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professores a partir de
relatos de experiências:
O trabalho pedagógico na Educação Infantil dos
Municípios de Barão de Cocais e Rio Piracicaba
Formação de
professores a partir de
relatos de experiências:
O trabalho pedagógico na Educação Infantil dos
Municípios de Barão de Cocais e Rio Piracicaba
ISBN 978-85-86369-10-0
CDD: 370.71
Bibliotecária responsável: Cleide A. Fernandes CRB6/2334
É permitida a reprodução parcial ou total desta publicação, desde que citada a fonte e que não seja
para venda ou qualquer fim comercial.
Conselheiros
Lino Barbosa Os autores são responsáveis pela escolha e
Benjamin Moro apresentação dos fatos contidos neste livro,
Felipe Peres bem como pelas opiniões nele expressas, que
não são necessariamente as da Fundação
Rodrigo Lauria
Vale, nem comprometem a Organização.
Vera Schneider As indicações de nomes e a apresentação
do material ao longo desta publicação não
Diretora-presidente implicam a manifestação de qualquer opinião
Isis Pagy por parte da Fundação Vale a respeito da
condição jurídica de qualquer país, território,
Diretor-executivo cidade, região ou de suas autoridades,
Luiz Gustavo Gouvêa tampouco da delimitação de suas fronteiras ou
limites.
Relações Intersetoriais
Andreia Rabetim
Educação
Maria Alice Santos
Andreia Prestes
Anna Cláudia D’Andrea
Carla Vimercate
Agradecimentos
Agradecemos a todos os profissionais que
fizeram parte desta produção
Barão de Cocais: Adriana de Lima Brandão, Aguida Nunis Soares de Moraes, Alcione
Gomes Cruz, Alessandra Luzia Nonato Santos, Ana Patricia Fonseca de Lima, Angelida
Aparecida Pereira Santos, Antônia das Dores Malaquias, Aparecida Maria Santos,
Auxiliadora Lucília Pena Gomes, Bruna Diana Dias, Cristiane Pereira de Melo, Cristina
Andreia Nunes dos Santos, Denísia Fonseca Nepomuceno, Ednéa Maria do Santos, Elida
Soares Silva, Eliza Aparecida dos Santos, Elk Soares Silva, Ericka Maria Viegas Carlos Santos,
Estelma Rodrigues Fernandes, Fátima Maria Borges, Flávia Regina Herculno Marques,
Gilmara dos Santos Melo, Gilvânia Bittencourt da Silva, Girlene Magna Simão, Giselda
Conceição Pereira, Grace Louise Botelho, Isaura A. Ribeiro Linhares Reis, Janaina Cristina
Matias, Jussara Fonseca de O. Gonçalves, Kátia Milene de Lima Fonseca, Kenia Lye Araújo
do Carmo, Lourdes Isabel do Carmo, Lourdes Nascimento Lopes, Lúcia Maria de Freitas
Oliveira, Ludvany Roberta O. do Carmo, Madalena de Fatima Rodrigues, Mafiza Vilela
Rodrigues Caldeira, Mara Cristina Almeida Soares, Márcia Fernandes da Silva Santos,
Margaretti S. Bretas Diniz, Margarida Lucianita Carneiro, Maria Aparecida Silva, Maria
das Graças Soares Rodrigues, Maria de Fátima Silva Costa, Maria do Carmo Nunes, Maria
Geralda Monteiro, Maria Isabel de Oliveira, Marilúcia de Araújo e Silva, Marlene de Souza
Dias, Miriam da Silva Marques Soares, Nilza Cássia de Souza Gonçalves, Raquel Fernandes
Lopes, Rita de Almeida Rodrigues, Rosimary Aparecida de Souza Silva, Rubinete Aparecida
Vital, Sabrina Luiza Marques Santos, Silvana Maria da Silva, Silvia Maria do Couto Santos,
Sonia Januária de Oliveira, Uara Priscila Libertino Souza, Vanda da Conceição Ferreira,
Vania Barbosa Carvalho Silva, Vanja Maria Duarte Jácome Arantes.
COBAP: Maria Elena Latalisa, Adriana Torres Máximo Monteiro, Alessandra Latalisa de Sá,
Ana Paula Rodrigues, Kenia Latalisa de Sá, Marcelo Monteiro de Siqueira, Márcia de Assis
Fonseca, Thiago Latalisa de Sá Antunes.
