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FACULDADE DAMÁSIO

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM DIREITO DE FAMÍLIA E


SUCESSÕES

ALBA PATRICIA JALES DANTAS NETTO

DIREITO À SUCESSÃO NA UNIÃO ESTÁVEL

Imperatriz
2017
FACULDADE DAMÁSIO
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM DIREITO DE FAMÍLIA E
SUCESSÕES

ALBA PATRICIA JALES DANTAS NETTO

DIREITO À SUCESSÃO NA UNIÃO ESTÁVEL

Monografia apresentada à Faculdade


Damásio, como exigência parcial para
obtenção do título de Especialista em Direito
de Família e Sucessões, sob orientação do
professor Felipe Matte Russomanno.

Imperatriz
2017
ALBA PATRICIA JALES DANTAS NETTO

DIREITO À SUCESSAO NA UNIÃO ESTÁVEL

Esta monografia apresentada no final do Curso de Pós-


Graduação Lato Sensu em Direito de Família e
Sucessões, na Faculdade Damásio, foi considerada
suficiente como requisito parcial para obtenção do
Certificado de Conclusão. O examinado foi aprovado
com a nota ________.

São Paulo, 08 de fevereiro de 2017


AGRADECIMENTOS

Hoje, comemoro mais esta vitória, mas, sozinha, não teria conseguido.
Gostaria de agradecer primeiramente а Deus qυе permitiu qυе tudo isso
acontecesse.
Agradeço aos meus amados pais, Ana Karla Jales Dantas e Benedito
Jorge Gonçalves de Lira, pelo apoio, incentivo e por toda dedicação. Aos meus
irmãos Eduardo e Olga pela admiração. A toda minha família pelas orações e o
carinho.
À Instituição pelo ambiente criativo е amigável qυе proporciona.
Ao mеυ professor, orientador Felipe Matte Russomanno, pela orientação,
incentivo e apoio à elaboração deste trabalho.
Enfim, aos amigos, colegas e a todos aqueles que colaboram direta ou
indiretamente para que este trabalho acontecesse. Àqueles que acreditaram em mim
e que de alguma forma me ajudaram a concluir este maravilhoso trabalho, muito
obrigado!
Aos funcionários do Damásio, que sempre estiveram a minha disposição.
“A motivação é como alimento para o cérebro, você não pode
ter o suficiente em uma refeição. A motivação precisa de
recargas contínuas e regulares para nutrir a fundo e
transformar um ser humano em um vencedor.” Peter Davies.
RESUMO

O trabalho de pesquisa que ora se depreende consiste na análise da sucessão na


união estável, com base nos princípios e demais normas constitucionais, bem como
na preocupação em relação aos preconceitos e discriminações que ainda permeiam
a sociedade e a própria legislação. Nota-se que a companheira é tratada de modo
distinto em relação à sucessão, quando comparada com o cônjuge. Neste contexto
se percebe que muito ainda precisa ser feito para igualar as duas entidades, embora
a Constituição as reconheça como “família”. O presente trabalho contempla também
pesquisa teórico-bibliográfica, uma vez que aborda o posicionamento dos mais
destacados estudiosos do Direito acerca do tema. Além disso, o trabalho faz uma
abordagem qualitativa, mais aprofundada e condizente com a própria pesquisa
bibliográfica. Nesse sentido, empreende-se uma crítica, levando-se em conta a
necessidade de que se promova a constitucionalização do direito das sucessões,
como tem sido feito com outras áreas do Direito.

Palavras-chave: União estável. Sucessão. Constituição Federal. Dignidade da


Pessoa Humana.
ABSTRACT

The present research work consists in analyzing the succession in the stable union,
based on the principles and other constitutional norms, as well as the concern about
the prejudices and discriminations that still permeate society and the legislation own.
It is noted that the partner is treated differently in relation to the succession, when
compared to the wife. In this context, it possible to perceive that much yet needs to
be done to equal the two entities, although the Constitution recognizes both as
"family". The present work also contemplates theoretical-bibliographic research,
since it approaches the positioning of the most outstanding scholars of the Law on
the subject. In addition, the work takes a qualitative approach, more in-depth and in
keeping with the bibliographical research itself. In this sense, a criticism is
undertaken, taking into account the need to promote the constitutionalization of
inheritance law, as has been done with other areas of law.

Keywords: Stable Union, Succession, Federal Constitution, Human Dignity.


SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. 10
2 CASAMENTO, CONCUBINATO E UNIÃO ESTÁVEL.................................... 12
2.1 Do casamento – disposições gerais, natureza jurídica, pressupostos e
capacidade.......................................................................................................... 13
2.2 Concubinato puro e adulterino – da nova visão constitucional como
entidade familiar................................................................................................. 15
2.3 A visão tradicional de família...................................................................... 16
2.4 A Constitucionalização do Direito de Família ........................................ 17
2.5 Do Direito das Famílias - Princípios .......................................................... 19
2.5.1 Princípio da Dignidade Humana ................................................................ 20
2.5.2 Princípio da Função Social da Família........................................................ 21
2.5.3 Princípio da Afetividade............................................................................. 22
2.5.4 Princípio da Solidariedade.......................................................................... 22
2.5.5 Princípio do Pluralismo............................................................................... 23
2.5.6 Princípio da Igualdade com Respeito à Diferença...................................... 24
2.5.7 Princípio da Proteção Integral às Crianças, Jovens e Idosos e Princípio
da Proibição de Retrocesso Social....................................................................... 25
2.6 Das “novas” entidades familiares.............................................................. 25
2.6.1 Família monoparental................................................................................. 26
2.6.2 Família homoafetiva.................................................................................... 26
2.6.3 Família anaparental.................................................................................... 26
3 A UNIÃO ESTÁVEL......................................................................................... 28
3.1 Conceito........................................................................................................ 28
3.2 Histórico........................................................................................................ 30
3.3 Legislação pertinente – Da visão da União Estável no Código Civil de
1916, na Constituição Federal de 1988, nas Leis 8.971/94, 9.278/96 e no
Código Civil de 2002.......................................................................................... 31
3.4 Requisitos legais para a configuração da União Estável......................... 34
3.4.1 Pressupostos de Ordem Subjetiva.............................................................. 35
3.4.2 Pressupostos de Ordem Objetiva............................................................... 36
4. DO DIREITO DAS SUCESSÕES...................................................................... 38
4.1 Da Sucessão – histórico e conceito de Direito das Sucessões............... 38
4.2 Dos sucessores legítimos, necessários, testamentários e legatários.... 40
4.3 Direito Sucessório na Legislação Atual – da sucessão do
companheiro no Código Civil de 2002.............................................................. 43
4.4 Da esposa, da companheira e da concubina no direito sucessório........ 45
5 O CÓDIGO CIVIL DE 2002 E O TRATAMENTO ATUAL DA SUCESSÃO NA
UNIÃO ESTÁVEL ................................................................................................ 48
5.1 O companheiro no Código Civil de 2002 – Da concorrência .................. 48
5.1.1 Concorrência com descendentes comuns e do autor da herança.............. 47
5.1.2 Concorrência com outros parentes ............................................................. 50
5.2 Análise crítica do direito sucessório da companheira com vistas ao
Princípio da Dignidade Humana e demais princípios da Constituição de
1988....................................................................................................................... 51
5.3 Da inconstitucionalidade da distinção de regime sucessório entre
cônjuges e companheiros ................................................................................ 55
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 63
REFERÊNCIAS.................................................................................................... 64
10

1 INTRODUÇÃO

Cada vez mais todos os ramos do Direito vêm buscando sua


constitucionalização, ou seja, adequar-se às normas dispostas na Constituição
Federal de 1988, em especial aos princípios.
Nesse diapasão, o Direito de Família e também o das Sucessões (objeto
do presente trabalho) precisam buscar ali os seus fundamentos. Assim, como a
Constituição estabelece que a união estável seja uma entidade familiar e que deve
ser facilitada sua conversão em casamento e se na prática a função de ambas as
entidades é a mesma – possibilitar o desenvolvimento da personalidade de todos os
seus membros – não faz sentido, discriminar uns em detrimento de outros e o
correto seria que a esposa e a companheira tivessem os mesmos direitos
assegurados.
No que se refere à sucessão não é assim que ocorre, ao contrário. Muitas
vezes, a companheira além de já sofrer com a discriminação no meio social, ainda o
sofre quando perde seu companheiro e não tem direito, como uma esposa teria a
sucedê-lo da mesma forma.
O presente trabalho interessa-se por entender a relação familiar
estabelecida pela união estável, a situação da companheira em comparação com a
da esposa, quando sucede o “de cujus”, analisando-a sob a ótica da Constituição
Federal e de seus princípios.
Para tanto, utilizou-se de pesquisa bibliográfica, especialmente nas áreas
de Direito de Família, Direito das Sucessões e Direito Constitucional; por meio de
livros e artigos impressos ou não e demais materiais disponíveis. Ademais, buscou-
se o entendimento jurisprudencial, numa busca pela construção de uma pesquisa
cuja abordagem fosse mais profunda e menos voltada a dados quantitativos
(pesquisa qualitativa). Também se pode afirmar que existe um viés descritivo no
presente trabalho monográfico, uma vez que se voltou à descrição da posição da
companheira perante a legislação brasileira – posição essa desprivilegiada, diante
da que teria uma esposa.
O trabalho está dividido em 06 (seis) capítulos (contando com as
considerações finais), onde são tratados o casamento, o concubinato e a união
estável, buscando explicitar as diferenças entre esses três institutos, com base no
que diz a legislação e buscando também entender a evolução do pensamento social
11

ao longo dos últimos anos. Além disso, também se trata de constitucionalização do


Direito de Família, em especial no que se refere aos princípios a ele ligados e
presentes na Constituição de 1988. Outros princípios também são aí analisados,
com fulcro na sua importância para a sucessão do “de cujus”.
O quarto capítulo se importa em analisar os institutos do Direito das
Sucessões, de forma mais detalhada.
Por fim, o último capítulo está voltado ao Código Civil de 2002 e ao
tratamento atual dado à sucessão na união estável. Para isso, busca-se analisar
muito especialmente a questão da concorrência entre a companheira (o) e demais
herdeiros em comparação com aquela que se dispõe entre cônjuge e demais
herdeiros.
12

2 CASAMENTO, CONCUBINATO E UNIÃO ESTÁVEL

O homem é um ser gregário. Viver em sociedade é antes de tudo, uma


necessidade do gênero humano, dada especialmente a sua fragilidade diante do
meio. Um bebê humano é delicado e incapaz de sobreviver sem a supervisão de um
adulto. Por isso, se não fosse à existência da família, do cuidado daqueles que o
amam, não poderia se desenvolver a contento.
Maria Berenice Dias concebe a família com sua função eudemonista, em
sua obra “Manual de Direito das Famílias”1. Isso significa que a família é um “locus”
privilegiado em que o homem se apoia para desenvolver todas as suas
potencialidades. Por este motivo, a primeira e mais importante forma de agremiação
social é a família.
O casamento, tradicionalmente é a forma institucional de unir homem e
mulher. Inicialmente a preocupação com a religiosidade levou algumas sociedades a
estabelecerem esse vínculo nas instituições religiosas, tal como fez a sociedade
cristã. Posteriormente, viu-se a necessidade de que esse vínculo também fosse
legal ou jurídico.
De qualquer modo, o adultério, que seria a relação extraconjugal, ou fora
do casamento, sempre foi visto com muito preconceito e chegou-se a estabelecer
em muitas sociedades, como ainda hoje se observa em alguns países do Oriente
Médio, por meio de notícias da mídia televisiva, essa prática como criminosa. Um
tempo atrás, o G1 deu notícias acerca do fato, trazendo um vídeo e também
comentários acerca de um caso que ocorreu no Estado Islâmico, em que o próprio
pai e também um Jihadista (que acredita em uma guerra santa) apedrejam uma
jovem, por tal fato, adultério. Segundo a reportagem:

Uma jovem mulher acusada de adultério foi apedrejada até a morte por seu
pai e jihadistas do grupo Estado Islâmico (EI) no centro da Síria, de acordo
com um vídeo postado no YouTube nesta terça-feira (21).
O Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH) afirmou que o
apedrejamento ocorreu em agosto ou setembro em uma região rural da
2
província de Hama (centro), controlada pelo EI.

1
DIAS, M. B. Manual de Direito das Famílias. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 43.
2
GLOBO. Mulher síria acusada de adultério e apedrejada por seus pais e jihadistas. 2014.
13

O casamento, sagrado para muitos, não poderia ter manchas em especial


em relação à mulher, já que os homens comumente traíam, sem que muito fosse
feito a esse respeito.
Conforme Dias3, as leis sempre foram feitas por homens e a mulher ficava
alijada, inclusive do processo político. No Brasil, por exemplo, é recente a
possibilidade de a mulher votar.
Mesmo pessoas solteiras, caso se unissem sem os laços do matrimônio,
eram consideradas adúlteras, promíscuas, não podiam ter seus filhos batizados na
igreja católica, não tinham qualquer direito sobre o patrimônio do companheiro,
inclusive diante da morte deste e da incapacidade de sustento próprio.
Tendo em vista tudo isso, qualquer relação amorosa que não fosse
permeada por esse vínculo sempre sofreu com preconceitos. Por isso mesmo,
durante muito tempo não se falou em união estável, terminologia recente, adotada
pela Constituição Federal de 1988, mas tão somente em “concubinato”, dividindo-se
ele em “puro” e “impuro”, o que será oportunamente tratado.

2.1 Do casamento – disposições gerais, natureza jurídica, pressupostos e


capacidade

O casamento para ser considerado válido precisa cumprir uma série de


formalidades. Sua natureza de negócio jurídico solene, segundo Gonçalves4 exige
que se cumpra um verdadeiro ritual, em que inclusive as palavras a serem ditas no
ato do matrimônio, são preestabelecidas. Nesse sentido, dispõe o art. 1535 do
Código Civil:

Presentes os contraentes, em pessoa ou por procurador especial,


juntamente com as testemunhas e o oficial de registro, o presidente do ato,
ouvida aos nubentes a afirmação de que pretendem casar por livre e
espontânea vontade, declarará efetuado o casamento nestes termos:
De acordo com a vontade que ambos acabais de afirmar perante mim de
vos receberdes por marido e mulher, eu, em nome da lei, vos declaro
5
casados.

