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vestigar quais são seus objetivos – que po-
o senso comum e na mídia popular, afirma- dem ser diferentes daquilo que geralmente
ções embasadas em conhecimentos cien- se consideram ser seus objetivos – ou repre-
tíficos costumam denotar uma confiabilidade sentados como tais, e podemos investigar os
especial. Por conta do reconhecimento que as meios usados para conseguir estes objetivos
e o grau de sucesso conseguido. Não se se-
ciências possuem, é comum que diversas áreas
gue disso que nenhuma área do conhecimen-
de conhecimento se auto intitulem “ciências”. to possa ser criticada. Podemos tentar qual-
São exemplos relativamente recentes as clas- quer área do conhecimento criticando seus
sificações: Ciência Bibliotecária, Ciência Ad- objetivos, criticando a propriedade dos méto-
ministrativa, Ciência do Discurso, Ciência Flo- dos usados para atingir esses objetivos, con-
frontando-a com meios alternativos e supe-
restal, Ciência de Laticínios, Ciência de Carne
riores de atingir os mesmos objetivos e assim
e Ciência Mortuária. (Chalmers, 1982/2014) por diante. Desse ponto de vista não preci-
Há, entretanto, uma pluralidade de objetos samos de uma categoria geral “ciência”, em
estudados e de métodos utilizados pelas diver- relação à qual alguma área do conhecimen-
sas áreas de produção de conhecimento que se to pode ser aclamada como ciência ou difa-
mada como não sendo ciência. (Chalmers,
intitulam ciências, de forma que o rótulo “ci-
1982/2014, p. 210)
ência” pode compreender uma ampla gama de
sentidos. Dada tal diversidade, variados auto- De acordo com Chalmers (1982/2014), as
res empenharam-se em delimitar o que é e o ciências são empreendimentos voltados à des-
que não é ciência, com base em diferentes cri- crição do mundo com base em diversos objeti-
térios (e.g., Kuhn, 1962; Popper, 1934/2002). vos e por meio de variados métodos. A alterna-
Contrapondo-se a essas classificações, Chal- tiva apresentada por ele diz respeito à avaliação
mers (1982/2014) afirmou que as delimita- das áreas de produção de conhecimento cien-
ções costumam mostrar-se limitadas, visto que tífico com base em análises de seus princípios
é comum deixarem de fora diversas formas de e de suas práticas. Esta é uma oposição à ava-
produção de conhecimento que se mostraram liação das mesmas baseadas em critérios ge-
produtivas durante a história. Em vista disso, rais para “a ciência”.
o autor afirmou que as tentativas de responder Devido à diversidade teórico-metodológi-
à questão “o que é ciência, afinal?” são proble- ca existente nos ramos que se designam cien-
máticas, pois elas supõem que exista uma cate- tíficos, foram criados sistemas classificatórios
goria geral de ciência, e sugeriu uma alternati- de ciências, dentre os quais destaca-se a di-
va considerada por ele como mais produtiva. cotomia entre ciências naturais e ciências so-
De acordo com o autor: ciais (Gil, 2008). Distintos critérios são utili-
zados para classificar as áreas de produção de
Cada área do conhecimento pode ser anali- conhecimento como ciências naturais ou ciên-
sada por aquilo que é. Ou seja, podemos in- cias sociais, normalmente levando em conside-
ração seus objetos de estudo e seus métodos. mentos são desenvolvidos nos sujeitos, a partir
Entre as múltiplas possibilidades de classifica- de suas interações com o meio social, de ma-
ção, alguns autores afirmaram que, a partir de neira independente de aspectos biológicos. A
seus objetos de estudo, as ciências naturais po- principal consequência negativa desse modo
dem ser compreendidas como aquelas que in- de enxergar o mundo, ainda segundo os auto-
vestigam fatos e fenômenos da natureza, descre- res, é a cisão entre as ciências sociais e as ci-
vendo leis da natureza (Gil, 2008; McAllister, ências naturais, que cria obstáculos ao diálogo
1997) ou relações temporais entre eventos fí- produtivo entre as disciplinas científicas. A par-
sicos (James, 1892). Por sua vez, as ciências tir dessa discussão, os autores defendem uma
sociais poderiam ser entendidas como as dis- visão integrada de ciência, incluindo as áreas
ciplinas que estudam o homem e a sociedade de produção de conhecimento tradicionalmen-
(Gil, 2008), as interconexões sociais (Elias, te entendidas como ciências sociais e como
1970/2008) ou a realidade social, compreendi- ciências naturais. Com a integração das ciên-
da como o conjunto de eventos sociais e cultu- cias, a questão dos rótulos, entre outras possí-
rais (Schutz, 1954). veis questões, seria eliminada, de acordo com
As diferentes formas de entender o mundo a argumentação dos autores.
