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António Rolo
Questões Fundamentais
Introdução1 2
- Maria Fernanda Palma – como toda a definição é uma negação (Baruch Espinosa), a
sua função é demarcar fronteiras e limites, logo, toda a definição de Direito Penal deve
começar pela sua demarcação.
- O Direito Penal não é Direito Civil, pois no segundo não existem sanções penais
específicas e porque ele tutela interesses privados e não públicos.
- Conclusão – o que acaba por caracterizar o Direito Penal é a gravidade das suas
penas, que restringem direitos fundamentais, e das suas infracções.
- Assim, o Direito Penal é o conjunto de normas que prevê, para certos factos,
classificados como crimes, certa sanções graves, protegendo interesses e valores
essenciais da vida em comunidade e do Estado.
- Há que distinguir ius poenale (direito penal, em sentido objectivo) e ius punendi
(poder de punir, o sentido subjectivo)
1
Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal – Parte Geral – Tomo I, pp 3-14
2
Maria Fernanda Palma, Direito Penal, Parte Geral – Fascículos, pp 21-24
1
- Como aponta Maria Fernanda Palma, encontramo-nos agora perante um problema: a
identificação anterior parece indicar que, sempre que o legislador designa os factos
como crimes e as sanções como penais, será que elas são realmente crimes e
sanções? Não, pois o crime e a pena têm um conteúdo pré-legislativo indisponível,
sendo entidades produzidas por instâncias sociais antes da sua modelação legislativa,
havendo uma relação entre a definição social e legal. Assim, as representações sociais
sobre o crime, pré-jurídicas, são pontos de referência para o legislador.
- Conclusão:
- Resta saber qual o seu ponto de partida – a pena ou o crime? E, sendo assim, será
o crime apenas um facto do qual deriva a pena? E que factos terão dignidade punitiva?
(art. 18º/2)?
Criminologia
- O crime não pode ser estático, mas, como facto sociológico, ele será o resultado da
selecção social que inclui legislador, polícia, tribunais e grupos sociais. Maria
Fernanda Palma critica esta noção como muito relativista.
Outras Teorias
- John Stuart Mill - Harm Principle – crime só o é se for um perigo efectivo para
terceiros, sendo este princípio um princípio fundamental da criminalização e
consequente limitação do poder estadual
3
Figueiredo Dias, Direito Penal, pp 106-154
4
Maria Fernanda Palma, Direito Penal, pp 25-24
2
- Labeling Approach
- Sellin – teoria dos conflitos de cultura; Cohen – crime nasce da eticidade produzida
pela estrutura social, criando uma sub-cultura delinquente
- Existem ainda teorias de cariz moral/ético-social, para as quais o crime passaria pela
violação de deveres ético-sociais elementares ou fundamentais. Figueiredo Dias rejeita
esta teoria por se enraizar no pensamento que o Direito Penal era a expressão terrena
da moralidade religiosa, não sendo, assim, a função do Direito Penal tutelar a virtude
ou a moral, sendo esta uma noção absolutamente inadequada à estrutura e
exigências das sociedades democráticas e pluralistas modernas.
- Houve uma grande controvérsia doutrinária entre Feuerbach (que achava que o
crime era uma violação de direitos subjectivos) e Birnbaum (que achava que o crime
seria uma violação de bens jurídicos)
- Binding, mais positivista, reduz o bem jurídico aos valores ou condições de vida da
comunidade jurídica, definidos pelo legislador
- Von Lizst, mais individualista, desenvolve o bem jurídico como um interesse humano
vital, mas nunca supra-individual
3
- Maria Fernanda Palma diz que a discussão sobre o bem jurídico depende
invariavelmente de concepções ideológicas, logo, há que encontrar uma definição
mais neutra.
- Maria Fernanda Palma – a visão funcionalista não emula a função crítica do conceito
material de crime.
- Taipa de Carvalho5 recusa o positivismo pois o crime não pode ser reconduzido à
vontade do legislador ordinário (assim o bem jurídico não teria qualquer conceito
material); recusa o jusnaturalismo, porque ele impede o diálogo democrático; recusa
o moralismo pois há uma pluralidade de mundividências a ela associados; e rejeita o
funcionalismo, pois ele nega autonomia ao Direito Penal para definir os bens ou
valores jurídicos penais, subordinando as pessoas à funcionalidade do sistema social.
5
Américo Taipa de Carvalho, Direito Penal – Parte Geral, pp 45-49
6
Manuel da Costa Andrade, A Dignidade Penal e a Carência de Tutela Penal Como Referências de uma
Doutrina Teleológica-Racional do Crime
4
- Figueiredo Dias – expressão de um interesse, da pessoa humana ou da
comunidade, na manutenção ou integridade de um certo estado, objecto ou bem em si
mesmo socialmente relevante e por isso juridicamente reconhecido como valioso.
- A teoria na qual se integram estas noções é a perspectiva racionalista, que pode ser
reconduzida a uma lógica teleológica-funcional, na medida em que se reconhece que
o conceito material de crime não pode ser deduzido das ideias vigentes a se em
qualquer ordem extra jurídica, mas tem de ser encontrado no horizonte de
compreensão imposto ou permitido pela própria função que ao direito penal se
adscreve no sistema jurídico-social
- Para este autor, o juízo de dignidade penal pode dividir-se numa dignidade de
tutela do bem jurídico em si, como já foi dito, e na potencial e gravosa danosidade
social da conduta.
