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Informativo 656-STJ
Márcio André Lopes Cavalcante

ÍNDICE
DIREITO ADMINISTRATIVO
REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL
▪ A contribuição previdenciária paga pelo servidor não deve incidir sobre parcelas que não são incorporadas à sua
aposentadoria.

DIREITO CIVIL
USUCAPIÃO
▪ Bem furtado pode ser objeto de usucapião, desde que tenha cessado a clandestinidade.

DIVÓRCIO
▪ A prova documental é o único meio apto a demonstrar a existência da sociedade de fato entre os sócios.

INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE
▪ Determinada pessoa ajuizou ação de investigação de paternidade contra o suposto pai e esta foi julgada
improcedente; transitou em julgado; o suposto pai morreu; eventual ação rescisória contra esta sentença deve ser
proposta contra os herdeiros (e não contra o espólio).

DIREITO DO CONSUMIDOR
FATO DO PRODUTO
▪ A simples comercialização de alimento industrializado contendo corpo estranho é suficiente para configuração do
dano moral ou é necessária a sua ingestão?

SERVIÇOS BANCÁRIOS
▪ Consumidor comprou um produto pela internet e que nunca foi entregue; o banco não pode ser responsabilizado
solidariamente pelo simples fato de o pagamento ter sido feito mediante boleto bancário.

PLANO DE SAÚDE
▪ Ex-empregado (demitido ou aposentado) pode ter direito de continuar no plano de saúde coletivo que era oferecido
aos funcionários; contudo, se a empresa e a operadora rescindirem o contrato para todos, esse ex-empregado
também não terá mais direito de continuar.

DIREITO EMPRESARIAL
FUNDO DE INVESTIMENTO
▪ O administrador de um Fundo encerrado possui legitimidade para ser réu em ação de reparação de danos proposta
por credor do Fundo que alega que a liquidação não foi correta considerando que, antes de haver a partilha do saldo
entre os cotistas, deveria lhe ter sido paga uma dívida.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL


COMPETÊNCIA
▪ Compete à 1ª Seção do STJ (que aprecia matérias de direito público) julgar recurso no qual se discute a contratação
ou não de aprovado em processo seletivo realizado por entidade do Sistema S (no caso, o SEBRAE).

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1


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AÇÃO RESCISÓRIA
▪ Juiz que não declara, de ofício, prescrição na ação de cobrança não viola literal disposição de lei para fins de ação
rescisória com base no art. 485, V, CPC/1973.

AGRAVO DE INSTRUMENTO
▪ A parte pede que o juiz suspenda o processo alegando prejudicialidade externa (art. 313, V, “a”); magistrado
indefere; esse pronunciamento não pode ser equiparado a uma decisão sobre tutela provisória; logo, não cabe
agravo de instrumento contra ele com base no inciso I do art. 1.015.

EMBARGOS À EXECUÇÃO
▪ A protocolização dos embargos à execução nos autos da própria ação executiva constitui vício sanável.

ARREMATAÇÃO
▪ O arrematante do bem é o responsável pelo pagamento da comissão do leiloeiro, não podendo essa obrigação ser
imputada àquele que ofertou a segunda melhor proposta, porque o vencedor desistiu da arrematação.

DIREITO PENAL
LEI MARIA DA PENHA
▪ Se a mulher vítima de crime de ação pública condicionada comparece ao cartório da vara e manifesta interesse em
se retratar da representação, ainda assim, o juiz deverá designar audiência para que ela confirme essa intenção e
seja ouvido o MP, nos termos do art. 16.

DIREITO PROCESSUAL PENAL


LITISPENDÊNCIA
▪ A pendência de julgamento de litígio no exterior não impede, por si só, o processamento da ação penal no Brasil,
não configurando bis in idem.

REVISÃO CRIMINAL
▪ A violação a normas processuais não escritas, como é o caso da proibição da supressão de instância, pode ensejar
o ajuizamento de revisão criminal com base no art. 621, I, do CPP.

DIREITO TRIBUTÁRIO
PARCELAMENTO TRIBUTÁRIO
▪ Depois que o contribuinte pedia o parcelamento da Lei 11.941/2009, demorava algum tempo até que o Fisco fizesse
a consolidação do débito; neste período, continuam incidindo juros moratórios sobre a dívida.

EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO
▪ No empréstimo compulsório sobre energia elétrica (DL 1.512/76), a Eletrobrás deverá pagar juros remuneratórios
de 6% ao ano sobre a diferença de correção monetária não paga nem convertida em ações.

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 2


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DIREITO ADMINISTRATIVO

REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL


A contribuição previdenciária paga pelo servidor não deve incidir
sobre parcelas que não são incorporadas à sua aposentadoria

Em adequação ao entendimento do STF, não incide contribuição previdenciária sobre verba


não incorporável aos proventos de aposentadoria do servidor público, tais como terço de
férias, serviços extraordinários, adicional noturno e adicional de insalubridade.
STJ. 1ª Turma. EDcl no AgInt no REsp 1.659.435-SC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em
03/09/2019 (Info 656).

Não incide contribuição previdenciária sobre verba não incorporável aos proventos de
aposentadoria do servidor público, tais como terço de férias, serviços extraordinários,
adicional noturno e adicional de insalubridade.
STF. Plenário. RE 593068/SC, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 11/10/2018 (repercussão geral
– Tema 163) (Info 919).

Imagine a seguinte situação hipotética:


João é servidor público federal.
Ele ajuizou ação contra a União pedindo para que fosse declarado que ele não deve pagar contribuição
previdenciária sobre os valores que recebe a título de:
• terço de férias;
• serviços extraordinários (horas extras);
• adicional noturno;
• adicional de insalubridade.

O argumento de João foi o de que tais valores que ele recebe não irão “somar” no montante que ele irá
receber quando se aposentar. Em outras palavras, tais valores não influenciam nos proventos de
aposentadoria. Logo, não teria sentido ele pagar contribuição previdenciária sobre valores que não serão
incorporados aos seus proventos.
Vale ressaltar que, no caso concreto, a discussão envolvia verbas anteriores à atual redação da Lei nº
10.887/2004, dada pela Lei nº 12.688/2012.

Contestação da União
A União contestou a demanda alegando que, a partir da EC 41/2003, o regime previdenciário dos
servidores públicos tornou-se expressamente solidário. Isso significa que o servidor paga as contribuições
previdenciárias não apenas para si, mas também para custear o sistema, inclusive os proventos de outros
servidores.
Diante deste caráter de solidariedade, o legislador estaria livre para definir, na lei, as parcelas da
remuneração que estariam sujeitas à contribuição previdenciária, podendo determinar a sua incidência
inclusive sobre verbas eventuais.
A União explicou ainda que o terço de férias, os serviços extraordinários, o adicional noturno e o adicional
de insalubridade somente foram excluídos pelo legislador da incidência de contribuição previdenciária
com a MP 556/2011 (convertida na Lei nº 12.688/2011).
Em outras palavras, antes da MP 556/2001, era permitida a incidência de contribuição previdenciária
sobre terço de férias, serviços extraordinários, adicional noturno e adicional de insalubridade. Esta MP
alterou a Lei nº 10.887/2004 e passou a dizer que sobre tais verbas não incide contribuição previdenciária.

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 3


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Outro argumento da União foi no sentido de que o § 11 do art. 201 da CF/88 determina que os ganhos
habituais do empregador, a qualquer título, sofrerão a incidência de contribuição previdenciária. Logo,
quando o constituinte utilizou a expressão “a qualquer título”, incluiu também os ganhos habituais com
terço de férias, serviços extraordinários, adicional noturno e adicional de insalubridade.

A tese de João foi acolhida pelo STF?


SIM. O STF fixou a seguinte tese a respeito do tema:
Não incide contribuição previdenciária sobre verba não incorporável aos proventos de aposentadoria do
servidor público, tais como terço de férias, serviços extraordinários, adicional noturno e adicional de
insalubridade.
STF. Plenário. RE 593068/SC, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 11/10/2018 (repercussão geral – Tema
163) (Info 919).

O § 3º do art. 40 determina a incidência de contribuição previdenciária apenas sobre parcelas de


remuneração que influenciarão no cálculo dos proventos
O STF, analisando o § 3º do art. 40 da CF/88, concluiu que, de fato, somente podem figurar como base de
cálculo da contribuição previdenciária os ganhos habituais com repercussão nos benefícios
previdenciários, excluindo, assim, as verbas que não se incorporam à aposentadoria:
Art. 40 (...)
§ 3º Para o cálculo dos proventos de aposentadoria, por ocasião da sua concessão, serão
consideradas as remunerações utilizadas como base para as contribuições do servidor aos regimes
de previdência de que tratam este artigo e o art. 201, na forma da lei. (Redação dada pela EC
41/2003)

Este § 3º do art. 40 previu a vinculação expressa entre os proventos de aposentadoria e a remuneração


recebida pelo servidor, de modo que as parcelas sem reflexo nos proventos estão livres da incidência da
contribuição previdenciária.

Não se aplica o § 11 do art. 201 ao regime próprio


Como vimos acima, a União argumentou que o § 11 do art. 201 da CF/88 determina que os ganhos
habituais do empregado, a qualquer título, sofrerão a incidência de contribuição previdenciária. Logo, não
houve uma limitação apenas para as verbas recebidas pelo servidor e que irão ter impacto em sua
aposentadoria. Veja a redação do dispositivo:
Art. 201 (...)
§ 11. Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para
efeito de contribuição previdenciária e consequente repercussão em benefícios, nos casos e na
forma da lei. (Incluído dada pela EC 20/98)

O STF refutou, contudo, essa alegação e disse o seguinte: as regras do art. 201 da CF/88 aplicam-se para
o regime geral de previdência social. Aqui nós estamos tratando sobre o regime próprio (servidores
públicos).
O regime próprio é disciplinado pelas regras do art. 40 e, somente de forma subsidiária é que podemos
aplicar o art. 201 para o regime previdenciário dos servidores públicos. Nesse sentido é o comando do §
12 do art. 40:
Art. 40 (...)
§ 12 - Além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores públicos titulares de
cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de
previdência social. (Redação dada pela EC 41/2003)

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 4


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Não se pode aplicar o § 11 do art. 201 ao regime próprio porque existe uma regra no § 3º do art. 40 em
sentido contrário, ou seja, determinando a não incidência da contribuição previdenciária sobre as parcelas
não incorporáveis à aposentadoria do servidor público.
Logo, o § 11 do art. 201 não pode ser aplicado subsidiariamente aos servidores públicos em razão da
previsão especial do § 3º do art. 40:
Art. 40 (...)
§ 3º As regras para cálculo de proventos de aposentadoria serão disciplinadas em lei do respectivo
ente federativo.

Regime contributivo
O regime previdenciário é contributivo e essa dimensão contributiva do sistema mostra-se incompatível
com a cobrança de qualquer verba previdenciária que não garanta ao segurado algum benefício efetivo
ou potencial ao servidor.
O princípio da solidariedade não é suficiente para afastar esse aspecto, impondo ao contribuinte uma
contribuição que não lhe trará qualquer retorno.
De um lado, o princípio da solidariedade afasta a relação simétrica entre contribuição e benefício. De
outro, o princípio contributivo impede a cobrança de contribuição previdenciária sem que se confira ao
segurado alguma contraprestação, efetiva ou potencial, em termos de serviços ou benefícios.
Nesse contexto, ainda que o princípio da solidariedade seja pedra angular do sistema próprio dos
servidores, não pode esvaziar seu caráter contributivo, informado pelo princípio do custo-benefício, tendo
em conta a necessidade de um sinalagma mínimo, ainda que não importe em perfeita simetria entre o
que se paga e o que se recebe.
Desse modo, deve ser estabelecida a aplicação simétrica do binômio formado entre os princípios da
contributividade e da solidariedade, de forma a prestigiá-los e conjugá-los em um produto final
equilibrado.
Logo, caso o Estado tenha intenção de promover um fortalecimento atuarial, poderá agravar a alíquota
incidente sobre os participantes ou até mesmo aumentar sua participação no custeio, mas não tributar
sobre base não imponível.

Legislador não pode subverter o comando constitucional nem o caráter contributivo


A Constituição conferiu ao legislador ordinário a tarefa de estabelecer quais parcelas seriam consideradas
remuneração do servidor e sobre quais delas incidiria contribuição previdenciária. No entanto, essa
delegação não permite que o legislador subverta o comando constitucional de modo a incluir, na base de
cálculo da contribuição previdenciária, parcelas sem repercussão nos proventos de aposentadoria, sob
pena de desrespeito ao § 3º do art. 40 da CF/88.
Assim, o rol das parcelas isentas de contribuição previdenciária previsto inicialmente pela Lei nº 9.783/99,
e atualmente pela Lei nº 10.887/2004, não é um rol taxativo, mas meramente exemplificativo. Isso porque
mesmo que uma verba não esteja ali listada como isenta, se ela não for “incorporável aos proventos de
aposentadoria do servidor público”, sobre ela não deverá haver a incidência de contribuição
previdenciária.

MP 556/2011 (convertida na Lei nº 12.688/2011)


A MP 556/2011, posteriormente convertida na Lei nº 12.688/2012, alterou a Lei nº 10.887/2004 e
expressamente excluiu da incidência da contribuição previdenciária as verbas a título de terço de férias,
serviços extraordinários (horas extras) e adicional noturno. Veja:
Art. 4º (...)

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 5


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§ 1º Entende-se como base de contribuição o vencimento do cargo efetivo, acrescido das


vantagens pecuniárias permanentes estabelecidas em lei, os adicionais de caráter individual ou
quaisquer outras vantagens, excluídas:
(...)
X - o adicional de férias;
XI - o adicional noturno;
XII - o adicional por serviço extraordinário;

O adicional de insalubridade já era excluído desde a redação originária da Lei nº 10.887/2004:


Art. 4º (...)
§ 1º Entende-se como base de contribuição o vencimento do cargo efetivo, acrescido das
vantagens pecuniárias permanentes estabelecidas em lei, os adicionais de caráter individual ou
quaisquer outras vantagens, excluídas:
VII - as parcelas remuneratórias pagas em decorrência de local de trabalho; (obs: é o caso do
adicional de insalubridade).