acarretam em diferentes posições metodológi- Outra forma de compreender a proposta di-
cas: uma parte dos autores acredita que existe visão entre ciências sociais e naturais foi apre-
uma fronteira natural que divide os eventos do sentada por Staddon (2017). O autor argumen-
mundo entre “eventos da natureza” e “eventos tou não haver razão para dividi-las com base
humanos e sociais”, que implicaria na necessi- em supostas fronteiras naturais. As diferenças
dade de métodos de estudo distintos, enquanto entre as ciências sociais e as ciências naturais
outro grupo de autores defende a existência de residiriam em três principais questões, natu-
um contínuo, que permite a utilização de mé- ralmente impostas às ciências sociais, mas que
todos semelhantes para o estudo de fenômenos não costumam atingir as ciências naturais: (1)
chamados de naturais e sociais (Schutz, 1954). a realização de estudos experimentais com hu-
Apesar disso, assim como não há um único manos levanta variados problemas éticos que
método a partir do qual seja possível delimitar impossibilitam a manipulação de diversas va-
o que é ciência (Chalmers, 1982/2014), não é riáveis importantes (e.g., não é possível avaliar
possível delimitar as ciências naturais e sociais o efeito de certos estímulos aversivos sobre o
com base nos métodos utilizados, pois diver- comportamento de humanos); (2) a impossibi-
sas disciplinas agrupadas sob o rótulo de ciên- lidade de colocar em prática certos experimen-
cias sociais utilizam métodos tradicionalmen- tos que forneceriam dados importantes para
te utilizados pelas ciências naturais (Tooby & compreensão de assuntos sociais faz com que
Cosmides, 1992), como a experimentação, a cientistas sociais “dependam fortemente de es-
quantificação e o uso de modelos matemáticos. tudos correlacionais” (Staddon, 2017, p. 53),
Destaca-se que, recentemente, propostas de produzidos, por exemplo, por estudos epide-
integração entre as ciências têm ganhado for- miológicos ou questionários, que não permi-
ça entre cientistas sociais (Derksen, 2005). De tem identificar causalidade entre eventos; (3)
acordo com Tooby e Cosmides (1992), as ci- o tempo para que certas variáveis produzam
ências sociais têm adotado, tradicionalmente, efeitos pode ser muito longo, o que dificulta a
uma visão dualista do mundo, que divide a na- avaliação das relações causais entre as variá-
tureza em aspectos biológicos e aspectos cultu- veis (e.g., uma mudança no currículo escolar
rais, segundo a qual o modo como comporta- pode ter efeitos bastante atrasados). Essas di-
ral e se são apresentadas justificativas do autor A análise dos trechos selecionados permi-
para tal classificação, em detrimento de outras, tiu identificar algumas características do que
foram buscadas ocorrências da expressão natu- Skinner considera uma ciência natural. Estes
ral science (ciência natural) em versões digita- aspectos estão presentes no trecho em que ele
lizadas de 11 de seus livros (Ferster & Skinner, apresenta algo mais próximo de uma proposi-
1957; Skinner, 1938/2016, 1953/2005, 1957, ção de critérios para delimitação de uma ciên-
1959/1999, 1968, 1969, 1971, 1974, 1978, cia natural:
1989). Foram excluídos da análise, por consi-
derar que fugiam do escopo do trabalho, seus Behavioristas são algumas vezes acusados de
livros autobiográficos (Skinner, 1976, 1979, idolatria; diz-se que cultuam a ciência e to-
mam emprestados os aparatos da ciência sim-
1983), seu livro que apresenta trechos de seus plesmente para parecerem científicos. Esta é
cadernos (Skinner, 1980) e seu livro sobre o uma crítica bastante comum a todas as ciên-
planejamento da velhice (Skinner & Vaughan, cias sociais ou comportamentais; meramente
1983). É importante frisar que o objetivo des- contar ou medir é entendido como imitar as
ciências naturais. Mas é difícil encontrar al-
