SA �TIDADE CATÓLICA
..

sofrer demasiadamente. Consolai-vos, pois ; dentro


de pouco tudo estará terminado e encontrar-me-ei
no Céu, à vossa espera. - J. C. Cornay. "
Em 21 de j unho de 1870, na cidade chinesa
de Tien-tsin eram assasinados, j untamente com
dois lazarisias, um francês, CLAUDIO CHEVRIER e
outro chinês, o Padre Ou, várias filhas de Caridade
que haviam chegado p ara cuidar dos enfermos e
-ensinar crianças. Havia entre elas seis francesas,
duas belgas, uma i taliana e uma irlandesa. A ita­
liana, Soror ANDREÔNI, havia anunciado que mor­
reria decapitada e que outra!! mais haveriam de
compartilhar de sua felic�dade. O pensamento do
martírio não 'abandonava a comunidade. "Dêl e
se falava nos recreios - refere HENRIQUE BoRDEAUX
- com a ânsia de colegi�is espreitando a chegada
do amor pelos atalhos do j ardim. Era o t·ema pre­
ferido. Ao passar a roupa, se um dos capuchões se
destacava pela alvura, logo uma das irmãs sugeria :
E se o guardássemos p ara o grande dia ? . . . -
Tôdas morreram decapitadas j unta,mente com uma
virgem chinesa que foi sacrificada por se haver
recusado a entregar os vasos sagrados."
Quantos heroismos poderiam ser , respigados
nas relações e nas descrições da revolta dos bóxers
na China, pelo ano de 1900 11 Heroismo dos missio­
nários Padres ÁNDLAUER, lsoRÉ, DENN ·e MANGIN, por
( 1 ) Eni 1 927 a Sagrada Ccmgregação dos Ritos ema­
nou um decreto em virtude do qual o Santo Padre aprova

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QuALIDADEs DA SANTIDADE CATÓLICA 149

ex·e mplo � ; heroísmo dos cristãos adultos, homens


e mulheres; heroísmo, mais surpreendente aind a,
das crianças. Uma· j ovem família cristã d·eve
fugir; a filha apenas sabe balbuciar e a mãe
ensina-lhe três p alavras : tien tch o u kiao, religião
católica. A admirável cristã, p·ensan do numa pos­
sibilidade de salvação para a filhinha ·e que·, na
sua falta, esta se fizesse p agã, envidou todos os
esforços p ara lhe ensinar a resposta que devia dar
aos boxers pagãos. O pai é assassinado, segue-o
a mãe e a criança era tão pequena que os própri os
verdugos ficaram compadecidos. " Ao m·enos você
não é cristã ", gritaram. A pequena vacilou um
pouco, tratou de lembrar a lição que a ·emoção lhe
impedia recordar e de repente exclamou : Reli­
gião, religião ! " As outras · palavras não lhe saem
pois delas não se recorda. Mas, apenas te·ntam
acariciá-Ia, seus olhinhos se agitam furiosos e
grita mais forte ainda : Religião, religião. -
"Bebeu o filtro dos cristãos I ", gri ta um dos boxers
e, desembainhando o sabre, fá-la em pedaços.

a introdução da ·causa de beatificação de 2 . 418 cristãos


condenados à morte nessa época.
(2) Em março d e 1 927 não anunciavam os d i ários
·
o assassínio , pelas tropas cantonesas, de outrns dois je­
suítas, em Nanquin, os Padres DuooT e VAnANA? Um
terceiro, o Padre JAcQUINoT, só escapou à morte por um
verdadeiro milagre. Em janeiro, um religioso dominica­
no, espanhol havia sido bàrbaramente assassinado em
Futcheú.

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150 A SANTIDADE CATÓLICA

Outro •episódio. Os boxers haviam assassina­


do mãe e cinco filhos. BÁRBARA, de 12 anos e meio,
cons·eguiu escapar e, antes de a receber em casa,
um dos parentes a intima : "Se não renegares.
não penses em passar a soleira de minha casa."
A menina abandona a aldeia e volta para os
boxers.
- És cristã ?
- S im
.

- Teus pais?
- Morreram.
';""""" Renegas ?
- - Não.
- Usaremos a faca.
Amarram-na numa árvore e lhe aplicam a
faca a uma orelha :
- Renegas ?
- Não.
A faca penetra lentamente. Intervem um ve­
lho. Não mais a supliciam, mas a deixam amar­
rada. O velho liberta-a e, à entrada de uma aldeia
é recolhida por uma mulher que se deixa impressio­
nar pelo sangue que mana da ferida; 3 Oculta-se
durante cinco meses numa cova escondid a por
ramagens. Isto é resistir I

( 3 ) Sob o título Histórias Chinesas, o Padre LEBBE


confiou à imprensa traços lindíssimos de valor cristão
de que foi testemunha no Celeste Império.

