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Do Pensamento às Palavras
Instrumento metodológico para a análise dos discursos
Original
Luiz Augusto F. Rodrigues 1 Paper
Palavras-chave: Resumo
Ideologia Fundamentos teóricos de proposta metodológica de análise do discurso que toma por
base contribuições da psicanálise lacaniana. Discurso, representação e ideologia.
Análise do discurso
Imaginário
[lacaniano]
“Of the thought to the words” is founded in theoretical beddings of proposal Applied Linguistics
methods of analysis of the speech that takes for base contributions of the lacanian
psychoanalysis. Speech, representation and ideology. The modernist
tradition
Este ensaio faz parte das reflexões não perde sua referência unitária (ZIZEK,
contidas no livro Universidade e a fantasia 1991). Por mais que se privilegie o plano da
moderna: a falácia de um modelo espacial percepção sensível (o campo da experiência
único publicado pela Editora da Universidade visual e imagética), os meios de comunicação
Federal Fluminense em 2001. São reflexões de massa têm forte apelo significativo a partir
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oriundas de minha tese de doutorado das construções discursivas.
em História, defendida nessa mesma O caminho aberto por Marx, e seguido por
Universidade. Graduado em Arquitetura outros teóricos, vê a ideologia como um fator
e Urbanismo, minhas preocupações se de dominação. Gramsci amplia os horizontes,
direcionam a diferentes discursos, em tratando a ideologia como componente da
especial os discursos sobre a cidade. realidade e, como tal, abarcando todas as
Pensar sobre o indivíduo em seu classes. Em Althusser vamos encontrar os
contexto cultural é inseri-lo num campo de dois caminhos: enquanto fator de dominação
edição nº 12, abril/2010
1
Professor do Departamento de Arte da Universidade Federal Fluminense
Coordenador do LABAC-UFF / Laboratório de Ações Culturais
UFF – Instituto de Artes e Comunicação Social
inconsciente foi tratado como contradição reflexo das hesitações subjetivo-psicológicas,
88 ou ambivalência. Os estudos lacanianos, mas das relações sociais estáveis dos
aprofundados por Slavoj Zizek, na direção de falantes” (BAKHTIN, 1986: 147), ou seja,
compreender como se estrutura a ideologia, Bakhtin parece incorporar apenas as emoções
vão contribuir diretamente para a correlação conscientes, deixando de fora as emoções que
entre ideologia e inconsciente, tendo na não afloram à consciência do falante, mas que
experiência linguística um eficaz elemento podem também ser percebidas por outrem em
de conhecimento (entendimento) de ambos. sua fala. “Assim, nas formas de transmissão do
Parece-me assim, ser impossível discurso, a própria língua reage à personalidade
retirar da realidade a carga ideológica que a como suporte da palavra” (1986: 188); só que
compõe. Como proceder, então, à análise de além de reagir, ela também pode deixar escapar
determinada realidade? Como interpretar suas coisas que são inconscientes. Os atos falhos,
relações? Podemos aproximarmo-nos de uma os lapsos,..., que Freud já nos apontava.
realidade pura? Ela existe? Jacques Lacan nos dá subsídios para
Talvez o caminho não deva ser flagrar a ideologia através da linguagem,
propriamente esse. O desafio encontra-se em pois desloca a ênfase dada ao sentido. Para
identificar a maior e mais complexa gama ele, o importante não é o significado, mas o
de representações, ou antes, as variações de significante (a parte material do signo); e que é
representações de uma mesma realidade, na relação entre a metáfora e a metonímia que
identificando-se os elementos dominantes e os residem suas essências:
dominados, e neles - num sentido hegeliano - Com isso, o autor quer dizer que o
suas contradições e suas oposições. desejo inconsciente, que supostamente
Na concepção marxista, argumenta Zizek, constituiria o núcleo mais oculto, escapa
atribui-se à ideologia uma “certa ingenuidade justamente na tentativa de disfarçar esse
constitutiva: a ideologia desconhece suas núcleo. Escapa, torna-se exterior, só que
condições, suas pressuposições efetivas, e seu “disfarçado”, e aí entram os mecanismos de
próprio conceito implica uma distância entre o deslocamento e condensação presentes nas
que efetivamente se faz e a ‘falsa consciência’ metáforas e metonímias.
que se tem disso [eles não sabem o que fazem Por isso, devemos ir do pensamento às
mas o fazem assim mesmo]” (1992: 59). palavras (que é uma expressão do próprio
Essa concepção é ampliada por Lacan): fugir da tentativa de entender o que está
autores da Escola de Frankfurt na análise oculto no pensamento, e sim aquilo que pode
crítico-ideológica, que tem como finalidade ser aclarado a partir das palavras. Entender o
“detectar, por trás da universalidade aparente, processo pelo qual o sentido oculto disfarçou-
a particularidade de um interesse que destaca se através de determinada(s) forma(s).