3
DIAS, M. B. Manual de Direito das Famílias. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p.146.
4
GONÇALVES, C. R. Direito Civil Brasileiro – Direito de Família. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 97.
5
BRASIL. Código Civil (2002). 2016.
14

Segundo Gonçalves6, as formalidades, tais como a exposta acima, em


conformidade com a Lei, é que conferem certeza e seriedade ao ato. Eles
constituem “prova e resguardam os interesses de terceiros no tocante à publicidade
da sociedade conjugal”, nas palavras do autor.
Segundo Gonçalves7, algumas dessas formalidades são, ainda, as
habilitações perante o oficial de registro; a exigência de documento escrito, assinado
inclusive por testemunhas que conferem veracidade ao fato; que seja celebrado por
quem tem competência para tanto, em um local, hora e lugar definidos previamente,
etc. Contudo, mesmo celebrado clandestinamente, desde que presentes os
requisitos, tais como capacidade para casar e ausência de impedimentos, não há
justificativa para anulá-lo, desde que as partes estejam de boa-fé.
Trata-se de ato relevante socialmente, tanto em relação aos nubentes
como aos demais. Estabelecem-se direitos e obrigações entre os cônjuges, tais
como alimentos, mesmo diante da separação. O casamento é assentado no livro de
registro e confere-se aos, agora cônjuges, uma certidão comprovando o ocorrido.
Ademais é preciso que se diga que em virtude de questões relativas aos
bens do casal, é possível que se estabeleçam distintos regimes, o que visa
resguardar o patrimônio de ambos. Caso nenhum regime seja adotado, a opção
legal é pela comunhão parcial de bens. Isso significa que apenas os bens adquiridos
na constância do casamento pertencem a ambos e não outro qualquer que o
nubente já traga consigo.
Conforme Gonçalves8, também é possível que se realize um casamento
religioso com efeitos civis, desde que cumpridas todas as formalidades legais, tais
como capacidade para casar ou assinatura de quem o possa permitir por direito
(pais e tutores) e ausência de impedimento (há certas pessoas que em virtude de
determinados laços de parentesco ou afinidade não podem se casar, tais como
ascendentes com descendentes, irmãos, sogros e genro ou nora, por exemplo).
Cumpridos todos os requisitos para o casamento e formalidades estabelecidas em
lei, nada impede, portanto, que se dê efeito civil ao casamento religioso.
A situação que merece destaque, porém, e mais interessante ao presente
trabalho, é a possibilidade de conversão da união estável em matrimônio. O que se

6
GONÇALVES, C. R. Direito Civil Brasileiro – Direito de Família. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 127.
7
Idem Ibidem, p. 127.
8
Idem Ibidem, p. 133-134.
15

leva em conta nesse fato, é que na prática os companheiros já vivem como se


cônjuges fossem. Nesse sentido, o art. 1726 do Código Civil 9 dispõe que: “A união
estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao
juiz e assento no registro civil”.
O referido artigo está em conformidade com o que dispõe a Constituição
10
Federal em seu art. 226, quando diz que a lei deve facilitar a conversão da união
estável em casamento. Mas por que essa preocupação do legislador constituinte em
formalizar a comunhão de vidas que já existe na prática? Ocorre que o casamento
tem a certidão que faz prova da existência dessa relação, que serve para as mais
variadas situações, inclusive na sucessão, enquanto a união estável, caso não haja
qualquer documento que a certifique deixa o companheiro em situação difícil, pois
há que se conseguir um número suficiente de provas para certificá-la, o que nem
sempre é fácil de alcançar.

2.2 Concubinato puro e adulterino – da nova visão constitucional como


entidade familiar

Como já se disse, conforme Dias11 tradicionalmente, a família sempre foi


vista como tal apenas em caso de existência do laço matrimonial. Se não houvesse
casamento chamava-se pelo pejorativo nome “concubinato”, visto como uma relação
espúria. Daí a inexistência de direitos da pessoa que vivesse em concubinato, que
era quem vivia maritalmente sem estar casado.
A denominação concubina, mais aplicável à mulher na prática, apenas
diferenciava solteiros com vida em comum pelo nome “puro” e quando um deles
ainda se mantinha casado com uma terceira pessoa, pelo adjetivo “impuro” ou
“adulterino”. Essa distinção também é feita por Paula Carvalho Ferraz em seu artigo
que trata do tema:

Era comum a distinção doutrinariamente estabelecida entre concubinato


puro e impuro. O concubinato puro se referia àquelas pessoas que não
casavam por opção, visto não possuir nenhum impedimento legal. Já o
concubinato impuro referia-se às relações entre um homem e uma mulher,

9
BRASIL. Código Civil (2002). 2016.
10
BRASIL. Constituição Federal (1988). 2016.
11
DIAS, M. B. Manual de Direito das Famílias. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p.146.
16

que se estabeleciam contrariamente às condições impostas ao casamento,


12
ou seja, materializadas nos impedimentos matrimoniais.

Na verdade, ambos eram vistos com preconceito ou discriminação e


mesmo os filhos advindos dessa relação, durante muito tempo, sequer podiam ser
registrados no nome do casal. Chamava-se “filho natural” o filho de apenas um dos
parceiros, já que o outro não podia lhe conferir seu sobrenome. Isso era tido como
uma vergonha e essas crianças ou mesmo depois de adultas sofriam com tais
denominações preconceituosas. Hoje a Constituição Federal já não o permite.

2.3 A visão tradicional de família

Família é um agrupamento social de pessoas que se ligam por laços de


parentesco entre si. De acordo com Gonçalves:

Latu sensu, o vocábulo família abrange todas as pessoas ligadas por


vínculo de sangue e que procedem, portanto, de um tronco ancestral
comum, bem como as unidas pela afinidade e pela adoção. Compreende os
13
cônjuges e companheiros, os parentes e os afins.

Essa visão de família, que engloba companheiros, afins e filhos por


adoção, porém, é uma perspectiva moderna. Tradicionalmente, a família se
constituiu no Brasil através do laço do matrimônio. Na verdade, por longas eras a
família sempre foi sinônimo de casamento e este ainda é, para muitos, a única forma
aceitável de se formar uma família.
Segundo Coulanges14 em sua obra “A Cidade Antiga” a família romana,
berço da nossa civilização era uma família extremamente patriarcal, em que o pai,
pater familias julgava-se e o era, pela Lei, o “dono” da esposa e dos filhos, podendo
até mesmo vendê-los (os filhos) ou condená-los à morte. Isso se verifica inclusive na
religião. E isso, na verdade nem mesmo deriva da Lei, inicialmente nasceu na
tradição. Nesse sentido, segundo o autor:

A família não recebeu suas leis da cidade. Se a cidade houvesse


estabelecido o direito privado é provável que teria feito tudo diferente do que

12
FERRAZ, P. C. O Concubinato e uma perspectiva de inclusão constitucional. Disponível em:
<https://goo.gl/zuCXsh>. Acesso em 30 out. 2016.
13
GONÇALVES, C. R. Direito Civil Brasileiro – Direito de Família. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 17.
14
COULANGES, F. A Cidade Antiga. 2. ed. São Paulo: Martin Claret, 2008. p. 107.
17

vimos até agora. [...] A lei que permite que o pai venda ou tire a vida do
filho, lei que encontramos tanto na Grécia, como em Roma, não foi
imaginada pela cidade. [...] o direito privado existiu antes dela. Quando
começou a escrever as suas leis, encontrou esse direito já estabelecido,
15
vivo, enraizado nos costumes, fortalecido pela adesão universal.

Essa forma de se enxergar a família, o machismo com que sempre foi


tratada a mulher perdurou até o século passado, e mesmo hoje ainda se percebe na
sociedade resquícios desse pensamento.
Mesmo depois de a mulher ter ganhado espaço, lutando lado a lado com
o homem no mercado de trabalho, estudando e se informando, ainda é tratada de
maneira desigual em relação a este, ganhando menos muitas das vezes, e sofrendo
todo tipo de abuso.
A visão tradicional de família e da mulher, em especial, vem dando lugar a
outra, mais condizente com a realidade, em que ambos precisam trabalhar, estudar
e buscar meios de sobrevivência da família. A legislação tem tentado acompanhar
as alterações sociais e aos poucos novas formas de família, inclusive aquelas que
não se tem o casal vão sendo reconhecidas e respeitadas como tal.

2.4 A Constitucionalização do Direito de Família

A Constituição é o documento mais importante da legislação, o


fundamento de validade de todas as leis em vigor em um país e deve ter
funcionalidade, até para não se tornar mera folha de papel, como afirma Ferdinand
Lassale16 em sua obra “O Que é uma Constituição?”.
Contudo, no Brasil, apesar de a Constituição atual ter sido promulgada
ainda na década de 80 (oitenta) do século passado, é muito recente a preocupação
concreta de tornar todo o Direito “Constitucional”, ou constitucionalizá-lo. Os
embates acadêmicos, os avanços e entraves que tem sofrido são inúmeros quando
se trata de interpretá-lo em conformidade com o texto constitucional.
A Constituição Federal de 1988 está permeada por princípios que são o
eixo norteador de todo o sistema constitucional. Dentre os princípios que geram
mais discussão, certamente está o da Dignidade da Pessoa Humana. Trata-se de
um macroprincípio que irradia sobre todo o texto constitucional e fora dele, de modo

15
COULANGES, F. A Cidade Antiga. São Paulo: Martin Claret, 2006, p. 92.
16
LASSALE, F. O que é uma Constituição. São Paulo: Edijur, 2006, p. 30.
18

que qualquer Lei precisa atribuir tratamento digno e condizente com a condição
humana das pessoas.
No Direito de Família, em especial, levando-se em conta que é no seio da
família que o ser humano se desenvolve, essa busca pela constitucionalização, ou
seja, torná-lo condizente com os princípios constitucionais e mais especialmente
com o da Dignidade da Pessoa Humana é ainda mais importante. O que se observa
nesse âmbito é uma modificação completa da visão que se tem de família a partir
daí.
Nos dizeres de Rodrigo da Cunha Pereira e Maria Berenice Dias, apud
Gonçalves, nesse sentido:

A Constituição Federal de 1988 ‘absorveu essa transformação e adotou


uma nova ordem de valores, privilegiando a dignidade da pessoa humana,
realizando verdadeira revolução no Direito de Família, a partir de três eixos
básicos’. Assim, o art. 226 afirma que a entidade familiar é plural e não mais
singular, tendo várias formas de constituição. O segundo eixo transformador
‘encontra-se no parágrafo 6º do art.227. É a alteração do sistema de
filiação, de sorte a proibir designações discriminatórias decorrente do fato
de ter a concepção ocorrida dentro ou fora do casamento’. A terceira grande
revolução situa-se nos ‘artigos 5º, inciso I, e 226, par. 5º. Ao consagrar o
princípio da igualdade entre homens e mulheres, derrogou mais de uma
17
centena de artigos do Código Civil de 1916.

O Direito precisa evoluir com a sociedade, obviamente, inclusive para ser


digno dela e a evolução que a Constituição representou irradiou seus efeitos em
toda a legislação brasileira, de modo que já não cabia mais a antiga visão de família,
que tratava de modo diferenciado aqueles que viviam em situação de igualdade na
prática, tais como cônjuges e companheiros ou filhos naturais e por adoção.
Assim, hoje é possível que se fale em “famílias”, das mais diversas
origens, que será tratado oportunamente no decorrer deste trabalho, e de muitos
direitos concedidos àqueles que estavam à margem da proteção, como se não
existissem. Também por isso se diz “Constituição Cidadã”.
Assim, foram muitas as transformações que sofreu esse ramo, não
apenas o conceito de família. Elas influenciaram todo o Direito relacionado ao tema,
trazendo novas interpretações, ou mesmo exigindo extinção de leis antigas e o
surgimento de novas.

17
GONÇALVES, C. R. Direito Civil Brasileiro – Direito de Família. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 33.
19

A Constituição como Lei Suprema deve funcionar como farol a guiar o


Estado ao caminho que se deseja construir. Por isso, as Leis infraconstitucionais
precisam ser compatíveis com seus ditames, sob pena de serem extirpadas do
ordenamento jurídico. E como a Dignidade da Pessoa Humana é o princípio que
fundamenta todo o texto, também foi ela, em consonância com os demais princípios
constitucionais ligados ao Direito de Família quem retiraram a família do plano
biológico, em que se identificava pelos laços de sangue e pelo casamento,
passando-a ao plano afetivo, em que uma família pode se formar apenas com um
dos ascendentes (família monoparental) ou com pessoas do mesmo sexo com
intenção de ter uma vida em comum (família homoafetiva), por exemplo.
São os laços de afinidade que ligam os companheiros; os pais com os
filhos, não mais “ilegítimos”, “bastardos” ou “adotados”, mas tão somente “filhos”. Daí
se dizer que a afinidade assumiu um papel preponderante nessa família
constitucionalizada, em que não se admite mais discriminações.

2.5 Do Direito das Famílias - Princípios

Todos os ramos do Direito são informados por princípios. A maioria deles


é de origem constitucional, o que significa que eles têm uma força normativa
superior e que todas as normas infraconstitucionais precisam estar em concordância
com seus ditames.
O princípio nada mais é que uma norma de caráter geral que embasa as
demais normas ou regras. São eles que sustentam tais regras, que lhes dão o
alicerce. Segundo Canotilho e Moreira, apud Silva18 “os princípios são ordenações
que se irradiam e imantam o sistema de normas, são (como observam Gomes
Canotilho e Vital Moreira) núcleos de condensações nos quais confluem valores e
bens constitucionais”.
O conceito acima citado refere-se especificamente aos princípios
constitucionais, mas de fato, mesmo aqueles cuja origem não é constitucional
também confluem valores e bens considerados essenciais à sociedade e as demais
normas, não principiológicas, precisam com eles se coadunarem.

18
SILVA, J. A. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 87.
20

O Direito de Família também como os demais ramos, sofre uma extrema


modificação, no sentido da constitucionalização de suas normas jurídicas, de modo
que os princípios constitucionais nunca foram tão valorizados como nos últimos
anos. Torna-se fundamental estudá-los e entender suas relações com o tema do
presente trabalho, portanto.
Dentre os inúmeros princípios ligados ao Direito de Família, alguns são
essenciais à pesquisa que ora se desenvolve. Daí a opção em se tratar aqueles que
possuem tal relação.

2.5.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana é antes de tudo, um


macroprincípio constitucional que irradia seus efeitos a todo o ordenamento jurídico
e não seria coerente que não se fizesse sentir no Direito de Família. Segundo Dias:

O novo modelo de família funda-se sobre os pilares da repersonalização, da


afetividade, da pluralidade e do eudemonismo, impingindo nova roupagem
axiológica ao direito de família. Agora, a tônica reside no indivíduo não mais
nos bens ou coisas que guarnecem a relação familiar. A família-instituição
foi substituída pela família instrumento, ou seja, ela existe e contribui tanto
para o desenvolvimento da personalidade de seus integrantes como para o
crescimento e formação da própria sociedade, justificando, com isso, a sua
19
proteção pelo Estado.

O meio familiar, portanto, é que garante ao ser humano, ou deveria


garantir apoio e proteção ao livre desenvolvimento dessa personalidade. É por isso
que não se permite designações discriminatórias aos filhos, preconceito e
desigualdades em relação às questões patrimoniais, inclusive no âmbito da
sucessão.
O mesmo se pode dizer em relação à esposa ou companheira. Quando
casada ou como convivente, ao lado daquele a quem escolheu para formar sua
família, deve ter garantida a manutenção da situação financeira que antes gozava.
A verdade é que muitas mulheres dependem financeiramente de seus
maridos e companheiros, e mesmo que não seja assim, a renda e o patrimônio
daquele contribuíam de alguma forma para sua manutenção, de modo que seria
indigno que, como ser humano, após ter estado lado a lado com tal pessoa não

19
DIAS, M. B. Manual de Direito das Famílias. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 43.
21

tivesse direito aos bens do outro. Não seria, portanto, compatível com a Dignidade
da Pessoa Humana que além de perder aquele que provia ou colaborava na
manutenção do lar, ainda sofra um prejuízo financeiro dessa ordem.
Nesse sentido, dar à companheira, que vive como se casada fosse, o
direito à sucessão é respeitar o Princípio da Dignidade Humana, conferir-lhe o direito
de ser tratada como pessoa, como ser humano.