No Brasil, a Educação Infantil para crianças de 04 e 05 anos passou a ser obrigatória a partir
da Emenda Constitucional 59 de 2009. Com isso, os municípios precisaram se organizar
para ofertar essa etapa da educação básica, que foi definida como responsabilidade
municipal. Essa organização incluiu desde o aumento da oferta de vagas, e a consequente
ampliação das instalações físicas, até a discussão sobre quais as especificidades da
educação na infância e que tipo de formação de profissionais contribui para a qualidade
do atendimento a esse público.
Esperamos que a leitura das experiências contribua para que gestores e educadores
possam entender as especificidades da Educação Infantil – e consequentemente ajudar
a fortalecer essa modalidade de ensino – desenvolvendo estratégias que considerem a
criança como um sujeito que merece ser ouvido, respeitado e estimulado.
Fundação Vale
Sumário
Capítulo 1
A proposta de formação - Percursos e desafios.............................................................. 11
Capítulo 2
Contextos educacionais...................................................................................................................... 15
A Educação Infantil em Barão de Cocais.......................................................................................... 15
A Educação Infantil em Rio Piracicaba............................................................................................. 16
Capítulo 3
A escrita como possibilidade de revelação e transformação da
experiência de professoras em sala de aula....................................................................... 19
Capítulo 4
Problematização da prática - Percursos e desafios...................................................... 23
Capítulo 5
As abordagens temáticas e a prática pedagógica dos municípios................ 25
Tema 1
A criança como sujeito do processo educativo........................................................................... 25
Entrevista - A Criança e a Educação Infantil................................................................................... 27
Tema 2
Afetividade e aprendizagem............................................................................................................... 33
Mini-história - O registro da brincadeira: diálogos, afetos, ações e emoções.................. 35
Tema 3
Educar, cuidar e brincar.......................................................................................................................... 40
Relato de Projeto - O cuidar e educar nas brincadeiras de circuito motor......................... 41
Tema 4
A pedagogia da escuta.......................................................................................................................... 51
Relato de projeto - Alimentação Saudável.................................................................................... 53
Tema 5
Avaliação e documentação pedagógica........................................................................................ 60
Mini-história - O trabalho pedagógico compartilhado: a força da parceria...................... 63
Relato de projeto - O que o professor aprende quando
documenta o cotidiano com as crianças......................................................................................... 70
Tema 6
Ambiente educativo................................................................................................................................ 77
Mini-história - Redescoberta de espaços e ambientes educativos....................................... 79
Tema 7
Linguagens................................................................................................................................................ 87
Artes plásticas......................................................................................................................................... 87
Relato de projeto - Aprender e fazer arte com o outro
e a diversificação de propostas....................................................................................................... 89
Linguagem musical.............................................................................................................................. 96
Linguagem matemática...................................................................................................................104
Mini-história - O Jogo das cores....................................................................................................106
Linguagens oral e escrita..................................................................................................................112
Relato de projeto - Projeto salada de frutas:
compartilhando sabores, vivenciando textos..........................................................................114
Tema 8
Projetos....................................................................................................................................................... 125
Relato de projeto - Reflexão sobre projetos a partir da
experiência A metamorfose da lagarta......................................................................................... 127
Capítulo 6
Reflexões finais e desdobramento........................................................................................... 131
Revolvendo o jardim de infância...................................................................................................... 131
A formação em contexto de professores da
educação infantil do município de Barão de Cocais................................................................. 133
Considerações finais..................................................................................................................................... 137
Referência bibliográfica............................................................................................................................. 138
A proposta de formação 1
Percursos e desafios
Adriana Torres Máximo Monteiro1
Alessandra Latalisa de Sá2
Caro(a) Leitor(a),
Esta publicação é parte do projeto desenvolvido pela Fundação Vale, em parceria
com o Congresso Brasileiro de Ação Pedagógica (COBAP)3 e as Secretarias Municipais de
Educação de Barão de Cocais e Rio Piracicaba, Minas Gerais, realizado nos anos de 2014 e
2015, com o objetivo de formar professores e gestores da Educação Infantil.
O texto, organizado por Adriana Torres Máximo Monteiro e Alessandra Latalisa de
Sá, é uma produção conjunta, a partir do registro das práticas pedagógicas desenvolvidas
nas escolas locais. Acreditamos que este material representa os 18 meses em que
estivemos empenhadas numa formação em serviço, focada na palavra e na ação das
professoras dos municípios onde o diálogo horizontal entre elas e as formadoras deu o
tom democrático do caminhar deste projeto.