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encontra mais cristalizado, quanto o que de que pode ou não ser dito.
novo anuncia-se. A teoria lacaniana aponta-nos que o
O autor dá um passo à frente, em relação desejo (de poder, de saber, ou qualquer outro)
às correntes linguísticas, ao incorporar à apresenta-se de forma irrestrita. A estrutura
linguagem fatores da realidade concreta, das de formação do indivíduo, e inerente a ele,
representações, e do psiquismo individual. assenta-se, no limite, no desejo de apoderar-se
Incorpora ação, pensamento e emoção, porém do todo. Como o todo é inalcansável, resta-nos
ele próprio afirma que “a língua não é o sempre o sentimento de falta. Esse sentido de
falta que estrutura o imaginário (o desejo, ou o onde a e b são comuns a todos os indivíduos,
núcleo do desejo) disfarça-se recorrentemente, c, d, e... são próprios de determinados grupos. 89
escapando independentemente da censura
consciente. Escapa justamente na tentativa de As linguagens estruturam nossa
realização de um desejo maior (e anterior); percepção e posicionamento no mundo.
escapa-nos como mecanismo de superação da Então, através dos discursos podem-se flagrar
angústia de tudo querer. indícios de como a realidade está sendo
O que procurarei metodologicamente social e particularmente construída. Sejam os
fazer, e consubstanciado pelas reflexões discursos verbais, sejam os não verbais.
anteriores, é analisar as produções discursivas Meu propósito final é o estudo da cidade
a partir de três níveis: o claramente dito (cuja e das práticas culturais.
veracidade é facilmente confrontável com a A cidade pesquisada através: do discurso
simples constatação da realidade); o não dito jornalístico (e as construções identitárias que
(o ideológico não evidenciado no discurso, ele produz); do discurso pessoal (e possíveis
mas resgatável –com o respaldo da História- constatações da incorporação de um discurso
enquanto intenção velada); e o interdito técnico “competente”); do discurso não
(ou seja, as fantasias “proibidas” de aflorar verbal (através das imagens veiculadas e
conscientemente, mas que escapam através dos através dos usos e formas de apropriação
mecanismos da própria língua –as metáforas e dos espaços); da identificação de alterações
metonímias) (RODRIGUES, 1998s). no uso (e/ou consumo) da cidade em face
E busco sempre como pano de fundo a das novas tecnologias de informação e
constituição da Identidade. meios de comunicação que operam sobre
A identidade cria amarras no indivíduo as expectativas e percepções dos usuários
(no sujeito) as quais permitem que ele persiga da cidade; do reconhecimento dos sentidos
caminhos plurais mas com direção clara, de de pertencimento através dos quais uma
modo que não fique “voando sem rumo”. sociedade pode reconhecer-se.
Sem identidade, o indivíduo, muitas vezes, Com base nos estudos do alemão Peter
fica sem clareza de seus desejos e aspirações, Sloterdijk, Zizek alerta-nos de que nem mesmo
sendo, desse modo, sujeito a que guiem suas essa análise crítica responde devidamente a
motivações externamente. esta questão, pois a ideologia funciona cada
vez mais envolta por uma “razão cínica”: eles
sabem muito bem o que fazem, e o fazem
assim mesmo; ou seja, estamos perfeitamente
conscientes da falsidade que há por trás da
a b
c... universalidade ideológica, mesmo assim não
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renunciamos a essa universalidade.
a = a estrutura do sujeito lacaniano A partir desses enfoques, o autor destaca
b = os arquétipos jungianos o papel da fantasia, pois “o ‘cínico’, que
c = as características singularizadas (padrões
nacionais, diferenças culturais, diferenças de ‘não acredita nisso’, que sabe muito bem
gênero, ... da inutilidade das proposições ideológicas,
desconhece, no entanto, a fantasia que
estrutura a própria ‘realidade’ social” (ZIZEK,
O núcleo duro da identidade não
1992: 61).
pressupõe subtrair as singularidades em favor
Como proceder a análise da ideologia
dos universais. Seria buscar as diferenças no
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onde se marca que é o desejo, desejo de outra manecendo presente pela sua conexão
coisa que falta sempre. Porque o que implica (metonímica) com o resto da cadeia
estas duas fórmulas é que não chega, para fazer (LACAN, 1978: 237).
(1996: 297). Isto é, o essencial não é o que está b) do ponto de vista intersubjetivo: uma
latente, e sim os mecanismos de deslocamento relação chamada dual baseada em -e captada
e condensação que configuram as formas (das por- a imagem de um semelhante (atração
palavras, dos sonhos, das mercadorias, ou seja, erótica, tensão agressiva). Para Lacan existe
dos signos em si). semelhante -outro que seja ego- apenas porque
o ego é originalmente outro;
A estrutura é sempre tríplice; há sempre
três elementos em ação: o texto mani- [...]
festo do sonho, o conteúdo latente do c) quanto às significações: um tipo de
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estratégia metodológica para tentar captar, na Resta-nos tentar entender (aclarar) o que,
fantasia que alimenta a modernidade, a falácia ou quem, manipula, por detrás do autômato, os
ideológica. efeitos (produtos) das máquinas.
É necessário, como evidencia Walter
Benjamin, “escovar a história a contrapelo”, Voltando a Löwy, “a perda da experi-
significando com isso a recusa da ilusão/ ência está, assim, para Benjamin, es-
fantasia de progresso, ou seja, não nadar no treitamente ligada à transformação em
sentido da corrente, que, neste caso, seria a autômatos: os gestos repetitivos, vazios
de sentido [...]” (1990: 194), caracterís-
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Informações bibliográficas:
Conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:
Rodrigues, Luiz Augusto F. Do Pensamento às Palavras - Instrumento metodológico para a análise dos discursos Cadernos UniFOA. Volta Redonda, ano V, n. 12, abril 2010.
Disponível em: <http://www.unifoa.edu.br/cadernos/edicao/12/87.pdf>