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Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas – FFLCH

Departamento de Filosofia – Disciplina: FLF 0116


Prof. Ricardo R. Terra

Problemas de gênero e a emancipação humana.

Eduardo A. R. Suppion
Nº USP: 10766615
Turma: Vespertino
Problemas de gênero e a emancipação humana.

O presente trabalho tem como objetivo apresentar uma posição sobre os problemas de
gênero e as vias possíveis para a emancipação humana levando em conta a bibliografia vista no
curso de Filosofia Geral I, segundo semestre de 2018, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas da Universidade de São Paulo. Para isso, minha sugestão é percorrermos, no decorrer da
dissertação, algumas das ideias propostas por três das autoras discutidas nos encontros do semestre.
São elas: Simone de Beauvoir em seu livro o “Segundo Sexo”, Joan Scott em seu artigo “Gênero:
uma categoria útil para análise histórica” e Judith Butler em seu livro “Problemas de gênero:
feminismo e subversão da identidade”.
Para melhor exposição do tema, irei dividir o texto em quatro partes, que ajudarão ao leitor,
e a mim também, explorar melhor os seguintes pontos: I) algumas considerações sobre gênero e
feminismo II) o binário masculino e feminino III) descontruindo a identidade de gênero IV)
conclusão e as vias possíveis para a emancipação humana.

O que é gênero? Pergunta que tem provocado os mais diferentes debates e ideias, com
diferentes pontos de vista e problemáticas que surgem a partir de cada um desses pontos.
Podemos iniciar o nosso caminho se apropriando da gramática, do léxico. No dicionário
Michaelis encontramos a seguinte definição, que é colocada como a primeira entre as muitas
propostas: “Conceito de ordem geral que abrange todas as características ou propriedades
comuns que especificam determinado grupo ou classe de seres ou de objetos”. Essa seria uma
maneira mais geral de definir e me parece que se concentra na forma, num tipo de categorização
que nos leva a excluir o indivíduo em sua singularidade. Como aponta Joan Scott, “na gramática,
gênero é compreendido como um meio de classificar fenômenos, um sistema de distinções
socialmente acordado mais que uma descrição objetiva de traços inerentes”, sugerindo assim uma
relação entre categorias que permite distinções ou agrupamentos separados.
Quais seriam então esses agrupamentos entre os humanos? Como afirma Scott, o gênero
em seu uso mais recente parece que surgiu primeiro entre as feministas americanas que queriam
insistir no caráter fundamentalmente social das distinções baseadas no sexo, por isso, falar em

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gênero, implica em falar em feminismo, afinal, a partir das demandas feministas que o recorte de
gênero passou a ser discutido como um problema. De maneira didática podemos passar por entre
essas demandas chamando-as de “ondas do feminismo”, que são específicas em seus contextos e
tempos.
A chamada primeira onda do feminismo ocorreu no século XIX e avançou pelo XX. Surgiu
inicialmente no Reino Unido e nos Estados Unidos e tinha como objetivo central a luta pela
igualdade de direitos civis para homens e mulheres. Esse movimento era feito basicamente por
mulheres brancas e ricas, que queriam ter a mesma voz e poder que seus pais, maridos e irmãos,
permitindo uma vida pública e não apenas uma vida privada e limitada em ser a esposa, a mãe ou
a filha de algum homem.
Após a Segunda Guerra Mundial, o feminismo tomou vigor, afinal, as mulheres foram
chamadas a servir a pátria como operárias, enfermeiras e outras ocupações necessárias aos esforços
de guerra. Dessa maneira, mulheres condicionadas socialmente à vida privada passaram a exercer
papéis na vida pública, provando que eram capazes de realizar funções não apenas restritas ao lar
e em pé de igualdade aos homens. Foi nesse momento que “O Segundo Sexo”, de Simone de
Beauvoir, em 1949, foi publicado e abriu caminho para uma revisão dos papéis de gênero na
sociedade.
Uma segunda onda nasce quando, na década de 60, surge a pílula anticoncepcional,
libertando as mulheres de uma gravidez indesejada e dando-lhes finalmente um maior controle
sobre o corpo e maior liberdade sexual. A partir desse momento, houve um relaxamento quanto às
normas sexuais e de repressão do corpo, transformando profundamente as relações sociais e os
comportamentos humanos.
Nos anos 80, o feminismo incorpora demandas trazidas por mulheres negras como Angela
Davis, que coloca no centro do debate as questões do gênero associadas às categorias de raça e
classe, mostrando como as opressões sociais atingem de maneiras diferentes mulheres que se
encontram sob diferentes condições sociais. Podemos fazer desse movimento uma terceira onda
do feminismo.
Neste caminho, chegamos numa quarta onda. Agora as problemáticas apontam para o
questionamento dos limites dos conceitos e das identidades, perguntando-se: o que é ser mulher?
O que é ser homem? Qual a essência do gênero? Um movimento de desconstrução que coloca em

