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“Este pequeno livro proporciona uma janela aberta para a fonte principal da
autêntica vida de corpo. Pesquise em suas páginas e encontre o Deus que está
além daquilo que a maioria de nós tem imaginado, o Deus que ressoa na voz
M ILT R ODRIGUEz
coletiva das genuínas igrejas”.

M ILT R ODRIGUEz
Frank Viola

VIDA
Autor de: Cristianismo Pagão (Abba Press);
Reimaginando a Igreja (Editora Palavra);
A História Não-Contada da Igreja do Novo Testamento e A
Reconsiderando a Vontade de Deus (Editora Restauração).

“Meu coração se alegra por ter aproveitado do fluxo permanente dos livros
publicados nos dez anos passados que abriram novas perspectivas acerca da
COMUNITÁRIA

DEUS
vida no Corpo de Cristo. A Vida Comunitária de Deus de Milt Rodriguez é
outra adição bem-vinda a este rio de vida. Fui profundamente abençoado,
renovado e desafiado por este livro. O autor lança o refletor na realidade e
maravilha de que “Deus” é realmente a vida comunitária de três pessoas – um DE
fato praticamente não tocado na teologia tradicional. Milt mostra de vários
ângulos como a vida comunitária de Deus é o fundamento da nossa vida de
ekklesia (igreja) orgânica juntos em Cristo”.

Jon Zens

A Vida Comunitária de Deus


Editor da Searching Together.
Autor de: A Church Building Every 1/2 Mile;
What Makes American Christianity Tick?

O MODELO PERFEITO DE IGREJA

Visto que a nascente para todo padrão e vida de igreja é a vida comunitária do
Pai, Filho, e Espírito Santo. Isso é tanto teológico como prático. A vida corpo-
rativa que Deus vive (a vida eterna) é a mesma vida que Ele nos dá. Essa é uma
vida de amor uns pelos outros e Jesus disse que ela vem do céu (ver João 17).
Essa vida comunitária é tanto o motor como o combustível para o nosso viver
juntos como crentes, a espinha dorsal da vida orgânica da igreja.

Milt Rodriguez tem vivido e estabelecido expressões orgânicas da igreja


desde 1990. Ele é também autor de vários livros inclusive A Borboleta em Você
e A Túnica de Várias Cores (Editora Restauração). Atualmente vive com sua
esposa Mary na Geórgia, Estados Unidos.

Editora

RESTAURAÇÃO Atos 3:21


Milt Rodriguez

Vendo a Divindade como o


Modelo para Todos os Relacionamentos
THE COMMUNITY LIFE OF GOD
Copyright ©2009 Milt Rodriguez
Publicado em Inglês por The Rebuilders
www.therebuilders.org

A VIDA COMUNITÁRIA DE DEUS


Copyright ©2011 Editora Restauração
www.editorarestauracao.com.br

Tradução:
João Alfredo e Delcio Meireles

Revisão:
Paulo César de Oliveira

Diagramação e capa:
Rita Motta – Ed. Tribo da Ilha

Ilustração da capa:
Vagner Coelho

Todos os direitos reservados

____________
Exceto onde indicado, todas as citações bíblicas são da tradução de João
Ferreira de Almeida, Revisada e Atualizada.
Agradecimentos

Desejo demonstrar a minha sincera gratidão a Pamela


Holland e Mary Rodriguez por digitarem o manuscrito. Muita
gratidão também a Kevin Lyons, Amy Mooney e Jon Zens pelos
seus comentários e edições úteis sobre este trabalho.
Gostaria, acima de tudo, de agradecer às igrejas orgâni-
cas na Califórnia, no Colorado e na Flórida, que me ensinaram
como viver a vida comunitária de Deus.
Sumário

8 Introdução

15 Capítulo 1 - O Deus que É Comunitário

23 Capítulo 2 - O Homem Corporativo de Deus

31 Capítulo 3 - A Queda

41 Capítulo 4 - O Resultado do Individualismo

53 Capítulo 5 - A Essência da Personalidade

61 Capítulo 6 - A Vinda da Semente

69 Capítulo 7 - Vida dentro da Semente

77 Capítulo 8 - O Plantio da Semente

83 Capítulo 9 - O Segundo Adão

89 Capítulo 10 - A Unidade de Deus

97 Capítulo 11 - Diversidade na Unidade


107 Capítulo 12 - O Relacionamento Divino

117 Capítulo 13 - Posses Divinas

125 Capítulo 14 - Conjuntamente

133 Capítulo 15 - Liderança

143 Capítulo 16 - A Vida da Cruz

149 Capítulo 17 - A Vida Vem à Terra

159 Capítulo 18 - Pondo em Prática

167 Capítulo 19 - Conformados à Sua Imagem

175 Capítulo 20 - A Imagem É o Propósito

181 Capítulo 21 - A Imagem como Missão

185 Capítulo 22 - O Modelo Perfeito - Conclusão


Introdução

E Este livro é o resultado de muitos anos de busca por re-


velação diante do Senhor. Isso é algo que é tão agradável ao co-
ração de Deus que toco nele com a maior reverência e respeito.
Quando alguém toca em questões do coração de Deus, então
percebe que está em solo santo e deve lidar com elas do modo
mais delicado possível. Existe um grande anseio de dizer estas
coisas e também de escrevê-las. Este tema do “estilo de vida” de
Deus e a Sua imagem têm estado em meu coração durante anos,
mas isso não tem sido mera teoria. Uma experiência muito rica
tem acompanhado o entendimento.
Há muito para ser descoberto sobre este nosso Deus in-
finito! Estamos todos apenas começando a tocar a superfície da
Sua experiência. Há uma demolição e uma edificação que espero
realizar com este livro. Com “demolição” quero dizer que estou
tirando o propósito morto de algo que tem estado conosco desde
a queda. Na verdade, é o resultado real e direto da queda.
O nosso conceito básico de Deus precisa ser radicalmente
mudado. Se realmente quisermos conhecê-lO como Ele é e não
como a nossa mente O concebe, a nossa mente deve passar por
uma grande revolução. Deus não se ajustará ao molde da nossa
compreensão finita. O nosso Deus é muito maior do que isso.
O problema é que a nossa mente pensa n’Ele de uma ma-
neira estabelecida. Entramos em um trilho mental na forma que
10  a vida comunitária de deus

pensamos n’Ele e é muito difícil para a nossa mente “saltar do


trilho”. Limitamos Deus à nossa compreensão d’Ele. Precisamos
realmente ter uma renovação se realizando em nossa mente.
Minha esperança é que ao ler este livro você não só terá
uma melhor compreensão da correlação entre a vida no Deus
Trino e a vida na Igreja, mas também será pessoalmente atraído
para experimentar tal vida para você mesmo.

O que Deus Quer?

“Também disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem,


conforme a nossa semelhança; tenha ele domínio sobre os
peixes do mar, sobre as aves dos céus, sobre os animais
domésticos, sobre toda a terra e sobre todos os répteis que
rastejam pela terra” (Gn 1:26).

A melhor forma de descobrir o propósito eterno de Deus é


olhar bem no começo das Escrituras, antes que houvesse o pecado,
e bem no final delas, depois que o pecado foi removido. Estas por-
ções das Escrituras seriam Gênesis 1 e 2 e Apocalipse 21 e 22.
Estes quatro capítulos não têm nada a ver com o proble-
ma do pecado e são notavelmente semelhantes um ao outro. No
final de Apocalipse podemos ver que Deus finalmente alcança
o que estava buscando bem no princípio. Mas o que exatamen-
te? Sabemos de uma coisa com certeza: não envolve o pecado
porque esse é um propósito eterno que estava na mente de Deus
antes do pecado (Ef 3). Por isso, não podemos dizer que o pro-
pósito eterno de Deus seja a salvação da humanidade. O peca-
do veio mais tarde, depois que Deus já tinha o Seu propósito.
Sim, é verdade que Ele tinha que salvar o homem para cumprir
Seu propósito, mas este foi o meio visando um fim. A salvação
introdução  11

é apenas uma pequena parte da história. Deus tem um plano


muito maior em vista do que apenas a salvação.
Antes que algo mais existisse, Deus tinha um propósito
nas profundezas do Seu coração. Este é um propósito eterno
(Ef 3) que existia antes do pecado, antes do homem, antes da
criação. Na verdade, este propósito é, em primeiro lugar, toda a
motivação de Deus para a criação. Por que Ele criou o universo?
Ele tem um plano. Ele tem um propósito. Ele quer algo.
Se olharmos para o final do livro, podemos ver o que Ele
alcança. Ele obtém uma cidade, que é chamada de Nova Jeru-
salém (Ap 21:2), e ela desce do céu para a Terra. Esta cidade é o
cumprimento de todas as esperanças e sonhos de Deus. Ela é o
cumprimento do Seu propósito eterno. Mas o que exatamente é
esta cidade? O que ela representa? Podemos conhecer plenamen-
te as respostas para essas perguntas?
Sim, sim e mais sim! Deus definitivamente quer que nós
conheçamos e cumpramos o Seu propósito eterno. Ele quer que
conheçamos exatamente o que Ele quer! Ele não quer que apenas
conheçamos o Seu propósito eterno, mas também “encarnemos”
ou vivamos este propósito em nossa vida diária. Mas isso começa
com um conhecimento, com uma revelação do Seu propósito.

Deus Cria o Homem como um “Nós”

Em Gênesis 1:26 lemos: “Também disse Deus: Façamos o


homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; e tenha
domínio...”. Por que Deus usa tal linguagem quando cria o ho-
mem? Por que Ele usa pronomes plurais como “Nós” e “Nossa”?
Por que Ele chama o homem de “eles”?1 O nosso conhecimento


1
As versões em inglês traduzem a segunda parte do versículo assim: “que
eles dominem...”, ou seja, na forma plural e não singular como nas versões
em português.
12  a vida comunitária de deus

das respostas a estas perguntas é chave para a compreensão do


Seu propósito eterno.

O Ambiente para o Propósito

Por que Deus criou? Qual foi o fator motivacional na


criação? Penso que podemos seguramente dizer que Ele criou
para colocar o Seu plano em ação; para dar o primeiro passo em
direção ao cumprimento do Seu propósito. Então há o propósi-
to, mas há também o Seu plano para o cumprimento do propó-
sito. O propósito é o Seu alvo. O plano é o modo para alcançar
esse alvo. O apóstolo Paulo fala deste “plano” em sua carta aos
Efésios: “… desvendando-nos o mistério da sua vontade, segun-
do o seu beneplácito que propusera em Cristo, de fazer convergir
nele, na dispensação da plenitude dos tempos, todas as coisas,
tanto as do céu como as da terra…” (Ef 1:9-10).
Vemos que, pelo Seu beneplácito (consentimento) Ele
tem uma vontade ou propósito e também tem um plano (admi-
nistração) para levar a cabo este propósito. O plano é chamado
de administração ou economia. O propósito é “convergir todas
as coisas em Cristo”. Isso é porque “aprouve a Deus que, nele,
residisse toda a plenitude” (Cl 1:19). Por isso, é simples ver que
o alvo de Deus é ter “todas as coisas” centradas em Cristo. Mas
quais são essas “todas as coisas”? Todo o universo! A plenitude da
Divindade (Pai, Filho e Espírito), a plenitude da criação (visível e
invisível), a plenitude do tempo, a plenitude do reino, a plenitu-
de da eternidade passada e futura, a plenitude da Igreja. Aprouve
a Deus que a PLENITUDE habitasse n’Ele! Toda a plenitude!
Este é o alvo de Deus, mas agora precisamos perguntar: como
Ele irá alcançar Seu alvo? Qual é a Sua administração (econo-
mia)? Como essa economia será executada?
introdução  13

Se quisermos entender o propósito e a administração de


Deus, então teremos que responder a essas perguntas. Eu iniciei
esta introdução fazendo a pergunta “o que Deus quer?”, mas só
podemos saber a resposta conhecendo as respostas para estas
outras perguntas:

ŠŠ O que o Deus queria no princípio? (Gn 1 e 2)


ŠŠ O que o Deus alcança no final? (Ap 21 e 22)
ŠŠ O que a cidade em Apocalipse 21 representa?
ŠŠ Por que Deus criou?
ŠŠ Por que Ele disse “Nós” quando criou o homem?
ŠŠ Por que Deus nos criou à Sua imagem?
ŠŠ O que é esta imagem?
ŠŠ Como Deus executa Seu plano?

Você e eu ocuparemos o resto deste livro para tentar des-


cobrir as respostas para estas perguntas.
1 O Deus que É
Comunitário

N Nós temos uma perspectiva de Deus que é tendenciosa


e distorcida. Nossa mente O concebe de uma forma que Ele
nunca pretendeu. Na verdade, essa forma de perceber Deus é
resultado direto da queda. Em vez de vê-lO da forma como Ele
realmente é, nós O vemos da forma que somos em nosso estado
caído. Isso é um grande problema para nós.
Precisamos desesperadamente de um novo ponto de vis-
ta. Precisamos ver as coisas da perspectiva de Deus. Mas para
isso precisamos ter a nossa mente renovada. A velha forma de
pensar nunca conseguirá. Precisamos pensar com uma nova
mente e ver com novos olhos. Somente com esses instrumentos
seremos capazes de entender o que estava no coração de Deus
desde antes da eternidade. Somente desta forma seremos capazes
de entender o propósito de Deus.
A primeira coisa que precisaremos ver irá chocá-lo
completamente. E irá chocá-lo porque você provavelmente
nunca ousou pensar dessa forma antes. Em sua mente você
formou Deus na sua imagem e por isso sempre se relaciona
com Ele dessa mesma forma. Mas a primeira coisa que você
deve ver é que:
DEUS NÃO É UM INDIVÍDUO!
16  a vida comunitária de deus

Ele nunca foi e nunca será. Contudo, pensamos n’Ele


como um indivíduo, não é?
Somos cristãos “individuais” que tentam se relacionar
com um Deus “individual”. Isso se parece com a tentativa de
colocar um pino quadrado em um buraco circular. Ele simples-
mente não se ajusta! Deus não se parece conosco. Primeira-
mente precisamos ver quem é Deus.
Repito que Deus não é um indivíduo. Ele é uma comunhão
de três Pessoas: Pai, Filho e Espírito Santo. Ele não pensa como
um indivíduo e não atua como tal. Ele é uma comunidade de três
personalidades distintas que são um. Ele é TRI-UNO (três-um),
ou três em um. Há um só Deus, mas Ele é composto de três Pes-
soas distintas. Essas Pessoas são diferentes, porém não são indi-
víduos separados. Cada uma delas tem uma personalidade única,
mas não vivem ou funcionam como entidades separadas. Cada
uma dessas Pessoas é Deus, embora haja apenas um Deus, não
três. O Pai é Deus. O Filho é Deus. O Espírito é Deus. Contudo,
há um só Deus! Como pode ser isso? Por que é tão difícil enten-
dermos isso? Porque pensamos com a mente “individual”, e algo
que não se ajusta a este padrão simplesmente não conta.
Mas Deus nunca foi um indivíduo isolado como você e eu;
por isso, os Seus pensamentos são totalmente diferentes dos nossos
(Is 55:8-9). Visto que Ele não é um indivíduo, não pensa como um
indivíduo. Ele pensa em termos comunitários.

O Ponto de Vista Comunitário

Deus pensa e atua como uma comunidade, não como um


indivíduo separado. Deus é comunitário, por isso pensa comuni-
tariamente. Essa diferença de ponto de vista tem sido um grande
problema desde a queda do homem. Cremos que Deus pensa
o deus que é comunitário  17

como nós, por isso podemos entendê-lO porque Ele é como nós!
Não é assim. Ele não é como nós em nada, e a única forma de O
entendermos ou compreendermos o que Ele diz é mudando o
nosso ponto de vista. Devemos ver as coisas do ponto de vista de
Deus, e esse ponto de vista é comunitário, não individual.

A trindade divina não é simplesmente uma declaração


sobre como experimentamos Deus. Nem é a trindade de
Deus simplesmente a forma que Deus aparece para nós.
Antes, o Deus único é eternamente três pessoas. Deus na
verdade é o Pai, Filho e Espírito. Assim como Deus é ca-
racterizado pela unidade, consequentemente, a trindade
também pertence à forma que Deus de fato é.
Stanley J. Grenz
Created for Community (Criado para Comunidade)
Baker Book House, 1998, p. 45

Um bom exemplo deste ponto de vista comunitário pode


ser visto na vida terrena do Senhor Jesus. Ele nunca trabalhou
sozinho. Ele disse as palavras do Pai (Jo 8:38). Ele fez as obras do
Pai (Jo 5:36). Ele expulsou demônios pelo Espírito (Mt 12:28).
Jesus viveu pela vida do Deus Trino. Ele poderia ter vivido e
trabalhado sozinho, mas esta não foi a Sua escolha. Por ser uma
pessoa, Ele tem uma vontade e o poder de escolher. E Ele es-
colheu, como homem, viver e trabalhar na vida comunitária de
Deus. Ele tinha uma “consciência comunitária” e estava ciente
de onde tinha vindo. Ele era parte de uma Comunidade e não
iria atuar independentemente dela somente porque estava aqui
na Terra. Na verdade, o Pai O enviou para continuar aquela
comunhão, aquele estilo de vida corporativo, aqui na Terra para
que os seus discípulos começassem a “ver” com novos olhos. Ele
queria que eles começassem a ver do ponto de vista de Deus.
18  a vida comunitária de deus

Uma das maiores necessidades entre os crentes de hoje


é a de serem capazes de “ver” a partir desse ponto de vista co-
munitário.
Correndo o risco de soar redundante, vou repetir:
Deus não é um indivíduo!
O nosso Deus é comunitário. Ele é Três em Um. Ele pen-
sa em termos comunitários e fala em termos comunitários. Ele
vive um “estilo de vida” comunitário. Ele vive como três Pes-
soas distintas, as quais têm a sua própria personalidade única e
contudo são um. Eles vivem juntos, agem juntos, têm comu-
nhão um com o outro continuamente. Eles compartilham da
mesma vida, substância e essência.

A unidade de Deus não é a unidade de um indivíduo


distinto, reservado; é a unidade de uma comunidade de
pessoas que amam umas às outras e vivem juntas em har-
monia... Elas são o que são somente no relacionamento
de umas com as outras... Não há uma pessoa solitária se-
parada das outras; nenhuma acima ou abaixo; nenhuma
em primeiro, segundo ou terceiro lugar em importância;
nenhuma governando e controlando ou sendo governada
e controlada; nenhuma posição de privilégio a ser manti-
da sobre as outras; nenhuma questão de conflito acerca de
quem está no comando; nenhuma necessidade de afirmar
independência e autoridade de uma à custa das outras.
Existe apenas a comunhão e a participação de iguais que
compartilham tudo o que são e têm na comunhão de uma
com a outra, cada uma vivendo com e para as outras em
sinceridade mútua, em amor desinteressado e sustentação;
cada uma livre não das, mas para as outras. É assim que
o deus que é comunitário  19

o Pai, o Filho e o Espírito Santo estão relacionados no


círculo íntimo da Divindade.
Kevin Giles
The Trinity and Subordinationism
(A Trindade e o Subordinacionismo)
Downwer Grove: Inter Varsity Press, 2002, p. 103

A Vida Divina é Comunitária

As Escrituras falam muito sobre a vida divina ou vida eter-


na. Precisamos entender que não é apenas a quantidade de vida
que é descrita, mas é a qualidade de vida que é mais importante.
A vida eterna é a vida divina, isto é, a mesma essência da vida do
Deus Trino. A vida eterna é o “material” que compõe a Trindade
Divina. Esta é uma vida comunitária. Esta é uma vida de unidade.
Esta é uma vida de colaboração e cooperação. Esta é uma vida de
comunhão profunda e unidade. Esta é uma vida de autodedica-
ção completa de uns para com os outros e um sacrifício de vida
de uns pelos outros. Esta é a vida interior de Deus!

A Vida Divina é Relacionamento

O elemento essencial nesta vida é o relacionamento. A


origem e fundamento de todo relacionamento é o Deus Trino.
O relacionamento dentro da Divindade é O relacionamento.
Em outras palavras, não existe nenhum outro relacionamento.
Há o relacionamento entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo.
Todos os outros “relacionamentos” são apenas um reflexo deste
único relacionamento.
Todos os relacionamentos naturais são apenas uma figura
do único relacionamento divino que existe dentro da comunidade
20  a vida comunitária de deus

eterna da Divindade. Só existe um relacionamento nesta Terra


que não é uma figura ou reflexo do relacionamento divino, mas
é, antes, uma expressão da comunhão da Divindade: é o relaciona-
mento dos membros do Corpo de Cristo. Isso porque o Corpo
de Cristo é constituído para o propósito específico de expressar a
vida comunitária de Deus.
Deus anela expressar a Sua própria vida. Seu desejo é der-
ramar a Sua vida eterna em um vaso para que ela possa se expres-
sar de uma forma tangível, visível. É importante lembrar que esta
vida é o próprio Deus. Quando Ele a dá, está dando a Si mesmo!
Esta vida contém a essência de tudo o que Ele é. Ela não é uma
força ou uma energia de algum tipo que é separada d’Ele. A vida é
Ele! E esta vida é comunitária porque Ele é comunitário.
A essência da vida divina é o relacionamento. Em outras
palavras, a vida divina, a vida de Deus, é corporativa por na-
tureza. Cada um dos membros da Divindade depende um do
outro. A vida não flui dentro desta comunidade a menos que
os membros cooperem um com o outro. Não há vida alguma
sem a cooperação mútua das Pessoas. Sem o Pai não pode haver
Filho. Sem o Filho não pode haver Pai. Sem o Espírito não pode
haver o Pai e o Filho. Eles são totalmente dependentes um do
outro. O relacionamento constitui o fluxo da vida. Se não hou-
ver relacionamento, então não há fluxo de vida.

Uma Descrição da Vida


Comunitária de Deus

O apóstolo João nos diz que Deus é amor (1 Jo 4:16).


Há muito significado nesta declaração, muito mais do que
normalmente percebemos. João não está dizendo que Deus
o deus que é comunitário  21

ama ou tem amor. Ele diz que Deus é amor. A própria natureza
de Deus é amor. Em outras palavras, o amor é a essência de
quem Deus é.
Ora, sabemos que este Deus ama. Mas Ele ama porque isso
é o que Ele é. O amor é a Sua vida. O amor é o Seu ser. O amor é a
Sua própria existência. Assim, esta nossa palavra “amor” é uma boa
forma de descrever a vida comunitária de Deus.
O amor exige um relacionamento. O amor deve ter um
objetivo. Um indivíduo separado, independente, não pode
amar. Esse indivíduo precisa ter um objeto para o seu amor.
Deve haver outro para amar. Agora estamos alcançando o cora-
ção da natureza de Deus. Ele é amor. Ele é relacionamento. O
Pai ama o Filho porque entrega a Sua vida (Ele mesmo) a Seu
Filho. O Filho entrega a Sua vida ao Pai. O Espírito também
entrega a Sua vida ao Pai e ao Filho. Os capítulos 14 a 17 de João
descrevem este relacionamento de amor dentro da Divindade.
Se Deus contivesse apenas uma Pessoa dentro d’Ele, en-
tão não haveria nenhum amor porque deve haver uma interação
acontecendo no mínimo entre duas pessoas. Por isso agora po-
demos ver que o amor é a descrição da vida que acontece dentro
do Deus Trino. O próprio amor só pode ser definido como o
intercâmbio de vida que acontece dentro da Divindade. Eles são
Um porque compartilham da mesma vida, que está sendo conti-
nuamente doada de um para o outro.

A Coinerência da Divindade

O Pai, o Filho e o Espírito não estão apenas unidos juntos;


eles são um (Jo 17). Isto significa que o Pai está no Filho, o Filho
está no Pai e o Espírito está no Pai e no Filho. Eles estão um
no outro mutuamente. Isto é chamado de coinerência (Jo 14:11;
22  a vida comunitária de deus

17:21). Obviamente, eles não são indivíduos independentes,


isolados, que funcionam separadamente um do outro.
Quando Cristo veio à Terra, Ele trouxe o Pai e o Espírito
com Ele. Depois, quando o Espírito veio à Terra, Ele trouxe o
Filho e o Pai com Ele. Ambos, o Pai e o Filho, nos enviaram o Es-
pírito (veja João 14:26; 15:26). O Pai enviou o Espírito em nome
do Filho e o Filho enviou o Espírito da parte (com) do Pai. Este é
o maravilhoso mistério da Trindade Divina. Eles sempre operam
juntos porque são um. Nenhuma das Pessoas considera a Sua
vida como propriamente Sua. Cada uma delas está continuamen-
te doando a Sua vida para a outra.
Por que temos tanta dificuldade para entender este mis-
tério da Divindade? A resposta é elementar: a nossa mente caída
simplesmente não pode pensar em termos corporativos. Esta é
a natureza da queda. Podemos pensar somente em termos de
indivíduos isolados. Podemos pensar somente de forma indi-
vidualista. É por isso que tentamos entender Deus como um
indivíduo. Mas, como vimos neste capítulo, Ele não é um indi-
víduo. Por isso, Ele não pensa da mesma forma que nós.
Deve ser óbvio para você agora que precisamos desespe-
radamente ter a nossa mente renovada. Isso deve começar co-
nosco vendo o propósito eterno de Deus para o homem. Então,
pela graça de Deus, prosseguiremos para ver como Deus está
cumprindo esse plano.
O Homem Corporativo
2 de Deus

“Também disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem,


conforme a nossa semelhança; tenha ele domínio sobre os
peixes do mar, sobre as aves dos céus, sobre os animais do-

A
mésticos, sobre toda a terra e sobre todo os répteis que raste-
jam pela terra” (Gn 1:26)

Aqui vemos um Deus corporativo criando um homem


corporativo à Sua imagem corporativa.
A quem exatamente Deus estava se referindo quando Se
expressou por meio de pronomes plurais? Quem é o “nós”? Al-
guns têm imaginado que Deus falava com os anjos quando disse:
“Façamos o homem à nossa imagem”. Contudo, há dois gran-
des problemas com esta teoria. Em primeiro lugar, os anjos não
criam. Se Deus falava com os anjos quando disse: “Façamos (crie-
mos) o homem”, Ele estaria pedindo que os anjos participassem
e O ajudassem na criação. Somente Deus tem poder para criar a
vida, portanto isso simplesmente não faz nenhum sentido. Em
segundo lugar, os anjos não têm uma “imagem”. Deus tem uma
imagem, mas os anjos não têm. Devemos sempre nos lembrar de
interpretar a Bíblia com a Bíblia. Em nenhum lugar na Escritura
24  a vida comunitária de deus

é dito que os anjos têm uma imagem. Só Deus tem uma ima-
gem, e veremos isso em breve.

O Deus Comunal Visto na Criação

É óbvio que os pronomes plurais são usados nesta passagem


em referência ao Deus Trino. Podemos dizer que o Pai, o Filho e
o Espírito Santo – a Trindade – tomaram conselho juntos e decidi-
ram fazer um homem comunal (a humanidade). No pensamento
de Deus, quando criou Adão, Ele criou uma raça inteira. Dentro
deste único homem estava toda a raça humana. É por isso que
quando Adão caiu (pecou), toda a raça caiu. O relato em Gênesis 1
diz: “E dominem [eles] sobre os peixes do mar...”.2 Deus criou um
“eles”. Muito embora houvesse dentro do “eles” indivíduos, Ele
ainda considerava esta criação como um homem.
Isso está de acordo com a Sua natureza. Lembre-se, o nos-
so Deus não é um indivíduo. Ele não pensa ou age como um indi-
víduo. Ele sempre pensa e age de forma comunal. Quando criou
o homem, Ele criou uma entidade corporativa que expressaria a
Sua natureza e vida comunal. É por isso que os termos plurais
como “nós” e “nosso” são usados no ato da criação. Esse foi o
movimento de um Deus comunal atuando de forma comunal!
Ele criou um homem comunal. Ele criou um “eles”. Todo o Seu
plano giraria em torno deste homem comunal chamado “Adão”.
Toda esta passagem das Escrituras está completamente
envolta pela terminologia corporativa. A palavra para “Deus”
em Gênesis 1:26 é Elohim. Este é um substantivo plural e sin-

2
As versões em inglês traduzem a segunda parte do versículo assim: “que
eles dominem...”, ou seja, na forma plural e não singular como nas versões
em português.
o homem corporativo de deus  25

gular na língua original. A palavra mais próxima em português


seria “comunidade”. Aquele que está falando nesta passagem é
o Deus plural em um – o Deus que é Comunitário. É este Deus
que é Comunitário que cria uma comunidade de seres huma-
nos que devem viver na Sua imagem.

Criado à Sua Imagem

Muitos surgiram com “ideias” e “teorias” sobre essa ques-


tão de imagem. De que maneira o homem é criado à imagem de
Deus? É porque o homem é um ser tripartite, assim como Deus?
É porque o homem tem um espírito, como Deus? Na verdade,
creio que perdemos completamente a direção nesta área da ima-
gem de Deus.
A passagem não diz que o homem foi criado como a ima-
gem de Deus. Ela diz que o homem foi criado à imagem de
Deus. Uma pequena palavra pode fazer toda a diferença. Lemos
este versículo como se ele dissesse que o homem foi criado como
a imagem de Deus. Mas em nenhum lugar nas Escrituras o ho-
mem jamais é chamado de “a imagem de Deus”. Contudo, ouvi
muitas pessoas dizerem que o homem é a imagem de Deus. Isto
é uma concepção totalmente errônea e aquilo que nos impediu
de ver o verdadeiro propósito eterno de Deus para o homem.
Há alguém que seja chamado de “a imagem de Deus” nas
Escrituras? Você sabe que há. Ele é chamado de o Cristo, o Filho
do Deus vivo! (2 Co 4:4; Cl 1:15). Cristo é a imagem do Deus
invisível. Não há nenhuma outra imagem de Deus. O homem
é somente uma imagem “derivada”. Isso significa que o homem
deriva sua semelhança a Deus de Cristo, que é a imagem. É
por isso que as Escrituras nos dizem que o homem foi criado à
imagem e semelhança de Deus. Cristo, o Filho, é a imagem de
Deus. O homem foi criado n’Ele!
26  a vida comunitária de deus

Somente o homem tem a imagem de Deus porque ele foi


criado em Cristo, que é a expressão exata do Seu ser (Jo 1:18).

A Imagem Deve Ser Comunitária

Observe comigo que Gênesis 1:26 nos diz que o homem foi
criado à imagem de Deus. Ele não diz que um homem chamado
Adão foi criado à imagem de Deus. A referência aqui não é a um
único indivíduo. A imagem de Deus é uma questão comunitária.
Quando Deus fala do “homem”, está se referindo à raça inteira
de homens e mulheres mencionada por Paulo como o “primeiro
Adão”. Esta é a raça adâmica. Ela é uma entidade corporativa.
Só faz sentido um Deus corporativo criar uma imagem
corporativa. Mas ser comunidade significa muito mais do que
apenas a quantidade. Apenas criar uma raça de muitas pessoas
não é em si mesmo um ato comunal. Para que o homem fosse
“semelhante a Deus” ele não poderia ter apenas o muito, mas
também teria que ter o “único”.

Conforme a doutrina da Trindade indica, o único Deus é a


Trindade social, a comunidade ou a comunhão do Pai, do
Filho e do Espírito. Como Deus é uma pluralidade em uni-
dade, o ideal para a humanidade não está focado em pessoas
solitárias, mas em pessoas em comunidade. Deus pretende
que reflitamos a natureza divina em nossa vida. Isso so-
mente é possível quando nos movemos para fora do nosso
isolamento para um relacionamento piedoso com outros.
Stanley J. Grenz
Created for Community (Criado para Comunidade)
Baker Book House, 1998, p. 51
o homem corporativo de deus  27

Como mostrei no último capítulo, Deus é uma comu-


nhão (ou comunidade) de três Pessoas que são um. Elas não são
separadas, isoladas, individuais, mas são personalidades distintas
que vivem, pensam e agem como um. Nenhuma das Pessoas age
independentemente das demais. Cada uma delas pertence ou ha-
bita na outra. Elas também coexistem uma com a outra, o que
significa que todas elas existem ao mesmo tempo. As Escrituras
nos dizem que toda a plenitude da Divindade habita em Cristo
(Cl 2:9). Isso significa que Deus investiu tudo o que Ele é em Seu
Filho. Cristo é a própria incorporação do Deus Trino.
Quando Deus criou esta raça chamada “homem”, Sua
intenção foi colocar este “homem” em Cristo e colocar Cristo
neste homem. Cristo é a imagem de Deus, mas ao colocar o
homem em Cristo e fazê-lo um com Cristo, o homem tomaria
a natureza comunitária da Divindade. O senso corporativo do
homem seria o mesmo senso corporativo de Deus (em Cristo),
por isso o homem seria verdadeiramente a imagem de Deus na
Terra. O Deus comunitário teria o Seu homem comunitário.
Porém isso só poderia acontecer “em Cristo”. Sempre foi inten-
ção de Deus que o homem somente existisse em e através do
Seu Filho. Mas como isso aconteceria na prática?
O plano de Deus era que Adão e Eva comessem da árvo-
re da vida. Esta árvore representa a vida da Trindade Divina em
Cristo. Jesus nos disse que Ele era a Videira verdadeira. Mas antes
que Ele se tornasse para nós a Videira, o Pai era uma Videira para
Ele. Cristo até foi chamado de um Renovo (Ramo) no Antigo
Testamento (Jr 23:5). Em outras palavras, o relacionamento do
Senhor conosco está baseado em Seu relacionamento com Seu
Pai (Jo 6:57). Assim, na árvore da vida podemos ver a vida e o
relacionamento da Divindade sendo colocados à disposição do
homem como alimento. Se o homem comesse do fruto, ele assi-
milaria e participaria da vida e da comunhão do Deus Trino.
28  a vida comunitária de deus

É por isso que Deus colocou um espírito humano em


Adão. A vida de Deus (Cristo) encontraria Seu lar no espírito
do homem quando ele comesse da árvore da vida. Então o ho-
mem teria a mesma vida que Deus, isto é, a vida comunitária, e
ele poderia viver por essa Vida e ser a expressão visível do Deus
invisível e comunitário! Isso cumpriria o propósito de Deus de
ter uma imagem.