O caso julgado pelo STF era, portanto, anterior à vigência da Lei nº 12.688/2012. Isso porque depois dela
não há mais discussão, considerando que tais verbas foram expressamente excluídas da cobrança.

STJ acompanha o STF


O STJ possuía posição em sentido diferente, mas passou a acompanhar a Suprema Corte:
Em adequação ao entendimento do STF, não incide contribuição previdenciária sobre verba não
incorporável aos proventos de aposentadoria do servidor público, tais como terço de férias, serviços
extraordinários, adicional noturno e adicional de insalubridade.
STJ. 1ª Turma. EDcl no AgInt no REsp 1.659.435-SC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em
03/09/2019 (Info 656).

DIREITO CIVIL
USUCAPIÃO
Bem furtado pode ser objeto de usucapião, desde que tenha cessado a clandestinidade

É possível a usucapião de bem móvel proveniente de crime após cessada a clandestinidade ou


a violência.
Nos termos do art. 1.261 do CC/2002, aquele que exercer a posse de bem móvel, interrupta e
incontestadamente, por 5 anos, adquire a propriedade originária do bem, fazendo sanar todo
e qualquer vício anterior.
A apreensão física da coisa por meio de clandestinidade (furto) ou violência (roubo) somente
induz a posse após cessado o vício (art. 1.208 do CC/2002), de maneira que o exercício
ostensivo do bem é suficiente para caracterizar a posse mesmo que o objeto tenha sido
proveniente de crime.
Caso concreto: indivíduo adquiriu caminhão por meio de financiamento bancário, com emissão
de registro perante o órgão público competente, ao longo de mais de 20 anos. Depois se descobriu
que o veículo havia sido furtado antes da aquisição. Pode-se reconhecer que houve a aquisição por
usucapião, sendo irrelevante se analisar se houve a inércia do anterior proprietário (vítima do
furto) ou se o usucapiente conhecia a ação criminosa anterior à sua posse.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.637.370-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 10/09/2019 (Info 656).

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Imagine a seguinte situação hipotética:


Em 2003, João adquiriu um caminhão de Ricardo, por meio de financiamento bancário.
Vale ressaltar que foi feito o registro e licenciamento regular perante o DETRAN.
Em 2013, apareceu Pedro dizendo que o caminhão era seu e que Ricardo havia furtado o veículo em 2002.
Diante disso, Pedro ajuizou ação de reintegração de posse contra João pedindo de volta o caminhão.
João, por sua vez, formulou pedido contraposto para que fosse reconhecida a usucapião extraordinária
sobre o bem, considerando que ele estava na posse mansa e pacífica durante todos esses anos.
Pedro argumentou que não havia posse porque se trata de bem objeto de furto.

O pedido de João pode ser acolhido? Existe a possibilidade de usucapião sobre bem objeto de furto?
SIM. Vamos entender com calma.

O que é usucapião?
Usucapião é...
- um instituto jurídico por meio do qual a pessoa que fica na posse de um bem (móvel ou imóvel)
- por determinados anos
- agindo como se fosse dono
- adquire a propriedade deste bem ou outros direitos reais a ele relacionados (exs: usufruto, servidão)
- desde que cumpridos os requisitos legais.

Usucapião de bem móvel


Existem duas espécies de usucapião de bens móveis:

USUCAPIÃO DE BEM MÓVEL


A) ORDINÁRIA B) EXTRAORDINÁRIA
Prazo: 3 anos. Prazo: 5 anos.
Exige justo título. Não exige justo título.
Exige boa-fé. Não exige boa-fé.
Prevista no art. 1.260 do CC: Prevista no art. 1.261 do CC:
Art. 1.260. Aquele que possuir coisa móvel como Art. 1.261. Se a posse da coisa móvel se prolongar
sua, contínua e incontestadamente durante três por cinco anos, produzirá usucapião,
anos, com justo título e boa-fé, adquirir-lhe-á a independentemente de título ou boa-fé.
propriedade.

Usucapião extraordinária não exige justo título nem boa-fé


Para que ocorra a usucapião extraordinária, exige-se apenas que a posse seja exercida de forma contínua
(sem interrupção) e incontestadamente (sem oposição).
Não se exige que a posse exercida seja justa nem que haja boa-fé.
Desse modo, no caso concreto, como João estava há mais de 5 anos com o bem, o que se deve analisar é
se esse poder que ele exercia sobre o bem poderia ou não ser considerado posse.

Análise do art. 1.208 do CC


O art. 1.208 do Código Civil prevê o seguinte:
Art. 1.208. Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam
a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a
clandestinidade.

O roubo se contamina pelo vício da violência.

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O furto, por sua vez, está ligado ao vício da clandestinidade.


Logo, em princípio, uma coisa obtida por meio de roubo (violência) ou furto (clandestinidade) não gera
posse. Trata-se de mera apreensão física do bem roubado ou furtado.
Nesse sentido, o agente que praticou o furto, enquanto não cessada a clandestinidade (isto é, enquanto
estiver escondido o bem subtraído) não estará no exercício da posse, caracterizando-se, assim, a mera
apreensão física do objeto furtado.
Inexistindo a posse, também não se dará início ao transcurso do prazo de usucapião. É essa ratio que
sustenta a conclusão de que a res furtiva não é bem hábil à usucapião.
Porém, uma vez cessada a violência ou a clandestinidade, a apreensão física da coisa induzirá à posse. Em
outras palavras, depois de cessada a violência ou a clandestinidade, a pessoa que estiver com o bem estará
exercendo a posse.

Bem furtado pode ser objeto de usucapião, desde que tenha cessado a clandestinidade
Assim, nem sempre será proibido que o bem furtado seja objeto de usucapião.
É necessário analisar, no caso concreto, se houve a cessação da clandestinidade, especialmente quando o
bem furtado é transferido a terceiros de boa-fé.
O exercício ostensivo da posse perante a comunidade, ou seja, a aparência de dono é fato, por si só, apto
a provocar o início da contagem do prazo de usucapião.

Em suma:
É possível a usucapião de bem móvel proveniente de crime após cessada a clandestinidade ou a
violência.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.637.370-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 10/09/2019 (Info 656).

DIVÓRCIO
A prova documental é o único meio apto a demonstrar
a existência da sociedade de fato entre os sócios

A prova escrita constitui requisito indispensável para a configuração da sociedade de fato


perante os sócios entre si.
Caso concreto: Daniel e Alessandra casaram-se sob o regime da separação convencional de
bens. Durante o casamento, Daniel montou um restaurante. Apesar de não ser sócia,
Alessandra trabalhava no restaurante, auxiliando o marido. Quando se divorciaram,
Alessandra ajuizou ação pedindo para ser reconhecida a existência de sociedade de fato
(sociedade em comum) no restaurante, ou seja, que ela fosse tida como sócia de Daniel. O
pedido foi negado em razão da ausência de qualquer prova escrita dessa sociedade de fato.
Além disso, também se considerou que não havia affectio societatis entre as partes e que não
restou demonstrado que a mulher praticasse atos de gestão ou que tivesse assumido os riscos
do negócio juntamente com o ex-marido.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.706.812-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 03/09/2019 (Info 656).

Imagine a seguinte situação hipotética:


Daniel e Alessandra casaram-se em 2002.
Na época, os dois não tinham patrimônio.
Mesmo assim, por meio de pacto antenupcial, escolheram o regime da separação convencional de bens
(também chamado de regime da separação absoluta de bens).
Vamos aqui relembrar a diferença entre o regime da separação legal e da separação convencional de bens:

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Separação LEGAL (OBRIGATÓRIA) Separação ABSOLUTA


Separação LEGAL (obrigatória) é aquela prevista Separação ABSOLUTA é a separação convencional,
nas hipóteses do art. 1.641 do Código Civil. ou seja, estipulada voluntariamente pelas partes
(art. 1.687 do CC).
No regime de separação legal de bens, Na separação absoluta (convencional), não há
comunicam-se os adquiridos na constância do comunicação dos bens adquiridos na constância
casamento, desde que comprovado o esforço do casamento.
comum para sua aquisição. Assim, somente haverá separação absoluta
(incomunicável) na separação convencional.
Aplica-se a Súmula 377 do STF. Não se aplica a Súmula 377 do STF.

(...) 3. Inaplicabilidade, in casu, da Súmula 377 do STF, pois esta se refere à comunicabilidade dos bens no
regime de separação legal de bens (prevista no art. 1.641, CC), que não é caso dos autos.
3.1. O aludido verbete sumular não tem aplicação quando as partes livremente convencionam a separação
absoluta dos bens, por meio de contrato antenupcial. (...)
STJ. 4ª Turma. REsp 1481888/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 10/04/2018.

A Súmula 377 do STF, editada em 1964, possui a seguinte redação:


Súmula 377-STF: No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do
casamento.

Essa súmula 377 do STF permanece válida?


SIM. No entanto, ela deve ser interpretada da seguinte forma:
“No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”, desde
que comprovado o esforço comum para sua aquisição.
Nesse sentido: STJ. 4ª Turma. REsp 1.689.152/SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 24/10/2017.

Voltando ao nosso exemplo:


Em 2009, ou seja, durante a relação, Daniel, em conjunto com um sócio, montou um restaurante que fez
grande sucesso, estando atualmente avaliado em R$ 3 milhões.
Em 2019, Daniel decidiu se divorciar, o que foi concretizado em março de 2019. A partilha de bens,
contudo, ficou para ser discutida posteriormente, em ação própria, conforme autoriza o art. 1.581 (O
divórcio pode ser concedido sem que haja prévia partilha de bens).

Ação de indenização
Foi então que Alessandra ajuizou ação de indenização contra Daniel.
Na ação, Alessandra argumentou que, no início, o restaurante foi instalado na própria residência do casal
e que, durante todos esses anos, ela trabalhou no negócio, sendo uma das responsáveis pelo sucesso do
empreendimento.
Argumentou que os frequentadores do local a identificavam como a personificação do próprio restaurante
e que trabalhou arduamente até a sua saída, que foi simultânea ao fim do casamento, não tendo jamais
recebido em espécie remuneração ou lucro da sociedade, que teria apenas beneficiado o réu, apesar do
esforço comum das partes.
Afirmou que, diante disso, deveria ser considerada como “sócia de fato” ou “dona do negócio”.
Alegou que tem direito aos lucros, pois, independentemente do regime de bens do casamento ou do
recebimento de pro labore, salário ou qualquer outra forma de remuneração, faz jus ao status de “sócia
de fato” do restaurante.
O pedido na ação foi, portanto, para que o réu fosse condenado a pagar em favor da autora uma
indenização no valor de 50% de suas cotas no restaurante e dos frutos dele decorrentes.

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O pedido da autora foi acolhido pelo STJ?


NÃO.

Do regime de bens adotado pelas partes


Inicialmente, não há que se falar em “sociedade de fato” quando o regime adotado é o da separação
convencional de bens. No regime da separação convencional de bens não se presume comunhão de bens.
Assim, o regime matrimonial adotado enseja plena autonomia dos patrimônios dos cônjuges, distintos por
natureza.
Ainda que se admita a possibilidade de os cônjuges casados sob o regime de separação de bens
constituírem, eventualmente, uma sociedade de fato, essa sociedade de fato não pode decorrer
simplesmente do fato de terem uma vida em comum.
A intenção do ex-casal de constituir uma sociedade somente poderia ser aceita se isso tivesse sido
demonstrado de forma solene, o que não ocorreu.
No caso, para que fosse aceito que eles tinham uma sociedade comercial em conjunto, ainda que não
regularmente constituída, seria indispensável demonstrar, no mínimo, que administravam tal empresa
juntos, o que não foi possível se extrair dos autos.
A autora, em verdade, alega ter trabalhado para o ex-marido, sem, contudo, ter fornecido capital ou
assumido os riscos do negócio ao longo da relação.
Aparentemente, o que se pretende, por vias oblíquas é a alteração do regime de bens escolhido por ambas
as partes. Ocorre que o regime jurídico da separação convencional de bens voluntariamente estabelecido
pelo ex-casal é imutável, ressalvada manifestação expressa de ambos os cônjuges em sentido contrário ao
pacto antenupcial.

Sociedade de fato ou em comum


Uma sociedade empresária nasce a partir de um acordo de vontades de seus sócios, que pode ser realizado
por meio de um contrato social ou de um estatuto, conforme o tipo societário a ser criado.
A “sociedade de fato” (atualmente chamada de “sociedade em comum”) é uma exceção a essa regra.
A sociedade em comum não passou pelas solenidades legais necessárias para adquirir personalidade
jurídica. Apesar disso, trata-se de sujeito de direitos e obrigações.
No caso não se tem nem mesmo “sociedade em comum”.
A condição para se admitir a existência de uma sociedade é a configuração da affectio societatis (que não
se confunde com a affectio maritalis) e a integralização de capital ou a demonstração de prestação de
serviços. Tais requisitos são basilares para se estabelecer qualquer vínculo empresarial.
Tais requisitos não foram comprovados, no caso concreto.
Os resultados comerciais podem ser positivos ou negativos, motivo pelo qual se presume que quem exerce
a empresa deve assumir também os riscos do negócio.
No caso concreto, não ficou demonstrado que Alessandra tenha realizado aportes ou integralizado o
capital, pretendendo ser considerada sócia por ter apoiado o marido nas atividades de funcionamento do
restaurante.
Não há notícia da prática de atos de gestão pela mulher nem de prestação de contas de valores
administrados por ela. Além disso, não restou configurada a indispensável affectio societatis voltada ao
exercício conjunto da atividade econômica ou à partilha de resultados, como exige o art. 981 do CC:
Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir,
com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos
resultados.

Necessidade de documento escrito


Vale relembrar, ainda, o que diz o art. 987 do CC:

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 10


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Art. 987. Os sócios, nas relações entre si ou com terceiros, somente por escrito podem provar a
existência da sociedade, mas os terceiros podem prová-la de qualquer modo.