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cheque as categorias até então propostas. É nesta onda que se encontram as questões levantadas
por Judith Butler em Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade.
Chegamos assim a um percurso em que a noção de gênero tem sido construída por
diferentes perspectivas, e como nos aponta Scott, não existe uma clareza ou coerência para a
categoria gênero, seu uso comporta um elenco tanto de posições teóricas, quanto de simples
referências descritivas às relações entre os sexos.

II

Agora talvez devêssemos parar um pouco e olhar mais de perto a análise de Beauvoir, que
evidencia uma dialética assimétrica entre o homem e a mulher, revisando os papéis do gênero na
sociedade e a lógica binária do masculino e feminino. O título de seu livro “Segundo Sexo” já nos
diz um pouco sobre a sua posição sobre o tema: existe um sexo colocado em primeiro plano, o
sexo do homem, e um outro colocado em segundo, o sexo da mulher.

“A humanidade é masculina, e o homem define a mulher


não em si, mas relativamente a ele; ela não é considerada
um ser autônomo.” (Beauvoir, 2016, vol. 1, p. 12)

Beauvoir desafia assim as ideias relacionadas à mulher que até então não tinham sido
questionadas de maneira ampla, quebrando tabus e convenções. Ela afirma que “Ninguém nasce
mulher, torna-se mulher (...)” e completa dizendo que “Nenhum destino biológico, psíquico,
econômico define a forma que a fêmea humana assume no seio da sociedade; é o conjunto da
civilização que elabora esse produto intermediário entre o macho e o castrado, que qualificam de
feminino” (Beauvoir, 2016, vol. 2). Em outras palavras, podemos dizer que sexo e gênero são
distintos. O primeiro está ligado a um fator biológico do corpo humano. O segundo é uma
construção da sociedade, ser homem e ser mulher não é um dado natural, mas algo social que foi
construído na história pelas diferentes culturas humanas.
Próxima a Sartre, filósofo francês, Beauvoir traz para o centro de seu pensamento algumas
ideias existencialistas como aquela que postula que a existência precede a essência e nos indica

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que somos lançados no mundo, dentro de uma situação, sem uma essência definida, numa espécie
de projeto para poder se construir da maneira que quisermos.

“Sim, as mulheres, em seu conjunto, são hoje inferiores aos


homens, isto é, sua situação oferece-lhes possibilidades
menores: o problema consiste em saber se esse estado de
coisas deve se perpetuar.” (Beauvoir, 2016, vol. 1, p. 21)

Na primeira parte de seu livro “Segundo Sexo – fatos e mitos”, a autora nos coloca três
pontos de vista importantes sobre essa definição da mulher como o outro diante do masculino: o
ponto de vista biológico, o psicanalítico e do materialismo histórico.
Do ponto de vista biológico não há nenhuma constatação que sustente de maneira
categórica essa “outridade feminina”. Essa hierarquia do sexo e essa condição de subordinação
da mulher ao homem. Embora reconheça que o corpo da mulher é um dos elementos essenciais de
sua situação no mundo e que suas limitações são de extrema importância, também ressalta que os
indivíduos não são apenas corpos, são corpos submetidos a tabus e leis da sociedade.

“(...) uma sociedade não é uma espécie: nela, a espécie


realiza-se como existência; transcende-se para o mundo e
para o futuro; seus costumes não se deduzem da biologia;
os indivíduos nunca são abandonados à sua natureza;
obedecem a essa segunda natureza que é o costume e na
qual se refletem os desejos e os temores que traduzem sua
atitude ontológica.” (Beauvoir, 2016, vol. 1, p. 64)

Do ponto de vista psíquico, Beauvoir denuncia como a psicologia psicanalítica, a partir de


Freud, fez de sua teoria uma explicação da subjetividade humana baseada em símbolos masculinos
como o “falo”, e todo um conjunto de caráter e situação viril. Nessa perspectiva, a mulher continua
sendo interpretada como o outro, aquela que na alteridade se mostra servil e inferior, detentora de
uma falta perante o homem que possui o pênis e seu representante simbólico, o falo.