Cristo: O Cumprimento do Propósito

Portanto, podemos ver que o propósito de Deus era


ter uma imagem corporativa. Essa imagem corporativa deve
ser um homem porque ela deve ser uma imagem visível em
um reino visível. Deus queria ter uma expressão visível d’Ele.
Este é o significado da glorificação. Deus queria uma expres-
são e expansão d’Ele mesmo. Ele quis ser ampliado, tornar-Se
maior, se você preferir.
Quando você amplia algo, torna-o maior com o propó-
sito de esclarecer. Você usa uma lente de aumento para ampliar
algo para que possa ver os detalhes daquele objeto. Deus quer
Se tornar maior para que todos nós possamos vê-lO mais clara-
mente, mais detalhadamente. Ele não quer ser visto apenas de
um modo vago, geral, mas quer ser visto de um modo detalha-
do muito mais amplo e maior. Isso é assim para que a Sua mul-
tiforme sabedoria, verdade e riquezas possam ser vistas através
da Igreja (Ef 3:8-10). Este processo de expansão (ampliação) e
expressão (manifestação) é chamado de glorificação. A glória de
Deus é a Sua expansão e expressão. Não é que Deus se torna
mais do que Ele já é; isso é impossível. Contudo, a Sua “totali-
dade” torna-se visível. A Sua grandeza, a Sua magnificência e o
Seu esplendor são expressos pelo homem comunitário.
o homem corporativo de deus  29

Paulo disse que pregava as riquezas de Cristo. Em outras


palavras, ele compartilhou a vida, o poder e o caráter do Senhor
Jesus Cristo para que Deus fosse glorificado. É através de Cristo
Jesus que a glória de Deus é manifestada (Hb 1:3). É por isso que
Ele é chamado de a imagem do Deus invisível (Cl 1:15). Já que
Cristo é o Filho de Deus e o Filho do Homem, Ele Se qualifica
para ser a Semente da nova raça. A imagem de Deus precisava
estar no homem para que Ele fosse exposto visivelmente neste
reino físico. No corpo físico de Jesus tanto Deus como o ho-
mem se apresentaram em um. Esta é a Semente, o Primogênito
de uma nova criação.

O Novo Homem é Consumado em Cristo

Deus, contudo, não precisou apenas de um homem para


cumprir o Seu propósito; Ele precisou de um homem que tivesse
uma vida comunitária. Ele precisou de um Homem Comunal.
Isso só podia acontecer em Seu Filho porque Ele é a incorpora-
ção da plenitude da Divindade, que é a fonte de toda vida comu-
nitária (Cl 2:9). A Vida Corporativa é a vida da Trindade Divina.
Deus não queria uma imitação ou um clone dessa vida. Ele quis
que a verdadeira vida de comunidade da Divindade fosse vivida
e expressada por Seu Homem Corporativo.
A imagem deve ser uma expressão da realidade por ser
de fato a realidade. Normalmente pensamos em uma imagem
como um reflexo ou a cópia do original. Uma fotografia é um
bom exemplo disso. Uma fotografia é uma “imagem” da reali-
dade. Se você tirar uma fotografia de uma árvore, ela é apenas
uma representação em duas dimensões da árvore real. É nisso
que pensamos quando vemos a palavra “imagem”. Contudo,
não é este tipo de imagem que Deus tem em Sua mente. Sim,
30  a vida comunitária de deus

a Sua imagem deve ser a Sua semelhança, mas deve ser a Sua
semelhança por ter a Sua vida. Em outras palavras, a Sua imagem
conterá o Seu DNA. A Sua imagem conterá e viverá pela mes-
ma vida comunal que Deus vive. A Sua imagem deve conter o
Seu Espírito e Sua vida.
A Sua imagem não deve conter apenas a Sua vida corpora-
tiva, mas esta imagem também deve viver e expor esta mesma
vida corporativa. Este homem comunal deve conter a vida co-
munal de Deus por compartilhar da Árvore da Vida. Esta Árvo-
re da Vida é o Filho de Deus. Ele é a incorporação do penhor de
toda a vida comunitária da Divindade. Quando o homem come
d’Ele, está compartilhando e participando da comunhão divina
do Deus Trino (ver Jo 6:51-58; Jo 15:5; 2 Pe 1:4).
É tudo uma questão de absorver, receber e consumir a
vida de Deus. Então, a imagem vive por esta vida e expõe esta
vida ao ambiente adjacente. Mas tudo isso depende de o ho-
mem comer da árvore apropriada. A fonte determina todas as
coisas. Se a fonte for a vida comunitária de Deus, então o ho-
mem cumprirá o propósito de Deus de ser a Sua imagem. Con-
tudo, se a fonte se tornar alguma coisa mais, então o homem
falhará em expor a vida corporativa de Deus. Ele, em vez disso,
manifestará alguma coisa mais.
3 A Queda

A Introdução do Individualismo

“Então, a serpente disse à mulher: É certo que não morre-

J
reis. Porque Deus sabe que no dia em que dele comerdes se
vos abrirão os olhos e, como Deus, sereis conhecedores do
bem e do mal” (Gn 3:4-5).

Já sabemos que Deus queria um Homem Comunal que


expressasse visivelmente a Sua própria vida comunitária nes-
te reino. Este homem corporativo seria “semelhante a Ele” no
sentido de que ele também seria corporativo, mas isso significa
muito mais do que apenas números. A matemática na Divinda-
de é: um mais um mais um é igual a um! A matemática na Sua
imagem seria a mesma – os muitos iguais a um. Assim, vemos
que a “unidade” é uma parte importante desta imagem. Mas
esta não é toda a história.
Deus também queria que a Sua imagem contivesse a Sua
própria vida, a Vida Divina da Divindade. Esta imagem não ape-
nas conteria esta vida divina, mas também viveria por esta vida
divina. Comendo da Árvore da Vida o homem obteria e gozaria
da própria vida de Deus. Já que esta vida é comunitária, o ho-
mem também viveria a mesma vida comunitária que o Deus
32  a vida comunitária de deus

Trino. Desta forma Deus teria a Sua imagem, a Sua semelhança.


O homem tinha todo o potencial para cumprir o propósito de
Deus vivendo em Sua imagem (Cristo), mas ele ainda não es-
tava completo porque não tinha comido da Árvore da Vida. Ele
podia viver em Cristo, mas podia não viver por Cristo. E ele só
poderia viver por Cristo se Cristo vivesse dentro dele.
É extremamente importante para nós entendermos ple-
namente o que Deus estava oferecendo ao homem nesta Árvore
da Vida. Ele não estava nos oferecendo apenas uma vida longa
sem doença ou preocupação. Ele estava nos oferecendo a Sua
própria vida. A Sua vida é comunitária. A Sua vida contém o Seu
DNA, o qual contém a própria essência da Sua comunidade. Os
membros de uma comunidade compartilham da mesma vida.
Isso é o que é comunidade – uma vida compartilhada. Em Sua
oferta da árvore, Ele estava nos oferecendo para participarmos
da Sua vida compartilhada de comunidade (2 Pe 1:4).
A Árvore da Vida na realidade representa a comunhão do
Deus Trinitário. O relacionamento que o Pai, o Filho e o Espí-
rito têm nesta Comunidade é a essência da Sua vida divina. Eles
estavam oferecendo esta mesma vida para Adão e Eva. Há muito
mais neste convite do que jamais pensamos ser possível.
Deus na verdade estava nos convidando para vir e tomar
parte na comunhão da Sua Comunidade divina! A árvore repre-
senta esta Comunidade. Você pode até dizer que o tronco (e a raiz)
é o Pai, os ramos são o Filho e a seiva (o fluxo da vida interior) é o
Espírito Santo. A Comunidade completa está representada aqui.
Mas não era o suficiente para o homem apenas ver esta árvore.
Para se tornar participante, ele tinha que comer da árvore! Esta
comunidade Trinitária tinha que vir e viver dentro dele para que
o homem vivesse por esta vida comunitária. O homem precisa-
ria se tornar um com esta vida divina compartilhada.
queda  33

É aí onde o fruto entra. Ele é um recipiente para a vida


da árvore. Ele é na realidade o transbordar da vida da árvore. A
árvore tem que depositar em algum lugar o fluir da vida, por
isso ela cria “vagens de vida”, que são recipientes para conter o
excesso de vida. O que é belo sobre o fruto é que ele contém o
DNA completo da árvore. Essas sementes contêm tudo o que é
necessário para produzir mais árvores.
Assim, ao comer do fruto desta árvore o homem teria
exatamente a mesma vida comunitária compartilhada de Deus
reproduzida dentro dele! A vida completa da árvore estaria nele.
Ele poderia ter comunhão com aquela Comunidade porque ela
viveria dentro dele.
Isso é o que Deus tinha em mente ao convidar o homem
para compartilhar da Árvore da Vida. Seu plano era ampliar a
Comunidade da Divindade injetando a Sua vida em Sua criação
(o homem). A “Árvore” iria se multiplicar e se expandir na cria-
ção visível. O homem e a “Árvore” se tornariam um. Isso não
significa que o homem se tornaria divino. A deidade não seria
compartilhada, mas sim a vida e a natureza de Deus. A comu-
nhão da Comunidade Trinitária se abriria para incluir muitos
outros participantes. Esses “participantes” seriam os muitos ir-
mãos do Filho Primogênito (Rm 8:29).

A Grande Mentira da Outra Árvore

Nestas circunstâncias a serpente foi até Eva para tentá-la


com algo. Ela lança uma isca, ou você poderia dizer que ela ba-
lançou uma cenoura diante dela. A isca era que ela poderia ser
como Deus.
Este é o ponto crucial dessa questão da tentação. Geral-
mente não conseguimos ver o ponto da oferta da serpente. O
34  a vida comunitária de deus

alvo da serpente não era tanto ver a queda do homem, mas sim
frustrar o propósito eterno de Deus. Satanás é o inimigo de
Deus. Ele procura sempre frustrar, corromper ou parar comple-
tamente algo que Deus esteja tentando estabelecer. Deus quis
ter uma imagem. O alvo da serpente era destruir qualquer pos-
sibilidade dessa imagem se tornar uma realidade. É por isso que
ela foi até Eva, para impedir que essa imagem se concretizase.
Mas por que a serpente a tentaria para ser como Deus? O
homem já não era criado à imagem de Deus, com a semelhança
de Deus? Qual seria o objetivo ao tentar Eva com algo que ela
já tinha? Se ela já era semelhante a Deus, então por que o diabo
usaria esse aspecto para tentá-la? Isso teria sido completamente
ineficaz. Ora, o diabo é muitas coisas, mas não é estúpido. Ele
nunca a teria tentado com algo que ela já tivesse. O poder da sua
proposta era que se Eva comesse daquele fruto ela poderia ter
algo que ainda não tinha – poderia ser como Deus.
Mas o que isso significa? Como Eva pode ser criada para
ser semelhante a Deus e ainda assim não ser como Deus? Para
responder a essa pergunta teremos que regressar um pouco e
dar outra olhada na criação do homem.
“Façamos o homem à nossa imagem...”

A Imagem Corporativa

Como compartilhei no último capítulo, Deus é comu-


nitário; portanto, a Sua imagem também deve ser comunitária.
Criar o homem à Sua imagem significa que assim como Deus
é três Pessoas em uma, o homem seria muitas pessoas em um.
A palavra homem neste versículo quer dizer a “humanidade” ou
toda a raça de homens.
queda  35

Agora, com esses pensamentos em mente, vamos consi-


derar o versículo seguinte:

“Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de


Deus o criou; homem e mulher os criou” (Gn 1:27).

Lembre-se de que a palavra para Deus aqui é “Elohim”,


que é um substantivo singular e plural em hebraico. Neste ver-
sículo Deus (plural contudo singular) está criando uma ima-
gem. “Deus o criou; homem e mulher os criou”. Deus criou um
“ele” ou um “eles”? Se você considerar tudo o que indiquei até
aqui, então a resposta é óbvia. Ele criou o homem, uma entida-
de corporativa, uma humanidade, uma raça que incluiu muitos
indivíduos dentro dele. Isso tem implicações de consequências
tremendamente amplas em nossa compreensão do propósito de
Deus ao criar uma imagem de Si mesmo.
Se o propósito de Deus era ter uma imagem comunal que
fosse a Sua expressão e autoridade na Terra, o que você pensa
que seria a estratégia da serpente para impedir isso? Não seria
romper e dividir a comunidade? Não seria destruir qualquer
possibilidade de aquela imagem corporativa se tornar uma rea-
lidade? Certamente a melhor estratégia seria em primeiro lugar
romper a comunidade, e então injetar o seu veneno nos indiví-
duos para trazer a corrupção.
Agora podemos responder à nossa pergunta sobre a pro-
posta da serpente a Eva. Ela estava tentando-a para ser como
Deus porque ela ainda não era como Deus. Eva, como um indi-
víduo, não foi criada à imagem de Deus. A humanidade como uma
raça corporativa foi criada à imagem de Deus! Você está começando a
captar a figura agora?
Por isso a estratégia da serpente foi tomar um indivíduo
(Eva) à parte e tentá-lo para ser como Deus. Isto era muito atraente
36  a vida comunitária de deus

para Eva porque significava que ela poderia, como um indiví-


duo, sem ninguém mais, ser como Deus. Isto significava que ela
não precisaria mais de Adão e poderia ser ela mesma separada,
independente. Ela seria autossuficiente e autônoma. Ela seria a
sua própria mulher. Soa familiar?

Divididos nós Caímos

Por favor, observe comigo que a serpente não tentou Adão


e Eva juntos. Ela foi a um indivíduo e tentou Eva sozinha. Isto
estava de acordo com a sua estratégia de romper a comunidade,
a imagem corporativa que Deus estava formando no homem.
A serpente estava contando com o fato de que Eva seria capaz
de convencer Adão a compartilhar da árvore e que ele cederia
por causa do seu amor por ela. Certamente sabemos que o seu
plano funcionou. Mas o que aquela velha serpente não sabia era
que Deus tinha um plano eterno que ia muito além do jardim!
Precisamos perceber que a velha serpente ainda usa a mes-
ma tentação hoje. Ela ainda vem a você e a mim e usa essa mesma
mentira: “Você, como um indivíduo, pode ser como Deus”. O
seu alvo é nos convencer de que realmente podemos ser suficien-
tes em nós mesmos. Você não precisa de ninguém mais; você é
tudo. Certamente esta é uma mentira perigosa. Você não pode ser
a imagem de Deus como um indivíduo separado, isolado. Você é
apenas uma parte do Corpo de Cristo (Ef 1:22-23).
Contudo, o inimigo virá a você e tentará convencê-lo de
outra forma. Se ele puder mantê-lo de alguma forma separado
e isolado como um indivíduo, então a imagem de Deus nunca
terá expressão prática alguma e esta imagem não terá autoridade
ou domínio na Terra. Ele teve sucesso (temporariamente) com
Adão e Eva no jardim.
queda  37

A Forma de Cristo

O colapso da comunidade e a sua degradação em hierar-


quia tiveram efeitos devastadores nas relações humanas.
A beleza comunitária da unidade projetada por Deus foi
substituída por instituições monstruosas, desumanizadas
que resultaram da obra nefasta de Satanás no jardim.
Gilbert Bilezikian
Comunity 101 (Comunidade 101)
Zondervan Publishing, 1997, p. 29

Devemos perceber nestas alturas que o inimigo não estava


tentando destruir a imagem de Deus. A imagem de Deus é Cristo
(veja Colossenses 1:15; 2 Coríntios 4:4; Hebreus 1:3; João 1:18).
Deus tinha criado Adão à Sua imagem (Cristo) para que ele fosse a
duplicação e a multiplicação de Cristo. Deus queria que Seu Filho
fosse multiplicado, aumentado, ampliado e duplicado. Ele queria
que Seu Filho fosse expresso e representado neste reino físico. Este
é o significado de o homem ser criado à imagem de Deus. O Pai
quis que Seu Filho fosse expresso e aumentado nesta Terra.
Adão tinha apenas a forma de Cristo e não tinha recebido
a vida d’Ele. Esta devia ser recebida da Árvore da Vida. Adão
(homem) era apenas como a fotografia de Cristo, sem a vida e
a realidade d’Ele. Por isso a imagem de Deus no homem ainda
não estava completa. É aí que a serpente se instalou. Ela se insta-
lou antes que a vida de Cristo fosse tomada pelo homem. Nesse
momento o homem ainda tinha apenas a forma de Cristo e não
a Sua vida. A serpente rapidamente se apropriou da sua oportu-
nidade de dividir e conquistar antes que a vida divina entrasse na
fotografia. O propósito da serpente era duplo: separar e disper-
sar o homem corporativo e desviá-lo da Árvore da Vida.
38  a vida comunitária de deus

Se o homem nunca comesse da Árvore da Vida, então


não concluiria o seu destino de ser a expressão e o aumento de
Deus. Ele seria apenas uma forma, sem vida divina ou realida-
de. Não apenas isso, mas a serpente tinha que se assegurar de
que o homem estaria separado e dividido de Deus e dos outros
homens. Isso então desqualificaria o homem de cumprir o seu
destino de ser a imagem comunitária de Deus.

O Domínio de Deus

Houve outro aspecto do propósito de Deus para o ho-


mem que foi até mais ameaçador para Satanás do que a imagem
ou expressão corporativa. Este era o domínio comunal de Deus
que é expresso pelo homem na Terra.
Lembre-se, Deus disse que o homem governaria sobre os
peixes, as aves, os animais e sobre toda a Terra, inclusive sobre as
coisas que se arrastam. Isso inclui a serpente! Você vê que o ho-
mem não devia trazer apenas a expressão e o aumento de Cristo,
mas também o Seu governo e domínio. Este seria o golpe final no
ego mais que inflado do maligno. Como ele poderia permitir que
isso acontecesse? Somente o pensamento de um mero homem
governando sobre um arcanjo tão glorioso como ele era demais
para ser suportado. Algo tinha que ser feito para impedir isso!

O Veneno da Serpente

Deus permitiu que Seu inimigo introduzisse a sua árvo-


re no jardim porque Deus sempre dá ao homem o poder de
escolha. A vida só pode fluir de uma atmosfera de liberdade.
Se não houver liberdade, então não pode haver o fluir da vida.
queda  39

Deus queria que o homem comesse da Sua vida, mas o homem


precisava desejá-la e escolher a vida em completa liberdade. A
serpente fez entrar o seu “veneno” na forma da sua própria ár-
vore. Esta árvore representa muitas coisas.

A Árvore do
Conhecimento do Bem e do Mal

Antes de tudo, esta árvore representa o conhecimento.


Este não é o conhecimento experimental de Deus, mas o tipo
de conhecimento que envolve a vida da alma de Adão. Sabe-
mos que o homem foi criado por Deus como um ser tripartido
(Gn 2:7; 1 Ts 5:23). Ele tem espírito, alma e corpo. O destino
de Deus para o homem era que ele comesse da Árvore da Vida e
assim se apropriasse da mesma vida de Deus em seu próprio es-
pírito humano. Deus queria que o Seu Espírito fosse um com o
espírito do homem para que este pudesse expressar a Sua vida.
O plano de Satanás era injetar o seu veneno na alma do ho-
mem. A alma é composta de mente, vontade e emoções. O conhe-
cimento desta árvore envolve a vida da alma do homem, de um
modo específico a mente. Este não é o conhecimento espiritual
que vem do espírito do homem; este é o conhecimento “almático”.
Este é o conhecimento que infla o ego (1 Co 8:1). Este não é o co-
nhecimento de Deus, mas o conhecimento sobre Deus. Isso não é
conhecer o Senhor no sentido íntimo, experimental, mas o estudo
intelectual e a assimilação mental de fatos sobre Deus.
Este é o conhecimento do bem e de ser bom. É impor-
tante notar que o conhecimento tanto do bem como do mal vem
da mesma árvore. Não existiam duas árvores: uma para o bem
e outra para o mal. Tanto o bem como o mal procedem da mes-
ma árvore. Você poderia dizer que o bem e o mal são os lados
40  a vida comunitária de deus

opostos da mesma moeda. Em outras palavras, ele queria inje-


tar a sua própria vida caída no homem. Esta vida é a essência
ou a natureza do anjo caído. Esta vida está contaminada com o
egocentrismo, autoconsciência e autossuficiência. Esta vida está
contaminada com o orgulho, rebelião e independência comple-
ta de Deus. Esta vida está cheia de individualismo, e o maligno
sabia que isso arruinaria qualquer possibilidade de o homem
conter a vida comunitária de Deus. Se o homem se tornasse
individualista, então ele não seria mais capaz de expressar a vida
comunitária do Deus Trino na Terra.
4 O Resultado do
Individualismo

D Descobrimos no último capítulo que a proposta feita


a Eva pela serpente foi individual em vez de corporativa. Ela
abordou Eva como um indivíduo separado, uma entidade inde-
pendente de Adão. Isso está em conflito direto com o propósito
de Deus, que era ter uma imagem comunitária. O apelo de “ser
como Deus” foi feito a Eva, não ao homem (corporativo). A es-
tratégia da serpente foi separar e dividir os indivíduos que com-
punham este homem comunitário, ou pelo menos o homem
comunitário potencial.

A Natureza do Pecado

A serpente teve sucesso em injetar da sua vida e natureza


no homem por meio da árvore do conhecimento do bem e do
mal. Essa natureza, ou princípio, é algo que opera dentro dos
membros do nosso corpo (veja Romanos 7). É algo que as Es-
crituras chamam de “pecado”. Este pecado conserva a natureza
da serpente. Ele é o veneno da serpente. Por isso, ele contém
todos os mesmos elementos do maligno. O mesmo orgulho,
rebelião, independência e egoísmo que estão na serpente estão
em seu veneno.
42  a vida comunitária de deus

Devemos perceber que o grande erro de Lúcifer foi que-


rer ser como Deus (Is 14:14). Ele disse: “Vou me fazer seme-
lhante ao Altíssimo”. Aqui podemos ver que o “eu” é o centro
de tudo. Eu farei isso! Eu me farei. Na mente pervertida de Sa-
tanás tudo era sobre ele mesmo! Ele ia fazer a si mesmo algo muito
especial. Ele ia se fazer como Deus.
Esta natureza independente, egocêntrica é que ele injetou
no homem. Na verdade, foi com isso que ele tentou Eva: “Você
será como Deus”. Você, como um ser independente, separado,
será como Deus. Você, o indivíduo exaltado, será como Deus.
Você, alguém isolado, será como Deus. Certamente, o mais ul-
trajante nessa tentação e promessa da serpente é que Deus não
é assim em absoluto!
Deus não é um indivíduo isolado, separado. Deus não é al-
guém independente que está tentando se tornar algo. Ele não é um
ser que é egocêntrico, autoconsciente e autossuficiente. Na verda-
de, a vida comunitária dentro da Divindade é exatamente o oposto!
Os membros da Divindade sempre estão se dando um ao outro.
Eles estão continuamente compartilhando a sua vida um com o
outro e continuamente derramando-a um para o outro. Nenhuma
das Pessoa tem um único pensamento egocêntrico. Os pensamen-
tos de cada Pessoa são somente em direção às outras Pessoas. O Pai
só quer elevar e glorificar o Filho (Jo 17:5). O Filho só quer glorifi-
car o Pai (Jo 17:1). O Espírito só quer glorificar e falar do Filho (Jo
16:13-14). Todos eles vivem um para o outro. Não há um espírito
independente. Não há egoísmo. Não há individualismo.

Ser como Deus

A tentação de Satanás sobre Eva foi um embuste, uma


fraude e uma completa mentira. Mas certamente ela tinha uma
medida de verdade, como veremos mais adiante.
o resultado do individualismo  43

A serpente disse a Eva que se comesse da árvore do co-


nhecimento do bem e do mal ela seria como Deus. Aqui mais
uma vez a palavra usada para Deus é “Elohim”, que é um subs-
tantivo plural e singular. Esta é a mesma palavra que os judeus
usavam em sua oração quando diziam “o Senhor nosso Deus
(Elohim) é um”. Quer dizer, esta palavra significa o Deus Trino:
Aquele que é três em Um. Satanás disse a Eva que ela se tornaria
como aquele Deus.
Uma maçã nunca será como uma laranja. Um cão nunca
será como um alce. São dois animais diferentes. E um indivíduo
nunca se parecerá com Deus! Lembre-se, Deus não é um in-
divíduo. Por isso, um indivíduo isolado nunca pode ser como
Deus. Só uma entidade corporativa pode ser como um Deus
corporativo. A imagem deve se igualar à natureza do original.
Somente um homem comunal pode ser semelhante a um Deus
comunal. E assim mesmo, o homem comunal não precisaria ape-
nas da “forma” de Deus, mas também da Sua vida, natureza e
substância. Isso nunca pode acontecer com uma “pessoa” indi-
vidual. A expressão de Deus requer um homem comunal que
conterá e viverá pela Sua vida divina.

As Alternativas de um Dilema

O principal dilema que foi introduzido na queda do ho-


mem foi o individualismo. O indivíduo agora se tornou um
‘deus’. A separação, independência e individualismo brotaram
do veneno daquela odiosa serpente, o diabo. Agora o homem
tem uma mentalidade individualista. Naturalmente, é impos-
sível para ele até mesmo pensar corporativamente, quanto mais
viver desta forma. Ele não pode nem mesmo pensar em termos
44  a vida comunitária de deus

comunitários, exceto quando isso puder beneficiá-lo como um


indivíduo.
Você, caro leitor, constantemente pensa em termos indi-
vidualistas. É extremamente difícil para você, como uma pessoa
caída, até mesmo pensar de qualquer outra forma. Você não per-
cebe isso porque está muito imerso nele. Você está mergulhado
num mar de individualismo e nem o percebe. Ele não apenas
controla a forma como você pensa, mas também a forma como
sente e toma decisões. Ele enche completamente a sua mente,
vontade e emoções. Ele é o ambiente no qual você vive.
O individualismo não é apenas o seu ambiente; é tam-
bém a forma pela qual você vive. Você certamente tem relaciona-
mento com outros indivíduos, mas ele ainda parte do ponto de
vista individualista do seu próprio bem-estar. Você, como um
indivíduo, tem relacionamentos com outros indivíduos.
Você poderia pensar nisso desta forma. Você vive dentro
de um cubículo. Ora, um cubículo tem muros ao seu redor,
mas esses muros são baixos. Você pode ver o lado de fora do seu
próprio cubículo, e se ele estiver perto do cubículo de outros,
você pode falar com eles. Às vezes pode até passar por cima do
muro e tocá-los. Contudo, você permanece dentro do seu cubí-
culo e eles permanecem no interior do deles. Em um prédio de
escritórios há muitos cubículos e muitos deles estão ligados uns
aos outros. Este é um microcosmo das nossas cidades. Muitas
pessoas vivem em um mesmo lugar, mas elas sempre permane-
cem dentro dos seus próprios cubículos individuais. Este é um
quadro do individualismo. Estamos separados e isolados uns
dos outros. Este é o nosso estilo de vida. Isto é quem somos.
Pelo menos isto é quem pensamos ser.3

3
Ver o livro A Borboleta em Você, deste autor, publicado por esta editora.
o resultado do individualismo  45

A Mentalidade Individualista

Sempre relacionamos tudo a nós mesmos como indiví-


duos. Tudo é visto pelos olhos do todo-poderoso “eu”. Muito
raramente usamos os termos “nós” ou “nosso”. É sempre “eu” e
“meu”. Basicamente cremos que todo o universo gira em torno
de nós mesmos. Tudo está em redor da trindade profana Meu,
Mim e Eu! É assim que pensamos, por isso é assim que vive-
mos. O indivíduo é tudo. O indivíduo é Deus.
Certamente podemos ver isso se tornando cada vez mais
prevalecente dentro da nossa sociedade, o que inclui todo o sis-
tema mundial. Sabemos que esse sistema está sob o poder do
maligno (1 Jo 5:19), portanto isso não deveria nos surpreender.
Podemos ver claramente que o indivíduo é elevado para ser o
mais alto padrão neste mundo.
Se você for um “homem autossuficiente”, é grandemente
honrado em nossa sociedade. Aqueles que são autossuficien-
tes e independentes são os admirados, e os fracos e humildes
são deixados à margem do caminho. A interdependência é con-
siderada uma fraqueza, e aqueles que não podem ajudar a si
mesmos são normalmente descartados. Tudo está relacionado
a mim como um indivíduo e tudo que vejo ou ouço é inter-
pretado pelos meus próprios filtros individualistas. Tudo isso se
origina daquele desejo de “ser como Deus”.

Cristãos Individualistas

Certamente este mesmo “veneno” infectou os crentes.


Não podemos pensar em termos corporativos. Só podemos
pensar em termos das nossas próprias necessidades individuais.
46  a vida comunitária de deus

Olhe para todos os diferentes “ministérios cristãos” e você


entenderá o que quero dizer. Praticamente todos eles giram em
torno de ajudar você como um crente individual, para que se
torne alguém melhor. Por exemplo: há ministérios para ajudar
você a se tornar um melhor guerreiro na oração, um melhor pai
cristão, um melhor cônjuge, uma melhor testemunha, um me-
lhor pastor, etc. As livrarias estão cheias de materiais para aju-
dar você, o crente individual, em sua caminhada com o Senhor.
Há seminários, conferências e cursos especiais para ensinarem
e treinarem você, crente individual, a como usar os seus dons es-
pirituais e/ou como superar os seus temores mais profundos e
viver a vida cristã individual vitoriosa.
Ir à “igreja” é a mesma coisa. Você assiste ao culto, senta-
se em um banco da igreja e então escuta um homem dizer-lhe
como viver a vida cristã individual. “Sete passos para uma vida de
oração melhor”, “Como estudar a Bíblia por si mesmo em casa”
e assim por diante. Tudo gira em torno do crente individual.
Nada gira em torno do propósito eterno de Deus, que é ter um
homem comunal, uma imagem comunal! Tudo diz respeito ao seu
relacionamento com Deus. Tudo é sobre como você pode se tor-
nar um cristão melhor.
Não temos ideia de quão penetrante a mentalidade indi-
vidualista realmente é. Ela penetrou profundamente em todos
os aspectos da nossa vida “cristã” e dos ministérios.
Outra área é o conceito total dos dons espirituais. Não
são os dons para o cristão individual? Não! Paulo fala deles em
1 Coríntios no contexto da vida corporativa. Os dons espirituais
e os ministérios são o resultado natural da vida corporativa orgâ-
nica. Em outras palavras, quando há o fluir da vida comunitária,
os dons naturalmente emergirão.
o resultado do individualismo  47

Paulo insiste que os dons que foram concedidos aos indi-


víduos não são primariamente para o seu próprio prazer,
mas para a edificação ou melhoramento da comunidade
(1 Co 12:7; Ef 4:12).
Robert Banks
Paul’s Idea of Community (A Conceito de Paulo sobre Comunidade)
Hendrickson Publishing, 1994, p. 99

Temos, mais uma vez, colocado o proverbial carro adian-


te dos bois. Você não pode ter o funcionamento apropriado dos
dons espirituais sem a vida comunitária. A vida corporativa deve
vir primeiro! Então os dons virão sem um pensamento ou pa-
lavra sobre eles. Contudo, eles não serão parecidos com o que
temos visto sair dos assim chamados “movimentos” do Espírito
nos últimos duzentos anos.
Todos esses “movimentos” saíram do sistema da igreja
organizada, não da vida orgânica do corpo. Esses “dons” são,
na melhor das hipóteses, mutações porque foram forçados em
ambiente incorreto. Você pode ser capaz de transplantar uma
macieira de Santa Catarina para a Bahia. Contudo, sem criar um
ambiente artificial (como uma estufa) a árvore não sobreviverá.
E mesmo em um ambiente artificial (sintético) a árvore sofrerá
mutação. O fundamento da verdadeira vida corporativa não es-
tava ali, por isso toda a edificação estava desalinhada.

A Abordagem Individualista das Escrituras

Você não percebe quão profunda realmente é esta mentali-


dade individualista. Você ainda não faz ideia de quão firmemente
enraizado isso está em sua mente. Ela afeta a forma como você vê
a Deus, você mesmo, os seus amigos, familiares e o mundo. E ela
48  a vida comunitária de deus

também afeta a forma como você vê e interpreta as Escrituras


Sagradas, a Bíblia.
Quando você abre a sua Bíblia e começa a ler, imediata-
mente começa a interpretar tudo pelo filtro da sua mente in-
dividualista. Você automaticamente assume que as Escrituras
foram escritas para você como um indivíduo, por isso a aplica
desta forma. Mas essa não é a realidade. A verdade é que a maior
parte das Escrituras não foi escrita para o indivíduo.
A maior parte do Novo Testamento foi escrita para entida-
des corporativas. Estas eram expressões comunitárias do Corpo de
Cristo em diferentes localidades ou cidades. Estou tentando não
usar a palavra “igreja” aqui por causa do abuso absurdo desse ter-
mo. Por exemplo, a carta aos colossenses não foi escrita para você
como um indivíduo. Ela foi escrita para a comunidade de crentes
na cidade de Colossos. O contexto dessa carta é a vida comuni-
tária. Você não pode superpor a sua mentalidade e estilo de vida
individualista sobre essa carta. Ela simplesmente não se ajustará.
É muito difícil realmente entender essa carta a menos que
você esteja experimentando a vida comunitária com um grupo
de crentes. Você terá uma tendência de sempre se lembrar do
significado dela e o relacionar ao seu próprio caminhar indivi-
dual com Deus. Mas ela não é sobre isso. É sobre a centralidade,
supremacia e preeminência de Cristo. Isto é, “Cristo em vós,
a esperança da glória”. Agora, por favor, preste atenção muito
cuidadosamente.
Assim que você leu a minha citação do versículo de Co-
lossenses, imediatamente tomou-o e o aplicou a você como um
indivíduo. “Cristo em mim, a esperança da glória.” Mas isso não
é o que o versículo diz! Ele diz: “Cristo em vós...”; a palavra
“vós” é plural, não singular! Paulo está falando para a igreja em
Colossos e está falando-lhes de um segredo, um mistério que
o resultado do individualismo  49

estava escondido durante eras. Mas esse mistério se tornou ago-


ra conhecido para os Seus santos. Esse mistério é Cristo em todos
vocês. Em outras palavras, Cristo vive em Seu Corpo! Cristo vive
em todos vocês.
Também é verdade que Cristo vive em você individu-
almente, mas não é sobre isso que Paulo está falando. Ele está
falando sobre o propósito misterioso de Deus sendo cumprido
por um corpo comunal que contém e expressa a vida de Seu Fi-
lho. Este é apenas um exemplo de como tomamos as Escrituras
e as interpretamos e aplicamos a nós como indivíduos. Estamos
constantemente fazendo assim sem ter consciência disso. Isso é
o que chamo de mente individualista. Muito raramente pensa-
mos em termos de comunidade. Contudo, é exatamente assim
que temos de pensar para entendermos as Escrituras. Afinal,
elas foram escritas por um Deus que é comunidade. Somente
uma renovação da nossa mente ocasionada pelo contato cons-
tante com o nosso Senhor que habita interiormente pode causar
uma mudança.
Fazemos isso com todas as coisas. Vemos tudo pelos nos-
sos “filtros” do individualismo. Precisamos desesperadamen-
te pedir que Deus abra os nossos olhos para vermos da forma
como Ele vê. Precisamos ver a partir da Sua perspectiva. Preci-
samos ver ao partir do Seu ponto de vista. Este ponto de vista é
comunitário. Precisamos ter uma revelação do propósito eterno
de Deus, e então ver e entender todas as coisas segundo esse
propósito, que é a motivação por trás de tudo o que Deus diz e
faz. Ele está sempre operando para cumpri-lo em nós e através
de nós (veja Romanos 8:28-30).
Quando vemos as Escrituras somente de um ponto de
vista individualista, algo muito prejudicial acontece. Colocamo-
nos debaixo da lei, e o resultado é condenação e culpa. Quando
50  a vida comunitária de deus

aplicamos as Escrituras a nós mesmos como indivíduos, então


simplesmente não podemos estar à altura do que Deus quer e
nos colocamos sob condenação. Deixe-me dar-lhe um exemplo
das palavras diretas do nosso Senhor.
Os capítulos 5, 6 e 7 de Mateus são normalmente trata-
dos como o Sermão do Monte. Mas depois de ler esta seção de
Mateus, quem não se sentiria totalmente inadequado? Por quê?
Porque como um indivíduo você é totalmente inadequado para
viver o tipo de vida descrita nesses capítulos. Mas nós perdemos
o foco. Nesses capítulos, e em muitos outros lugares nos evan-
gelhos, Jesus está descrevendo um povo. Ele está dando a des-
crição de um reino de pessoas, de uma nova raça, de um novo
homem. Esta passagem só pode ser entendida da perspectiva
comunal. Quando você a toma individualmente, ela se torna
lei e resulta em condenação. Mas esta é uma descrição de um
homem corporativo que contém a vida de Cristo, o único que
pode cumprir a lei! A lei é cumprida pela vida eterna, divina,
comunitária de Deus, não por um indivíduo.
Outro exemplo do nosso ponto de vista errado está em
Efésios 6:10-18, que fala sobre a armadura de Deus. Lembre-
se de que essa carta foi escrita a uma igreja; na verdade, foi
escrita a várias igrejas da Ásia Menor. Paulo não estava pedin-
do aos indivíduos que colocassem a armadura de Deus; ele
estava pedindo à Igreja. A noiva, o Corpo de Cristo põe esta
armadura. Não você como um indivíduo. Você nunca pode
estar à altura disso como um indivíduo. E o que é essa arma-
dura? A verdade, a justiça, a paz, a fé, a salvação e a Palavra de
Deus. Quem é todas estas coisas, caro leitor? Com certeza é
o próprio Cristo! A Igreja deve vestir Cristo como a sua única
armadura e proteção.
o resultado do individualismo  51

Precisamos desesperadamente ver tudo do Seu ponto de


vista. Precisamos ver como Ele vê; precisamos pensar como Ele
pensa. E precisamos ver todas as Escrituras em relação ao Seu
propósito eterno de ter uma imagem corporativa (ou homem)
que expressará a vida de Seu Filho. Este é o pensamento central de
Deus em toda a Bíblia. Se não compreendemos isso, não compreendemos
o ponto principal de todas as coisas.