5
- Assim, como conclui o professor de Coimbra, a função principal do direito penal é a
tutela subsidiária de bens jurídico-penais.
- Esta imposição não existe, nem que seja por um direito geral dos cidadãos à
segurança jurídica.
- Esse perigo consistirá numa situação que faz aparecer como possível a
realização de um dano contrário a interesses juridicamente protegidos, i.e., na
possibilidade de um resultado danoso. Assim, os bens jurídicos estão a ser tutelados
por antecipação.
7
Rui Patrício, Os Crimes de Perigo Abstracto e Concreto
6
- Problemas dos Crimes de Perigo Abstracto:
- Qual a legitimidade do Estado para punir esses crimes? Até onde pode ir,
legitimamente, o alargamento do campo de protecção de bens jurídicos pelo Direito
Penal?
- Faria Costa – a antecipação da tutela protectora não tem que ver com efeito
intimidativo da pena, mas sim com um juízo político-criminal de que é insustentável,
ética-socialmente ilegítimo, que os danos se desencadeiem para começar intervenção
do Direito Penal
- Rui Patrício acha que o ponto de partida é o bem jurídico e a congruência entre a
ordem axiológica constitucional e a ordem legal penal: não basta dignidade penal, ao
abrigo do princípio da intervenção mínima
Ac. 441/94 TC
- O recorrente alega violação do princípio da culpa, que exclui responsabilidade objectiva, – art. 25º/1 –
e da presunção de inocência.
- Tribunal acaba por alegar que não viola presunção de inocência, pois a incriminação de perigo
abstracto é constitucionalmente consentida
Ac. 295/03 TC
- Mesma questão:
- Será manifestamente excessivo, arbitrário e desproporcionado punir um agente que detenha, sem que
para tal esteja autorizado, quantidade superior à legal?
7
- TC diz que não, pois a quantidade elevada potencia tráfico e outras actividades, deixando de estar
sobre o controlo do agente.
- Exclui-se a possibilidade de o arguido fazer contra-prova e demonstrar que não agiu com dolo. Acha
que não é uma mera antecipação da tutela, mas uma violação do princípio da culpa. Ainda por cima foi
provado que a droga se destinava ao consumo, subsistindo, absurdamente, a presunção de tráfico,
acabando a lei por admitir, implicitamente, um puro crime de detenção de droga para consumo. Além do
mais, é preciso ter em conta a opção descriminalizadora do legislador.
- Outra das grandes questões do Direito Penal, revelando-se a pena quase sempre
como um mal para a pessoa do criminoso.
Teorias Retributivas/Absolutas
- Kant
- Para estas teorias, o sentido da culpa do criminoso tem de ser compensada por
outro mal, dando origem, assim, ao princípio da culpa: a medida da pena deve ter em
consideração a medida da culpa.
- Indemonstrabilidade dos seus pressupostos, pois ela parte de uma ideia de livre
arbítrio total, o que a ciência não permite comprovar.
- Não é uma teoria de fins da pena, pois considera a pena como uma entidade
independente de fins – a zeckgelöste Majestät
8
Maria Fernanda Palma, Direito Penal..., pp 34-50
9
Figueiredo Dias, Direito Penal..., pp 43-84
10
Claus Roxin, Os Fins das Penas e o Limite do Poder Punitivo do Estado
8
- Inadequação à legitimação, fundamentação e sentido da intervenção penal – estas
só podem resultar da necessidade, e para proporcionar as condições de existência
comunitárias. Sendo assim, o moderno Estado democrático não se pode afigurar
como um sancionador de pecados e vícios – tem de se limitar a defender os bens
jurídicos
- Apoiada por Platão e por Feuerbach, que fala da pena como uma ‘força moderadora
de costumes’
- Tem uma vertente positiva – dizer ao ‘bom cidadão’ como deve ser a sua contuda,
fortalecendo os juízos de valor social dos cidadãos.
- Esta teoria já tem como fundamento a função do Direito Penal de tutela subsidiária
dos bens jurídicos.
- Interesse público não justifica qualquer pena – a pessoa não é um meio. (v. art.1º
CRP)
- Críticas retributivas – teoria muito utilitária, usando o ser humano como um meio
9
Crítica de Claus Roxin
- Teoria admite castigar uma pessoa, não em função dela própria, mas em função dos
outros
- Levou a procurar como sentido da pena a sua necessidade estrita (von Liszt) –
intimidação, melhoramento e eliminação do criminoso.
- Consequências graves- crimes muito graves podem passar impunes se não houver
hipótese de reincidência e vice-versa
10
- Só o seu conteúdo positivo, a mitigação da reincidência, sobreviverá num Estado de
Direito
- Tal como Maria Fernanda Palma, deixaria crimes graves passar impunes.
- Roxin fala num panorama pouco animador, propondo uma teiran ova.
- Contudo, cada uma das teorias do Direito Penal dirige a sua visão unilateralmente
para determinados momentos:
- Legislador não pode castigar pela imoralidade, visto que a moral não é mentir
bem jurídico. Se respeitado, a prevenção geral passa a ser aceitável.
- Aplicação da Pena
- Pena não pode exceder a medida da culpa e pensa suspensa admite-se no caso
concreto de restauração da paz jurídica.
11
- Execução
- Roxin chama a esta teoria a teoria unificadora dialéctica, que funciona como
protecção subsidiária de bens jurídicos, mediante a prevenção geral e especial, que
salvaguardam a personalidade no quadro traçado pela medida da culpa individual.