2.5.2 Princípio da Função Social da Família

Muito se fala da função social da propriedade, do contrato e de outros


ramos ligados a questões meramente financeiras. Mas a família também tem sua
função social. Como já se afirmou, é em seu seio que o ser humano pode
desenvolver plenamente sua personalidade. Daí a importância da proteção a essa
instituição. Nesse sentido, destaca Fiúza:

A família desempenha uma função, qual seja, de amparo ao


desenvolvimento da pessoa. Já o princípio da função social da família dita
que esta função social deverá ser preservada, a fim de garantir a cada um
dos membros da família a possibilidade de desenvolver sua personalidade.
20

Imagine-se nesse caso, a situação em que pai e mãe são apenas


companheiros. A criança precisa de saúde, educação, moradia e lazer, dentre
outros. Nesse sentido, negar à mãe a sucessão é negar ao filho a parte que lhe
caberia quando esta viesse a falecer, é negar a ele muitas possibilidades que teria
caso seu pai se mantivesse vivo. Não faz nenhum sentido que ela não possa
suceder o “de cujus” pelo simples fato de não haver um documento comprovando o
que, de fato, existe.
Mesmo em se tratando de um casal sem filhos, é direito dos
companheiros a sucessão, ou essa família, a qual se nega tal “status” não estariam
exercendo sua função social de proteção, amparo e acolhimento dos membros
protegidos de intervenções externas. A partir do momento em que existe uma
família, seja ela matrimonializada ou não, é preciso que seja protegida e
assegurados os seus direitos.

20
FIÚZA, C. Direito Civil – Curso completo. Vol. Único. Belo Horizonte: Del Rey, 2014, p. 1180.
22

2.5.3 Princípio da Afetividade

Para Fiúza21 a afetividade não pode ser alçada à condição de princípio,


uma vez que “afeto é sentimento” e ninguém pode ser obrigado a sentir afeição por
quem quer que seja. Para ele, embora ela mereça atenção jurídica não pode ser
considerada uma norma principiológica.
Porém, não é o que pensa Dias. Para a autora “afetividade não apenas é
um princípio, mas é o princípio norteador do direito das famílias”. 22 É possível
concordar com ela. A família deve ser um núcleo de afeto e proteção, o que não
significa que caso não haja afeto não se pode considerar que exista família. Mas
negar sua importância como elemento norteador do Direito de Família é
desumanizar esse ramo.
É claro que a família é o lugar em que esse afeto normalmente se
manifesta com mais força. O amor ou o afeto são de fato, sentimentos, mas quem
ama protege, acolhe e apoia, e é isso o que se espera de uma família. Daí se dizer
que a afetividade é sim um princípio que deve informar tal ramo. Destaca Dias,
ainda:

Ao serem reconhecidas como entidade familiar merecedora da tutela, as


uniões estáveis, que se constituem sem o selo do casamento, tal significa
que a afetividade, que une e enlaça duas pessoas, adquiriu reconhecimento
e inserção no sistema jurídico. Houve a constitucionalização de um modelo
de família eudemonista e igualitário, com maior espaço para o afeto e a
23
realização individual.

Nesse sentido, entendendo a afetividade como um princípio ligado ao


Direito de Família, a companheira, que agora também é entendida como parte desta,
deve ter direito à sucessão. Ora, se existe um núcleo familiar ligado pelo afeto, a
intenção de formar família não se pode negar à companheira o direito de suceder o
“de cujus”. Assim, esse princípio também é muito importante a essa questão.

2.5.4 Princípio da Solidariedade

21
FIÚZA, C. Direito Civil – Curso completo. Vol. Único. Belo Horizonte: Del Rey, 2014, p. 1187.
22
DIAS, M. B. Manual de Direito das Famílias. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 70.
23
Idem Ibidem, p. 70.
23

Segundo esse princípio, os membros de uma família devem prestar


assistência uns aos outros. Segundo Dias:

Solidariedade é o que cada um deve ao outro. Esse princípio que tem


origem nos vínculos afetivos, dispõe de acentuado conteúdo ético, pois
contém em suas entranhas o próprio significado da expressão
solidariedade, que compreende a fraternidade e a reciprocidade. A pessoa
só existe enquanto coexiste. O princípio da solidariedade tem assento
constitucional, tanto que seu preâmbulo assegura uma sociedade fraterna.
Também ao ser imposto aos pais o dever de assistência aos filhos (CF229),
consagra o princípio da solidariedade. O dever de amparo às pessoas
idosas (CF230) dispõe do mesmo conteúdo solidário.
A lei civil igualmente consagra o princípio da solidariedade ao dispor que o
casamento estabelece plena comunhão de vidas (CC 1.511). Também a
obrigação alimentar dispõe deste conteúdo (CC 1.694). Os integrantes da
família são, em regra, credores e devedores de alimentos. A imposição de
obrigação entre parentes representa a concretização do princípio da
24
solidariedade familiar.

Ora, se eles têm direito a pedir alimentos ao outro quando formam uma
família, muito mais terão de sucedê-lo em caso de morte daquele. Seria incoerente
dizer ou pensar o contrário. Daí ser esse princípio caro a essa pesquisa.

2.5.5 Princípio do Pluralismo

Por força de princípios como o da afetividade, que permite reconhecer


como família núcleos de afeto entre duas ou mais pessoas, sendo elas do mesmo
sexo, um dos ascendentes com seus descendentes, irmãos sem a presença do pai
ou da mãe, é que se pode falar em família plural. Mas nem sempre foi assim, e de
acordo com Fiúza:

Até muito recentemente, a família era objeto de estrito enquadramento


jurídico, moral e religioso. Só se considerava família legítima aquela
constituída pelo casamento. Mesmo a família em sentido mais amplo,
constituída pelos parentes ligados por um vínculo ancestral comum, mesmo
25
essa família só seria legítima se permeada pelas justas núpcias.

A legitimidade da família, portanto, era conferida pelo casamento. Fiúza


ainda destaca que foi a Constituição Federal de 1988 que consagrou a família plural

24
DIAS, M. B. Manual de Direito das Famílias. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 66-67.
25
FIÚZA, C. Direito Civil – Curso completo. Vol. Único. Belo Horizonte: Del Rey, 2014, p. 1182.
24

“desvinculando a célula familiar do casamento e admitindo expressamente outras


modalidades de família.”26
Portanto, perceber a diversidade de possibilidades de constituição de um
núcleo familiar é de grande importância, inclusive no que se refere à união estável.
Família hoje não é mais sinônimo de casamento, ao contrário, ela se estende para
muito além dele. E foi a Constituição Federal quem promoveu esta mudança.
Segundo Dias:

Desde a Constituição Federal, as estruturas familiares adquiriram novos


contornos. Nas codificações anteriores, somente o casamento merecia
reconhecimento e proteção. Os demais vínculos familiares eram
condenados à invisibilidade. A partir do momento em que as uniões
matrimonializadas deixaram de ser reconhecidas como a única base da
sociedade, aumentou o espectro da família. O princípio do pluralismo das
entidades familiares é encarado como o reconhecimento pelo Estado da
existência de várias possibilidades de arranjos familiares.
Como as uniões extramatrimoniais não eram consideradas de natureza
familiar encontravam abrigo somente no direito obrigacional, sendo tratadas
27
como sociedades de fato.

O que a Constituição Federal de 1988 fez, como deveria, foi reconhecer


um fato comum e notório que já fazia parte da vida prática das pessoas, retirando
essa família da seara do direito obrigacional e passando-a verdadeiramente ao
direito de família e ao das sucessões, objeto do presente trabalho. Assim, se a
própria Constituição Federal reconhece a união estável como entidade familiar, seria
incoerente que o legislador infraconstitucional proibisse à companheira os mesmos
direitos que a família matrimonializada teria.

2.5.6 Princípio da Igualdade com Respeito à Diferença

Homens e mulheres são iguais em direitos e também em deveres. A


Constituição o estabelece. Mas é preciso lembrar que essa igualdade não deve ser
meramente formal. Nesse sentido, é preciso tratar os iguais como iguais, mas os
desiguais como tal, na medida em que se desigualam. Essa norma que estabelece a
ideia de Isonomia foi pensada por Aristóteles, há muitos séculos e ainda hoje é
extremamente válida.

26
Idem Ibidem, p.1182.
27
DIAS, M. B. Manual de Direito das Famílias. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais 2010, p. 67.
25

Assim, se a situação de fato é semelhante ao casamento, não há porque


tratar a união estável de maneira distinta. É preciso respeitar as diferenças, mas se
existe a intenção de formar família, não há por que não reconhecer como família.

2.5.7 Princípio da Proteção Integral às Crianças, Jovens e Idosos e Princípio da


Proibição de Retrocesso Social

Levando-se em conta esse princípio da proteção às crianças, jovens e


idosos, seria absoluto retrocesso não conceder à companheira e mesmo ao
companheiro, o direito à sucessão, pois se estaria, como já se disse, negando aos
filhos o direito ao que caberia a sua mãe. Não pode haver discriminação e a
Constituição já reconhece a união estável como entidade familiar.
A proibição de retrocesso social diz respeito aos avanços alcançados
pelas normas do país, em especial os avanços no sentido constitucional. Leis que
firam essas regras e princípios são leis que tentam retroceder e instalar o antigo
estado de coisas.
Segundo Lhering28, todos os direitos foram alcançados com muita luta. Os
direitos humanos e os princípios hoje insculpidos na Constituição também o foram. É
preciso lutar por eles, impedir o retorno à barbárie, ao tempo em que cada um
precisava na medida de suas forças, fazer valer seus direitos.
O desenvolvimento da sociedade atual não permite retrocessos, ainda
mais quando se trata de suprimir tais direitos. Assim, a companheira que forma
entidade familiar, tanto quanto a esposa deve sim ter, e continuar tendo, direito a
suceder o “de cujus”. Isso é humano, digno e por isso mesmo, constitucional.

2.6 Das “novas” entidades familiares

Em primeiro lugar é preciso explicar as aspas no título deste subitem. Diz-


se novas entidades familiares, mas elas não são tão “novas” assim, ao contrário. A
união entre homem e mulher, famílias compostas por apenas um dos ascendentes
com seus descendentes, famílias de irmãos convivendo sozinhos no mesmo lar,

28
LHERING, R. V. A Luta pelo Direito. São Paulo: Martin Claret, 2002.
26

famílias homoafetivas, etc., sempre existiram. O que ocorria é que não eram tidas
como tal, não tinham respaldo jurídico como entidades familiares, de fato.
Assim, o que se faz hoje especialmente em função da gama de princípios
supracitada, é assegurar e reconhecer tais entidades e dar-lhes proteção legal.
Nesse sentido, algumas das não tão “novas” entidades familiares são as
mencionadas a seguir.

2.6.1 Família monoparental

A família monoparental é aquela composta por um dos ascendentes e


seus filhos. Comum e muito antiga, sofria discriminações. Composta normalmente
pela mãe e seus filhos, fosse pela morte do companheiro ou por abandono, essa
família era, em geral, mal vista socialmente. Dizia-se “mãe solteira” quando não
precedia o casamento e ficava a mulher impedida de colocar no filho o nome do pai
(filho natural) e no campo religioso, até de batizar a criança.
Essa discriminação seja a família monoparental precedida ou não de
matrimônio já não é possível, e o reconhecimento e proteção a esse núcleo são os
mesmos conferidos às demais entidades familiares.

2.6.2 Família homoafetiva

De todos os tipos de família, a homoafetiva, sempre foi e pode-se dizer


que ainda é a mais massacrada pela discriminação. O afeto que liga as duas
pessoas e a intenção de uma vida em comum eram simplesmente desprezados,
especialmente quando se tratava do campo patrimonial.
Era muito comum que os companheiros homoafetivos passassem uma
vida juntos, constituíssem patrimônio, e que depois da morte de um deles, o outro
não tivesse qualquer direito patrimonial sobre a herança, já que não se considerava
“família” e quem acaba sucedendo eram os ascendentes, os quais, muitas vezes,
devido a questões de preconceito, os havia rejeitado sempre.
O primeiro grande avanço foi considerar que houvesse uma relação
jurídica entre eles, como um contrato, o que permitiu que o outro tivesse acesso aos
bens do companheiro. Mas hoje a situação está resolvida juridicamente, permitindo-
se e reconhecendo-se a união entre eles. É claro que o avanço jurídico ainda
27

precisa se refletir em um avanço social, porque grande parte da sociedade ainda


não admite e reconhece que pessoas homoafetivas possam formar uma família, ter
ou adotar filhos, casar-se, formar união estável, etc.
Portanto, por mais que se note uma modificação no campo da legislação,
ainda muito precisa ser feito no sentido de respeito à diversidade familiar, de modo a
garantir a todos um tratamento justo e igualitário.

2.6.3 Família anaparental

A família anaparental é aquela formada pelos irmãos no mesmo lar, sem


os pais. Em uma sociedade capitalista, em que nem todos têm acesso à compra da
sua moradia, ou mesmo por uma questão de afetividade que liga aquela família,
também é comum que se veja irmãos dividindo o mesmo lar, levando uma vida em
comum em que todos se auxiliam uns aos outros, como verdadeira família que são.
O reconhecimento dessa entidade familiar também é recente. O que se
há de levar em conta é a ideia de família que deve existir entre os membros de uma
entidade familiar. Quem deve dizer se formam ou não uma família são essas
pessoas.
Assim, não importa o tipo de família, o que importa é a relação que liga
esses entes, que os faz reconhecer-se como tal. Ademais, toda entidade familiar
matrimonializada ou não deve ser protegida.
28

3 DA UNIÃO ESTÁVEL

3.1 Conceito

Segundo Bitencourt, apud Fiúza29, a união estável é a “convivência


pública, contínua e duradoura sob o mesmo teto ou não, entre duas pessoas
naturais não ligadas entre si pelo casamento, com a intenção de constituir família”.
Por esse conceito é possível depreender alguns elementos fundamentais
para que se possa falar em União Estável, quais sejam: publicidade, continuidade no
tempo e intenção de formar família. É possível assim, que duas pessoas tenham,
por exemplo, um filho e, no entanto não exista o desejo de convivência mútua,
formando uma família.
Como já se disse, “família” pressupõe afetividade. Nesse caso, a intenção
de ter uma vida em comum ajuda a configurar essa situação.
Não se exige para a configuração da união estável o documento
comprovando tal laço, uma vez que havendo na prática os elementos supracitados
já está caracterizada a relação. Nada impede, porém, que os companheiros decidam
até para se resguardarem legalmente a constituição de tal documento.
Interessante também notar no conceito do ilustre autor, a não obrigação
de convivência sob o mesmo teto, mas também há que se diferenciar a união
estável do namoro ou do noivado; já que ali é necessária a intenção de constituir
família, desde logo. Nesse sentido, e reconhecendo a dificuldade de caracterizá-la,
quando não existe a convivência comum idêntica ao do casamento, assim afirma
Fiuza:

Pode haver, portanto, união estável sem que haja coabitação e vida idêntica
à do casamento, embora deva estar presente a intenção de constituir
família. Esta intenção traduz-se na vontade de viver juntos, compartilhando
o dia a dia, criando uma cumplicidade, uma comunhão de vida, amparando-
se e respeitando-se reciprocamente. Na vida prática, é difícil, porém,
caracterizar a união estável sem o mos uxórios, exatamente dada esta
30
intenção de constituir família, exigida pelo Código Civil.

