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Do Pensamento às Palavras
Instrumento metodológico para a análise dos discursos

Of the Thought to the Words


Instruments for the analysis of the speeches Artigo
Original

Original
Luiz Augusto F. Rodrigues 1 Paper

Palavras-chave: Resumo

Ideologia Fundamentos teóricos de proposta metodológica de análise do discurso que toma por
base contribuições da psicanálise lacaniana. Discurso, representação e ideologia.
Análise do discurso

Imaginário
[lacaniano]

Abstract Key words:

“Of the thought to the words” is founded in theoretical beddings of proposal Applied Linguistics
methods of analysis of the speech that takes for base contributions of the lacanian
psychoanalysis. Speech, representation and ideology. The modernist
tradition

Position “on the


border”

Este ensaio faz parte das reflexões não perde sua referência unitária (ZIZEK,
contidas no livro Universidade e a fantasia 1991). Por mais que se privilegie o plano da
moderna: a falácia de um modelo espacial percepção sensível (o campo da experiência
único publicado pela Editora da Universidade visual e imagética), os meios de comunicação
Federal Fluminense em 2001. São reflexões de massa têm forte apelo significativo a partir
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oriundas de minha tese de doutorado das construções discursivas.
em História, defendida nessa mesma O caminho aberto por Marx, e seguido por
Universidade. Graduado em Arquitetura outros teóricos, vê a ideologia como um fator
e Urbanismo, minhas preocupações se de dominação. Gramsci amplia os horizontes,
direcionam a diferentes discursos, em tratando a ideologia como componente da
especial os discursos sobre a cidade. realidade e, como tal, abarcando todas as
Pensar sobre o indivíduo em seu classes. Em Althusser vamos encontrar os
contexto cultural é inseri-lo num campo de dois caminhos: enquanto fator de dominação
edição nº 12, abril/2010

paradigmas transdisciplinares que busquem (efeito de ilusão) e enquanto visão de


romper as barreiras de um conhecimento mundo (efeito de alusão). Se, por um lado,
compartimentado. Hegel já nos apontava a trajetória teórica apresentada já apontava
que mesmo na razão universal o indivíduo elementos inconscientes, em todos eles o

1
Professor do Departamento de Arte da Universidade Federal Fluminense
Coordenador do LABAC-UFF / Laboratório de Ações Culturais
UFF – Instituto de Artes e Comunicação Social
inconsciente foi tratado como contradição reflexo das hesitações subjetivo-psicológicas,
88 ou ambivalência. Os estudos lacanianos, mas das relações sociais estáveis dos
aprofundados por Slavoj Zizek, na direção de falantes” (BAKHTIN, 1986: 147), ou seja,
compreender como se estrutura a ideologia, Bakhtin parece incorporar apenas as emoções
vão contribuir diretamente para a correlação conscientes, deixando de fora as emoções que
entre ideologia e inconsciente, tendo na não afloram à consciência do falante, mas que
experiência linguística um eficaz elemento podem também ser percebidas por outrem em
de conhecimento (entendimento) de ambos. sua fala. “Assim, nas formas de transmissão do
Parece-me assim, ser impossível discurso, a própria língua reage à personalidade
retirar da realidade a carga ideológica que a como suporte da palavra” (1986: 188); só que
compõe. Como proceder, então, à análise de além de reagir, ela também pode deixar escapar
determinada realidade? Como interpretar suas coisas que são inconscientes. Os atos falhos,
relações? Podemos aproximarmo-nos de uma os lapsos,..., que Freud já nos apontava.
realidade pura? Ela existe? Jacques Lacan nos dá subsídios para
Talvez o caminho não deva ser flagrar a ideologia através da linguagem,
propriamente esse. O desafio encontra-se em pois desloca a ênfase dada ao sentido. Para
identificar a maior e mais complexa gama ele, o importante não é o significado, mas o
de representações, ou antes, as variações de significante (a parte material do signo); e que é
representações de uma mesma realidade, na relação entre a metáfora e a metonímia que
identificando-se os elementos dominantes e os residem suas essências:
dominados, e neles - num sentido hegeliano - Com isso, o autor quer dizer que o
suas contradições e suas oposições. desejo inconsciente, que supostamente
Na concepção marxista, argumenta Zizek, constituiria o núcleo mais oculto, escapa
atribui-se à ideologia uma “certa ingenuidade justamente na tentativa de disfarçar esse
constitutiva: a ideologia desconhece suas núcleo. Escapa, torna-se exterior, só que
condições, suas pressuposições efetivas, e seu “disfarçado”, e aí entram os mecanismos de
próprio conceito implica uma distância entre o deslocamento e condensação presentes nas
que efetivamente se faz e a ‘falsa consciência’ metáforas e metonímias.
que se tem disso [eles não sabem o que fazem Por isso, devemos ir do pensamento às
mas o fazem assim mesmo]” (1992: 59). palavras (que é uma expressão do próprio
Essa concepção é ampliada por Lacan): fugir da tentativa de entender o que está
autores da Escola de Frankfurt na análise oculto no pensamento, e sim aquilo que pode
crítico-ideológica, que tem como finalidade ser aclarado a partir das palavras. Entender o
“detectar, por trás da universalidade aparente, processo pelo qual o sentido oculto disfarçou-
a particularidade de um interesse que destaca se através de determinada(s) forma(s).
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a falsidade da universalidade em questão: o Podemos amparar-nos também em