Ser como Jesus

Conforme já vimos, “ser como Deus” foi uma tentação


para o indivíduo. Portanto, o indivíduo nunca pode ser como
Deus. Obviamente, a tentação da serpente era uma mentira. So-
mente a comunidade pode ser como a Comunidade.
Contudo, ouço crentes falando todo o tempo sobre ser
“como Jesus” ou ser “como Cristo”. No entanto, as Escrituras
não ensinam nenhuma vez que você, como um indivíduo, pode
ser como Cristo. Esse, mais uma vez, é o engano da serpente.
Você não pode ser como Jesus. Você nunca foi destinado a ser
como Jesus.
Aqui novamente desenvolvemos essa ideia por causa da
nossa compreensão individualista das Escrituras. Este conceito
vem principalmente das passagens que falam de ser conformado
à imagem de Deus em Cristo (veja Romanos 8:29; 2 Coríntios
3:18). Mas essas passagens são todas dadas no contexto do Cor-
po de Cristo. Nós estamos sendo transformados na Sua imagem.
Isso é algo nosso. Isso não é algo individual. A transformação do
crente individual é com o propósito de expressar comunitaria-
mente a glória de Deus. É a Igreja que deve expressar a plenitude
de Cristo (Ef 1:22-23).
52  a vida comunitária de deus

Como Um de Nós

O resultado da queda foi que nos tornamos individua-


listas egocêntricos. Eva não se tornou como Deus. Adão não
se tornou como Deus. Isso foi um engano. O indivíduo não
pode ser como Deus. Somente o Cristo corporativo (Cabeça e
Corpo) pode expressar plenamente e ampliar a semelhança e a
glória de Deus (Ef 4:11-16).
Por isso, depois que Adão e Eva caíram, Deus fez esta
declaração: “Eis que o homem se tornou como um de nós...” (Gn
3:22a). Isso implica que a entidade corporativa da humanidade
agora tinha se tornado como uma das Pessoas da Divindade. O
homem não tinha se tornado como Deus. Ele tinha se tornado
como um dos indivíduos da Trindade.
Quando falamos no nome de “Deus”, estamos nos re-
ferindo ao Deus Trino. Ele é o Deus três em Um. Ele é uma
comunidade de três Pessoas. A humanidade tinha se tornado
como uma daquelas Pessoas somente. Em outras palavras, a
humanidade tinha se tornado uma entidade individualista. Por
causa da queda, o homem tinha se tornado uma raça de indi-
víduos que foi consumida pela sua própria autossuficiência e
autocompreensão. O homem tinha se tornado uma raça de in-
dividualistas. Essa raça de Adão agora nunca poderia ostentar a
imagem e o domínio de Deus. Essa raça tinha se tornado uma
perversão do propósito de Deus. Por isso Ele precisou impedi-
los de ter acesso à Árvore da Vida.
5 A Essência da
Personalidade

“Não crês que eu estou no Pai e que o Pai está em mim?


As palavras que eu vos digo não as digo por mim mesmo;
mas o Pai, que permanece em mim, é quem faz as obras”

P
(Jo 14:10).

Por causa da nossa mente caída temos uma visão muito


torcida da personalidade. A nossa definição de uma “pessoa” não
é baseada no fundamento apropriado. O fundamento adequado
é o próprio Deus. Obviamente, toda personalidade originou-se
no e com o Deus vivo. Antes de haver qualquer coisa, havia
Deus. Antes de haver qualquer outra pessoa, havia Deus. Por
isso, temos de investigar o próprio Deus para descobrir o fun-
damento e a essência de toda personalidade.

A Singularidade do Indivíduo

Antes de tudo, precisamos ver que dentro deste nosso


Deus corporativo há três Pessoas distintas e únicas. O Pai, o Fi-
lho e o Espírito Santo cada um tem a sua própria personalidade
54  a vida comunitária de deus

distinta. Não estou falando aqui de funções ou papéis, mas das


personalidades únicas que os fazem quem Eles são. Cada um
tem as Suas próprias características peculiares, os “traços” per-
sonalizados, se você desejar, que O torna único.
Só por Eles serem um não significa que são o mesmo.
A unidade não significa uniformidade. Na verdade, a unidade
presume a diversidade. Isso significa que dentro do Deus único
existem três personalidades diferentes e distintas, as quais pen-
sam, vivem e atuam como uma entidade. Isso é mais do que
apenas um time. É uma comunidade.

Ela reflete a unidade na diversidade inerente à Trindade


divina de pessoas que de um modo análogo deve caracte-
rizar a vida da Igreja em sua dimensão local, regional,
internacional e universal. Esta comunhão não tem como
alvo vencer toda diversidade, mas abraçá-la no vínculo di-
nâmico, relacional e crescente do amor e da compreensão.
Kevin Giles
What on Earth is the Church? (O que é a Igreja na Terra?)
InterVarsity Press, 1995, p. 202

Mas a questão aqui é que para se ter diversidade deve-se


ter distinção. Todas as Pessoas dentro da Divindade têm as suas
próprias distinções que as fazem únicas. A expressão disso pode
ser vista na criação.
Gosto de observar as pessoas. Às vezes, quando minha es-
posa e eu vamos ao shopping, apenas nos sentamos ali e obser-
vamos as pessoas passarem. Nunca deixo de me admirar como
cada pessoa é individualmente diferente. E estou falando apenas
das suas aparências. Cada pessoa tem a sua própria e única apa-
rência. Não há duas pessoas que sejam exatamente idênticas. É
tão misterioso e, contudo, tão maravilhoso que o nosso Deus
a essência da personalidade  55

possa ter tanta variedade dentro d’Ele para ser capaz de expres-
sá-la em tal criação.
Depois, quando pensamos nos traços e maneirismos pró-
prios da personalidade única de cada pessoa, torna-se até mes-
mo mais maravilhoso. Há literalmente bilhões de pessoas atu-
almente neste planeta e, contudo, cada uma é única. E estamos
falando somente daquelas pessoas que estão vivas hoje! Que tal
os bilhões que vieram antes de nós e aquelas que virão depois?
Pense em todas as pessoas que nasceram desde o princípio.
Cada uma delas é completamente única. Se isso não é motivo
para você louvar o seu Senhor, não sei o que será.
O seu Deus está na singularidade da pessoa. O seu Deus
está na santidade do indivíduo. O seu Deus, obviamente, ama
a diversidade e a variedade. Ele não é um Deus estoico, ma-
çante. Ele ama cores, ama a variedade e ama a vida! Ele criou
você como um indivíduo único. Ele criou você para ser uma ex-
pressão única d’Ele. Você pode apresentar e expressar um lado
d’Ele que ninguém mais pode expressar. O Pai entrou no Seu
Filho e separou uma determinada porção da vida de Seu Filho
e escreveu o seu nome nela! Sim, Ele o escolheu, em toda a sua
singularidade, para ser um dos Seus “santos” para ser amado
por Ele (Ef 1:4). Você foi chamado, escolhido, colocado à parte,
santificado, e então colocado no Corpo de Cristo para cumprir
um grande destino. Esse destino é ser parte da Sua plenitude
(Ef 1:23). Essa plenitude é o Seu Corpo, a expressão d’Aquele
que enche tudo em todos. E somente você pode cumprir o seu
destino específico em sua própria forma única. Você é um dos
muitos “sabores” de Cristo. O sabor único que a Sua vida em
você produz não pode ser reproduzido em ninguém mais.4


4
Ver o livro A Borboleta em Você, deste autor, publicado por esta editora.
56  a vida comunitária de deus

Portanto, podemos ver que a singularidade do indivíduo


é um dos requisitos da personalidade. Uma “pessoa” é alguém
que é diferente e único dentre outros. Contudo, esta é apenas
a metade da história. Sem esta próxima metade a personalidade
nunca existiria.

A Personalidade é Definida
pelo Relacionamento

Como eu disse muitas vezes, dentro do Deus único há três


Pessoas. Elas são coexistentes e coinerentes juntas. A coexistência
delas significa que as três vivem e existem ao mesmo tempo.
Todas as três existem ao mesmo tempo. O Pai não desaparece
para se tornar o Filho, e o Filho não desaparece para se tornar o
Espírito. Todas elas existem todo o tempo.
A coinerência significa que cada um deles vive dentro um
do outro. O Pai está dentro do Filho; o Filho está dentro do Pai;
o Espírito está dentro do Filho. Todos os três vivem dentro um
do outro. Por serem coinerentes, eles são um. Eles estão um no
outro (veja João 14-17).
Eles também se dedicam um ao outro. Isso significa que
cada um depende totalmente dos outros. Eles são muito mais
que uma cooperativa.
Eles não somente cooperam um com o outro, mas de-
pendem completamente um do outro. Nenhum deles atua
sozinho. Sempre que um estiver ocupado em uma atividade,
todos estão ocupados em conjunto. Podemos ver isso na vida
terrena do Senhor Jesus.
Ele fez todas as coisas em nome do Pai (Jo 17:6). Ele falou
as palavras e fez as obras do Pai (Jo 8: 28-29). Ele nunca atuou
sozinho. Ele sempre se movia junto em Sua comunidade. Ele
a essência da personalidade  57

também disse aos fariseus que expulsava demônios pelo Espí-


rito. Aqui novamente vemos os membros da Divindade ope-
rando juntos. Quando Jesus foi batizado por João, vemos toda
a Trindade envolvida. O Filho foi batizado, o Espírito desceu
como pomba e o Pai falou do céu.
Este Deus que temos é um Deus Três em Um. Contudo,
todas as três Pessoas obtêm a sua identidade da comunidade.
Elas não são separadas, indivíduos independentes que fazem
todas as suas próprias coisas individuais. Elas são um coração,
uma mente, uma alma e sempre se movem e atuam em conjun-
to como uma. Cada uma recebe a Sua “personalidade” do Seu
relacionamento com as outras. Sem o relacionamento não ha-
veria pessoas. Isso nos mostra alguns aspectos muito importan-
tes da personalidade em geral. Lembre-se, toda personalidade
origina-se do interior desse Deus Trino.

A Personalidade Está
Enraizada na Unidade

Antes de tudo, podemos ver claramente que a personalida-


de tem um contexto. Não existe algo como uma pessoa que está
em um vácuo. A personalidade tem o seu próprio ambiente. Ela
deve estar enraizada no solo firme da comunidade. Ela deve ser
plantada no terreno sólido da unidade. Somente na esfera da vida
corporativa é que a verdadeira personalidade emerge. Sem rela-
cionamento não pode haver nenhuma personalidade verdadeira.
Uma pessoa sem a comunidade é como um peixe fora da água.

A participação na dinâmica do amor Trinitário, contudo,


não é meramente como indivíduos em isolamento. Antes,
é um privilégio que compartilhamos com todos os outros
58  a vida comunitária de deus

crentes. A atividade do Espírito dentro de nós faz-nos co-


participantes no relacionamento desfrutado entre o Pai e o
Filho. Atuando como mediador deste relacionamento para
nós, o Espírito nos atrai juntos em um povo. Somente no
nosso corporativismo produzido pelo Espírito é que real-
mente refletimos para toda a criação o grande dinamismo
que repousa no coração do Deus Trino.
Stanley J. Grenz
Created for Community (Criado para Comunidade)
Baker Book House, 1998, p. 216

Há muitas cores, como podemos ver em um arco-íris,


mas todas existem dentro da única cor branca. A cor bran-
ca contém todas as outras cores. Podemos comparar o bran-
co com a comunidade. Todas as cores individuais irradiam do
interior da luz branca. Em outras palavras, todas as singula-
ridades das várias cores emanam do interior do ambiente da
comunidade. Sem a luz branca não haveria nada para conter as
cores. Assim, podemos ver deste modo que a comunidade é o
“recipiente” da personalidade.5
O Deus único é o recipiente do Pai, do Filho e do Espí-
rito Santo. As três Pessoas vivem e (juntas) são Deus. O rela-
cionamento delas ou a sua comunidade é o ambiente no qual
elas vivem. Elas vivem dentro de um contexto. Elas vivem em
comunidade e como uma comunidade. A principal atividade
dessa comunidade é a comunhão. A comunhão é o ato de re-
partir, ofertar, relacionar, comunicar e experimentar a sua vida
comum. Essa é a esfera na qual elas vivem. Isso é o que os define
como Pessoas individuais.


5
Ver o livro A Túnica de Várias Cores, deste autor, publicado por esta editora.
a essência da personalidade  59

A Identidade Encontrada
apenas na Comunidade

As pessoas neste mundo estão sempre procurando sua


identidade. “Quem sou eu?” é uma das perguntas mais básicas
que a humanidade sempre fez. Não há dúvida de que, como uma
raça, Adão perdeu a sua identidade. Realmente não temos ne-
nhuma ideia de quem somos. Por isso a busca pela nossa própria
identidade é infindável. Estou falando da identidade individual da
pessoa. Como eu sou único? Como eu sou especial? Como me
destaco da multidão? Você pode ter feito essas mesmas perguntas
a si mesmo. Mas deixe-me dizer que você nunca terá as respostas
a esses tipos de perguntas fora da comunidade. A sua identidade
só pode ser descoberta no ambiente de relacionamento.
Você é um indivíduo único. Contudo, há apenas uma
parte de você que pode conhecer o verdadeiro você. Você não pode
descobrir quem é com a sua mente ou suas emoções. Você só
pode descobrir o verdadeiro você em seu espírito. Paulo disse-
nos isto em 1 Coríntios 2:11. Só o espírito de um homem re-
almente conhece aquele homem. Por quê? É porque o espírito
é a parte de nós que está conectada com Deus. O Espírito de
Deus vive dentro do nosso espírito. Por isso, o nosso espírito
humano é o órgão da comunidade. Ele é o meio pelo qual nos
comunicamos com o Deus Trino.
A personalidade e a identidade só podem ser definidas
pelo relacionamento com outros. Você realmente nunca “se
encontrará” até que esteja vivendo na vida comunitária de
Deus. Então, e somente então, as suas verdadeiras cores apare-
cerão. O que quero dizer com “verdadeiras cores” são aqueles
aspectos de Cristo que foram colocados em você para torná-lo
especial. Estas são as riquezas de Cristo. Você é especial porque
60  a vida comunitária de deus

Deus depositou alguns aspectos únicos d’Ele dentro de você.


Mas aquelas “cores” só podem ser expostas no contexto da vida
comunitária. É somente quando você vive e se relaciona com
outros no Corpo de Cristo que a sua própria singularidade pode
se manifestar. Isso é por causa do propósito e do plano de Deus.
Ele quer Se manifestar por um vaso corporativo. Esse vaso é a
plenitude de Cristo (Ef 1:22-23). Cada indivíduo dentro des-
se vaso expressará ou exporá um aspecto único do Deus vivo.
Juntos todos compõem este novo homem comunitário. Juntos,
como um, eles expressam e aumentam a plenitude de Cristo!
6 A Vinda da Semente

P Portanto, podemos ver claramente que o primeiro ho-


mem chamado Adão falhou completamente em cumprir o
propósito eterno de Deus, que queria um homem comunitá-
rio que expressasse a plenitude da Sua vida e do Seu amor. Já
que o próprio Deus é comunitário, naturalmente, Ele preci-
saria de um homem (raça) comunitário para expressar visivel-
mente o fluir interno da comunhão dentro da Divindade. Esse
propósito foi o de incluir uma imagem (expressão e expansão),
e um reino, para levar a cabo e representar a autoridade de
Deus na Terra.
Isso requeria que a Sua imagem contivesse a Sua vida.
Essa vida divina é corporativa, compartilhada e vivida pelas Pes-
soas na Divindade. Adão falhou em comer dessa vida conforme
figurado na Árvore da Vida. Em vez disso, ele comeu da outra
árvore, que introduziu o veneno da serpente. Esse veneno, em
essência, é a vida do anjo caído que foi injetado no homem. Este
inclui o orgulho, a rebelião, a independência e o individualis-
mo. O homem se tornou uma raça independente, individualista
e não pode mais ser considerado um candidato para conter a
vida comunitária divina de Deus. Assim, ao homem foi proibi-
do o acesso à Árvore da Vida.
62  a vida comunitária de deus

A Falsificação Corporativa

O inimigo de Deus sempre tenta falsificar o que Ele está


fazendo e envia seus pequenos espiões para tentar obter algu-
ma informação “íntima” sobre o que Deus está planejando. Ele
então tenta esmurrá-lO criando a sua própria versão do pro-
pósito eterno de Deus. Ele tem feito isso por toda a história do
homem. Podemos ver que isso aconteceu no Jardim do Éden.
A serpente estava lá só para assegurar-se de que o homem seria
dissuadido do propósito de Deus e fosse dado a ele um pro-
pósito alternativo falso. Ela quis assegurar-se de que o homem
comesse da sua árvore e não da de Deus.
Temos várias “figuras” nas Escrituras sobre o propósito
eterno de Deus. A Árvore da Vida é uma delas. A outra é a edifi-
cação de uma cidade. Quando você considera o livro de Apoca-
lipse, pode ver uma figura do cumprimento do propósito eterno
de Deus. Esse cumprimento é uma cidade: a Nova Jerusalém.
Ela é outra ilustração do homem corporativo contendo e ex-
pressando a vida do Deus.
Deus sempre quis essa cidade. Então o que o inimigo faz?
Bem no princípio, no capítulo quatro de Gênesis, vemos a cida-
de falsa. Caim tem um filho e o chama de Enoque. Este não é o
mesmo Enoque que andou com Deus e era o pai de Matusalém.
Caim então construiu uma cidade e a chamou com o nome de seu
filho, Enoque. Essa cidade era uma falsificação satânica do propó-
sito eterno de Deus. Era Satanás tentando construir a sua própria
versão do homem comunitário. Certamente, ela se extinguiu ao
ser levada na inundação durante o tempo de Noé. O próximo ho-
mem a construir uma cidade foi Ninrode, o filho de Cuxe, filho
de Cam. Na verdade, Ninrode construiu várias cidades, incluindo
aquela chamada Babilônia. Este foi o lugar onde Deus confundiu a
a vinda da serpente  63

língua das pessoas, porque tinham se tornado uma poderosa enti-


dade corporativa sem a vida de Deus (Gn 11:1-9).
Foi a cidade de Babilônia que mais tarde perseguiu e
capturou os judeus. Na verdade, foram os babilônios que tam-
bém destruíram o templo de Salomão em Jerusalém. Vemos
esta cidade emergir mais uma vez no fim da Bíblia para se opor
e matar os santos de Deus (Ap 17:6). Esta cidade é uma figu-
ra do sistema religioso apóstata que é a falsificação da Nova
Jerusalém, a cidade de Deus, a noiva, a esposa do Cordeiro
(Ap 21:9). O sistema religioso apóstata sempre se oporá e per-
seguirá a edificação da cidade verdadeira de Deus. Babilônia
e Nova Jerusalém estão sempre em oposição uma à outra e
estarão até o fim quando a Babilônia cairá e somente a gloriosa
Nova Jerusalém será deixada em pé.
Satanás sempre tentou reproduzir ou falsificar o propó-
sito eterno de Deus tendo o seu próprio homem comunitário.
Contudo, tudo o que ele tem para trabalhar é a raça caída de
Adão, que foi condenada desde o jardim. Este homem corpora-
tivo caído pode apenas expressar a vida pervertida do maligno.
Nunca pode haver verdadeira harmonia e comunhão nesta raça
porque cada indivíduo age por si mesmo. Cada indivíduo está
se afogando em seu próprio egocentrismo e autoabsorção. Este
homem, Adão, é incorrigível como uma raça. Ele não pode ser
consertado ou melhorado. Ele é inclinado a satisfazer os seus
próprios desejos e luxúrias distorcidos. Não há nenhuma espe-
rança para este homem.

A Nova Vida Vem à Terra

O plano de Deus não era salvar a raça de Adão, pois ela era
um caso perdido. Em vez disso, Ele criaria uma raça totalmente
64  a vida comunitária de deus

nova, que seria composta de indivíduos que contivessem a Sua


vida eterna e tivessem provado da Árvore da Vida. Este novo ho-
mem comunitário seria composto daqueles que tivessem saído da
velha raça adâmica e tivessem sido transferidos para a nova raça.
Este novo homem não precisaria apenas conter a vida corporativa
de Deus, mas também teria que viver por esta mesma vida divina.
Deste modo, o propósito de Deus poderia ser cumprido tendo
uma expressão da Sua vida e um representante da Sua autoridade.
Mas isso era possível? Em caso afirmativo se, como?

Portanto, peso as minhas palavras, e quero repetir isso: o


Novo Testamento em sua totalidade está ocupado com uma
coisa (há muitas coisas a respeito da única coisa contida
nele), mas esta é a única: a transição daquela humanidade,
uma classe de seres humanos, para Outra. A Outra que
é Cristo, o Primeiro desta Nova Raça e Ordem de seres
humanos sobre a qual o coração de Deus tem sido colocado
desde o princípio.
T. Austin-Sparks
The Great Transition from One
Humanity to Other (A Grande Transição de
Uma Humanidade para Outra)
Emmanuel Church, 1982, p. 19

Isso somente seria possível se os indivíduos fossem trazi-


dos para fora da raça de Adão e então compartilhassem da Árvo-
re da Vida. Mas - o acesso à Árvore da Vida tinha sido revogado
por Deus depois da queda do homem. Como alguém da raça
de Adão poderia esperar ter acesso a esta maravilhosa árvore da
vida comunitária de Deus? Bem, é exatamente isso. Ninguém
da raça de Adão jamais poderia ter acesso a ela novamente. Ape-
nas alguém de fora da raça de Adão poderia ter acesso a ela.
a vinda da serpente  65

Somente alguém que não tivesse sido tocado pelo veneno da


serpente poderia entrar.
Mas como isso poderia ajudar o resto de nós? Mesmo
se uma pessoa pudesse entrar novamente no jardim, como isso
nos ajudaria a receber a vida de Deus? Estamos todos aqui, fora
do jardim. Como Deus poderia alcançar a Sua expressão corpo-
rativa a menos que houvesse muitos que fossem incorporados
neste novo homem? Não há justamente nenhuma forma de
isso funcionar...
Mas e se...
a Árvore da Vida pudesse andar?
E se a Árvore da Vida pudesse vir a nós?
Isso resolveria o problema da falta de vida. Contudo, não
resolveria o problema do nosso estado caído. Deus nunca nos
permitiria comer daquela árvore enquanto ainda estivéssemos
sob o poder da serpente. Seria extremamente perigoso!

A Solução em uma Semente

A resposta de Deus a este dilema foi enviar a nós a Ár-


vore da Vida na forma de uma Semente. Não é absolutamente
maravilhoso que a solução para o problema de todo o universo
poderia estar contido dentro de uma pequenina Semente?
Satanás injetou a sua natureza no homem, e este caiu do
elevado destino de Deus para ele. A raça adâmica se tornou um
grupo egocêntrico, rebelde, independente de seres que estão
cuidando apenas dos seus interesses. Toda a criação caiu junto
com o homem. A serpente está construindo falsificações. As
coisas estão se tornando cada vez piores enquanto a raça caída
dos homens cai mais e mais no poço. O sistema do mundo
está sob o poder do maligno, e este lugar está uma verdadeira
66  a vida comunitária de deus

desordem. E no meio de tudo isso Deus envia uma Semente


muito pequena! Mas ela não é apenas uma Semente qualquer. É a
Semente da Árvore da Vida. E isso não é tudo. Este Alguém que é
a Semente não é apenas uma semente: Ele é também o Cordeiro
de Deus. Agora você pode estar se perguntando: que benefício
uma Semente e um Cordeiro poderiam trazer para solucionar o
problema do dilema do homem? Apenas espere e veja.

A Vida dentro de uma Semente

Tudo que foi criado por Deus nos mostra um pouco mais
da Sua natureza, propósito e caráter. Quando um artista cria uma
pintura, ele está expressando a si mesmo naquela tela. Ele não
pode pintar sem expressar algo dele. Assim é com Deus e a Sua
criação. Sabemos que todas as coisas foram criadas em e por Cris-
to (Cl 1:16). Isso porque Cristo é a Palavra e a Imagem de Deus
(Jo 1:1; Cl 1:15). Assim o Pai expressa a Si mesmo no Filho, e esta
expressão veio através do Filho na forma da criação. É por isso
que tudo na criação revela mais de Deus a nós (Rm 1:20). Isso
também é verdade na vida de uma semente muito pequena.
Apenas pense em tudo o que está contido dentro da casca
daquela semente muito pequena. Toda a vida daquela árvore –
passada, presente e futura – está contida naquela semente.
Tudo o que a futura árvore um dia será está contido den-
tro da semente. As raízes, o tronco, a casca, os ramos, as folhas,
as flores e o fruto estão todos dentro da semente. A semente é
um microcosmo da “vida da árvore.” E todo o “DNA” da árvore
está contido dentro da casca daquela semente muito pequena.
Tudo o que a semente precisará está contido interiormente. A
vida interior de uma semente é realmente admirável!
a vinda da serpente  67

E também há um futuro a ser considerado. Aquela se-


mente muito pequena um dia crescerá e será uma grande ár-
vore. A árvore produzirá ramos, folhas, flores e fruto, e dentro
desse fruto haverá muitas novas sementes que contêm a mesma
vida da árvore. Haverá potencialmente muitas novas árvores
contidas dentro da vida de cada uma daquelas novas sementes.
Assim você poderia até dizer que ali dentro de cada uma daque-
las sementes estão contidas muitas novas árvores, porque cada
nova árvore produzirá mais fruto, que conterá mais sementes.
Por isso talvez agora você possa apreciar a glória de uma
pequenina semente. E, contudo, este é apenas um quadro débil
e fraco do seu Senhor.

O Pai Envia a Semente

O Pai celestial enviou a Semente de Seu Filho para ser


plantada na Terra. O Filho contém toda a vida do Pai e do Espíri-
to dentro d’Ele (Cl 2:9). Na verdade, Ele é a Árvore da Vida em
forma de semente. O Pai enviou a Árvore da Vida ao homem.
Mas o homem também estava caído. Ele não necessitava
apenas da vida divina, mas de redenção. Por isso o Pai não en-
viou apenas a Árvore; também enviou o Cordeiro. Seu Filho
não é apenas a Árvore da Vida; também é o Cordeiro de Deus.
O homem precisava de redenção e de vida se fosse andar à ima-
gem de Deus e cumprir o seu destino.
Mas, por favor, não entenda mal. O plano de Deus não
era salvar a raça de Adão. Seu plano era aniquilar essa raça. A
raça do primeiro Adão foi condenada à extinção. O plano de
Deus era salvar alguns indivíduos da raça de Adão para serem
introduzidos em uma criação inteiramente nova.
7 Vida dentro
da Semente

“E o Verbo [Palavra] se fez carne…” (Jo 1:14)

N Nunca deixarei de me maravilhar com o fato de Deus se


fazer homem. Essa é uma parte tão gloriosa do nosso evangelho,
mas precisamos perguntar-nos: por que Deus se fez homem?
Certamente a resposta “cristã” popular seria: para nos salvar dos
nossos pecados. Mas esta resposta em si mesma está destituída
da glória de Deus. É verdade que Jesus realmente nos salvou
dos nossos pecados, mas isso responde ou mesmo começa a to-
car a superfície do por que Deus se fez homem?
Outra resposta típica a esta pergunta é que Deus se fez
homem para que Ele pudesse se relacionar e entender a huma-
nidade e o que os seres humanos sofrem. Embora ela ainda seja
insuficiente, é muito melhor e chega mais perto do âmago do
propósito eterno de Deus. Todavia, os cristãos ainda esquecem
um ponto principal: Jesus Cristo ainda é um homem. Se Ele
veio somente para nos salvar dos nossos pecados e para ser ca-
paz de se relacionar com os nossos problemas, então depois da
encarnação, crucificação, ressurreição e ascensão, por que não
70  a vida comunitária de deus

voltou a ser Deus (divino) apenas? Permanece o fato de que Ele


ainda é, hoje, agora mesmo, tanto humano como divino.
A Palavra (Verbo) se fez homem para que tanto o homem
como Deus possam ser um. Deus entrou no homem para que
este pudesse entrar n’Ele. Lembra-se do nosso termo “coine-
rência”? Para que duas coisas se tornem uma, ambas têm de
viver uma na outra. O Pai e o Filho são um porque ambos vi-
vem um no outro. Isso só poderia acontecer se Deus se fizesse
homem. Deus precisava entrar no homem.

A Comunhão Comunitária
dentro da Semente

Mas como Deus poderia viver dentro de um corpo huma-


no? Jesus disse-nos que Deus é Espírito (Jo 4:24). Aqueles que
querem entrar em contato com Deus devem fazê-lo em espírito,
porque Ele é Espírito. A natureza e o método de contato devem
combinar com Aquele que é contatado. Se você quer falar com
um guarda florestal, terá que entrar na floresta. A floresta é a “es-
fera” na qual ele vive. O espírito é a esfera na qual Deus vive. Se
você quiser contatá-lO, deve entrar na esfera chamada “espírito”.
Deus deu a você um espírito humano. Esse espírito vem
e combina com a esfera na qual Deus vive. Este é o lugar dentro
de você onde Deus vive. Este é o Seu “tabernáculo” dentro de
você.6 Quando o Senhor Jesus andou sobre a Terra na forma
humana, Ele também tinha um espírito humano. Este é o lugar
dentro d’Ele onde Deus vivia. A plenitude da Divindade vivia
n’Ele. Isso significa que o Pai, o Filho e o Espírito vivem dentro
do Seu corpo humano, dentro do Seu espírito humano. Eles


6
Ver o livro The Temple Within (O Templo Interior), deste autor, que em
breve será publicado por esta editora.
a vida dentro da semente  71

não apenas vivem ali, mas estão tendo comunhão íntima um


com o outro dentro do espírito humano do seu Senhor. Eles
estão vivendo a vida comunitária dentro do corpo humano de
Jesus de Nazaré. Eles estão tendo comunhão um com o outro
dentro do espírito do seu Senhor.
O Senhor Jesus nos deu “dicas” sobre essa comunhão en-
quanto esteve aqui na Terra. Provavelmente podemos ver isso
mais claramente no evangelho de João. Ele nos disse que o Pai
Lhe falava constantemente e Lhe mostrava coisas. Essas coisas
eram a revelação do próprio Pai (Jo 5:19-20). Jesus fez as coisas
que o Pai Lhe deu para fazer através e no poder do Espírito Santo.
Lucas nos diz que Ele foi cheio do Espírito Santo e foi conduzido
pelo Espírito (4.1). Por isso podemos ver claramente o Deus Tri-
no dentro do espírito humano de Jesus de Nazaré.
Quando Ele falava, não falava em um vazio. Ele não apa-
nhava palavras no ar. Ele falava da Sua experiência profunda
dentro da Divindade na eternidade passada. O Pai, o Filho e o
Espírito estiveram gozando da comunhão um com o outro por
um longo tempo. Quando Jesus falava, falava daquela história
rica e fantástica. Ele falava a partir da Sua própria esfera e con-
texto. Quando Ele nos disse que era o Bom Pastor, foi porque
o Pai já tinha sido o Seu Bom Pastor. Quando Ele nos disse que
era a Videira verdadeira, foi porque Ele já tinha experimenta-
do o Pai como Sua Videira e Ele era o Ramo. Tudo que Ele
nos disse saiu da Sua experiência da comunhão da Divindade. E
agora, enquanto Ele estava na Terra, ainda estava tendo comu-
nhão com a Sua Comunidade dentro do Seu próprio espírito
humano! A comunhão continua dentro da Semente.