- Figueiredo Dias critica esta teoria, dizendo que todas as teorias unificadoras são
inaceitáveis pois chamam a retribuição à colação.
- A pena concreta é limitada pela medida da culpa, e dentro desse limite máximo ela
é determinada no interior de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo
limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento,
abaixo do qual a comunidade perde confiança no Direito Penal.
12
Concepção de Maria Fernanda Palma
- Teorias pretendem resolver um problema mal colocado, o dos fins ‘ideais’ das
penas, opondo-se a esses fins ideais a amarga necessidade de punir – toda a discussão
deve centrar-se na realidade da pena e não no que ela devia ser.
- Dizer que não pode haver retribuição é estúpido porque a pena substitui
psicologicamente o impulso da vingança privada. E pode a pena fazê-lo racionalmente
e eticamente, tendo efeitos sociais úteis?
- Maria Fernanda Palma rejeita formulações de Beccaria e von Liszt por terem uma
base contratualista e individualista, dizendo que essas necessidades comunitárias
dependem de consensos temporários ou maiorias contigentes.
- Guarda da PSP, respeitado e estimado na Comunidade, atropela duas pessoas bêbado e mata uma
delas. Tem 2 g/l de álcool no sangue.
- Nos termos do art. 137º/2, trata-se de negligência grosseira. Admite pena suspensa? Sim.
- Prevenção Especial – se fim da pena é intimidação (negativo) e reintegração (positiva), aqui ela não
será necessária, porque demonstrou-se que o agente era um ‘delinquente ocasional’, com pouca
inclinação para o crime – censura dofacto e ameaça da pena bastarão para o afastar de maiscrimes.
- Prevenção Geral – fortalecimento dos costumes, transmissão desta mensagem aos cidadãos: ‘não
conduzam bêbados’.
- Art. 40º - não pode ser prevenção especial, porque deixa-se um bem jurídico altamente valioso
desprotegido, especialmente valorado pelo legislador.
13
Princípios Constitucionais de Direito Penal11
Princípio da Culpa
- Como fundamento da pena – não é hoje unanimamente aceite como tal. Para Roxin,
o princípio da culpa é alheio aos fins do Estado Social de Direito, sendo irracional
atribuir à culpa, como desvalor ético-social derivado da prática de certo
comportamento, a função de legitimar a realização de fins do Estado. Não se deve
punir um ‘mal’, só o dano que afecte os objectivos da sociedade.
- Maria Fernanda Palma – não é nesse plano que se concretiza o Direito Penal, mas
sim porque os seus comandos, proibições e aplicação realizam ideias culturais de
justiça que enformam as expectativas da sociedade.
- É nessa segunda dimensão que o princípio da culpa ainda encontra o seu lugar
como fundamento do Direito Penal. Duas ideias:
11
Maria Fernanda Palma, Direito Penal..., pp 50-64
14
da vontade humana – crença na liberdade e no poder de acção causal do homem é o
seu pressuposto.
- Utilização pelo Estado de meios penais deve ser limitada, ou mesmo excepcional, só
se justificando com a protecção dos Direitos Fundamentais (isto é uma reacção contra
a arbitrariedade das penas).
- Pretende ser um limite substancial ao Direito Penal – com base no contrato social, só
se podem proteger as liberdades estabelecidas nesse contrato.
- Importante também é que no momento da pena, tudo o que seja mais do que
necessário para atingir os fins das penas seja ilegítimo.
- Consagrada no art. 13º CRP, apesar de não ser um princípio específico do Direito
Penal
- Prescreve a discriminação
15
- Princípio inverso não se aplica – ninguém pode ser punido menos severamente
do que outrem por factos idênticos ou mais graves.
Princípio da Legalidade12
- Maria Fernanda Palma – a racionalidade e aplicação das normas penais estão tão
condicionadas por esse princípio que ele é a proposição jurídica fundamental do
sistema penal.
- Nulla poena sine lege – tribunais não podem aplicar sanções penais sem lei
anterior que as preveja.
- Figueiredo Dias – não pode haver crime nem pena que não resultem de uma lei
prévia (regras da aplicação da lei penal no tempo), escrita (excepção no art. 29º/2
CRP), estrita (regras de interpretação) e certa (ver caso especial das normas penais em
branco) – nullum crimen, nulla poena sine lege. Assim, como diz Roxin, a protecção da
pessoa não é só feita através do Direito Penal mas perante o Direito Penal.
12
Figueiredo Dias, Direito Penal..., pp 177-185
16
- Assim, a solução do caso concreto está totalmente vinculado a um modelo legal,
i.e., uma articulação já feita pelo legislador entre um determinado caso, semelhante ao
concreto, e uma situação já prevista.
- Articulação entre as duas máximas anteriores dará – nulla poena sine crimen.
- A propósito da lei penal certa, vamos ver o problema das normas penais em branco; a
propósito da estrita, veremos a interpretação; a propósito da prévia veremos a
aplicação da lei no tempo.
- Conceito – norma que contém uma cisão entre a norma de compotamento, com
origem em leis de ordenamentos extra-penais, e a norma que contém a ameaça
penal.
- Há quem ache que, stricto sensu, só cabem na noção aquelas que remetam para leis
inferiores
- Outros acham que a lei só tem de remeter para outro ordenamento, de nível igual
ou inferior.