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QUALIDADES DA SANTIDADE CATÓLICA 151

A um pequeno coreano . de treze anos, PEDRO


Nmu TAI-T'SIEL-1, o pai, ao ser leTitd.o ao cárcere,
lhe havia dado êste último cons·elho : "Pedro, os
p oderosos da terra, por maiores que sejam, não
podem alcançar as estrêlas ; mas aquêle que p er­
manec·e fiel ao divino Mestre alcança o Céu."
Reconhecido como cristão, o p equeno foi conde­
nado à tortura. Sob a chuva dos golpes PEDno
sorria. Um soldado, então, afundou a lança em
suas carnes :
- Continuarás sendo cristão ?
- Sim !
- Então, toma esta cerej a·! Assim dizendo,
apresenta-lhe um carvão incandesc-ente. Pedro
ime·diatamente abre a hôca. Quatorze vêzes se re­
pete a tortura e outras tantas vêzes resiste o m e­
nino até que finalmente é degol ado no próprio cár­
cere. PEDRO Nmu foi beatificado por Pio XI em 5
de j ulho de 1 925, j untamente com Monsenho r IM­
RERT, Bispo e Mártir da Coréia.
Da China passemos para a África. Ali encon­
traremos os gloriosos pagens de MIVANGA, Rei de
Uganda, pouco maiores do que Nmu e que acusa­
dos de " rezar", isto é, de ser cristãos, preferem ser
traspassados a golpes de lança e ser decapitados
ou queimados vivos em número de 26. Três dêles
foram perdoados por s·erem muito j ovens : " Onde
está meu grupo ?", gritavam, querend o 'acompa­
nhar até o ultimo instante os companheiros e ir-

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152 A SANTIDADE CATÓLICA

mãos na fé. O próprio filho do verdugo foi supli­


ciado, mas, por um sentimento de comiseração pa­
ra o p ai, antes de o queimar, mataram-no com UJn
golpe na m,tca.
Seria tudo ? Não. Também os povos americ-a­
nos contam seus mártires. Eis o que escrevia um
sacerdote mexicano em novembro de 1 926 : "Vi­
vemos em uma época de tirania v-erdadeiramente
espantosa : a perseguição continua em seu apogeu
e alcança um grau de intensidade que ninguém po­
deriu imaginar. Basta s·er reconhecido como cató­
:tico para perder tôda garantia e ainda todo o rli­
reito à propria vida. Todos os dias ouvimos dizer
que a polida chegou a ·esta ou àquela casa em que
se celebrava a Sunta Missa •e prendeu o sacerdote
(mais de uma voez, como na Capital, completamen­
te paramentado) e todos os assistentes."
Chega-se ao derramamento de sangue. Em 3
de j aneiro foram presos e cruelmente assussinados
VALÊNCIA GALLARno, SALVADOR VARGAs, EzEQUIEL Go­
MEZ e NICOLAU NAVARRO, pertencentes à Juv-entude
Católica Mexicana de Leão. O primeiro dêles diz
à espôsa que, lacrimosa, lhe apresenta o filhinho :
"Se tivesse dez filhos, abandoná-los-ia todos, por
Deus." E, como animasse os companheiros ao che­
gar ao lugar de suplício, os verdugos, furiosos, cor­
taram-lhe a língua. O segundo morreu clamando :
" Por Deus e por sua glória ! " Sua velha mãe, ve­
nerável septuagenária, declarou : "Negaram-me o

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QUALIDADES DA SANTIDADE CATÓLICA 153:

direito ao corpo de meu filho, mas não importa..


Seu corpo é de menos, pois esta manhã encomen­
dei sua alma ao Divino Coração de J·esus." O ter­
-
ceiro diz à sua mãe : , " Desejo morrer porque sei
que o S·enhor acei tará meu sangue pela salvaçãn
de minha pátria." 0 úllimo, NICOLAU NAVARRO, no­
lugar do suplício pronuncia estas palavras que
lembram as do grande G�RCIA MonENO : "Morro, po­
rém morro por Jesus Cristo e tl·e não morre ! "
Infelizmente, as agências informativas cuida­
ram bem d·e silenciar êstes fatos. 4
Aqui ficam os fatos. Quem o desej ar, poderá
verificá-los. Mas há outro ainda : MATEus CoRREIA.
ancião de 62 anos era Pároco de Valparaíso, em
Zacatecas. Expulso da paróquia pela perseguição,.

(4) A maioria dos diários publicou, sem uma só


palavra de protesto, sem um grito de revolta, a seguinte
informação transmitida· por uma agência telegráfica r <'
mana : "A guerra religiosa no México. Roma, 1 7. - O
Secretariado· da Comissão dos Bispos mexicanos anuncia
ter recebido as -seguintes notícias acêrca das atrocidades
da guerra religiosa no México. Em Toluca, uma jovem
católica foi crucificada e imediatamente depois fuzila­
da na própria cruz. Em Guadalajara, um -sacerdote fc:>i
embebido em gasolina e queimado vivo. Na Capital, 1 7
sacerdotes foram levados de uma fortaleza a t é o cemi-­
tério de Dolores e fuzilados às bordas de uma fossa
·
recentemente aberta. Váríos dêlés foram sepultados com
vida. O espetáculo era tão terrível que um dos coveiros
ficou louco."

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154 A SANTIDADE CATÓLICA

refugia-se numa estância de São José de Llanetes,


propriedade de Dom JosÉ MuRANDA. Em 30 de j a­
neiro de 1 927 pedem seus serviços à cabeceira de
um moribundo e êloe parte levando o Santíssimo
Sacramento, acompanhado por Dom JosÉ. Pelo
caminho, porém, encontra-se com lilS tropas de Eu­
í..ÓGio Ü!lTIZ. São presos e separados. Em 9 de
fevereiro apareoe nos arredores de Durango um
cadáver mutilado : o de Dom MATEUS CoRREIA. O
digníssimo sacerdote havia sido assassinado.
Mais adiante, entre mil outros excessos e atro­
cidades, deve-s·e assinalar o assassínio de um j o­
vem j esuíta, o Padre PRó, cujo martírio foi conta­
do de modo comovedor pelo Padre DunoN na re­
vista Eiudes. 6
Como muitos franceses na grande revo�ução,
os jovens mexicanos com o valor e orgulho santo
atestam o heroísmo da propria fé. Costu:r_n a-se ci­
tar o feito de uma j ovem de 1� anos : as tropas ha­
viam recebido ordem de atirar sôbre um grupo
de católicos entrincheirados n'a def·esa da igreja ;

a intrépid'a crislã adianta-se resoluta, gritando :
" An ies que os �utros, ·matem a rriim."
Pobre nação ! �as gloriosa religião que sabe
infundir tanto valor a seus mártires I

(5 ) Veja-se o número 5 de ma·rço de 1 926. Encan­


tadora relação do Padre CouVREUR. (Aipostolado da Ora­
.