Conforme explica André Luiz Santa Cruz Ramos:


“se quem necessita provar a existência da sociedade são os seus próprios sócios - com a finalidade, por
exemplo de discutir a partilha de investimentos -, só se admite a prova por escrito” (RAMOS, André Luiz
Santa Cruz. Direito Empresarial Esquematizado. 5ª ed., São Paulo: Método, p. 239).

A prova escrita constitui requisito indispensável para a configuração da sociedade de fato perante os
sócios entre si.
A prova documental é o único meio apto a demonstrar a existência da sociedade de fato entre os sócios.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.706.812-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 03/09/2019 (Info 656).

INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE
Determinada pessoa ajuizou ação de investigação de paternidade contra o suposto pai e esta foi
julgada improcedente; transitou em julgado; o suposto pai morreu; eventual ação rescisória
contra esta sentença deve ser proposta contra os herdeiros (e não contra o espólio)

A ação rescisória de sentença proferida em ação de investigação de paternidade cujo genitor


é pré-morto deve ser ajuizada em face dos herdeiros, e não do espólio.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.667.576-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 10/09/2019 (Info 656).

Imagine a seguinte situação hipotética:


João tinha dois filhos chamados Lucas e Tiago.
Cristina ajuizou ação de investigação de paternidade contra João alegando que também era sua filha.
O pedido foi julgado improcedente. O processo transitou em julgado em março de 2017.
Em março de 2018, João faleceu.
Em abril de 2018, Cristina quer ajuizar ação rescisória para desconstituir a sentença proferida na ação de
investigação de paternidade.

Essa ação rescisória deverá ser proposta contra o espólio ou contra os herdeiros de João?
Contra os herdeiros.
A ação rescisória de sentença proferida em ação de investigação de paternidade cujo genitor é pré-
morto deve ser ajuizada em face dos herdeiros, e não do espólio.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.667.576-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 10/09/2019 (Info 656).

Ação de estado e de natureza pessoal


Por se tratar de ação de estado e de natureza pessoal, a ação de investigação de paternidade em que o
pretenso genitor biológico é pré-morto (já faleceu) deve ser ajuizada somente em face dos herdeiros do
falecido (e não de seu espólio).

Segue a mesma lógica da ação de investigação de paternidade


Se Cristina ajuizasse a ação de investigação de paternidade depois da morte de João, ela teria que propor
contra os herdeiros (e não contra o espólio do falecido). Isso porque, segundo a jurisprudência do STJ, a
ação de investigação de paternidade deve ser ajuizada em face dos herdeiros, e não do espólio do falecido.
Nesse sentido: STJ. 3ª Turma. REsp 331.842/AL, DJ 10/06/2002.

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 11


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Logo, em caso de ação rescisória contra ação de investigação de paternidade, o raciocínio deve ser o
mesmo e a ação deve ser proposta também contra os herdeiros (e não contra o espólio).

Espólio é um mero ente despersonalizado que titulariza a herança até que haja a partilha
O espólio não é parte legítima para responder à ação rescisória em que se pleiteia a rescisão de sentença
e o rejulgamento de ação investigatória de paternidade post mortem na medida em que, nessa ação, nada
será pedido contra o espólio, que tão somente é um ente despersonalizado apto a titularizar a
universalidade jurídica denominada herança até que se efetive a partilha dos bens.
Obs: o espólio é o ente despersonalizado que representa a herança em juízo ou fora dele. Mesmo sem
possuir personalidade jurídica, o espólio tem capacidade para praticar atos jurídicos (ex.: celebrar
contratos no interesse da herança) e tem legitimidade processual (pode estar no polo ativo ou passivo da
relação processual) (FARIAS, Cristiano Chaves. et. al., Código Civil para concursos. Salvador: Juspodivm,
2013, p. 1396).

DIREITO DO CONSUMIDOR

FATO DO PRODUTO
A simples comercialização de alimento industrializado contendo corpo estranho é suficiente
para configuração do dano moral ou é necessária a sua ingestão?

Tema polêmico!
Para ocorrer indenização por danos morais em função do encontro de corpo estranho em
alimento industrializado, é necessária a sua ingestão?
• SIM. Só há danos morais se consumir o corpo estranho. Vale ressaltar que, para gerar danos
morais, a ingestão pode ser apenas parcial. Posição da 4ª Turma do STJ.
STJ. 4ª Turma. AgRg no AREsp 489.030/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 16/04/2015.
STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 1299401/SP, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 12/02/2019.

• NÃO. A simples comercialização de alimento industrializado contendo corpo estranho é


suficiente para configuração do dano moral. Posição da 3ª Turma do STJ.
STJ. 3ª Turma. REsp 1828026/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 10/09/2019 (Info 656).

Para ocorrer indenização por danos morais em função do encontro de corpo estranho em alimento
industrializado, é necessária a sua ingestão?
As duas Turmas do STJ que decidem a matéria estão divididas:

SIM NÃO
Só há danos morais se consumir o corpo estranho. A simples comercialização de alimento
Vale ressaltar que, para gerar danos morais, a industrializado contendo corpo estranho é
ingestão pode ser apenas parcial. suficiente para configuração do dano moral.
Posição da 4ª Turma do STJ. Posição da 3ª Turma do STJ.
Ausente a ingestão do produto considerado A aquisição de produto de gênero alimentício
impróprio para o consumo em virtude da presença contendo em seu interior corpo estranho,
de corpo estranho, não se configura o dano moral expondo o consumidor a risco concreto de lesão à
indenizável. sua saúde e segurança, ainda que não ocorra a
ingestão de seu conteúdo, dá direito à

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 12


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Não há dano moral na hipótese de aquisição de compensação por dano moral, dada a ofensa ao
gênero alimentício com corpo estranho no interior direito fundamental à alimentação adequada,
da embalagem se não ocorre a ingestão do corolário do princípio da dignidade da pessoa
produto considerado impróprio para consumo, humana. Caso concreto: Danoninho com inseto.
visto que referida situação não configura STJ. 3ª Turma. REsp 1828026/SP, Rel. Min. Nancy
desrespeito à dignidade da pessoa humana, Andrighi, julgado em 10/09/2019 (Info 656).
desprezo à saúde pública ou mesmo descaso para
com a segurança alimentar. Exemplo: encontrar larvas no interior de bombom
A ausência de ingestão de produto impróprio para no momento de sua retirada da embalagem.
o consumo configura, em regra, hipótese de mero STJ. 3ª Turma. REsp 1744321/RJ, Rel. Min. Nancy
dissabor vivenciado pelo consumidor, o que afasta Andrighi, julgado em 05/02/2019.
eventual pretensão indenizatória decorrente de
alegado dano moral. Exemplo: no interior de garrafa de refrigerante
STJ. 4ª Turma. AgRg no AREsp 489.030/SP, Rel. lacrada havia um inseto.
Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 16/04/2015. STJ. 3ª Turma. REsp 1768009/MG, Rel. Min. Nancy
Andrighi, julgado em 07/05/2019.
A ingestão, ainda que parcial, de alimento
contaminado pela presença de larvas de inseto O simples ato de “levar à boca” o alimento
constitui dano moral in re ipsa. Neste caso, a industrializado com corpo estranho gera dano moral
indenização foi de R$ 12 mil. in re ipsa, independentemente de sua ingestão.
STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 1299401/SP, Rel. STJ. 3ª Turma. REsp 1644405/RS, Rel. Min. Nancy
Min. Raul Araújo, julgado em 12/02/2019. Andrighi, julgado em 09/11/2017.

Obs: apesar da divisão do tema nas Turmas do STJ, arriscaria dizer que a segunda corrente é majoritária.
Assim, a simples comercialização de alimento industrializado contendo corpo estranho é suficiente para
configuração do dano moral.

SERVIÇOS BANCÁRIOS
Consumidor comprou um produto pela internet e que nunca foi entregue;
o banco não pode ser responsabilizado solidariamente pelo simples fato de
o pagamento ter sido feito mediante boleto bancário

Banco não é responsável por fraude em compra on-line paga via boleto quando não se verificar
qualquer falha na prestação do serviço bancário.
Caso concreto: o consumidor comprou, pela internet, um produto de uma loja virtual. Ocorre
que a loja não entregou a mercadoria. O consumidor pretendia a responsabilidade solidária
do banco pelos danos sofridos em razão de o pagamento ter sido realizado por boleto
bancário. O STJ não concordou.
O banco não pode ser considerado um fornecedor da relação de consumo que causou prejuízos
ao consumidor, pois não se verifica qualquer falha na prestação de seu serviço bancário
apenas por ter emitido o boleto utilizado para pagamento.
Não pertencendo à cadeia de fornecimento em questão, não há como responsabilizar o banco
pelos produtos não recebidos. Ademais, também não se pode considerar esse suposto
estelionato como uma falha no dever de segurança dos serviços bancários.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.786.157-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/09/2019 (Info 656).

Imagine a seguinte situação hipotética:


João queria comprar um celular e procurou os preços pela internet.

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 13


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O celular mais barato que encontrou foi na loja virtual “Celulares.net”.


Ele decidiu comprar e escolheu, como forma de pagamento, o boleto bancário.
Depois de imprimir, João pagou o boleto bancário, que era emitido pelo Banco Bradesco.
Passados meses da compra, João nunca recebeu o aparelho comprado.
Diante disso, ele ajuizou ação de indenização por danos morais e materiais contra o Banco Bradesco
alegando ter sido vítima de fraude em virtude da realização de compras em loja virtual sem a devida
entrega do produto adquirido.
João alegou, na ação, que a instituição financeira possui responsabilidade objetiva e solidária junto com a
“Celulares.net”, uma vez que falhou em sua prestação de serviços ao não realizar a devida conferência e
aceitar que uma empresa fraudulenta abrisse conta bancária e emitisse boletos de pagamento.

O pedido de João foi acolhido pelo STJ? A instituição bancária tem responsabilidade neste caso?
NÃO.

Responsabilidade objetiva dos bancos


Inicialmente, devemos relembrar que o Código de Defesa do Consumidor se aplica para os serviços bancários:
Súmula 297-STJ: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

Os serviços desempenhados pelos bancos, por suas características de disponibilidade de recursos


financeiros e sua movimentação sucessiva, têm maior risco em comparação com outras atividades
econômicas. Justamente por isso, a jurisprudência, em regra, impõe maiores exigências para as
instituições financeiras.
Deve-se recordar, nesse sentido, a Súmula 479 do STJ:
Súmula 479-STJ: As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito
interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.

Assim, as instituições financeiras são consideradas objetivamente responsáveis por danos decorrentes de
sua atividade bancária. Por atividade bancária, devemos entender o conjunto de práticas, atos ou
contratos executados por instituições bancárias.
Em complementação, a doutrina define como instituição bancária “a empresa que, com fundos próprios
ou de terceiros, faz da negociação de créditos sua atividade principal, de onde se dessume competir-lhe,
dentro de suas prerrogativas profissionais, também o exercício das acessórias, que, não se contendo
dentro das creditícias, atendem à finalidade de atrair o cliente para elas.” (ABRÃO, Nelson. Direito
bancário. São Paulo: Saraiva, 15ª ed., 2014).

Banco não pode ser considerado fornecedor neste caso


No caso concreto, o consumidor foi vítima de suposto estelionato, pois adquiriu um bem de consumo que
nunca recebeu. Vale ressaltar, contudo, que o meio de pagamento escolhido não foi decisivo para ele não
receber o bem. Em outras palavras, o consumidor também não iria receber o bem se tivesse pagado com
cartão de crédito ou transferência bancária.
Assim, o banco não pode ser considerado um “fornecedor” da relação de consumo que causou prejuízos
ao consumidor, pois não se verifica qualquer falha na prestação de seu serviço bancário.
É certo que são múltiplas e variadas as formas e arranjos econômicos para a viabilização e promoção do
consumo. Isto é, bancos podem se associar a redes varejistas ou estas podem constituir seus próprios
bancos para facilitar a venda de seus produtos e serviços.
No caso concreto, contudo, não há como considerar o banco como pertencente à cadeia de fornecimento
do produto que nunca foi entregue apenas por ter emitido o boleto utilizado para pagamento.

Não se pode considerar que houve falha do banco


Não se pode considerar esse suposto estelionato como uma falha no dever de segurança dos serviços
bancários.

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 14


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Se fôssemos considerar como falha, teríamos que dizer que todos os bancos operando no território
nacional, incluindo operadoras de cartão de crédito, seriam solidariamente responsáveis pelos vícios,
falhas e acidentes de produtos e serviços que forem adquiridos, utilizando-se um meio de pagamento
disponibilizado por essas empresas, o que, definitivamente, não encontra guarida na legislação de defesa
do consumidor.

Em suma:
Banco não é responsável por fraude em compra on-line paga via boleto quando não se verificar qualquer
falha na prestação do serviço bancário.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.786.157-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/09/2019 (Info 656).

PLANO DE SAÚDE
Ex-empregado (demitido ou aposentado) pode ter direito de continuar no plano de saúde
coletivo que era oferecido aos funcionários; contudo, se a empresa e a operadora rescindirem o
contrato para todos, esse ex-empregado também não terá mais direito de continuar

Inviável a manutenção do ex-empregado como beneficiário do plano de saúde coletivo após a


rescisão contratual da pessoa jurídica estipulante com a operadora do plano.
Ex: João era funcionário da empresa que oferecia plano de saúde coletivo; foi demitido sem
justa causa; ele tem direito de continuar no plano, cumpridas as exigências do art. 30 da Lei nº
9.656/98; ocorre que, se, posteriormente, a empresa cancelar o plano para seus funcionários,
esse ex-empregado também perderá o direito de continuar.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.736.898-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 17/09/2019 (Info 656).

