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Policiais de folga podem entrar armados em estabelecimentos particulares


vigiados por segurança privada?

Marcelo de Lima Lessa

Publicado em 04/2019. Elaborado em 04/2019.

Tema gerador de grande celeuma nos meios acadêmicos, o ingresso de policiais de


folga armados em estabelecimentos particulares é visto com reservas por alguns
operadores do Direito. Isso porque a expressão “folga”, por vezes, é erroneamente
interpretada como hábil a retirar a condição de policial do agente, de modo a ceifá-lo,
ainda que temporariamente, das suas prerrogativas legais.

Conquanto não seja pacífica, a questão deve ser encarada de modo a preservar o
espírito da Lei, a qual, de maneira clara e objetiva, assegura o porte funcional de arma
de fogo ao policial em território nacional.

Façamos então uma análise ponto a ponto, a fim de entendermos que essa
prerrogativa é de fato legítima e, burlá-la de forma concisa, poderá, salvo
entendimentos contrários, gerar futuras responsabilizações aos recalcitrantes no
campo penal.

Diz o art. 6º, inciso II, da Lei Federal n° 10.826, de 22 de dezembro de 2003, que é
proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos
previstos em legislação própria e para os integrantes de órgãos referidos nos incisos
do “caput” do art. 144 da Constituição Federal, dentre os quais se enquadram todos os
policiais civis (estaduais e federais) e militares brasileiros. O § 1o do mesmo artigo
estatui que as pessoas previstas nos incisos I, II (policiais), III, V e VI do “caput” do
artigo terão direito de portar arma de fogo de propriedade particular ou fornecida
pela respectiva corporação ou instituição, mesmo fora de serviço, nos termos do
regulamento da Lei, com validade em âmbito nacional para aquelas constantes dos
incisos I, II (policiais), V e VI. Ou seja, é uma regra de abrangência nacional e, através
dela, reside o direito do policial, civil ou militar, portar arma de fogo no Brasil.

Disciplinando essa norma geral, o Decreto Federal nº 5.123, de 1º de julho de 2004,


prevê, em seu art. 34, que os órgãos, instituições e corporações mencionados nos
incisos I, II, III, V, VI, VII e X do caput do art. 6º da Lei nº 10.826, de 2003 (onde
estão todas as Policias brasileiras), estabelecerão, em normativos internos, os
procedimentos relativos às condições para a utilização das armas de fogo de sua
propriedade, ainda que fora do serviço. Ou seja, o porte de arma “fora do serviço” é
expressamente garantido pela Lei, recaindo aos Estados, assim, apenas o múnus de
disciplinar as condições em que ele será exercido.

Mais adiante, o § 2° do mesmo artigo estabelece que as instituições, órgãos e


corporações, nos procedimentos descritos no “caput”, disciplinarão as normas gerais
de uso de arma de fogo de sua propriedade, fora do serviço, quando se tratar de locais
onde haja aglomeração de pessoas, em virtude de evento de qualquer natureza, tais
como no interior de igrejas, escolas, estádios desportivos, clubes, públicos e privados.
Disso concluímos que a Lei, de maneira sábia, entregou aos Estados o dever de
disciplinar como o porte de arma será exercido em recintos públicos e privados, ainda
que o agente se encontre fora de serviço.

E é essa polêmica expressão, “fora de serviço”, que exige cautela na interpretação. O


policial, dada a sua peculiar condição profissional, jamais estará, literalmente, fora de
serviço. Ele poderá estar em horário de folga e gozando férias ou licença, mas sem
com isso perder a condição de policial e as prerrogativas do seu cargo, afinal, de
acordo com o art. 301 do Decreto-Lei n° 3.689, de 3 de outubro de 1941, as
autoridades policiais e seus agentes deverão, isto é, estão obrigadas a prender quem
quer que seja encontrado em flagrante delito, no momento que for. Note-se que essa
regra nada diz sobre como agir em horário de folga, posto não ser dada ao policial,
mesmo fora de serviço, a prerrogativa de omitir-se diante da prática de uma infração
penal sob essa escusa.

E tanto isso é verdade que, no âmbito da Polícia Civil do Estado de São Paulo, o art.
44 da Lei Complementar Nº 207, de 5 de janeiro de 1979, estabelece que os cargos
policiais civis serão exercidos necessariamente em regime especial de trabalho
policial, o qual se caracteriza pelo cumprimento de horário irregular, sujeito a
plantões noturnos e chamados a qualquer hora. Ora, se um policial, no caso o civil,
está sujeito a ser acionado a qualquer hora do dia ou da noite, é patente que ele,
mesmo estando de folga, deverá estar em prontas condições de dar a resposta
pretendida, fazendo uso de todos os instrumentos que a lei o autoriza o usar, como,
no caso, a sua arma de fogo.