ção, Tolosa.)

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QUALIDADES DA SANTIDADE CA�ÓLICA 155

Emocionantes que sejam êstes feitos, sob o


ponto de vista que nos interessa, são menos impre-s­
sionantes do que esta reflexão : o que dá um relê­
vo singular à santidade de nossos dias é o de um
valor doutrinário de primeira ordem.
Queremos dizer que em tôdas os épocas se
pod•e apresen1ar, e de fato existiu, o valor cristão,
o catolicismo praticado integralmente. Mas o que
chama a atenção do observador perspicaz é que
a santidade de nossos dias se rnanifes:a como a
floração espontânea, lógica, de um catolicismo
mais bem compreendido do que nunca. É que os
elementos dou trinários que animam êste grande es­
fôrço cristão até à perfeição do cristianismo são de
primeira ordem. É que a santidade atual é uma
santidade que se arraiga profundamente, uma san­
tidade que se liga mais intimamente do que no
passado, com quanto há de mais elevado e imprJr­
tante em o dogma católico, isto é, para não assina­
lar senão dois traços, a habitação da Santíssima
Trindade em nossas almas pela graça santifican t e,
e noss a par: icipaçâo' forçada, como membros de
Cristo, na Redenção do mundo por Jesqs Cristo.
Sej am-nos permitidas algumas ligeiras refle­
xões sôbre êstes dois pontos.
O Padre FocH já o fazia notar numa carta a
propósito de IsABEL DA TRINDADE, do carmelo de

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156 A SANTIDADE CATÓLICA

Dij on. Um dos pontos essenciais do dogma ca tó­


lico é a doutrina referent•e à habitação divina em
nós por meio do santo B atismo� Parece que hoj e
o Espírito Santo orienta um gran d e número de
-almas para uma compreensão mais íntima dêss·e
tesouro. O grande mal de nossa época é o laicis­
]no. Deus, porém, dá o remédio ao lado do mal,
movendo as almas a penetrar melhor no elemento
sobr<!natural : enxerta a santidade cntólica numa
compreensão mais profunda do donum Dei."
ISABEL DA TRINDADE é b astante conhecida. Não
insistamos, pois, em recordá-la. Lembremos, a n­
tes, a Irmã-branca MARIA DE SANTO ANSELMO. Em
24 de fevereiro de 1907, com o próprio sangue es­
creve em seu "Diário " : " Sinto-me cadn vez mais
atraí da para levar uma vida puramente interior,
para guardar silêncio, para me contentar com t:.le,
somente." Em 24 de abril : " Sim, devo permane­
cer enclausuradn. Para mim, o claustro é minha
Trindade. Jesus conduziu todos até f:le. E' a pri­
meira vez que, com tanta intensidad·e, experimen­
tei a presença do Pai e o amor ativo das Três divi­
n as Pessoas, uma para outrn, em mim mesma."
O jovem beneditino PIO DE HEMPTINNE não fala
diversan1ente, assim como SoFIA DE CLAYE, perten­
cente às religiosas de Maria Reparadora.
"A alma é uma habitação que deve ser habi­
tnda ".• escreve em suas notas o fervoroso discípulo

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Q UALIDADES DA SANTIDADE CATÓLICA 157

de Dom MARMION, e a santa vida dêsse jovem reli­


gioso é uma formosa homenagem à formação que,
como Mestre de Noviços, deu o autor tão justamen­
t-e apreciado de Cristo Vida da A lma e Cristo �em
Seus Mistérios. "Só o Senhor, ,e de pleno direito,
penetra nesta habitação. Por isso merece o titulo
de s antuário. É a solidão em que o homem se en­
contra com seu Deus e aprende a conhecê-lo e a
amá-lo. Alguns abrem aos poucos a habitação ao
espírito das trevas, entregando-se ao pecado e ex­
pulsando de si o espírito do Senhor, preferindo o
ódio ao amor. Outros receiam abrir o coração a
Deus porque os assusta a austerid a de do amor cas­
to e desconhecem os encantos d a divina solidão d a
alma. São êstes o s filhos d o mundo, a quem a le­
viandade cerra os olhos e a tibieza afasta do úni co
Bem verdadeiro. Outros, finabnente, abriram
completamente a alma a Deus e o possuem p erma­
nentemente pal"a viver sempre com �le, para o co­
nheçer e amar. Somente êstes compreendem que
a abna é uma habitação que deve ser ocupada."
Entre 'as recordações de SoFIA DE CLAYE, cujo
p rólogo foi escrito pelo Padre BRIERE, encontram­
se lindíssimas páginas sôbre o Espírito Santo, " doce
Hóspede da alma", escritas por ocasião das festas
de Pentecostes.
Não será supérfluo saber que em junho de 1877
Soror MARIA DE JESUS CRUCIFICADO, monja leiga do