Imagine a seguinte situação hipotética:


João era empregado de um banco há mais de 10 anos e possuía plano de saúde (Unimed) oferecido aos
funcionários da instituição.
O custeio do plano era mantido da seguinte forma: o empregador arcava todos os meses com R$ 100,00
e o empregado pagava outros R$ 100,00.
João se aposentou e deseja continuar no plano de saúde com as mesmas condições de cobertura
assistencial que gozava. Para tanto, ele se compromete a pagar mensalmente R$ 200,00 (sua parte e a do
antigo empregador). Em tese, ele possui esse direito?
SIM. Em tese, isso é possível, conforme prevê o art. 31 da Lei nº 9.656/98 (que trata sobre os planos de saúde):
Art. 31. Ao aposentado que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º
desta Lei, em decorrência de vínculo empregatício, pelo prazo mínimo de dez anos, é assegurado
o direito de manutenção como beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de
que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento
integral.
(...)

Plano de saúde aceitou João


João pediu para continuar no plano, assumindo o pagamento integral, e a Unimed aceitou.
Essa situação durou 1 ano e meio.
Foi aí que João teve uma surpresa desagradável. A Unimed (operadora do plano) e o banco (pessoa jurídica
estipulante do plano empresarial) decidiram rescindir o contrato.
Com isso, acabou o plano empresarial que era oferecido aos funcionários do banco.

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 15


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A Unimed notificou João, informando-o que ele não mais teria direito ao plano, salvo se quisesse fazer um
novo contrato individual, com outras condições.
João não se conformou e ingressou com ação de obrigação de fazer pedindo a manutenção do plano com
as mesmas condições de que gozava antes da sua aposentadoria.

O pedido foi acolhido?


NÃO.
No caso em que a pessoa jurídica estipulante rescinde o contrato com a operadora, a Agência Nacional de
Saúde Suplementar (ANS) estabelece que se extingue o direito assegurado nos arts. 30 e 31, da Lei nº
9.656/98. É o que prevê o art. 26, III, da RN 279/11, da ANS:
Art. 26. O direito assegurado nos artigos 30 e 31 da Lei nº 9.656, de 1998, se extingue na
ocorrência de qualquer das hipóteses abaixo:
(...)
III – pelo cancelamento do plano privado de assistência à saúde pelo empregador que concede
este benefício a seus empregados ativos e ex-empregados.

A única “garantia” que João terá será a de poder contratar um plano individual ou familiar com a
operadora sem precisar cumprir carência, nos termos da Resolução 19/99 do Conselho de Saúde
Suplementar.

Em suma:
Inviável a manutenção do ex-empregado como beneficiário do plano de saúde coletivo após a rescisão
contratual da pessoa jurídica estipulante com a operadora do plano.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.736.898-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 17/09/2019 (Info 656).

DIREITO EMPRESARIAL

FUNDO DE INVESTIMENTO
O administrador de um Fundo encerrado possui legitimidade para ser réu em ação de reparação
de danos proposta por credor do Fundo que alega que a liquidação não foi correta considerando
que, antes de haver a partilha do saldo entre os cotistas, deveria lhe ter sido paga uma dívida

O administrador do fundo de investimento é parte legítima para figurar no polo passivo de


demanda em que se pretende a reparação de supostos danos resultantes de inadequada
liquidação.
DPC Fund era um Fundo de Investimento em Participações, sendo administrado pelo Banco X.
Decidiu-se fazer o encerramento do fundo. No procedimento de liquidação, o administrador
calculou o ativo do fundo, fez o pagamento do passivo e o saldo foi dividido entre os cotistas.
A empresa THA era uma das credoras do Fundo e afirmou que a liquidação não foi correta,
considerando que o Fundo não cumpriu com algumas obrigações assumidas perante ela.
Diante disso, a THA ajuizou ação de reparação de danos contra o Banco, administrador do
Fundo. Segundo a teoria da asserção, isto é, à luz das afirmações deduzidas na petição inicial,
o administrador do Fundo possui legitimidade passiva para a demanda.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.834.003-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 17/09/2019 (Info 656).

Imagine a seguinte situação hipotética:


“DPC Fund” era um Fundo de Investimento em Participações.

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O “DPC Fund” era administrado pelo Banco “X”.


Decidiu-se fazer o encerramento do fundo.
No procedimento de liquidação, o administrador calculou o ativo do fundo, fez o pagamento do passivo e
o saldo (positivo) foi dividido entre os cotistas.
A empresa THA era uma das credores do Fundo e afirmou que a liquidação não foi correta, considerando
que o Fundo não cumpriu com algumas obrigações assumidas perante ela.
Diante disso, a THA ajuizou ação de reparação de danos contra o Banco, administrador do Fundo.
O Banco suscitou a sua ilegitimidade passiva afirmando que o Fundo possui existência própria e que ele
(Banco) agiu conforme as determinações do Fundo e que só teria responsabilidade se tivesse praticado
algum ato fora dos poderes que lhe foram conferidos.

O administrador do Fundo possui ou não legitimidade passiva, neste caso?


Sim. Possui.
O administrador do fundo de investimento é parte legítima para figurar no polo passivo de demanda
em que se pretende a reparação de supostos danos resultantes de inadequada liquidação.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.834.003-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 17/09/2019 (Info 656).

As condições da ação, aí incluída a legitimidade, devem ser aferidas com base na teoria da asserção, isto
é, à luz das afirmações deduzidas na petição inicial.
No caso concreto, o administrador do Fundo foi demandado pelo fato de ter realizado a liquidação do
fundo de investimento, mediante distribuição do patrimônio líquido entre os cotistas, sem o prévio
pagamento de um suposto passivo.
No entanto, a Instrução CVM n. 391/2003, que primeiro tratou especificamente dos Fundos de
Investimento em Participações (FIPs), já incluía entre as obrigações do administrador o dever de “cumprir
e fazer cumprir todas as disposições do regulamento do fundo” (art. 14, XV).
Desse modo, a satisfação integral do passivo antes da partilha do patrimônio líquido entre os cotistas está,
em regra, inserida entre as atribuições do administrador, sendo dele a responsabilidade, em tese, por
eventuais prejuízos que guardem nexo de causalidade com a sua inobservância.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

COMPETÊNCIA
Compete à 1ª Seção do STJ (que aprecia matérias de direito público) julgar recurso no qual se
discute a contratação ou não de aprovado em processo seletivo realizado por entidade do
Sistema S (no caso, o SEBRAE)

Compete à Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça processar e julgar feitos relativos à
contratação de candidatos inscritos em processo seletivo público para preenchimento de
cargos em entidades do Sistema S.
O dirigente de entidade do Sistema S, como o Sebrae, ao praticar atos em certame público para
ingresso de empregados, está a desempenhar ato típico de direito público, vinculando-se ao
regime jurídico administrativo.
STJ. Corte Especial. CC 157.870-DF, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 21/08/2019 (Info 656).

Imagine a seguinte situação hipotética:


O SEBRAE/RJ realizou processo seletivo público para contratar funcionários.

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 17


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João, Pedro e Tiago foram aprovados, mas não foram chamados.


Diante disso, ingressaram com mandado de segurança contra o SEBRAE pedindo o reconhecimento de que
teriam direito de serem contratados.
O juiz determinou que o SEBRAE contratasse os aprovados e o Tribunal de Justiça manteve a sentença.
O SEBRAE interpôs, então, recurso especial contra o acórdão.

Conflito interno de competência no STJ


Chegando ao STJ, este recurso especial foi distribuído para a 1ª Turma do STJ (que faz parte a 1ª Seção do
STJ). A 1ª Seção do STJ julga causas envolvendo Direito Público.
Ocorre que a 1ª Turma declinou da competência para uma das Turmas da 2ª Seção (especializada em
Direito Privado) ao argumento de que a questão se refere à contratação de pessoal por pessoa jurídica de
direito privado.
A 3ª Turma do STJ (Turma que compõe a 2ª Seção) não concordou com a declinação e suscitou conflito de
competência.

Quem julga esse conflito de competência?


A Corte Especial do STJ.
Segundo o Regimento Interno do STJ:
Art. 11. Compete à Corte Especial processar e julgar:
(...)
XII - os conflitos de competência entre relatores ou Turmas integrantes de Seções diversas, ou
entre estas;

Órgãos do STJ
O STJ é dividido em órgãos julgadores internos da seguinte forma:
CORTE ESPECIAL SEÇÕES TURMAS
Composta pelos 15 Ministros mais Existem três Seções no STJ Existem seis Turmas no STJ (da
antigos do STJ. (Primeira, Segunda e Terceira). Primeira até a Sexta).
Cada Seção abrange duas Turmas. Cada Turma é composta por 5
1ª Seção: engloba a 1ª e 2ª Turmas. Ministros, sendo divididas por
2ª Seção: abrange a 3ª e 4ª Turmas. assunto (cada Turma é
3ª Seção: inclui a 5ª e 6ª Turmas. especializada em certos temas).
Suas competências estão previstas Suas competências estão previstas Suas competências estão previstas
no art. 11 do RISTJ. no art. 12 do RISTJ. no art. 13 do RISTJ.
Principais competências: Principais competências: As Turmas julgam todos os
• julgar as ações penais de • mandado de segurança contra ato processos do STJ que não se
competência originária do STJ (ex: de Ministro de Estado; enquadram nas competências das
Governadores, Desembargadores, • Conflitos de competência que são Seções e da Corte Especial.
Conselheiros do TCE etc.); de atribuição do STJ (ex: conflito de Assim, por exemplo, em regra,
• embargos de divergência se a competência entre juiz de direito e todos os recursos especiais que não
divergência for entre Turmas de juiz federal); sejam “repetitivos” são julgados
Seções diversas, entre Seções, entre • recursos especiais repetitivos que pelas Turmas.
Turma e Seção que não integre ou envolvam os assuntos das Turmas Da mesma forma, a maioria dos
entre Turma e Seção com a própria que compõe aquela Seção. habeas corpus são apreciados pelas
Corte Especial. Turmas.

COMPETÊNCIAS MATERIAIS DAS TURMAS (E DAS SEÇÕES)


Primeira e Segunda Terceira e Quarta Quinta e Sexta
(Primeira Seção) (Segunda Seção) (Terceira Seção)

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 18


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• Licitações e contratos • domínio, posse e direitos reais À Terceira Seção cabe processar e
administrativos; sobre coisa alheia, salvo quando se julgar os feitos relativos à matéria
• nulidade ou anulabilidade de atos tratar de desapropriação; penal em geral, salvo os casos de
administrativos; • obrigações em geral de direito competência originária da Corte
• ensino superior; privado, mesmo quando o Estado Especial e os habeas corpus de
• inscrição e exercício profissionais; participar do contrato; competência das Turmas que
• direito sindical; • responsabilidade civil (sem ser do compõem a Primeira e a Segunda
• nacionalidade; Estado); Seção.
• desapropriação; • direito de família e sucessões; Assim, ficam responsáveis por julgar
• responsabilidade civil do Estado; • direito do trabalho; os processos criminais.
• tributos de modo geral; • propriedade industrial;
• preços públicos e multas de • sociedades;
qualquer natureza; • comércio em geral, instituições
• servidores públicos civis e financeiras e mercado de capitais;
militares; • falências;
• habeas corpus referentes às • títulos de crédito;
matérias de sua competência; • registros públicos, mesmo quando
• benefícios previdenciários; o Estado participar da demanda;
• direito público em geral. • locação predial urbana;
• habeas corpus referentes às
matérias de sua competência;
• direito privado em geral.

Voltando ao caso concreto. O que decidiu a Corte Especial a respeito deste conflito? De quem é a
competência para julgar este recurso especial?
Da 1ª Turma (1ª Seção).
Compete à Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça processar e julgar feitos relativos à
contratação de candidatos inscritos em processo seletivo público para preenchimento de cargos em
entidades do Sistema S.
STJ. Corte Especial. CC 157.870-DF, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 21/08/2019 (Info 656).

Analisando a jurisprudência do STJ, no tocante à matéria relativa a concurso público/processo seletivo,


principalmente lides formadas a partir de ação mandamental, constata-se que a competência está inserida
no âmbito do Direito Público, ainda que envolvam entidades de direito privado.
Assim, o dirigente de entidade do Sistema S, como o Sebrae, ao praticar atos em certame público, para
ingresso de empregados, está a desempenhar ato típico de direito público, vinculando-se ao regime
jurídico administrativo. Em razão disso, deve observar os princípios que vinculam toda a Administração,
como a supremacia do interesse público, legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência
e todos os demais. Portanto, tais atos são revestidos de caráter público, não podendo ser classificados
como “de mera gestão”, configurando, verdadeiramente, atos de autoridade.
Dessa feita, compete à Primeira Seção do STJ processar e julgar feitos relativos à contratação de candidatos
inscritos em processo seletivo público para preenchimento de cargos em entidades do Sistema S.

AÇÃO RESCISÓRIA
Juiz que não declara, de ofício, prescrição na ação de cobrança não viola literal disposição de lei
para fins de ação rescisória, com base no art. 485, V, CPC/1973

O fato de o magistrado não reconhecer, de ofício, a prescrição não redunda na ofensa à


literalidade do § 5º do art. 219 do CPC/1973, a subsidiar ação rescisória, com fulcro no art.
485, V, CPC/1973 (art. 966, V, CPC/2015).
STJ. 3ª Turma. REsp 1.749.812-PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 17/09/2019 (Info 656).

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 19


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Imagine a seguinte situação hipotética:


João ajuizou ação de cobrança contra Pedro.
O réu foi revel.
O autor demonstrou a inadimplência por meio de documentos e o juiz julgou o pedido procedente,
condenando Pedro a pagar a dívida.
Houve o trânsito em julgado.

Ação rescisória
Alguns meses depois, Pedro ajuizou ação rescisória alegando que quando João propôs a ação de cobrança
contra ele, a pretensão já estava prescrita, considerando que já haviam-se passado mais de 3 anos, nos
termos do art. 206, § 3º, V, do Código Civil:
Art. 206 (...)
§ 3º Em três anos:
(...)
V - a pretensão de reparação civil;

Argumentou que, independentemente da revelia havida nos autos originais, o art. 219, § 5º, do CPC/1973
determinava que o juiz deveria pronunciar, de ofício, a prescrição, já que se tratava de matéria de ordem
pública:
Art. 219. (...)
§ 5º O juiz pronunciará, de ofício, a prescrição.