13
Luís Duarte d’Almeida, Problemas da Inconstitucionalidade das Normas Penais em Branco, in Casos e
Materiais de Direito Penal
17
incriminação caiam em mãos normalmente administrativas, sendo que a Assembleia
da República não intervém.
Conclusão
- Ac. 427/95 STJ – a remissão, em matéria penal, é admissível quando feita para
instância normativa que não estabeleça nenhum critério autónomo de ilicitude, apenas
concretizando o cartório legal através da aplicação de conhecimentos técnicos.
- A norma penal em branco não pode ter conteúdo inovador, não podendo definir
o bem jurídico a proteger.
- ‘Nullum crimen, nulla poena sine legem praevia...’ – nasce da exigência jurídico-
política de garantia do cidadão face ao poder punitivo do Estado.
14
Taipa de Carvalho, Direito Penal..., pp 170-204
15
Maria Fernanda Palma, Direito Penal..., pp 106-122
16
Figueiredo Dias, Direito Penal..., pp 193-206
18
- Para Taipa de Carvalho o fundamento principal será a garantia dos cidadãos (a
‘âncora firme’) e função dissuasora (prevenção geral) do Direito Penal para a
orientação dos cidadãos.
- Para Jorge Miranda, esta regra tem o princípio da igualdade como fundamento.
- Para Eduardo Correia – se uma nova lei deixa de incriminar outros factos é porque se
entende que eles já não merecem punição.
- E nos casos em que a conduta se protrai por um certo período de tempo? Em crimes
mais prolongados, será mais provável a vigência sucessiva de leis.
- Se lei for uma lei criminalizadora, não haverá dúvida: só podem ser consideradas
as condutas praticadas depois do início da sua vigência – as anteriores são
irrelevantes, pois violaria a proibição constitucional da retroactividade de lei
criminalizadora.
19
- Crimes de omissão – ele determina-se no último momento em que o omitente
ainda tinha podido praticar eficazmente a acção imposta. Nova lei só se aplica
quando entrar em vigor antes da última possibilidade.
- E como proceder nos casos em que uma lei converte uma contra-ordenação em
crime ou vice-versa?
- Figueiredo Dias e Maria Fernanda Palma discordam – facto que deixou de ser crime
e passa a ser contra-ordenação anterior, deve ser punível por sanção contra-
ordenacional.
20
- Assim, se facto deixar de ser considerado um crime, o art. 2º/2 estabelece que o
facto deixa de ser punível e que a execução, ao existir, seja suspensa, mesmo que
transitada em julgado. Se legislador mudou a sua concepção sobre crimes, faz sentido
que quem os tenha cometido seja libertado.
- Qual o fundamento legal? O art. 2º/4, quando fala em ‘leis posteriores’ e o art.
29º/4, in fine.
17
Taipa de Carvalho, Lei Penal Intermédia
21
(prisão e prisão). Quando são heterogéneas (pena tem limite máximo maior que a
outra, mas tem um limite mínimo menor) Tem de haver determinação concreta.
- Unitária ou diferenciada?
- Segundo a ponderação unitária, a lei deve ser aplicável na totalidade das suas
disposições sobre a pena principal, acessória e pressupostos processuais.
- Taipa de Carvalho diz que argumento do STJ é inócuo, pois o Código Penal usa
‘disposições’, ‘normas’ e ‘regime’ como sinónimos.
Leis Temporárias
- Considera que a lei posterior descriminalizadora não inclui entre os seus elementos
típicos a situação do crime, havendo alteração essencial no ilícito típico entre as duas
leis, que serão temporalmente mas não juridicamente sucessivas.
- Maria Fernanda Palma diz que é uma boa explicação para leis excepcionais e não para
todas as temporárias – é discutível a ideia de que o legislador enha querido legitimar
a ultra-actividade da lei só por ser temporária. Logo, não basta ser temporária, a
temporalidade tem de estar ligada a uma excepcionalidade historicamente
objectivada da situação típica.
- Além disso, o art. 2º/3 não pode ultrapassar princípios do art. 29º/4 – a lei mais
favorável com elementos típicos.
22
Alteração dos Elementos Constitutivos do Tipo
- Situações em análise são aquelas em que a Lei Nova altera a estrutura do tipo legal
de crime, acrescentando, retirando ou substituíndo algum dos elementos da Lei Antiga
em vigor no tempus delicti. A complexidade reside em saber se, determinado facto,
praticado na vigência da Lei Antiga foi discriminalizado pela Lei Nova ou continua a
ser considerado crime. No primeiro caso aplicar-se-á o 2º/1 e no segundo o art. 2º/4.
- Exemplo: se Lei Antiga previa 10 anos e Lei Nova prevê 5, aplicar-se-á a Lei Nova.
Se, ao contrário for a Lei Antiga a prever 10 anos e a Lei Nova a prever 15 anos, aplicar-
se-á a Lei Antiga
- Taipa de Carvalho acha que está mais conforme com os princípios político-criminais
que a entrada em vigor da Lei Nova determine a despenalização da conduta praticada
na vigência da Lei Antiga, mesmo que os pressupostos da Lei Nova estejam
preenchidos.
23
continuidade da punibilidade era valorar retroactivamente como típica uma
circunstância que na altura em que foi praticada não o era.
- Para Taipa de Carvalho pode haver, contudo, casos em que a aplicação da Lei
Nova (desde que a pena seja mais leve) apesar de esta restringir a punibilidade, não
implicar uma valoração retroactiva típica. Aí, mantém-se a manutenção da
punibilidade da conduta praticada na vigência da Lei Antiga. Exemplo: se se viesse
estabelecer que furto só era acima de 12 euros e a Lei Antiga dizia 10, manter-se-ia a
punibilidade.