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158 A SANTIDADE CATÓLICA

convento do Carmelo, de Be·lém, falecida no ano


seguin .•e, em conceito de santidade, dirigia a Mon­
senhor BRACO uma súplica destinada ao Papa : '' O
mundo e as Comunidades religiosas, dizia ela 'ao
S obe·rano Pontífice, da parte de Nosso Senhor, pro­
curam a novidade nas devoções •e menosprezam a
verdadeira devoção ao Paráclito. Até mesmo nos.
seminários deixa-se de lado esta de·v oção."
Mas, se logramos nossa divinização, dev·emo-lo
a Cristo. Pata nos restituir os dons espirituais
perdidos com o pecado original, o Verbo se fêz
homem e- nos incorporou a êle. SÃo PAULO, que
j untamente com SÃ� JOiÃo é o ,grande t·eólogo desta
doutrina, pareceria hoje menos ignorado que ou­
trora e um bom numero de almas sonha realizar,
com pe·rfeição, o ideal cristão que propõe. Daí êsse
cará ter singularmente vigoroso do esfôrço pela
Santi dade.
CATARINA O'NEIL, primeira mestra de noviças·
da Assunção, da qual esperamos confiadament·e
que se não cubram de- p ó suas preciosas notas, cer­
tamente recebeu um dom éspecial para praticar
oe ensinar esta piedade substancial. Sua grande
devoção era a devoção a �risto, Cabeça do Corpo
Místico. " Tratava-se - diz de reproduzir em

mim a vida de Cristo, de consagrar-me a seus mis­


térios. " Nosso Senhor pedia " querendo que sua
hum·anidade se abandonasse inteiramente a seus
c;lesígnios : Sejas S alvador ! (O nome de Ca�'U'� na,

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Q uALIDADES DA SANTIDADE CATÓLICA 159

em religião, era Madre Teresa Salvador.) Não


quero que con tinues vivendo de tua própria vida,
pois eu hei de viver em ti." Humildemente acres­
centa : " E' uma espécie de luta entre Jesus que se
apodera de meu ser p ara o usar conforme suas
finaliàades, como se· fôsse próprio d�le, e eu, que
desej o continuar com a propriedade dêste ser.''
" Sentia-me - · diz também - absolutamente con­
denada a perder a vida, tôda minha vida própria.
não pelos homens, mas p or Deus." Atrav�s des­
tas palavras se vê reproduzido o "Já não eu, mas
Cristo", doe São Paulo.
Em MARIA AMADA DE JEsus, do Carmelo da ave­
nida de Sax•e, se encontra a me-sma característica.
Formula o voto de fazer, s:empre, o que for mais.
agradável ao Senhor, para compensar a claudica­
ção de Renan, e sente-se animada a escrever uma
vida de Jesus para contrabalançar a famosa Vida
de Jesus dêss'e autor. Seu programa de santifica­
ção se encontra concebid o nesta forma : desapare­
cer para que somente Cristo viva e resplandeça

nela ; transformar-se em cópia viva de Jesus Cristo.
Porção integrante de .Cristo Jesus, não só nos·
esforçaremos em nos parecer com �le, tornando­
nos outros Cristas, mas havemos de prolongar sua
atividade. Identificou-nos com sua pessoa (Eu sou
a vide, e vós os sarment·os) só para nos unir a sua
obra. Por vocação batismal somos redentores do
mundo, ainda que não constituamos senão uma só

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160 A SANTIDADE CATÓLICA

eoisa com Cristo : Redentor do mundo. Compreen­


·
de-se isto hoj e melho r ; por isso êsse ardente dese­
j o doe re-p aração. Falamos bastante desta caracte­
rística de santidade católica nos momentos atuais
p ara que nos limitemos a simp'les menção.
Onde encontrar um sentido mais profundo d e
nossa participação redentora que em MARIA DE­
LUIL MARTINY, fundadora das Filhas do Coração
de Jesus, uma das muiheres que melhor escreve­
-ram s Ôbre nosso dever de completar a Paixão de
·Cristo e que foi assassinada por um anarquista em
'27 de fevereiro d e 1884 ? Ou no Padre LYONNARD,
'
'() s anto autor de Apostolado do Sofrimento, ou na
Bélgica o Padre LINTELo ? Entre os leigos citemos
SoNIS, o generoso Luís PEYROT, fundador da União
Católica dos En.fermos, MARIA B noTEL favorecida
,

com surpreendentes revelações sôbre a necessida­


de da união de sentimentos •e afetos entre tôdas as
-ordens religiosas e os membros da Hierarquia
eclesiástica ; sôhre o amor dd Igrej a e do Pap a ;
'TERESA DuR�ERLN, fundadora d o s Amigos dos
Pobres; também MARIA ANTONIETA DE GEUSER, so­
brinha do erudito e santo Padre LEôNCIO DE
·GRANDMAISON, e cujo ideal foi reproduzir tão fiel­
·mente " a plenitude de vida em Cristo ", que pôde
'l"ealizar na ínais ampla acepção o anêlo do divino
Mestre : " Consumir-se na unidade " : Consummata.
Ordinàriamente, êstes anelos de intima umão
.e estas aspirações redentoras germinam ao con-