universal, na verdade, está preso ao particular, Michel Foucault (1996) quando propõe
é determinado por uma constatação histórica uma análise a partir das relações do poder
concreta” (Idem). com o saber e destaca as aceitações ou
O estudo de Bakhtin (1986) aponta negações de discursos como exclusões (ou
para a potencialidade da análise de um não) a partir das quais é exercido o poder,
momento histórico a partir dos discursos nele na tentativa de dominar seu acontecimento
produzidos. Pela linguagem, apreende-se a aleatório. Uma dessas funções de exclusão
síntese do sistema ideológico. Tanto o que se discursiva é a interdição que determina o
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encontra mais cristalizado, quanto o que de que pode ou não ser dito.
novo anuncia-se. A teoria lacaniana aponta-nos que o
O autor dá um passo à frente, em relação desejo (de poder, de saber, ou qualquer outro)
às correntes linguísticas, ao incorporar à apresenta-se de forma irrestrita. A estrutura
linguagem fatores da realidade concreta, das de formação do indivíduo, e inerente a ele,
representações, e do psiquismo individual. assenta-se, no limite, no desejo de apoderar-se
Incorpora ação, pensamento e emoção, porém do todo. Como o todo é inalcansável, resta-nos
ele próprio afirma que “a língua não é o sempre o sentimento de falta. Esse sentido de
falta que estrutura o imaginário (o desejo, ou o onde a e b são comuns a todos os indivíduos,
núcleo do desejo) disfarça-se recorrentemente, c, d, e... são próprios de determinados grupos. 89
escapando independentemente da censura
consciente. Escapa justamente na tentativa de As linguagens estruturam nossa
realização de um desejo maior (e anterior); percepção e posicionamento no mundo.
escapa-nos como mecanismo de superação da Então, através dos discursos podem-se flagrar
angústia de tudo querer. indícios de como a realidade está sendo
O que procurarei metodologicamente social e particularmente construída. Sejam os
fazer, e consubstanciado pelas reflexões discursos verbais, sejam os não verbais.
anteriores, é analisar as produções discursivas Meu propósito final é o estudo da cidade
a partir de três níveis: o claramente dito (cuja e das práticas culturais.
veracidade é facilmente confrontável com a A cidade pesquisada através: do discurso
simples constatação da realidade); o não dito jornalístico (e as construções identitárias que
(o ideológico não evidenciado no discurso, ele produz); do discurso pessoal (e possíveis
mas resgatável –com o respaldo da História- constatações da incorporação de um discurso
enquanto intenção velada); e o interdito técnico “competente”); do discurso não
(ou seja, as fantasias “proibidas” de aflorar verbal (através das imagens veiculadas e
conscientemente, mas que escapam através dos através dos usos e formas de apropriação
mecanismos da própria língua –as metáforas e dos espaços); da identificação de alterações
metonímias) (RODRIGUES, 1998s). no uso (e/ou consumo) da cidade em face
E busco sempre como pano de fundo a das novas tecnologias de informação e
constituição da Identidade. meios de comunicação que operam sobre
A identidade cria amarras no indivíduo as expectativas e percepções dos usuários
(no sujeito) as quais permitem que ele persiga da cidade; do reconhecimento dos sentidos
caminhos plurais mas com direção clara, de de pertencimento através dos quais uma
modo que não fique “voando sem rumo”. sociedade pode reconhecer-se.
Sem identidade, o indivíduo, muitas vezes, Com base nos estudos do alemão Peter
fica sem clareza de seus desejos e aspirações, Sloterdijk, Zizek alerta-nos de que nem mesmo
sendo, desse modo, sujeito a que guiem suas essa análise crítica responde devidamente a
motivações externamente. esta questão, pois a ideologia funciona cada
vez mais envolta por uma “razão cínica”: eles
sabem muito bem o que fazem, e o fazem
assim mesmo; ou seja, estamos perfeitamente
conscientes da falsidade que há por trás da
a b
c... universalidade ideológica, mesmo assim não
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renunciamos a essa universalidade.
a = a estrutura do sujeito lacaniano A partir desses enfoques, o autor destaca
b = os arquétipos jungianos o papel da fantasia, pois “o ‘cínico’, que
c = as características singularizadas (padrões
nacionais, diferenças culturais, diferenças de ‘não acredita nisso’, que sabe muito bem
gênero, ... da inutilidade das proposições ideológicas,
desconhece, no entanto, a fantasia que
estrutura a própria ‘realidade’ social” (ZIZEK,
O núcleo duro da identidade não
1992: 61).
pressupõe subtrair as singularidades em favor
Como proceder a análise da ideologia
dos universais. Seria buscar as diferenças no
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levando em conta o imaginário, as fantasias


