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FACULDADE DE EDUCAÇÃO
METODOLOGIA DO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA
Profª. Drª. Claudia Rosa Riolfi
DIÁRIO DE CAMPO
A E.E. Emygdio de Barros, na Vila São Luís, conta com vinte salas de aula,
além de dependências para reuniões, para coordenação, professores e mediação,
laboratórios de ciência, informática e multimídia, anfiteatro e pátios e quadra de esporte
coberta e descoberta. Os recursos físicos e pedagógicos também são variados, contando
com um retroprojetor, televisores, computadores, aparelhos de DVD e uma biblioteca
com cerca de 14 600 livros. Esses ambientes estão bem conservados, salvo as salas de
aula, que não contam com ventiladores e têm carteiras e janelas deterioradas.
Acerca dos recursos humanos, a escola se divide em cinco núcleos: os da
direção, pedagógico, administrativo, operacional, docente e discente, com atribuições
específicas e que cooperam entre si. A diretoria deve representar a escola, ao executar,
planejar, organizar, coordenar, avaliar e integrar as atividades. O núcleo pedagógico tem
como responsabilidade assistir professores e alunos, mediando relações. O núcleo
docente conta cem membros, entre professores titulares (83), ocupantes de função de
atividade (9), contratados (8), além de eventuais, de número variado. Finalmente, os
alunos atingem a cifra de 1720, segundo o PGE (PGE, 2015). Embora as listas de
chamada contabilizem entre 30 e 35 alunos, nas salas em que estive, raramente havia
mais de 25 alunos, evidenciando um significativo índice de evasão escolar.
A relação da escola com seu entorno parece figurar como eixo central da
realização de seu projeto político-pedagógico. Na caracterização da unidade escolar, em
seu PGE, aparece como um dos primeiros itens as contradições vigentes na vinculação
escola-vizinhança: por um lado, comunidades; de outro, “bairros cujos moradores têm
alto poder aquisitivo” e a USP. A escola recebe “alunos de origens sociais
diversificadas, muitos dos quais com grandes dificuldades materiais e emocionais”, e
então
No primeiro dia do estágio, fui à escola para a primeira aula do dia, conforme
combinado com a coordenadora. No entanto, o professor responsável pelo 3o ano não
havia chegado. Sugeri, então, acompanhar as aulas do 1o ano, até que o professor do
último ano chegasse. Assisti então a uma aula dupla: na sala, com 26 alunos, os
primeiros dez minutos foram reservados aos avisos a respeito de provas anteriores e a
chamada. O professor alterna uma postura disciplinada, pedindo silêncio com
frequência e dando broncas nos alunos pelo uso de celular ou por estarem fora de seus
lugares designados, com uma relação de atenção e amizade. Essa mistura parece criar
uma postura de respeito e intimidade dos alunos em relação ao professor. O que não
significa, necessariamente, que a sala atenda às orientações do professor.
Ele escreve na lousa: Apostila - páginas 124 a 128. São exercícios a respeito de
uma cantiga satírica, especificamente uma de maldizer, do trovador João Garcia de
Guilhade; e uma outra de escárnio, do mesmo poeta. Uma das questões pedia a
diferenciação entre esses dois gêneros satíricos, mas o professor havia apenas dado uma
introdução ao trovadorismo, segundo ele próprio me informou. Assim, muitos alunos
estavam inseguros quanto à classificação dos poemas - os cincos alunos próximos à
mesa do professor estavam perguntando uns aos outros - e o professor permanecia
ocupado entregando as provas feitas em semanas anteriores. Sugeri então mostrar para
os alunos as distinções entre os poemas, lendo os versos de “dona fea” e “Maria
Mateu”. A primeira mais irônica e ambígua, a última explícita e ostensivamente
agressiva, com a nomeação direta do alvo da sátira e uso de baixo calão. Elaborei um
esquema na lousa, desta forma:
cantigas satíricas
escárnio: ironia, ambiguidade, crítica sem um nome específico;
maldizer: ofensa direta, cita o nome da pessoa criticada; uso de baixo calão -
ex: cona.
Após o intervalo, decidi continuar com os primeiros anos. O professor pediu aos
alunos a mesma atividade a respeito das cantigas. Ajudei os alunos com as dúvidas e
repeti a breve explicação sobre as possibilidades do gênero satírico, mas a sala parecia
mais dispersa se comparada à anterior. Enquanto isso, o professor saiu da sala para
buscar avaliações que precisava corrigir. Comentei então com os alunos o exercício de
reescrita que havíamos feito na outra sala e isso os fez ficarem nitidamente mais
interessados. Principalmente um dos alunos que estava sentado no fundo da sala, que
chegou a pedir silêncio mais de uma vez aos que conversavam sentados próximos a ele.
Notando esse interesse, chamei-o para que participasse desde o início da recriação do
poema: perguntei seu nome e pedi que ele me explicasse o sentido das gírias comuns
entre seus amigos.