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Freud supõe que a mulher se sente um homem mutilado e explica sua angústia frente ao
homem como a inversão de um desejo frustrado. Toda a tentativa de emancipação feminina e
transcendência de sua existência pode ser encarado como um tipo de “protesto viril”. Para Adler,
psicanalista contemporâneo de Freud, “quando uma menina sobe em uma árvore é, ao seu ver,
para igualar-se aos meninos: não imagina que subir numa árvore lhe agrade” (Beauvoir, 2016,
vol. 1, p. 80). A psicanálise assim ajuda a reforçar uma ideia de normalidade baseada no masculino,
tomando o ponto de vista do homem como o modelo de humano e todas as vezes que a mulher se
conduz como ser humano, ela apenas está imitando o macho em sua condição de fêmea.

“Ser mulher seria ser o objeto, o Outro, e o Outro


permanece sujeito no seio de sua demissão.” (Beauvoir,
2016, vol. 1, p. 80)

Do ponto de vista do materialismo histórico, Beauvoir aponta como a fraqueza física da


mulher, embora uma inferioridade flagrante frente ao homem, só faz sentido no tempo em que
enfrentávamos animais selvagens e carregávamos pesadas massas, assim a técnica e as máquinas
modernas não exigem mais esses recursos viris. Ao realizar um resgate histórico sobre a família,
podemos ver que em sua origem, a divisão do trabalho era feita de maneira igualitária com homens
na caça e pesca, e mulheres na tecelagem, jardinagem e no lar. Mas quando um trabalho mais
intenso é exigido para desbravar florestas e manter campos produtivos, o homem recorre a serviços
de outros homens por meio da escravidão, surge a propriedade privada, o senhor dos escravos, da
terra e assim o homem torna-se também proprietário da mulher. Essa nova família, baseada na
propriedade e no patriarca, oprime a mulher e coloca o homem como um soberano absoluto.
Essa servidão doméstica e opressão social que a mulher sofre é consequência de sua
opressão econômica e só poderá ser superada quando a mulher e o homem tiverem direitos
juridicamente iguais e estiverem inseridos igualmente na vida pública e produtiva.

“ A mulher só se emancipará quando puder participar em


grande medida social na produção, e não for mais
solicitada pelo trabalho doméstico senão numa medida
insignificante.” (Beauvoir, 2016, vol. 1, p. 85)

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Beauvoir nos coloca frente ao conflito provocado pelo binômio masculino e feminino e
mostra que o corpo, a psique, a vida sexual e o trabalho, só existem para o homem dentro de um
mundo de valores que estão integrados numa perspectiva global da existência humana, e que em
si, todos esses campos nada poderiam explicar as diferenças vividas entre um homem e uma
mulher.

III

O binarismo de gênero, proposto até aqui, reforça uma posição simplificadora em que toda
a questão se resume entre o conflito do mundo masculino e feminino. O que nos lança a perguntas
como: o que nos faz aceitar a imposição de gênero em sua estrutura binária e estável? Seria
importante retomar a questão o que é o gênero? Masculino e feminino são a verdade do gênero?
É no centro dessas questões que podemos ver surgir a filósofa feminista americana Judith
Butler, que propõe descontruir a noção de gênero, recusando a ideia de uma estabilidade de gênero
e mostrando a inadequação do sujeito a uma identidade fixa. Podemos pensar que não há uma
essência ou substância por trás do gênero e questionar o ideal normativo do gênero em duas
categorias, que exclui os indivíduos que não se encaixam nesse ideal, como transexuais,
transgêneros, drags e outros, colocando-os como patológicos. Esse pensamento nos cria um outro
problema, que seria o da definição do que é humano e seu reconhecimento, o que seria o “ser”?
Na perspectiva de Butler, o gênero é culturalmente construído, não é o resultado causal do
sexo e nem é fixo, quanto ele o é. Não há razões para supor que os gêneros devam permanecer em
número de dois apenas.

“Quando o status construído do gênero é teorizado como


radicalmente independente do sexo, o próprio gênero se
torna um artifício flutuante, com a consequência de que
homem e masculino podem, com igual facilidade, significar
tanto um corpo feminino como masculino, e mulher e
feminino, tanto um corpo masculino como feminino.”
(Butler,2003, p. 24)