interior de certas invariantes. Essas diferenças,
inconscientes?
por sua vez, são dadas não apenas por variantes
Os estudos, entre outros, de Cerqueira
individualizadas, mas também por contextos
Filho ilustram-nos o caminho possível: “A
culturais e históricos particularizados.
repetição de certos significantes de que a
repressão se apoderou ou ocultou, isto é,
Sugestão gráfica para a Identidade, segundo
reprimiu, é o que deve ser interpretado” (1988:
subconjuntos:
27), pois em todo ato de fala, o “discurso
consciente, atividade da imaginação, se uma máquina radicalmente não espon-
90 deixou penetrar sob uma forma velada, tânea, que distorce de fora para dentro
incompreensível, pelo discurso inconsciente” a autenticidade da nossa experiência de
vida” (1996: 24).
(1988: 26). Lacan reafirma colocações já
presentes em Freud de que, como maneira
Daí a importância da incorporação
de revelar o inconsciente, podemos utilizar
das ideias lacanianas para a interpretação
os sintomas que afloram na linguagem, nas
de nossa realidade social, pois a realidade
figuras de metáfora e metonímia.
mascara o real do desejo. Observem que
Zizek desloca conceitualmente a
há aí uma inversão relevante, pois não é a
Ideologia. Ela não mascara a realidade e sim o
realidade que é mascarada pelo desejo, e sim
real do desejo (da fantasia), ou seja, a ideologia
a realidade é que mascara o desejo. E esse
é uma esfera intrínseca da realidade. O autor
núcleo recalcado do desejo “escapa”, tanto
aborda a questão segundo a tese lacaniana ao
através do mecanismo do sonho, quanto
dizer que sempre existe um “núcleo sólido”, um
através do mecanismo da linguagem.
“resto” que persiste (o Real é concebido como
Por Jacques Lacan, temos a fantasia
aquilo que “sempre retorna ao mesmo lugar”),
articulada à estrutura da repetição
e que a única maneira de nos aproximarmos
-desejo não satisfeito que se manifesta de
desse “núcleo sólido do Real” é através do
maneira recorrente- e que o modo de nos
sonho; o mesmo que acontece com o “sonho
aproximarmos do núcleo desse desejo é
ideológico”. “A única maneira de romper com
através das metáforas e metonímias (passar
o poder de nosso sonho ideológico é confrontar
do pensamento às palavras).
o Real de nosso desejo que se anuncia nesse
Por concordar com o autor, sou levado
sonho” (ZIZEK, 1996: 325).
a me contrapor às análises que Umberto
A ideologia (...) é uma construção de Eco faz sobre a metáfora como expressão
fantasia que serve de esteio à nossa de um tempo:
própria “realidade”: uma “ilusão” que
estrutura nossas relações sociais reais Quanto mais original tiver sido a inven-
e efetivas e que, com isso, mascara um ção metafórica, tanto mais sua geração
insuportável núcleo real impossível terá violado cada um dos hábitos retóri-
(...). A função da ideologia não é ofe- cos precedentes. É difícil produzir uma
recer-nos uma via de escape de nossa metáfora inédita com base em regras já
realidade, mas oferecer-nos a própria adquiridas, e toda e qualquer tentativa
realidade social como uma fuga de al- no sentido de prescreverem-se regras
gum núcleo real traumático (ZIZEK, para produzir uma in vitro fará com que
1996: 323). se gere uma metáfora morta, ou exces-
sivamente banal (ECO, 1995: 113).
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O autor aponta que, já na década de 50,


