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01/01/2008

De mapa em mapa O Brasil era um território mal definido quando a Corte chegou. A evolução de seus contornos
respondeu às disputas políticas da época Íris Kantor
A Coroa portuguesa preferia manter os mapas em cópias manuscritas, para preservar informações relacionadas à
defesa militar e controle das rotas comerciais. Havia uma diferença importante entre mapas manuscritos e os
mapas impressos difundidos nos atlas e livros de viagens. Os mapas impressos estavam sempre desatualizados
em relação ao conhecimento vigente. Somente homens ligados à administração pública — como governadores
de capitania, engenheiros militares e magistrados — tinham acesso a mapas manuscritos, para orientar
expedições de exploração do território. O conhecimento adquirido nas expedições do século XVIII só começou a
ser de fato difundido com a criação, em 1798, da Sociedade Real Marítima, Militar e Geográfica para o
Desenho, Gravura e Impressão das Cartas Hidrográficas, Geográficas e Militares. Por meio dela, Portugal definia
pela primeira vez uma política oficial de impressão e comercialização de mapas dos seus domínios. O objetivo
era corrigir deformações e erros veiculados pela cartografia estrangeira, sobretudo holandesa, francesa e inglesa.
No alvará de criação da Sociedade Real, a rainha Maria I menciona a escassez de mapas acurados: “e sendo-me
presente (...) a falta e penúria que sente a minha Marinha Real e Mercante de boas Cartas hidrográficas, achando-
se até a necessidade de comprar as das nações estrangeiras, e de servir muitas vezes de algumas, que pela sua
incorreção expõem os navegantes a gravíssimos perigos”. A Sociedade Real Marítima foi incumbida de
examinar, corrigir e aprovar a venda de todas as cartas impressas em Portugal ou no estrangeiro.
A vinda da Corte para o Brasil, em 1808, foi um novo marco para a “descoberta” geográfica do território. Mais
de mil cartas e planos da Sociedade Real Marítima foram transportados para o Rio de Janeiro. Em seguida, a
Coroa solicitou a todos os governadores que enviassem os mapas e as cartas geográficas e topográficas
existentes em suas capitanias para o recém-criado Arquivo Militar. De imediato, a Imprensa Régia iniciou a
publicação de mapas, o que evidencia uma mudança de estratégia quanto à difusão dos conhecimentos
cartográficos: agora eles eram considerados instrumentos imprescindíveis para o desenvolvimento do comércio,
a construção de portos fluviais e a exploração das riquezas naturais do Brasil. Não por acaso, a abertura dos
portos marítimos estimulou a liberalização da navegação fluvial para facilitar o escoamento da produção
agrícola.
Ainda assim, até a Independência foram escassas as imagens de conjunto do Brasil produzidas pela cartografia
impressa portuguesa. As representações continuaram sendo difundidas principalmente pelos livros e atlas
estrangeiros, que, por sua vez, plagiavam mapas elaborados no século XVII pela Companhia das Índias
Ocidentais.
Com o estreitamento das relações diplomáticas e militares com a Inglaterra, Londres tornou-se um centro de
gravação e impressão de mapas, elaborados a partir da cartografia manuscrita portuguesa. Os franceses, por sua
vez, se valiam de informações produzidas por cartógrafos espanhóis para compor mapas da América meridional,
demarcando seus interesses geopolíticos na região das Guianas (Caiena).
Assim como os autores dos primeiros romances de folhetim brasileiros, que se inspiravam em relatos de
viajantes estrangeiros para compor seus personagens e episódios, a percepção da territorialidade sul-americana
também era filtrada pelo olhar interessado das potências marítimo-comerciais. Tanto nos mapas franceses como
nos ingleses, percebe-se um claro destaque das informações de natureza etnográfica, hidrográfica e comercial.
No conhecido mapa da América do Sul editado pela casa de Arrowsmith em 1814, os nomes das etnias indígenas
aparecem grafados em tamanho maior do que os nomes das cidades ou vilas, produzindo uma percepção
fragmentada, indistinta e hipertrofiada da rede urbana e administrativa portuguesa.
Muito mais fidedignos e úteis eram os mapas manuscritos difundidos naquele início do século XIX. Eles
auxiliaram as reformas necessárias à nova capital do império, como o estabelecimento dos correios públicos e o
controle fiscal de caminhos, estradas e vias fluviais. No atlas Guia dos Caminhantes (1816), preparado pelo
ilustrador baiano Anastácio de Sant’Anna (conhecido como “Pardo Velho”), são detalhadamente apresentados os
caminhos e as estradas existentes na época da elevação do Brasil a Reino Unido de Portugal e Algarve. O autor
comenta que desejava eliminar “erros cartográficos” difundidos pelos mapas impressos e roteiros preparados
pelos “homens de ciência”, dispondo-se a apresentar uma representação atualizada da rede de comunicações
internas e da ocupação territorial.
Sant’Anna dedica seu trabalho aos comerciantes, fazendeiros e feitores, e faz uma série de recomendações aos
jovens americanos, em tons nitidamente patrióticos. Seus mapas registram a trama das estradas reais, registros
fiscais, rede de vilas, feiras, freguesias e pousos, além de farta informação sobre a presença das populações
indígenas e africanas.
O crescente interesse em conhecer a geografia brasileira se refletia até mesmo nas páginas dos jornais da época.
Eles mantinham seções especiais para a edição de roteiros de viagens e memórias estatísticas, escritos por
engenheiros militares, cartógrafos, naturalistas, mineralogistas e magistrados. Raramente os relatos vinham
acompanhados de representações cartográficas, mas a divulgação desses textos, muitos deles inéditos, foi um
estímulo importante para a formação da consciência territorial entre o público leitor.
O Brasil como entidade geopolítica estava sendo inventado naquele momento. Descrever o território físico, as
riquezas naturais e a população passou a ser tarefa prioritária para uma geração de cientistas e administradores
públicos que apostaram no projeto de transformar o Brasil em centro político do Império português.
Íris Kantor é professora do Departamento de História da Universidade de São Paulo e autora de Esquecidos e
Renascidos: a historiografia acadêmica luso-americana (1724-1759). Salvador, São Paulo, Centro de Estudos
Baianos da UFBA/Hucitec, 2004.
Saiba Mais
ADONIAS, Isa. Mapa: imagens da formação territorial brasileira. Rio de Janeiro: Fundação Odebrecht, 1993.
BIBLIOTECA VIRTUAL DA CARTOGRAFIA HISTÓRICA: Do século XVI ao XVIII. Biblioteca Nacional.
Endereço eletrônico http://consorcio.bn.br/cartografia/.
CORTESÃO, Jaime. História do Brasil nos Velhos Mapas, 2 vols. Rio de Janeiro: Ministério das Relações
Exteriores, 1965 e 1971.
GARCIA, João Carlos. A Nova Lusitânia: Imagens Cartográficas do Brasil nas Colecções da Biblioteca
Nacional (1700-1822). Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses,
2001.
GUEDES, Max Justo. “A cartografia da delimitação das fronteiras do Brasil no século XVIII”, in Cartografia e
diplomacia no Brasil do século XVIII. Lisboa: CNCDP, 1997.

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