Como o magistrado não agiu dessa forma, houve violação literal do referido dispositivo legal.
Logo, caberia ação rescisória, com fundamento no art. 485, V, CPC/1973 (art. 966, V, CPC/2015):

CPC/1973 CPC/2015
Art. 485. A sentença de mérito, transitada em Art. 966. A decisão de mérito, transitada em
julgado, pode ser rescindida quando: julgado, pode ser rescindida quando:
(...) (...)
V - violar literal disposição de lei; V - violar manifestamente norma jurídica;

A tese defendida na ação rescisória foi acolhida pelo STJ?


NÃO.
O fato de o magistrado não reconhecer, de ofício, a prescrição não redunda na ofensa à literalidade do
§ 5º do art. 219 do CPC/1973, a subsidiar ação rescisória, com fulcro no art. 485, V, CPC/1973 (art. 966,
V, CPC/2015).
STJ. 3ª Turma. REsp 1.749.812-PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 17/09/2019 (Info 656).

Art. 219, § 5º do CPC/1973 não trazia um dever do magistrado


A prescrição, compreendida como a perda da pretensão de exigir de alguém a realização de uma
prestação, em virtude da fluência de prazo fixado em lei, está relacionada com interesses exclusivamente
das partes envolvidas. Isso porque a prescrição refere-se a direitos subjetivos patrimoniais e relativos, na
medida em que a correlata ação condenatória tem por finalidade obter, por meio da realização de uma
prestação do demandado, a reparação dos prejuízos suportados em razão da violação do direito do autor.
Não é por outra razão, aliás, que a prescrição, desde que consumada, comporta, à parte que a favoreça,
sua renúncia, expressa ou tácita (ao contrário do que se dá com a decadência que, diretamente, guarda
em si, um interesse público).

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 20


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Assim, a possibilidade que havia no CPC/1973 de o juiz reconhecer de ofício a prescrição tinha por objetivo
dar mais celeridade, efetividade e economia processual. A despeito disso, o fato de o magistrado não
reconhecer, de ofício, a prescrição não pode ser tido como ofensa à literalidade do § 5º do art. 219 do
CPC/1973, a subsidiar ação rescisória, com fulcro no art. 485, V, CPC/1973 (art. 966, V, CPC/2015). Isso
porque o art. 219, § 5º do CPC/1973, que autorizava o juiz a pronunciar, de ofício, a prescrição, não
representava um dever do magistrado. Tratava-se de uma possibilidade ligada, como já dito, à celeridade
processual.

Para que houvesse violação literal de lei era necessário que o juiz deliberasse sobre o tema
A violação literal de lei, como fundamento da ação rescisória, pressupõe que o órgão julgador delibere
sobre a questão posta, conferindo indevida aplicação a determinado dispositivo legal ou deixando de
aplicar preceito legal que, supostamente, segundo a compreensão do autor da rescisória, melhor resolva
a matéria.
Em uma ou outra situação, é indispensável que a questão aduzida na ação rescisória tenha sido objeto de
deliberação na ação rescindenda, o que não se confunde com exigência de prequestionamento do
dispositivo legal apontado.
No caso concreto, a questão relacionada à prescrição, embora fosse possível, não foi tratada, de ofício,
pelo juiz, tampouco foi suscitada por qualquer das partes, não tendo havido, assim, nenhuma deliberação
sobre a matéria na ação original.
Não cabe o manejo de ação rescisória, sob a tese de violação literal de lei, se a questão a qual o preceito
legal apontado na ação rescisória deveria supostamente regular não foi objeto de nenhuma deliberação
na ação originária.

O CPC/2015 permite o reconhecimento de ofício da prescrição?


SIM, conforme previsão do art. 487, II. No entanto, exige que esse tema seja submetido a contraditório,
nos termos do art. 10:
Art. 487. Haverá resolução de mérito quando o juiz:
(...)
II - decidir, de ofício ou a requerimento, sobre a ocorrência de decadência ou prescrição;

Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito
do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria
sobre a qual deva decidir de ofício.

AGRAVO DE INSTRUMENTO
A parte pede que o juiz suspenda o processo alegando prejudicialidade externa (art. 313, V, “a”,
CPC/2015); magistrado indefere; esse pronunciamento não pode ser equiparado a uma decisão
sobre tutela provisória; logo, não cabe agravo de instrumento contra ele com base no inciso I do
art. 1.015 do CPC/2015

A decisão interlocutória que indefere o pedido de suspensão do processo em razão de questão


prejudicial externa não equivale à tutela provisória de urgência de natureza cautelar e, assim,
não é recorrível por agravo de instrumento.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.759.015-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 17/09/2019 (Info 656).

Imagine a seguinte situação hipotética:


A empresa “A1” ingressou com execução de título extrajudicial contra a empresa “B2”.

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 21


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O título executado foi um contrato celebrado entre “A1” e “B2”.


Foi, então, que a empresa “B2” ajuizou ação de rescisão do contrato.
Além disso, a empresa “B2” formulou pedido ao juiz para suspender o processo de execução enquanto se
discute, na outra ação, a rescisão do negócio jurídico.
O pedido foi baseado no art. 313, V, “a”, do CPC/2015:
Art. 313. Suspende-se o processo:
(...)
V - quando a sentença de mérito:
a) depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de
relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente;

A empresa “B2” argumentou que está configurada a chamada “prejudicialidade externa” entre as ações.
Isso porque a existência da ação de rescisão é uma questão prejudicial (externa), cuja solução irá interferir
no resultado da execução.

Magistrado indefere o pedido e a parte interpõe agravo de instrumento


O juiz indeferiu o pedido de suspensão do processo de execução.
A empresa “B2” interpôs, então, agravo de instrumento contra esta decisão interlocutória afirmando que
a hipótese se amolda ao art. 1.015, I, do CPC/2015:
Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:
I - tutelas provisórias;

A tutela provisória é o gênero do qual decorrem duas espécies:


1) Tutela provisória de urgência;
2) Tutela provisória de evidência.

Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência.

A tutela provisória de urgência divide-se em:


1.1) Tutela cautelar
1.2) tutela antecipada (satisfativa)

Art. 294 (...)


Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em
caráter antecedente ou incidental.

O pedido do recorrente foi aceito pelo STJ? Cabe agravo de instrumento neste caso? Pode-se dizer que
decisão que indefere o pedido de suspensão do processo é uma decisão que versa sobre tutela provisória
de urgência de natureza cautelar?
NÃO.
A decisão interlocutória que indefere o pedido de suspensão do processo em razão de questão prejudicial
externa não equivale à tutela provisória de urgência de natureza cautelar e, assim, não é imediatamente
recorrível por agravo de instrumento com fundamento no art. 1.015, I, do CPC/2015.

Conceito de decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória é amplo, mas não abrange pedidos
de suspensão do processo por prejudicialidade externa
Embora o conceito de “decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória” (art. 1.015, I) seja bastante
amplo e abrangente, ele não inclui a decisão que resolve se suspende ou não o processo por conta de uma
questão prejudicial externa. Isso não é tutela provisória. São institutos jurídicos ontologicamente distintos.

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 22


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Suspensão de processo por prejudicialidade externa não envolve urgência


No caso concreto, estava sendo debatida a possibilidade de ser suspensa a execução de título extrajudicial
em virtude de alegada prejudicialidade externa gerada por ação de rescisão contratual.
A executada (autora da ação de rescisão) afirma que se a rescisão for julgada procedente, o título
executivo pode deixar de existir, razão pela qual a execução depende do resultado da ação de
conhecimento.
Embora exista, evidentemente, uma natural relação de prejudicialidade entre a ação de conhecimento em
que se impugna a existência do título e a ação executiva fundada nesse mesmo título, é preciso esclarecer
que a suspensão do processo executivo em virtude dessa prejudicialidade externa não está fundada em
urgência, nem tampouco a decisão que versa sobre a suspensão do processo versa sobre tutela de
urgência.
Com efeito, o valor que se pretende tutelar quando se admite suspender um processo ao aguardo de
resolução de mérito a ser examinada em outro processo é a segurança jurídica.
No ponto, ensinam Fernando da Fonseca Gajardoni, Luiz Dellore, André Vasconcelos Roque e Zulmar
Duarte de Oliveira Jr.:
9.6. O grande objetivo da suspensão pela prejudicialidade externa, como se pode vislumbrar, é
evitar que haja a prolação de decisões confliantes, especialmente porque, para decidir a questão
principal, o juiz terá de enfrentar a questão prejudicial – que é objeto de discussão em outro
processo, por outro juiz. (GAJARDONI, Fernando da Fonseca; DELLORE, Luiz; ROQUE, André
Vasconcelos; OLIVEIRA JR., Zulmar. Teoria geral do processo: comentários ao CPC de 2015. São
Paulo: Forense, 2015. p. 937).

Suspensão por prejudicialidade envolve segurança jurídica e não é obrigatória


Como vimos acima, a suspensão do processo pode ser decretada em nome da segurança jurídica (para
evitar a prolação de decisões conflitantes). Ocorre que não é uma medida obrigatória, até porque ela
subverte a lógica do sistema e mitiga a incidência dos princípios constitucionais da celeridade e da razoável
duração do processo.
Desse modo, a suspensão processual por prejudicialidade externa, além de excepcional, é regra não
cogente. A esse respeito, ensina José Roberto dos Santos Bedaque:
“Não se trata de regra cogente, pois, ainda que admissível, pode não ser conveniente a suspensão,
especialmente se o processo em que se discute a questão prejudicial esteja ainda em fase inicial
e o outro pronto para julgamento. Cabe ao juiz avaliar as circunstâncias e escolher pela solução
mais adequada ao caso concreto, fundamentando-a. Às vezes é preferível optar pela celeridade,
mesmo havendo risco de contradição entre julgados.” (BEDAQUE, José Roberto dos Santos.
Comentários ao Novo Código de Processo Civil (Coords: Antonio do Passo Cabral e Ronaldo
Cramer). Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 496).

Desse modo, a decisão interlocutória que versa sobre suspensão do processo por prejudicialidade externa,
fundada em segurança jurídica, em nada se relaciona com a decisão interlocutória que versa sobre tutela
provisória, fundada em urgência ou evidência, não sendo o mero risco de prolação de decisões conflitantes
ou a hipotética e superveniente perda de objeto elementos hábeis a comprometer o resultado útil do
processo.

Executado poderá demonstrar a presença dos requisitos processuais para a suspensão dos efeitos do
título
Vimos acima que o executado não tem o direito subjetivo de conseguir a suspensão por prejudicialidade.
No entanto, o executado tem uma outra providência processual que pode ser manejada. Ele poderá, na
ação de conhecimento por ele ajuizada, demonstrar a presença dos requisitos processuais para a
concessão de tutela provisória que suste a produção de efeitos do título em que se funda a execução.
Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 23
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Veja bem. Nesta segunda hipótese, não se está buscando suspender a execução por prejudicialidade
externa. O que se está pedindo é a suspensão da exigibilidade do título. O autor da ação de rescisão
demonstra que seus argumentos são muito fortes e o juiz decide suspender a exigibilidade do título (não
por prejudicialidade externa), mas sim porque foi demonstrada a probabilidade do direito.
Neste segundo caso (pedido para suspender a exigibilidade do título), caso o juiz negue ou defira o pleito,
caberia agravo de instrumento com base no art. 1.015, I, do CPC/2015.

Esclarecimento adicional
O acórdão do STJ não menciona isso. No entanto, particularmente, penso que caberia agravo de
instrumento no caso concreto, com base no parágrafo único do art. 1.015 do CPC/2015:
Art. 1.015 (...)
Parágrafo único. Também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias
proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de
execução e no processo de inventário.

Isso porque o executado pediu ao juiz da execução a suspensão do processo e o magistrado indeferiu o
pleito. Logo, houve a prolação de uma decisão interlocutória no processo de execução, atraindo o
cabimento de agravo de instrumento, não com base no inciso I do art. 1.015, mas sim com fundamento
no parágrafo único.
O STJ não tratou sobre o tema porque o recorrente alegava violação do inciso I do art. 1.015, de forma
que não poderia o Tribunal “salvar” o cabimento do recurso, enquadrando-o em outro dispositivo legal.
Este último ponto, contudo, é apenas uma observação pessoal e que não constou no voto.

EMBARGOS À EXECUÇÃO
A protocolização dos embargos à execução nos autos
da própria ação executiva constitui vício sanável

Os embargos à execução deverão ser propostos nos próprios autos da execução ou em autos
apartados? Em autos apartados. É o que diz expressamente o § 1º do art. 914 do CPC/2015:
Art. 914 (...) § 1º Os embargos à execução serão distribuídos por dependência, autuados em
apartado e instruídos com cópias das peças processuais relevantes, que poderão ser
declaradas autênticas pelo próprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal.
Se o embargante (executado) apresenta, de forma incorreta, os embargos à execução nos
próprios autos da execução, o juiz não deverá rejeitar liminarmente esses embargos.
O magistrado deverá conceder prazo para que a parte faça o desentranhamento dos embargos
e promova a sua distribuição em autos apartados, por dependência. Isso porque a propositura
dos embargos à execução nos próprios autos da execução configura vício sanável, que pode
ser, portanto, corrigido.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.807.228-RO, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/09/2019 (Info 656).

Processo de execução
O procedimento para execução de quantia pode ser realizado de duas formas:
a) execução de quantia fundada em título executivo judicial (chamada de “cumprimento de sentença”).
b) execução de quantia fundada em título executivo extrajudicial;

Defesas típicas do executado


Se o devedor está sendo executado, ele tem o direito de se defender. Qual é a defesa típica do devedor
executado?
Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 24
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• No cumprimento de sentença (execução de título judicial): é a IMPUGNAÇÃO (art. 525 do CPC/2015).