Roland Barthes (em Mitologias) propunha a Sou levado a discordar, pois, como
noção de ideologia como “naturalização da veremos a seguir, as metáforas -assim como
ordem simbólica”, querendo com isso alertar as metonímias- permitem, por meio de seus
para um tipo de percepção da realidade que significantes (e não de seus significados
“reifica os resultados dos processos discursivos imediatos do texto), aproximarmo-nos das
em propriedades da ‘coisa em si’ ” (ZIZEK, fantasias inconscientes do “falante”, não
1996: 16). tendo necessariamente o vínculo que Eco
tenta estabelecer.
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Através do sonho ideológico, a percepção


da realidade é estruturada antecipadamente: Cabe, neste momento, conceituar termos
percebemos o mundo da maneira pela qual e expressões que apresentam significações
somos levados a percebê-lo. específicas, quando utilizadas neste trabalho.
Metáfora e Metonímia são figuras de
Para Zizek, há uma “oposição entre a linguagem definidas, de modo singular, por,
ideologia como universo de vivência respectivamente: comparação; nomear uma
‘espontânea’ (...) e a ideologia como
coisa por outra, tomando a parte pelo todo ou (...). Quanto à metonímia, remete me-
o todo pela parte. nos de um termo para outro, do que 91
Roman Jakobson será o linguista que marca a função essencial da falta no in-
terior da cadeia significante: a conexão
melhor subsidiará a reflexão lacaniana, pois tira
dos significantes que permitem operar
das metáforas e metonímias seus laços estritos
‘a transferência’ daquilo que não deixa
à gramática, ligando-as relacionalmente uma a de faltar num discurso, ou seja, um pra-
outra, e apontando-as como um dos princípios zer definitivo (DUCROT, TODOROV,
básicos do código verbal: 1974: 416-417).