- O art. 204º CRP determina que a sujeição imediata dos tribunais à Constituição
precede e limita a sua subordinação à lei (v. também nos arts. 203º e 205º/1) que
traduz uma manifestação de um princípio do Estado de Direito e da legalidade ao
nível da função judicial, pelo que o julgamento segundo normas inconstitucionais não
é uma ‘tolerância em relação ao vício’, mas uma violação do art. 204º CRP
18
Rui Pereira, A Relevância da Lei Penal Inconstitucional de Conteúdo Mais Favorável ao Arguido, in
RPCC, ano 1, 1991
19
Jorge Miranda, Os Princípios Constitucionais da Legalidade e da Aplicação da Lei Mais Favorável em
Matéria Criminal, in O Direito
24
constitucionalidade. Logo, é preciso transferir este problema de uma sede de justiça
constitucional para um problema de ignorância da lei penal válida pelo agente, i.e.,
uma eventual falta de consciência da ilicitude ou gravidade do ilícito. Para Rui
Pereira, aplicar-se-á o regime do erro do art. 16º/1 CP nas normas inconstitucionais
descriminalizadoras. Nas desagravantes, estar-se-á perante um erro sobre a
gravidade do ilícito, não previsto autonomamente no CP, tendo influência para efeitos
de determinação da pena – art. 70º ss CP.
- Acaba por concluir o autor que em ambas as hipóteses nunca é aplicada uma norma
declarada inconstitucional, esta é tida em conta só negativamente, não por si, mas “à
luz do princípio cogente dos arts. 29º/4 e 282º/3, in fine o qual tem eficácia
incondicionada e imediata”
- Maria Fernanda Palma – a reserva de lei penal origina uma especial conformação da
técnica legislativa e da interpretação, de modo a poder haver uma aplicação estrita
da definição legislativa das normas, chamando-se a isso o princípio da determinação
das normas penais incriminadoras.
20
Maria Fernanda Palma, Direito Penal..., pp 82-106
21
Figueiredo Dias, Direito Penal..., pp 187-193
25
- O que acabámos de ver resulta da mitificação da separação de poderes, sendo que os
seus pressupostos são os seguintes:
26
- Outro critério relevante poderá ser todos os sentidos das palavras na linguagem
corrente que sejam previsíveis.
- Maria Fernanda Palma acha que o art. 1º/3 não proíbe expressamente a
interpretação extensiva, pois ela só poderá ser retirada do art. 1º/3 por analogia, o
que não pode acontecer, devido à proibição da própria analogia.
27
haver incoerência sistemática) e institucional (a garantia jurisprudencial da unidade do
Direito, que compete aos tribunais superiores). Assim, acha Castanheira Neves, a
interpretação permitida será a que caiba não só no sentido logicamente possível das
palavras da lei, mas também a que revele os valores jurídicos que a lei pretende
atingir e seja compatível com o sistema, tendo a unidade de Direito por instâncias
que a asseguram – as ideias jurídicas não se moldam pelas palavras.
- Maria Fernanda Palma também não aceita modelo positivista, pois haverá sempre
uma vinculação relativa ao texto, em si mesmo, para apreender a norma. Sendo
assim, propõe o positivismo lógico-analítico:
- Figueiredo Dias crê que, devido ao facto de haver muitas palavras polissémicas, o
legislador, ao criar a lei, oferece um quadro de significados dentro do qual o aplicador
da lei se pode mover e pode optar sem ultrapassar os limites legítimos da
interpretação. Fora desse quadro estaremos no domínio da analogia proibida.
28
Proibição de Redução Teleológica Incriminadora das Normas Que Delimitam a
Tipicidade
22
Figueiredo Dias, Direito Penal..., pp 207-232
29
interesses nacionais específicos, sendo indiferente a nacionalidade ou residência do
autor); princípio da nacionalidade (Estado pune todos os factos relevantes praticados
pelos seus nacionais, com indiferença pelo lugar onde eles foram praticados); princípio
da universalidade (manda o Estado punir todos os factos contra os quais se deva lutar
a nível mundial ou que internacionalmente ele tenha assumido a obrigação de punir,
com indiferença pelos princípios acima); e princípio da administração supletiva da
justiça penal (lei portuguesa passa a ter competência para conhecer dos factos que,
não estando sujeitos às regras anteriores, foram praticados no estrangeiro por
estrangeiros que se encontram em Portugal e cuja extradição, tendo sido requerida,
não pode ser concedida.)
Princípio da Territorialidade
- Crimes continuados (art. 30º/2) – basta que um dos factos e encontre abrangido
pelo princípio da territorialidade
30
- Delitos itenerantes ou de trânsito – factos que, pelo seu modo específico de
execução, se põem em contacto com diversas ordens jurídicas nacionais. Certa
doutrina entende que qualquer uma das ordens jurídicas contactadas se torna
aplicável em nome do princípio da territorialdiade.
O Critério do Pavilhão
- Ambos estão consagrados no art. 5º/1 c), que diz que a lei penal portuguesa é
aplicável a factos cometidos fora do território nacional por portugueses ou por
estrangeiros contra portugueses, sob uma tripla condição – agentes serem
encontrados em Portugal, factos serem puníveis no locus delicti e de constituírem
crime que admita extradição e esta não possa ser concedida. Para efeitos deste artigo
‘português’ é todo o que será como tal considerado no momento do facto.