ta análise foi apenas ilustrar a questão da rotu-
gum sinal disso na história da análise expe-
lação da análise do comportamento como ci- rimental do comportamento. Estudos iniciais
ência natural para Skinner. usaram equipamentos simples, e os dados fo-
Os procedimentos utilizados para ilustrar ram relatados da maneira mais simples pos-
a posição de Skinner sobre a classificação da sível. A suposição subjacente de que o com-
portamento era ordenado e não caprichoso
análise do comportamento como uma ciên-
dificilmente poderia ser entendida como ten-
cia natural possuem diversas limitações. Por do sido adotada para fins honoríficos. Estabe-
exemplo, é possível que Skinner tenha apre- lecer as dimensões do comportamento e va-
sentado discussões sobre o assunto em outras riáveis relacionadas, insistir na previsão e no
publicações não incluídas na presente seleção, controle, usar matemática quando a quantifi-
cação permite [ênfase adicionada]—Esses fo-
como em seus artigos publicados em periódi-
ram os passos essenciais ao invés de uma fa-
cos científicos, e que a delimitação de apenas chada. (Skinner, 1974, pp. 232-233)
uma palavra-chave para busca em seus livros
(Natural Science) pode ter omitido resultados O uso de equipamentos simples, análises de
importantes. dados simples, a crença na existência de ordem,
O termo foi encontrado em 33 parágrafos, a insistência na previsão e no controle e o uso
em quatro das oito obras analisadas (i.e., Skin- de quantificações matemáticas parecem ser ca-
ner, 1953/2005, 1957, 1959/1999, 1969, 1974). racterísticas da análise do comportamento que
Dentre estes parágrafos, nove deles apresenta- a aproximam das ciências naturais.
vam o termo em outro contexto (e.g., citação a Em outros trechos (Skinner, 1959/1999), o
outros autores que falaram sobre ciências na- autor afirma que a probabilidade de resposta
turais), que não da classificação da análise do como objeto de estudo, o delineamento experi-
comportamento, e foram excluídos das análi- mental de sujeito único como método e a análi-
ses. Assim, foram analisados 24 trechos pre- se por meio de curvas acumuladas são capazes
sentes nos livros Science and Human Beha- de produzir dados rigorosos, compatíveis com
vior (Skinner, 1953/2005), Cumulative Record as ciências naturais. Ainda assim, não é apre-
(Skinner, 1959/1999), Verbal Behavior (Skin- sentada uma definição clara de ciência natural:
ner, 1957), Contingencies of Reinforcement
(Skinner, 1969) e About Behaviorism (Skin- Talvez o suficiente tenha sido dito, contu-
ner, 1974). do, para argumentar que ao voltarmo-nos
Behaviorismo, com ênfase na última sílaba, tivo" ou "propósito" são geralmente redutí-
não é o estudo científico do comportamen- veis a afirmações sobre o condicionamento
to, mas uma filosofia da ciência preocupada operante, e apenas uma ligeira mudança é
com seu objeto de estudo e os métodos da necessária para coloca-las no âmbito de uma
psicologia. Se psicologia é uma ciência da ciência natural. (Skinner, 1953/2005, p. 87)
vida mental–da mente, da experiência cons-
ciente–então ela deve desenvolver e defen-
der uma metodologia especial, o que ainda Aparentemente, a sua concepção de ciên-
não foi feito com sucesso. Se ela é, por outro cia natural não se baseia numa fronteira en-
lado, uma ciência do comportamento dos or- tre eventos da natureza e eventos sociais, mas
ganismos, humano ou não, então ela é parte numa visão de que os fenômenos sociais tam-
da biologia, uma ciência natural para a qual
bém são naturais, compostos da mesma natu-
métodos testados e altamente bem-sucedidos
estão disponíveis. A questão básica não é a reza física. Estariam assim incluídas na sua
natureza do material do qual o mundo é fei- proposição de ciências naturais os fenômenos
to ou se ele é composto de uma matéria ou humanos e sociais.