metáfora e metonímia são, assim, as Condensação e deslocamento são


expressões mais condensadas dos pro- conceitos que Lacan toma de Freud e associa-
cessos desenvolvidos sob as relações de
os, respectivamente, à metáfora e à metonímia,
similaridade e de contiguidade. Ou ain-
embora Lacan não as considere isoladamente:
da, são os resultados explícitos de dé-
marches inconscientes, ancorados nos é a metonímia que torna possível a metáfora.
dois eixos básicos presentes no código condensação, é a estrutura de sobreimposição
expressional humano, verbal ou não dos significantes onde a metáfora se origina
verbal (KATZ, DORIA, LIMA: 1971,
p. 208). deslocamento, (...) essa virada da sig-
nificação que a metonímia demonstra e
Charles Peirce, lógico da virada do que, desde seu aparecimento em Freud,
século XIX para o XX e fundador da teoria é apresentada como o meio mais eficaz
de que dispõe o inconsciente a fim de
dos signos, verá, também, a metáfora como
burlar a censura (LACAN, 1978: 242).
transferência do nome pela similaridade dos
sentidos, e a metonímia como transferência
O “simbolismo que se exprime na
pela contiguidade dos sentidos.
metáfora supõe a similaridade, a qual é
Lacan, no entanto, desloca a ênfase
manifestada unicamente pela posição”.
dada ao sentido. Para ele o importante não é o
Lacan alerta, no entanto, que não se pode não
significado, mas o significante (a parte material
considerar a dimensão sintática, pois a palavra
do signo); e que é na relação entre a metáfora e
(tomada por seu simbolismo) “perderia
a metonímia que residem suas essências:
toda espécie de sentido se baralhássemos as
• metáfora: substituição do significante
palavras em sua ordem.”
recalcado, relegado ao nível de significado
para aquele que o representa;
“Eis o que se neglicencia quando se
• metonímia: combinação de significantes fala de simbolismo -a dimensão ligada
onde o discurso manifesto, suprimindo o à existência do significante, a organi-
essencial, compõe sua unidade tranquilizadora,
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zação do significante (LACAN, 1985:
posto que ilegível. 250).

Consideremos as definições de Ducrot & A centelha criadora da metáfora não
jorra da apresentação de duas imagens,
Todorov para depois dar a palavra ao próprio
isto é, de dois significantes igualmente
Lacan. Segundo esses autores, para Lacan:
atualizados. Ela jorra entre dois sig-
a condensação é uma metáfora, em que se nificantes dos quais um substituiu o
diz para o sujeito o sentido recalcado do seu outro tomando-lhe o lugar na cadeia
objeto, e: o deslocamento é uma metonímia: significante, o significante oculto per-
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onde se marca que é o desejo, desejo de outra manecendo presente pela sua conexão
coisa que falta sempre. Porque o que implica (metonímica) com o resto da cadeia
estas duas fórmulas é que não chega, para fazer (LACAN, 1978: 237).

um tropo, pôr uma palavra no lugar de outra


em virtude dos seus significados respectivos. Um novo conceito foi aí introduzido,
A metáfora, muito mais precisamente, é o peguemos sua definição. Cadeia significante:
aparecimento numa cadeia significante dada “anéis formando um colar que se enlaça no
de um significante vindo de uma outra cadeia, anel de um outro colar feito de anéis”. “De
onde o poder-se dizer que é na cadeia do Vejamos como são definidas as instâncias
92 significante que o sentido insiste; mas que do simbólico, do imaginário e da fantasia.
nenhum dos elementos da cadeia consiste na O Simbólico é utilizado por Lacan em
significação da qual ele é capaz no momento duas direções diferentes e complementares:
mesmo” (LACAN, 1978: 232). Ou seja, o a) Para designar uma estrutura cujos
autor aponta a recorrência do sintoma e a elementos discretos funcionam como
correlação metáfora/metonímia. Não é nem significantes (modelo linguístico) ou, de um
uma nem outra isoladamente, mas a relação modo mais geral, o registro a que pertencem
entre elas. Volto ao autor: tais estruturas (a ordem simbólica);
a estrutura metonímica, indicando que é a b) Para designar a lei que fundamenta
conexão do significante com o significante, esta ordem: assim Lacan, pela expressão
que permite a elisão pela qual o significante “pai simbólico” ou “nome-do-pai”, tem em
instala a carência do ser na relação de objeto, vista uma instância que não é redutível às
servindo-se do valor de remessa da significação metamorfoses do pai real ou imaginário e que
para investi-la com o desejo visando essa promulga a lei (LAPLANCHE, PONTALIS,
carência que ele suporta. 1986: 625).