29
FIÚZA, C. Direito Civil – Curso completo. Vol. Único. Belo Horizonte: Del Rey, 2014, p. 1220.
30
Idem Ibidem, p. 1221.
29

Assim, a união estável se caracteriza em regra, pela relação contínua,


duradoura e pública entre pessoas que não sejam casadas e que tenham intenção
de constituir família; vivendo uma vida em comum. Por mais que se diga que não é
preciso a convivência sob o mesmo teto, é difícil até para o companheiro conseguir
comprová-la sem que isso tenha ocorrido.
Ademais, para que se configure união estável, não deve existir qualquer
impedimento à conversão ao casamento, ou seja, nenhum deles deve ser casado
com outra pessoa, nem podem ser irmãos, ou parentes na linha reta, dentre outros.
Contudo, os tribunais vêm aceitando, em conformidade com o Código Civil, que
mesmo quando um dos companheiros ainda está casado oficialmente, mas
separado na prática, convivendo e constituindo família com um terceiro; que se fale
em união estável entre estes, especialmente para fins previdenciários ou de
sucessão. É o que diz o julgado abaixo:

RMS 30414 / PB RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE


SEGURANÇA 2009/0173443-9 Relator(a) Ministra LAURITA VAZ (1120)
Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA Data do Julgamento 17/04/2012 Data
da Publicação/Fonte DJe 24/04/2012
Ementa
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RECONHECIMENTO
DE CONCUBINATO. EXTENSÃO DA RES JUDICATA À ADMISSÃO DE
UNIÃO ESTÁVEL. IMPOSSIBILIDADE. LIMITES OBJETIVOS DA COISA
JULGADA. PEDIDO E CAUSA DE PEDIR. SERVIDOR PÚBLICO
ESTADUAL FALECIDO. PENSÃO POR MORTE. RATEIO ENTRE VIÚVA E
CONCUBINA. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
1. A coisa julgada contida no dispositivo da decisão judicial transitada em
julgado está delimitada pelo pedido e pela causa de pedir apresentadas na
petição inicial do processo de conhecimento.
2. Conquanto somente o dispositivo da sentença seja abarcado pela coisa
julgada material, é certo que os efeitos da res judicata apenas se abatem
sobre as matérias cujos contornos fáticos e jurídicos tenham sido
efetivamente examinados e decididos pelo Poder Judiciário de forma
definitiva.
3. Na peça vestibular da ação de reconhecimento de concubinato não
foi veiculado qualquer pedido no sentido de que restasse declarada a
existência de união estável; e também não consta do decisum transitado em
julgado nenhum consideração, apreciação de prova ou
desenvolvimento de tese jurídica que tivesse por objetivo alicerçar
conclusão nesse sentido.
4. No caso de pensão por morte, é possível o rateio igualitário do benefício
entre a ex-esposa e a companheira de servidor falecido.
5. O reconhecimento da união estável pressupõe a inexistência de
impedimentos para o casamento.
6. A vigência de matrimônio não é empecilho para a caracterização da união
estável, desde que esteja evidenciada a separação de fato
entre os ex-cônjuges, o que não é a hipótese dos autos.
7. O concubinato não pode ser erigido ao mesmo patamar jurídico da união
estável, sendo certo que o reconhecimento dessa última é condição
30

imprescindível à garantia dos direitos previstos na Constituição Federal e na


legislação pátria aos companheiros, inclusive para fins previdenciários.
8. Recurso ordinário em mandado de segurança conhecido e provido.

No julgado acima, o Tribunal entende que se deve ratear de maneira


igualitária a pensão deixada pelo servidor público entre a companheira e a ex-
esposa, uma vez que existe nesse caso, separação de fato entre os cônjuges e a
formação de uma nova família com a companheira. Nesse sentido é interessante
destacar o trecho do julgado em que se afirma que “o matrimônio não é empecilho
para a caracterização da união estável”.
É o que pensa, por exemplo, Maria Berenice Dias 31 quando afirma que é
a comunhão de vidas, a afetividade que define as relações familiares e não o
documento em si. Valoriza-se assim, a prática em detrimento da ficção jurídica, já
que o laço do matrimônio apenas subsiste no papel.
Essa é a grande novidade trazida pelo Código Civil, a possibilidade de
haver união estável quando um dos companheiros está separado de fato da ex-
esposa (o). É o que afirma Fiuza:

Segundo a Lei 8.971/94, os companheiros somente teriam proteção legal se


fossem solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos. Em outras
palavras, a Lei só reconhecia e protegia o chamado concubinato puro ou
união estável. O concubinato impuro continuaria sendo condenável.
O Código Civil permite a união entre pessoas solteiras, viúvas, divorciadas,
separadas judicialmente ou separadas de fato. A grande novidade em
relação à Lei 8.971/94 é a possibilidade de pessoas separadas de fato
32
constituírem união estável válida.

Contudo, subsiste a impossibilidade de configuração de união estável,


segundo Fiúza nos casos de “impedimentos dirimentes públicos, especificamente
incesto, bigamia e homicídio”. 33

3.2 Histórico

Segundo Gonçalves a união entre homem e mulher, sem o laço do


matrimônio, foi denominada por muito tempo, simplesmente “concubinato”. Não

31
DIAS, M. B. Manual de Direito das Famílias. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.
32
FIÚZA, C. Direito Civil – Curso completo. Vol. Único. Belo Horizonte: Del Rey, 2014, p. 1221.
33
Idem Ibidem, p. 1221.
31

havia a denominação “companheiros”, mas, como já se disse apenas essa


denominação, que por si já é discriminatória e pejorativa.
A visão religiosa do casamento e também tradicional, entendia-o como
entidade sagrada, dizendo-se comumente inclusive, que os cônjuges se tornam um
só. Assim, a relação amorosa com aparência de casamento, mas sem o devido
formalismo que o matrimônio exige, era tida como espúria avessa à moral, e por isso
mesmo, indigna de proteção legal.
O próprio Código Civil de 1916 não admitia esse tipo de relação. Segundo
Gonçalves34, não se permitiam doações ou benefícios testamentários, em especial,
o homem casado à sua concubina, mesmo havendo separação de fato.
A concubina, portanto, até então não havia o conceito “união estável”,
ficava em uma situação de desproteção legal, pois a própria Lei não lhe conferia
direitos de ordem patrimonial.
Tudo isso, porém se modificou. A sociedade evoluiu e com ela também a
forma de se encarar tal relação. A própria Constituição Federal defende a Dignidade
da Pessoa Humana, protegendo a pessoa de ser tratada de maneira discriminatória.
Em relação, por exemplo, aos filhos proíbem-se quaisquer discriminações entre eles.
Desse modo, negar à mãe deles, convivente ou companheira de seu pai, é negar o
direito deste à parte que caberia a ela, a qual eles teriam direito na ocasião de sua
morte (da mãe).
O passo maior em relação ao concubinato, que fez nascer a união estável
protegida e assegurada, foi dado pela Constituição Federal de 1988, seguida pelo
Código Civil de 2002, reconhecendo-a como entidade familiar, o que será analisado
no próximo item.

3.3 Legislação pertinente – Da visão da União Estável no Código Civil de 1916,


na Constituição Federal de 1988, nas Leis 8.971/94, 9.278/96 e no Código Civil
de 2002

Para o Código Civil de 1916, família confundia-se com casamento.


Somente este instituto era capaz de determinar se havia ou não uma entidade
familiar. A família era, portanto, patriarcal e hierarquizada. A ideia de afetividade,

34
GONÇALVES, C. R. Direito Civil Brasileiro – Direito de Família. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 603.
32

família socioafetiva somente veio a ser considerada modernamente conforme


Gonçalves35.
Assim, enquanto o Código de 1916 trazia a mulher em situação de
submissão e dependência em relação ao homem, a Constituição de 1988 trouxe
inúmeras modificações no campo do Direito de Família, incluindo em seu artigo 226
a noção de igualdade entre o casal, estabelecendo em seu § 5º que: “os direitos e
deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e
pela mulher.” Ademais a Constituição se pautou no princípio da Dignidade da
Pessoa Humana, preocupou-se com o planejamento familiar e com a assistência à
família.
A primeira norma que surgiu no intuito de regulamentar melhor o que
estabeleceu a Constituição Federal de 1988 acerca da união estável, foi a Lei nº
8.971 de 1994. Logo em seu art. 1º, a Lei estabelecia que:

Art. 1º A companheira comprovada de um homem solteiro, separado


judicialmente, divorciado ou viúvo, que com ele viva há mais de cinco anos,
ou dele tenha prole [...] Parágrafo único. Igual direito e nas mesmas
condições é reconhecido ao companheiro de mulher solteira, separada
36
judicialmente, divorciada ou viúva.

Nota-se que para que se falasse em união estável, era preciso comprovar
estado de não casado cinco anos ininterruptos de relacionamento ou prole do outro.
Porém, em relação ao direito sucessório, chama a atenção os artigos 2º e
3º da mesma Lei, em que situação excepcional é aquela em que a companheira ou
companheiro recebe a totalidade da herança deixada pelo “de cujus”. Segundo a
íntegra desses artigos:

Art. 2º As pessoas referidas no artigo anterior participarão da sucessão


do(a) companheiro(a) nas seguintes condições:
I - o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito enquanto não constituir
nova união, ao usufruto de quarta parte dos bens do de cujos, se houver
filhos ou comuns;
II - o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito, enquanto não constituir
nova união, ao usufruto da metade dos bens do de cujos, se não houver
filhos, embora sobrevivam ascendentes;
III - na falta de descendentes e de ascendentes, o(a) companheiro(a)
sobrevivente terá direito à totalidade da herança.

35
Idem Ibidem, p.33.
36
BRASIL. Constituição Federal (1988). 2016.
33

Art. 3º Quando os bens deixados pelo(a) autor(a) da herança resultarem de


atividade em que haja colaboração do(a) companheiro, terá o sobrevivente
37
direito à metade dos bens.

Portanto, a regra era que apenas teria direito à metade dos bens do autor
da herança se aquele com quem convivia comprovasse haver participado na
constituição desses bens.
No restante das hipóteses o direito é apenas de usufruto, assim mesmo
de apenas uma quarta parte ou da metade, enquanto não sobreviesse nova relação
conjugal, respectivamente diante da existência ou não de filhos. A totalidade da
herança somente era possível diante da inexistência de filhos e também de
ascendentes do “de cujus”.
O que se percebe pela leitura dessa Lei é que o companheiro não está
hierarquicamente no topo de uma ordem de preferência na sucessão, ao contrário,
apenas é beneficiado com a totalidade da herança na ausência de outros parentes
na linha reta.
Outra Lei que vale a pena ser citada é a nº 9.278 de 1996. Nesta Lei e
levando-se em consideração os já mencionados artigos que definem a união estável
e estabelece a questão dos bens, importante destacar os artigos 1º e 5º, quais
sejam:

Art. 1º É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura,


pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo
de constituição de família.
Art. 5° Os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por ambos os
conviventes, na constância da união estável e a título oneroso, são
considerados fruto do trabalho e da colaboração comum, passando a
pertencer a ambos, em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação
38
contrária em contrato escrito.

Como se vê, a primeira mudança trazida por esta Lei foi acerca da
duração do relacionamento que já não é mais de cinco anos. Basta que seja
duradoura, pública e contínua e que haja a intenção de formar família. Além disso,
os bens adquiridos durante a relação, a título oneroso desde que não sejam
produtos de bens adquiridos anteriormente à relação, são contabilizados como do
casal, ou seja, presume-se esforço mútuo.

37
Idem Ibidem.
38
BRASIL. Constituição Federal (1988). 2016.
34

A lei não trata especificamente da sucessão, mas tão somente do caso


em que sobrevindo à morte o companheiro sobrevivente tem direito de habitação.
Mas é de se pressupor o direito à sucessão, obviamente, se a própria Lei presume
que o patrimônio foi obtido em esforço comum do casal.
Por fim, o Código Civil de 2002 revogou as supracitadas Leis nº 8.971/94
e nº 9.278/96, por tratar da mesma matéria. Na parte do direito das sucessões o
referido Código estabeleceu como se dará a sucessão do companheiro, dispondo
que:

Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do


outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união
estável, nas condições seguintes:
I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à
que por lei for atribuída ao filho;
II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a
metade do que couber a cada um daqueles;
III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da
herança;
IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.
39

Como se vê na sucessão o companheiro participa da sucessão dos bens


adquiridos onerosamente durante a vigência da união estável e pode receber a
totalidade do montante caso não haja outros parentes que possam suceder. De
qualquer forma, não se fala em usufruto, mas em direito à herança. Pelo que se
pode perceber, também se presume a participação dos companheiros dos bens
adquiridos a título oneroso.

3.4 Requisitos legais para a configuração da União Estável

Segundo Gonçalves, a união estável se distingue do casamento, em


especial, pela “ausência de formalismo para a sua constituição”. Segundo ele:
“Enquanto o casamento é precedido de um processo de habilitação, com publicação
dos proclamas e de inúmeras outras formalidades, a união estável, ao contrário,
independe de qualquer solenidade, bastando o fato da vida em comum” 40.

39
BRASIL. Código Civil (2002). 2016.
40
GONÇALVES, C. R. Direito Civil Brasileiro – Direito de Família. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 611.
35

Portanto, é a vida em comum do casal que estabelece a união estável


entre eles, sem as formalidades que o matrimonio exige. É claro, porém, que para
que se reconheça tal relação não deve haver os impedimentos já mencionados, tais
como incesto ou homicídio (quando o homicida matou o marido da companheira),
por exemplo.
O que pode parecer uma vantagem, que é a ausência do formalismo,
apresenta uma grande desvantagem, segundo o autor, que é provar a existência do
vínculo, se não há documento que lhe dê veracidade jurídica, desde logo. O ideal é
que, mesmo em se tratando de união estável, os companheiros providenciem uma
documentação que o comprove, o que hoje já é possível. Mas quando, de fato, esse
documento não existe há de se buscar os meios de fazê-lo.
Interessante o que afirma Zeno Veloso acerca da união estável, a respeito
de quando é possível, na ausência de documento, afirmar que já existe entre um
casal a chamada “união estável”. Segundo Veloso, apud Gonçalves:

A sucessão de fatos e de eventos, a permanência do relacionamento, a


continuidade do envolvimento, a convivência more uxorio, a notoriedade,
enfim a soma de fatores subjetivos e objetivos que, do ponto de vista
41
jurídico, definem a situação.

Nesse sentido, Gonçalves promove uma distinção entre o que chama


“pressupostos de ordem subjetiva” e “pressupostos de ordem objetiva”, que
compõem os pressupostos gerais para que se diga que entre um casal existe de fato
união estável.