Querendo incentivá-los, e também provocar um brio de competitividade neles, li
a versão da outra sala, que os fez rir muito. Propus que a versão que faríamos poderia
partir daquela, ou ir criando uma outra possibilidade desde o primeiro verso. Eles, como
imaginei, optaram por esta. O divertido é que de fato eles levaram muito a sério a
escolha e a sonoridade, discutindo às vezes acaloradamente e disputando cada troca no
texto. Chamei a atenção deles para que fosse mantida uma continuidade entre a função
das palavras do original e da versão deles, assim um adjetivo deveria ser trocado por
outro substantivo, um verbo por um verbo. Ao final da aula - o professor demorou mais
tempo do que eu esperava, e chegou faltando poucos minutos para o soar do sinal -,
ainda não tínhamos terminado o poema, mas já era evidente que estava mudado em uma
composição nova e diversa das versões anteriores. O sinal tocou, mas alguns alunos
quiseram continuar ainda por uns minutos nesse processo de reescrita. Quando os
últimos alunos saíam falaram que queriam continuar depois, um deles era aquele do
fundo da sala, e dei a ideia de lermos depois o poema em frente à sala na semana
seguinte, o que eles aprovaram.
Cantigas líricas:
Amor: eu-lírico masculino; sentimento idealizado, cortês; linguagem culta;
vassalagem amorosa;
Amigo: eu-lírico feminino; relacionamento real; linguagem popular e
simples; tema da saudade e da partida do amado.
Uma explicação rápida e o professor começa a ler com os alunos uma tradicional
cantiga de amigo de D. Dinis, que começa com o célebre verso:“Ai flores, ai flores do
verde pino”. O vocabulário, apesar de simples, espanta alguns alunos, que protestam:
não dá pra entender! Sem tradução não dá... O professor explica mais uma vez que a
língua desses poemas é o galego-português, que é normal estranhar, e começa a elucidar
com calma o significado dos versos, a turma tem alguns olhares com ar de interesse,
mas faltam poucos minutos para o final da aula e a sala começa a se mostrar impaciente.
O professor interrompe a explicação, dá uma bronca e avisa que continuará depois.
O professor avisa que corrigiu as redações - são textos que eles haviam escrito
há duas semanas -, mas que não pode entregar para os alunos ainda porque os
professores de filosofia e sociologia também irão dar nota pelas redações. Falando sobre
as redações, o professor afirma que muitos alunos copiaram partes do texto da internet
e, a partir disso, passa a explicar como uma citação deve ser feita e o uso de aspas. A
explicação foi rápida, sem nenhuma anotação ou exemplificação.
Alguns alunos começam a conversar entre si falando que não sabiam que não
podiam copiar da internet sem usar aspas.
Dois alunos saem para buscar os livros de português na sala dos professores.
Enquanto isso, há uma revisão a respeito do modernismo (tema que os alunos estudaram
no primeiro semestre). Agora estão estudando a segunda fase do modernismo,
estudaram sobre o Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles e Vinícius de
Moraes. Depois passarão para a terceira fase modernista.
Os livros chegam. Os alunos conversam e poucos buscam os livros para começar
a atividade. O professor pergunta se alguém sabe cantar “A rosa de Hiroshima”, poema
de Vinícius de Moraes que foi musicado. Ninguém sabia. Um grupo de alunos buscou a
música no YouTube e foram apresentar ao professor, que havia prometido pontos
positivos. O professor responde que só dará os pontos se eles apresentarem para toda a
turma, os alunos desistem. Poucos alunos começaram a atividade. O professor sai da
sala e quando volta os alunos começam a devolver os livros. O professor termina a aula
dizendo que continuarão na próxima aula.
No terceiro ano, o professor começa a aula lembrando aos alunos que terão uma
apresentação na semana seguinte. Alguns alunos entregam uma redação ao professor e
ele pede que os alunos que não trouxeram hoje tragam na próxima aula.
A aula sobre modernismo passa com certa tranquilidade, professor e alunos não
saem dos seus lugares, com livro aberto na frente. Alguns fazem as atividades.
Dez minutos antes do intervalo os alunos já querem sair da sala. O professor
pede que se acalmem e a turma permanece na sala por mais cinco minutos.
O professor vai ao fundo da sala e pede para os alunos que estavam com a
cabeça encostada à mesa que se levantem. Eram quatro, apenas dois atendem. O
professor voltar à frente da sala e relê o poema, a pedido dos alunos. Ele lê a primeira
estrofe e passa a leitura a um dos garotos. A partir desse momento a sala parece mais
concentrada. A leitura continua, agora com uma aluna. A sala está em silêncio e quase
todos acompanham pelo livro. Alguns ainda dormem. O professor para a leitura e
orienta: tem que ler com mais energia, com mais força, com paixão poética! A turma
responde, ri e faz comentários debochados. Ele então continua a ler, dando ênfase
sentimental ao texto, performático, gesticulando. A cada verso, alguns riem, outros
aplaudem, ou fazem os dois simultaneamente. Eles perguntam o sentido de algumas
palavras (cousas, arrebol) durante a leitura. O professor interrompe a declamação,
explica e retorna no mesmo tom. Quando termina, ouço um coro: uau! Mas soa ambíguo
e fico sem saber se era desdém pelo desfecho do poema, pela interpretação, ou uma
interjeição sincera de admiração.
Levanto-me e quando os alunos me chamam vou até eles para ajudá-los a
chegarem às respostas pedidas. Fico sempre contente nesses momentos, releio os textos
com eles, que parecem se admirar de si mesmos quando compreendem o poema.
Geralmente os alunos saem alguns minutos antes, mas hoje o sinal tocou e ainda
estávamos falando do poema. Depois continuaremos. Saí conversando com um menino
e duas meninas, que me apresentaram um aplicativo de cruzadinhas no celular. Quando
me despeço deles não consigo não me lembrar da importância do desvelo na educação,
na dificuldade de encontrar e de nutrir essa relação dedicada e atenta em um cotidiano
que parece tantas vezes constranger a um caminho oposto.