31
- Agente tem de se encontrar em Portugal – condição objectiva de punibilidade. Será
uma condição de aplicação no espaço da lei penal portuguesa.
- Facto seja punível pela legislação do lugar em que tiver sido encontrado. É a
condição materialmente mais importante para aplicação do princípio da
nacionalidade. Contudo, se no local do facto não se exercer poder punitivo – nesse
caso o princípio da nacionalidade deixa de ser complementar para ser tornar no
princípio único de aplicação da lei no espaço, e serve para não deixar factos sem
condição.
- Facto tem de constituir crime que admita extradição e ela não pode ser concedida.
Se estiver em causa o princípio da nacionalidade activa, a extradição só será possível
nos apertados limites do regime previsto no art. 33º/3 CRP e 32º/2 da Lei de
Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal (Lei 144/99). As condições
serão as seguintes: reciprocidade de tratamento pelo Estado requerente,
consagração dessa reciprocidade em convenção, casos de terrorismo ou convenção
internacional, e garantia de um processo justo e equitativo.
- Se crime for passível de extradição, ela pode não ser concedida porque, não foi
requerida, por ser fora dos casos previstos, por ter motivos políticos, pena de morte
e lesão irreversível da integridade física (art. 33º/4 CRP) e pena perpétua (33º/5). As
primeiras proibições cessam se Estado requerente comutar essas penas ou se aceitar
a conversão das mesmas por um tribunal português pela lei portuguesa – art. 6º/2 a)
LCJIMP, e a terceira cessa se Estado requerente der garantais de que tal pena não
será aplicada ou executada – (art. 6º/2 b) LCJIMP e 33º/5 CRP)
32
- Ainda se pode extender o princípio da nacionalidade nos termos do art. 5º/1 d),
segundo o qual a lei penal portuguesa é aplicável a factos cometidos fora do
território nacional contra portugueses, por portugueses que viverem habitualmente
em Portugal ao tempo da prática e aqui forem encontrados. Extensão deriva de não
se aplicarem os da al. c). Serve para evitar fraudes à lei penal. Justificação prende-se
com fidelidade do agente e da vítima aos princípios fundamentais da comunidade a
que pertencem e habitualmente vivem.
- Aplicar a lei penal portuguesa da específica protecção real que deve ser concedida a
bens jurídicos portugueses, independentemente da nacionalidade do agente e do
local do crime e da lei do lugar do crime. O fundamento será o de que o agente
estabeleceu uma relação com a ordem jurídica-penal portuguesa ao dirigir o seu
facto contra interesses especificamente portugueses, e porque o Estado pode não ter
condições ou vontade de punir esses factos.
- Que bens jurídicos? O art. 5º/1 a) enumera esses factos – arts. 221º (burla
informática), 262º-271º (falsificações moedas e títulos de crédito), 325º-345º (crimes
contra Estado de Direito ou eleitorais).
- Art. 5º/1 b) – ordena a aplicação da lei penal portuguesa a crimes que tutelam bens
jurídicos carecidos de protecção internacional – crimes dos arts. 159º (escravidão),
160º (rapto), 169º (tráfico de pessoas), art. 172º-173º (abuso sexual de crianças), 176º
(lenocínio e tráfico de menores), 237º (aliciamento de forças armadas).
- Aplicação da lei penal portuguesa depende de uma dupla condição – que o agente
seja encontrado em Portugal e que não possa ser extraditado/entregue
- Certo direito internacional convencional pode ser fonte deste princípio – art. 5º/2.
33
Princípio Complementar da Administração Supletiva da Justiça Penal
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Figueiredo Dias, Direito Penal, pp 992-1004
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- Primeiro há que determinar se as normas não estão numa relação lógico-jurídica da
qual resulte a aplicação de apenas uma delas, pela razão de que à luz da norma que
prevalece já se pode avaliar de forma esgotante o conteúdo de ilícito e de culpa do
comportamento global.
- Assim, falaremos de um concurso legal ou concurso aparente, ou, como também lhe
chama Figueiredo Dias, unidade de norma ou de lei, tratando-se ela de uma operação
de natureza lógica-conceitual, de um trabalho sobre normas que constitui
pressuposto da indagação material da unidade ou pluralidade de crimes; o autor de
Coimbra prefere chamar concurso aparente a outra problemática, que se traduz na
unidade do sentido social de ilicitude do facto punível.
Formas de Concurso
Especialidade
- Será o homicídio uma lei especial em relação à ofensa à integridade física? Sim, pois
não é possível cometer um homicídio sem ofender a integridade física a alguém,
havendo a tal relação de implicação conceitual. Dúvidas podem-se levantar se se
tratar de uma ofensa à integridade física grave e um homicídio, podendo o
agravamento da integridade física nada ter a ver com o homicídio, havendo dois
sentidos de ilicitude.
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ilegítima em habitação e de membro de um bando. Em princípio dever-se-á aplicar,
salvo uma relação de subsidiariedade, pela pluralidade de leis aplicáveis, e o mesmo
deve afirmar-se para os casos de concorrência de qualificação e privilegiamento no
mesmo substrato de facto, no qual Figueiredo Dias afirma que as leis concorrentes
devam aplicar-se umas ao lado das outras.