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QUALIDADES DA SANTIDADE CATÓLICA 161

tacto com 'a Sagrada Eucaristia. Será preciso


recordar em apoio de-sta afirmativa a senhorinha
TAMISIER, iniciadora, com FILIBERTo VRAU, dos
Congressos Eucarísticos Internacionais ; EusTELA
HARPAIN, falecida aos vinte-e-nov·e anos, depois d e
ier sido durante sete anos sacristã de uma igrej a
da Vendéia, e da qual o Padre EYMARD pôde dizer :
"Estou convencido de que a Virgem de Saint Pal­
lais foi a precursora dês te triunfo . du Eucaristia
que nós presenciamos.'' Quinze anos depois de
sua morte, três j ov-ens tolosanas se reúnem e diri­
gem uma súplica a MARIA Eusmu para que ela
assuma a presidência honorária. Essa foi a ori.,
gem da pequena Sociedade de Jesus Hóstia, que
dez anos mais tarde devia dar origem às S.e rvas
d.e Jesus no Santíssimo Sacramento. A senhorinhu
GUIBRET, a sobrevivente das três, em memóriu do
fe·ito tomou o nome de Madre MARIA EusTELA. Em
1 � de j aneiro de 1921 era decidida a iniciação da
causa de b eatificação de MARIA EUSTELA HARPAIN.
Para propagar a culto à Eucaristia, também
se sentiu atraída MARIA TERESA DA CRUZ, fundadora
d as Guardas A doradoras do Santíssimo Sacramento
e que devia achar a morte no bombardeio de Comi­
nes, -em 1 8 de novembro de 1916. Havia nascido
num lar pouco cristão. A Comunhão recebida
aos doze anos foi o fermento que, apesar das pri-

( 1 ) Sua vi !la foi publicada pelo Apostolado da


Oração, Tolosa.

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162 A SANTIDADE CATÓLICA

meiras repulsas, inflamou em sua alma o desej o


da vida religiosa e eucarística. De início desej a
s·er carmelita; porém mais tarde Monsenhor D u­
PANLOUP a aceita em Saint Aignan, de onde será
uma segunda fundadora e onde iniei arú uma de­
voção de todo agrado de Jesus Hóstia. 2
Jesus Cristo, Verbo Incarnado, Jesus p rolon­
gando sua p_ermanência entre nós por m eio da
Sagrada Hóstia, constitui o centro da religião cató­
lica. Centro dêste centro, no entanto, é o amor.
A essência íntima dêste esfôrço denodado de Cristo
por nos devolve·r a vida divina é seu amor imenso
para com os homens. O coração do mundo é Je­
sus Cristo e o Coração de Cristo é o Sagrado
Coração. Nunca como em nossos dias se souhe
penetrar no S·entido da devoção ao Coração de
Jesus e é esta, precisamente, uma das razões p or
que a san ti dade católica atual é tão copiosa e pro­
funda ! Quantas almas se consagraram a 1;:.le,
quantas instituições se fundaram sob sua invoca­
ção ·e em sua honra ou professam uma vida dedi­
cada, inteiramente, à dilatação de sua glóri a !
Pois bem, o Sagrado Coração entre as demais
promessas, não assegurou a· santa MARGARIDA :
" Elevarei as almas fervorosas à santidad.e " ? E
soube manter a palavra.

(2) A vida foi p ublicada por de Gigord, Paris.

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QuALIDADES DA SANTIDADE CATÓLICA 163

Aqui também deveríamos contar alguns n omes.


Não omitamos p-elo menos os seguintes : a Madre
MARIA no DIVINO
CoRAÇÃO, no século, Drost•e Vische­
ring, susci tada por Deus a fim de solicitar ao Pa­
pa' Leão XIII a consagração do gênero humano
ao Coração de Jesus ; LuísA TERESA DE MoNTAIGNAC
que confia a suas filhas, juntamente com o cuidado
de obras lindíssimas, o fogo sagrado que lhes
infunde vida : " 0' Jesus, vida eterna no seio do
Pai, vida das almas criadas à Vossa semelhança,
por Vosso amor, faz·ei que conheçam, manifestai­
lhes Vosso coração !" ]';:sse é um grito que não
será olvidado. " MAmA ADÉLIA GARNIER (1838/1 924) ,
que fund ; um instituto de adoração em Montm,·tr­
tre e C!lj as filhas, instaladas perto do antigo patí­
bul? de Tyburn, em Londres, rogam, meditam,
expiam particularmente para a volta da Inglaterra
à. unidade da Igrej a ; LuísA MARGARIDA CLARET DE
LA ToucHE, falecida aos quarenta-e�set·e anos, em
14 de ma·io de 1 915, fundadora de Betânia do Sa­
grado Coração e da A liança Saoerdotal Universal
dos Amigos do Sagrado Coração; sua autobiogra­
fia escrita por ordem do Diretor ·espiritual, Padre
ALFREDO CHARRIER, está em vias de publicação.
Aos doze anos faz voto de virgindade e aos vinte:
e-três uma vida de são Luís GoNZAGA
lhe infun­
d·e novos alentos, e aos 20 de novembro de 1 890
é admitida na Visitação de Romans, onde se aper-

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164 A SANTIDADE CATÓLICA

feiçoa nas vias místicas, máxime a partir de


j unho de 1902, terminan.do seus- anos numa vida
de abnegação e imolação pelo sacerdócio.
Como é doloroso ver-nos obrigados a deixár
na sombra tantas figuras representativas, ma:s não
temos outro recurso. D estaquemos, pelo m·enos,
o poder da santidade católica que traduz o admi­
rável movimento de conversões dês.t es últimos
anos e, no meio da massa de vocações, algumas
-
eminentemente significativas.
Conversões de anglicanos e ortodoxos em
grande número ; conversões de incréus e isto, ge­
ralmente, não em ambientes pouco elevados, e d e
f é mais ou menos servil, mas de indivíduos inteli­
gentes, cultos, que refletem e que se não decidem
a não ser após detido estudo dos problemas :
•RuviLLE, BENSON, CLAUDEL, PsiCHARI, RIVIERE e
centenas de outras pessoas ilustres.
Também as vocações manifestam, e com maior
intensidade, a sêde de santidade que abrasa o
pensamento e a vida católica.
Através das paredes de dois quartos contíguos
dialogam duas crianças, êle com nove e a menina
com sete anos :
- Joaninha !
- Que há ?
- Sabe de uma coisa ? Existe um Deus que
é bom . . .