A Expressão Prática da Comunhão

A vida humana do homem Jesus foi uma expressão prática


da vida de Deus. Como vimos em Gênesis, o propósito de Deus
72  a vida comunitária de deus

na criação do homem foi ter uma imagem (1.26). O Deus invisí-


vel quer fazer-se visível. Embora seja Espírito, Ele quer fazer-se
visível. Embora seja Espírito, Ele quer ser expresso visivelmente
neste reino físico. Jesus Cristo, a Semente, veio para cumprir o
propósito de Deus de ter uma expressão visível, ou imagem.
A comunhão comunitária da Divindade vivia e fluía den-
tro do espírito humano de Jesus de Nazaré. Isso era evidente
em tudo o que Ele disse e em tudo o que fazia. Contudo, em
geral, a cristandade perdeu este ponto tão importante. Não con-
seguimos ver este fluir mais profundo, essencial da Comunida-
de de Deus dentro d’Ele. Aqui, mais uma vez, é por causa do
nosso estado caído. Sempre “individualizamos” tudo. Sempre
centramos tudo em torno do nosso próprio ego independente.
Sempre vemos as Escrituras do nosso próprio ponto de vista
individualista.
O evangelho de João é especialmente claro em nos mos-
trar como Jesus viveu a Sua vida na comunhão do Deus Trino.
Ele compartilhou essa vida comunitária de forma especial com
os discípulos nos capítulos 14 a 17 de João.

A Casa do Pai

Em João 14 Jesus fala com os Seus seguidores sobre a


casa de Seu Pai. Ele lhes diz que está indo preparar um lugar
para eles na casa do Pai para que onde Ele estiver eles possam
estar também. Obviamente, o próprio Cristo também vive na
casa do Pai! Ele então continua explicando que o Pai vive n’Ele
e Ele vive no Pai e que a forma pela qual eles conhecerão e verão
o Pai é conhecendo e vendo a Ele. Esta figura da “casa” é outra
descrição da vida comunitária de Deus. O propósito de Deus é
a vida dentro da semente  73

cumprido por ter uma casa ou família de filhos que expressem


a Sua glória e representem a Sua autoridade.
Então Ele começa a lhes falar sobre o Espírito Santo. Este
Espírito da verdade (ou realidade) habitará com eles, mas tam-
bém estará neles. Isso está no versículo 17. Então no versículo 18
Ele diz que não os deixará como órfãos, mas virá a eles. Você vê
a unidade da Trindade aqui? Nos versículos 16 a 21 Ele fala da
Sua Comunidade em termos intercambiáveis. Toda essa passa-
gem exala a unidade do Deus Trino.
Depois, no versículo 23, Ele nos diz que a Comunidade
virá para o interior do crente e fará o Seu lar dentro dele. Nesta
passagem em particular Ele está falando do Pai e d’Ele, mas bem
antes (versículo 17) Ele nos disse que o Espírito também viria
para viver em nós. Certamente, já que a Divindade é uma, se uma
Pessoa vier para viver em nós, as outras vêm junto com Ela.

A Videira

No capítulo 15 Jesus nos descreve a vida dentro de Deus.


Esta comunhão dentro da Divindade é como uma videira. O Pai,
o Filho e o Espírito Santo são todos ramos em uma mesma vi-
deira. Eles estão todos conectados como uma planta. Todos eles
extraem a mesma água. Todos eles respiram a mesma vida. Aqui
vemos uma bela figura da Árvore da Vida. Esta figura da vida co-
munitária de Deus está sendo descrita por Jesus. Esta figura está
sendo descrita pela Semente. E dentro daquela Semente estão
contidas todas as coisas para que a Árvore da Vida volte à Terra.
Como sei que a videira descrita por Jesus neste capítulo
é a Árvore da Vida no jardim? Simples, esta mesma árvore (vi-
deira) é descrita em Apocalipse 22. Ali João (o mesmo homem)
74  a vida comunitária de deus

nos diz que a Árvore da Vida cresce nos dois lados do rio da
vida (versículo 2). O único tipo de planta que pode crescer nos
dois lados de um rio é uma videira. Portanto, a Árvore da Vida é
uma videira. Tratando-se de uma videira, algumas vezes é muito
difícil dizer onde o “tronco” principal termina e os ramos co-
meçam. Esta é a unidade do nosso Deus.
Jesus está nos dizendo que Ele é a videira genuína (ver-
dadeira) e nós somos os ramos. Está nos dizendo que Ele é a
nossa fonte e provisão de vida e tudo o que precisamos para o
crescimento da vida. Sem Ele não podemos fazer nada. Isso é
realmente maravilhoso porque Jesus também disse isso sobre
Si mesmo em João 5:19. Assim, agora podemos ver a correla-
ção. Justamente como o Filho depende do Pai para a Sua pro-
visão de vida, assim dependemos do Filho para a nossa provisão
de vida. O relacionamento do Pai e do Filho é a base do nosso
relacionamento com Cristo (Jo 6:57). Relacionamo-nos com
Cristo assim como Ele se relaciona com o Pai. Ele é a nossa
Árvore. Ele é a nossa Videira. Ele é a fonte e provisão de toda
a vida para nós, os ramos.

O Homem Comunitário

No capítulo 16 de João mais do relacionamento glorio-


so dentro do Deus Trino é revelado. Nos capítulos anteriores
o nosso Senhor nos disse que Ele não fazia nada sozinho. Ele
tomou tudo o que tinha recebido do Pai e depois nos repassou.
Nos versículos 12 a 15 Ele nos diz que o Espírito da verdade (ou
realidade) virá e nos guiará a toda a verdade. Tudo o que Espí-
rito ouve Ele fala. Ele toma tudo o que é de Cristo e depois nos
dá. Este não é um belo relacionamento? O Senhor se tornou
o Espírito Vivificante para que pudéssemos receber Sua vida
a vida dentro da semente  75

em nosso espírito (1 Co 15:45). A finalidade disso é produzir o


novo homem. Esta é a comunidade que Deus pretendia ter com
o primeiro Adão.

A nova criação já está presente na velha, mas ainda está


esperando o seu cumprimento total. Esta nova criação não
é apenas uma versão reformada do homem. Ela é o pri-
meiro passo de um processo que eventualmente resultará
na renovação de toda a ordem criada.
Hal Miller
Biblical Community: Biblical or Optional?
(Comunidade Bíblica: Bíblica ou Opcional?)
Ann Arbor Servant Books, 1979, p. 45

Em João 16:22 Jesus narra aos discípulos uma curta pará-


bola. Eles estavam preocupados e tristes porque Ele precisava ir.
Então Ele os compara (os Seus seguidores) a uma mulher que
está para dar à luz. Ela sofre dores durante o parto, mas depois
se esquece da dor e se alegra porque um ser humano veio ao
mundo. Mas quem é esta pessoa que nascerá através dos e nos
seguidores de Cristo? É o próprio Cristo! Ele nasce e amadure-
ce dentro de cada crente. Deus terá a Sua imagem corporativa.
Ele terá o Seu homem corporativo, o Corpo de Cristo, o Cristo
corporativo, a Comunidade de Deus!
8 O Plantio
da Semente

“Em verdade, em verdade vos digo: se o grão de trigo, cain-

A
do na terra, não morrer, fica ele só; mas, se morrer, produz
muito fruto” (Jo 12:24).

A Semente da Árvore da Vida veio à Terra na forma de


um homem. Ele viveu a Sua vida humana por 33 anos. Ele rea-
lizou as obras que o Pai Lhe deu. Ele executou tudo isso através
do Espírito Santo. Ele expressou o Seu Pai perfeitamente. Ele
veio e expressou o nome do Pai, que é a Sua Pessoa.
A Semente continha toda a plenitude da Divindade. Na
verdade, agradou a Deus que a Sua plenitude habitasse dentro
de Cristo (Cl 1:19). Dentro dessa Semente habitava a perfeita
humanidade e a plenitude de Deus. A vida comunitária de Deus
estava sendo vivida dentro dessa Semente. Todos os atributos de
Deus – a Sua santidade, a Sua justiça, a Sua graça, a Sua verdade,
a Sua fidelidade, o Seu amor, a Sua paz, a Sua alegria, a Sua mi-
sericórdia –, e muito mais, eram encontrados plenamente den-
tro dessa Semente. Todas as realizações de Deus – a criação do
mundo visível e invisível, o chamamento e o envio de Seu Filho,
o sacrifício do Cordeiro, a derrota do diabo, a abolição da morte,
78  a vida comunitária de deus

do pecado e da velha raça –, e muito mais, estavam contidas den-


tro desda pequena Semente. Ela era verdadeira e completamente
a Árvore da Vida. Contudo, essa Semente ainda era apenas um
grão de trigo. Ela ainda era apenas uma Semente individual.

A Necessidade do Plantio

Um grão de trigo sozinho nunca poderia expressar a vida


comunitária de Deus. Era preciso haver uma comunidade de
“sementes” para expor a vida comunitária interior de Deus.
Sabemos que uma árvore pode produzir o fruto que con-
terá muitas sementes. E toda árvore começa como uma semen-
te. Então essa Semente que veio do Pai poderia se multiplicar
e produzir muitas sementes? Cada semente precisaria conter a
mesma vida da única Semente. Cada nova semente precisaria
conter a Árvore da Vida para que pudesse alimentar-se da vida
da Árvore. Mas a vida não é a única questão aqui. A raça hu-
mana tinha caído. A antiga serpente tinha injetado seu veneno
em Adão. Se alguns fossem sair da velha raça, teriam que ser
transferidos por um processo chamado de redenção e regenera-
ção. Eles teriam que ser libertados da escravidão do diabo e das
consequências da sua influência. Eles precisariam de uma saída
de uma raça e de uma entrada em outra, a nova raça.

A Semente que É um Cordeiro

Essa Semente que veio do céu não é uma semente co-


mum. Ela também é um Cordeiro inteiramente puro. De um
modo geral, Ele veio para fazer duas coisas. Há o lado negativo
e há o lado positivo.
o plantio da semente  79

Do lado negativo havia a redenção, que era uma necessi-


dade do homem. O homem tinha sido envenenado pela serpen-
te, por isso o Filho do Homem precisava ser levantado como
a serpente de bronze no deserto (Jo 3:14). Os filhos de Israel
tinham pecado contra o Senhor falando contra Deus e Moisés.
Por esse motivo Deus enviou cobras venenosas para o meio do
povo e muitos foram mordidos. O povo voltou-se para o Se-
nhor e arrependeu-se; então Deus disse a Moisés que tomasse
uma serpente de bronze e a colocasse em uma longa vara para
que todo o povo pudesse vê-la. Se a serpente mordesse alguém,
tudo o que ele teria que fazer era olhar para a serpente de bronze
e ele viveria (veja Números 21:5-9).
Esta é uma bela figura do Senhor Jesus Cristo e da Sua
obra redentora. Para Deus Ele Se tornou o Cordeiro sacrificial
que tiraria os pecados do mundo. A exigência do Pai era um
sacrifício de sangue. Alguém teria que pagar pelas ofensas co-
metidas pela raça caída. Deus precisava de um Cordeiro para
satisfazer a Sua justiça e santidade. Mas o homem precisou de
uma serpente. A raça caída de Adão tinha sido envenenada pelo
veneno do diabo, Satanás. A serpente de bronze que Moisés le-
vantou no deserto é um tipo de Cristo. Ele veio em “semelhan-
ça” da carne pecaminosa para redimir aqueles que tinham sido
envenenados pela serpente. Quando olhamos para Ele, somos
libertos do veneno e recebemos o “antídoto” que é a Sua vida.
Observe então que a Semente não é apenas um Cordeiro, Ele é
também a serpente de bronze.
Do lado positivo está o elemento que Adão nunca re-
cebeu – a vida de Deus. Para que o homem cumprisse o Seu
propósito, ele não devia ser apenas redimido, mas também pre-
cisava receber a vida divina da Árvore da Vida. Assim o Senhor
Jesus Cristo veio como a Semente para que pudéssemos ter vida
80  a vida comunitária de deus

eterna (divina), vida em abundância. A redenção precisava ser


realizada primeiro, e a Árvore da Vida precisava ser suspensa na
árvore da morte para que pudéssemos ter vida.
A vida veio através da ressurreição da Semente. O grão de
trigo precisava cair na terra para liberar o elemento divino den-
tro da Sua dura casca. Uma semente contém potencialmente
todas as partes e a vida da árvore. Contudo, essa vida não pode
ser liberada se a casca exterior da semente não for quebrada.
A semente deve ser plantada na terra e depois exposta aos ele-
mentos.7 Então, os ingredientes do solo operam na demolição e
amolecimento da dura casca que envolve a semente.
Cristo foi para a cruz não apenas por causa dos nossos
pecados, mas também para glorificar o Pai (Jo 12:27-28). Mas
como Deus poderia ser glorificado pelo fato de Seu Filho ir para
a cruz? Foi através da morte que a Semente foi quebrada e a vida
divina do Deus Trino jorrou. Um grão de trigo se tornou mui-
tos grãos através da ressurreição. Foi na vida de ressurreição, a
vida que havia conquistado a morte, que a nova raça foi criada.
Os muitos grãos se tornaram um pão (1 Co 10:16-17). Todos
nós participamos deste pão, que é Cristo.
A não ser que um grão de trigo caia na terra, ele perma-
nece só. Cristo é o Primogênito de muitos irmãos (Rm 8:29).
A Semente não podia permanecer sozinha. Uma Semente so-
litária não pode expressar a plenitude do Deus corporativo. Ele
precisou de um homem corporativo para cumprir o Seu propó-
sito. Embora o homem Jesus contivesse a plenitude do Deus
Trino, Ele não poderia expressar a plenitude como um homem
único. Era necessário todo um corpo completo de pessoas para
isso (Ef 1:22-23).

7
Aqui o autor refere-se aos elementos básicos da natureza: terra, água, ar e
fogo (N. do T.).
o plantio da semente  81

A Semente Plantada em Nós

Jesus proferiu várias parábolas concernentes a sementes e


a semeadura. Em Marcos 4 Ele compartilha sobre as parábolas
dos semeadores da palavra, o semeador do campo e a semente de
mostarda. Em todas essas histórias o ponto principal é o mesmo.
Agora que a Semente passou pelo plantio (na crucifica-
ção), Ele também Se tornou o Semeador. A Semente que Ele
semeia é Ele mesmo, isto é, a Sua própria vida divina. O desejo
de Deus é dispensar a Si mesmo no homem para que este possa
expressá-lO. O Pai planta a Semente do Seu Filho em nós quan-
do inicialmente cremos n’Ele e somos salvos. Esta é a Semente
da Árvore da Vida. A Semente se tornou uma Árvore.
O Pai rega e fertiliza essa Árvore para que se torne forte
dentro de nós. A Árvore é plantada dentro de nós para que co-
mamos dela e vivamos por ela. Não devemos viver pela nossa
própria vida humana, mas sim pela “árvore-vida” dentro de nós.
Desta forma, Deus obterá a Sua imagem, a Sua expressão e o
Seu domínio sobre a Terra.
9 O Segundo Adão

“O primeiro homem, formado da terra, é terreno; o segun-


do homem é do céu” (1 Co 15:47).

C
A Restauração da Imagem Corporativa

Como afirmei muitas vezes, já que o nosso Deus é co-


munitário (três em um), a Sua imagem ou expressão também
deve ser comunitária. Entretanto, essa imagem não pode ser a
humanidade dentro de si mesma. Se isso fosse verdade, então
a imagem seria uma mera “fotocópia” do original e de modo
nenhum o que Deus tinha em mente.
A única forma de Deus ter a Sua verdadeira imagem seria
em dois aspectos da vida. Primeiro, o homem teria que receber
a vida divina de Deus dentro dele como tipificado pela Árvore
da Vida. Segundo, o homem teria que ser colocado dentro da-
quela mesma vida. Assim, seria necessário que a vida estivesse
nele e que ele estivesse na vida. Isso aconteceu por meio da cru-
cificação e ressurreição do Senhor Jesus Cristo. Na ressurrei-
ção Cristo Se tornou o Filho Primogênito de Deus (Rm 8:29).
Certamente, Ele sempre foi o Filho Unigênito de Deus, mas na
ressurreição tornou-Se o Filho Primogênito.
84  a vida comunitária de deus

Ele Se multiplicou através da ressurreição. Um Grão de


Trigo se tornou muitos grãos. Ele Se tornou o Filho Primogê-
nito para que Deus pudesse ter muitos filhos. Os muitos filhos
(ou grãos) vieram a existir n’Ele e através d’Ele. Ele executou
o velho homem, a velha raça adâmica na cruz e então levantou
o novo homem, o segundo Adão, através da ressurreição. Ele
colocou a Sua vida neste novo homem e colocou este novo ho-
mem na Sua vida. Isso o fez um com Ele. Isso constituiu a Sua
expressão ou corpo. O novo homem foi composto de Cabeça
e corpo. Jesus Cristo é a Cabeça e os remidos são o Corpo. Na
verdade Ele é a Cabeça e o Corpo, visto que tudo está no am-
biente da Sua vida (Cl 1:18; 1 Co 12:12).

A Região “em Cristo”

Quando fomos colocados em Cristo, nós fomos coloca-


dos na Imagem de Deus. O Próprio Cristo é a imagem de Deus
(Cl 1:15). Este é o segundo Homem, a imagem corporativa res-
taurada. Todos aqueles que são membros de Cristo recebem a
Sua vida como a Árvore da Vida. Você está começando a per-
ceber a figura? Uma árvore tem ramos, não apenas um tronco.
Uma videira tem ramos, não apenas uma videira principal (ou
tronco). A Árvore da Vida é o tronco e os ramos. O segundo
Homem é a Cabeça e o Corpo.
Estou falando aqui do Cristo corporativo, não do Cris-
to pessoal. Alguns podem nunca ter visto este termo antes: o
Cristo corporativo. Muito embora a frase em si não esteja nas
Escrituras, a revelação definitivamente está ali. Paulo nos diz
que Cristo é a Cabeça do Corpo, a Igreja (Cl 1:18). Também
sabemos que Cristo igualmente é os verdadeiros membros
do Corpo (1 Co 12:12). Por essa razão, Paulo refere-se a este
o segundo adão  85

novo Homem completo (Cabeça e Corpo) como o Cristo


(Cl 3: 9-11).
O Cristo corporativo é o cumprimento do propósito eter-
no de Deus de ter uma expressão visível (imagem) d’Ele na Terra.
O Cristo corporativo é a Árvore da Vida. Assim como Ele é a Ca-
beça e nós somos o Corpo, Ele também é a Videira e nós somos
os Ramos. Esta é outra figura de Cristo e a Igreja. Nós, como os
ramos-membros, recebemos de Cristo, que é a Videira-Cabeça,
a vida divina de Deus. Ele é a nossa Vida e Provisão do Pai. Esta
união orgânica entre a Videira e os ramos é o que possibilita a
expressão. Não somos nós que estamos sendo expressos, mas o
Próprio Deus, porque é a Sua vida que flui através dos ramos.

Da perspectiva de Deus, Cristo não é mais uma pessoa


única. Ele é uma pessoa corporativa; Cristo e a igreja são
uma realidade única. A igreja é a metade de baixo de Jesus
Cristo. A ideia de Paulo não é que a Cabeça é de alguma
maneira parafusada ao corpo. Sua ideia é de que Cristo
personifica a igreja. O Cristo ressurreto é uma persona-
lidade viva, inclusiva, “mais que individual”. A igreja é
uma entidade corporativa composta de diversos indivíduos.
É uma pessoa vivendo e expressando a Ele mesmo através
dos Seus muitos membros.
Frank Viola
From Eternity to Here
(Da Eternidade até Aqui)
David C. Cook, 2009, p. 267

Deus nos colocou em um mundo ou esfera inteiramente


nova. Este novo ambiente é Seu Filho. Vivemos, respiramos e
nos movemos n’Ele. O Segundo Adão é uma raça completamen-
te nova. Este Homem é uma nova criação, uma nova espécie.
86  a vida comunitária de deus

Ele é composto de ambos, Deus e Homem. Ele é composto de


ambos, divindade e humanidade. Deus e o homem foram fun-
didos juntos como um em Cristo. Ele é o tabernáculo, o lugar
onde Deus e o homem se encontram. Ele é ambos, Filho de
Deus e Filho do Homem. A plenitude da deidade habita n’Ele.
A plenitude da humanidade não caída também habita n’Ele. Ele
reconciliou os dois pela Sua encarnação, vida humana, morte,
ressurreição, ascensão e entronização. A Sua vida e obra abriram
o caminho para o propósito eterno de Deus ser cumprido.
Agora há um ambiente, uma atmosfera onde o novo ho-
mem pode viver. Esse novo homem tem o seu próprio sistema
de subsistência de vida exclusivo. Ele precisa do seu ambiente
para satisfazer certas condições. Ele precisa de um tipo particu-
lar de ar para respirar. Ele precisa de certo clima e certa tempe-
ratura. Ele precisa obter certos nutrientes da sua comida e bebi-
da. Isso significa que apenas uma determinada comida e bebida
fornecerão os nutrientes necessários. Todas essas questões de
suporte de vida estão providas neste ambiente perfeito.
O ambiente é Cristo. Ele é a mistura perfeita de Deus e
Homem. Ele é o segundo Homem, que é Espírito vivificante (1
Co 15:45). A palavra ‘espírito’ é pneuma no grego e literalmente
significa respiração ou ar. Ele é o ar que respiramos. Ele é a nossa
respiração. Ele é o nosso oxigênio.

O Sopro do Espírito

Depois que ressuscitou, Jesus apareceu diante dos discí-


pulos, soprou sobre eles e disse: “Recebei o Espírito Santo” (Jo
20:22). Seu sopro é o Seu Espírito. É isso que sai d’Ele e entra
em nós. Ele disse aos discípulos que o Espírito estava com eles
e logo estaria neles (Jo 14:17). Isso é Deus se dispensando no
o segundo adão  87

homem. Com o Espírito viria o Pai e o Filho porque Eles são


um e inseparáveis.
Como vimos desde o princípio, Deus sempre quis dis-
pensar a Si mesmo no homem. O Deus Trino sempre quis
derramar-se no homem com o propósito de que o homem ex-
pressasse a Sua vida comunitária. Essa vida comunitária é a Sua
“glória” e esplendor. É tudo o que Ele é e tudo o que Ele faz.
Este Deus comunitário que vem até nós em Seu Espírito
é, em essência, o Deus Trino que nos está disponível. Ele nos dá
um espírito humano e então Se coloca à nossa disposição, vindo
a nós em Espírito. Agora podemos recebê-lO em toda a Sua
plenitude. Agora podemos recebê-lO em toda a Sua glória. Isso
estabelece a etapa do Seu plano a ser posto em movimento. A
vida foi dada, derramada, sacrificada e então ressuscitada. Este é
agora o Segundo Adão, que é o Espírito vivificante (1 Co 15:45).
Mas que vida Ele nos dá? É a vida divina, a vida eterna, a vida de
Deus, a vida comunitária. Contida dentro dessa vida está toda a
história e a experiência da comunhão da Divindade! Ele dispen-
sou toda a Sua experiência como Comunidade em nós.
A Sua vinda como a Semente e a formação do Segun-
do Adão deu a tudo um novo começo. Esta é a nova criação
no novo homem, mas ainda precisava amadurecer para crescer
n’Ele em todas as coisas. A medida da estatura da plenitude de
Cristo era algo que ainda precisava ser trilhada e vivida na Terra
(Ef 4:13). Esta seria a expressão da plenitude da vida comunitá-
ria de Deus.
10 A Unidade de Deus

“... a fim de que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em


mim e eu em ti, também sejam eles em nós; para que o
mundo creia que tu me enviaste” (Jo 17:21).

P
A Unidade Determinada pela Posição

Podemos ver claramente em João 17 que a unidade é


determinada pela posição. O fato de o Pai estar no Filho e de
o Filho estar no Pai determina a unidade d’Eles. Eles são um
porque estão um no outro. Isso não é apenas uma mera união, é
unidade. União é apenas um acordo entre pessoas, mas unidade
é uma coinerência real entre pessoas. A coinerência é a experi-
ência de pessoas que vivem uma dentro da outra.
O Pai vive dentro do Filho. O Filho é a casa do Pai, ou o
lugar de habitação. Esta é uma posição ou lugar real (espiritual-
mente falando) onde o Pai vive. Não estou falando aqui de uma
mera habitação teórica. Este é um verdadeiro viver interior. O
Pai vive dentro do Filho. O Filho vive dentro do Pai. Ambos vivem
dentro do Espírito.
Deus está muito preocupado com o “em”. Você já notou
isso lendo as Escrituras? Em é uma grande palavra para Deus,
90  a vida comunitária de deus

porque é a “interiorização” que determina a “unidade”. Se as


coisas estiverem “em”, então elas são “uma”. Por exemplo: Ele
diz que os “dois serão uma só carne”. Como isso é realizado?
Como podem dois corpos se tornarem uma carne? Por estarem
“em”. A mulher foi tirada do homem. O homem e a mulher
estavam originalmente no mesmo corpo. Então Deus tirou Eva
do lado de Adão. O um se tornou dois. Então Adão entrou em
Eva e os dois se tornaram uma só carne novamente. Esta é a
figura da unidade.

A “Interiorização” Determina a “Unidade”

Deus sempre quis viver dentro do homem. O em sempre


foi importante para Ele. Podemos ver claramente este Seu dese-
jo em todas as Escrituras. Ele sempre construiu coisas para viver
nelas. Havia a arca, o tabernáculo e o templo. Estes são sombras
ou tipos do verdadeiro lugar em que Ele quer habitar, isto é,
dentro do homem. Ele sempre quis dispensar a Si mesmo no
homem. Por Ele habitar no homem e o homem habitar n’Ele,
este “habitar” mútuo traria a unidade entre Deus e o homem.

Participando da Unidade da Divindade

Em João 17 nosso Senhor orou para que a unidade or-


gânica do Deus Trino fosse compartilhada pelos Seus seguido-
res. Essa unidade foi possibilitada quando fomos colocados em
Cristo (Jo 17:23). A nossa união orgânica com Cristo possibili-
tou a nossa unidade com a Divindade.
Estamos dentro do Filho. O Filho está no meio da Divindade.
Fomos feitos um com o Deus vivo! O Pai, o Filho e Espírito estão
a unidade de deus  91

tendo comunhão gloriosa um com o outro. Eles estão amando


um ao outro. Eles estão compartilhando a vida um com o outro.
Eles estão desfrutando um do outro.
Mas, querido irmão(ã), onde está você? Você está em Cris-
to. Você e eu estamos bem ali no meio da comunhão d’Eles por
causa da nossa “unidade” com o Filho. Fomos feitos um dentro
da unidade d’Eles porque Cristo está em nós e nós estamos n’Ele
(Jo 17:20-21). O estar em nos torna um.
Mas como isso funciona? Em primeiro lugar, precisamos
entender que o Filho é perfeitamente um com o Pai (Jo 17:21).
Esta é uma unidade perfeita e constante. Em segundo lugar, o
Filho veio habitar em nós (Jo 17:23). “Eu neles.” Quando Ele
vem habitar em nós, traz a Sua unidade perfeita com o Pai (ver-
sículo 23). “Vós em Mim.” Esta unidade é introduzida pela dá-
diva da vida eterna (Jo 17:2).
“Eu neles e Tu em Mim, para que eles, tendo sido trazi-
dos para o estado de perfeição com respeito à unidade, possam
persistir neste estado de perfeição” (João 17:23 – Tradução Ex-
pandida do Novo Testamento, de Kenneth Wuest).
Não somos um apenas com o Pai, um com o Filho e um
com o Espírito, mas somos também um com a Divindade.8 Somos
um n’Eles. Somos um n’Eles corporativamente. Somos um na
comunhão d’Eles. Somos um na comunidade d’Eles. Somos um
na atividade d’Eles. Somos um no regozijo d’Eles, um no amor
d’Eles, um na doação d’Eles. Somos um na unidade d’Eles.


8
Aqui, evidentemente, o autor refere-se à nossa unidade orgânica com a
Divindade; não se trata de unidade em natureza. Somente a Trindade de
Deus tem a natureza e é Divina. Nós, como homens, temos a natureza
humana e assim permaneceremos eternamente. O Deus Trino, em Jesus
Cristo, se fez homem e apenas este Homem tem a natureza Divina. Todos
os demais homens, mesmo que redimidos pela Sua obra, podem apenas
por graça participar organicamente da Divindade (N. do T.).
92  a vida comunitária de deus

Isso não significa que somos pequenos deuses. Não com-


partilhamos da Sua deidade. No entanto, somos um com Ele.
Isso significa que compartilhamos da Sua vida, natureza, comu-
nhão e comunidade.
Isso também significa que a oração de Jesus em João 17
já foi respondida pelo Pai. Foi respondida no dia da Sua ressur-
reição, quando Ele soprou sobre os discípulos e eles receberam
o Espírito Santo. Através da Sua ressurreição o seu Senhor Se
tornou o Espírito vivificante (1 Co 15:45) que soprou a Sua vida
sobre os Seus seguidores. Quando isso aconteceu, os discípu-
los se tornaram um com Cristo e, assim, um com a Divindade.
Através da ressurreição Ele Se tornou disponível a nós pelo Es-
pírito. Agora podemos recebê-lO em nós quando nos voltamos
para Ele e cremos. A Sua oração por unidade foi respondida.
Certamente, a questão agora é a manifestação prática da expres-
são da unidade na Terra.

Assim, alguém precisa avançar apenas três versículos na


Bíblia para descobrir o que é amplamente ensinado no res-
to das Escrituras, especialmente no Novo Testamento, que
Deus é apresentado como uma Triunidade de entidades
divinas como Pai, Filho e Espírito Santo, a comunidade
eterna da unidade da qual todas as outras comunidades
derivam a vida e o significado. Assim como os cristãos,
os judeus e os muçulmanos também creem em um Deus.
Contudo, porque o Deus deles é uma pessoa dentro de um
ser, Ele é o prisioneiro da Sua própria limitação congelada
dentro da singularidade da Sua transcendência, e nun-
ca pode experimentar a comunidade. Não é assim com o
Deus revelado por Jesus Cristo. Embora sendo um, Ele é
eternamente três pessoas dentro da unidade. Ele valoriza a
a unidade de deus  93

comunidade supremamente porque Ele experimenta a di-


nâmica e a sinergia de três em um. Por essa razão, quando
Ele cria à Sua imagem, Ele cria a comunidade.
Gilbert Bilezikian
Community 101
(Comunidade 101)
Zondervan Publishing House, 1997, p. 18

A Expressão Local

Para que esta expressão da unidade seja vista de um modo


visível e prático é necessário que haja uma expressão local da
vida comunitária. Essas “expressões” desse novo homem são
grupos locais de crentes que estão sendo edificados juntos de
um modo muito prático. O que lemos no Novo Testamento é o
testemunho dessas expressões locais.
O que vemos acontecendo em Jerusalém, Antioquia,
Galácia, Grécia, Ásia Menor e outros lugares são as expressões
locais e práticas daquele único novo homem corporativo. Estas
não eram várias corporações locais de crentes, mas as expressões
locais do Corpo Único de Cristo. Há apenas um Cristo corpo-
rativo, a Cabeça e o Corpo, compondo um Novo Homem.
É por isso que Paulo fez a pergunta aos coríntios: “Está
Cristo dividido?”. Você vê quão estreitamente Paulo associa
Cristo com a Igreja? Eles são um e inseparáveis em seu pen-
samento. Ele não pergunta: “Está a Igreja dividida?”, mas: “Está
Cristo dividido?”. Há só um Cristo e por isso uma só Igreja. Os
grupos de crentes são apenas expressões locais do único Cristo.
Contudo, o único Corpo precisa ter expressão local e prá-
tica. Lembre-se, o nosso Deus corporativo quer uma expressão
visível d’Ele. Isso só pode acontecer em uma localidade quando
94  a vida comunitária de deus

um grupo de crentes se rende completamente a Ele e decide


viver pela Sua vida e não por sua própria vida. Deve haver uma
edificação em conjunto naquele lugar para que esta expressão
apareça. As pedras vivas precisam ser ajustadas em conjunto
para formar o Seu edifício, o Seu templo.

Um Corpo para Expressão

O seu Senhor anela ser visivelmente expresso. Esse é todo


o significado do termo “o Corpo de Cristo”.
Não é verdade que o seu corpo humano físico expressa
quem você é? Seu corpo dá expressão à pessoa que está no inte-
rior. Quando você fala, sua boca se movimenta, suas sobrance-
lhas se movem para cima e para baixo, seu nariz se movimenta
de vez em quando, suas mãos se mexem e, às vezes, todo o seu
corpo ajuda a expressar a sua comunicação verbal.
Você alguma vez assistiu à apresentação de um mímico?
Um mímico é uma pessoa que diverte sem usar qualquer pala-
vra. Ele usa apenas seu corpo para fazer os movimentos expres-
sarem os seus pensamentos e sentimentos. Ele pode contar uma
história ou tornar uma questão simples porque o próprio corpo
pode comunicar-se pelas suas ações sem o uso de palavras. To-
dos nós ouvimos sobre “linguagem corporal”. Esse é o termo
usado para descrever como o corpo comunica pensamentos e
sentimentos sem qualquer comunicação verbal.
Falando de forma simples, a cabeça comunica-se através
do corpo. Paulo nos diz em 1 Coríntios que isso é uma figura
de Cristo e a Igreja. Na verdade, isso é uma figura de Cristo
(1 Co 12:12). Ele é a Cabeça e o Corpo. Ele é o único Novo
Homem. Cristo e a Igreja são inseparavelmente um. Eles não
a unidade de deus  95

devem ser divididos nem no nosso pensamento nem no nosso


falar. Eles são um, tanto quanto o Pai e o Filho, eles são o Cristo
Corporativo.
Essa unidade toma uma forma? Sim, ela definitivamente
toma! Ela toma a forma de um corpo. Ela é manifestada por
grupos locais de crentes que estão amando o Senhor juntos em
liberdade e graça.
Essa vida comunitária é a mesma vida da Divindade. É
a manifestação visível na Terra da própria comunhão que está
acontecendo agora mesmo dentro do seu Deus. O Pai, o Filho e
o Espírito estão desfrutando um do outro agora mesmo dentro
do seu espírito. Esse compartilhar de vida, amor e comunicação
que é o conteúdo da comunidade d’Eles anela ser expressa na
forma humana. Esse é o propósito elevado e glorioso da Igreja.
Na verdade, ela é a expressão dessa vida comunitária.
A que se parece esta expressão? Bem, ela pode se tornar
visível em uma variedade infinita de formas, mas há um deno-
minador comum: este grupo de pessoas amará uns aos outros.
Este grupo de pessoas cuidará uns dos outros. Este grupo de
pessoas oferecerá suas vidas uns pelos outros. Este grupo de
pessoas se dará uns aos outros sem limite. Este grupo de pessoas
compartilhará a vida divina uns com os outros. E este grupo de
pessoas fará tudo isso em uma atmosfera de completa liberdade,
graça e aceitação.
Como sei que isso tudo é verdade? Simples. Porque é
assim que o Pai, o Filho e o Espírito Santo vivem juntos!
11 Diversidade
na Unidade

“Chegando-vos para ele, a pedra que vive, rejeitada, sim,


pelos homens, mas para com Deus eleita e preciosa, tam-
bém vós mesmos, como pedras que vivem, sois edificados
casa espiritual para serdes sacerdócio santo, a fim de ofe-
recerdes sacrifícios espirituais agradáveis a Deus por inter-
médio de Jesus Cristo” (1 Pe 2:4-5).