[...] Tentar entender o simbólico


a estrutura metafórica, indicando que separadamente é, de certa maneira, ir contra
é na substituição do significante ao
as próprias ideias de Lacan, pois para ele um
significante que se produz um efeito
significante nunca tem uma ligação fixa com
de significação que é de poesia ou de
criação, em outras palavras, de advento um significado. O simbólico, como já dito
da significação em questão (LACAN, anteriormente, compõe a tríade (junto com
1978: 246). o real e com o imaginário) que vai compor a
realidade.
Consideremos, sob um outro viés, o Deve-se considerar a noção de
papel de destaque do significante. Slavoj imaginário sabendo que Lacan, ao usá-la,
Zizek compara-o em Marx e Freud (o fetiche tinha como referência seu estudo a respeito do
da mercadoria e o fetiche do sonho), só que o “estádio do espelho”, no qual o ego da criança
autor alerta-nos de que “a questão é evitar o começa a se constituir a partir da imagem do
fascínio propriamente fetichista do ‘conteúdo’ seu semelhante. Pode-se, assim, qualificar de
supostamente oculto por trás da forma: o imaginário:
‘segredo’ a ser revelado pela análise não é a) do ponto de vista intrassubjetivo: a
o conteúdo oculto pela forma (...), mas, ao relação fundamentalmente narcísica do
contrário, o ‘segredo’ dessa própria forma” indivíduo com seu ego;
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(1996: 297). Isto é, o essencial não é o que está b) do ponto de vista intersubjetivo: uma
latente, e sim os mecanismos de deslocamento relação chamada dual baseada em -e captada
e condensação que configuram as formas (das por- a imagem de um semelhante (atração
palavras, dos sonhos, das mercadorias, ou seja, erótica, tensão agressiva). Para Lacan existe
dos signos em si). semelhante -outro que seja ego- apenas porque
o ego é originalmente outro;
A estrutura é sempre tríplice; há sempre
três elementos em ação: o texto mani- [...]
festo do sonho, o conteúdo latente do c) quanto às significações: um tipo de
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sonho, ou seu pensamento latente, e o apreensão em que certos fatores como


desejo inconsciente articulado num so- a semelhança e o homeoformismo de-
nho. Esse desejo, [...] consistindo intei- sempenham um papel determinante, o
ramente nos mecanismos do significan- que atesta uma espécie de coalescência
te, [...] seu único lugar está na forma do [junção de partes que estavam separa-
“sonho” [...] (ZIZEK, 1996: 299). das] do significante para o significado
(LAPLANCHE, PONTALIS, 1986:
304).
Em relação à fantasia -que alguns desejos, mas ao mesmo tempo, é aquilo que
autores não distinguem de “fantasma”-, nos capacita a revelar uns aos outros desejos e 93
Lacan a relaciona diretamente ao imaginário. nos “comunicarmos” (cf. FINK, 1998: 23).
Seria uma espécie de encenação imaginária Para Lacan, as noções linguísticas
na qual o desejo está presente, porém de de metáfora e metonímia correspondem
forma defensiva, ou seja: fantasia ou desejo aos conceitos freudianos de deslocamento
inconsciente seria uma estrutura apenas e condensação típicos do sonho. É o que
subjacente a um conteúdo manifesto. ele denomina de ‘alienação do homem na
Toda essa discussão aponta para questões linguagem’, pois a linguagem embora permita
que buscam revelar o indivíduo, seus desejos que o desejo se realize, dá um nó nesse lugar
e expectativas. O que significa ser um sujeito? de modo que podemos desejar e não desejar a
Como se tornar um sujeito (cujo fracasso leva mesma coisa, e nunca nos satisfazemos.
á psicose)? Como promover uma ‘precipitação É, pois, na e a partir da linguagem que
da subjetividade’? podemos revelar/flagrar esses discursos:
Pela teoria lacaniana, a subjetividade discurso do eu / discurso do outro; quando o
emerge das relações consciente-inconsciente primeiro é consciente, intencional, alienado
e das relações Eu-Outro. O inconsciente é o pela linguagem e o segundo é inconsciente,
discurso do outro; o Outro como linguagem; involuntário, se vale da equivalência literal
e também: o Outro como demanda, como (por isso a ênfase no significante).
desejo (objeto a), como gozo. O eu é o outro Lacan refuta qualquer teoria linguística
imaginário (eu ideal) e o Outro como desejo estritamente referencial. Para ele, nenhuma
(o ideal do eu). palavra tem qualquer valor fixo (exceto em
Para Lacan, o objeto do desejo (“objeto contextos específicos), o que vale é a cadeia
a”) é a causa que perturba o funcionamento de palavras. Enquanto o pensamento se
das estruturas e que conduz a enigmas. baseia no domínio de sentido, os processos
Entendendo o objeto como causa do desejo e inconscientes não. A análise implica em um
não como aquilo capaz de satisfazer o desejo. processo significativo de decifração que
E a psicanálise, como a entende Lacan, não é resulta em verdade, não em sentido.
um discurso ou fundamento científico; mas O autor propõe três esferas:
algo que permitiria analisar a própria estrutura Real: seria, se fosse possível, um tempo
e funcionamento de outras “disciplinas”, pré-simbólico, pré-linguístico; caracteriza-
propiciando uma visão sobre suas molas se então como um “tecido inteiro,
mestras e pontos cegos. indiferenciado”, sem brechas. Aquilo que
A base da psicanálise lacaniana dá- não foi ainda simbolizado.
se a partir da linguagem (enquanto sistema Ordem simbólica: lugar de onde parte
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significante). O discurso não possui uma só o pensamento; é aquilo que busca a “divisão
dimensão; são vários os discursos presentes do real em zonas separadas, características
ao mesmo tempo. Como esclarece Bruce Fink distintas e estruturas contrastantes”, e ao
no livro O sujeito lacaniano, o Eu acha que fazê-lo, “ao neutralizar o real, o simbólico
comanda a realidade; o Eu “acredita que sabe cria a ‘realidade’ ” (FIN K, 1998: 44).
o que pensa e sente, e acredita que sabe por Realidade: aquilo que é nomeado
que faz o que faz” (1998: 20). pela linguagem e, então, sujeito ao
Por que a ênfase nos lapsos? Por pensamento (simbólico).
que atribuir importância a esse(s) outro(s)
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discurso(s) – o Outro como discurso - que O sujeito lacaniano (um significante