3.4.1 Pressupostos de Ordem Subjetiva

Dois são os pressupostos de ordem subjetiva, quais sejam: convivência


“more uxório” e “afectio maritalis”, expressões latinas que designam
respectivamente, a comunhão de vidas e o objetivo de formar família.
A comunhão de vidas é a busca de uma vida em comum, similar a de
pessoas casadas. Segundo Gonçalves:

41
GONÇALVES, C. R. Direito Civil Brasileiro – Direito de Família. 8. ed. São Paulo Saraiva, 2011, p. 612.
36

Envolve a mútua assistência material, moral e espiritual, a troca e soma de


interesses da vida em conjunto, atenção e gestos de carinho, enfim a
somatória de componentes materiais e espirituais que alicerçam as relações
42
afetivas inerentes à entidade familiar.

Mútua assistência, afeto, soma de interesses. Tudo isso denota a relação


existente entre os companheiros, mas para definir união estável é preciso mais que
isso, especialmente quando se leva em conta que a coabitação não é obrigatória,
embora seja comum, para o seu estabelecimento.
Nesse sentido, e na tentativa de afastar quaisquer dúvidas, afirma
Gonçalves que apenas excepcionalmente se pode conferir tal status àqueles que
não convivem sob o mesmo teto. Assim mesmo, somente é possível quando
justificável motivo profissional, contingência pessoal ou física o impeçam. Seria para
o autor motivo de insegurança jurídica que se permitisse que pessoas que não
convivem na mesma casa possam ser consideradas como companheiras uma da
outra.
O segundo pressuposto de ordem subjetiva, “afectio maritalis”, como já se
disse é à vontade, o ânimo de formar ali um núcleo familiar. Esse elemento subjetivo
da vontade ou intenção.

3.4.2 Pressupostos de Ordem Objetiva

Quanto aos pressupostos de ordem objetiva, tem-se de acordo com


Gonçalves43 a diversidade de sexos, o que é discutível nos dias atuais, tendo em
vista os relacionamentos homoafetivos; a notoriedade, que diz respeito à publicidade
da relação, ou seja, tratar-se de relação do conhecimento de todos, não sigilosa; a
estabilidade da relação ou sua duração prolongada, que antes era de cinco anos,
mas que hoje diante do silêncio da Lei, fica a cargo do juiz verificar “se a união
perdura por tempo suficiente, ou não, para o reconhecimento da estabilidade
familiar”44; continuidade, ou seja, sem interrupções; sem impedimentos matrimoniais;
e monogâmica, o que significa a existência do vínculo entre um casal.
Observados os pressupostos de ordem subjetiva e também os de ordem
objetiva, em conjunto, pode-se dizer claramente se uma relação amorosa de fato

42
Idem Ibidem, p. 612.
43
Idem ibidem, p. 615.
44
Idem Ibidem, p. 620.
37

constitui uma união estável ou apenas se trata de namoro, noivado ou outro tipo de
relacionamento distinto do primeiro.
38

4 DO DIREITO DAS SUCESSÕES

4.1 Da Sucessão – histórico e conceito de Direito das Sucessões

Em relação à etimologia da palavra “sucessão” afirma Gonçalves que:

A palavra “sucessão”, em sentido amplo, significa o ato pelo qual uma


pessoa assume o lugar de outra, substituindo-a na titularidade de
determinados bens. Numa compra e venda, por exemplo, o comprador
sucede ao vendedor, adquirindo todos os direitos que a este pertenciam. De
forma idêntica, ao cedente sucede o cessionário, o mesmo acontecendo em
todos os modos derivados de adquirir o domínio ou o direito. [...] A
expressão latina de cujus é abreviatura da frase de cujus sucessione (ou
hereditatis) agitur, que significa “aquele de cuja sucessão (ou herança) se
45
trata”.

Portanto, a sucessão patrimonial de que trata o Direito das Sucessões é a


assunção do patrimônio do outro, em virtude da morte deste. Assim, o Direito das
Sucessões é aquele ramo do Direito que se ocupa da transmissão do patrimônio de
uma pessoa quando morre para os seus herdeiros ou legatários (sendo estes os que
recebem legado do “de cujus”, via testamento).
Segundo o art.1796 do Código Civil Brasileiro vigente, “a sucessão dá-se
46
por lei ou por disposição de última vontade” . Quando inexiste um testamento a
sucessão é legal, ou seja, têm direito de suceder aqueles a quem a Lei confere tal
direito, na ordem de preferência por ela estabelecida. Tal é o caso dos filhos, da
esposa e dos ascendentes, por exemplo.
Segundo o Código ainda, em seu art. 1788:

Morrendo a pessoa sem testamento, transmite a herança aos herdeiros


legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não forem
compreendidos no testamento; e subsiste a sucessão legítima se o
47
testamento caducar, ou for julgado nulo.

Portanto, quando existe testamento, que é essa disposição de última


vontade do “de cujus”, obedece-se o que ali foi disposto, exceto se houver algum
prejuízo aos chamados “herdeiros necessários”, do que se tratará mais adiante.

45
GONÇALVES, C. R. Direito Civil Brasileiro – Direito de Família. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p.28.
46
BRASIL. Código Civil (2002). 2016.
47
Idem, art. 1788.
39

As normas referentes à sucessão se encontram positivadas no Código


Civil, como se vê e também no Código de Processo Civil, principalmente, mas há
outras normas esparsas na legislação brasileira.
Segundo Fiúza48 a transmissão de bens entre pessoas vivas é tratada
pelo Direito das Coisas. Segundo o autor, ainda, no Direito das Sucessões o objeto
“é o patrimônio do finado”, a herança por ele deixada.
Para Fiúza, nem sempre se cogitou a transmissão de bens a possíveis
herdeiros, porque originariamente os bens eram considerados coletivos ou
patrimônio de toda a comunidade. Mas quando os bens passam a adquirir um
caráter familiar, passou-se então a entender que os bens passariam do antigo para o
novo chefe da família.
Quem sucedia nesses primeiros tempos era o filho homem mais velho, o
primogênito, ficando os demais desamparados financeiramente. À mulher não se
permitia suceder. Mas, na verdade a visão era muito mais relacionada à questão
religiosa que patrimonial, de fato. Nesse sentido, segundo Fiúza:

A ideia de sucessão como a conhecemos hoje veio a surgir mesmo com o


advento da propriedade individual. Seu fundamento, porém, era, de início,
religioso e não econômico. A concepção religiosa exigia que tivesse o
defunto um continuador de seu culto, que lhe fizesse os sacrifícios
propiciatórios e lhe oferecesse o banquete fúnebre. O patrimônio era da
família, que cultuava seus antepassados, na categoria de deuses
domésticos. A sucessão era, assim, calcada no direito da primogenitura. O
primogênito sucedia ao pater familias na chefia da família e do patrimônio
49
familiar.

Portanto, o herdeiro era, antes de tudo, o que recebia a incumbência pelo


culto, aquele que daria continuidade à família, cultuando os chamados deuses
“lares” e a questão da sucessão dos bens não era o principal. É o que também se
afirma em “A Cidade Antiga” de Coulanges.
Por isso, também se fazia tanta questão de deixar herdeiros do sexo
masculino, até porque as mulheres ao se casarem, passavam a cultuar, segundo
Coulanges50, os deuses da casa de seu marido. Assim, o filho primogênito era
aquele que daria continuidade à família patrimonial e religiosamente.

48
FIÚZA, C. Direito Civil – Curso completo. Vol. Único. Belo Horizonte: Del Rey, 2014, p. 1263.
49
Idem. p. 1267.
50
COULANGES, F. A Cidade Antiga. 1. ed. São Paulo: Martin Claret, 2006.
40

O direito da primogenitura é impensável nos dias atuais, tendo em vista a


igualdade entre os filhos, proibindo-se inclusive, designações discriminatórias. A
ideia de continuidade patrimonial em si foi aos poucos substituindo a visão religiosa,
em especial, quando a acumulação patrimonial passa a ser vista como fundamental
na sociedade capitalista.
Ademais, permitir a transmissão dos bens é uma forma de se proteger os
descendentes do evento futuro e incerto que é a morte de seus ascendentes. É
preciso lembrar também que animais e coisas não podem ser herdeiros ou
legatários de patrimônios, mas nada impede que certa parte do patrimônio seja
reservada sob a condição de que aquele que o receba cuide destes.
Em relação ainda ao direito de suceder, afirma Gonçalves, que se trata de
corolário do próprio sistema capitalista, que permite a livre iniciativa e a propriedade.
Seria uma incoerência que proibisse, nesse contexto, a sucessão. Em suas
palavras:

É indubitável o interesse da sociedade em conservar o direito hereditário


como um corolário do direito de propriedade. Deve o Poder Público
assegurar ao indivíduo a possibilidade de transmitir seus bens a seus
sucessores, pois, assim fazendo, estimula-o a produzir cada vez mais, o
que coincide com o interesse da sociedade. A Constituição Federal de
1988, por isso, no art. 5º, XXII e XXX, garante o direito de propriedade e o
direito de herança.
O Código Civil de 2002 elevou o cônjuge e o companheiro a sucessores em
grau de concorrência com os descendentes e ascendentes do de cujus, em
quota-parte dependente da verificação de certos pressupostos. Assim
agindo, o legislador, como observa Giselda Hironaka, “parece ter-se
enquadrado entre aqueles que veem como fundamento do direito
sucessório não apenas o direito de propriedade em sua inteireza como
também o direito de família, com o intuito de protegê-la, uni-la e perpetuá-
51
la”.

Assim, garantir a sucessão é garantir a própria manutenção do sistema


capitalista. Não haveria por que acumular bens se não se pudesse deixá-los aos
seus.

4.2 Dos sucessores legítimos, necessários, testamentários e legatários

A sucessão legítima é aquela determinada pela Lei, em regra, quando


ocorre o falecimento de um indivíduo que possuía bens em seu nome, mas não

51
GONÇALVES, C. R. Direito Civil Brasileiro – Direito de Família. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 28.
41

deixou um testamento definindo quem herdaria o quê, ou seja, quem seriam seus
herdeiros e legatários. É o que afirma Dower:

Sucessão Legítima ocorre quando alguém, antes de morrer, não deixa


testamento sobre o destino de seus bens. Dá-se, portanto, quando o
falecido não dispõe de seus bens, deixando à própria lei a determinação de
como eles devem ser deferidos. Enfim, é a lei que prescreve as preferências
que devem prevalecer entre os parentes que deverão herdar os bens
deixados pelo de cujus, passando o patrimônio deste às pessoas indicadas
52
pela lei, obedecendo-se à ordem de vocação hereditária.

Portanto, se o próprio “de cujus” não estabeleceu em vida, a quem


gostaria de deixar seu patrimônio (respeitando é claro a parcela reservada por Lei
aos herdeiros necessários), então a Lei se ocupa em definir quem poderá sucedê-lo
na ocasião de sua morte. Na verdade, segundo Fiúza, existem 04 (quatro) situações
em que a sucessão legítima pode ocorrer:

a) quando o de cuius morrer sem testamento;


b) quando o testamento for anulado ou caducar;
c) quando o testador não dispuser da totalidade da herança, deixando
parte sem destinação no testamento;
d) quando houver herdeiros necessários, que restrinjam a liberdade de
testar à parte disponível. Havendo descendentes, ascendentes ou cônjuge
supérstite, ou seja, havendo herdeiros necessários, o testador só poderá
dispor de metade do seu patrimônio. A outra parte deverá obrigatoriamente
53
ser deixada para os herdeiros necessários.

Ora, a sucessão legítima leva em conta a unidade familiar, o direito de a


família receber parte do patrimônio deixado por aquele ente falecido. A Lei não os
desampara e nem poderia, mesmo que o falecido tenha tencionado fazê-lo.
É claro que parte do patrimônio, como já se disse, pode ser deixada a
terceiras pessoas, à escolha do testador, a seus legatários também, àqueles que
não receberiam parte desse patrimônio se não houvesse testamento.
O instrumento hábil para se fazer isso, portanto, em relação aos
herdeiros e também aos legatários, é o testamento, documento solene que leva em
conta a vontade da pessoa enquanto estava viva. Porém, não havendo testamento,
a Lei chama, conforme uma determinada ordem, as pessoas aptas a essa sucessão.

52
DOWER, N. G. B. Direito Civil; direito das sucessões. São Paulo: Nepa, 2004, p. 15.
53
FIÚZA, C. Direito Civil – Curso completo. Vol. Único. Belo Horizonte: Del Rey, 2014, p. 1280.
42

Não havendo herdeiros necessários ou previstos no testamento, e


também não fazendo a pessoa, ainda que parente, parte da ordem determinada em
Lei, o Estado recebe esses bens, tendo em vista que Ele representa toda a
coletividade.
No Brasil são chamados à sucessão apenas os parentes na linha reta ou
na colateral até o quarto grau e paga-se um tributo por esta transmissão,
progressivamente. Além disso, é importante falar dessa ordem de vocação
hereditária, já que a Lei chama à sucessão em primeiro lugar os herdeiros
denominados necessários.
Assim, há de se ter em conta que a ordem de vocação hereditária é a
relação preferencial estabelecida pela Lei, das pessoas que são chamadas a
suceder o “de cujus”. Coube à legislação dividi-las em classes. Tais classes, ou
ordem de preferência à sucessão, estão estabelecidas no Código Civil, em seu
artigo 1.829, a saber:

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:


I – Aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo
se casado com o falecido no regime da comunhão universal ou no de
separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no
regime de comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens
particulares;
II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III – ao cônjuge sobrevivente;
54
IV – aos colaterais.

Como se vê, não fala o artigo, de maneira retrógada e até contraditória à


própria Constituição, da sucessão dos companheiros. Gonçalves trata da questão e
tece uma crítica à inserção do dispositivo em local que denomina inadequado. Em
suas palavras:

Como se infere do art. 1.829, pois, defere-se a herança, em primeiro lugar,


à classe dos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente,
salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou
no da separação obrigatória de bens, previsto no art. 1.641 do mesmo
diploma. Havendo alguém que pertença à aludida classe, afastados ficam
todos os herdeiros pertencentes às subsequentes, como foi dito, salvo a
hipótese de concorrência com cônjuge sobrevivente ou companheiro (art.
1.790). Seguem-se, pela ordem preferencial, os demais contemplados pela

54
BRASIL. Código Civil (2002). 2016.
43

lei: a) os ascendentes, em concorrência com o cônjuge; b) o cônjuge


sobrevivente; e c) os colaterais. Observa-se, in casu, uma falha legislativa,
devido à falta de inserção do companheiro na referida ordem, em que
deveria estar situado ao lado do cônjuge. Os seus direitos hereditários,
todavia, embora reconhecidos, são disciplinados em local inadequado, no
capítulo das Disposições Gerais do Título I, concernente à Sucessão em
55
Geral, mais precisamente no art. 1.790[...].

Como se nota, a doutrina se dá conta do erro do legislador e chama a


atenção para o fato de que se reconhece o direito do companheiro a suceder,
embora não conste do rol dos herdeiros legítimos presentes no art. 1790.

4.3 Direito Sucessório na Legislação Atual – da sucessão do companheiro no


Código Civil de 2002

Em primeiro lugar, há que se dizer que algumas Leis anteriores ao Código


Civil de 2002 foram tacitamente revogadas, tendo em vista o fato de o Código ter se
dedicado a tratar integralmente do assunto por elas versado. Este é o caso da união
estável. Nesse sentido, segundo Gonçalves:

Restaram, porém, tacitamente revogadas as Leis n. 8.971/94 e 9.278/96 em


face da inclusão da matéria no âmbito do Código Civil de 2002, que fez
significativa mudança, inserindo o título referente à união estável no Livro de
Família e incorporando, em cinco artigos (1.723 a 1.727),os princípios
básicos das aludidas leis, bem como introduzindo disposições esparsas em
outros capítulos quanto a certos efeitos, como nos casos de obrigação
56
alimentar (art. 1.694).