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Q UALIDADES DA SANTIDADE CATÓLICA 165

- E com isto ? . . .
Assim prossegue a conversa pueril que s·e re­
nova tôdas as noites. Um dia, os p ais, incrédulos,
surpreendem-nos, ouv·em a conversa, comovem­
&e . . . e entra em jôgo a graça divina. JoRGE
e JoANA DoussOT são b atizados simultâneamente
com os pais. O menino entrará mais tarde na
ordem dominicana, a irmã no Carmelo.
Poucos anos depois da guerra, o conde CLÁU­
DIO D'ELBÉE e sua espôsa decidem consagrar-se a
D eus. �le, brilhante oficial do Estado Maior
francês, ingress-ará em Piepus; e ·ela tornar-se-á
CLARA MAniA DO CoRAÇÃo DE JEsus, no Carmelo d e
Lovaina.
Também o general conde FRANCISCO DE GRUN­
NE é ordenado sacerdote pelo Cardeal MERCIER n a
ordem q e São Bento, onde toma o nome d e D .
DoMINGos; era o domingo d e Pent�cost·es d e 1923 :
ocupam as primeiras cadeiras os filhos e o genro
do Padre DoMINGOS, os condes CARLOS, EuGÊNIO,
IWILLY e XAVIER DE GRUNNE, e o conde ANDRÉ DE
MoNTALEMBERT.
Um oficial de •engenh-ari a troca os galões
p ela sotaina dos Irmãos de S ão João de Deus.
É o mesmo que certo dia, perseguido por um bando
de moleques que vociferavam " morra o jesuíta ! ",
responde tranqüilamente : " Eu não .sou j esuíta,
sou irmão de São João de D eus e trato de loucos :
estou às suas ordens I "

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166 A SANTIDADE CATÓLICA

Não faltam, tampouco, advogados e mari­


nheiros ilustres. Pnra sucessor do Padre Fou­
CAULT, apresentam-se um advogado do fôro de
Nancy e um vice-almirante. Ambos, consagrados
pelo Bispo d-e Cartago, plantam suas tendas nos
limites saáricos e contam com as orações do após­
tolo de Hoggar a fim de terem um apostolado
fecundo. O vice-almirante MALcoR havia feito
brilhante carreira : chefe do pôs to de Bizerta,
preferiu a humilde sotaina às estrêlas do pôsto.
Com êste título Do Governo ao Claustro se
anunciava há pouco que um ex-primeiro minis­
tro chinês, RENATO Lou-TSENG-TSIANG, acabavà de
ingressar ·entr.e os beneditinos de Santo André de
Bruges.
Eis alguns exemplos femininos : uma atriz
italiana, estrêla de ópera cômica, RosiNA SToRCHIA,
a " Storchia " como era conhecida no mundo tea­
tral, não encontra nos esplendores da arte as satis­
fações da vida. Renuncia à ribalta e ingressa no
convento de Santa Clara, ·em Assis.
EvA LAVALLIERE, por sua vez, sacrifica a glória
humana p ara se consagrar a uma existência de
total obscuridade, oração e renúncia. Com o nome
de PAULA DOMINGA, a senhora PAUL ADAM, espôsa
do vigoroso autor de Trust e La Forc.e, apres•enta­
se no convento de Pensier, perto de Friburgo, na
Suíça, solicitando a plenitude e a paz que o mundo
é incapaz de lhe proporcionar.

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QUALIDADES DA SANTIDADE CATÓLICA 167

Que afã ardente de santidade em tôdas essas


almas ! Como é poderoso êsse Cristo ! Divina
essa religião que inspira tais sacrifícios, provoca
tão intenso amor e tanta elevação moral !
Em meio . às perplexidades desta hora, isso
tudo permite esperar com fé e confiança num futu­
ro feliz. Acima de tudo, no século em que vive­
mos, temos necessidade de Santos. Há perto d e
cinqüenta anos Monsenhor Baunard e m sua bio­
grafia de Madalena Sofia Barat tinha essa afirma­
tiva. 1 E, nas últimas p alavras de O Primado do
Espiritual, MARITAIN punha em claro a necessidade
presente e, poderíamos dizer, a urgência da san-

(1) "Quando nossa sociedade culp ável, como outrora


Sodoma, se acha ameaçada, quiçá por nova chuva d e
fogo, não é coisa inútil contar o número dos justo·s, sa­
bendo que na balança divina dez deles pesam mais d o
que mil outros. U m autor escreveu que o s Santos san­
tificam o mundo ; eu acrescento que êles o conservam.
São êles os verdadeiros, os únicos con servadores dêste
mundÓ que dêles ·caçoa e que, no entanto, não vive sec
n ão por meio dêles. Os séculos não contam diante de
Deus, a não ser em co'nsideração aos Santos que pro­
duzem e isto é tão seguramente certo que a terra sõ
p oderia d esaoparecer no dia em que deixar de enviar
Santos ao Céu. Só êles :progridem ; os demais vivem
a perambular sem resultado. Só êles edificam na am­
pla acepção da palavra. Os outros ficam pregados a o
solo. Só êles são, aqui e m baixo, os trabalh adores d a
vida : os outros, e m maior o u menor grau , são o s artesãos
d a morte. O amor puro, a oração, o exemplo, o sacri-