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Como aponta Patrícia Porchat, no livro Histeria e Gênero, ao comentar Butler, “somos
ditos homens ou mulheres a partir de nosso nascimento. Uma vez nomeados por um médico que
declara “É um menino!” ou “É uma menina!”, uma espécie de verdade é criada para o sujeito
em questão. A partir desse momento inicial, o gênero continua a ser reproduzido e mantido por
uma série de palavras ou gestos que, ao serem expressos, criam uma realidade. Essa é a própria
ideia de gênero como um ato intencional e performativo. Esses atos, repetidos de uma forma
estilizada, produzem um efeito ontológico, levam a crer na existência de seres homens e seres
mulheres; produzem uma ilusão de substância. Mas trata-se apenas de uma ilusão, pois não há
ser, não há um fazedor, não há um agente por trás do ato, não há unidade. A ontologia não é uma
fundação, mas uma injução normativa.”
É desta maneira que Butler demonstra o quanto o gênero é uma construção artificial, um
amontoado de signos e linguagem que forjam estereótipos, de modo que o ser dos gêneros são atos
reiterados que acabam se confundindo com o natural por repetição, mas são artificiais, inventados.
O ponto chave aqui é o gênero enquanto performance, como atos, práticas sociais, linguagem e
costumes que se perpetuam no tempo, sem um original ou uma essência.

“O gênero não deve ser construído como uma identidade


estável ou um locus de ação do qual decorrem vários atos;
em vez disso, o gênero é uma identidade tenuamente
construída no tempo, instituído num espaço externo por
meio de uma repetição estilizada de atos. O efeito do
gênero se produz pela estilização do corpo e deve ser
entendido, consequentemente, como a forma corriqueira
pela qual os gestos, movimentos e estilos corporais de
vários tipos constituem a ilusão de um eu permanente
marcado pelo gênero. (Butler, 2003, p. 200)

IV

Podemos dizer que, de certa maneira, a sociedade aceitou como óbvio que o fator principal
que diferencia o gênero seria aquele baseado no sexo biológico do sujeito, radicalmente ligado a

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natureza dos corpos. A partir dessa perspectiva se produziu no seio dessa sociedade uma identidade
sexual promotora de desigualdades entre homens e mulheres, na qual o homem hétero oprime e
subordina as mulheres.
Beauvoir denuncia essa dialética opressora e, somada as conquistas das lutas feministas,
coloca em cheque a supremacia do homem hétero, abrindo espaço para a reflexão e mudança. A
frase ninguém nasce mulher, torna-se mulher, produz um questionamento sobre a determinação
ontológica do gênero e promove assim novas possibilidades de discussões da categoria gênero.
Como aponta Joan Scott, gênero é necessariamente uma categoria histórica, social,
construída, temporal; as relações que podemos vislumbrar através dos conceitos são também
construídas e mutáveis.
Essa construção possível e essa mutabilidade, inspira a filósofa Judith Butler e nos coloca
frente a frente com novas possibilidades e questionamentos, descontruindo as noções de identidade
de gênero até então estabelecidas. Assim o gênero é visto agora como um ato, um discurso com
práticas reiteradas pela sociedade e que se trata muito mais de “o que você faz” do que “o que
você é”.
Dentro dessa perspectiva em que “gênero” pode ser entendido como uma prática e não uma
essência fixa determinada por modelos biológicos, é possível sim construir novos significados para
dar conta desse significante.
Podemos realizar essa transformação por meio do discurso e dos costumes da nossa
sociedade. Isso exigiria, por um lado, um estado que se comprometesse com políticas públicas
capazes de promover igualdade de existência e liberdade de expressão, além de mais tolerância
com as diferenças. Por outro, uma sociedade que produzisse em sua cultura novos discursos e
simbolismos acerca da singularidade, do corpo, das sexualidades, e da normatividade da
perspectiva masculina e hétero. Uma sociedade que estimulasse o debate e a reflexão sobre as
diferentes maneiras pelas quais os desejos e as identidades se entrelaçam.
Se algo foi construído socialmente, pode também, pela mesma via, ser desconstruído,
renovado e reinventado, tornando livre a humanidade de práticas e conceitos que não respeitam a
singularidade e fazem pacto com a opressão dos corpos e das subjetividades.

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Referências Bibliográficas

AMBRA, P. E. S. e SILVA JR, N. Histeria e Gênero. São Paulo: nVersos, 2014.

BEAUVOIR, S. O segundo sexo: fatos e mitos (Vol. 1). Tradução Sérgio Milliet. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 2016.

BEAUVOIR, S. O segundo sexo: a experiência vivida (Vol. 2). Tradução Sérgio Milliet. Rio
de Janeiro: Nova Fronteira, 2016.

BUTLER, J. P. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Tradução Renato


Aguiar. Rio de janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

MICHAELIS. Dicionário Brasileiro de Língua Portuguesa (formato digital). Editora


Melhoramentos, 2017.

SCOTT, J. Artigo: Gênero: uma categoria útil para análise histórica. Tradução Christine R.
Dabat e Maria B. Ávila. Texto original: Gender: a useful category of historical analyses. Gender
and the politics of history. New York, Columbia University Press. 1989.

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