H
A Revelação da Edificação de Deus

Houve uma circunstância no tempo em que Pedro rece-


beu uma revelação acerca da identidade do seu Senhor. O Pai
no céu mostrou a Pedro algo sobre Seu Filho. Então Pedro fez
aquela maravilhosa declaração: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus
vivo”. E mediante essa simples declaração-revelação um mundo
todo novo abriu-se para o propósito eterno de Deus a ser cum-
prido na Terra (Mt 16:13-18).
Essa revelação era o fundamento para a Igreja. Na ver-
dade, essa revelação é o fundamento para tudo. Mas o que é
essa revelação? É a revelação de um relacionamento. Pedro viu
que Cristo, o Ungido, o Messias, é parte de uma comunidade
98  a vida comunitária de deus

dentro do Deus Vivo. Ele é o Filho do Pai. Este é um Deus vivo,


não uma religião morta. E dentro d’Ele há um relacionamento e
uma comunhão acontecendo. Essa comunhão flui como um rio
poderoso (Ap 22:1). Essa comunhão é o fundamento da Igreja.
Este relacionamento-comunhão é a “rocha” sobre a qual a Igreja
seria edificada.

A Pedra e o Fundamento

O que Jesus disse a Pedro em Mateus 16 é extremamente


importante. Pedro acabara de dizer ao Senhor que Ele era “o
Cristo, o Filho do Deus vivo”. Esta declaração curta abrangia
todos os componentes dentro da vida comunitária de Deus.
Primeiro, ele O chamou de Cristo. A palavra Cristo sig-
nifica “O Ungido”. Mas ungido com o quê? Com o Espírito
Santo, naturalmente. Este é Aquele que foi batizado, foi cheio
e enviado pelo Espírito Santo. Este é Aquele que disse todas as
coisas na pessoa do Espírito. Ele cumpriu a Sua missão pelo Es-
pírito e através do Espírito. O Espírito é o “conduíte” por meio
de quem o Pai realizou o Seu propósito em Cristo.
Segundo, este Cristo é o Filho de Deus. Dentro de Deus
há um relacionamento com um correspondente fluxo de comu-
nhão. Jesus estava sempre nos falando de Seu Pai. Ele disse que
veio para testemunhar, falar e revelar Seu Pai. Ele veio para ex-
pressar quem é o Pai (Jo 14:9). Ele nos falou do Seu amor pelo
Pai e da glória que Ele compartilhava com o Pai antes da criação
(Jo 17:5). Ele até disse que vivia pela vida do Pai (Jo 6:57). A
unidade da Divindade é o fundamento da Igreja (Jo 17:21).
Terceiro, Pedro disse que Cristo era o Filho do Deus
vivo. O nosso Deus está vivo. Ele não é uma religião morta.
Tudo isso é com relação à vida. A Sua vida. Vida divina. Vida
diversidade na unidade  99

eterna. A vida Comunitária. Este fundamento está vivo. Este


fundamento é um relacionamento vivo e uma comunhão viva.
Este fundamento é sobre Pessoas vivas que são uma. Este fun-
damento é sobre essas Pessoas vivas, que se amam, que se dão
e compartilham Sua vida juntas. Este fundamento é sobre a
comunidade e a unidade.
Depois que Pedro fez a sua declaração, Jesus disse várias
coisas muito significativas. Ele mudou o nome de Pedro de
Simão Barjonas para Pedro. A palavra “Pedro” no grego é “pe-
tros”, que literalmente significa uma pedra. Depois Jesus disse
que sobre esta rocha (petra) edificaria a Sua Igreja. A palavra
“rocha” literalmente significa uma grande rocha ou uma fun-
dação. Portanto, vemos que aqui temos duas coisas: uma pedra
e uma grande rocha ou fundamento. A pedra (petros) é uma
parte separada da rocha. A rocha (petra) é uma rocha maciça
como um pico ou montanha.
Pedro explica-nos o propósito destas “pedras”:

“Chegando-vos para ele, a pedra que vive, rejeitada, sim,


pelos homens, mas para com Deus eleita e preciosa, tam-
bém vós mesmos, como pedras que vivem, sois edificados
casa espiritual para serdes sacerdócio santo, a fim de ofe-
recerdes sacrifícios espirituais agradáveis a Deus por inter-
médio de Jesus Cristo” (1 Pe 2:4).

Deus quer uma casa espiritual (ou templo) no qual Ele


possa habitar. Este templo é feito de pedras vivas (você e eu)
que agora estão sendo edificadas juntas (Ef 2:19-22). Cristo
já habita em cada uma dessas pedras: por isso elas estão vivas.
Cada uma delas está cheia da Sua vida. Contudo, Deus tam-
bém quer habitar em nós juntos. Isto é, Ele quer viver em nós
100  a vida comunitária de deus

corporativamente. Ele já vive em nós individualmente, agora


quer edificar as pedras juntas para formar as paredes do templo,
e então viver dentro do templo. Ele não só quer viver dentro das
pedras, mas também quer viver dentro do templo juntamente
construído.

Dando Permissão Para Sermos Edificados

1 Pedro 2:5 também pode ser traduzido desta forma:


“Deem permissão para serem edificados como uma casa espi-
ritual”. Há uma escolha envolvida aqui. Podemos permitir que
nós mesmos sejamos edificados juntos ou não.
É triste dizer isso, mas a maioria dos crentes nunca nem
tiveram a chance de experimentar este edificar juntos. Quase
todos nós estamos sentados em uma “pedreira”. Estamos ali
apenas sentados com um grupo de outras “pedras” no domin-
go pela manhã e realmente nunca pudemos experimentar este
lindo processo do Espírito Santo de sermos edificados juntos.
Deus quer ajustar e moldar cada um de nós para que nos en-
caixemos perfeitamente um ao outro para formar as paredes do
templo. Isso exige que algumas lascas das nossas bordas ásperas
sejam retiradas, a fim de que nos ajustemos uns aos outros. Isso
algumas vezes pode ser doloroso. Isso requer a nossa transfor-
mação. Isso é algo que somente Deus pode fazer. Tudo o que
podemos fazer é segui-lO.
Mas também podemos ceder a Ele. Podemos permitir
que Ele nos coloque junto com um grupo de pedras vivas. De-
pois podemos permitir que Ele nos edifique juntos.
Podemos permitir que Ele nos reduza até que consiga o
perfeito ajuste junto com os nossos irmãos. Isso é para Sua gló-
ria. Isso é para Sua casa.
diversidade na unidade  101

A Revelação do Fundamento

Pedro recebeu a revelação do fundamento da casa de


Deus, a Igreja. O fundamento é o próprio Cristo. Mas este
Cristo não se encontra dentro de um vácuo. Este Cristo é parte
de uma Comunidade. Este Cristo é o Filho do Deus vivo. O
fundamento é o relacionamento da Divindade. Este fundamen-
to é um. Este fundamento é de rocha maciça. Este fundamento
é a própria unidade do Deus Trino!
Qualquer bom pedreiro (construtor) sabe que a fundação
é crucial para tudo no edifício. Se a fundação for sólida, estiver
no esquadro e for precisa, então o edifício também será preciso.
Se a fundação estiver errada, o edifício inteiro será danificado.
Sabemos que há apenas um fundamento que pode ser posto, e
este é o próprio Jesus Cristo (1 Co 3:11). O fundamento não
são ensinos ou doutrinas sobre Jesus Cristo. O fundamento não
são tradições ou práticas religiosas ou conceitos. O fundamento
é realmente a Pessoa e obra do próprio Cristo. O fundamento é
uma Pessoa, não uma “coisa”.
Mas essa Pessoa não está sozinha. Ele não é um indiví-
duo solitário. Ele não é um indivíduo separado. Ele é o Cris-
to, o Filho do Deus vivo. Ele tem um relacionamento com o
Pai. Ele tem um relacionamento com o Espírito. Ele é parte
de uma Comunidade. Ele é parte de uma Comunhão. Ele é
um com outros. Ele compartilha a Sua vida com outros. Ele
recebe vida de outros. Ele vive em um ambiente. Este am-
biente é chamado de o Deus vivo. Ele vive dentro de Deus.
Ele recebe vida, nutrimento e proteção do Seu ambiente, da
Sua Comunidade.
102  a vida comunitária de deus

A Casa sobre Areia

Jesus disse-nos que sábio é o homem que constrói a sua


casa sobre rocha e não sobre a areia. Por quê? Por que a areia não
é um bom material de fundação? A areia não é o mesmo material
da rocha, apenas quebrada em muitos pedaços? De onde vem a
areia? Ela vem da rocha. Ela vem da montanha. Então, por que a
rocha se torna uma boa fundação e não a areia? Por uma razão: a
rocha é uma peça sólida e não muitas peças separadas. A rocha é
sólida e coesa. A areia é fragmentada e não coesa. Por isso a areia
se deslocará ao passo que a rocha se manterá como um todo.

Sendo Edificados Juntos

Tanto Pedro como Paulo nos dizem que somos pedras


vivas que são edificadas juntas como uma casa espiritual para
o Senhor (1 Pe 2:45; Ef 2:19-22). Somos pedras vivas porque
Cristo vive em nós. Todos somos partes da Rocha. Exatamente
como Pedro, todos nós somos pedras vivas que vieram da ro-
cha de fundação, da montanha. Conhecer isso, por revelação,
é muito importante para ver a sua identidade em Cristo.9 Para
entender quem é você, é preciso saber de onde você veio. Você
é uma parte da rocha. Você saiu da rocha de fundação.

Pedaços de Rocha Escolhidos

Efésios 1:4 nos diz que fomos escolhidos (marcados) em


Cristo antes da fundação do mundo. Antes que o fundamento

9
Ver o livro A Borboleta em Você, deste autor, publicado por esta editora.
diversidade na unidade  103

deste mundo fosse até mesmo lançado, havia outro fundamen-


to. Este era o fundamento do relacionamento do Deus Trino.
Havia Cristo vivendo e desfrutando do Seu Pai pelo Espírito
Santo. Mas o que aconteceu durante a comunhão desta Comu-
nidade divina? Uma das coisas que aconteceram foi a escolha
dos pedaços da rocha: as pedras vivas.
Paulo nos diz em Efésios que Deus (o Pai) escolheu (ou
“marcou”, no grego) algo dentro de Cristo. Por favor, tenha em
mente que este “marcar” aconteceu antes da criação, antes que
houvesse qualquer coisa exceto Deus. O Pai selecionou algo
dentro de Seu Filho. Ele escolheu VOCÊ em Cristo antes da
criação. Ele marcou uma porção de Cristo e colocou o SEU
nome sobre ele. Estes são os Seus escolhidos. Estes são os pe-
daços da Rocha. Estes são as pedras vivas que Pedro menciona
por ter recebido a revelação do Pai. Você veio d’Ele. Você veio da
Rocha. Ele usa estes “pedaços” para edificar a Sua casa.
Outra figura desta edificação é encontrada em Gênesis
com a criação de Adão e a edificação de Eva. Note comigo que
Deus criou Adão, mas Ele edificou Eva. Eva veio a existir por
Deus ter tirado algo de Adão. Ele “marcou” uma parte de Adão
(a costela) e usou aquela porção de Adão para construir Eva.
Aqui é o Pai escolhendo porções de Seu Filho para com elas
construir a Sua casa, a Igreja. Essa Igreja é uma pessoa (Eva),
mas também é uma casa (pedras vivas).
Você vê de onde você veio? Você pode ver quem você é?
Você é uma porção especial de Seu Filho especificamente
selecionada para ter um destino singular. Você foi marcado pelo
Pai para expressá-lO de um modo especial. Você é uma pedra
viva, um pedaço da rocha, e foi escolhido para ser edificado em
um templo espiritual para expressar a glória do Deus vivo.
Isso é quem você é.
104  a vida comunitária de deus

A Obra de Edificação

Para ser edificado em conjunto como um todo, você


deve se relacionar com um grupo local de crentes. A edificação
não pode acontecer com pedras que ocasional e casualmente se
juntam. Lembre-se, o relacionamento da Divindade é o fun-
damento da Igreja. Quão disponíveis são os membros da Di-
vindade uns para com os outros? Com que frequência Eles se
encontram? Como Eles são edificados em conjunto? Eles estão
continuamente entregando a Sua vida uns aos outros. Eles estão
continuamente compartilhando e se dando uns aos outros. A
Sua comunhão flui como um rio poderoso. Nunca para!
No momento em que escrevo este livro, minha esposa,
Mary, e eu vivemos em conjunto com um grupo de crentes no
Colorado. Estamos aqui para sermos edificados em conjunto
como expressão do Corpo de Cristo e da Casa de Deus. Este
não é um processo fácil. Isso só pode acontecer quando nos
submetemos a Deus e uns aos outros.
A minha tendência pessoal é de ser eremita. Se me deixas-
sem por conta própria, iria viver em uma cabana completamen-
te sozinho na floresta em algum lugar, a muitos quilômetros de
distância de qualquer forma de civilização. Contudo, isso sou
eu, isso não é Cristo em mim. Porque não me pertenço mais,
mas pertenço a Ele, não é assim que vivo. O meu verdadeiro eu
gosta de estar junto com os meus irmãos. Por isso devo decidir
viver diariamente pela Sua vida e não pela minha.
Todos nós temos a tendência de querer reunir pessoas em
torno de nós que nos façam sentir cômodos. Em outras palavras,
queremos nos abrir com pessoas que se parecem conosco! Estas
são pessoas com as quais podemos nos relacionar e ter interesses
comuns. Mas isso não é a Igreja! A Igreja é a reunião e edificação
diversidade na unidade  105

em conjunto de santos quem têm somente um denominador


comum – Jesus Cristo.
“Não podem os olhos dizer à mão: não precisamos de ti...
(1 Co 12:21a).”
Descobri que preciso de todos os meus irmãos com os quais
Deus está me edificando no Colorado, especialmente aqueles
que são muito diferentes de mim. São esses “diferentes” que me
equilibram e me completam. E quando sacrifico a minha vida
por estes santos, a Casa de Deus está sendo edificada.
12
O Relacionamento
Divino

T Tentar descrever o relacionamento divino não é uma ta-


refa fácil. Alguns podem até perguntar se é mesmo necessário.
Afinal, como o Pai, o Filho e o Espírito Se relacionam um
com o outro realmente não é da nossa conta. Não é algo que
devamos “espreitar”. É um mistério que deve ser mantido em
segredo. Esta é a atitude de muitos crentes quando chegam à
vida interna de Deus.
Mas Paulo nos diz que podemos conhecer as coisas gra-
tuitamente dadas a nós por Deus (1 Co 2:6-13). Um mistério
é um segredo, e um segredo só permanece um segredo até que
alguém lhe diga o significado. Deus nos conta os Seus segredos
através do Seu Espírito (1 Co 2:10). Deus revela os segredos
para revelar mais d’Ele mesmo e do Seu propósito para nós.
Como vimos no último capítulo, o fundamento da Igreja
é Cristo e o Seu relacionamento com o Pai através do Espírito
Santo. A unidade da Divindade é a Rocha sobre a qual a casa
é edificada. Deixe-me ir um pouco além e dizer que a comu-
nhão do Deus Trino e Uno não é apenas o fundamento, mas é
a própria vida e o centro da Igreja. Em outras palavras, a vida
comunitária de Deus é a vida da Igreja.
108  a vida comunitária de deus

O Significado da Vida Eterna

A maior parte dos crentes tem muito pouca compreen-


são da vida eterna. Normalmente pensamos nela simplesmente
como a longevidade da vida. Quando Deus nos dá a vida eter-
na, isso significa que viveremos para sempre. A palavra eterna
significa apenas a duração. De fato, não é o que ela significa em
absoluto. Eterna tem a ver com o tipo e qualidade de vida mais
do que o comprimento da vida. A vida Eterna vem da Eterni-
dade, completamente outro reino. Ela não tem nada a ver com
o tempo. O tempo é um item encontrado neste reino. Não há
tempo algum na Eternidade, por isso o comprimento da vida não
tem nenhuma relevância ali. É o tipo de vida que é importante.
A vida eterna é a vida divina. É a própria vida de Deus. Ela
é a vida com a qual Deus vive e opera. Quando Jesus nos disse
que veio para que pudéssemos ter vida, e tê-la em abundância (Jo
10:10b), esta é a vida sobre a qual Ele falava. É a vida pela qual o
próprio Deus vive. Esta não é a vida humana, é a vida divina.
Esta vida eterna é a essência e substância da comunhão di-
vina. Ela é a água que flui pelo rio da comunhão da Divindade.
Ela é a força real que gera e energiza o próprio Deus. Ela é a vida
que é trocada entre o Pai, o Filho e o Espírito. É esta vida que é
a base da comunhão d’Eles uns com os outros (1 Jo 1:1-4). E o
conhecimento da comunhão d’Eles nos dá esta vida (Jo 17:3).
Por isso podemos ver que a vida eterna é a vida comu-
nitária. Ela é a vida pela qual Deus vive, e Deus é comunitário.
Sempre pensamos na vida eterna como individual, mas não é.
Por causa da queda, sempre pensamos em termos individualistas.
Contudo, a vida eterna é a vida corporativa. Ela é a vida de comu-
nhão. Ela é a vida de comunidade. Ela é a vida da unidade.
o relacionamento divino  109

Conhecê-lO é conhecer esta vida. Em Cristo habita a


plenitude da Divindade (Cl 2:9). Em Cristo habita a completa
comunhão e relacionamento da Divindade. Ser edificado em
Cristo é ser edificado nessa comunhão. A Igreja deve manifestar
essa comunhão divina na Terra. Ele veio para expressar Seu Pai.
Devemos expressá-lO aqui. Mas quando digo “Ele” ou “Cristo”
estou falando da plenitude da Divindade. Estou falando da ple-
nitude do relacionamento d’Eles que é expressa na comunhão.
Esta vida comunitária é uma vida de comunhão. É uma
vida de troca, comunicação e intercurso divino.
Pensamos que a vida eterna é sobre eu ter a minha “man-
são” no céu. De fato é sobre eu entrar na casa de comunhão do
Pai e ser edificado como uma pedra viva em Seu Santo templo
(Jo 14:1-6). Devemos aprender a ver através de novos olhos.
Devemos aprender a ver através dos olhos corporativos.

Uma Casa de Comunhão

Jesus foi acusado de ser um glutão e um bebedor de vi-


nho. Por quê? Porque amava a comunhão. Ele gostava de estar
com as pessoas e compartilhar com elas. Ele gostava de entregar
a Sua vida e amar a outros e de gastar tempo com as pessoas du-
rante uma refeição. Digo isso com o maior respeito – Ele amava
festejar! Mas por que isso era tão importante para Ele?
Devemos perceber que o Filho desfrutava da comunhão
da Divindade por toda a eternidade. Essa era a Sua “formação”.
Essa era a Sua história. Essa foi a maneira como Ele foi “levan-
tado”. Toda a Sua vida foi dedicada ao desfrute da comunidade
divina. A comunhão era a Sua forma de vida. Este era o Seu
ambiente. Esta era a Sua cultura.
110  a vida comunitária de deus

Este era o ambiente em que vivia quando deixou a eter-


nidade para vir para a Terra. O seu hábitat natural tinha sido de
comunhão e comunidade. Era com isso que Ele estava confor-
tável e por isso, naturalmente, continuou esta vida na Terra em
Sua comunhão com Seu Pai no Espírito. Ele vivia e andava con-
tinuamente na comunhão com Seu Pai, assim como tinha feito
por toda a eternidade. A única diferença era que agora aprendeu
a fazer isso como um homem em um ambiente tempo/espaço.
Havia agora os obstáculos, as distrações e as dificuldades que
potencialmente poderiam impedir ou restringir essa comunhão.
Mas o Senhor Jesus superou todos os obstáculos e andou na
comunhão íntima com Seu Pai enquanto esteve aqui na Terra.
Esta é a Rocha, a base e a fundação da Igreja.

Descrição da Comunhão

Infelizmente, hoje os cristãos tomaram esta palavra, “co-


munhão”, e a reduzram a um nível muito baixo. Ela passou a sig-
nificar um pouco mais do que a socialização com outros crentes.
Reunimo-nos para um cafezinho com rosquinhas e discutimos
sobre o clima e pensamos que isso é comunhão. Na verdade, isso
é relacionamento social, não comunhão. Eu gostaria de fazer uma
tentativa de levar de volta esta palavra até a posição elevada à qual
estava destinada a ter. Para isso, teremos que ver a comunhão de
dois ângulos diferentes. Primeiro, veremos a definição técnica da
palavra, então veremos a aplicação espiritual nas Escrituras.

Definição da Comunhão

Segundo o Dicionário Expositivo das Palavras do Novo Tes-


tamento de W. E. Vine, a palavra grega para comunhão significa
o relacionamento divino  111

coparticipação, compartilhar em comum, participação, parti-


cipação em conjunto, comunicar e compartilhar em conjunto
com outros. Assim podemos ver que essa palavra, tomada so-
zinha, poderia significar simplesmente relacionamento social.
Contudo, temos que ver o contexto bíblico primeiro. O que é
que estamos compartilhando em comum? Do que é que somos
em conjunto parceiros e participantes?

A Comunhão de Vida Divina

Segundo João, essa comunhão compõe-se de quatro ati-


vidades: ouvir, ver, contemplar e tocar.

Ouvir

“... porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos tenho dado a
conhecer” (Jo 15:15b).

É evidente que dentro da comunhão da Divindade há o


falar e o ouvir. Deus fala. Mas o que Ele fala? Antes da criação, o
que Ele falava? Antes que houvesse qualquer coisa, qual poderia
ter sido o tema da conversação? Obviamente, não era política, as
notícias ou o clima! Sobre o que o conselho do Pai, do Filho e
do Espírito Santo poderia estar tratando antes da criação?
Antes que possamos responder esta pergunta devemos en-
tender como Deus fala. Ele sempre fala através e por algo chama-
do a Palavra. Ora, entendemos que “palavra” significa a menor
parte da linguagem. Comunicamo-nos através do uso de palavras.
Elas são os blocos do edifício da comunicação. Usamos “pala-
vras” para transmitir os nossos pensamentos. Expressamo-nos
112  a vida comunitária de deus

verbalmente usando palavras. Contudo, Deus o faz um pouco


diferentemente. Ele usa a Palavra. O que é a Palavra? Isso signi-
fica que Deus usa somente uma palavra única para se comuni-
car? Não exatamente.

“No princípio era o Verbo [a Palavra], e o Verbo [a Pala-


vra] estava com Deus, e o Verbo [a Palavra] era Deus. Ele
estava no princípio com Deus” (Jo 1:1-2).

Aqui a Palavra é chamada de Ele. Então vemos no versícu-


lo 14 que a Palavra Se tornou carne e viveu entre nós. A Palavra
de Deus se tornou carne. Ele se tornou homem. Esta Palavra é
obviamente uma Pessoa, e a Pessoa é Jesus Cristo. Em 1 João 1:1
Ele é chamado de a Palavra da vida. Deus se comunica através
de uma Pessoa. Esta Pessoa é chamada de Palavra. Esta Pessoa é
Cristo (Ap 19:13).
Falamos através de palavras. Deus fala através da Palavra.
Quando Deus fala, o que sai é Cristo. Ele é o veículo e conte-
údo de toda a comunicação divina. Você pode dizer que Deus
tem uma obsessão, e Ele é definitivamente obcecado pelo Seu
Filho! Quando Ele fala, é sempre de Cristo. Quando Ele fala, é
sempre através de Cristo. Deus só fala a língua de Cristo. Agradou a Ele
que toda a Sua plenitude habitasse em Cristo (Cl 1:19).
Assim, quando Deus se comunica dentro do conselho da
Divindade, o tópico da discussão é sempre Cristo e o propósito
eterno de Deus em Cristo. Antes da criação Deus discutia como
o Seu propósito eterno seria realizado em Cristo. Seu propósito
é realizado através de Seu plano ou Sua economia (Ef 3).
A comunhão é sempre baseada na Palavra da vida (1 Jo 1:1, 4).
O compartilhamento comum ou a participação são sempre em
Cristo. A vida em comum que compartilhamos é uma Pessoa –
o relacionamento divino  113

a Palavra da Vida. A comunicação que compartilhamos é Cristo.


Ele é sempre a base, os meios e o fim de todas as nossas conver-
sações. Ele é o veículo e o conteúdo de toda comunhão verbal.
Não compartilhamos apenas coisas sobre Ele. O que comparti-
lhamos é Cristo. Como compartilhamos é Cristo.
Isso requer um compartilhamento da Sua comunhão
com o Pai. Devemos ser capazes de ouvir, ver, contemplar e to-
car o Seu compartilhamento com o Pai. Devemos ser capazes de
ouvi-lO (Mt 17:5). Como podemos ouvi-lo se não estivermos
escutando? O Filho está escutando o Pai. O Pai está escutando
o Filho. Eles estão escutando no Espírito.

Ver

“Em verdade, em verdade vos digo que o Filho nada pode


fazer de si mesmo, se não somente aquilo que vir fazer o
Pai...” (Jo 5:19a).

O próximo elemento dessa comunhão é ver. “… Deus


é luz, e não há nele treva nenhuma” (1 Jo 1:5a). Temos comu-
nhão com Ele e uns com os outros na luz. A luz é o lugar de
exposição. A luz é o lugar da completa autenticidade. A luz é o
lugar de revelação. O Pai e o Filho são completamente abertos e
honestos um com o outro no Espírito.
Essa comunhão é o lugar onde não há nada para esconder.
A completa autenticidade e honestidade governam aqui. O Pai,
o Filho e o Espírito não retêm nada um do outro. Eles mostram
tudo um ao outro. Há uma constante revelação do verdadeiro
eu de alguém continuamente acontecendo neste lugar de comu-
nhão. Não há nenhum engano. Não há nenhum encobrimento.
É porque não há nenhum temor. Não há nenhum temor de
114  a vida comunitária de deus

perder. Na verdade, nessa comunhão o perder é uma forma de


vida. Não apenas não há nenhum temor de perder, o perder é
completamente abraçado!

Contemplar

Contemplamos a Palavra da vida. A palavra “contemplar”


significa fitar com um propósito. Fitar é muito mais do que so-
mente olhar. Significa investigar atentamente algo para encon-
trar o grande propósito e o detalhe. A nossa comunhão com o
Pai e o Seu Filho envolve tal intenso fitar.
Há um grande propósito nessa comunhão na qual o Deus
vivo seria expresso em toda a Sua plenitude. A comunhão tem
um alvo. O alvo é a manifestação plena de um Deus invisível.
Deus foi encarnado em um Homem, e esse Homem tinha co-
munhão interna com Deus continuamente. O resultado dessa
comunhão interna foi a vida exterior do Senhor Jesus Cristo.
A comunhão divina da Divindade tem uma expressão,
que é a Igreja. Essa expressão é Cristo – o Cristo corporativo, o
Cabeça e o Corpo.
O Pai, o Filho e o Espírito contemplam um ao outro com
este propósito e intenção em mente. O Deus corporativo deseja
uma expressão corporativa, e essa expressão flui da vida comu-
nitária d’Eles em conjunto.

Tocar

Este aspecto da comunhão é muito profundo e muito di-


fícil de descrever. Os membros da Divindade “tocam” um ao
outro. Naturalmente, não digo isso de uma forma física. Mas há
o relacionamento divino  115

um toque espiritual que é indescritível. Isso é muito íntimo e,


contudo, se torna muito prático. Jesus de Nazaré precisava tocar
Seu Pai celestial. De vez em quando Ele precisava escapar para
um lugar solitário onde pudesse estar a sós com Deus. Ele pre-
cisava daquele toque íntimo com Seu Pai. Isso só acontece pelo
espírito tocando o Espírito. Isto é, o espírito humano tocando o
Espírito de Deus (Rm 8:16).
Isso também fala de Deus e o homem se tornando um. A
humanidade de Cristo O fez “tocável” para nós como seres huma-
nos. Não poderíamos tocá-lO ou nos relacionar com Ele de uma
forma íntima se Ele não tivesse Se encarnado como um Homem.
Deus veio em carne. Deus Se tornou “tocável” para o homem.
Você não está contente porque o seu Deus não é into-
cável? Você não está contente porque Ele pode Se relacionar
completamente com você como um ser humano? Você não está
contente porque você pode tocar a Sua humanidade bem como
a Sua divindade? Isso faz parte da vida comunitária. Ser capaz de
tocar o Cristo em nós mesmos e em outros membros do Corpo
é muito importante.10

O ensino bíblico da Tríade não é uma exposição sobre o


projeto abstrato de Deus. Em vez disso, ele nos ensina
sobre a natureza de Deus e como ela opera na comunidade
cristã. Como tal, não deve ser relegado a uma nota de ro-
dapé do Evangelho. Antes ele deve conformar a vida cristã
e informar a prática da igreja... De forma interessante, os
primeiros cristãos usavam o termo “perichoresis” para des-
crever a dança divina da comunhão que acontece entre o

Ver o livro The Temple Within (O Templo Interior), deste autor, que em
10

breve será publicado por esta editora.


116  a vida comunitária de deus

Pai, o Filho e o Espírito. (O prefixo peri significa “em tor-


no”, e a palavra choresis literalmente significa “dançar”.)
O objetivo final da humanidade é de ser totalmente toma-
da para a dança da Trindade, trazida plenamente para o
círculo daquele amor superabundante que flui dentro da
Divindade (1 Co 15:24-28; Ef 1:10). A boa nova é que
podemos viver no antegozo desta futura realidade agora.
Como Miroslav Volf diz: “A participação na comunhão do
Deus trino, contudo, não é apenas um objeto da esperança
da igreja, mas é também a sua experiência presente”.
Frank Viola
Reimaginando a Igreja
Editora Palavra, 2010, p. 34, 109
13 Posses Divinas

“É por eles que eu rogo; não rogo pelo mundo, mas por
aqueles que me deste, porque são teus; ora, todas as minhas

E
coisas são tuas, e as tuas coisas são minhas; e, neles, eu sou
glorificado” (Jo 17:9-10).

Essa passagem nos revela claramente a atitude divina para


com as posses. É dessa forma que os membros da Divindade Se
relacionam uns com os outros no tocante às posses. “Todas as
coisas que são Minhas são Suas, e as Suas são Minhas.” Jesus
está falando ao Pai com respeito à Igreja. O “deles” e o “eles”
nessa passagem se refere claramente aos discípulos. Jesus diz
que o Pai deu a Ele a Igreja, e mesmo assim a Igreja pertence ao
Pai porque “todas as coisas que são Minhas são Tuas”. Com cer-
teza isso tem pleno sentido numa atmosfera de unidade total.
Aquilo que pertence ao Pai também pertence ao Filho, porque
o Pai e o Filho são um.
Mas observe comigo que existe algo semelhante à posse
dentro da Divindade. O Filho possui coisas. O Pai possui coi-
sas. Jesus disse: “Todas as coisas são Minhas”, indicando que
Ele possui coisas. Embora a Igreja pertencesse ao Pai, Ele a deu
a Cristo. E mesmo assim Cristo ainda considera que ela per-
tence ao Pai também, porque “todas as coisas que são Minhas
118  a vida comunitária de deus

são Tuas”. Isso nos mostra que existe algo semelhante à posse
dentro da comunidade divina, mas essa propriedade nunca é ex-
clusiva, mas é sempre uma atividade e atitude inclusiva. O Filho
não considera as Suas posses como apenas d’Ele, e o Pai tem a
mesma atitude. Embora o Espírito não seja mencionado direta-
mente em João 17, podemos ver em outras Escrituras que Ele
tem essa mesma atitude (Jo 16:13-15). A propriedade, portanto,
não é exclusiva de uma Pessoa individual, mas é comunitária,
fundamentada numa decisão voluntária.
Em João 17.9 está claro que o Pai deu a Igreja a Cristo. Ele
afirma que “eles são Teus”. Entretanto, logo antes disso Ele dis-
se que eles foram dados a Ele pelo Pai. É interessante observar
que mesmo depois de o Pai ter dado a Igreja a Cristo, ela ainda
pertencia ao Pai: “Aqueles que Me deste; pois são Teus”. Eles
foram dados a Cristo por Ele, e mesmo assim ainda eram d’Ele.
Jesus continua e explica por que isso é verdade: “Todas as coisas
que são Minhas são Tuas, e as Tuas são Minhas”. Embora o Pai
tivesse dado a Igreja a Cristo, ela ainda pertencia ao Pai porque
todas as coisas que pertencem ao Filho também pertencem ao
Pai. O Pai realmente deu a Igreja ao Filho, mas logo que o Filho
recebeu-a como Sua, Ele a devolveu ao Pai. Isso porque “todas
as coisas que são Minhas são Tuas, e as Tuas são Minhas”.

Dando e Recebendo

Assim, podemos ver que dentro da Divindade existem


propriedade e posse real. Entretanto, essa propriedade não é ex-
clusiva nem egoísta. As posses são dadas tão logo são recebidas
sem qualquer temor de perda. O dar é a atividade normal da
vida divina. A dádiva contínua de vida, amor, comunicação e
posses divinas  119

todas as coisas é o fluir natural da vida eterna. Deus queria dar


além de Si mesmo. Ele queria dar além do círculo dos Três aos
outros, então deu Seu Filho Unigênito (Jo 3:16). Esse é o pro-
pósito da criação, que Ele pudesse repartir Sua vida com outros
fora de Si mesmo. Ele queria que Sua comunhão, a comunhão
da Divindade, se expandisse para fora da comunidade dos Três.
Ele queria que a mesma comunhão e vida fossem experimenta-
das por outros. Foi por isso que Ele criou.
Deus dá. Ele é um Doador. Ele é O Doador. Ele dá sem
pensar em recompensa ou retorno. Ele dá sem reserva ou hesi-
tação. Ele dá plena e genuinamente. Na verdade podemos dizer
que Ele está dando. É Sua natureza “fluir”. É Sua natureza Se
derramar sobre aqueles que Ele ama. O Pai, o Filho e o Espírito
estão sempre dando um ao outro. O Pai toma a dádiva de Si
mesmo e a envia ao Filho através do Espírito Santo. O Filho
também Se dá completamente ao Pai através do Espírito Santo.
O Espírito é o mensageiro das dádivas que vão e voltam. O Pai
dá todo o Seu amor ao Filho. O Filho recebe esse amor e depois
faz um embrulho dele todo e o “envia” de volta ao Pai. “Esses
“pacotes” de amor e vida estão fluindo para frente e para trás
entre o Pai e o Filho através do Espírito Santo. Não se trata de o
Pai dar Seu amor ao Filho uma vez ou outra. A troca divina de
vida e amor acontece sem parar.
E se a dádiva está acontecendo, então você sabe que o
receber também está acontecendo. Mas quem é o doador e
quem é o recebedor? A única resposta só pode ser “sim”! Cada
Pessoa dentro da comunidade divina é tanto doador como re-
cebedor. Naturalmente é lógico que se todas as Pessoas estão
doando uma à outra, então todas elas também estarão receben-
do. Essa não é uma sociedade de admiração mútua. O receber
é parte muito importante da equação. A natureza doadora de
120  a vida comunitária de deus

Deus nunca poderia ficar satisfeita se não houvesse recebedor.


