Em "A Ideologia Alemã", duas críticas aos ideólogos alemães são
realizadas por Marx:
1. os chamados ideólogos alemães, ao pretenderem demolir o sistema
hegeliano, criticaram apenas um aspecto de sua filosofia, substituindo tal dialética por uma fraseologia sem "sentido e sem consistência"; 2. Os ideólogos alemães tomaram apenas um aspecto da realidade humana, convertendo-o em uma idéia universal e passando a deduzir todo o real dese aspecto idealizado (ou seja, não criticaram coisa alguma, ignoraram a filosofia hegeliana e, sobretudo, a realidade alemã - nada mais fizeram do que ideologia).
Dispensadas as interpretações dos ideológos alemães (que apenas o
ridicularizaram e, sem o saber, permaneceram presos a ele), Marx realiza uma crítica radical (e por isso mesmo conserva sem risco muitas das suas contribuições) sobre a dialética hegeliana.
Para compreendermos a mudança da dialética idealista hegeliana para a
dialética materialista marxista, faz-se necessário, neste momento, enumerar as principais idéias de Hegel na forma de um esquema:
1. A Cultura, relações dos homens com a Natureza, é o real enquanto
manifestação do Espírito; 2. O real é definido pela Cultura, a Cultura é definida pelo movimento de exteriorização e interiorização da Espírito; 3. Há revolução do conceito de história, pois: a. os acontecimentos não estão no tempo, mas são o tempo; b. a história é um processo dotado de uma força ou de um motor interno que produz acontecimentos (e não uma sucessão de causas e efeitos). Esse motor interno é a contradição; c. pensa-se a história como um processo contraditório unificado em si mesmo e por si mesmo, plenamente compreensível e racional (e não na história como sucessão de fatos dispersos que seriam unificados pela consciência do historiador); 4. Concebe-se a história como história do Espírito. Assim entendida, a história é o movimento pelo qual o que o Espírito é em si (as obras culturais) se torna o que o Espírito é para si (compreensão de sua obra como realização sua), desaguando em um momento final chamado filosofia (ou seja, a Memória da história do Espírito). 5. A história é reflexão. Nesse sentido, o Espírito 'sai para fora de si', criando a cultura, e 'volta para dentro de si', reconhecendo sua produção, fazendo com que o que ela é, em si, seja também para si. Assim, o Espírito é o Sujeito da história, pois somente um sujeito é capaz de ter reflexão; 6. No processo de exteriorização-interiorização do Espírito-Sujeito, quando este não se reconhece como produtor das obras e como sujeito da história, ocorre a alienação; 7. Imediato, abstrato e aparência (modo pelo qual uma realidade se oferece como algo dado) X mediato, concreto e ser (processo de uma constituição de uma realidade através de mediações contraditórias). O primeiro e o segundo trinômios são contraditórios e reais. E sua síntese é efetuada pelo espírito (síntese, agora, denomina-se conceito).
Uma vez enumerada as principais idéias de Hegel, pergunta-se: em
relação à dialética idealista hegeliana, o que muda e o que se conserva na dialética materialista marxista?
1. Marx conserva o conceito de dialética. Porém, a contradição não é
do Espírito consigo mesmo (exteriorização de obras - interiorização de idéias), mas contradição entre homens reais em condições históricas e sociais reais (contradição que recebe o nome de luta de classes). 2. A história não é, portanto, o processo pelo qual o Espírito toma posse de si mesmo, mas a história é a história do modo real como os homens reais produzem suas condições reais de existência. É também a história de como os homens interpretam todas essas relações. 3. Marx conserva as diferenças entre abstrato/concreto, imediato/mediato, aparecer/ser. Mas demonstra que a mercadoria não é uma coisa, mas trabalho social, tempo de trabalho não pago (ocultamento da exploração social). 4. Marx conserva a afirmação de que a realidade é histórica e, por isso, reflexionante. Mas ao invés de o sujeito ser o Espírito, agora o sujeito são as classes sociais em luta. 5. Marx conserva o conceito de alienação. Mas, agora, a alienação não é do Espírito, mas dos homens reais em condiçoes reais. 'Alienação, reificação, fetichismo: é esse processo no qual as atividades humanas começam a se realizar como se fossem autônomas ou independentes dos homens, sem que estes possam controlá-las. São ameaçados e perseguidos por elas. Tornam-se objetos delas