De forma mais específica e ainda tomando como exemplo a centenária Polícia Civil
paulista, a nossa administração superior, atendendo aos comandos do Decreto
Federal nº 5.123, de 1º de julho de 2004, baixou a Portaria DGP-40, de 23 de outubro
de 2014, a qual, em seu art. 8º, diz que o policial civil, em razão das suas funções
institucionais, é autorizado a portar arma de fogo de propriedade particular, ou
fornecida pela Polícia Civil, em serviço ou fora deste, em local público ou privado,
mesmo havendo aglomeração de pessoas, em evento de qualquer natureza, tais como
no interior de igrejas, escolas públicas, estádios desportivos e clubes, em todo
território nacional. Isso espanca, assim, quaisquer dúvidas sobre a legitimidade do
porte de arma quando o agente esteja transitoriamente fora de serviço e necessite
ingressar armado em locais que estejam sob vigilância privada. Nesses casos o policial
civil deverá portar a sua arma de fogo de forma discreta, especialmente nos locais
onde haja aglomeração de pessoas, evitando constrangimentos a terceiros, salvo
quando em operação policial, trajando vestimenta e/ou distintivo que o identifique. E
a comunicação do porte de arma ao responsável pela segurança do local, sempre que
solicitado, deverá ser feita de forma discreta, mediante apresentação da carteira
funcional.

Não é demais lembrarmos que, por força da Portaria DGP-28, de 19 de outubro de


1994, as autoridades policiais e seus agentes devem portar permanentemente sua
cédula de identificação funcional e respectivo distintivo e, em razão de estar
permanentemente em serviço, o policial civil deve sempre portar arma e algemas,
sendo que o mesmo, ainda que fora do horário normal de trabalho, é obrigado a
intervir em qualquer ocorrência de polícia judiciária de que tenha conhecimento,
adotando as medidas que o caso exigir.

Entretanto, alguns poderão alegar que se tratam de normas internas da Polícia, sem
abrangência ao público externo. Entendemos o contrário. Essas regras
administrativas, ao contrário do que se pode parecer, foram editadas em obediência a
um mandamento vindo da própria Lei, a qual estabelece que quem disciplina o porte
de arma fora do horário de serviço são as próprias administrações das Polícias. E
estas, ao editarem regramentos administrativos, estão apenas disciplinando o que a
Lei já anteriormente autoriza. Diante disso, eventual burla a esses mandamentos
pode configurar desrespeito ao que determina a Lei Federal n° 10.826, de 22 de
dezembro de 2003 e o Decreto Federal nº 5.123, de 1º de julho de 2004 e, desacatá-
los, poderá, em tese, configurar crime de desobediência, o qual se constitui não por
ato de mera desobediência à Lei, mas por ato de menoscabo à ordem de um
funcionário público em atuação da Lei.

A jurisprudência, em casos similares, já entendeu que “o art. 330 do CP não inclui


expressamente no seu conteúdo a transgressão a editais ou portarias, mas não
impede que se reconheça em tais casos o crime, desde que se prove a inequívoca
ciência da norma pelo agente, que obra com dolo genérico, isto é, livre vontade de
desobedecer à ordem legal, sabendo-a expedida ou executada por funcionário
competente” (TACRIM-SP – AC – Rel. Edmond Acar – RT 427/424). E mais, “sendo
estreme de dúvidas a legalidade da portaria baixada pela Polícia, comete o crime
quem a desobedece, sem embargo de ter da peça expresso conhecimento” (TACRIM-
SP – AC – Rel. Edmond Acar – RT 427/426).

Diante disso, a fim de envergar legitimidade na sua conduta, o policial que se ver
impedido de ingressar armado em determinado local sob vigilância privada, deverá,
cordialmente, exibir sua cédula de identidade funcional ao responsável e, mais ainda,
alertá-lo sobre a existência de normas específicas, tantos as legais como as
administrativas, as quais em conjunto legitimam a sua intenção, advertindo-o das
possíveis responsabilidades em caso de não acatamento. Em havendo insistência na
negativa, o policial, sempre de forma serena, deverá providenciar, pelos meios
disponíveis, apoio externo e proceder como de direito, isto é, encaminhar o
recalcitrante ao Distrito Policial da área, preso se necessário, a fim de que os fatos
sejam analisados pelo Delegado de Polícia que, ao final, adotará as providências de
polícia judiciária pertinentes contra o faltoso.

É de bom tom esclarecermos que, no âmbito da Polícia Civil do Estado de São Paulo,
o policial civil, nos termos da Portaria DGP-40, de 23 de outubro de 2014, não está
obrigado a entregar sua arma ou respectiva munição como condição para ingresso em
recinto público ou privado, salvo nas hipóteses de submissão à prisão; durante
audiência judicial, a critério da autoridade judiciária; por determinação, ainda que
verbal, de Delegado de Polícia superior hierárquico e por determinação da autoridade
corregedora, sempre que tal medida se afigurar necessária. Fora isso, entendemos
que o policial civil não deverá entregar sua arma de fogo a quem quer que seja, e nem
tão pouco deixa-la em cofres particulares, sob pena de responder por eventual mau
uso ou inadequada destinação dela.