Porém, a questão do direito real de habitação, apesar de não tratado pelo


novo Código, subsiste. É o que entende o autor, que afirma que críticas têm sido
tecidas nesse sentido. Afinal, seria um absurdo que, além de perder o companheiro,
o sobrevivente ainda fosse obrigado compulsoriamente a deixar o lar compartilhado
por eles.
Ainda em relação ao Código Civil, no que diz respeito à sucessão na
união estável, assim dispõe o art. 1.790 do Código Civil:

55
GONÇALVES, C. R. Direito Civil Brasileiro – Direito de Família. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 114.
56
Idem Ibidem, p. 132.
44

A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto


aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas
condições seguintes:
I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à
que por lei for atribuída ao filho;
II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a
metade do que couber a cada um daqueles;
III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da
herança;
IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.
57

Como se vê, o companheiro se encontra em uma situação de


inferioridade em relação à sucessão, primeiro porque somente teria direito aos bens
adquiridos onerosamente durante a união estável e depois em relação à
concorrência com os demais herdeiros. Gonçalves também tece críticas em relação
ao fato:

Em linhas gerais, o dispositivo restringe o direito do companheiro aos bens


que tenham sido adquiridos onerosamente na vigência da união estável; faz
distinção entre a concorrência do companheiro com filhos comuns ou só do
falecido; prevê o direito apenas à metade do que couber aos que
descenderem somente do autor da herança e estabelece um terço na
concorrência com herdeiros de outras classes que não os descendentes do
falecido; não beneficia o companheiro com quinhão mínimo na concorrência
com os demais herdeiros nem o inclui no rol dos herdeiros necessários;
concorre com um terço também com os colaterais e só é chamado a
recolher a totalidade da herança na falta destes. O cônjuge, porém, prefere
aos parentes da linha transversal, com exclusividade. Parte da doutrina
critica a disciplina da união estável no novo diploma, no tocante ao direito
sucessório, sublinhando que, em vez de fazer as adaptações e consertos
que a doutrina já propugnava, especialmente nos pontos em que o
companheiro sobrevivente ficava numa situação mais vantajosa do que a
viúva ou o viúvo, acabou colocando os partícipes de união estável, na
sucessão hereditária, numa posição de extrema inferioridade, comparada
com o novo status sucessório dos cônjuges. Outros estudiosos, todavia,
afirmam que o novo Código procura, com largueza de espírito, guindar a
união estável ao patamar do casamento civil, sem incidir em excessos, não
representando discriminação a disparidade de tratamento, mas o pleno
atendimento ao mandamento constitucional que, em momento algum,
58
equiparou a união estável ao casamento.

Ora, como é possível que cônjuge e companheiro sejam tratados de


maneira tão distinta diante da sucessão se em ambos os casos tem-se um núcleo
familiar e se a própria Constituição procura igualar os institutos? Volta-se aqui a
dizer, que apesar da série de “avanços” em relação ao reconhecimento de núcleos
familiares alheios ao matrimônio, ainda é este privilegiado em detrimento daqueles,
57
BRASIL. Código Civil. 2016.
58
GONÇALVES, C. R. Direito Civil Brasileiro – Direito de Família. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 133.
45

como sempre se fez. Em relação à questão da concorrência será tratada mais


detalhadamente no próximo capítulo, mas já é possível que se note a disparidade
existente em relação ao companheiro em detrimento de um tradicionalismo já hoje
incompatível com a realidade.

4.4 Da esposa, da companheira e da concubina no direito sucessório

A Constituição Federal de 1988 reconhece a União Estável como


entidade familiar em seu art. 226, § 3º e dispõe que a Lei deve facilitar sua
conversão em casamento. Apesar disso, cônjuge e companheiro são tratados de
maneira muito distinta.
O Código Civil de 2002 que poderia ter representado um marco no
sentido de igualar os direitos da esposa e da companheira, pelo menos no que se
refere ao Direito das Sucessões, parece não ter tido o valor de fazê-lo. Esposa e
companheira ainda são tratadas nessa seara de forma desigual, infelizmente.
Para começar, o artigo 1.790, que trata dos direitos sucessórios da
companheira não está disposto ou localizado topograficamente no mesmo título que
trata dos demais herdeiros legítimos. Daí já se nota o preconceito que permeia as
mentalidades, a ponto de o próprio legislador não ter se atentado para o fato de que
não deveria tal dispositivo fazer parte do título que se ocupa da Sucessão em Geral,
mas sim ter sido colocado juntamente com a sucessão do cônjuge. Nesse sentido,
conforme Martini, em seu artigo publicado no portal “Âmbito Jurídico”:

A impressão que o dispositivo transmite é de que o legislador teve rebuços


em classificar a companheira ou companheiro como herdeiros, procurando
evitar percalços e críticas sociais, não os colocando definitivamente na
disciplina da ordem de vocação hereditária.
Portanto, evidencia-se, logo de antemão, que os direitos sucessórios
conferidos ao companheiro nem sequer foram incluídos no Título próprio,
onde se encontra elencada toda a ordem de vocação hereditária. O
companheiro permanece segregado dos demais entes constituintes da
família que disputam a sua fração na herança. artigo publicado por Letícia
Moreira de Martini “Direito sucessório na união estável: a desigualdade
59
implantada no atual Código Civil” .

59
MARTINI, L. M. Direito sucessório na união estável a dignidade (...). In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIV, n.
94, nov. 2011. Disponível em:
<http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10767>. Acesso
em 21 set. 2016.
46

Como se vê já na disposição que o legislador dá ao artigo se nota um


tratamento desigual e sua falta de coragem para enfrentar a questão. De toda sorte,
é interessante analisar mais detidamente o art. 1790, que traz as regras para a
sucessão dos companheiros, quais sejam:

Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do


outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união
estável, nas condições seguintes:
I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à
que por lei for atribuída ao filho;
II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a
metade do que couber a cada um daqueles;
III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da
herança;
IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.
60

Como se observa, as regras que tratam da sucessão da companheira não


são as mesmas para a esposa. Nesse sentido, conforme Martini é necessário
comentar o fato de o legislador apenas ter conferido à companheira o direito de
suceder nos bens adquiridos onerosamente durante o tempo em que conviveram em
união estável. Assim, conforme Menin, apud Martini:

Tormentosas situações depreenderão desta peremptória norma, como no


caso de um companheiro que viveu durante anos ao lado de outro,
somando o afeto e dividindo as dores que decorrem de uma união
prolongada, e embora o companheiro falecido tenha amealhado diversos
bens antes da união estável, nada conseguiu auferir durante os anos do seu
relacionamento. Nessa hipótese, o companheiro remanescente não
receberá a meação e pela nova norma de direito sucessório ainda será
subtraído o seu direito à herança.
Se os bens particulares do falecido estão fora da quota hereditária do
companheiro remanescente, e se existirem, por exemplo, colaterais até
quarto grau, estes serão os parentes beneficiados com a herança, excluindo
a pessoa mais intimamente ligada ao falecido, para substituí-la por um ente
61
que, na maioria das vezes, não possui qualquer relação com o de cujus”.

Ora, se nada foi adquirido durante esse tempo, nada receberia o


companheiro, ainda que o outro fosse o provedor do lar, “nem a título de meação,

60
BRASIL. Código Civil (2002). 2016.
61
MARTINI, L. M. Direito sucessório na união estável (...).In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIV, n. 94, nov. 2011.
Disponível em:
<http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10767>. Acesso
em 21 set. 2016.
47

nem a título de herança”, afirma a autora, nem mesmo se não houver outros
herdeiros.
Imagine-se que, nesse caso, parece insólito, mas restaria ao Estado
receber os bens como herança vacante; numa total incoerência com princípios
constitucionais como a Isonomia ou a Dignidade da Pessoa Humana, por exemplo.
Outro fator bem preocupante, ao qual chama a atenção a autora é a
desnecessária confusão que parece ter cometido o legislador ao confundir herança e
meação. Ora, se o regime de bens na união estável já é o da comunhão parcial,
então a meação já lhe seria ali garantida. Não haveria, portanto, razão para dispor
que apenas o adquirido onerosamente poderia lhe ser aproveitado.
Em relação à concorrência com os demais herdeiros legítimos e
necessários, o Código também desiguala a companheira em relação à esposa, mas
o tema será tratado no próximo capítulo que se ocupará da chamada “concorrência”
na sucessão.
Já em relação à concubina, nem mesmo o que foi constituído
onerosamente durante a relação lhe caberia, pelas normas do Código Civil, a não
ser que conseguisse comprovar que já se tratava de companheira, e não mais
concubina, tendo em vista a separação de corpos com a esposa há determinado
tempo e a união de fato com ela própria; fato que não é de fácil comprovação.
48

5 O CÓDIGO CIVIL DE 2002 E O TRATAMENTO ATUAL DA SUCESSÃO NA


UNIÃO ESTÁVEL

5.1 O companheiro no Código Civil de 2002 – Da concorrência

Como já se disse, embora cônjuge e companheiro sejam ambos vistos


como entidades familiares pela própria Constituição Federal, infelizmente são
tratados de forma desigual no que toca à sucessão de bens do “de cujus”.
A companheira é prejudicada, como se verá, sendo que se fosse
observado apenas o que diz o Código Civil de 2002, poderia chegar a receber
menos bens que um primo do autor da herança, que nem intimidade com este
tivesse.
Acerca da sucessão do companheiro com os descendentes comuns e do
autor da herança e também com outros parentes nas linhas reta ou colateral, tratar-
se-á nos próximos itens.

5.1.1 Concorrência com descendentes comuns e do autor da herança

É possível que o autor da herança tenha deixado filhos, dele apenas ou


em comum com sua companheira. Nesse caso, assim dispõe o Código Civil:

Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do


outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união
estável, nas condições seguintes:
I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à
que por lei for atribuída ao filho;
II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a
62
metade do que couber a cada um daqueles;

No que toca ao primeiro inciso, o que se nota pela letra deste artigo, é
que novamente a companheira sofre um prejuízo em relação à esposa. Enquanto
esta receberia uma quarta parte mínima desta herança quando concorra com os
próprios filhos, afinal ela é ascendente deles, a companheira, diz a Lei apenas tem
direito a uma proporção equivalente à quota que couber a cada um dos filhos. Isso

62
BRASIL. Código Civil (2002). 2016.
49

significa que esse mínimo pode exceder e muito ao que caberia à esposa, pelo
simples fato de haver ali uma relação matrimonial.
Não há, como se vê, nada que justifique essa distinção a não ser o
preconceito, a falta de coragem dos legisladores para avançarem rumo à verdadeira
constitucionalização do Direito de Família. Carecem de eficácia, nesse caso, vários
princípios de ordem constitucional, o que será discutido oportunamente.
Mas como funcionaria na prática essa divisão? Imagine-se que os filhos
são comuns, ou seja, que o “de cujus” e a sua companheira sejam seus
ascendentes, ambos. Nesse caso, a situação estaria em pé de igualdade todas as
vezes que o número de filhos não excedesse a três, porque em ambos os casos
(cônjuge e companheira) em sendo um filho, a herança seria dividida com a
companheira, levando-se em conta que o patrimônio teria sido adquirido
onerosamente durante o período da União Estável.
Em sendo dois filhos ou três filhos novamente restaria idêntica a situação
da companheira em relação à esposa, porque não teriam elas direito a uma fração
inferior à quarta parte da herança. Contudo, havendo, por exemplo, 04 (quatro) filhos
a esposa continuaria recebendo a quarta parte, por ser o mínimo que pode lhe
caber, mas a companheira receberia apenas a quinta parte, por caber a ela apenas
uma parcela equivalente a que couber a cada filho. Isso significa que para cada filho
que excede a quantidade de 03 (três) menos recebe a companheira do patrimônio
do “de cujus”, enquanto a esposa mantém o valor mínimo que lhe cabe. Injusta e
extremamente desigual a situação da companheira em relação à esposa. Em
relação ao inciso II, Menin explicita mais um pouco sobre essa situação desigual em
que se encontra a companheira. Em suas palavras:

Quando os descendentes forem somente do autor da herança, ao cônjuge


será destinado quinhão igual ao daqueles, independente do seu número,
conforme interpretação do art. 1.832 do Código Civil. O companheiro, nesta
condição, perceberá apenas metade do que couber a cada descendente
(art. 1.790, II)[2]. Portanto, destas circunstâncias, pode-se inferir que
enquanto o cônjuge herda de forma equivalente aos seus descendentes
quando não é ascendente dos mesmos, tal igualdade só é conferida ao
companheiro caso ocorra a situação inversa, ou seja, quando todos os
descendentes forem também seus. Esta contradição não merece ser
acolhida no nosso ordenamento jurídico. “A sociedade deve estar segura de
que não importa a espécie de vínculo a ser escolhido, pois ambos sempre
63
estarão igualmente protegidos pelo Direito”.

63
MENIN, M. M. A Necessidade da Equiparação entre União Estável e Casamento (...). 2007. p. 286.
50

Essa situação desprivilegiada em que se encontra a companheira, para a


autora não teria respaldo na legislação brasileira, tendo em vista os princípios
constitucionais. Coube, segundo ela, à jurisprudência assegurar os direitos das
companheiras.