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168 A SANTIDADE CATÓLICA

tidade : *• .Mais necessária ainda que a união de


t�dos no esfô:rço da ação - constituindo por
outra· parte uma condição superior é (a san­
-

tidade) . . . Eis o que está a reclamar, ant·es de


mais nada, a angústia dos tempos que correm.
O mundo está a pedir Santos.•• Algumas páginas­
antes j á havia escrito : " O heroísmo cristão será
um dia a única solução para os problemas da
vida. Então, dado que Deus concede suas graças
proporcionalmente às necessidad·es e· não permite
que a nada sejamos tentados de modo superior
às nossas fôrças, verá coincidir, com a caótica
página da história da humanidade, uma grande
floração de santidade.''
Com que grandeza e amplidão está por se
realizar esta previsão I O passado próximo é um
penhor do porvir.

ficio, cuja r-epresentação perman ente são êles mesmos,


opõem sem cessar, ao choque de nossos crimes, d a · par­
te da terra, um protesto e, da parte celestial, uma repa�
ração." ( 4.a ed. 1879, POUSSIELGUE, lntr., pág. 20.)

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Conclusão

A TRAVÉS desta rápida exposição, creio possível


que se chegue a forma r uma idéia do poder
santificador da Igrej a de Cristo no século vinte�
como, aliás, em todos os séculos c, por certo, não­
menos do que nos demais. Os p rincípios s.ão
seguros e eficazes : os resultados concludentes.
Dir-se-á : nada mais exato do que esta afir­
mativa e, sob pena de negação de ·inteligênci a ou
sectarismo, não 'Se pode desconhecer o que há de
glorioso nf'ste panorama de santidade católica a
se ·estender, desde os tons mais cálidos até as
gradações mais imperceptíveis. Mas esquecere;..­
mos, por acaso, o reverso da medalha ? Se a
Igrej a corta com tamanho poucr de santificação,
como explicar a razão por que há t antos cristãos
que se acham tão afastados da santida de ?

Demos, antes de mais nada, um argumento


ad liomin.em. Não se vê bastmüc santidade entre­
os catól:cos ? Fora do catolicismo haveria santi­
dade maior ? Comparado a qualq� cr outra dou­
trina, não está o catolicismo com a p alma ?'
Que religião conhecem os leitores que chegue a
santificar seus membros do mesmo modo como
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170 A SANTIDADE CATÓLICA

a católica ? Leitor, você que talvez s·ej'a, mesmo,


filho 'da Igreja : que faz para evitar êste ataque ?
Se é indiferente, onde ·estão suas virtudes para
estabeleoer um têrmo de comparação ? Pelo que
toca aos inimigos <la Igrcjn, êst-cs j á estão sufi­
cientemente classificados para que se faça uma
comparação de suas virtudes com as dos católicós.
De fato, alguém já se não atreveu a sustentar -
note-se que a palavra é de uma clareza brutal,
mas não m�mos exata - que " comum·ente, para
se tecer a apologia da Igrej a, seria suficiente pôr
às claras a vida de s·eus detratores " ?
Reconheçamos, contudo, que existe um ponto
vulnerável. Proclama-s·e em VO.ies bastante al­
tas : " Suponhamos os cristãos de nome transfor­
mados em verdadeiros cristãos e terá desaparecido
a questão social", exclamou CLEMENCEAU. Está
certo ; mas obs·erve-se que a ausência de santidade·
·em certos católicos provém, não precisamente de
sua obediência aos princípios, mas 'da falta de
observação dos mesmos. Dev·e-se incriminar a
debilidade humana e não falar de impotência san­
tificante da doutrina. Mais rude ainda do que
CLEMENCEAU foi Nietzsche : " Se vossa fé vos torna
felizes, mostrai-vos tais ! Vossas fisionomias sem­
:pre prejuàicaram mais a fé d o que vossos argu­
mentos. Se a feliz mensag·em de vossa Bíblia
fôsse estampada em vossos rostos, não teríeis
necessidade de reclamar com tanta insistência a

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CoNcLusÃo 1 71

autoridade dêsse livro ; vossas palavras, vossos


atos tornariam supérflua a Bíblia e, constante­
mente, de vós mesmos dev·eria ir surgindo, sempre,
uma nova Bíblia."
Esta nova Bíblia, esta apologé �ica em função
das virtudes, existe, como o vimos. e não há razão
para que as moitas imp·e çam a visão do arvoredo.
Que está a provar a cizânia? Que a Igreja na
·
terra continua sendo militante. C ontém quanto
necessita para a perfeição de seus membros ; mas
não pretende que todos êJ.es sejam perfeitos. " A
lgrej a n ã o é uma sociedade d e sêrcs pc·r.f.eitos,
-:- adverte mui acertadamente um autor inglês -
mas a escola para os imperfei tos. Confundir a
Igrej a militante com a Igrej a triunfante é êrro há
muito conhecido."
Intentaremos· outra resposta. Se a Igrej a Ca­
tólica, que conta com tamanho po der santifica­
dor, não logrou santificar tudo qu anto se acha a
seu redor ; se, em seu própt:io seio,. nem to dos vivem
a perfeição cristã, que conclusão poderemos tirar
disso ? Que a Igrej a frocassou ? De modo algum,
mas, simplesmente, que ela ·deve ter •em conta,
nã () só as paixões e vícios de cada um, mas tam­
bém a época.
Quem sabe se o mundo &e não encontra, ai,nda,
em plena j uventude ? Não estaríamos vivendo os
primeiros estádios da humanidad·e ?. A julgar pela