Ainda no que tange a inspeção preventiva privada em estabelecimentos particulares,


já tivemos a oportunidade de lecionar que: “interessante é a questão da inspeção
preventiva efetuada por agente particular em casas de show ou estabelecimentos
congêneres. Nesses locais a vistoria física deve se basear na concordância do
consumidor em submeter-se a ela como condição de entrada. Embora a lei não
discipline taxativamente a questão, é certo que os prestadores de serviços têm o dever
de fornecer a segurança adequada aos consumidores e, em razão disso, é razoável a
adoção de medidas que visem garanti-la, dentre as quais, as inspeções, preliminares e
indiretas, em locais onde exista elevada concentração de pessoas. Embora o cidadão
não esteja obrigado a ser submetido a ela, tem se entendido que essa relação funciona
como uma espécie de “contrato”, pelo que deve prevalecer o acordo mútuo e sensato
de vontade. No caso dos profissionais que têm porte funcional de arma de fogo, essa
regra particular não se aplica, pois a lei diz que essas próprias instituições
estabelecerão, em normativos internos, os procedimentos relativos as condições para
a utilização das armas de fogo de sua propriedade, ainda que fora do serviço e em
local onde haja aglomeração de pessoas. Ou seja, nesses casos não há a possibilidade
de desarme de um policial, salvo as hipóteses administrativamente previstas pelas
suas corporações”[1].

Ademais, ressalte-se que, no Brasil, a Lei Federal n° 7.102, de 20 de junho de 1983


(alterada pela Lei Federal n° 8.863, de 28 de março de 1994), estabelece que o
profissional habilitado para exercer as funções de segurança privada é o vigilante, que
não se confunde com a figura do porteiro, o qual, desarmado, executa apenas o
controle de acesso simples, de guarda e zelo, sem contato físico com os usuários do
serviço. Isso deve ser levado em conta quando da análise geral da ocorrência, a qual
também poderá revelar eventual contravenção de exercício irregular de profissão por
pessoas desabilitadas na área específica de segurança privada do estabelecimento,
cujo exercício requer o preenchimento de requisitos previstos em Lei e em atos
normativos da Polícia Federal.

No que tange ao embarque armado em aeronaves civis, o tema é disciplinado pela


Resolução nº 461, de 25 de janeiro de 2018, da Diretoria da Agência Nacional de
Aviação Civil, a qual, por força do art. 8º da Lei Federal n° 11.182, de 27 de setembro
de 2005, tem a responsabilidade de expedir regras sobre segurança em área
aeroportuária e a bordo de aeronaves civis, porte e transporte de cargas perigosas,
inclusive o porte ou transporte de armamento, explosivos, material bélico ou de
quaisquer outros produtos, substâncias ou objetos que possam pôr em risco os
tripulantes ou passageiros, ou a própria aeronave.

Dito isso cremos que o tema, se visto de maneira sensata e formal, não carece de
maiores dúvidas quanto a sua interpretação, cabendo aos coadjuvantes do impasse
apelarem para a cordialidade e o bom senso, afinal as regras existem e não só podem,
mas devem ser aplicadas em caso de desrespeito. O porte de arma do policial é
inerente ao seu cargo e, ceifá-lo desse direito é enfraquecer a linha de proteção da
sociedade, afinal a arma de fogo é usada, acima de tudo, para protege-la. Embora
focado no policial civil estadual, é certo que as demais instituições policiais possuem
regras próprias, cuja observância deve ser feita na mesma toada pelos administrados,
os quais, no policial, devem ver um amigo e aliado, e jamais um oponente.
NOTA

[1] LESSA, Marcelo de Lima. Busca pessoal processual, busca pessoal preventiva e
fiscalização policial: legalidade e diferenças. Revista Jus Navigandi, ISSN
1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5482, 5 jul. 2018. Disponível em: <https://jus.com.br
/artigos/61753>. Acesso em: 1 abr. 2019.

Autor
Marcelo de Lima Lessa

Delegado de Polícia em São Paulo desde 1996, professor de


Gerenciamento de Crises e Conduta Policial da Academia de Polícia “Dr.
Coriolano Nogueira Cobra”. Graduado em "Gerenciamento de Crises e
Negociação de Reféns" pelo FBI - Federal Bureau of Investigation e em
"Controle e Resolução de Conflitos e Situações de Crise com Reféns" pelo
Ministério da Justiça. Atuou no Grupo de Operações Especiais - GOE, no Grupo
Especial de Reação - GER e no Grupo Armado de Repressão a Roubos -
GARRA, todos da Polícia Civil do Estado de São Paulo.

Informações sobre o texto


Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LESSA, Marcelo de Lima. Policiais de folga podem entrar armados em


estabelecimentos particulares vigiados por segurança privada? . Revista Jus
Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5824, 12 jun. 2019. Disponível em:
https://jus.com.br/artigos/73045. Acesso em: 14 dez. 2019.

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