- Há que frisar que uma relação de especialidade só pode ser afirmada quando o tipo
legal prevalecente tenha alcançado a consumação, já não quando esteja em causa
uma tentativa do tipo especial e a consumação do tipo geral, afirmando-se aqui, para
Figueiredo Dias, uma pluralidade de normas concretamente aplicáveis, pois de outra
forma, ficaria à partida por considerar que o agente produziu o resultado típico da lei
excluída.
Subsidiariedade
- Existe quando um tipo legal de crime deva ser aplicado somente de forma auxiliar
ou subsidiária, se não existir outro tipo legal, em abstracto também aplicável, que
comine pena mais grave. Está aqui em questão a relação lógica dita de interferência
ou sobreposição – lei primária derroga lei subsidiária.
- Há a subsidiariedade expressa, que existe onde o teor literal de um dos tipos legais
restringe expressamente a sua aplicação à inexistência de outro tipo legal que
comine pena mais grave, i.e., quer nomeie esse tipo (subsidiariedade especial) ou
determine em geral a subordinação (s. geral).
- Não há objecção, para Figueiredo Dias, para que alguns destes casos se aceitem
como tendo uma relação de subsidiariedade, e noutros só uma hipótese de
concorrência de normas.
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e 344º) relativamente aos que punem a tentativa ou a consumação dos crimes
respectivos. Assim, os tipos legais de crime contemplados no art. 271º (actos
preparatórios) são preteridos na sua aplicabilidade se ao facto for aplicável a norma
que prevê o crime, tentado ou consumado, de contrafacção de moeda. O mesmo se
diz em relação entre a tentativa e a consumação de um crime.
Consumpção
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assim, a punição do concurso não devia seguir a norma de sanção do art. 77º, mas
ocorrer em termos idênticos àqueles em que ocorre a punição dos casos de
especialidade e subsidiariedade.
- Sendo assim, para Figueiredo Dias, o ‘regime legal’ do concurso de normas deve se ir
buscar somente à norma prevalecente e única concretamente aplicável, não também
à norma excluída. No entanto, alguns esclarecimentos:
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poderá falar, em bom rigor, concorrência de normas nem de norma prevalecente. Não
se poderá falar de uma eventual ressurreição da norma afastada.
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Figueiredo Dias, Direito Penal, pp 235-251
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Taipa de Carvalho, Direito Penal, pp 244-248
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- Assim, o sistema do facto punível haveria de ser apenas constituído por realidades
mensuráveis e empricamente comprováveis, pertencessem elas à facticidade
objectiva do mundo exterior ou a processos subjectivos e psíquicos internos.
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- Figueiredo Dias afirma que, no fundo, a concepção clássica foi abandonada no
momento em que se pôde compreender que não eram mais defensáveis os
fundamentos ideológicos e filosóficos subjacentes.
- É verdade que esta concepção teve mérito de ter erigido todo um sistema do
crime assente numa rigorosa metódica classificatória, dotado de clareza e
simplicidade, preocupando-se com a segurança e a certeza e o Estado de Direito.
- Ela pretende retirar o direito do mundo naturalista do ‘ser’, para, como ciência
do espírito, o situar numa zona intermédia entre aquele mundo e o puro ‘dever-ser’,
num campo referencial no mundo das referências da realidade aos valores, no mundo
da axiologia e dos sentidos.
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- A acção continua a ser concebida, no essencial, como comportamento humano
causalmente determinante de uma modificação do mundo exterior ligada à vontade
do agente.
- Taipa de Carvalho ainda alerta para o facto desta teoria continuar a seguir uma
concepção de ilícito baseada no desvalor do resultado.
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A Concepção Finalista
- Após a tragédia da II Guerra Mundial ficou claro que as concepções anteriores não
bastavam para proteger a justiça do conteúdo de normas válidas e democráticas,
procurando-se a substituição do Estado de Direito formal pelo Estado de Direito
material. Ficava por isso próxima a tentativa de limitar toda a normatividade numa
via fenomenológica e ontológica por leis estruturais determinantes do ser, as quais,
quando estabelecidas, serviriam de fundamento vinculante às ciências do homem e ao
direito.
- Hans Welzel – decisivo seria determinar o ‘ser’, a ‘natureza da coisa’, que se escondia
sob o conceito fundamental de toda a construção do crime, é dizer, sob o conceito de
acção, um conceito pré-judídico, que teria de ser ontologicamente determinado e,
aceite pelo legislador, não poderia por ele ser reconformado. Dele resultaria o inteiro
sistema do facto e do crime – como diz Welzel, a verdadeira essência da acção humana
foi encontrada por Welzel na verificação de que o homem dirige finalisticamente os
processos causais naturais em direcção a fins mentalmente antecipados, escolhendo
um meio para tal – logo, toda acção humana é assim supradeterminação final de um
processo causal – o objectivo é encontrar um fundamento ontológico e pré-jurídico.
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- Quanto ao ilícito pessoal, as aquisições do finalismo apresentam-se ainda hoje
cheias de valor e mesmo reforçadas por todas a discussão científico-dogmática
posterior que suscitaram. É exacto que fora da sua realização por dolo ou por
negligência o facto nunca contrariará a ordem jurídica nem nucna será ilícito. Todo o
ilícito é, por conseguinte, um ilícito pessoal, e dele fazem parte o dolo, como
representação e vontade de realização de um facto, e a negligência, como violação do
cuidado objectivamente imposto.
