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Por muito tempo tive vontade de escrever resenhas dos livros que li do Eric
Voegelin, este gigante da filosofia ainda esquecido, devido ao grande impacto que estas
obras exerceram não só na minha vida filosófica, mas espiritual. Há vários motivos pra
destacar o mérito de Voegelin como um cientista político par excellence mas gostaria de
destacar dois:
Nesse livro, mais conhecido pela polêmica levantada nos últimos capítulos com
relação aos reformistas Lutero e Calvino, Voegelin estabelece uma relação entre as
ideologias totalitárias do século XX, tais quais o nazismo e o socialismo-comunismo, com
as revoltas religiosas surgidas na Idade Média. Mas vamos por partes.
Finalmente chegamos no ápice do livro que, para surpresa de muitos, não está na
análise da Reforma e de Lutero e Calvino, mas nos antecedentes que permitiram o
surgimento do protestantismo e os gérmens ideológicos das revoltas espirituais que
assolam o Ocidente.
É aqui que surge, segundo o autor, a defesa do aniquilamento dos indivíduos como
uma forma de sacrifício para a implantação do paraíso terreno. Cada homem que é morto
ou ‘silenciado’ por não defender essa implantação é visto como inimigo da própria
vontade divina que emana dos ‘emissários de Deus’. A destruição de um anti-socialista
ou anti-nazista se torna um dever divino. O amor Dei, a humildade verdadeira, dá lugar a
libido dominandi, a vaidade espiritual e intelectual de mudar o mundo e a estrutura da
realidade segundo os próprios desígnios.
As ideologias modernas são, então, formas deturpadas do que era pra ser uma
religião, embasadas numa fé imanente, na salvação da natureza humana através da ação
do proletariado, da raça, da ciência, da razão, etc.
Ao fim da análise (há muito mais a destacar, mas sugiro a leitura para melhor
entendimento), Voegelin aponta na personalidade de Lutero como responsável pelo
rompimento com a Igreja. Segundo o autor, a crise e a reforma poderiam ter sido feitas
sem a necessidade de um rompimento total, incluindo a mistura de críticas políticas,
algumas certas outras exageradas, da estrutura da Igreja e a mudança de dogmas acerca
dos mistérios da fé, criando um rompimento religioso. São Francisco de Assis apontou
várias críticas a Igreja Católica também, exortando ao próprio Papa, mas jamais deixou
que a sua personalidade tomasse a dianteira e com isso, rompesse definitivamente.
Segundo Voegelin, proposições como “Deus elege alguns homens” e “Deus reprova
alguns homens”, combinam um sujeito transcendental (Deus) com predicados tomados
da experiência imanente do mundo; as proposições que resultam dessa combinação não
são proposições da ciência empírica, mas símbolos. Os predicados de tais proposições
não devem ser tomados no sentido que têm em um contexto imanente do mundo (como
se por exemplo, eleger fosse predicado de um homem); eles têm de ser tomados
analogicamente. A necessidade ou inelutabilidade dos decretos de Deus surge
especulativamente do problema da eternidade de Deus; porque Deus está fora do tempo,
tudo o que ocorre no tempo está em presença eterna para ele; ele “sabe antecipadamente”
o que vai acontecer porque para ele não é o futuro, mas sua presença; e à medida que ele
é a prima causa, tudo o que acontece na distensão do tempo acontece por necessidade em
sua causação eterna.
CONCLUSÃO
A leitura deste livro vale a pena, seja para analisar as relações que Voegelin traça
para entender a crise civilizacional do Ocidente ao encontrar seus rastros na Idade Média,
seja para criticar o autor por uma crítica tão dura e excessiva aos autores da Reforma e
relacioná-los com tiranos verdadeiramente luciferinos como Marx e Hitler. Por mais erros
que apresentem na abordagem de suas ideias e nas consequências desencadeadas por seus
processos reformistas, nem eles conseguiriam prever a crise que ocorreria séculos depois
nem podem ser totalmente responsabilizados pelo gérmen anticivilizacional que
germinou e eclodiu na Reforma, permitindo o surgimento das mais vis e cruéis maquinas
de escravização e aniquilação humana, as ideologias modernas.
Encerro esta resenha (que ficou grande demais para uma resenha) apontando acima
de tudo a importância de Eric Voegelin como mais que um cientista político, um gigante
da filosofia. Por mais críticas que possam ser feitas em discordância de suas análises, não
se pode negar a grande capacidade intelectual e espiritual do autor, principalmente por
apontar na religião cristã como o ponto máximo da diferenciação da consciência humana.
Esse ponto será esclarecido em futuras resenhas (se Deus assim permitir) sobre outras
obras de Eric Voegelin e suas fases posteriores de abordagem. Se muitos o reconhecem
por esta obra crítica ao protestantismo e ao gnosticismo, também devem reconhecer obras
que ele aprofunda a análise das raízes da crise civilizacional como produtos provindos d
distensão da própria consciência humana.