Jesus disse que era mais bem aventurado dar do que receber,
mas Ele nunca disse que o receber não era importante.
Se o Pai está doando constantemente todas as Suas posses
ao Filho, como Ele pode possuir algo? O Pai retém algo? Ou a
propriedade dentro da Divindade é algo tão transitória como
o vento? A resposta está na diferença entre a propriedade in-
dividual e a propriedade corporativa. Lembre-se de que Deus
vive numa vida comunitária e não numa vida individualista. As
posses são retidas dentro da comunidade e não dentro do indi-
víduo. Dentro da comunidade divina a posse e as propriedades
estão protegidas e conservadas. Deus está seguro em quem Ele
é e no que Ele tem. As Pessoas individuais não precisam conten-
der para Se apegarem às Suas posses porque toda propriedade
está mantida dentro da comunidade. Deus é tudo porque tudo
é possuído por este Deus Trino.
Sempre que Ele precisa de algo, pode encontrar dentro
da comunidade. Na verdade pode ser dito também que Deus é
todo suficiente porque dentro d’Ele mesmo, dentro da comuni-
dade divina, todas as coisas podem ser encontradas. O Pai pode
estar completamente seguro em perder tudo para o Filho por-
que Ele sabe que o Seu “tudo” ainda será mantido pela comuni-
dade. A exaltação do indivíduo não é a questão. O bem-estar da
comunidade é que conta. Isso não significa que o indivíduo não
seja importante. Mas nenhum dos membros considera coisa
alguma como somente Sua propriedade única e particular. Po-
demos dizer que dentro da comunidade divina todas as posses
são mantidas em comum. Existe algo semelhante à propriedade,
mas essa propriedade é mantida com mãos abertas porque cada
membro doa livremente aos outros.
posses divinas  121

Nosso Conceito de Propriedades

Naturalmente que na América do século vinte e um o


conceito de propriedade é totalmente diferente. Quando nós
possuímos algo, isso permanece nosso, pelo menos em nossa
mente. Mas Deus não possui todas as coisas? Sim, na verdade
Ele até nos possui! Mas ainda existe algo semelhante à proprie-
dade, conforme podemos ver na Igreja do século vinte e um.

“E, vendido, não estaria em teu poder?” (At 5:4).

Essa foi a pergunta que Pedro fez a Ananias e Safira de-


pois que eles mentiram ao Espírito Santo. Podemos ver por essa
pergunta que Pedro não considerava a propriedade de Ananias
e Safira como comum até que eles a vendessem. Em outras pa-
lavras, as posses deles continuavam sendo deles até que eles as
dessem. O problema com Ananias e Safira é que eles tentaram
enganar a Igreja fazendo crer que estavam dando mais do que
realmente estavam dando. Pedro não os repreendeu (literal-
mente!) porque não deram o suficiente. Ele os repreendeu por
tentarem enganar a Igreja.
Observe então que dar é o ato de escolher pegar algo que é
seu e doar a alguém. A igreja em Jerusalém não tinha uma bolsa
comum como geralmente se ensina. Certos crentes foram mo-
vidos pelo Espírito Santo a vender algumas de suas propriedades
e doar o dinheiro para a igreja ajudar os necessitados. Primeiro
deve haver posses antes que possa haver a doação. O Pai e o Filho
possuem vida. É por isso que Eles podem dar essa vida um ao ou-
tro. A posse antecede o dar. As posses só se tornam um problema
122  a vida comunitária de deus

quando não existe o dar. A Divindade considera todas as posses


como corporativas, porque todas as posses foram doadas. O Pai
deu tudo ao Filho. O Filho deu tudo ao Pai de volta.
O problema é que nós não vivemos por essa mesma vida
comunitária. O dar é difícil para nós por causa da natureza caída
e individualista. Nós somos consumidos com os nossos pró-
prios egos individuais; por isso o dar não se encaixa na indivi-
dualidade. Quando você dá, deve considerar as necessidades de
alguém mais. O ato de dar é, na essência, um ato corporativo.

Diferentemente dos essênios, Paulo não encontrou comu-


nidades enquanto viajava pelo mundo antigo, mas isso
não significa que ele não desafiava as posições comuns de
propriedade. Aqueles que se tornavam membros das suas
comunidades nunca mais podiam olhar para os seus bens
com os mesmos olhos.
Robert Banks
Paul’s Idea of Community
(O Conceito de Paulo sobre Comunidade)
Hendrickson Publishers, 1994, p. 87

Nossa natureza caída e egoísta é extremamente insegura


no tocante às propriedades. Na verdade nossa saúde emocional,
mental e física é construída em torno da posse de coisas. Não
estou me referindo apenas a coisas físicas, mas ao conceito geral
de propriedade. Todas as nossas depressões e medo têm sua ori-
gem na nossa insegurança com respeito às propriedades.
Ficamos deprimidos porque sentimos que algo está nos
faltando. Pense nisso. Por que você fica deprimido? É bastante
simples. É porque você crê que existe algo que você não tem.
Existe algo faltando em sua vida. Pode ser qualquer coisa. Talvez
posses divinas  123

você sente que não recebe bastante amor, atenção ou compa-


nhia. Ou talvez você sinta que precisa de mais dinheiro, ou um
carro melhor, ou uma casa melhor. Ou talvez você não tenha
nenhum alvo ou está sem um emprego agora. Não importa o
que seja, algo está faltando. Você acredita que há algo que você
precisa (ou queira) e que você não possui. Tudo é sobre posse.
O medo é semelhante, só que é com respeito ao futuro.
Você tem medo de perder algo. Se você pensa que existe a possi-
bilidade de perder algo, ficará com medo. Você pode perder sua
vida, sua carreira, seu casamento, seus amigos, seu dinheiro. Na
verdade, pode ser qualquer coisa. Você tem medo de perder.
Isso é bastante irônico porque foi exatamente o que Jesus
nos disse para fazer. Ele nos disse para perdermos a nossa vida da
alma (Mt 16:25). Ele estava dizendo que por perder a nossa vida
nós ganharíamos a vida d’Ele, vida eterna, a vida comunitária.
O perder é realmente uma faceta muito importante da nossa
caminhada com Ele. De certo modo, todos nós precisamos nos
tornar perdedores.
Querido crente, se você apenas conhecesse que proprie-
dades você tem dentro de Cristo,11 nunca ficaria deprimido ou
com medo novamente. Você está n’Ele. Isso significa que tudo o
que está dentro d’Ele também pertence a você. Essa é a maneira
de Ele viver: corporativamente. O que pertence a Ele pertence
a você. Se você pudesse apenas ver e crer em todas as riquezas
que estão contidas dentro do seu Senhor, veria que nada está
faltando – nem uma coisa sequer.

Ver o livro A Borboleta em Você, deste autor, publicado por esta editora.
11
14 Conjuntamente

A
“E aquele que me enviou está comigo, não me deixou só,
porque eu faço sempre o que lhe agrada” (Jo 8.29).

A unidade da Divindade inclui algo que eu chamo de


“conjuntamente”. Sabemos que o Pai, o Filho e o Espírito são
um. Os três são um.
O Filho foi até João (o Batista) para ser batizado. Enquan-
to isso acontecia, o Espírito Santo desceu sobre Ele como uma
pomba. Então o Pai falou do céu: “Este é o meu Filho amado,
em quem me comprazo” (Mt 3:17). Aqui podemos ver clara-
mente o Deus Trino trabalhando em conjunto para realizar o
Seu propósito. Eles sempre trabalham em conjunto.
Jesus não pensava ou agia de forma individualista. Ele es-
colheu agir corporativamente. Escolheu agir em conjunto com o
restante da comunidade divina. Ele foi enviado pelo Pai e ungi-
do pelo Espírito para fazer a vontade de Deus. Não havia inte-
resses especiais ou pessoais envolvidos nisso.

Ministério Corporativo

A obra do Senhor sempre deve ser corporativa. Em Lucas


10 podemos ver que o Senhor enviou os Seus obreiros de dois
126  a vida comunitária de deus

em dois. Por que Ele não os enviou como indivíduos? Na ver-


dade é muito simples: dois obreiros são mais fortes do que um.
Esse é o princípio do “conjuntamente”. O ministério e a Igreja
devem trabalhar da mesma forma que o Deus Trino, juntos.
Não existem obreiros “Zorros”.12 Até mesmo o Zorro (Cavaleiro
Solitário) tinha um companheiro chamado Tonto!
Também vemos isso retratado na vida e obra do após-
tolo Paulo. Ele sempre ia pregar o evangelho e plantar igrejas
junto com outro obreiro. No início ele ia com Barnabé, depois
com Silas, Lucas, Timóteo, Tito e outros. Estes “enviados”, ou
apóstolos, sempre trabalhavam juntos. Não havia “solitários” na
obra do Senhor. Havia somente o conjuntamente. Com certe-
za nós perdemos isso no cristianismo moderno. Somos muito
individualistas, e a maioria dos ministérios atua sozinha. Não
precisamos do jugo porque podemos levar sozinhos toda a car-
ga. Isso não é vida comunitária. Isso é vida da alma.
Os motivos que levam os obreiros a servirem sozinhos
são muitos. Às vezes é porque não se dão bem com seus coo-
breiros. Isso acontece algumas vezes. Aconteceu com Paulo e
Barnabé. Eles se dividiram porque houve um desentendimento
a respeito de João Marcos, um parente de Barnabé (At 15:39).
Entretanto, Paulo e Barnabé tomaram novos coobreiros para
estarem com eles. Paulo tomou Silas e Barnabé tomou Mar-
cos (At 15:40). Veja que eles entenderam o significado de vida e
serviço comunitário. Os dois tinham vivido a vida corporativa
na igreja em Antioquia. Eles entenderam que esse é o modo do
Deus Trino operar: juntos.
Outro motivo que leva os coobreiros a se dividirem
é a ambição egoísta. Os homens querem ter os seus próprios

Aqui o autor se refere ao personagem dos filmes de faroeste “Zorro”, cujo


12

nome original é “Lone Ranger”, que traduzido é “Cavaleiro Solitário”.


conjuntamente  127

pequenos reinos para que possam governar sozinhos. A maioria


desses homens é paranoica. Eles temem constantemente que
alguém possa tentar assumir a obra deles. Mas a obra não é deles.
A obra é de Deus – ou não. E Deus sempre opera corporati-
vamente porque Ele é corporativo. A obra é corporativa. Em
outras palavras, Deus está no conjuntamente.
Eu creio que um dos principais motivos de não termos
visto a vida comunitária na Terra hoje em grande parte é por-
que não admitimos o obreiro-semeador. Estes são santos que
Deus chamou, preparou e enviou para pregar as riquezas de
Cristo e levantar igrejas orgânicas como as do primeiro sécu-
lo, por toda a Terra. Precisamos desesperadamente desses “en-
viados” para lançarem o fundamento e nos mostrarem como
viver a vida comunitária. Eles experimentaram essa vida e são
chamados e capacitados por Deus para ajudar os grupos de
crentes a viverem da mesma forma. Eles pregam Cristo e não
doutrinas, tradições, ideias religiosas ou o recente ensino po-
pular “cristão”. As igrejas eram levantadas por esses homens
no primeiro século. Ainda precisamos que eles façam a mes-
ma coisa hoje. Esses santos receberam uma visão e revelação
de Jesus Cristo e da Sua Igreja que nunca abandonarão. Eles
são extremamente ousados, mas também amáveis e dispostos
a assumir quaisquer perigos para eles mesmos necessários para
o avanço do Reino.
Existem alguns que estão trabalhando assim hoje. O que é
lamentável dizer é que a maior parte deles serve de forma inde-
pendente. Isso não está de acordo com a vida de Deus. Oremos
para que Deus levante mais obreiros, mas oremos também para
que eles tenham uma experiência e entendimento verdadeiros
da vida comunitária.
128  a vida comunitária de deus

Convivência na Vida Diária da Igreja

Existem muitos lugares nas Escrituras que tratam com


o “conjuntamente” ou “um com o outro”. Não tenho como
examinar todos eles neste livro, mas vou cobrir algumas poucas
áreas importantes.

Encorajamento Mútuo

“Consideremo-nos também uns aos outros, para nos es-


timularmos ao amor e às boas obras. Não deixemos de
congregar-nos, como é costume de alguns; antes, façamos
admoestações e tanto mais quanto vedes que o Dia se apro-
xima” (Hb 10:24-25).

A vida corporativa é a vida da Igreja, já que esta deve ser a


expressão corporativa da vida de Cristo. O que estamos falando
aqui é a vida comunitária de Deus sendo manifestada visivel-
mente na Terra através do Seu povo. Jesus Cristo encarnado
através da Sua Igreja. Essa é a plenitude de Cristo explicada por
Paulo em Efésios 1:23.
A vida cristã nunca foi planejada para ser um esforço in-
dividual. A maior parte de nós nunca conseguirá isso em nossa
vida espiritual sozinhos. Precisamos do suporte e encorajamento
constante dos nossos irmãos e irmãs em Cristo. Não estou falan-
do aqui necessariamente de ministério, mas sim do nosso andar
diário com o Senhor. Você e eu precisamos de encorajamento
diário. Você e eu precisamos encorajar outros diariamente.
Esse sistema mundial tentará nos derrubar diariamente.
Existe uma quantidade de estresse a ser experimentada apenas
conjuntamente  129

porque vivemos neste mundo cada dia, como nós sabemos.


Nossa vida está se tornando mais agitada e tumultuada na tenta-
tiva de ganhar a vida, fazer provisão para nossas famílias e sim-
plesmente sobreviver num ambiente geralmente cruel e sem
coração. As pessoas estão trabalhando e se preocupando mais
e mais e dormindo menos e menos. A verdadeira paz e o bem-
estar são difíceis de ser encontrados.
É por isso que precisamos desesperadamente da vida co-
munitária. Precisamos de um lugar aonde possamos ir e encon-
trar paz, abrigo da tempestade e sermos aceitos como somos.
Esse lugar é a Igreja. Esse lugar é o verdadeiro Corpo de Cristo.
Aqui nós recebemos (e damos) verdadeira aceitação, sustento
e encorajamento. Precisamos lembrar um ao outro quem nós
realmente somos em Cristo. Precisamos lembrar um ao outro
para nos voltarmos para o Senhor interior.13 Precisamos orar um
pelo outro, cantar um para o outro e encorajar um ao outro enquanto
ainda se chama “hoje”.

A comunidade cristã acontece quando os crentes comparti-


lham a vida diária na busca do reino de Deus. A comu-
nidade é um lugar onde todos os membros experimentam
a comunhão e aceitação, porque eles pertencem a uma rede
de relacionamentos comprometidos de amor. Comunida-
de cristã significa viver uma vida de interdependência, de
suporte, de serviço, de comunhão, de compartilhar e de so-
lidariedade com irmãos e irmãs em Cristo. Ela envolve a
celebração das nossas alegrias e triunfos, como também dos
nossos esforços para passarmos por problemas e conflitos
com respeito à unidade e à reconciliação.

13
Ver o livro deste autor The Temple Within (o Templo Interior), que será em
breve publicado por esta editora.
130  a vida comunitária de deus

Comunidade significa mais do que ter bons amigos. Sig-


nifica ser parte de um corpo de pessoas comprometidas com
relacionamentos extraordinários arraigados numa identi-
dade e propósito comum em Cristo. Comunidade significa
mais do que ter várias reuniões. Significa construir um
modo de vida conjuntamente, uma memória grupal e um
futuro comum antecipado. Comunidade significa também
mais do que se sentir aconchegado em grupos exclusivos
e fechados de apoio. A comunidade é vivida no mundo,
aberta e inclusivamente.
Christian Smith
Going to the Root
Nine Proposals for Radical Church Renewal
(Indo à Raiz –
Nove Propostas para Renovação Radical na Igreja)
Herald Press, 1960, p. 2

Cuidado Mútuo Uns pelos Outros

“Levai as cargas uns dos outros e, assim, cumprireis a lei


de Cristo” (Gl 6:2).

Nós, como Corpo de Cristo, somos membros uns dos


outros. Pertencemos uns aos outros. Jesus nos ensinou a lavar
os pés uns dos outros (João 13). Esse tipo de serviço humilde e
cuidado uns pelos outros é uma expressão da vida divina dentro
da Divindade. Ou eu diria que deve ser.
Jesus não nos disse para amar uns aos outros para que
pudéssemos cuidar dos nossos irmãos e irmãs de uma forma
mecânica. O que Ele estava dizendo era que você deve deixar a
vida comunitária de Deus dentro de você fluir para seus irmãos
e irmãs. Existe uma diferença enorme.
conjuntamente  131

Se pudéssemos fazer isso por nós mesmos, então não


haveria necessidade da cruz. Muitos cristãos acreditam que o
único motivo que levou Jesus à cruz foi para Deus perdoar os
nossos pecados. Assim ganhamos uma ficha limpa. Agora pode-
mos enchê-la de novo com nossos trastes! Cristo foi à cruz não
somente para nos dar uma ficha limpa; Ele foi à cruz e morreu
para nos dar Sua própria vida. Foi por isso que o Pai colocou
Seu Filho dentro de você. Foi por isso que, através da ressurrei-
ção, Ele Se tornou o Espírito Vivificante (1 Co 15:45). Foi assim
para que Ele pudesse entrar no seu espírito e então seu espírito
se tornar um com o Espírito d’Ele (1 Co 6:17).
Tudo isso foi com o propósito expresso de Ele poder vi-
ver Sua vida em e através de você. Na cruz Ele colocou você na
morte. Através da ressurreição Ele colocou a Sua vida dentro de
você. Agora Ele pode viver a Sua vida dentro de você (Gl 2:20).
É assim que amamos os irmãos. É assim que encorajamos
uns aos outros diariamente. É assim que servimos uns aos outros,
cuidamos uns dos outros e compartilhamos nossa vida uns com
os outros. É assim que vivemos a vida comunitária de Deus.
15 Liderança

A A liderança espiritual é um dos assuntos mais mal en-


tendidos hoje. Inúmeros crentes têm sofrido nas mãos de líde-
res dominadores e autoritários em várias situações de “igreja” e
“ministério” cristão.
Eu conheço pessoalmente muitos crentes que foram se-
veramente prejudicados pelos assim chamados líderes domi-
nando o rebanho de Deus. E sempre há justificação bíblica para
dominar e manipular o povo de Deus. Esses “líderes” sempre
têm versículos da Bíblia para lhes dar suporte. Todos nós sa-
bemos, naturalmente, que podemos justificar quase qualquer
coisa utilizando versículos bíblicos. Os pregadores fazem isso o
tempo todo. Encontram um versículo aqui e outro lá e depois
de colocados juntos surge uma doutrina!
Por outro lado, como uma reação a essa liderança apli-
cada de forma opressiva, podemos ter ido para o outro extre-
mo abandonando a liderança totalmente. Muitos crentes que
tenho conhecido não querem qualquer ligação com líderes
cristãos desse tipo. Eles têm pavor de quaisquer líderes e tal-
vez com justas razões. Entretanto, a verdadeira autoridade e
liderança espirituais existem.
134  a vida comunitária de deus

O Ponto de Vista Trinitariano

O propósito deste livro é mostrar a você como o Deus


Trino é o fundamento para tudo. Essa vida corporativa que é
vivida entre os membros da Divindade é a nossa realidade em
todas as áreas. Se quisermos descobrir como amar uns aos ou-
tros, precisamos alcançar essa posição. Se quisermos ver o eter-
no propósito de Deus, precisamos alcançar essa posição. E se
desejarmos descobrir a verdadeira liderança espiritual, também
precisamos alcançar essa posição.
Não é que a vida do Deus Trino seja uma espécie de pa-
drão ou exemplo para nós seguirmos. De modo algum é isso.
Não tentamos seguir “o padrão” de vida da Divindade. Na ver-
dade nós vivemos a vida da Divindade. Deus, em Cristo, é a
nossa vida. Não se trata de nós O imitarmos. Na verdade é Ele
vivendo Sua vida corporativa em nós e através de nós.
Então precisamos continuar nossa consideração de como
a vida é vivida dentro da comunidade do próprio Deus. Nessa
consideração podemos descobrir, e descobrimos por meio de
revelação. A revelação é o fundamento sobre o qual a vida é
vivida. Primeiro nós cremos, depois nós vemos, após isso en-
tendemos e por fim vivemos. Mas antes que possamos crer ou
ver nós precisamos ouvir. A fé vem pelo ouvir. Este livro foi
escrito com o propósito de levar você a ouvir, depois crer, depois
ver e então viver.
Então, como a liderança é vivida dentro da Divindade?
Existe algo semelhante à liderança dentro do Deus Trino? Se
existe, como ela é praticada? As respostas podem impactar
você.
liderança  135

O Pai e o Filho

O conceito típico de liderança dentro do relacionamento


do Pai e do Filho é muito terreno. Consideramos esse relacio-
namento e imaginamos: bem, com certeza o Pai está no coman-
do. Ele é o “Pai”. O Filho é sujeito ao Pai. Depois o Espírito está
sujeito ao Filho. Essa é a nossa conclusão: a liderança dentro da
Divindade é organizada por meio de uma corrente de comando.
Mas é realmente assim que a liderança opera dentro de Deus?
Vimos no último capítulo que a comunidade de Deus sem-
pre opera conjuntamente. Tudo o que Eles fazem, fazem juntos.
Não seria isso legítimo também para a autoridade e a liderança?
Somos nós que fazemos distinções, separamos funções e respon-
sabilidades, dividimos em categorias e classes. Isso é por causa da
nossa mente caída e individualista. Deus não pode ser forçado a
Se encaixar em nosso insignificante modo de pensar.
O Pai e o Filho são um. Também é verdadeiro que Eles
são duas Pessoas diferentes, mas não diferentes da maneira que
nós somos diferentes. Eles têm um propósito, um alvo, um co-
ração e uma mente. Quando Eles Se movem, movem-Se juntos
em direção a um alvo comum. Eles não precisam de uma Pessoa
para ser o “líder” porque estão continuamente Se submetendo
uns aos outros. O interesse de cada um é o bem dos outros.
Cada um está sempre promovendo os outros. Na Terra Jesus
estava sempre “promovendo” Seu pai. Seu alvo era que Seus
seguidores conhecessem o Pai e fizessem a vontade d’Ele.
Mas o alvo do Pai era igualmente promover o Filho. “Este
é o meu Filho amado, em quem me comprazo” nos revela isso.
O Pai enviou o Filho para obter uma noiva para Si mesmo. O
Filho veio à Terra para obter uma família para o Pai. O Espírito
apenas promoveu o Filho e O revelou aos Seus discípulos. Ele
veio para obter uma casa ou habitação para Deus.
136  a vida comunitária de deus

A liderança também poderia ser corporativa? Seria pos-


sível que uma comunidade (de três) pudesse governar e liderar
como se fosse uma? Por que sempre pensamos que a liderança
deve ser investida em um único indivíduo? Aqui eu digo no-
vamente que esse tipo de pensamento é um resultado direto
da condição caída da nossa mente individualista. Temos mui-
ta dificuldade para pensar em termos de corporativismo. Nós
pensamos como indivíduos separados e independentes, e esse é
o modo como vivemos. Deus sabe que Ele é uma comunidade e
por isso pensa e vive dessa forma. Nós, na verdade, somos uma
comunidade, mas ainda não reconhecemos isso e então vive-
mos como indivíduos separados. Todavia, isso não muda o fato
de quem Deus é e do que Ele quer.
Ele ainda quer uma expressão corporativa de Si mesmo. Ele
quer que essa imagem seja a própria vida de Deus, a vida comuni-
tária vivida por um grupo de pessoas de carne e sangue na Terra.
Precisamos entender que a autoridade de Deus na Terra
está na Sua Igreja. Essa é uma autoridade corporativa investida
em todos os membros do Corpo.
Naturalmente isso significa que Cristo deve ser a Cabeça
absoluta da Igreja. O Corpo é governado pela Cabeça, e só pela
Cabeça. O governo está nos Seus ombros , mas os ombros são
parte do Corpo. Veja, é a Cabeça e o Corpo que têm autorida-
de porque estamos falando sobre um Homem. Quem está no
comando? Cristo está no comando. Um Cristo que é composto de
Cabeça e Corpo. O Novo Homem (Cl 3:9-11; Ef 2.15).

Liderança Líquida

A maneira como eu vejo a vida (e a liderança) operando


dentro da Divindade é como um fluido. Essa é a única maneira
que eu posso descrevê-la. A vida flui dentro de Deus como um
liderança  137

líquido, como um rio. Tudo sobre Deus está contido dentro da


água desse rio. O líquido é Sua vida. É o que Ele é e o que Ele
faz. A autoridade e a liderança são apenas outra parte da Sua
vida. Elas fluem como o resto da Sua vida flui.
O líquido flui. Ele é fluente. Ele é mutável. Ele é dinâmi-
co e não estático. Nossos conceitos sobre liderança são muito
rígidos e estáticos. Nós só podemos pensar dentro de uma de-
terminada “caixa” que chamamos de liderança. Mas a vida de
Deus é fluente. Ela flui e muda de acordo com a necessidade.
Eu não creio que Deus mude em Seu caráter essencial e
natureza. Seus atributos não mudam. A essência de quem Ele é
e o que faz não muda. Entretanto, a forma como Ele Se move e
faz as coisas muda. Água é água. É H2O. A composição e a natu-
reza essencial da água nunca mudam. Mas ela é fluente e flui e
muda de aspecto e forma para se ajustar à situação. Essa fluidez
de Deus se reflete diretamente na maneira como Ele comanda.
Podemos ver isso claramente no modo como Ele Se moveu no
passado, conforme o registro nas Escrituras.

O Pai no Antigo Testamento

No Antigo Testamento podemos ver claramente o Pai


tendo o lugar de preeminência. O Filho é mais mencionado
em termos proféticos e futuros. O Espírito é mais menciona-
do como Aquele que executa a vontade do Pai. O Pai, Jeová, é
Aquele que parece tomar a dianteira no Antigo Testamento.

O Filho nos Evangelhos

O Filho é o mais proeminente nos evangelhos. Através da


encarnação, viver humano, crucificação e ressurreição nós vemos
o Filho ocupando a cena principal.
138  a vida comunitária de deus

O Espírito nas Epístolas

Quando o Filho ascendeu ao Pai, Ele enviou o Espírito


Santo. O Espírito Santo desce sobre a Igreja, e os crentes são
batizados por Ele. No restante do Novo Testamento vemos o
Espírito como o mais proeminente.
Tudo isso nos mostra quão fluente o nosso Deus real-
mente é. A Sua liderança não é “rígida”. Ela muda e se adapta
à necessidade e situação. Deus coloca Seu Espírito em pessoas
diferentes, em ocasiões diferentes e em diferentes situações para
liderarem.
Quando Jesus esteve na Terra, Ele disse: “… o Pai é maior
do que eu” (Jo 14:28). Todavia, depois da ressurreição, o Pai deu
toda autoridade e poder no céu e na Terra ao Filho. Quem está
no comando agora? Só podemos dizer isto:
DEUS ESTÁ NO COMANDO AQUI!
E Deus é uma comunidade de Três.

A Expressão da Comunidade

A Igreja é a incorporação de Cristo. Ele é a incorporação


de Deus. Toda a plenitude da Divindade habita em Cristo. Isso
significa que a Igreja é a expressão da plenitude da Divindade. O
Corpo, que é a Sua Igreja, é a plenitude de Cristo (Ef 1:23).
O Corpo de Cristo não é uma organização, mas um or-
ganismo composto de crentes regenerados cujo propósito é ex-
pressar a vida e as atividades da Cabeça. A Cabeça e o Corpo são
um e juntos eles compõem o Novo Homem chamado Cristo
(Ef 4:13). O Corpo é para expressar a Cabeça, mas a Cabeça
não é um indivíduo isolado. Ela é parte de uma Comunidade.
liderança  139

A Cabeça é uma com as outras Pessoas na Divindade. Assim, a


comunidade da Divindade é uma com a comunidade do Corpo.
Deus é um com Sua Igreja. Isso é a verdadeira “rede de conta-
tos”! Todo o capítulo 17 de João trata disso. Deus Se torna um
com o homem. A Comunidade de Deus se une com a comu-
nidade do Homem. Este não é o homem caído, mas o Novo
Homem em Cristo.

O Senhorio de Cristo

Todos sabemos que Jesus Cristo é a única Cabeça da Igre-


ja (Cl 1:18). Mas devemos entender que este senhorio não está
investido num indivíduo solitário. Este senhorio é corporativo.
O Filho é um com o Pai e com o Espírito. A plenitude da Di-
vindade habita em Cristo. Este senhorio é compartilhado, exata-
mente como qualquer outra atividade dentro do Deus Trino.
Precisamos entender que Deus faz tudo dentro do contexto da
comunidade.
Assim podemos começar a ver algumas das formas em
que a liderança como parte da vida de Deus funciona. Primeiro
a liderança é sempre compartilhada. Isso é claramente salientado na
prática das igrejas primitivas. Não podemos ver um exemplo
sequer de um homem liderando (sozinho) uma igreja ou uma
equipe de ministério no Novo Testamento. Sempre era com-
partilhado. Sempre era corporativo.

A liderança em equipe não é uma invenção humana. Seu


precedente foi estabelecido no céu. As Escrituras apresen-
tam um exemplo maravilhoso de liderança participativa
no nível mais elevado no tocante à tarefa de uma igreja que
140  a vida comunitária de deus

parece por demais simples: equipar os corpos locais com


dons espirituais. Visto que a igreja desde o Pentecostes está
sob o cuidado geral do Espírito Santo, parece que a distri-
buição dos dons espirituais recai simplesmente no Espírito
Santo. Entretanto, todas as três pessoas da Divindade es-
tão intimamente envolvidas no capacitar a igreja com dons
espirituais. O Espírito Santo provê os dons; Cristo o Se-
nhor provê diferentes tipos de serviço; e Deus o Pai supre
diferentes tipos de operações (1 Co 12:4-6).
A igreja e o seu ministério local são bastante importantes
no propósito de Deus para que toda a Trindade esteja en-
volvida em providenciar tudo que seja necessário para pro-
mover seu desenvolvimento. Este é o melhor do ministério
coletivo. O mínimo que pode ser feito pelos beneficiários
terrenos desta colaboração celestial para imitá-la e para se
opor resolutamente a qualquer recrutamento autocrático da
liderança dentro das comunidades cristãs.
Gilbert Bilezikian
Community 101
(Comunidade 101)
Zondervan Publishing House, 1997, p. 165

Outra coisa que podemos ver é que a liderança era lí-


quida. Ela era sempre adaptável e fluente. A liderança nunca
foi estabelecida como um sistema rígido e hierárquico. Quando
Paulo e Barnabé foram enviados no início, a aparência era que
Barnabé conduzia a equipe. Entretanto, no meio da viagem pela
Galácia parece que ela mudou para Paulo. Na igreja em Jeru-
salém algumas vezes Pedro tomou a frente e em outras vezes
Tiago foi mais proeminente. Isso é apenas o fluir natural da vida
comunitária.
liderança  141

O mais importante é entender que a liderança é apenas


outra parte da vida de Deus. Essa vida flui como um rio. Essa
vida é fluida e aceitável. Essa vida é sempre corporativa. E a nos-
sa chamada é para aprender como viver com essa vida.
Essa vida não é apenas fluente, mas também é maleável e
submissa. Essa vida está saturada de humildade. Essa vida sem-
pre toma o último lugar. Essa vida promove os outros em vez
de si mesma.
A vida comunitária dentro da Divindade não é como a
vida humana. As Pessoas na Divindade estão continuamente
dando sua vida uma à outra. Ninguém busca ser o primeiro.
Ninguém busca ser promovido ou estar “acima de todos”. Essa
vida corporativa é uma vida crucificada. Por isso a vida corporati-
va de Deus é uma vida de ressurreição!
16 A Vida da Cruz

A As noções da cruz para muitos crentes são muito limita-


das e superficiais. Para a maioria dos cristãos a cruz era um pe-
daço de madeira onde Jesus foi crucificado por nossos pecados.
Usamos pequenas cruzes em nosso pescoço para simbolizar e
nos lembrar da crucificação do nosso Senhor. Distribuímos cru-
cifixos e participamos da Ceia do Senhor para nos lembrarmos
do quanto Ele sofreu por nossa causa. O que não percebemos é
que vendo a cruz dessa forma perdemos o ponto principal dela.
Ainda somos individualistas e agarrados em nós mesmos. Isso é
o exato oposto da cruz.

A Cruz é Eterna

A cruz não é simplesmente algo que aconteceu há dois mil


anos no Calvário. Aquele acontecimento foi motivado por algo
que sempre existiu dentro do coração de Deus. A cruz é eter-
na. Ela é parte da vida comunitária de Deus. O que aconteceu
há dois mil anos no Calvário é a expressão externa, o resultado
de algo que sempre existiu dentro do Deus vivo. “E eles irão
adorá-la, todos os que habitam sobre a terra, (todos) cujos no-
mes não estão escritos no pergaminho da vida (o pergaminho)
que pertence ao Cordeiro que foi morto (na mente e propósi-
to de Deus) desde quando os fundamentos do universo foram
144  a vida comunitária de deus

lançados, e que é considerado (por Deus) como o Cordeiro no


momento” (Ap 13:8).14
O Filho Se tornou o Cordeiro por causa de algo que sem-
pre existiu dentro de Deus. Esse “algo” é na realidade parte da
vida divina.
Lembre-se de que tudo o que Jesus ensinou veio de Seu
Pai. Tudo o que Ele disse e fez saiu da Sua própria experiência
com a Divindade na eternidade passada. Ele não falou de dentro
de um vácuo. Ele não ensinou mera teoria. Todas essas coisas
Ele já havia experimentado no Espírito com Seu Pai.
“Ninguém tem maior amor do que este” (Jo 15:13). Dar
a vida por outro já tinha sido Sua experiência dentro da comu-
nidade da Divindade. Essa é uma forma de vida dentro dessa
Comunidade. O dar a vida é uma experiência “diária” dentro
de Deus. O Pai está sempre dando Sua vida pelo Filho. O Filho
está sempre dando Sua vida pelo Pai. O Espírito é quem trans-
fere essa vida sacrificial. Ele é o canal da vida crucificada.
Prezado leitor, por favor, preste atenção nisto: “A vida
corporativa é um sacrifício contínuo”.
As Pessoas da Divindade estão continuamente dando sua
vida uma à outra. Há uma contínua doação da vida neste lugar.
Há um “sacrifício” contínuo sendo oferecido um ao outro neste
lugar. Elas não Se apegam à Sua própria vida; pelo contrário, dão
Sua vida o tempo todo.