5.1.2 Concorrência com outros parentes

Outra situação que demonstra a situação de desigualdade em que se


encontra a companheira em detrimento à esposa é aquela em que subsistem outros
herdeiros do “de cujus”. Conforme a letra do inciso III do art. 1790, nesses casos a
companheira teria direito apenas à terça parte da herança.
Além disso, quando a Lei fala em outros parentes suscetíveis, não está
falando ela de herdeiros necessários. Tal é o caso do primo que distante do falecido,
sem ter com ele qualquer relação de afinidade, pode vir a receber mais da herança
do “de cujus” que sua companheira, a pessoa que vivia com ele na intenção de
formar família, numa comunhão de vidas, ligados os dois por laços de afeto.
Imagine-se nesse caso, só para que se proceda a uma comparação, duas
situações bem interessantes. Na primeira, a companheira concorre com um filho
comum do casal. Nesse caso, rateia-se a herança, e a cada um caberia a metade do
patrimônio acumulado.
Contudo, em outra situação, imagine-se que a companheira venha a
concorrer não com o filho, mas com outros parentes suscetíveis, tal como um primo.
Diz a letra fria da Lei que a ela caberia um terço do montante. Ora, daí se conclui
que os outros dois terços ficariam para o referido parente.
Como se vê totalmente incoerente e fora de contexto o que diz a
legislação, posto que mesmo o filho recebesse menos que um parente suscetível em
seu lugar, não sendo ele herdeiro necessário.
Como se vê apenas a jurisprudência é que pode agir para que sejam
assegurados verdadeiramente os direitos da companheira, para que não sofra ainda
mais com preconceitos e discriminações, mesmo após o falecimento do seu
companheiro.
Nesse sentido, o portal Âmbito Jurídico destaca, corroborando todo o
exposto e trazendo exemplos da jurisprudência nacional acerca do tema:
51

Nesta perspectiva, é o que destaca Menin (2007, p. 293): “[...] pode ocorrer
que aquele primo que sequer teve qualquer entrosamento afetivo com o de
cujus herde maior porção do que a pessoa que com este tenha vivido no
mais completo grau de intimidade”. [...]
Posteriormente, o Egrégio Tribunal prolatou decisão, por meio do Agravo de
Instrumento nº 70.024.715.104, o qual deliberou pela não incidência do art.
1.790, III do Código Civil, acolhendo como fundamento a consideração a ser
feita ao § 3º do art. 226 da Constituição Federal, o que confere ao
companheiro, por conseqüência, o mesmo tratamento sucessório
dispensado ao cônjuge. A ementa da decisão, relatada pelo desembargador
José Ataídes Siqueira Trindade, possui a seguinte redação:
“Agravo de Instrumento. Inventário. Companheira sobrevivente. Direito à
totalidade da herança. Parentes colaterais. Exclusão dos irmãos da
sucessão. Inaplicabilidade do art. 1.790, inc. III, do CC/02. Não se aplica a
regra contida no art. 1.790, inciso III, do CC/2002, por afronta aos
princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e de
igualdade, já que o art. 226, § 3º da CF, deu tratamento paritário ao
instituto da união estável em relação ao casamento. Assim, devem ser
excluídos da sucessão os parentes colaterais, tendo o companheiro o direito
à totalidade da herança. Recurso desprovido, por maioria.” (grifo nosso).
No mesmo sentido:
“Herança. Arrolamento de bens. Companheira. Ausência de descendentes e
ascendentes. Colaterais. Exclusão da sucessão. Não incidência do art.
1.790, III, do Código Civil. Afronta ao art. 226, § 3º, da Constituição
Federal. Tratamento sucessório do companheiro sobrevivente assemelhado
àquele do cônjuge. Inteligência dos artigos 1.829, III, e 1.838 do novo
Código Civil. Reconhecimento do direito da companheira à totalidade da
herança. Recurso provido”. (TJSP, AI nº 6.524.254.400, rel. Des. Vicentini
64
Barroso, j. 30.06.2009, (grifo nosso).

Como se nota pelo menos a jurisprudência nacional não se encontra


alheia e relação às inúmeras falhas e lacunas que o Código Civil acabou deixando
em relação aos direitos dos companheiros.

5.2 Análise crítica do direito sucessório da companheira com vistas ao


Princípio da Dignidade Humana e demais princípios da Constituição de 1988

Como já se disse, a Constituição Federal é o fundamento de validade de


todas as demais normas infraconstitucionais. Na prática, isso significa que a norma
que for incompatível com alguma das regras positivadas, ou mesmo com os
princípios depreendidos da Constituição Federal, não importa se tenha surgido antes
ou após a Carta Magna brasileira, será extirpada do ordenamento jurídico.

64
MARTINI, L. M. Direito sucessório na união estável a dignidade (...). 2015. Disponível em:
<http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10767>. Acesso
em 21 de set. 2016.
52

Nesse sentido, ainda, os princípios dispostos na Constituição Federal de


1988 possuem, pelo simples fato de terem sua origem no texto constitucional, uma
hierarquia superior em relação às demais normas.
Muitos desses princípios são fundamentais a um Estado Democrático de
Direito, outros tantos para garantir que os direitos e garantias constitucionais serão
respeitados. Dentre eles, dois se destacam, fundamentalmente, em relação à
questão do direito sucessório, quais sejam: o Princípio da Dignidade da Pessoa
Humana e o Princípio da Isonomia.
Como se viu, a companheira encontra-se em situação de prejuízo em
relação à esposa sobrevivente, tanto em relação aos bens a que ela, pela Lei, teria
direito a receber, como também quando se encontra em situação de concorrência
com outros parentes, sejam eles filhos comuns do casal, filhos apenas do cônjuge
falecido, ou mesmo outros parentes na linha reta ou colateral. Mas por que isso
ocorre?
De fato, por mais que se fale em famílias plurais, que a Constituição
tenha positivado a norma que dispõe que é entidade familiar o núcleo estabelecido
pela união estável, ainda existe muito preconceito e mesmo o legislador parece ter
uma grande dificuldade para enfrentar o problema, dado a repercussão social.
Assim, embora o Código de 2002 tenha ampliado o antigo rol dos
herdeiros tidos como “necessários”, incluindo o cônjuge, por outro lado parece ter
retrocedido ao não incluir o companheiro topograficamente no mesmo espaço, nem
ter lhe conferido os mesmos direitos. É inadmissível que o legislador o tenha
desconsiderado a tal ponto de permitir que tenha acesso apenas aos bens deixados
pelo falecido companheiro (a), que tenham sido onerosamente adquiridos durante a
constância da referida relação.
Ora, não é isso o que pensa Dias65. Para a autora o companheiro deve
ser considerado sim herdeiro necessário, tanto quanto a esposa, posto que afinal
ambos sejam casos de entidades familiares. Resta extremamente cruel e
preconceituoso entender que a esposa teria mais direitos que a companheira, uma
vez que o que diferenciaria os dois tipos de relação seria apenas o documento
comprovando que ali existe uma comunhão de vidas, posto que na prática existe nos
dois.

65
DIAS, M. B. Manual de Direito das Famílias. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 174.
53

Assim, o princípio afrontado claramente quando se aplica essa norma de


maneira isolada, sem entender o contexto que cerca a relação familiar, em que a
família, como afirma Dias é o “locus” privilegiado em que cada um pode desenvolver
plenamente suas personalidades; é, em primeiro lugar, o Princípio da Isonomia.
A isonomia manda que se tratem diferentemente aqueles que são
diferentes na medida em que se desigualam. É isso o que diz Rui Barbosa 66 em sua
obra célebre “Oração aos Moços”, mas esse desigualar não é discriminar, ao
contrário, ele serve para reequilibrar, para proteger a parte hipossuficiente e não
para diferenciar e imprimir preconceitos.
Assim, fere o legislador a Isonomia quando desiguala situações que na
prática são iguais, uma vez que a família é o núcleo de pessoas ligadas por laços de
afeto e consanguinidade e, a própria Constituição tanto reconhece como tal o grupo
familiar ligado pelo matrimônio, como também o que se produz a partir da União
Estável. Por isso mesmo, para Dias, a melhor interpretação é aquela que reconhece
o companheiro como herdeiro necessário e na falta de outros sucessores deve ele
ter acesso à integralidade do que deixou o outro.
Também não faz sentido que somente tenha direito à parcela obtida
durante a vigência da União Estável, mas o mais coerente com esse princípio da
Constituição e com os demais, é que tenha acesso à integralidade, respeitando-se a
parcela dos demais herdeiros necessários; como se depreenderia com base no
próprio regime de bens que rege a União Estável, conforme a Lei, qual seja:
comunhão parcial de bens.
Isso pode ser concluído também a partir da própria noção de que o fim
da sucessão é justamente o de oferecer proteção à família e sendo a entidade
representada por também uma “família”, não há por que discriminá-la e não lhe
garantir o “status” de herdeiro necessário.
Ainda levando-se em consideração a Isonomia, os filhos também devem
ser tratados de maneira igualitária. Durante muito tempo, trataram-se os filhos não
oriundos da relação do matrimônio como filhos “espúrios”, “ilegítimos”, “bastardos”,
e, assim sendo, acabaram desprivilegiados em relação aos demais filhos.
Atualmente, a Constituição já não permite esse tratamento
discriminatório. Filhos são apenas isso, “filhos”. Já não se diferencia os oriundos do

66
Rui Barbosa. Oração aos Moços. São Paulo: Saraiva, 2009.
54

matrimônio, de relações extraconjugais, os adotivos e até mesmo os socioafetivos.


Todos são herdeiros necessários e devem ter os mesmos direitos e tratamento,
embora se saiba que não é isso o que ocorre.
Nesse sentido, quando se exclui a mãe do direito à sucessão, por ser ela
apenas companheira, mesmo que se garanta aos filhos em comum o seu quinhão
necessário, ou a sua legítima, como se afirma; elas ficam prejudicadas em relação a
filhos de adviessem de um matrimônio. Isso ocorre porque quando a mãe recebe
parcela menor do que a que teria uma esposa ou nada recebe como eles também
são herdeiros dela, perdem em relação ao que receberiam no futuro, quando ela
falecesse. Portanto, tratar a companheira de modo desigual, também fere a
Constituição por desigualar a situação dos filhos.67
Também não se pode deixar de mencionar o foco desse item, em
relação aos princípios constitucionais que são violados ao se discriminar a
companheira em detrimento da esposa, qual seja o da Dignidade da Pessoa
Humana.
Esse princípio é considerado, como já se disse o “macroprincípio”, ou o
principal, o mais importante de todos os princípios, base de sustentação dos demais.
Nesse sentido, todo ser humano merece tratamento digno e condizente com sua
condição humana. A companheira é um ser humano e, como tal, precisa e tem
direito a sua dignidade, ao mínimo existencial. É por isso que se lhe concede
atualmente, tanto quanto à esposa, o direito de habitação. Não faria sentido negar-
lhe também o direito à sucessão.
Assim, se ela vive com um homem, tendo ou não filhos com ele, mas se
tem uma relação que pressupõe comunhão de vidas, se os bens que são dele
servem para o sustento dela, auxiliam de algum modo para que tenham certa
estabilidade financeira, se ela cuida dele e da casa, não faz sentido que caso ele
morra, um primo, que muitas vezes nem tenha intimidade com o parente fique com o
patrimônio do “de cujus”, em detrimento dela. Tal situação fere gravemente a
dignidade do ser humano, pois considera que o tempo juntos nada representou.

67
DIAS, M. B. Manual de Direito das Famílias. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.
55

5.3 Da inconstitucionalidade da distinção de regime sucessório entre cônjuges


e companheiros

No que tange à equiparação e desequiparação entre cônjuge e


companheiro em matéria sucessória, eis que após larga discussão no cenário
jurídico, a Corte Suprema, no bojo do Recurso Extraordinário 878.694 - Minas
Gerais reconheceu a repercussão geral da matéria e consolidou o seguinte
entendimento:

Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E CIVIL. RECURSO


EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL.
INCONSTITUCIONALIDADE DA DISTINÇÃO DE REGIME SUCESSÓRIO
ENTRE CÔNJUGES E COMPANHEIROS.
1. A Constituição brasileira contempla diferentes formas de família legítima,
além da que resulta do casamento. Nesse rol incluem-se as famílias
formadas mediante união estável.
2. Não é legítimo desequiparar, para fins sucessórios, os cônjuges e os
companheiros, isto é, a família formada pelo casamento e a formada por
união estável. Tal hierarquização entre entidades familiares é incompatível
com a Constituição.
3. Assim sendo, o art. 1790 do Código Civil, ao revogar as Leis nºs 8.971/94
e 9.278/96 e discriminar a companheira (ou companheiro), dando-lhe
direitos sucessórios bem inferiores aos conferidos à esposa (ou ao marido),
entra em contraste com os princípios da igualdade, da dignidade humana,
da proporcionalidade como vedação à proteção deficiente e da vedação do
retrocesso.
4. Com a finalidade de preservar a segurança jurídica, o entendimento ora
firmado é aplicável apenas aos inventários judiciais em que não tenha
havido trânsito em julgado da sentença de partilha, e às partilhas
extrajudiciais em que ainda não haja escritura pública.
5. Provimento do recurso extraordinário. Afirmação, em repercussão geral,
da seguinte tese:
“No sistema constitucional vigente, é inconstitucional a distinção de regimes
sucessórios entre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado, em
68
ambos os casos, o regime estabelecido no art. 1.829 do CC/2002”.

O supracitado Recurso Extraordinário analisa a validade do artigo 1.790


do Código Civil de 2002 (CC/2002), que outorgava aos companheiros direitos
sucessórios distintos daqueles conferidos ao cônjuge pelo artigo 1.829 do mesmo
Código. A divergência constitucional em baila consiste na legitimidade ou não da
distinção, entre a família proveniente do casamento e a proveniente de união estável
para fins sucessórios.

68
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 878.694 – Estado de Minas Gerais. Relator:
Ministro Luís Roberto Barroso, 31 ago. 2016. ATA Nº 25, de 31 ago. 2016. DJE nº 194, 09 set. 2016.
56

A discussão surgiu a partir de um caso concreto, onde a parte recorrente


vivia em união estável, em regime de comunhão parcial de bens, há cerca de 09
anos, até que seu companheiro veio a falecer, sem deixar testamento. Como o
falecido não possuía descendentes, tampouco ascendentes, mas apenas três
irmãos, o Tribunal de origem, limitou o direito sucessório da recorrente a um terço
dos bens adquiridos onerosamente durante a união estável, excluindo-se os bens
particulares do falecido, os quais seriam recebidos integralmente pelos irmãos
utilizando como fundamento o art. 1.790, III, do CC/2002. O curioso é que caso
fosse casada com o falecido, a recorrente faria jus à totalidade da herança.
No voto do Relator Ministro Luís Roberto Barroso, este cuida do
delineamento da controvérsia, dedicada à apreciação da compatibilidade do
dispositivo impugnado com a Constituição de 1988 e arremata tratando da resolução
do caso concreto submetido à apreciação da Corte.
Faz uma contextualização da controvérsia constitucional, abordando a
evolução do conceito de família, trata da família, casamento, filiação, dos diferentes
modelos de família e do papel do Estado na proteção das relações familiares.
Seguido pelo voto dos demais ministros, o relator aborda a progressiva
equiparação legal entre cônjuges e companheiros, defendendo que:

A Constituição de 1988, como se viu, constitui o marco de uma importante


mudança de paradigma em relação ao conceito – social e constitucional –
de família. A família passa a ser protegida não como um “bem em si”, mas
como meio para que as pessoas possam se realizar, o que independe da
configuração de família adotada. Entretanto, como se verá, o Código Civil
de 2002 não foi capaz de acompanhar essa evolução no tratamento do
69
regime sucessório aplicável aos companheiros e aos cônjuges.