• No processo de execução (execução de título extrajudicial): a defesa típica do executado são os
EMBARGOS À EXECUÇÃO (art. 914 do CPC/2015).

Vale ressaltar que a pessoa executada poderá se defender ainda por meio de:
• exceção de não-executividade (exceção de pré-executividade / objeção de pré-executividade); ou
• ações autônomas (a chamada defesa heterotópica do executado).

Procedimento dos embargos à execução


1) O executado, para se defender, apresenta os embargos à execução.
Os embargos à execução possuem natureza jurídica de ação autônoma.

2) O executado pode apresentar embargos à execução mesmo que não tenha havido penhora, depósito
ou caução. Em outras palavras, não é necessária a garantia do juízo.

3) Os embargos à execução serão distribuídos por dependência, autuados em apartado e instruídos com
cópias das peças processuais relevantes, que poderão ser declaradas autênticas pelo advogado, sob sua
responsabilidade pessoal.

4) O prazo que o executado possui para oferecer os embargos é de 15 dias.

5) Nos embargos à execução, o executado poderá alegar:


I - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação;
II - penhora incorreta ou avaliação errônea;
III - excesso de execução ou cumulação indevida de execuções;
IV - retenção por benfeitorias necessárias ou úteis, nos casos de execução para entrega de coisa certa;
V - incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução;
VI - qualquer matéria que lhe seria lícito deduzir como defesa em processo de conhecimento.

6) O juiz rejeitará liminarmente os embargos:


I - quando intempestivos;
II - nos casos de indeferimento da petição inicial e de improcedência liminar do pedido;
III - manifestamente protelatórios.
Obs: considera-se conduta atentatória à dignidade da justiça o oferecimento de embargos
manifestamente protelatórios.

7) Em regra, os embargos à execução não possuem efeito suspensivo.


- O juiz poderá, a requerimento do embargante, atribuir efeito suspensivo aos embargos quando
verificados os requisitos para a concessão da tutela provisória e desde que a execução já esteja garantida
por penhora, depósito ou caução suficientes. Assim, para que haja efeito suspensivo, é necessária a
garantia do juízo.
- Cessando as circunstâncias que a motivaram, a decisão relativa aos efeitos dos embargos poderá, a
requerimento da parte, ser modificada ou revogada a qualquer tempo, em decisão fundamentada.
- Quando o efeito suspensivo atribuído aos embargos disser respeito apenas a parte do objeto da
execução, esta prosseguirá quanto à parte restante.
- A concessão de efeito suspensivo aos embargos oferecidos por um dos executados não suspenderá a
execução contra os que não embargaram quando o respectivo fundamento disser respeito exclusivamente
ao embargante.
- A concessão de efeito suspensivo não impedirá a efetivação dos atos de substituição, de reforço ou de
redução da penhora e de avaliação dos bens.

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 25


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8) Se o juiz receber os embargos, em seguida ele deverá intimar o exequente para se manifestar no prazo
de 15 dias.

O embargado/exequente poderá oferecer reconvenção?


NÃO. É incabível o oferecimento de reconvenção em embargos à execução.
STJ. 2ª Turma. REsp 1528049/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 18/08/2015

9) A depender dos argumentos invocados pelo embargante, pode ser necessária ou não a realização de
audiência de instrução:
- Se for necessária a audiência, o juiz designa e, só após a sua realização, profere a sentença;
- Se não for necessária a audiência, o juiz julgará imediatamente o pedido.

10) Os embargos à execução são decididos por meio de SENTENÇA e o recurso cabível contra esse
julgamento é a APELAÇÃO.

Feita esta breve revisão, indaga-se: os embargos à execução deverão ser propostos nos próprios autos
da execução ou em autos apartados?
Em autos apartados. É o que diz expressamente o § 1º do art. 914 do CPC/2015:
Art. 914 (...)
§ 1º Os embargos à execução serão distribuídos por dependência, autuados em apartado e
instruídos com cópias das peças processuais relevantes, que poderão ser declaradas autênticas
pelo próprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal.

Se o embargante (executado) apresenta, de forma incorreta, os embargos à execução nos próprios autos
da execução, o juiz deverá rejeitar liminarmente esses embargos?
NÃO.

O que o juiz deverá fazer?


Deverá conceder prazo para que a parte faça o desentranhamento dos embargos e promova a sua
distribuição em autos apartados, por dependência, conforme determina o art. 914, § 1º do CPC/2015.
Isso porque a propositura dos embargos à execução nos próprios autos da execução configura vício
sanável, que pode ser, portanto, corrigido.
A protocolização dos embargos à execução nos autos da própria ação executiva constitui vício sanável.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.807.228-RO, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/09/2019 (Info 656).

Não se mostra razoável deixar de apreciar os argumentos apresentados nos embargos à execução pelo
simples fato de eles terem sido opostos, de forma errônea, nos autos da própria ação de execução.
Sendo cometido esse erro, o juiz deverá conceder à parte prazo para sanar o vício, adequando o
procedimento à forma prescrita no art. 914, § 1º, do CPC/2015.
O art. 277 do CPC/2015 preceitua que, quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará
válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade.
A propositura equivocada dos embargos deve ser analisada à luz dos princípios da instrumentalidade das
formas e da economia processual, de modo que a sua rejeição liminar configuraria excesso de formalismo.
Assim, deve-se conceder prazo para que a parte promova o desentranhamento, distribuição por
dependência e autuação em apartado dos embargos à execução opostos, em conformidade com as
exigências legais quanto à forma de processamento.

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 26


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ARREMATAÇÃO
O arrematante do bem é o responsável pelo pagamento da comissão do leiloeiro, não podendo
essa obrigação ser imputada àquele que ofertou a segunda melhor proposta, porque o vencedor
desistiu da arrematação

O arrematante do bem é o responsável pelo pagamento da comissão do leiloeiro, não podendo


essa obrigação ser imputada àquele que ofertou a segunda melhor proposta, porque o
vencedor desistiu da arrematação.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.826.273-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 10/09/2019 (Info 656).

Imagine a seguinte situação hipotética (com diferenças em relação ao caso concreto):


O Banco Safra ajuizou execução de título extrajudicial contra João.
Foi penhorado um imóvel do devedor e levado a leilão.
No leilão, apareceram dois interessados que ofereceram lances: Pedro (maior lance), Hugo (segunda
melhor proposta).
Ocorre que Pedro desistiu da arrematação.
Diante disso, o leiloeiro cobrou o pagamento de sua comissão de Hugo, segundo ofertante.
O juiz negou o pleito, afirmando que o leiloeiro deveria cobrar de Pedro (vencedor que desistiu da
arrematação).
Contra esta decisão interlocutória, o leiloeiro interpôs agravo de instrumento (art. 1.015, parágrafo único,
do CPC) ao Tribunal de Justiça.
A questão acabou chegando ao STJ por meio de recurso especial.

Quem é o responsável pelo pagamento da comissão do leiloeiro neste caso?


Pedro (o vencedor que desistiu da arrematação).
O arrematante do bem é o responsável pelo pagamento da comissão do leiloeiro, não podendo essa
obrigação ser imputada àquele que ofertou a segunda melhor proposta, porque o vencedor desistiu da
arrematação.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.826.273-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 10/09/2019 (Info 656).

Nos termos do art. 879 do CPC, a alienação do bem penhorado pode ser feita por:
a) iniciativa particular ou
b) em leilão judicial.

No caso concreto, foi realizado o leilão judicial, e nele foram oferecidos dois lances, inaugurando a fase de
licitação entre eles, nos termos do § 2º do art. 892 do CPC:
Art. 892. Salvo pronunciamento judicial em sentido diverso, o pagamento deverá ser realizado de
imediato pelo arrematante, por depósito judicial ou por meio eletrônico.
(...)
§ 2º Se houver mais de um pretendente, proceder-se-á entre eles à licitação, e, no caso de
igualdade de oferta, terá preferência o cônjuge, o companheiro, o descendente ou o ascendente
do executado, nessa ordem.

Desse dispositivo legal pode-se extrair que será considerado arrematante aquele que ofertar o maior lance.
A doutrina de Fredie Didier Jr., Leonardo Carneiro da Cunha, Paula Sarno Braga e Rafael Alexandria de
Oliveira esclarece:
“Não havendo nenhum pretendente com direito de preferência ou se, havendo, esse pretendente
não ofereceu proposta equivalente ao maior preço ofertado, o concurso será resolvido por

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 27


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licitação entre os pretendentes (art. 892, § 2º, CPC): vence quem oferecer o maior valor. No caso
de igualdade de oferta, terá preferência o cônjuge, o companheiro (o que inclui a relação
homoafetiva), o descendente ou o ascendente do executado, nessa ordem.” (Curso de Direito
Processual Civil. Vol. 5, Salvador: JusPodivm: 2019, p. 965)

A desistência de Pedro não torna Hugo, autor da segunda proposta, arrematante de forma automática.
Não há previsão no CPC para a sucessão dos participantes.
Dessa forma, o segundo proponente não pode ser considerado arrematante, seja por não ter ofertado o
maior valor no leilão, seja por ter sido expressamente excluído do certame pelo exequente e pelos
executados, razão pela qual não lhe pode ser imputada a obrigação pelo pagamento da comissão do leiloeiro.

DIREITO PENAL
LEI MARIA DA PENHA
Se a mulher vítima de crime de ação pública condicionada comparece ao cartório da vara e
manifesta interesse em se retratar da representação, ainda assim o juiz deverá designar
audiência para que ela confirme essa intenção e seja ouvido o MP, nos termos do art. 16

Importante!!!
A Lei Maria da Penha autoriza, em seu art. 16, que, se o crime for de ação pública condicionada
(ex: ameaça), a vítima possa se retratar da representação que havia oferecido, desde que faça
isso em audiência especialmente designada, ouvido o MP. Veja:
Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta
Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente
designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.
Não atende ao disposto neste art. 16 a retratação da suposta ofendida ocorrida em cartório de
Vara, sem a designação de audiência específica necessária para a confirmação do ato.
Em outras palavras, se a vítima comparece ao cartório e manifesta interesse em se retratar,
ainda assim o juiz deverá designar a audiência para ouvir a ofendida e o MP, não podendo
rejeitar a denúncia sem cumprir esse procedimento.
STJ. 5ª Turma. HC 138.143-MG, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 03/09/2019 (Info 656).

Imagine a seguinte situação hipotética:


João e Francisca eram casados.
Determinado dia, tiveram uma grave discussão e ele disse que iria matar a mulher.
No mesmo instante, Francisca decidiu que não queria mais viver com ele e, com medo da ameaça,
procurou a Delegacia da Mulher.
O Ministério Público ofereceu denúncia contra João pela prática do crime de ameaça, previsto no art. 147
do Código Penal:
Art. 147. Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de
causar-lhe mal injusto e grave:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
Parágrafo único - Somente se procede mediante representação.

Qual é a natureza da ação penal no caso do crime de ameaça?


Trata-se de crime de ação penal pública condicionada. Assim, a denúncia somente pode ser oferecida se
houver representação da vítima (art. 147, parágrafo único, do CP).

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 28


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A pena do crime de ameaça é de 1 a 6 meses de detenção. Trata-se, portanto, de infração de menor


potencial ofensivo. Por que não foram aplicadas, no exemplo acima, as medidas despenalizadoras da
Lei nº 9.099/95 (suspensão condicional do processo e transação penal)?
A Lei Maria da Penha proíbe expressamente que se aplique a Lei nº 9.099/95 para os crimes praticados
com violência doméstica e familiar contra a mulher. Veja:
Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher,
independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995.

Por essa razão, a suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na hipótese de
delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha. Nesse sentido:
Súmula 536-STJ: A suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na hipótese de
delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha.

Alguns de vocês podem estar se perguntando: “eu já ouvi dizer que a lesão corporal leve é crime de ação
pública condicionada, salvo no caso de violência doméstica”. Isso significa que todo crime praticado
contra a mulher envolvendo violência doméstica será de ação pública incondicionada?
NÃO.
Realmente, a lesão corporal leve cometida em detrimento da mulher, no âmbito doméstico e familiar, é
crime de ação pública incondicionada. Isso porque o art. 88 da Lei nº 9.099/95 não se aplica para os casos
de violência doméstica:
Art. 88. Além das hipóteses do Código Penal e da legislação especial, dependerá de representação
a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas.

Existe até um enunciado do STJ nesse sentido:


Súmula 542-STJ: A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra
a mulher é pública incondicionada.

Por outro lado, é errado dizer que todos os crimes praticados contra a mulher, em sede de violência
doméstica, serão de ação penal incondicionada. Continuam existindo crimes praticados contra a mulher
(em violência doméstica) que são de ação penal condicionada, desde que a exigência de representação
esteja prevista no Código Penal ou em outras leis, que não a Lei nº 9.099/95.
Assim, por exemplo, a ameaça praticada pelo marido contra a mulher continua sendo de ação pública
condicionada porque tal exigência consta do parágrafo único do art. 147 do CP.
O que a Súmula nº 542 do STJ afirma é que o delito de LESÃO CORPORAL praticado com violência
doméstica contra a mulher é sempre de ação penal incondicionada porque o art. 88 da Lei nº 9.099/95
não pode ser aplicado aos casos da Lei Maria da Penha.

Voltando ao nosso exemplo:


Como houve representação da vítima, o Promotor de Justiça ofereceu denúncia contra o réu pela prática
de ameaça (art. 147 do CP).
Após o oferecimento da denúncia (e antes que ela fosse recebida pelo Juiz), a vítima compareceu ao
cartório da Vara e, arrependida, manifestou o desejo de se retratar da representação concedida. Ela disse
que “não queria mais continuar com o processo” porque já perdoou o marido.
O servidor da Vara fez uma certidão narrando o ocorrido e colheu a assinatura da mulher.
O processo foi concluso ao Juiz, que acolheu a retratação da representação e rejeitou a denúncia.