A Essência da Vida

Naturalmente isso não se refere especificamente à vida físi-


ca. Jesus deu Sua própria vida física na cruz. Todavia, ao fazer essa
declaração incrível Ele não estava Se referindo à vida física…


14
Tradução expandida do Novo Testamento de Kenneth Wuest.
a vida da cruz  145

A palavra vida neste versículo é vida da alma, não vida físi-


ca. Refere-se àquela parte de nós que compõe a mente, a vontade
e as emoções. É uma questão de desistirmos daquilo que quere-
mos, daquilo que escolhemos, daquilo que desejamos em favor
de outro. Esse “dar a vida” não se refere ao martírio. Antes, é um
derramar da sua própria pessoa para outra. É a doação da sua vida
preciosa; seu tempo, seu dinheiro, seus pensamentos, seus sen-
timentos em favor de outro. É uma doação total de quem você
é e do que você tem para outro. Não é um simples compartilhar
da vida, é uma doação completa da vida por outro. É dar a outras
pessoas sua atenção plena, seus pensamentos, seus sentimentos e
recursos para o bem delas e não para o seu próprio bem.
Não precisamos dizer que não desistimos da nossa vida
com facilidade. Nossa tendência é nos apegar firmemente à
nossa preciosa pequena vida. Esse egoísmo é baseado no temor.
Temos medo de perder algo se o dermos a outra pessoa. E esse
é o ponto central. Precisamos perder nossa vida completamente
a fim de ganhar. Pois é somente pelo perder que você ganhará
o reino. É apenas pelo morrer que você poderá realmente viver.
Essa é a vida da cruz. Essa é a vida corporativa.

A Cruz na Vida da Igreja

“Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu…”


(Jo 3:16).

Esse é um verso notável das Escrituras que todos conhe-


cemos. Deus amou, por isso Ele deu. Mas o que Ele deu? Ele
deu o Seu tudo. Ele deu o Seu Filho. Deus, o Pai, está acostu-
mado a dar desde muito tempo. Poderíamos dizer que Ele tem
146  a vida comunitária de deus

um “estilo de vida” de dar Sua vida. Ele esteve sempre dando


Sua vida ao Seu Filho. Quando Ele deu o Seu Filho por nós, Ele
estava dando a Sua própria vida, porque toda a Sua vida estava
investida em Seu Filho. Quando Ele deu o Seu Filho, Ele nos
deu o Seu tudo!
Mas é muito importante entendermos por que Ele fez
isso. Foi por duas razões: Ele amava o mundo e amava Seu Fi-
lho. Agora você pode estar perguntando: se Ele amava tanto Seu
Filho, por que O entregou? Ele O entregou para que pudesse
ser glorificado (Jo 17:1). A glorificação do Filho é um assunto
muito simples, mas muito profundo. Glorificar significa am-
pliar, expandir, aumentar, tornar maior, mais pleno e mais rico;
e para expressar toda essa plenitude, Deus, o Pai, amou tanto o
Filho que Ele quis expandi-lO para depois expressar toda a Sua
plenitude a toda a criação.
Seu plano era fazer isso colocando Seu Filho em nós e
assim ter muitos filhos que fossem moldados segundo o Filho
Primogênito (Rm 8:29). Isso só aconteceria pela entrega da Sua
vida, pela dádiva do Seu Filho. A distribuição da vida do Seu
Filho em muitos filhos só poderia acontecer por meio da entre-
ga dessa mesma vida. O Grão de Trigo tinha que cair na terra e
morrer para que muitos grãos pudessem surgir (Jo 12:24).
Essa é a essência da vida divina. Essa é a essência da vida
comunitária: dar a vida pelo outro.
“Nisto conhecemos o amor: que Cristo deu a sua vida por
nós; e devemos dar nossa vida pelos irmãos” (1 Jo 3:16). Essa é
a base para toda liderança. O maior deve se tornar o menor e o
servo de todos. A liderança na igreja não é como uma pirâmide
com todos os líderes no topo e o resto do povo embaixo. Antes,
é como um funil, com todos os líderes no fundo segurando,
sustentando e treinando os santos. Os líderes treinam os santos
a vida da cruz  147

para realizarem todo o ministério. Os líderes não realizam todo


o ministério (Ef 4:11-13).
A cruz é o elemento mais crucial na vida de qualquer lí-
der. Ele precisa dar sua vida constantemente pelos santos. Ele
precisa derramar sua vida constantemente pelos outros. Os lí-
deres não são “especiais”. Eles são apenas irmãos e irmãs que
são chamados para funcionarem de certa maneira para edificar
o Corpo de Cristo. Tem havido muitos abusos da liderança por
haver muito pouco da cruz.
Se você decide se envolver com uma expressão orgânica
da Igreja, então a vida comunitária estará presente. Isso significa
que você se tornará muito próximo de outros irmãos e irmãs.
Quando isso acontece, a cruz estará presente de uma maneira
clara. Vai haver um (ou talvez mais) irmão ou irmã que irá irritar
você. Eles dificultarão a sua aproximação. E aí será apresentada a
você uma grande oportunidade de abraçar a cruz.
Então você pode realizar aquilo que sua carne não quer
fazer. Você pode dar sua vida por essa pessoa! Você pode amá-la.
Você pode dar do seu tempo e recursos a ela. Ela é membro de
Cristo. Ela faz parte do mesmo Corpo. Você pertence a ela e ela
pertence a você (Rm 13:4-5).

Cristo não pode entrar enquanto o homem não sair. Isso se


aplica inicial e progressivamente. Em Cristo não há lugar
para os julgamentos caídos e produzidos por Satanás, nem
para os conceitos, energias e sentimentos de outro homem.
A medida de Cristo depende da saída daquilo que não é
de Cristo. Isso tem que ser enfrentado como um fato bá-
sico e inclusivo mais cedo ou mais tarde, de uma vez por
todas. Depois é preciso reconhecer que a conformidade com
a imagem de Cristo é um processo para toda vida, e esse
148  a vida comunitária de deus

processo prossegue com base na Cruz. Não são novas mor-


tes de Cristo, não é uma repetição da Cruz, uma, duas ou
muitas vezes, mas é uma operação exterior do significado e
implicações definitivos da Cruz. A presença e a influência
na Igreja daquilo que somos naturalmente é limitar a Cris-
to, e consequentemente negar a Igreja, opor-se ao Senhorio
Soberano de Cristo, promover fraqueza espiritual e colocar
Satanás no lugar de poder. Tudo isso é solucionado pela
Cruz de Cristo. Por isso o Altar fica no limiar da Casa;
é o Grande Altar – uma oferta totalmente queimada. A
grandeza da Cruz vem da imensidade daquilo a que ela se
refere, e torna possível, nos conselhos eternos de Deus.
T. Austin-Sparks
The Centrality and Universality of the Cross
(A Centralidade e Universalidade da Cruz)
Emmanuel Church, 1929, p. 70-71

A cruz deve ser o caminho de vida na Igreja. A vida da


Igreja deve ser uma vida crucificada, onde todos estão dando sua
vida pelos santos. Se e quando isso acontecer, então veremos a
vida corporativa sendo manifestada na Terra novamente.
17 A Vida Vem à Terra

“No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o


Verbo era Deus” (Jo 1:1).

“E o Verbo se fez carne e habitou entre nós, cheio de graça e

I
de verdade, e vimos a sua glória, glória como do Unigênito
do Pai” (Jo 1:14).

Isso é a divindade assumindo a humanidade. Deus Se fez


Homem. Esses versículos deixam claro que o Filho eterno é o
Verbo e que Ele Se fez carne. Ele veio na “semelhança” da carne
pecaminosa, mas sem pecado (Rm 8:3). Em outras palavras, o
Filho divino assumiu a humanidade. Agora Ele tem ambas: a
divindade e a humanidade. Ele é tanto Deus como Homem: o
Filho de Deus e o Filho do Homem. Como diz Stanley Grenz:

Jesus é o Verbo. Segundo o Novo Testamento, Jesus é tanto


divino como humano porque Ele é o Verbo. João declara
que Jesus é o “Verbo” no prólogo do seu Evangelho e na
introdução da sua primeira epístola. O termo que João es-
colhe (logos: Verbo) contém um profundo significado.
De acordo com os filósofos gregos, todo o universo foi or-
ganizado segundo uma lei interior por meio da qual os
150  a vida comunitária de deus

humanos deveriam orientar sua vida. Eles chamavam esse


princípio de “Palavra”. O mais importante para o nosso
entendimento de Cristo é a noção hebraica da “Palavra de
Deus”. A “Palavra” é o que revela a própria natureza de
Deus. E ela incorpora o poder criativo de Deus que fala
e assim se faz, o Deus que cria o mundo segundo a Sua
sabedoria (Pv 8:22-31).
Por meio desse termo “Palavra” João reconhece a identida-
de criativa e reveladora de Jesus. Ele é a Palavra criativa
de Deus: “Todas as coisas foram feitas por intermédio dele
e, sem ele, nada do que foi feito se fez” (João 1:2; veja
1:10). E Jesus é a Palavra reveladora de Deus: “E o Verbo
(Palavra) se fez carne e habitou entre nós, cheio de graça e
de verdade, e vimos a sua glória, glória como do Unigênito
do Pai,” (Jo 1:14; Cl 1:15-16).
Portanto, a declaração “Jesus é o Verbo” (Palavra) afirma
que Jesus de Nazaré revela o significado de toda a realida-
de – até mesmo a natureza de Deus. Quer dizer, esse ser
humano Jesus é a revelação divina de Deus.
Stanley Grenz
Created for Community
(Criados para a Comunidade)
Baker Books, 1996, p. 123

Observe que desde o início do evangelho de João (ver-


sículo 14) é estabelecido que existe um relacionamento. Esse
relacionamento é o Pai e o Filho. Imediatamente o fato de que
Deus é corporativo é estabelecido. O Filho é enviado do Pai
como a Palavra e Se faz carne. Ele Se torna humano. Mas Ele
não vem como um indivíduo solitário. Ele vem como a Palavra
de Deus. Ele vem como o representante, a explicação e a expres-
são do Deus Trino. Lembre-se de que aprouve residir n’Ele toda
a plenitude (Cl 1:19).
a vida vem à terra  151

Assim podemos ver que a vinda de Cristo como a ex-


pressão plena do Deus corporativo é que explica o propósito da
encarnação. Ele Se fez carne para cumprir o eterno propósito de
Deus. O propósito era cumprir o desejo de Deus de ter uma ex-
pressão visível e expansão da Sua própria vida corporativa aqui
na Terra. Isso só poderia acontecer se Deus e o homem se tor-
nassem um. Deus precisava trazer a vida humana a Si mesmo
para que pudesse introduzir a vida divina no homem. Deus pre-
cisava de um “lugar de encontro” onde Ele pudesse Se tornar
um com o homem, e esse lugar foi a Palavra.
Agora Deus teria a humanidade (não caída) n’Ele e o
homem teria a divindade nele. Deus e o Homem poderiam se
tornar um. Essa unidade se tornaria possível por meio de uma
vida compartilhada, uma vida comum. Em outras palavras, co-
munidade.

O Alvo de Deus Revelado

É tão maravilhoso que Deus nos tenha dado um vislum-


bre do Seu resultado final nas Escrituras. Vendo o resultado fi-
nal podemos entender qual é a Sua visão, propósito e alvo para
tudo. No final do livro de Apocalipse é mostrado um belo qua-
dro do propósito de Deus cumprido. Estou me referindo à visão
da Nova Jerusalém (por favor, leia Apocalipse 21). Essa cidade é
chamada de esposa do Cordeiro. Sua Noiva. Paulo também usa
essa “figura” de uma noiva em Efésios 5. Ele se refere a Adão
e Eva no jardim como uma figura de Cristo e a Igreja. Assim
podemos ver claramente o desejo do coração do nosso Deus de
ser um conosco tanto no início como no fim das Escrituras. O
desejo de Deus é estar “casado” com o Homem, a fim de que
152  a vida comunitária de deus

o Homem possa se expandir e expressar a Sua glória. A fim de


cumprir esse grande propósito o Filho de Deus precisou vir à
Terra para que Se tornasse o Primogênito entre muitos irmãos
(Rm 8:28-29).

Ele Tabernaculou entre Nós

“E o Verbo se fez carne e habitou entre nós, cheio de graça


e verdade, e vimos a sua glória, glória como do Unigênito
do Pai” (Jo 1:14).

Tudo nas Escrituras fala de Cristo (Jo 5:39). Todo o Anti-


go e o Novo Testamento falam d’Ele. Podemos dizer que todos
os livros da Bíblia compõem uma grande revelação escrita de Je-
sus Cristo. Se você começar a ver as Escrituras dessa forma, sua
vida espiritual sofrerá uma completa revolução. Pare de exami-
nar as Escrituras como lei e comece a buscá-las para encontrar
a Cristo. Pare de procurar encontrar nelas o que Deus quer que
você faça e comece a buscar para ver o Seu Filho. Isso vai mudar
tudo. Eu lhe garanto!

Ele é o Nosso Tabernáculo

Quando olhamos para o Antigo Testamento, podemos ver


muitas sombras, tipos e figuras do nosso Senhor. Lembre-se, to-
dos falam d’Ele. O tabernáculo de Moisés é uma das sombras.
Depois da doação da Lei, o próximo acontecimento im-
portante na história de Israel ao sair do Egito foi a construção
do tabernáculo, que se tornou o centro de todo culto a Deus
enquanto os judeus viajavam pelo deserto a caminho de Canaã.
a vida vem à terra  153

Esse tabernáculo era chamado de “tenda da reunião” e era o


lugar onde os sacerdotes apresentavam as ofertas ao Senhor. Era
basicamente uma tenda onde Deus encontrava com Seu povo.
Depois que o tabernáculo foi erigido, Deus não falou mais do
monte Sinai com Moisés; agora Ele falava da tenda da reunião.
Isso fez d’Ele o Deus tanto do céu como da Terra.
O tabernáculo trouxe Deus ao homem. Muito embo-
ra Ele não pudesse morar realmente numa estrutura feita por
mãos humanas (At 7:48), mesmo assim, simbolicamente, mani-
festou Sua presença com uma nuvem enchendo o tabernáculo.
Guarde na mente, outra vez, que isso é uma sombra das coisas
vindouras. Por meio disso Deus nos mostrou que Ele queria
habitar com o homem e no homem.

A Arca e o Tabernáculo

No tabernáculo havia três seções: o átrio exterior, o lugar


santo e o santo dos santos. A presença de Deus se manifestava
dentro do santo dos santos. Ele era ocupado por qual utensílio?
Pela Arca da Aliança. A Arca era feita de madeira (uma espécie
de caixote) e revestida de ouro. Estas coisas são tipos do seu
Senhor. Na Bíblia a madeira sempre simboliza a humanidade e
o ouro a divindade incorruptível. Isso significa que o conteúdo
ou material da Arca era tanto humano como divino – homem e
Deus. Filho do Homem e Filho de Deus. Em Cristo a natureza
humana e a natureza divina se tornaram uma.
O resto do tabernáculo também era feito desses mesmos
materiais, tábuas de madeira cobertas ou revestidas de ouro. Isso é
uma figura do homem em Deus. O homem coberto com Deus.
O tabernáculo é uma extensão ou uma ampliação da Arca.
Isso significa que ele é uma ampliação ou aumento de Cristo. A
Arca é o Cristo individual, o homem Cristo Jesus. O tabernáculo
154  a vida comunitária de deus

é o aumento desse Cristo; em outras palavras, o Cristo corpo-


rativo. Você está começando a ver mais claramente agora através
dessa figura do tabernáculo?
A Arca é o Cristo individual. Ele é o centro, o núcleo, a
vida e a Cabeça de tudo. O tabernáculo é o aumento daquele
mesmo Cristo. É o Cristo corporativo, a Igreja. Os dois, a Ca-
beça e o Corpo, são Cristo (1 Cor 12:12). Todo o tabernáculo
é Cristo – Deus e o homem como um na Terra. Você não pode
ter o tabernáculo sem a Arca e não pode ter a Arca sem o taber-
náculo. Assim como você não pode ter a Cabeça sem o Corpo,
também não pode ter o Corpo sem a Cabeça. A Cabeça e o
Corpo compõem um novo homem.

A Principal Atividade do Tabernáculo

A principal atividade é a entrega das ofertas a Deus. A


oferta é um “presente” ou dádiva para Deus. A Bíblia diz que as
ofertas são alimento para Deus (Nm 28:2). Já pensamos nisso
dessa forma? Chegamos a Deus para sermos alimentados. Sa-
bemos que Ele é o suprimento da nossa vida e o Pão da Vida
(João 6). Mas já imaginamos que Deus também tem fome? Na-
turalmente estou falando de maneira espiritual aqui. Mas Deus
precisa comer! Esse é o significado mais profundo por trás das
ofertas. A finalidade das ofertas é suprir comida para Deus. E
o que Deus gosta de comer? Na verdade só existe uma única
coisa. Seus gostos são muito específicos.

A Primeira Oferta

Existe um princípio muito conhecido entre os mestres e te-


ólogos da Bíblia. Ele se chama o princípio da “primeira menção”.
a vida vem à terra  155

Isso significa que a primeira vez que algo é mencionado na Bí-


blia, este incidente vai dar o significado mais genuíno por trás
do assunto todo através do restante das Escrituras. Se quisermos
entender as ofertas, precisamos considerar a primeira oferta.
A primeira oferta foi feita por Caim e Abel. Caim tinha
uma horta e levou uma oferta ao Senhor dos seus produtos.
Abel cuidava das ovelhas e levou um dos seus cordeiros ao Se-
nhor. Por que Deus aceitou a oferta de Abel e a de Caim não?
Porque Caim levou o “fruto” dos seus próprios trabalhos. Abel
levou um cordeiro puro e inocente. Caim levou dos seus pró-
prios trabalhos. Abel levou uma figura de Cristo. Você percebe
que tipo de oferta satisfaz a Deus? Só existe um tipo de alimento
de que Ele gosta… Cristo!

Levando Ofertas à Tenda da Reunião

A Igreja tem dois propósitos principais: expressar Cristo


visivelmente ao mundo e levar alimento a Deus. A tenda da
reunião é a assembleia dos crentes. Quando nos reunimos, que
espécie de oferta levamos a Deus? O único alimento que satis-
faz a Deus é o Seu único Filho. É esse alimento que estamos le-
vando? Muitos podem dizer que nunca levam nada às reuniões.
Se este é o seu caso, então você está perdendo o propósito das
reuniões. E levar qualquer coisa à reunião também não é bastante.
Deus quer ser alimentado com Cristo.
Se estivermos experimentando Cristo diariamente, se ti-
vermos comunhão com Ele em nosso espírito e se O tocarmos
no outro reino, se O buscarmos nas Escrituras esperando que
Ele nos dê revelação, então teremos uma oferta de cheiro suave
(presente) para dar a Deus. Levaremos uma oferta aceitável, a
única oferta aceitável, que é Cristo.
156  a vida comunitária de deus

A Vida Corporativa Anda com os Homens

Ele “tabernaculou” entre nós com o propósito expresso


de trazer a comunhão da Divindade ao Homem. Ele trouxe não
apenas o todo da Sua experiência e história nesta comunhão,
mas trouxe também a vida real dessa comunhão. Ele viveu a vida
corporativa diante dos Seus discípulos. João nos diz que eles vi-
ram e tocaram a Vida (1 Jo 1:1-2). Essa vida estava com o Pai. Essa
vida é comunhão. Essa vida é comunitária.
Jesus Cristo trouxe o Seu relacionamento com o Pai à
raça dos homens. Ele a trouxe no Espírito e através do Espírito
Santo. Ele a trouxe por meio dos Seus ensinos. Ele a trouxe por
meio dos Seus milagres. Mas, acima de tudo, Ele a trouxe por
meio do Seu viver. E depois Ele a trouxe por meio da Sua morte
e ressurreição.
A vida comunitária de Deus andou com os homens du-
rante trinta e três anos e meio. Ele mostrou a eles como viver
essa vida vivendo-a diante deles. Mas a simples imitação não
funcionaria. Sua intenção não era que eles O observassem e
depois tentassem viver essa vida. A vida humana nunca pode
imitar a vida divina. Não, isso nunca funcionaria. A vida divina
é vida corporativa e só poderia ser comunicada. Esse foi o pro-
pósito da Sua morte e ressurreição, a fim de que Ele Se tornasse
o Espírito vivificante (1 Co 15:45).
Ele andou pelas praias da Galileia com um grupo de ho-
mens. Ele não escolheu um grande homem para treinar e de-
pois enviar ao mundo. Ele escolheu um grupo de homens. Ele
escolheu uma comunidade. Com certeza a vida corporativa de
Deus só poderia ser manifestada através de uma comunidade.
Como eu disse várias vezes neste livro, um Deus corporativo só
a vida vem à terra  157

pode ser expressado corporativamente. É necessário um Corpo para


expressar e aumentar o Deus vivo.
Cada um dos doze homens era diferente. Cada um ti-
nha sua personalidade singular e traços de caráter. Onde alguns
eram fracos, outros eram fortes. Mas as personalidades deles
eram ajustadas pela vida comunitária de Deus que estava depo-
sitada em cada um (Jo 20:22). Eles andaram e viveram com a
Vida Divina durante três anos e meio e fizeram isso juntos. Eles
viveram com um Homem que não apenas viveu para Deus, mas
também viveu por meio de Deus (Jo 6:57). Eles testemunharam
a vida d’Ele com Seu Pai e em Seu Pai. Eles viram a vida corpo-
rativa de Deus vivida diante deles.
18 Pondo em Prática

A A vida que Jesus e os doze tinham juntos é um exemplo


para nós da vida comunitária. Na verdade é muito mais do que
isso…
Jesus tomou a vida comunitária que Ele havia experimen-
tado na Divindade desde a eternidade passada e a trouxe para a
Terra. Ele trouxe a comunhão que havia experimentado com o Pai
e o Espírito e a comunicou aos doze homens. Durante três anos e
meio esses homens tiveram o privilégio de ver a vida corporativa
bem diante deles. Eles observaram esse estilo de vida comunitário
na Terra. Eles testemunharam como essa vida se conduz. Eles
viram como essa vida compartilha, dá e entrega a si mesma. Eles
viram como essa vida manifesta sua própria natureza corporativa.
Eles viram as Pessoas da comunidade divina viver como um. Eles
contemplaram essa vida graciosa quando fluía entre eles e viram
o amor e o relacionamento do Deus Trino.
Depois, um dia, essa vida gloriosa foi realmente dada
diretamente a eles (Jo 20:22). Eles a receberam através do vaso
do Espírito Santo. Agora a comunidade estava literalmente
vivendo dentro deles! O Senhor deles Se tornou o Espírito
Vivificante e comunicou-lhes essa vida. Agora eles não eram
apenas testemunhas dessa vida, eram participantes da vida cor-
porativa (2 Pd 1.4).
160  a vida comunitária de deus

A Revelação Progressiva de Deus

Os discípulos não entenderam muito o que Jesus ensinou


a eles na ocasião. Eles ainda mantinham o conceito de que Jesus
viera para assumir o poder político como um rei literal e des-
truir o domínio do Império Romano. Esse era o conceito deles
do “Messias”. Ele libertaria a nação de Israel da escravidão política
dos romanos. Eles falharam em entender, no início, que o reino
de Deus é um reino espiritual e não deste mundo (Jo 18:36).
Jesus havia lhes dito que o reino não vem por observação.
Não podemos dizer que ele está aqui ou acolá. O reino de Deus
está entre vós. Os doze não entenderam essas coisas. Eles ainda
mantinham um conceito rudimentar do Pai. Ainda imaginavam
Deus como o Deus irado e vingativo, conforme algumas des-
crições do Antigo Testamento. Eles ainda não tinham visto que
essa era uma reação imatura à disciplina do Pai.
Jesus Cristo veio para nos mostrar uma forma muito
mais profunda e madura de olhar para o Pai. Esse Pai nos ama
profundamente. Somos Sua criação e Ele nos chamou para en-
trarmos no Seu reino por meio da fé no Seu Filho Unigênito.
Quando cremos, tornamo-nos Seus filhos como também so-
mos introduzidos em Sua família eterna.
Esse conceito de Deus sendo nosso Pai e de nós sendo
Seus filhos era inteiramente novo para esses jovens judeus.
Deus estivera sempre longe, e os simples mortais não poderiam
se aproximar da Sua santidade. Pensar que Deus era o “Papai”
deles era por demais íntimo e difícil de aceitar no início.
Mas Jesus lhes disse (e a nós) que Ele veio para revelar o
Pai. Ele veio para lhes dar a plena revelação de Deus como Pai
deles e do Seu desejo de ter muitos filhos.
pondo em prática  161

A Expressão Prática da Vida Corporativa

A vida comunitária é manifestada de uma forma prática


através da vida dos crentes na Terra. As Escrituras fazem refe-
rência a isso usando termos como o Corpo de Cristo, a Noiva
de Cristo, o Templo espiritual, a Família de Deus e o novo Ho-
mem. Existe outro termo que é traduzido pela palavra “igreja”.
Mas esse termo tem sido tão mal utilizado e distorcido que eu
hesito até em mencioná-lo. O que geralmente pensamos sobre
“igreja” não tem absolutamente nada a ver com a vida corpora-
tiva que tenho descrito neste livro.
A verdadeira “vida da Igreja” é a expressão espiritual e
prática da vida corporativa do Deus Trino. Isso é manifestado
através dos seres humanos. Não temos uma comunidade se-
parada da d’Ele. ELE É A NOSSA COMUNIDADE! Se um
grupo de crentes não é uma comunidade, então eles não são a
Igreja. A Igreja não é um prédio, organização ou evento. A Igreja
é a comunidade de crentes que são a expressão da vida corpora-
tiva de Deus. Ela é um fluir contínuo da vida divina, não apenas
uma reunião. Isso é uma tribo, uma sociedade, um estilo de
vida, uma família de irmãos e irmãs.
Deus é o nosso Pai eterno e nós somos Seus filhos. Temos
a própria vida de Deus dentro de nós. Temos o DNA divino.
Provavelmente a melhor forma de se referir à comunidade de
crentes seja pelo uso de termos relacionados à família. A família
cuida uns dos outros. A família guarda uns aos outros. A família
se diverte junta. A família supre as necessidades uns dos outros.
A família nem sempre concorda e algumas vezes até briga. Mas
a família sempre retorna uns aos outros. A família está sempre
ali uns pelos outros. Com a família você não pode esconder ou
fingir ser alguém ou algo que você não é. Todos conhecem suas
162  a vida comunitária de deus

fraquezas na família. Mas todos estão protegidos e seguros den-


tro da família. O Pai cuida de todos. Como Robert Banks diz:

Paulo vê implicações disso para a vida das comunidades


locais. Aqueles que pertencem a elas veem uns aos outros
principalmente como membros de uma família comum.
Por isso, em Gálatas Paulo encoraja a si mesmo e aos seus
leitores, sempre que tiverem oportunidade, a fazer “o bem
a todos, mas principalmente aos da família da fé” (Gl
6:10). De acordo com Efésios, a comunhão cristã entre ju-
deus que eram membros da linhagem do pacto e os gentios
que antes estavam alienados das promessas divinas expe-
rimentadas na ekklesia celestial deve ser visto exatamente
nesses termos. Referindo-se a Cristo, o autor assinala que,
“por ele, ambos temos acesso ao Pai em um Espírito. As-
sim, já não sois estrangeiros e peregrinos, mas concidadãos
dos santos, e sois da família de Deus (Ef 2:18-19). Tan-
to a reunião local como a “assembleia” celestial devem ser
consideradas como nada menos do que a família de Deus.
Robert Banks
Paul’s Idea of Community
(O Conceito de Paulo sobre Comunidade)
Hendrickson Publishers, Inc., 1994, p. 50

Embora tudo isso seja verdade, devemos sempre ter cau-


tela com o “como”. Como isso é verdadeiro? Isso não é uma
lista de “sim e não”. Isso não é lei. Isso é vida. Você não faz a
vida comunitária, você vive a vida comunitária. Não se trata de
fazer as coisas certas, e sim de permitir que a vida de Deus flua
em você e através de você. Deus nada poupou a fim de colocar
a Sua vida dentro de você. Essa vida, por sua própria natureza, é
corporativa. Essa vida está dentro de você neste momento. Tudo
pondo em prática  163

o que você precisa fazer é aprender a ter comunhão e a cooperar


com ela.15
Certamente, a vida corporativa não pode ser vivida ape-
nas por você. Essa vida deve fluir para os outros. A vida da Igreja
(por faltar um termo melhor) é a manifestação da vida divi-
na entre um grupo de crentes. A comunhão da Divindade está
buscando uma expressão prática na Terra. Isso exige um corpo
de crentes, onde todos estejam buscando a comunhão com esse
Deus corporativo. A vida que dá energia ao Deus Trino, a co-
munidade divina, é exatamente a mesma vida que dá energia ao
Corpo de Cristo, a Igreja. Essa vida deve expressar-se de forma
prática. Na Terra. Entre os seres humanos. Em sua cidade!
O desejo do coração de Deus é que Sua comunhão (a co-
munhão expressa pelos membros da Divindade) fosse manifes-
tada por Seu povo (os membros do Corpo de Cristo). Isso não
acontece por acaso. Isso tem sido o alvo, o desejo e o propósito
do Deus vivo desde a eternidade. Ele quer uma imagem. Ele quer
uma expressão. Ele quer um Homem corporativo (Ef 4:13) que
possa manifestar Sua natureza corporativa. Ele quer que você e
eu e cada crente estejamos envolvidos ativa e diariamente. Foi por
isso que nascemos. É por isso que vivemos neste planeta.
Como já vimos, Deus não quer apenas uma expressão,
mas quer também uma expansão do Seu Filho. Ele quer uma
amplificação do Seu Filho para que a vida da comunidade divina
possa ser manifestada a todas as criaturas viventes em todas as
regiões. Isso parece muito majestoso, vasto e impressionante,
mas realmente se torna muito prático na Terra. Essa vida é ma-
nifestada por seres humanos nas situações do dia a dia. E muitas
vezes não é fácil. Não é fácil por causa de todos os obstáculos.

15
Veja o livro The Temple Within (O Templo Interior), deste autor, que em
breve será publicado por esta editora.
164  a vida comunitária de deus

Obstáculos à Expressão Prática

Há o obstáculo da nossa mente individualista. Há o obs-


táculo da nossa carne caída e egoísta. E há o obstáculo da nossa
sociedade e cultura. Todas (e mais) nos impedem de viver a vida
comunitária de Deus de forma prática com outros crentes. Deus
quer um Templo espiritual. Esse Templo é composto de pedras
vivas… você e eu. Mas para ter um Templo é preciso haver edi-
ficação. Deus quer nos edificar juntos (1 Pd 2:5). Isso vem a ser
muito prático. Isso significa ficar próximo de outros crentes.
Significa construir relacionamentos de confiança, intimidade e
compromisso com outros santos em nossa região local. Signifi-
ca gastar muito tempo juntos para que tudo isso aconteça.
Essa vida corporativa tritura a nossa natureza egoísta e
a nossa cultura individualista. Ela perturba as nossas zonas de
conforto pessoal e invade nosso espaço “privado”. Ela é desa-
gradável para nós porque temos medo… medo de perder algo.
Talvez seja a nossa independência ou nossa individualidade.
Talvez estejamos com medo de ver nossos minúsculos mun-
dos particulares esmagados e substituídos pela realidade. Não
importa o motivo, não há dúvida de que os crentes têm pavor
mortal de viver a vida comunitária. Todavia, isso é o que nosso
Senhor mais deseja. É isso que impulsiona o seu Deus. Esse é o
ardente desejo no mais profundo do Seu coração. Foi isso que
O motivou a criar tudo.

Os Obstáculos Culturais

Jesus mencionou dois obstáculos principais que impedi-


riam o cumprimento do eterno propósito de Deus. Ele falou
pondo em prática  165

sobre eles muitas vezes a muitas pessoas. Não foi algo dito ape-
nas para aquele dia e época. Definitivamente eles se aplicam à
nossa geração.

A Família

Esse é o maior empecilho para a expressão prática da vida


de Deus. Estou falando da sua família natural. Jesus tinha mui-
tas coisas para falar sobre como a nossa família natural pode ser
um empecilho para Sua família espiritual (Mt 10:35, 37; 12:46-
50; 19:15, 29; Lc 14:26).
Embora seja uma crença popular entre os cristãos evan-
gélicos de hoje, a família não está em primeiro lugar. O reino
de Deus vem em primeiro lugar (Mt 6:33). Naturalmente que
dentro desse contexto a sua família é o grupo de pessoas mais
importante na sua vida. Mas o que Deus quer é que a Sua von-
tade, o Seu reino e senhorio permeiem tudo isso. “Para em to-
das as coisas ter a primazia...” (Cl 1:18).

O Dinheiro

Esse é o segundo maior empecilho para a vida corpora-


tiva. O dinheiro e a busca por ele através de negócio, profissão,
educação e outros são uma distração extremamente forte dentro
da nossa cultura atual. Jesus falou muito a respeito desse empe-
cilho (Mt 6:21, 24; 19:21; Lc 12:21, 33-34; 18:18-27).
Os doze deixaram tudo para seguir a Cristo. Os cento e
vinte deixaram tudo para segui-lO. Os três mil no dia de Pente-
costes deixaram tudo para segui-lO. Mas hoje, no mundo oci-
dental, é muito raro encontrar uma família que se mude para
166  a vida comunitária de deus

encontrar uma expressão orgânica autêntica da Sua Igreja. Po-


rém, mudamos nossas famílias por causa de um emprego ou
para ficarmos mais próximos de outros membros da família. E
ficamos surpresos porque não vemos a Igreja verdadeira em po-
der e liberdade!
Assim, deparamo-nos com um dilema: descobrimos que
estamos sendo empurrados em duas direções opostas. De um
lado você deseja viver a vida ao máximo, edificar sua própria
vida e cuidar do seu próprio negócio. De outro lado, Deus tem
esse propósito eterno. Ele deseja edificar um Homem corpora-
tivo para cumprir o Seu propósito. Viver a vida comunitária de
Deus exige muito. Ela vai exigir que você sacrifique a sua própria
vida, e isso significa tempo e recursos. Mas você quer acumu-
lar essas coisas para si mesmo. Você quer gastar o seu tempo e
recursos construindo a sua própria vida e não a expressão corpo-
rativa de Deus.
E há também algo no profundo do seu ser que está cla-
mando por essa vida. Isso é o seu espírito. Seu espírito (o ho-
mem interior) já sabe disso e quer viver essa vida. A sua parte
mais profunda anseia pela vida da Igreja. Sua parte mais profun-
da aspira pela vida corporativa.
Então fica claro que uma escolha precisa ser feita. A ques-
tão é: qual vida você vai escolher? Que vida você vai viver? Deus
escolheu você para um grande destino. Esse destino está cen-
tralizado em Seu propósito. Esse destino está centralizado em
Seu Filho. E eu devo perguntar novamente: qual vida você vai
viver?
19 Conformados
à Sua Imagem

“Porquanto aos que de antemão conheceu, também os


predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho,
a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos”
(Rm 8:29).