irrompem e interrompem o discurso do eu? de um sujeito) pode ser encontrado a partir
Trata-se de procurar um método dos enunciados, ou seja, do que é dito. Sua
de elucidação da lógica que governa estruturação, a estruturação da identidade,
essas interrupções, e a partir daí (de uma precisa da interdição. Enquanto sujeito
aproximação do seu entendimento) afetar o desejante, nossa pulsão é na direção do gozo
Outro discurso e, então, provocar a mudança. pleno, da satisfação plena dos desejos (o
O Outro é um intruso que transforma nossos que é inalcançável, pois levaria à “morte
do sujeito”). É na/da interdição (que Lacan da dominação sobre a natureza (LÖWY,
94 coloca na “figura do pai”, do “pai” simbólico) 1990: 192).
que conseguimos nos realizar como sujeito.
Sujeito barrado (ou dividido, interditado). A crítica de Benjamin sobre a
modernidade apoia-se, também, nas análises
“A divisão é, em certo sentido, a con- de Marx em O Capital, pelas quais o mal não
dição da possibilidade da existência de está no desenvolvimento técnico em si, mas
um sujeito e o deslocamento intermi- no uso capitalista que dele advém. Ao invés
tente parece ser sua realização” (FINK, da máquina possibilitar tempo livre para que
1998: 70).
o homem (o trabalhador) dedique-se, também,
a outras atividades (artísticas, científicas,...),
E é na alienação –a criança assujeitada ao
ela o leva a ser explorado ainda mais. Para
Outro- que o sujeito (ainda em criança) insere-
operar a máquina, o homem tem que “adaptar
se na linguagem, permitindo que o significante
seu movimento ao movimento contínuo e
a substitua. Essa substituição (que na criança
uniforme do autômato”. Poderíamos dizer
se dá quando da substituição do desejo da mãe
que não apenas os movimentos, mas também
por um nome (via linguagem), caracteriza o
as ideias e a própria criatividade passou, cada
que Lacan denomina Nome-do-Pai_ (o não
vez mais, a apresentar essa característica de
do Pai; a proibição; o falo; o significante do
automação.
desejo do Outro, desejo da mãe).
Remetamo-nos a Le Corbusier e sua
noção da casa como uma “máquina de morar”
“O resultado dessa substituição ou me-
e chegaremos a essa mesma automação. Creio,
táfora é o advento do sujeito como tal,
o sujeito como não mais apenas uma não restam dúvidas de que tal ideia corrobora
potencialidade, um mero marcador de o anonimato da vida urbana moderna. E além.
lugar no simbólico, esperando ser pre- Vejamos a citação de Lacan, que relaciona
enchido, mas um sujeito desejante” o inconsciente a uma “máquina de pensar”,
(FINK, 1998: 81). onde “a máquina rege o próprio regente”:

Por fim, e reside aí a importância da É numa memória, [...] nossas modernas


Fantasia, do Imaginário, flagrar o inconsciente máquinas para pensar [...], que jaz esta
é penetrar nessa ilusão de totalidade; “ao cadeia que insiste em se reproduzir na
apegar-se ao objeto a, o sujeito é capaz de transferência, e que é a de um desejo
morto.
ignorar sua divisão”, esclarece Bruce Fink
É a verdade do que esse desejo foi em
(1998: 83).
sua história, que o sujeito grita pelo seu
Meu propósito é a utilização das sintoma [...] (LACAN, 1978: 249).
reflexões tecidas anteriormente como
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estratégia metodológica para tentar captar, na Resta-nos tentar entender (aclarar) o que,
fantasia que alimenta a modernidade, a falácia ou quem, manipula, por detrás do autômato, os
ideológica. efeitos (produtos) das máquinas.
É necessário, como evidencia Walter
Benjamin, “escovar a história a contrapelo”, Voltando a Löwy, “a perda da experi-
significando com isso a recusa da ilusão/ ência está, assim, para Benjamin, es-
fantasia de progresso, ou seja, não nadar no treitamente ligada à transformação em
sentido da corrente, que, neste caso, seria a autômatos: os gestos repetitivos, vazios
de sentido [...]” (1990: 194), caracterís-
edição nº 12, abril/2010

crença no desenvolvimento técnico ilimitado.


tica do “mundo (capitalista) moderno.
Dominado pela mercadoria, este é o
Evidentemente, Benjamin não nega que
universo por excelência da repetição,
os conhecimentos e as atitudes huma-
do ‘sempre-o-mesmo’, disfarçado em
nas progrediram [...], o que ele recusa
novidade [...]” (LÖWY, 1990: 198).
[...] é o mito [...] de um progresso da
própria humanidade que resulta neces-
sariamente das descobertas técnicas, do
desenvolvimento das forças produtivas,
Para Benjamin, em 1940, “a
ideia de um progresso da humanidade _________ . O Seminário. Rio de Janeiro : 95
na história é inseparável da ideia de sua Jorge Zahar Ed., 1985. Livro 3: As psicoses.
marcha no interior de um tempo vazio LÖWY, Michel. Romantismo e messianismo :
e homogêneo. A crítica da ideia do pro-
ensaios sobre Lukács e Benjamin. São Paulo :
gresso tem como pressuposto a crítica
Perspectiva, 1990.
da ideia dessa marcha” (BENJAMIN,
1987, V. 1: 222-232).
RODRIGUES, Luiz Augusto F. O sentido
Por isso é preciso nadar contra a da falta no discurso. In: XXX CONGRESSO
correnteza, é preciso “escovar a história BRASILEIRO DE LÍNGUA E LITERATURA,
a contrapelo”, e, creio, a maneira mais 1998, Rio de Janeiro. Paper.
eficaz é desmistificar a fantasia ideológica
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Informações bibliográficas:
Conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:
Rodrigues, Luiz Augusto F. Do Pensamento às Palavras - Instrumento metodológico para a análise dos discursos Cadernos UniFOA. Volta Redonda, ano V, n. 12, abril 2010.
Disponível em: <http://www.unifoa.edu.br/cadernos/edicao/12/87.pdf>

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