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 29


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Recurso em sentido estrito


Inconformado, o Promotor de Justiça interpôs recurso em sentido estrito dirigido ao TJ, alegando que o
magistrado ignorou o art. 16 da Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006). Isso porque esse dispositivo
permite a retratação da representação da vítima, mas desde que isso seja feito em audiência específica,
com a oitiva do Ministério Público. Veja a redação legal:
Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta
Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente
designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.

O STJ concordou com a argumentação do Ministério Público?


SIM.
A Lei Maria da Penha disciplina procedimento próprio para que a vítima possa eventualmente se retratar
de representação já apresentada. Dispõe o art. 16 da Lei nº 11.340/2006 que, “só será admitida a renúncia
à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade” (STJ. 5ª Turma.
HC 371.470/RS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 17/11/2016).
Assim, a informação prestada em cartório de que a vítima não mais pretendia processar o autor da ameaça
deveria ter sido confirmada perante o juiz, em audiência especialmente designada para essa finalidade.
Existem outros julgados do STJ no mesmo sentido:
É irrelevante que exista carta de retratação redigida pela vítima à autoridade policial com o fim de impedir
as investigações, pois o art. 16 da Lei nº 11.340/2006 - que prevê a possibilidade de renunciar à
representação nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida - só admite a
renúncia perante o Juiz, em audiência especialmente designada.
STJ. 6ª Turma. HC 458.835/GO, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 02/10/2018.

Essa é também a posição da doutrina:


“não é incomum que mulheres, quando o crime depende de representação (ex: ameaça),
registrem ocorrência na delegacia de polícia, apresentem representação e, depois, reconciliadas
com seus companheiros ou maridos, busquem a retratação da representação, que, alguns autores
denominam de renúncia, evitando- se, com isso, o ajuizamento da ação penal ou o seguimento
para a transação, quando viável (...) De toda forma, o art. 16 da Lei 11.340/06 procura dificultar
essa renúncia ou retratação da representação, determinando que somente será aceita se for
realizada em audiência especialmente designada pelo juiz, para essa finalidade, com prévia oitiva
do Ministério Público.” (NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas.
3ª ed., São Paulo: RT, p. 113).

Em suma:
Não atende ao disposto no art. 16 da Lei Maria da Penha a retratação da suposta ofendida ocorrida em
cartório de Vara, sem a designação de audiência específica necessária para a confirmação do ato.
STJ. 5ª Turma. HC 138.143-MG, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 03/09/2019 (Info 656).

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 30


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DIREITO PROCESSUAL PENAL

LITISPENDÊNCIA
A pendência de julgamento de litígio no exterior não impede, por si só, o processamento da
ação penal no Brasil, não configurando bis in idem

A pendência de julgamento de litígio no exterior não impede, por si só, o processamento da


ação penal no Brasil, não configurando bis in idem.
STJ. 6ª Turma. RHC 104.123-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 17/09/2019 (Info 656).

Imagine a seguinte situação hipotética:


João foi condenado, em 1ª instância, no Brasil, a 8 anos de reclusão pela prática de associação para o
tráfico transnacional (art. 35, caput, c/c o art. 40, I, da Lei nº 11.343/2006).
Contra esta condenação, a defesa impetrou habeas corpus alegando a ocorrência de bis in idem, sob o
argumento de que o réu já foi preso, processado e cumpriu 7 anos no Uruguai pelos mesmos fatos.
Logo, pediu para que a condenação proferida no Brasil fosse anulada.

O pedido foi acolhido pelo STJ?


NÃO. Vamos entender com calma.

Litispendência e proibição do bis in idem


A litispendência guarda relação com a ideia de que ninguém pode ser processado quando está pendente
de julgamento um litígio com as mesmas partes (eadem personae), sobre os mesmos fatos (eadem res) e
com a mesma pretensão (eadem petendi). Trata-se da proibição do bis in idem.

Duas vertentes do bis in idem


Embora o ne bis in idem tenha origem mais ligada à sua vertente processual, é possível identificar duas
vertentes:
a) ne bis in idem material: significa que o acusado tem o direito de não ser punido duas vezes pelo mesmo
fato. Impede que alguém seja, efetivamente, punido em duplicidade ou que tenha o mesmo fato,
elemento ou circunstância considerados mais de uma vez para definir-se a sanção criminal.
b) ne bis in idem processual: assegura-se ao réu o direito de não ser processado duas vezes pelo mesmo
fato. Assim, impede a formação, a continuação ou a sobrevivência da relação jurídica processual que esteja
em duplicidade.

O princípio do ne bis in idem é previsto na legislação brasileira?


No Direito Brasileiro, embora ausente sua previsão na Constituição Federal (ao menos de modo explícito),
pode-se identificar a influência do ne bis in idem, em maior ou em menor grau, na legislação ordinária, tal
como ocorre no art. 8º do Código Penal, no art. 110 do CPP e no art. 82, V, da Lei de Migração.
A incorporação do princípio do ne bis in idem ao ordenamento jurídico brasileiro, ainda que sem o caráter
de preceito constitucional, vem complementar o rol dos direitos e das garantias individuais já previsto
pela Constituição Federal de 1988, em razão de que a interpretação constitucional sistemática leva à
conclusão de que se impõe a prevalência do direito do indivíduo à liberdade em detrimento do poder-
dever do Estado-juiz de acusar (STF. Plenário. HC 80.263/SP, Rel. Ministro Ilmar Galvão, DJ 27/6/2003).

Limites de aplicação do ne bis in idem


As mudanças ocorridas no Direito, principalmente a partir da universalização dos direitos humanos e da
criação consensual de instâncias supranacionais para protegê-los e punir os responsáveis por suas
violações, implicou a progressiva e lenta reestruturação do processo penal moderno para um modelo

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 31


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incriminatório universal, em que as fronteiras não sejam obstáculo para a justiça ou refúgio para a
impunidade.
Uma dessas mudanças diz respeito aos limites de aplicação do ne bis in idem, a um primeiro olhar mais
restritos, quando aplicados no âmbito da jurisdição transnacional do que em sua corrente incidência
dentro de cada ordenamento jurídico.
Nesse contexto, pela análise de normativas internacionais incorporadas e vigentes no ordenamento
jurídico brasileiro, constata-se a regra de que é a sentença definitiva oriunda de distintos Estados
soberanos – e não a existência de litígio pendente de julgamento – que pode obstar a formação, a
continuação ou a sobrevivência da relação jurídica processual que configuraria a litispendência.

A pendência de julgamento de litígio no exterior não impede o processamento de demanda no Brasil


Prevalece, portanto, que a pendência de julgamento de litígio no exterior não impede o processamento de
demanda no Brasil, até mesmo porque no curso da ação penal pode ocorrer tanto a alteração da capitulação
(emendatio libeli) como, também, da imputação penal (mutatio libeli), o que, por si só, é suficiente para exigir
maior cautela na extinção prematura de demandas criminais em Estados soberanos distintos.
Seria temerário, portanto, também sob esse aspecto, aniquilar o cumprimento da pena no território
brasileiro. Além disso, poderá incidir o art. 8º do Código Penal que, embora não cuide propriamente da
proibição de dupla punição e persecução penais, dispõe sobre o modo como deve ser resolvida a situação
de quem é punido por distintos Estados soberanos pela prática do mesmo delito, nos seguintes termos:
Art. 8º A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime,
quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas.

Não há elementos seguros para se afirmar que são os mesmos fatos


No caso concreto, o STJ considerou que não havia elementos suficientes nos autos para se afirmar, com
certeza, que a investigação realizada no Uruguai envolveu exatamente as mesmas condutas.
Vale ressaltar que, mesmo que, posteriormente, conclua-se que são os mesmos fatos, será possível
aplicar, no caso, a regra do art. 8º do Código Penal. Essa regra afastará, portanto, eventual dupla apenação
do réu.

Não é matéria para habeas corpus


Por fim, o STJ afirmou que não é possível, na via estreita do habeas corpus, avaliar a extensão das
investigações realizadas numa e noutra ação penal, bem como os fatos delituosos objeto de um e de outro
processo, para se concluir, com precisão, se há ou não bis in idem ou litispendência.
A questão da litispendência há de ser enfrentada e dirimida nas instâncias ordinárias, onde o maior âmbito
da cognição - horizontal e vertical - permitirá a aferição da efetiva ocorrência do alegado pressuposto
negativo da validade da relação processual.

Em suma:
A pendência de julgamento de litígio no exterior não impede, por si só, o processamento da ação penal
no Brasil, não configurando bis in idem.
STJ. 6ª Turma. RHC 104.123-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 17/09/2019 (Info 656).

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 32


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REVISÃO CRIMINAL
A violação a normas processuais não escritas, como é o caso da proibição da supressão de
instância, pode ensejar o ajuizamento de revisão criminal, com base no art. 621, I, do CPP

Importante!!!
O art. 621, I, do CPP prevê que cabe revisão criminal “quando a sentença condenatória for
contrária ao texto expresso da lei penal”.
É admissível a revisão criminal fundada no art. 621, I, do CPP ainda que, sem indicar nenhum
dispositivo de lei penal violado, suas razões apontem tanto a supressão de instância quanto a
ausência de esgotamento da prestação jurisdicional.
Isso porque a expressão “texto expresso da lei penal” prevista no art. 621, I, do CPP é ampla e
abrange também as normas processuais não estão escritas.
STJ. 3ª Seção. RvCr 4.944-MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 11/09/2019 (Info 656).

Em que consiste a revisão criminal?


Revisão criminal é...
- uma ação autônoma de impugnação
- de competência originária dos Tribunais (ou da Turma Recursal, no caso dos Juizados)
- por meio da qual a pessoa condenada requer ao Tribunal
- que reveja a decisão que a condenou (e que já transitou em julgado)
- sob o argumento de que ocorreu erro judiciário.

Então a revisão criminal pode ser proposta a qualquer tempo?


SIM. A revisão poderá ser requerida em qualquer tempo, mesmo após já ter sido extinta a pena (art. 622
do CPP).

Natureza jurídica
A revisão criminal NÃO é um recurso.
Trata-se de uma ação autônoma de impugnação, mais precisamente uma ação penal de natureza
constitutiva (tem por objetivo desconstituir uma decisão transitada em julgado).

Pressupostos:
A revisão criminal tem dois pressupostos:
a) existência de decisão condenatória (ou absolutória imprópria) com trânsito em julgado;
b) demonstração de que houve erro judiciário.

Quem pode propor a revisão criminal?


• o próprio réu;
• procurador legalmente habilitado pelo réu;
• o cônjuge, ascendente, descendente ou irmão do réu, caso este já tenha morrido.
CPP/Art. 623. A revisão poderá ser pedida pelo próprio réu ou por procurador legalmente
habilitado ou, no caso de morte do réu, pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.

Hipóteses
As hipóteses de revisão criminal estão previstas no art. 621 do CPP:
Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida:
I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos
autos;
Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 33
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II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos


comprovadamente falsos;
III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de
circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.

Obs: o art. 263 do Regimento Interno do STF reproduz essas três hipóteses.

Feita esta breve revisão, imagine agora a seguinte situação hipotética:


João foi condenado por furto.
O réu interpôs apelação junto ao Tribunal de Justiça postulando:
a) o reconhecimento do princípio da insignificância;
b) subsidiariamente, caso não acolhido o pedido anterior, que fosse reduzida a sua pena em razão da
confissão e das circunstâncias judiciais favoráveis.

O TJ reconheceu a incidência do princípio da insignificância e absolveu o réu. Como o TJ acolheu o pedido


principal (absolvição pelo princípio da insignificância), ficou prejudicada a análise do pedido subsidiário
(redução da pena).

Recurso especial do MP
O Ministério Público interpôs recurso especial contra o acórdão do TJ.
O STJ deu provimento ao recurso especial do MP e afastou o princípio da insignificância e reestabeleceu a
condenação imposta.
O processo transitou em julgado.

Revisão criminal
João ingressou, então, com revisão criminal, fundada no art. 621, I, do CPP, alegando que o STJ, ao dar
provimento ao recurso especial do MP e rejeitar a aplicação do princípio da insignificância, deveria ter
determinado o retorno dos autos ao Tribunal de Justiça para que continuasse o julgamento do recurso.
Isso porque na apelação a defesa formulou dois pedidos: absolvição e redução da pena.
Se o STJ entendeu que não era o caso de absolvição pelo princípio da insignificância, deveria ter permitido
que o TJ analisasse o pleito subsidiário da defesa para redução da pena. Como o STJ não permitiu isso,
houve supressão de instância.
O MP afirmou que a revisão criminal não deveria ser conhecida porque o inciso I do art. 621 do CPP fala
que cabe a revisão “quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal”. A
defesa, contudo, não indicou nenhum dispositivo de lei penal que teria sido violado.

O que decidiu o STJ? A revisão criminal deve ser conhecida?


SIM.
Muito embora o autor da revisão criminal não indique nenhum dispositivo de lei penal violado, é nítido
que suas razões apontam que houve supressão de instância e ausência de esgotamento da prestação
jurisdicional como consequências do error in procedendo do STJ.
A expressão “texto expresso da lei penal” prevista no art. 621, I, do CPP é ampla e abrange:
• as normas penais escritas;
• qualquer ato normativo que tenha sido utilizado como fundamento da sentença condenatória (portarias,
leis completivas empregadas na aplicação de uma lei penal em branco etc.);
• normas penais processuais;
• normas processuais civis (que são aplicáveis subsidiariamente no processo penal, por força art. 3º do
CPP);
• normas constitucionais;

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 34


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• e também normas processuais não estão escritas, que podem ser depreendidas do sistema processual
como um todo. Exemplos: o direito ao duplo grau de jurisdição, a proibição de supressão de instância, a
obrigação do julgador de produzir uma prestação jurisdicional completa e relacionada ao pedido veiculado
na inicial etc.

Desse modo, a violação a normas processuais não escritas, como é o caso da proibição da supressão de
instância, pode também ensejar o ajuizamento de revisão criminal, com base no art. 621, I, do CPP.