H
Ser como Jesus

Hoje ouvimos muito sobre ser como Jesus. Existe até


uma canção escrita por Rich Mullins chamada “É Difícil Ser
como Jesus”. Os pregadores, e consequentemente os crentes,
falam sobre a semelhança com Cristo. Temos ouvido dizer que
nosso alvo é sermos como Cristo, mas isso como cristãos indi-
viduais. Atualmente é isso que a maior parte dos “discipulados”
fazem. Estamos aqui para “fazer discípulos”, seja qual for o seu
significado. Afinal de contas, isso faz parte da “grande comis-
são” (Mt 28:19-20). Temos interpretado isso com o significado
de que devemos pegar os crentes individuais e ajudá-los a ser
como Cristo. Geralmente fazemos isso ensinando doutrinas a
eles, como estudar a Bíblia, como orar, como servir a Deus no
campo missionário e basicamente como ser bons cristãos.
168  a vida comunitária de deus

Mas onde as Escrituras falam sobre alguém se tornar


como Cristo? De onde tiramos essa ideia? A única coisa que eu
posso citar são as passagens que tratam com o ser conformado
à Sua imagem. Talvez seja a nossa paráfrase para o “tornar-se
como Cristo”. Se for assim, e acredito que seja, então devemos
olhar o contexto de cada uma dessas passagens. Em que contex-
to devemos ser conformados à Sua imagem?
Se você ler as passagens que tratam com o ser conforma-
dos à Sua imagem, verá imediatamente que o contexto é sempre
corporativo (Rm 8:28-30; 12:1-5; 2 Co 3:18; Cl 3:10-11). Somos
nós que somos conformados à Sua imagem. Somos nós juntos, o
Corpo, que deve ser como Ele. Você nunca pode ser como Jesus,
mas Ela pode! Estou me referindo àquela linda mulher, a Noiva
de Cristo, que está destinada a ser a Sua esposa (Ap 21:9).
Se você ler as Escrituras dessa perspectiva, cuidadosa-
mente, principalmente o Novo Testamento, ele se tornará um
novo livro. Você começará a ver a perspectiva correta para o tes-
temunho. As coisas farão mais sentido quando você as ler com a
“visão corporativa”. É por isso que a imagem de Deus é comu-
nitária, e assim, naturalmente, o processo de ser conformado
àquela imagem deve ser comunitário.

Realidade Espiritual e Expressão Prática

O fato é que nós já somos um. Nós estamos em Cristo e


Ele está em nós. Isso nos faz um (Jo 17.22-23). Como podería-
mos todos estar “em Cristo” e ainda não sermos um? O proble-
ma não é a nossa unidade, e sim a sua expressão prática.
Isso aparece através de nós quando a vivenciamos juntos
dia a dia. Isso aparece através de nós quando desenvolvemos
uma “consciência do corpo”. Como diz Watchman Nee:
conformado à sua imagem  169

É a mesma verdade com respeito ao corpo de Cristo. Mui-


tos irmãos e irmãs perguntam: Como posso dizer que vi o
corpo de Cristo? Em que base eu posso afirmar que tenho
vivido a vida do corpo de Cristo? Nossa resposta é sim-
ples: todos os que conhecem a vida do corpo de Cristo terão
a consciência do corpo de Cristo. Se você viu o corpo de
Cristo, você não tem como não ter a consciência do corpo,
porque a vida em você sendo uma realidade e uma expe-
riência, não tem como ela não manifestar sua consciência.
Você percebe o corpo de Cristo não apenas como um prin-
cípio ou como um ensinamento, mas você descobre que o
corpo de Cristo é uma questão de consciência real interior.
A vida não pode ser simulada e nem precisa ser. Se existe
vida, não há necessidade de fingir; se há vida, não há pos-
sibilidade para fingir. A expressão mais evidente da vida é
a sua consciência. Por isso, o cristão que vê a vida do cor-
po invariavelmente terá a consciência do corpo com outros
membros do corpo.
Watchman Nee
The Body of Christ: A Reality
(O Corpo de Cristo: Uma Realidade)
Christian Fellowship Publishers, Inc., 1978, p. 4-5

Ela vem através de uma revelação da natureza corporativa


da Igreja. Ela vem através do desenvolvimento de um estilo de
vida comunitário e não do individualismo e independência. E
ela vem quando compartilhamos nossa vida uns com os outros
e cuidamos uns dos outros. Em uma palavra, é uma família, mas
família no verdadeiro sentido da palavra. Não a família como
temos visto neste mundo, mas família como uma expressão ge-
nuína da vida comunitária de Deus.
170  a vida comunitária de deus

Verdadeiro Discipulado

Ser conformado à Sua imagem (ou se tornar como Cris-


to) é uma questão corporativa. Somos transformados juntos pela
renovação da nossa mente (Rm 12:1-5). Essa renovação aconte-
ce porque estamos aprendendo a pensar como um corpo e não
como um grupo de indivíduos. Estamos “aprendendo” Cristo.
Estamos aprendendo e experimentando a unidade da Cabeça e
do Corpo. Estamos aprendendo a pensar e funcionar como o
Novo Homem (veja Colossenses 3:9-11).
Isso é verdadeiro discipulado. Não é uma questão de ser
colocado num programa de treinamento individual de estudo
bíblico, oração, evangelismo e desenvolvimento do caráter, mas
é o processo de transformação da vida de ser conformado prati-
camente à Sua imagem. Isso é a manifestação da Sua vida comu-
nitária. É a projeção da comunhão da Deidade.
Por isso, só posso concluir de tudo isso que todo “disci-
pulado” verdadeiro acontece num contexto corporativo. Apren-
demos juntos como viver através de Cristo. Isso é algo que todos
aprendemos nas chamas diárias da vida da Igreja orgânica. Essa
ideia não é algo novo. Essa “tocha” brilhou claramente há qui-
nhentos anos quando os Anabatistas descobriram o verdadeiro
discipulado. Conforme Peter Hoover escreve:

Os Anabatistas falaram de um discipulado corporativo,


mas eles enfatizavam a Cristo. Cristo era a peça prin-
cipal. Os Anabatistas eram leais apenas a Cristo e disso
se desenvolveu naturalmente o discipulado corporativo e
lealdade uns para com os outros. Os Anabatistas não fa-
lavam de lealdade à igreja, ou lealdade à irmandade, ou
conformado à sua imagem  171

lealdade aos líderes ordenados por Deus. Eles não faziam


dois comprometimentos, um com a Cabeça e outro com o
Corpo. O comprometimento incondicional deles a Cristo
tornava todos os outros comprometimentos condicionais.
Peter Hoover
The Secreto of the Strength
(O Segredo da Força)
Masthof Press, 1997, p. 129

“Cristo era a peça principal”.


Eles o mantinham como o centro. Isso é extremamente
importante. Não é bastante ter relacionamentos íntimos e um
grupo bem unido. O único fator que nos une juntos deve o pró-
prio Cristo. Não devemos estar juntos porque todos nos damos
bem e temos os mesmos interesses. Isso é um grupo social, não
a Igreja orgânica de Jesus Cristo.
O que nos transforma é a vida interior de Cristo dentro
de todos nós.16 Isso é uma questão de companhia. A imagem
d’Ele é corporativa. Então não faz sentido que o processo de nos
conformar àquela imagem também seja corporativo?
Paulo nos diz em 2 Coríntios 3:18 que somos transfor-
mados na Sua imagem por contemplar e refletir a glória do
Senhor como num espelho. Nós fazemos isso juntos com um
rosto descoberto! Observe como esse versículo começa: “Mas
todos nós, com rosto descoberto...” (ACF). Ele começa com o
plural (todos nós), mas termina com o singular (rosto). Todos
nós O contemplamos com um rosto. Quando olhamos para o
rosto dos nossos irmãos e irmãs e vemos a face de Jesus Cristo,
então somos transformados em Sua imagem corporativa.

16
Ver o livro A Borboleta em Você, deste autor, publicado por esta editora.
172  a vida comunitária de deus

“Porque Deus, que disse: Das trevas resplandecerá a luz,


ele mesmo resplandeceu em nosso coração, para ilumina-
ção do conhecimento da glória de Deus, na face de Cris-
to” (2 Co 4:6).

Isso é muito difícil de reconciliar com nossos estilos de


vida e cultura individualistas. Até mesmo a unidade da família
nuclear foi demolida de tal forma que as gerações mais novas
não têm conceito de comunidade. Ou então o único conceito
que elas têm de comunidade é de disfunção, abuso e violência,
daí o crescimento das gangues de rua.
A resposta é encontrada na Deidade. O Pai, o Filho e o
Espírito têm essa comunhão fantástica que flui constantemente
como um rio (veja João capítulos 14 a 17). A maneira como Eles
se relacionam um com o outro é o modelo para a vida da Igreja
e todo discipulado. Estamos sendo conformados a essa imagem.
A vida comunitária e o amor compartilhados dentro do Deus
Trino são a mesma vida e o amor a serem compartilhados den-
tro da Igreja (veja João 17).
Quando aprendemos a ver e ouvir Cristo em nossos ir-
mãos e irmãs, então a verdadeira transformação (discipulado)
fluirá. Vamos deixar isso bem claro. A imagem de Deus é Cris-
to (Cl 1:15). Este Cristo é corporativo. Ele é a Cabeça e o Cor-
po (1 Co 12:12). Ele é a Videira e os Ramos (João 15:5). Ele é o
Noivo e a Noiva (Jo 3:29-30). Ele é o fundamento e as pedras
da casa (1 Pd 2:4-7). Esse Cristo corporativo é a perfeita ima-
gem visível da Deidade invisível. Nós estamos sendo transfor-
mados nessa imagem de um degrau de glória para outro.

A Renovação da Mente

A transformação necessária começa dentro da mente. A


consciência corporativa ou do corpo precisa ser desenvolvida.
conformado à sua imagem  173

Mas como ela começa? Ela começa com o ver. Ela começa com
a luz. Deve haver luz antes que possa haver vida. Primeiramente
Deus criou a luz, depois Ele criou a vida. A primeira coisa que
precisamos é de revelação, a revelação da vida comunitária, a
revelação do Corpo de Cristo.
Mas como recebemos essa revelação? Ela vem através do
desespero e da cruz. Precisamos ficar tão desesperados por Deus e
por tudo o que Ele quer, a ponto de nada mais importar. Precisa-
mos estar dispostos a deixar que Ele trate com nossa vida natural
por meio do Espírito Santo dentro de nós. Precisamos permitir
que Ele quebre o homem exterior para que a vida no interior pos-
sa fluir para os outros. A nova maneira de pensar virá na medida
em que fixarmos nossa mente n’Ele e no Seu propósito eterno.
É uma questão de se “revestir” desse novo homem corpo-
rativo (Ef 4:20-24; Rm 13:14; Gl 3:27-29). Esse “revestir” é na
verdade a fixação da nossa mente em Cristo e nas regiões invisí-
veis (Cl 3:1-4). E isso é uma mudança contínua, uma constante
fixação da nossa mente n’Ele. O sentido literal de Colossenses 3:2
é fixar nossa mente e conservá-la fixa em Cristo. Essa não é uma ati-
tude única, mas uma constante “fixação” a ser mantida. Durante
o dia todo levamos nossos pensamentos de volta ao nosso Senhor
e à Sua igreja. Em tudo o que fazemos somos lembrados que es-
tamos ligados ao Corpo e vivendo a vida da Sua comunidade.
Devemos apresentar nosso corpo como um sacrifício vivo,
como Paulo declarou: “Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericór-
dias de Deus, que apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo,
santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional. E não vos
conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação
da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável
e perfeita vontade de Deus” (Rm 12:1-2). Fixando nossa mente
em Cristo e nos revestindo do novo homem (que é a vida corpo-
rativa), seremos transformados na Sua imagem corporativa para
manifestar a vida comunitária da Deidade!
A Imagem
20 É o Propósito

O O eterno propósito de Deus é aumentar e ampliar Cristo,


a fim de que Ele possa encher todas as coisas com Ele mesmo.

“… desvendando-nos o mistério da sua vontade, segundo


o seu beneplácito que propusera em Cristo, de fazer con-
vergir nele, na dispensação da plenitude dos tempos, todas
as coisas, tanto as do céu como as da terra” (Ef 1:9-10).

“E pôs todas as coisas debaixo dos pés e, para ser o cabeça


sobre todas as coisas, o deu à igreja, a qual é o seu corpo,
a plenitude daquele que a tudo enche em todas as coisas”
(Ef 1:22-23).

“Aquele que desceu é também o mesmo que subiu acima de


todos os céus, para encher todas as coisas” (Ef 4:10).

Você e eu, como indivíduos separados, devemos diminuir


para que o Cristo corporativo possa crescer (Jo 3:30). Esse é o pro-
cesso de transformação sobre o qual eu escrevi no capítulo anterior.
Você e eu, como indivíduos, devemos ter nossa mente renovada
para pensarmos de acordo com o plano de comunidade e não do
176  a vida comunitária de deus

individualismo e da separação. A transformação do individua-


lismo para a comunidade começa na mente e é encorajada pela
edificação mútua do corpo.

A Mente Corporativa

Mais uma vez, a renovação da mente está sempre no contex-


to corporativo nas Escrituras (Rm 12:1-5; Ef 4:10-24; Cl 3:9-11). A
mudança de uma mentalidade individualista para uma mentali-
dade corporativa acontece no contexto da vida comunitária. É o
Corpo que cresce da Cabeça (Cl 2:19), isto é, ele cresce da men-
te corporativa de Cristo. A Cabeça, Jesus Cristo, já tem uma
mentalidade corporativa. Ele é uma das Pessoas na comunidade
divina. Ele tem vivido eternamente no ambiente de comunida-
de com o Pai e o Espírito. Ele pensa corporativamente porque
sempre viveu corporativamente. A comunidade é a Sua própria
vida, pensamento e existência.
Paulo nos diz que o Corpo cresce da Cabeça (Cl 2:19).
Essa declaração da verdade tem muitas implicações poderosas.
Todas elas giram ao redor da definição da palavra Cabeça.

A Fonte da Vida

Jesus Cristo é a fonte de vida do Seu Corpo. A explicação


do Corpo que cresce da Cabeça é que Ele é quem supre vida
para todas as coisas pertencentes à vida do Corpo.
Não existe vida de Corpo sem o Espírito vivificador
(1 Co 15:45). Ele é o Novo Adão e Sua Noiva é a Nova Eva. Ela
sai d’Ele e Ele a supre com toda a vida do Pai. Toda a vida divina
flui da Cabeça para o Corpo (Sl 133).
a imagem é o propósito  177

O Centro de Controle

A Cabeça sabe exatamente o que está acontecendo o tem-


po todo. Quando os membros do Corpo se submetem à Sua
direção, Ele pode realizar a vontade do Pai (ou reino) na Terra.

Autoridade

A Cabeça toma todas as decisões. Não existe comitê hu-


mano, junta, diretor, chefe executivo ou vice-regente. Ele toma
todas as decisões revelando Sua mente ao Corpo. Cabe a cada
membro do Corpo fixar sua mente n’Ele para descobrir Sua
vontade juntos (Cl 3:1-2). Isso introduz um ponto importante:
a mente de Cristo é algo que nós temos que descobrir juntos.
Paulo disse: “Nós, porém, temos a mente de Cristo” (1 Co 2:16)
e não que devemos ter a mente de Cristo.
Portanto, as decisões no Corpo são tomadas corporativa-
mente, isto é, por consenso. Cada membro do Corpo é respon-
sável por buscar a mente da Cabeça a fim de sentir Sua direção.
Essa forma de tomar decisões provoca o crescimento do Corpo.
Cada crente está aprendendo a ouvi-lO. Cada crente tem voz
no Seu Corpo.

O Aumento de Cristo

O propósito de Deus é expandir e aumentar a comunhão


e a comunidade da Deidade. Ele realiza isso ampliando a “esfe-
ra” do Seu Filho. Paulo nunca nos diz que a Cabeça cresce, mas
que o Corpo cresce (Ef 4:14-16; Cl 2:16-19). Quando o Corpo
cresce, o Filho é aumentado. Lembre-se de que o Corpo é parte
178  a vida comunitária de deus

de Cristo! Ele é tanto a Cabeça como o Corpo (1 Co 12:12). O


Corpo cresce (tanto espiritual como numericamente) a fim de
cumprir o eterno propósito de Deus de que Ele encheria todas as
coisas com Cristo. Seu Filho deve encher todas as coisas em todos
os domínios com tudo d’Ele mesmo. Cristo não deve ser apenas o
centro de todas as coisas; Ele deve ser o tudo de todas as coisas!
Isso é realizado pelo aumento de Cristo através do Seu
Corpo. O ardente desejo do Pai é que o Cristo corporativo encha
todas as coisas com Ele mesmo. Visto que isso só pode ser realiza-
do pela vida comunitária de Deus, o resultado será a comunidade
divina enchendo todas as coisas. Como Bill Freeman diz:

Precisamos ver a igreja conforme a revelação divina; caso


contrário, nossa visão e prática da igreja carecerão de algu-
ma coisa. Certamente a igreja não é um edifício físico; a
igreja também não é uma organização humana; a igreja
também não é simplesmente um grupo de pessoas que apro-
va uma particular declaração doutrinária. Antes, a igreja
é o próprio Cristo distribuído com todos os Seus membros.
Sua vida única é repartida para dentro dos “muitos mem-
bros”. É a vida d’Ele enchendo e atuando através de cada
membro que torna a igreja de Cristo em realidade. Tal
definição da igreja nos indica a fonte exata dela – o próprio
Cristo! Todos os Seus membros compõem a Sua plenitu-
de. Estamos organicamente unidos a Ele como a Cabeça.
Como a Cabeça Ele não é simplesmente o centro contro-
lador, mas é também o suprimento de vida que flui em
cada membro. Por meio da Sua vida Ele vive em nós, nos
enche e flui de nós e nos tornamos Sua expressão. Assim,
a igreja é o aumento de Cristo. Por exemplo: eu sou uma
pessoa com uma cabeça e um corpo. Minha cabeça está
a imagem é o propósito  179

ligada ao meu corpo e porque estão ligados organicamente


como uma unidade há aumento e plenitude. Se eu tivesse
apenas a cabeça, mas não o corpo, não haveria aumento ou
expressão adequada.
Bill Freeman
The Church is Christ
(A Igreja é Cristo)
Ministry Publication, 1993, p. 11

O Tabernáculo

No Antigo Testamento há uma linda figura disso no ta-


bernáculo. Essencialmente o ele é o resultado e o aumento da
Arca da Aliança. A Arca representa a comunidade divina. Den-
tro dela havia três coisas: as tábuas de pedra, o maná e a vara de
Aarão que floresceu. Cada uma delas representa uma das três
Pessoas da Comunidade Trinitária.

Tábuas de Pedra

Isso é a lei. O doador da lei é o Pai. É parte da função do


Pai iniciar e levar avante Seus padrões de santidade. Natural-
mente, apenas o Filho pode estar à altura de tal padrão. E o úni-
co modo de os humanos alcançarem tal padrão era Ele pondo
Seu próprio Filho dentro deles, por meio da Nova Aliança.

O Maná

Jesus Cristo é o verdadeiro Pão do céu (João 6:51). O


maná, portanto, representa o Filho. Ele é o Suprimento de Vida
e o sustento para a humanidade.
180  a vida comunitária de deus

A Vara

O terceiro elemento dentro da Arca era a vara de Aarão


que floresceu. Isso fala de vida e ressurreição. É o Espírito que
dá vida.
A Arca é uma sombra da vida comunitária de Deus. Ela
era feita de madeira de acácia e coberta de ouro. Isso representa
a humanidade (madeira) coberta com a divindade (ouro). A ple-
nitude da divindade habita em Cristo (Cl 2:9).
Mas o que não temos visto é que o tabernáculo é a ex-
pressão e expansão da Arca. O tabernáculo é o lugar de habita-
ção da Arca. Ele é feito dos mesmos materiais (madeira de acácia
coberta de ouro) da Arca.
O tabernáculo é a expressão e expansão de Cristo, e Cristo
é a expressão e expansão da comunidade divina. O tabernáculo
ficava continuamente no centro de Israel. Toda a vida da nação
estava centralizada ao redor do tabernáculo (ou tenda da congre-
gação) com a Arca da Aliança no seu centro. Essa é uma linda
figura da Igreja. A comunidade divina está no centro de tudo na
Igreja. A vida da Igreja deve ser um reflexo ou expressão do Deus
Trino e da Sua vida comunitária. Esse é o significado de ser a ima-
gem de Deus. Nossas vidas juntas devem ser como um espelho
refletindo a vida corporativa do Pai, do Filho e do Espírito. É pre-
ciso muito tempo e aplicação da cruz para que isso seja realizado
na prática. Mas essa é a razão por que todos nós nascemos. É a
razão por que estamos respirando o ar neste momento.
21 A Imagem
como Missão

V Viver pela vida da Comunidade Trinitária deveria ser o


alvo de todo ministério. Visto ser esse o propósito eterno e alvo
de Deus, isso deveria também ser o propósito e alvo de todo
serviço missionário. O alvo do evangelismo, da obra social e de
missões não é aliviar a necessidade humana, e sim que a missão
de Deus seja realizada.
Colocando de forma simples, a missão de Deus é que
toda a Terra seja cheia da Sua glória. Mas o que significa isso?
Tem a ver com a expressão visível da vida invisível de Deus.
Como temos visto, a vida de Deus é corporativa. É associada.
É uma vida compartilhada que as três Pessoas participam com
igualdade. Fiz o melhor que pude para descrever esse relaciona-
mento maravilhoso a você neste livro. Reconheço que foi uma
descrição fraca, mas as palavras ficam aquém da descrição dessa
comunidade santa e divina.
A glória é a manifestação ou expressão dessa vida divina.
Em outras palavras, estou falando da imagem de Deus. Qualquer
coisa que impeça o cumprimento desse alvo superior fica aquém
do Seu desejo mais elevado. Devemos estar alinhados com esse
alvo em toda a nossa devoção e serviço. Deus queria três coisas
do homem no jardim. Esse tríplice propósito incluía: que ele
182  a vida comunitária de deus

ostentasse a imagem de Deus, que tivesse domínio sobre a Terra


e fosse frutífero e multiplicasse. Isso mostra que Ele quer colo-
car a Sua vida comunitária no homem (a Árvore da Vida), que
o homem viva por essa vida divina e expresse e amplie essa vida
para cobrir a Terra.

O Dilema da Necessidade Humana

O problema é que ficamos aquém da glória (expressão) de


Deus. Adão caiu. O resultado é que o homem tem uma mente
caída que está centrada no ego e voltada para servir a si mesma.
Estamos obcecados com a nossa própria pessoa!
Na verdade pensamos e agimos como se fôssemos o
centro de tudo e Deus girando ao nosso redor. Essa é a grande
mentira do pecado. A humanidade não é o centro do plano de
Deus. Jesus Cristo é o centro do Seu plano! A ampliação e pre-
eminência desse Novo Homem é toda para Ele. Precisamos de-
sesperadamente ser libertados do nosso evangelho centralizado
no homem. Essas não são boas novas! Precisamos nos livrar do
foco da necessidade humana. Isso está nos cegando para o ver-
dadeiro coração de Deus. Está nos desviando do alvo de Deus. É
um caminho que não nos leva a cumprir Seu eterno propósito.
Como declarou T. Austin-Sparks:

Existem três coisas que são essenciais para uma vida apro-
priada com Deus, para a plenitude da vida cristã.
Primeiro o reconhecimento de que Deus está interessado na
realização de algo digno d’Ele mesmo. Nosso avanço não
será grande com respeito a uma vida cristã plena, ou uma
vida com Deus, até que raie sobre nós e tome posse de nós
a imagem como missão  183

que Deus está realmente interessado na realização de algo


digno d’Ele mesmo.
A segunda coisa é que as pessoas se tornarão conscientes
do que seja aquele grande algo no coração de Deus, no
que Deus está tão interessado e então serão movidas a co-
operarem com Ele. Isso é fundamental para uma vida de
plenitude com Deus, que nós, Seu povo, cheguemos a ver
o que Ele realmente está buscando, o que será realmen-
te digno d’Ele mesmo, e mais do que isso, que sejamos
profundamente movidos a respeito desse assunto a fim de
cooperarmos com Ele. E depois, em terceiro lugar, que re-
conheçamos que esse algo no coração de Deus e essa coope-
ração com Ele por Seu povo envolve conflito e preço real e
que Seu povo deve enfrentar e estar pronto para aceitá-lo.
T. Austin-Sparks
The Recovering of the Lord’s Testimony in Fullness
(A Restauração Plena do Testemunho do Senhor)
Emmanuel Church, p. 5 e 6

Por favor, não me entenda mal. Deus certamente ama


toda a humanidade. Ele deseja satisfazer nossas necessidades e
derramar Seu amor e graça sobre nós, mas simplesmente por
causa do que Ele é. E Ele quer uma expressão daquilo que Ele
é para ressoar através de toda a criação. Sim, Deus quer salvar,
libertar, curar e restaurar a humanidade em todos os sentidos.
Mas a razão para Ele fazer tudo isso é para que Ele tenha aquilo
que Ele deseja. E Ele deseja uma imagem, uma expressão, um
lugar de habitação, um corpo, uma família e uma noiva, para
que a Sua glória possa encher toda a Terra.
Deus é amor, por isso Ele nos ama. Mas Ele ama com
um propósito e com um alvo em mente. Ele deseja que Sua
divina comunidade de amor seja experimentada e vista pelos
184  a vida comunitária de deus

homens e anjos (Ef 3:10). Nunca deveríamos ficar aquém desse


alvo, concentrando-nos e focando na necessidade humana. Isso
é parte da nossa missão. Isso é parte da expressão de quem Ele é
e do que Ele faz. Mas essa não é a história completa, tampouco
o alvo final. Dê apenas uma olhada nos dois últimos capítulos
da Bíblia e você verá isso.
Vemos em Apocalipse 21 e 22 que Ele tem uma cidade,
uma noiva e um lugar de habitação onde Sua glória (luz) pode
ser amplamente manifestada para todos verem. Essa cidade é
feita de ouro, pérola e pedras preciosas. Essas pedras estão vivas
com Sua vida divina, Sua comunidade divina. Deus e o homem
se tornaram um e Seu coração está plenamente satisfeito.
22 O Modelo Perfeito –
Conclusão

EEu viajo para muitos lugares procurando ajudar os crentes


a entenderem e manifestarem o que temos chamado de “Igreja
orgânica”. Uma das frequentes perguntas que recebo tem a ver
com o modelo para a Igreja. Qual é o seu modelo para a Igreja
orgânica? O propósito deste livro é responder a essa pergunta. É
uma pergunta muito importante, e eu não a considero leviana-
mente. Existem vários modelos que estão sendo usados hoje.

O Modelo Tradicional

Muitos crentes hoje estão em grupos organizados chama-


dos de denominações. Existem atualmente por volta de 33.000
variedades de tais organizações. Geralmente são controladas por
uma sede central onde a forma e o programa de ação é decidido
para as congregações locais.
Assim, poderíamos dizer que a organização é o modelo. Mas
de onde veio esse modelo? A história da Igreja tem nos mostrado
que em todos os casos esse modelo veio do sistema do mundo.17

Veja o livro Cristianismo Pagão?, de Frank Viola e George Barna, publicado


17

pela Editora Abba Press.


186  a vida comunitária de deus

Esse modelo envolve um lugar designado para a realiza-


ção dos “cultos”, um pastor, um corpo de anciãos, diáconos, es-
cola dominical, vários comitês, cultos nas manhãs de domingo,
etc. Mas é isso o que vemos no Novo Testamento? Creio que a
resposta é óbvia.

O Modelo da Igreja Primitiva

Esse é o modelo que usa o Novo Testamento, principal-


mente o Livro de Atos, como “modelo” para a Igreja. Em outras
palavras, apenas leia o que a Igreja do primeiro século fez e de-
pois copie.
Existem alguns problemas principais com essa ideia. Pri-
meiro, temos uma visão muito distorcida de como era a Igreja
primitiva. Nossa tendência é ler a história com “filtros” base-
ados em nossas próprias experiências e práticas. Procuramos
encaixar as Escrituras em nossas experiências em vez de fazer
o contrário.
Outro problema é que não temos uma descrição clara
da Igreja do primeiro século. Nosso Novo Testamento não foi
colocado em ordem cronológica. Os livros são colocados na or-
dem dos mais longos para os mais curtos. Isso tem distorcido o
nosso entendimento daquilo que realmente aconteceu no pri-
meiro século. Também não conhecemos os contextos históricos
e culturais apropriados dos escritos.18
Outro problema com esse modelo é que nós estamos copiando
pessoas que seguiram um modelo. Mas qual foi o modelo delas no
primeiro século? Por que não retornar ao original?

18
Veja o livro A História Não-Contada da Igreja do Novo Testamento, de Frank
Viola, publicado por esta editora.
o modelo perfeito - conclusão  187

O Modelo Missionário

Esse modelo é baseado na multiplicação e crescimento.


O propósito é cumprir a “grande comissão” através da rápida
multiplicação de pequenos grupos. O alvo é alcançar e mudar o
mundo através da ação social.
Permita-me dizer que este modelo toca o coração de Deus
pelos perdidos e destituídos, algo que é muito importante para
Ele. Todavia, este não é o modelo completo; ele é apenas parte
da história. O único modelo que satisfará o coração de Deus é
aquele baseado no Seu propósito eterno.
Esse propósito vai além da queda do homem e da ne-
cessidade humana. Esse propósito vem diretamente do centro
ardente do coração do seu Senhor. Esse propósito existe antes
da queda e até mesmo antes da criação. Por essa razão Paulo o
chama de propósito eterno (Ef 1 e 3).

O Modelo Perdido

A fim de encontrarmos o modelo perfeito para a vida da


Igreja, precisamos voltar antes das organizações e denominações.
Precisamos voltar antes da Igreja primitiva. Esse modelo eterno
não é algo que você possa copiar com um carimbo de borracha,
por meio do aprendizado de algum programa ou sistema de regras
para depois executá-los. Esse modelo só pode ser experimentado.
Esse modelo é a experiência de um relacionamento!
O Senhor Jesus trouxe para a Terra uma experiência que
Ele possuía antes da eternidade. Essa experiência estava fora
do espaço e do tempo. Essa experiência estava dentro do Deus
Vivo. O seu Senhor tinha comunhão com Seu Pai através do
Espírito Santo antes da criação.
188  a vida comunitária de deus

Essa comunhão é a base do relacionamento dentro da


Trindade (ou Deidade). O Deus Trino é o nosso modelo perfei-
to para a vida da Igreja. Esse é o modelo e a base para tudo. Se
descobrirmos e experimentarmos essa comunidade maravilho-
sa, então estaremos no nosso caminho para realizar o propósito
eterno de Deus.
Nós seremos a expressão prática de Cristo na Terra e Ele
é a imagem perfeita do Deus Trino (Cl 1:15). Esta é a nossa su-
prema vocação. Deus colocou essa vida comunitária dentro de
nós quando colocou Seu Filho em nós.
Temos um Senhor que habita em nós e contém a comu-
nhão e a comunidade divina do Deus Trino (Cl 2:9). Deus já
nos proveu com tudo de que precisamos.
Agora avancemos para expressar a plenitude da vida co-
munitária de Deus!
__________

Esta obra foi composta em Aldine 401 BT e Trajan,


no formato 140 x 210mm, mancha de 100 x 178mm
A impressão se fez sobre papel Lux Cream 70 g/m2,
capa em Duplex 250g. Impresso pela
Gráfica Imprensa da Fé no verão de 2011
para a Editora Restauração
ER
“Este pequeno livro proporciona uma janela aberta para a fonte principal da
autêntica vida de corpo. Pesquise em suas páginas e encontre o Deus que está
além daquilo que a maioria de nós tem imaginado, o Deus que ressoa na voz
M ILT R ODRIGUEz
coletiva das genuínas igrejas”.

M ILT R ODRIGUEz
Frank Viola

VIDA
Autor de: Cristianismo Pagão (Abba Press);
Reimaginando a Igreja (Editora Palavra);
A História Não-Contada da Igreja do Novo Testamento e A
Reconsiderando a Vontade de Deus (Editora Restauração).

“Meu coração se alegra por ter aproveitado do fluxo permanente dos livros
publicados nos dez anos passados que abriram novas perspectivas acerca da
COMUNITÁRIA

DEUS
vida no Corpo de Cristo. A Vida Comunitária de Deus de Milt Rodriguez é
outra adição bem-vinda a este rio de vida. Fui profundamente abençoado,
renovado e desafiado por este livro. O autor lança o refletor na realidade e
maravilha de que “Deus” é realmente a vida comunitária de três pessoas – um DE
fato praticamente não tocado na teologia tradicional. Milt mostra de vários
ângulos como a vida comunitária de Deus é o fundamento da nossa vida de
ekklesia (igreja) orgânica juntos em Cristo”.

Jon Zens

A Vida Comunitária de Deus


Editor da Searching Together.
Autor de: A Church Building Every 1/2 Mile;
What Makes American Christianity Tick?

O MODELO PERFEITO DE IGREJA

Visto que a nascente para todo padrão e vida de igreja é a vida comunitária do
Pai, Filho, e Espírito Santo. Isso é tanto teológico como prático. A vida corpo-
rativa que Deus vive (a vida eterna) é a mesma vida que Ele nos dá. Essa é uma
vida de amor uns pelos outros e Jesus disse que ela vem do céu (ver João 17).
Essa vida comunitária é tanto o motor como o combustível para o nosso viver
juntos como crentes, a espinha dorsal da vida orgânica da igreja.

Milt Rodriguez tem vivido e estabelecido expressões orgânicas da igreja


desde 1990. Ele é também autor de vários livros inclusive A Borboleta em Você
e A Túnica de Várias Cores (Editora Restauração). Atualmente vive com sua
esposa Mary na Geórgia, Estados Unidos.

Editora

RESTAURAÇÃO Atos 3:21

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