- A doutrina finalista da culpa é objecto de muita crítica por parte de Figueiredo Dias,
pois ele acha que a afirmação de que a culpa é mero juízo de desvalor, expurgada de
todo o objecto de valoração e reduzida à pura valoração do objecto, não é compatível
com a função político-cirminal que o princípio da culpa deve exercer no sistema.
Princípio da culpa é um princípio político-criminal e dogmático essencial ao direito
penal, o dolo e a negligência têm de ter significado como graus.
- Taipa de Carvalho diz que esta concepção continua a não explicar nem os crimes
negligentes nem os crimes de omissão, pois nos primeiros não há a característica da
finalidade, nem os crimes de omissão, pois neles não existe qualquer actividade causal,
finalisticamente orientada.
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político-criminais imanentes ao quadro axiológico e às finalidades jurídico-
constitucionais.
Falta funcionalismo
O Conceito de Acção26
- Para qualquer uma das concepções anteriormente expostas, é necessária uma base
autónoma e unitária de construção do próprio sistema, capaz de suportar as
predicações da tipicidade, ilicitude, culpa e punibilidade, mas sem as pré-determinar.
- Podemos identificar finalidade com dolo? Se sim, o conceito de acção perde a sua
função de ligação, na medida em que se opera a sua pré-tipicidade.
- A segunda possibilidade está em fazer uma cisão entre finalidade e dolo, bastando
então que, para de que acção final se possa falar, que o agente tenha querido alguma
coisa, que tenha supradeterminado finalisticamente um qualquer processo causal, sem
que releve para as posteriores valorações sistemáticas o conteúdo da vontade.
- Contudo, Figueiredo Dias acha que não se pode dizer em definitivo que um tal
conceito de acção final cumpra a sua função primária de classificação e abarque a
totalidade das formas básicas de aparecimento do facto punível. Pois se não há
dúvida que um tal conceito abrange os crimes dolosos de acção, já terá de deixar de
fora os crimes de omissão, e não possui em último termo conteúdo material bastante
para que uma parte dos crimes negligentes.
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Figueiredo Dias, Direito Penal, pp 251-263
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Conceito Social
- Para Figueiredo Dias, tem o mesmo problema – é certo que também a omissão,
antes mesmo da sua predicação jurídica, pode já em si própria possuir relevo social,
sendo que o social pode constituir em si mesmo um sistema normativo extra-jurídico.
- Assim, o conceito social de acção que aspire, como deve, a uma autonomia pré-
jurídica, deixará fora da omissão o elemento que verdadeiramente constitui o ilícito-
típico do crime – a acção positiva omitida e juridicamente imposta ou esperada.
Conceito Negativo
- Claus Roxin – novo conceito ‘pessoal’ de acção resideria em vê-la como ‘expressão da
personalidade’.
- Claus Roxin, partindo desta concepção pessoal de acção, usa-o como elemento limite.
Assim:
- Não são acções, naturalmente, quaisquer actos provenientes de animais. Não tendo
eles ‘personalidade’ para ser manifestada (apesar de poderem ter vontade), nem
inteligência, não fará sentido serem punidos pelo Direito Penal.
27
Claus Roxin, Derecho Penal, pp 253 ss
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- Tão pouco são acções os actos provenientes de pessoas colectivas – só órgãos
‘humanos’ é que podem ser punidos.
- Não serão acções aquelas situações em que o corpo humano funcione como uma
massa mecânica, sem que a psiqué haja participado de algum modo para isso
acontecer – um desmaio que parte um vaso, ataques epilépticos, a vis absoluta, etc.
- Caso do insecto que entra pelo vidro do carro – aqui Roxin afirma que houve
uma reflexão consciente que levou a um movimento defensivo transmitido
psiquicamente e dirigido a um objecto, bastando isso para admitir que há uma
manifestação de personalidade. Assim, diz o professor alemão, os movimentos
reflexos só não são acção quando a excitação dos nervos motores não estiver debaixo
de influência cerebral sem que o estímulo corporal se transmita directamente do
centro sensorial ao movimento (convulsões por descarga eléctrica).
- Relativamente a estes exemplos Roxin crê que cabe decidir que não se
acomodam a eles critérios tais como ‘voluntariedade, ‘finalidade’, planificação ou
configuração. Trata-se antes de direcção final interna, o da ‘finalidade inconsciente’,
podendo o conceito pessoal de acção acolhê-las sem mais, pois há uma manifestação
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da personalidade enquanto nos encontramos com produtos da adaptação do
aparato anímico a circunstâncias ou sucessos do mundo externo – a personalidade
não se reduz à esfera da consciência.
- Figueiredo Dias - o conceito de acção não é, nem deve ser, algo de previamente
dado ao tipo, mas apenas um elemento, a par de outros, integrante do cerne dos
tipos de ilícito. A partir daqui é inevitável, assinalar a este conceito o desempenho de
um papel secundário no sistema teleológico, essencialmente correspondente à função
de delimitação ou função negativa de excluir da tipicidade comportamentos jurídico-
penalmente irrelevantes. Para o autor, a primazia deverá ser concedida ao conceito de
realização típica do ilícito.
- O autor acha ainda que o conceito pessoal de acção, como qualquer outro
conceito geral, não pode cumprir capazmente a sua função de delimitação.
- Atenção que a própria função de delimitação não deve ser desempenhada por
um conceito geral de acção, mas antes por vários conceitos tipicamente
conformados. Não se elimina, no entanto, o relevo do conceito de acção, só que ele
perde autonomia e, deste modo, capacidade para se arvorar em pedra-base do
sistema.
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