duas, mas sim as dimensões das coisas estu- Ao contrário do que ocorreu nos trechos da
dadas pela psicologia e os métodos relevan-
obra de Skinner analisados, alguns autores pro-
tes para eles. (p. 221)
curaram delimitar explicitamente os motivos
Apesar de apresentar algumas característi- pelos quais a análise do comportamento de-
cas do que entende como uma ciência natural, veria ser caracterizada como uma ciência na-
nos 24 trechos analisados Skinner não oferece tural. A seguir são apresentados alguns traba-
explicitamente uma definição de ciência natu- lhos de autores que discutiram explicitamente
ral e nem de ciência social, mas apenas alguns essa questão.
elementos que caracterizam a análise do com- Conforme Jonhston e Pennypacker (1993),
portamento, entendida como uma ciência na- que avaliam a análise do comportamento como
tural. Nos trechos em que Skinner apresenta a uma ciência natural, a tentativa de classificar as
sua visão de ciência natural não há indícios de ciências por meio dos seus métodos não seria
que esteja opondo-se às ciências sociais de for- possível devido à grande variedade metodoló-
ma geral, mas sim à visão da necessidade de gica existente nas diferentes disciplinas cientí-
uma ciência social com métodos necessaria- ficas. Eles propõem que a delimitação seja fei-
mente distintos das outras ciências. A sua posi- ta com base nos objetos de estudo das variadas
ção é feita num contexto de antagonismo entre ciências: as ciências naturais teriam objetos de
análise do comportamento e outras disciplinas estudo que possuem natureza física, explican-
com abordagens mentalistas e/ou teleológicas: do a ocorrência de eventos físicos com base em
outros eventos físicos, e as ciências sociais pos-
Não é correto dizer que o reforçamento ope- suiriam objetos de estudo que envolvem fenô-
rante “fortalece a resposta precedida por ele.” menos de outra natureza, explicando fenôme-
A resposta já ocorreu e não pode ser modifi-
cada. O que é modificada é a probabilidade nos físicos com base em constructos mentais.
futura de respostas da mesma classe. . . Não Segundo os autores, são implicações da ado-
há, portanto, nenhuma violação do princípio ção de objetos de estudo não físicos: o enco-
fundamental da ciência que exclui as "causas rajamento de métodos de pesquisa com estra-
finais". Mas este princípio é violado quan-
tégias de medidas indiretas (e.g., avaliação do
do se afirma que o comportamento está sob
o controle de um "incentivo" ou "objetivo" desempenho em testes de lógica como medida
que o organismo ainda não alcançou ou um de um constructo chamado inteligência) e uma
"propósito" que ainda não cumpriu. As de- presumida incapacidade, por parte das ciências
clarações que utilizam palavras como "incen- sociais, de produzir tecnologias úteis.