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172 A SANTIDADE CATÓLICA

alma, a maioria dos civilizados não se parece a


grosseiros primitivos ? O Evangelho quase não
pene trou em p arte alguma. Tudo ou quase tudo
ainda está por fazer. LA BRUYERE escrevia : " Tu­
,
do est á dito e chegamos demasiadamente tarde i .
D e modo algum ! Ou se muito s-e disse, nada, abso­
lutamente nada se fêz até o presente. Entre povos,
entre classes, entre indivíduos, no íntimo de cada
indivíduo, em nós mesmos que nos detemos a ler
estas páginas, até onde chega o Evangelho ? Qual
o alcance de sua açãq ? Um p ouquinho de Evan­
gelho verdadeiro, em qualquer p arte, bastaria p-ara
uma renovação geral. No •entanto, qual não é o
empenho em se fazer tudo à margem dêsse mesmo
Evangelho ! O mundo é j ovem. Cristo ainda 'não
mostrou tudo quanto é capaz de fazer. Rein-a, n o
entanto, uma imensa barbárie e , na realidade, en­
contramo-nos na aurora. Começa a se levantar
- o p-ano : a sement·e de mostarda começa, ap enas,
a se mostrar na superfície, o fermento foi lançado
em poucos r ecipi·éntes ,e ali fôrças antagônicas des··
truíram ou diminuíram s·eu poder. Mas, onde o
Evangelho chegar a penetrar ou brilhar livremen­
te, de que não será cap-az ?
Quem poderá dizer a extensão do reinàdo de
Crisj.o na terra dentro de um milhar de anos ? A"
Jgr.ej a não só cr·escerá em espaço, mas também
em perfeição de vida. Surgirão magníficos San-

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CoNcLusÃo 173

tos. Atualmente, hnnbém, nascem e se preparam


Santos extraordinários e sabe D-eus se agora mesmo,
quando terminamos estas linhas, já não deixa ouvir
seus vagidos, num b ercinho distante ou bem perto,
um menino que a Igrej a há d·e canonizar algum dia
como canonizou tantos filhos e filhas !
Belos e numerosos que se suponham os Santos
- de ontem como de hoj e - por f.ecund a que até
hoj e tenha sido a ação santificadora da Igrej a no
mundo, não pensemos que Jesus Cristo tenha vindo
sàmente para produzir êstes resultados tão me·squi­
nhos. É indubitável que, falando com precisão de
têrmos, só se requer a santidad·e de dir.eito, como
'a catolicidade de direito, e tais condições prescin­
dem em absoluto das limitações do tempo. O
mundo po derá acabar amanhã mesmo, pois a dura­
ção não influi o mínimo nisto tudo, a não ser para
Jhe dar uma confirmação de magnífica eloqüência.
No entanto, o mesmo não se dá com a santiQ.ade
de falo. Como não é numerosa a _ parte d a huma­
nidade que ainda deve s·er santificada ! Um bilhão
de pagãos e, entre os que conhecem a Cristo, dedu­
zidos os hereg-es e cismáticos d·e boa-fé e que cum­
prem tôda a lei, deduzidos, também, os fiéis que o
são verdadeiramente, de todos os Santos de quem
falamos, sej a qual fôr o grau de santidade alcan­
çado, em quantos outros, no entanto, ainda se deve
fazer penetrar o Evangelho !

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174 A SANTIDADE CATÓLICA

Para cooperar com esta obra foram criados


todos os homens. Queira Deus que estas breves
idéias auxiliem algumas almas na subida à santifi­
cação, e que, para edificação das gerações futuras,
delas façam reproduções as mais fiéis do Santo por
antonomásia, do único perfeito, Nosso Senhor Jesus
Cristo.
íNDICE

Introdução . . . . . . . • . . . . . . . . • . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

PmivmmA PAliTE

FONTES DA SANTIDADE CATóLICA

CAP.
I. Um ideal sublime e uma regra. segura . . . . 13
II . Doutrina de coesão e adaptação admi ráveis 23
UI . Auxílios de singular eficácia . .. . .. . . . . . . . 40

SEGUNDA PARTE

A SANTIDADE EM SUA PRATICA ATUAL

I. A Santid ade comum . .. ... ....... .. ....... 51


11. A Santidade eminente = 1. Na vida' religiosa 59
III . A Santidade eminente : 2 . Na vi da missio- .

nária .... .. .... .... .. .. ....... ... .. . .. ..


. 80
IV . A Santidade eminente : 3. Na vida sacer-
dotal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . _. . ... .......
. .. 94
V. A · Santidade eminente : 4. Na vida leiga 1 08
VI . Qualidades da Santidade Católica em nossos
tempos ........ .. ...... .. ...... .. ... .. ..
. 1 35
Concl'UISão . , . . . . . . . . .. . ..
. . • • . • _ .. . . . . .. . • . . . . • . �69

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:ll:s te livro foi composto e Impresso nas oficinas da Emprêsa.

Gráfica da " Revista dos Tribunais" Ltda., à rua Conde

de Sarzed a.s, 38 - São Paulo.

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