No interim entre a promulgação da Constituição de 1988 e da edição do


CC/2002, o regime jurídico da união estável também foi objeto de duas leis
específicas, quais sejam, as Leis nº 8.971/94 e 9.278/96.70
Segundo o Ministro Luís Roberto Barroso, a Lei nº 8.971/1994 teria
praticamente reproduzido o regime sucessório estabelecido para os cônjuges no
CC/1916, vigente à época, ao estabelecer que o companheiro seria o terceiro na
ordem sucessória, preterido em relação aos descendentes e dos ascendentes.
69
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 878.694 – Estado de Minas Gerais. Relator
Ministro Luís Roberto Barroso; ATA Nº 25, de 31 ago. 2016. DJE nº 194, 09 set. 2016.
70
Lei nº 8.971/1994, art. 2º: “As pessoas referidas no artigo anterior participarão da sucessão do(a)
companheiro(a) nas seguintes condições: (...) III - na falta de descendentes e de ascendentes, o(a)
companheiro(a) sobrevivente terá direito à totalidade da herança.”
57

Ademais, concedeu-lhe direito de usufruto idêntico ao do cônjuge sobrevivente, e


previu o direito do companheiro à meação quanto aos bens da herança adquiridos
com sua colaboração, o que em pouco ou nada diferia daquele previsto para o
cônjuge, que também não era herdeiro necessário no CC/1916.
Sucede que as leis relativas ao regime sucessório nas uniões estáveis
foram, portanto, evoluindo e consolidando aquilo que a CF/1988 já preconizava, que
era a equiparação entre cônjuges e companheiros, no que diz respeito a receber a
mesma proteção sucessoriamente falando, visto que, independentemente do tipo de
entidade familiar, o objetivo do estado é garantir ao parceiro remanescente, meios
que garantam dignidade de vida.
Ademais, imperioso salientar que o direito sucessório brasileiro funda-se
na noção de que a sucessão patrimonial é fator fundamental para a proteção,
coesão e perpetuação da família.
Mas com o advento do atual Código Civil aprovado em 2002, a
desequiparação de regimes sucessórios foi trazida pelo art. 1790 do CC/2002, a
referida evolução, foi abruptamente interrompida. É que o Código trouxe
diferenciações que criaram dois diversos regimes sucessórios, um para a família
formada pelo matrimônio e outro para a família constituída por união estável.
Em sintéticas palavras, o Ministro Relator Luís Roberto Barroso aduz que:

“O cônjuge foi alçado à categoria de herdeiro necessário (art. 1.845), o que


não ocorreu – ao menos segundo o texto expresso do CC/2002 – com o
companheiro19. Assim, caso se interprete o Código Civil em sua
literalidade, um indivíduo jamais poderá excluir seu cônjuge da herança por
testamento, mas este mesmo indivíduo, caso integre uma união estável,
poderá dispor de toda a herança, sem que seja obrigado a destinar qualquer
71
parte dela para seu companheiro ou companheira”.

É de suma importante ressaltar também que o Código Civil de 2002,


muito embora tenha assegurado direito real de habitação para o cônjuge (art. 1.831,
CC/2002) não o fez para o companheiro, semeando ainda no cenário o debate no
afã de perscrutar se o companheiro ainda teria esse direito com base na Lei nº
9.278/1996 ou se ele teria sido revogado pelo novo Código Civil.
A proteção do companheiro, no entanto, só passa a surgir no horizonte,
porém, quando o art. 1.790 do CC/2002 foi colocado em cheque no cenário jurídico,

71
A herança não se confunde, é claro, com a meação, que corresponde à metade do patrimônio comum do
casal, a que faz jus o cônjuge ou o companheiro, a depender do regime de bens adotado.
58

pois dispunha sobre o regime da sucessão legítima nas uniões estáveis de forma
diversa do regime geral previsto no art. 1.829 do mesmo Código em relação ao
cônjuge. Para uma melhor compreensão, salutar transcrever os dispositivos das
referidas normas:

Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do


outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união
estável, nas condições seguintes:
I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à
que por lei for atribuída ao filho;
II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a
metade do que couber a cada um daqueles;
III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da
herança;
IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.
Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo
se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da
separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no
regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens
particulares;
II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III - ao cônjuge sobrevivente;
IV - aos colaterais.

No julgamento do Recurso Extraordinário 878.694 ora em discussão, as


principais diferenças que restaram evidenciadas entre os regimes sucessórios de
cônjuge e companheiro no atual Código Civil são duas.
A primeira é que o regramento do atual novo Código Civil restringe a
participação hereditária do companheiro aos bens obtidos onerosamente na vigência
da união estável, em relação aos quais o companheiro já possuía meação. Por outro
lado, consoante o caput do art. 1.790 do CC/2002, fica excluído da sucessão
qualquer bem adquirido gratuitamente pelo falecido, assim como qualquer bem
adquirido onerosamente em período anterior à vigência da união estável.
A segunda marcante diferença é que, em regra, seu quinhão é muito
inferior ao que lhe seria conferido caso fosse casado com o falecido, como é o caso
concreto objeto do recurso, onde a recorrente vivia em união estável, em regime de
comunhão parcial de bens, até que seu companheiro veio a falecer, sem
descendentes nem ascendentes, mas apenas três irmãos, que são colaterais.
Assim, segundo o regramento do CC/2002, esta companheira receberia
apenas um terço dos bens adquiridos onerosamente durante a vigência da união, ao
passo que os irmãos receberiam todos os demais bens, mas se esta recorrente
59

fosse casada com o falecido, teria direito a todo o monte sucessório, excluindo os
referidos herdeiros.
Mais em confronto à lógica do Direito das Sucessões é o caso do falecido
ter deixado apenas um tio-avô, um primo, ou um sobrinho-neto, os quais receberiam
todos os bens adquiridos gratuitamente, todos os adquiridos antes da união estável,
e mais dois terços daqueles adquiridos onerosamente durante a união estável, uma
vez que nos termos do art. 1.729, III c/c art. 1.839 do Código Civil, os parentes
colaterais até o quarto grau são sucessíveis. Neste diapasão, destaca Zeno Veloso:

A lei não está imitando a vida, nem está em consonância com a realidade
social, quando decide que uma pessoa que manteve a mais íntima e
completa relação com o falecido, que sustentou com ele uma convivência
séria, sólida, qualificada pelo animus de constituição de família, que com o
autor da herança protagonizou, até a morte deste, um grande projeto de
72
vida, fique atrás de parentes colaterais dele, na vocação hereditária.

O ápice da discussão, no entanto, é a compreensão da inexistência de


hierarquia constitucional entre as formas de família, a partir da compreensão da
Constituição de 1988, em seu artigo 226, caput, o qual dispõe genericamente, que “a
família, base da sociedade civil, terá especial proteção do Estado”. Nos parágrafos
seguintes, o texto constitucional confere previsão expressa a três categorias de
organização familiar, qual seja o casamento (§ 2º e 3º), a união estável (§ 3º) e a
família monoparental (§ 4º).
O Recurso Extraordinário ora em baila aborda categoricamente e com
genialidade a demonstração da ilegitimidade da hierarquização das formas de
família, suscitando o relator que os quatro elementos tradicionais de interpretação
jurídica, a saber, o gramatical, o teleológico, o histórico e o sistemático, podem
auxiliar na solução deste dissenso.
Numa interpretação semântica, também conhecida como gramatical,
literal ou filológica, indubitavelmente os sentidos mínimo e máximo das palavras
figuram como limites à atuação criativa do intérprete, e como a norma sob análise
estabelece, de forma inequívoca que a família tem especial proteção do Estado, sem
especificar o modelo familiar mais ou menos merecedor desta proteção, nos termos
do art. 226, seja em seu caput, seja em seu § 3º, não traça qualquer diferenciação

72
VELOSO, Z. Do direito sucessório dos companheiros. In: DIAS, M. B.; PEREIRA, R. C. (Coord.). Direito de família
e o novo código civil. 4. ed. Belo Horizonte: Del Rey2005, p. 249.
60

entre o casamento e a união estável para fins de proteção estatal. Portanto, se o


texto constitucional não hierarquizou as famílias para tais objetivos, por conseguinte
e obviamente o legislador infraconstitucional não poder fazê-lo.
Numa abordagem teleológica, fica claro que o objetivo da norma é
garantir a proteção das famílias, pois, se o Estado tem como principal meta a
promoção de uma vida digna a todos os indivíduos, é necessário proteger de
antemão a família, visto que esta desempenha um papel essencial. Portanto, é
natural concluir que o dever estatal de proteção não pode se limitar às famílias
constituídas pelo casamento, estendendo-se a outras formas de entidades
familiares, igualmente, formadas pelo amor, afeto e vontade de vida em comum, e
igualmente capazes de contribuir para o desenvolvimento de seus integrantes,
independentemente de qualquer formalidade ou solenidade.
A partir desta ilação do referido Recurso Extraordinário, fica claro que a
Constituição se contrapõe na contramão da discriminação entre indivíduos a partir
de critérios puramente legais, uma vez que todos os indivíduos, sejam eles cônjuges
ou companheiros, têm direito a igual proteção legal.
Se a interpretação enveredar pelo crivo histórico do dispositivo
constitucional, a convergência desemboca para o mesmo vértice, pois a norma do
art. 226 da CF/1988 é inclusiva, e não limitativa, na medida em que não primou por
dividir as famílias em classes de primeira e segunda ordem, mas de ampliar a
proteção estatal aos diversos layouts familiares presentes em nosso quadro social.
Não resta, pois, nenhuma dúvida de que o estabelecimento de uma
hierarquia entre casamento e união estável ou qualquer outro modelo de família, vai
de encontro à vontade originária do constituinte, mesmo a partir de vários prismas
de interpretação.
Numa concepção sistemática, pressupõe-se unidade e harmonia
hermenêutica numa análise interpretativa. Esta situa o dispositivo a ser interpretado
dentro do contexto normativo geral e particular, panorâmico e ampliado, o que
estimula uma conexão em cadeia entre as diversas regras e princípios do sistema
normativo, de sorte que elide contradições e antinomias.
Ainda consoante palavra do Ministro Relator Luís Roberto Barroso:

Apesar de não reconhecer qualquer diferença entre as entidades familiares


para fins de proteção estatal, a parte final do § 3º do art. 226 da CF/1988
estipula que a lei deve facilitar a conversão da união estável em casamento.
61

Está implícita nesta cláusula a possibilidade de o legislador


infraconstitucional traçar contornos distintos para as duas entidades
familiares. Afinal, se a lei deve facilitar a conversão de uma em outra,
pressupõe-se que ambas são figuras juridicamente (e não apenas
socialmente) distintas. Essa é uma primeira constatação importante que
decorre do sistema constitucional: o legislador pode atribuir regimes
jurídicos diversos ao casamento e à união estável. Todavia, como será
detalhado adiante, a partir da interpretação conjunta de diversos
dispositivos da Constituição de 1988, que trazem a noção de
funcionalização da família, alcança-se uma segunda constatação
importante: só será legítima a diferenciação de regimes entre casamento e
união estável se não implicar hierarquização de uma entidade familiar em
relação à outra, desigualando o nível de proteção estatal conferido aos
73
indivíduos.

O recurso aborda ainda o tema a partir da perspectiva da dignidade da


pessoa humana, no que atine à proibição de proteção deficiente e vedação ao
retrocesso, assente que a diferença de tratamento entre as espécies de família Viola
o princípio da proporcionalidade.
A conclusão do Relator Luís Roberto Barroso é, pois a seguinte:

Ante o exposto, dou provimento ao recurso para reconhecer de forma


incidental a inconstitucionalidade do art. 1.790 do CC/2002, por violar a
igualdade entre as famílias, consagrada no art. 226 da CF/1988, bem como
os princípios da dignidade da pessoa humana, da vedação ao retrocesso e
da proteção deficiente. Como resultado, declaro o direito da recorrente a
participar da herança de seu companheiro em conformidade com o regime
jurídico estabelecido no art. 1.829 do Código Civil de 2002.
70. Assento, para fins de repercussão geral, a seguinte tese: “É
inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e
companheiros prevista no art. 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado,
tanto nas hipóteses de casamento quanto nas de união estável, o regime do
74
art. 1.829 do CC/2002”.

Nesta senda, se colocarmos em frontispício o caput e os parágrafos do


art. 226 da Constituição Federal da República de 1988 e outros dispositivos
infraconstitucionais, todos têm que se coadunar sendo a Carta Magna o parâmetro à
quais estas demais normas devem se adequar.
Assim, nos termos da ementa do Recurso Extraordinário 878.694 – MG,
não é legítimo desequiparar para fins sucessórios, os cônjuges e os companheiros,
isto é, a família formada pelo casamento e a formada por união estável, por ser certo
que tal hierarquização entre entidades familiares é incompatível com a Constituição.

73
Recurso Extraordinário 878.694 – Estado de Minas Gerais. Relator: Ministro Luís Roberto Barroso; Brasília, 31
ago. 2016. DJE, 09 set. 2016.
74
Idem Ibidem.
62

Destarte, a conclusão é que a companheira passa a ser considerada


herdeira necessária, uma vez que de acordo com artigo 1.845 do Código Civil, são
Herdeiros Necessários os ascendentes, descendentes e os cônjuges, aos quais se
pertence metade dos bens da herança, constituindo a legitima, consoante
inteligência do artigo 1.846 do mesmo diploma legal.
Portanto, por via de consequência não há outra interpretação que se
coadune com o artigo 226 e seus parágrafos da Constituição Federal e com o artigo
1.723 do Código Civil, senão a de que o companheiro também é um herdeiro
necessário, devendo fazer parte da ordem de vocação hereditária nos termos do
artigo 1.829 do Código Civil, principalmente diante da declaração de
inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil, que se encontra revogado
tacitamente.
63

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como se vê a união estável ainda se encontra em uma situação de total


desprestígio em relação ao matrimônio, embora a própria Constituição garanta
tratamento igualitário aos dois institutos reconhecendo-os como entidades familiares
e ordenando que se facilite a conversão da primeira no segundo.
Levando-se em conta todo o exposto, nota-se que muito ainda falta para
que a legislação civil brasileira possa, de fato, constitucionalizar-se. Ainda hoje, por
mais que no discurso se fale em diversidade, famílias plurais e respeito à Dignidade
da Pessoa Humana, muitas das leis brasileiras ainda são permeadas por
preconceitos e discriminações absolutamente incompatíveis com a Constituição
Federal de 1988 e com seus princípios.
Nesse sentido, o objeto do presente trabalho foi a sucessão na união
estável, numa perspectiva constitucional e notou-se que a companheira é tratada de
modo desigual e discriminatório, como se ainda fosse a época do chamado
“concubinato puro e impuro”.
Ora, tratar igualmente as entidades familiares, independentemente da
forma como se agruparam, desde que ligados por laços de afeto, não é favor que
fazem os legisladores, mas obrigação diante de uma Constituição que não permite
tratamento desumano, discriminatório e contrário à Dignidade da Pessoa Humana.
Portanto, quando o legislador dá à companheira tratamento diferenciado,
não a arrolando entre os herdeiros necessários, nem igualando seu quinhão à da
esposa, por exemplo, ele está sendo contrário aos ditames constitucionais e essa
incompatibilidade precisa ser extirpada do ordenamento.
Por enquanto, tem cabido à jurisprudência dos tribunais garantirem os
direitos da companheira, permitindo que alcancem o mesmo status dos que teria
uma esposa, tendo em vista a situação jurídica em que se encontra.
Mas, apesar disso, urge uma legislação mais coerente com a Constituição
Federal e com os princípios por ela defendidos. Nesse sentido, sabe-se que existe
uma intenção geral dos legisladores no sentido de tornar os mecanismos legais mais
coerentes com a modernidade. Daí a modificação do Código de Processo Civil e a
pretensa modificação do Código de Processo Penal.
Espera-se, assim, que o Código Civil possa em um futuro próximo,
também passar pelas devidas modificações, que garantam um tratamento mais justo
64

e condizente com os referidos ditames constitucionais. Sabe-se, porém, que esse é


um processo lento, que demanda tempo e esforço coletivo, tanto por parte dos
legisladores, como também por parte da sociedade civil. Daí a necessidade de
pesquisas como a que ora se apresenta, a fim de alertar a comunidade e
principalmente o meio acadêmico sobre a necessidade de se proceder a essas
modificações.
65

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ed. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2016.

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66

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