Em suma:
É admissível a revisão criminal fundada no art. 621, I, do CPP, ainda que, sem indicar nenhum dispositivo
de lei penal violado, suas razões apontem tanto a supressão de instância quanto a ausência de
esgotamento da prestação jurisdicional.
STJ. 3ª Seção. RvCr 4.944-MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 11/09/2019 (Info 656).

Obs: no mérito, o STJ julgou procedente a revisão criminal para que seja desconstituída a coisa julgada na
parte referente à fixação da pena e seja determinado que o TJ prossiga no julgamento das demais teses
defensivas apresentadas quando da interposição do recurso de apelação, pertinentes à dosimetria da pena.

DIREITO TRIBUTÁRIO

PARCELAMENTO TRIBUTÁRIO
Depois que o contribuinte pedia o parcelamento da Lei 11.941/2009, demorava algum tempo
até que o Fisco fizesse a consolidação do débito; neste período, continuam incidindo juros
moratórios sobre a dívida

Incidem juros moratórios no período entre o requerimento de adesão e a consolidação do


débito a ser objeto do parcelamento tributário instituído pela Lei nº 11.941/2009.
STJ. 1ª Turma. REsp 1.523.555-PE, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 13/08/2019 (Info 656).

Parcelamento tributário instituído pela Lei nº 11.941/2009


A Lei nº 11.941/2009 trata sobre diversos aspectos da legislação tributária federal, ou seja, envolvendo
tributos de competência da União.
O art. 1º trata sobre o parcelamento e o pagamento de dívidas de tributos federais. Veja o que diz um
trecho do caput:
Art. 1º Poderão ser pagos ou parcelados, em até 180 (cento e oitenta) meses, nas condições desta
Lei, os débitos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e os débitos para com a
Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (...)

Desse modo, esse art. 1º prevê a possibilidade de parcelamento, em até 180 parcelas mensais, dos débitos
relacionados com tributos federais.

Imagine agora a seguinte situação hipotética:


A empresa “XX” possui débitos tributários federais avaliados, aproximadamente, em R$ 500 mil.
A empresa pediu a sua adesão ao parcelamento, com fundamento na Lei nº 11.941/2009, requerendo o
parcelamento em 180 prestações.

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 35


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Como o volume de requerimentos foi muito grande, depois que o contribuinte pedia o parcelamento, a
Receita Federal demorava alguns meses para fazer a chamada “consolidação do débito”, ou seja, para
calcular exatamente quanto a empresa estava devendo e o valor exato das parcelas que ela deveria pagar.
Enquanto não ocorria essa consolidação do débito, a empresa deveria ficar pagando, obrigatoriamente,
uma parcela mínima no valor de R$ 100,00.
Assim, a empresa “XX” pediu o parcelamento e ficou pagando a parcela mínima de R$ 100,00.
Depois de 6 meses, a Receita Federal consolidou o débito e afirmou para a empresa “XX”: agora, você
deverá pagar uma prestação mensal de R$ 3 mil.
Foi, então, que a empresa “XX” notou que, nos 6 meses que ela ficou esperando a consolidação do débito,
continuaram incidindo juros moratórios sobre a sua dívida.
A empresa não concordou e ajuizou ação contra a União afirmando que, neste período, não deveriam
incidir juros moratórios, considerando que ela não estava em atraso. Ela estava aguardando uma
providência do Fisco, qual seja, a consolidação do débito para iniciar o pagamento das parcelas cheias.

Qual é o entendimento do STJ a respeito do tema? No período que o contribuinte está aguardando a
consolidação do débito continuam incidindo juros de mora?
SIM.
Incidem juros moratórios no período entre o requerimento de adesão e a consolidação do débito a ser
objeto do parcelamento tributário instituído pela Lei nº 11.941/2009.
STJ. 1ª Turma. REsp 1.523.555-PE, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 13/08/2019 (Info 656).

Nos termos do art. 155-A, caput e § 1º, do CTN, o parcelamento tributário deve ser concedido na forma e
condição estabelecidas em lei específica e, em regra, não importa exclusão de juros e multas.
A regra geral é que incida atualização monetária no parcelamento do crédito tributário, a menos que a lei
disponha de modo diverso.
A Lei nº 11.941/2009 não previu a dispensa dos juros moratórios no período entre a adesão e a
consolidação da dívida.
À mingua de previsão específica na lei do parcelamento, não se pode mesmo determinar a exclusão dos
juros de mora calculados no período entre a adesão e a consolidação da dívida, sob pena de criar mais um
benefício ao devedor não estabelecido pelo legislador.
Embora o contribuinte não tenha contribuído para a demora entre o requerimento e a consolidação, tal
fato não implica a inexigibilidade dos juros moratórios que seriam devidos, ordinariamente, no decorrer
do parcelamento.
Desta forma, os débitos para com o Fisco Federal, antes que sejam consolidados no programa de
parcelamento instituído pela Lei nº 11.941/09, ficam sim sujeitos à incidência de juros de mora, calculados
com base na Taxa SELIC, consoante o teor do art. 61, § 6º, da Lei nº 9.430/96.

EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO
No empréstimo compulsório sobre energia elétrica (DL 1.512/76), a Eletrobrás deverá pagar
juros remuneratórios de 6% ao ano sobre a diferença de correção monetária não paga nem
convertida em ações

No empréstimo compulsório sobre energia elétrica, são devidos juros remuneratórios sobre
a diferença de correção monetária não paga nem convertida em ações, no percentual de 6%
ao ano, nos termos do art. 2º do Decreto-Lei nº 1.512/76.
STJ. 1ª Seção. EDv nos EAREsp 790.288-PR, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 12/06/2019 (Info 656).

Informativo 656-STJ (11/10/2019) – Márcio André Lopes Cavalcante | 36


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O que é um empréstimo compulsório?


Se houver...
1) uma calamidade pública
2) uma guerra externa ou
3) a necessidade de se fazer investimento público urgente e de interesse nacional ...

... a União poderá tomar emprestados recursos do contribuinte, comprometendo-se a aplicar o valor
arrecadado em uma dessas despesas.
Nisso consiste o empréstimo compulsório, que é uma espécie de tributo prevista no art. 148 da CF/88:
Art. 148. A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios:
I - para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa
ou sua iminência;
II - no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional,
observado o disposto no art. 150, III, "b".
Parágrafo único. A aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será
vinculada à despesa que fundamentou sua instituição.

A lei complementar que instituir o empréstimo compulsório já deverá fixar o seu prazo e as condições de
resgate (art. 15, parágrafo único, do CTN).

Empréstimo compulsório sobre o consumo de energia elétrica


Em 1962, foi editada a Lei nº 4.156/62 criando um empréstimo compulsório sobre o consumo de energia
elétrica. Esse tributo foi instituído com o objetivo de financiar a expansão e a melhoria do setor elétrico
brasileiro em uma época onde em muitos lugares do país não havia energia elétrica. Assim, na conta de
luz do consumidor, além da tarifa normal, era cobrado determinado valor a título de empréstimo
compulsório, o que perdurou até 1993.
O valor arrecadado era destinado à Eletrobrás (Centrais Elétricas Brasileiras), sociedade de economia mista
federal responsável pela expansão da oferta de energia elétrica no país.

Histórico da legislação sobre o tema


• Lei nº 4.156/62: instituiu a cobrança do empréstimo compulsório para todos os consumidores de energia
elétrica a partir de 1964. Essa Lei previa que a devolução dos valores do empréstimo para os contribuintes
deveria ser realizada por meio de títulos ao portador, o que foi feito até 1976.
• Decreto-Lei nº 1.512/76: restringiu a cobrança do empréstimo compulsório apenas aos consumidores
industriais de energia elétrica cujo consumo mensal fosse igual ou superior a 2000Kw/hora (art. 5º do DL).
É importante registrar que, a partir deste DL, foi determinado que os créditos do empréstimo compulsório
passariam a ser escriturados pela Eletrobrás e que poderiam ser convertidos em ações representativas do
capital social da empresa.
• Lei 7.181/83: o prazo de vigência do empréstimo compulsório foi prorrogado até 31/12/1993.

Divergências quanto à devolução dos valores


No prazo previsto na lei, a Eletrobrás efetuou a devolução dos valores cobrados dos clientes como
empréstimo compulsório. No entanto, surgiram várias divergências acerca da quantia que seria realmente
devida. Isso porque diversos consumidores questionaram os índices de correção monetária que foram
utilizados pela empresa para a devolução, especialmente por causa da alta inflação vivenciada no período.

Crédito convertido em participação acionária


O art. 3º do DL nº 1.512/76 previu que...
- na data de vencimento do empréstimo compulsório ou
- em uma data antes, caso a Assembleia Geral da Eletrobrás decidisse antecipar o pagamento

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- o crédito do consumidor poderia ser convertido em participação acionária na Eletrobrás

Em outras palavras, o consumidor que pagou o empréstimo compulsório não receberia de volta em
dinheiro, mas sim em ações preferenciais nominativas da Eletrobrás.

Diferença de correção monetária não paga nem convertida em ações


Chegando na data estipulada, a Eletrobrás calculou quanto era devido para cada consumidor e fez a
conversão deste crédito em ações.
Ex: a Indústria ABC pagou empréstimo compulsório durante alguns anos. Houve uma Assembleia-Geral
Ordinária (AGE) da Eletrobrás na qual se decidiu antecipar o pagamento e, portanto, calculou-se que a
Indústria ABC deveria receber de volta R$ 200 mil. Esse valor não foi pago em dinheiro, mas sim convertido
em ações, conforme autorizava o art. 3º do DL nº 1.512/76. Logo, a Indústria ABC recebeu R$ 200 mil em
ações preferenciais nominativas da Eletrobrás.
Ocorre que a Indústria ABC, depois de receber as ações, questionou o valor apurado e ingressou com
demanda judicial contra a Eletrobrás alegando que deveria ter recebido R$ 300 mil, sob o argumento de
que o índice de correção monetária utilizado pela Eletrobrás foi abaixo do que seria devido.
O Poder Judiciário concordou com a Indústria e disse que ela tinha direito a um saldo de R$ 100 mil
decorrente da diferença de correção monetária calculada a menor que, por não ter sido convertido em
ações, ainda seria devido pela Eletrobras.

A Eletrobrás deverá pagar juros remuneratórios sobre esses R$ 100 mil?


SIM. Incidem juros remuneratórios de 6% ano.
Ora, se existiam quantias que não foram convertidas em ações nem foram pagas em dinheiro, tais valores
ainda permaneceram como débito. Logo, a Indústria continuou sendo credora dessa quantia e, portanto,
sobre esse crédito (nessa parte não convertida) incidem os critérios próprios do empréstimo compulsório:
juros remuneratórios até que o valor seja efetivamente pago ou venha a ser convertido em ações, nos
termos do art. 2º do DL nº 1.512/76:
Art. 2º O montante das contribuições de cada consumidor industrial, apurado sobre o consumo
de energia elétrica verificado em cada exercício, constituirá, em primeiro de janeiro do ano
seguinte, o seu crédito a título de empréstimo compulsório que será resgatado no prazo de 20
(vinte) anos e vencerá juros de 6% (seis por cento) ao ano.

Em suma:
No empréstimo compulsório sobre energia elétrica, são devidos juros remuneratórios sobre a diferença
de correção monetária não paga nem convertida em ações, no percentual de 6% ao ano, nos termos do
art. 2º do Decreto-Lei n. 1.512/1976.
STJ. 1ª Seção. EDv nos EAREsp 790.288-PR, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 12/06/2019 (Info 656).

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EXERCÍCIOS

Julgue os itens a seguir:


1) Incide contribuição previdenciária sobre verba não incorporável aos proventos de aposentadoria do
servidor público, tais como terço de férias, serviços extraordinários, adicional noturno e adicional de
insalubridade. ( )
2) É possível a usucapião de bem móvel proveniente de crime após cessada a clandestinidade ou a violência.
( )
3) A existência da sociedade de fato entre os sócios pode ser provada por qualquer meio de prova admitida
em direito. ( )
4) A ação rescisória de sentença proferida em ação de investigação de paternidade cujo genitor é pré-morto
deve ser ajuizada em face dos herdeiros, e não do espólio. ( )
5) Banco não é responsável por fraude em compra on-line paga via boleto quando não se verificar qualquer
falha na prestação do serviço bancário. ( )
6) É possível a manutenção do ex-empregado como beneficiário do plano de saúde coletivo após a rescisão
contratual da pessoa jurídica estipulante com a operadora do plano. ( )
7) O administrador do fundo de investimento é parte legítima para figurar no polo passivo de demanda em
que se pretende a reparação de supostos danos resultantes de inadequada liquidação. ( )
8) A decisão interlocutória que indefere o pedido de suspensão do processo em razão de questão prejudicial
externa não equivale à tutela provisória de urgência de natureza cautelar e, assim, não é recorrível por
agravo de instrumento. ( )
9) O juiz deve rejeitar liminarmente os embargos à execução protocolizados nos autos da própria ação
executiva. ( )
10) O arrematante do bem é o responsável pelo pagamento da comissão do leiloeiro, não podendo essa
obrigação ser imputada àquele que ofertou a segunda melhor proposta, porque o vencedor desistiu da
arrematação. ( )
11) Se a mulher vítima de crime de ação pública condicionada comparece ao cartório da vara e manifesta
interesse em se retratar da representação, ainda assim o juiz deverá designar audiência para que ela
confirme essa intenção e seja ouvido o Ministério Público. ( )
12) A pendência de julgamento de litígio no exterior não impede, por si só, o processamento da ação penal
no Brasil, não configurando bis in idem. ( )
13) Não é admissível a revisão criminal fundada no art. 621, I, do CPP se o autor não indicar nenhum
dispositivo de lei penal violado. ( )
14) Não incidem juros moratórios no período entre o requerimento de adesão e a consolidação do débito a
ser objeto do parcelamento tributário instituído pela Lei nº 11.941/2009. ( )

Gabarito
1. E 2. C 3. E 4. C 5. C 6. E 7. C 8. C 9. E 10. C
11. C 12. C 13. E 14. E

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