Para assumirmos o desafio de irmos além, era preciso conhecer as realidades locais
para propor outros estudos e análises de práticas. Partir dos saberes já construídos
foi fundamental para que a nossa proposta fizesse sentido e, de fato, promovesse
transformações na práxis das escolas e creches de Educação Infantil.
Vale destacar que essa formação partiu do princípio fundamental de fazer valer
o direito que a criança tem de ser cuidada e educada em um ambiente adequado e
saudável, no qual possa brincar, apoderar-se dos saberes produzidos pela sociedade e
produzir uma cultura própria da infância ao ser protagonista e, dessa maneira, construir
sua identidade como cidadã. E ainda: espera-se que as escolas possam criar situações
educativas para ampliar o universo de conhecimentos, saberes e experiências dessa
criança.
Nessa trajetória, buscou-se promover o aperfeiçoamento da educação oferecida
pelas escolas públicas de Educação Infantil pertencentes aos municípios citados,
além do desenvolvimento de competências e habilidades dos professores e gestores
pedagógicos, visando ao compromisso com a qualidade da educação, especificamente,
dessa etapa da educação básica.
Para tanto, o processo formativo proposto contou com seis estratégias
metodológicas, assim resumidas:
(I) O Seminário de lançamento do projeto de formação foi realizado com a intenção
de conhecer o perfil dos participantes quanto as suas demandas e realidades educacionais.
Na ocasião, expusemos a organização geral do projeto, carga horária a ser certificada
e a proposta desta publicação. As coordenadoras e formadoras participantes foram
apresentadas, e os representantes da Fundação Vale e dos municípios se pronunciaram.
1. Doutora e Mestre em Educação – Coordenadora Pedagógica deste projeto, organizadora desta publicação.
2. Doutora e Mestre em Educação – Coordenadora Pedagógica deste projeto, organizadora desta publicação.
3. O COBAP é uma organização sem fins lucrativos. Há mais de 20 anos, promove cursos de formação de professores,
congressos e consultorias. Para a presente formação, estão envolvidas a direção, a coordenação, bem como as
professoras da Educação Infantil Balãozinho.
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(II) Os Encontros de formação, grupos temáticos tiveram o objetivo de conduzir
o aprimoramento conceitual e a reflexão da prática pedagógica. Cada grupo temático
contou com duas etapas de formação, em datas distintas, permitindo a realização de
atividades e o aprofundamento teórico e metodológico entre um encontro e outro.
Essa etapa contou ainda com uma formadora referência para acompanhar e
desenvolver atividades presenciais entre um encontro e outro, tais como: avaliar o processo
de formação, observar o ambiente escolar e as atividades realizadas pelos professores,
reunir com gestores para selecionar professores e atividades que se adequariam ao
cenário de discussão, planejar a atividade a ser observada e documentada para reflexão
posterior, estabelecer relações entre as reflexões teóricas e práticas desenvolvidas nos
encontros temáticos e no trabalho na escola local.
Nos encontros, que antecederam aos sábados, os conteúdos trabalhados nos
Grupos Temáticos foram: A criança como sujeito do processo educativo; Afetividade
e aprendizagem; Educar, cuidar e brincar; Avaliação e documentação pedagógica; A
pedagogia da escuta; Ambiente educativo; Projetos; Linguagens, entre elas, Linguagem
musical, Artes plásticas e visuais, Linguagem matemática e Linguagens oral e escrita.
(III) Os Encontros de formação dos gestores pedagógicos, realizados em Belo
Horizonte, no espaço da Escola Balão Vermelho, foram desenvolvidos para acompanhar
professoras em sala e correlacionar o que foi trabalhado nos grupos temáticos, sua
viabilidade e interferência no trabalho pedagógico na escola e a articulação das ações
necessárias para que a rede do município possa oferecer uma Educação Infantil cada vez
melhor. Parte da carga horária desses encontros foi dedicada à observação do trabalho
pedagógico da Educação Infantil da Escola Balão Vermelho. Ressalta-se que, ao longo
da formação, avaliou-se a importância da participação de professores, especialmente
para ver na prática, por meio das observações, as abordagens teóricas discutidas nos
municípios. Além disso, as gestoras e as professoras presentes foram orientadas e
escutadas nas questões relativas aos registros da prática para a publicação final.
(IV) Produção de material teórico escrito e (V) Publicação. Um dos produtos
previstos neste projeto foi a publicação deste material aqui apresentado, tendo como
referência os eixos temáticos abordados, bem como experiências educativas de cada
município. O objetivo foi o de sistematizar conceitos fundamentais para o trabalho
na educação de crianças de zero a cinco anos, relatar experiências e perspectivas dos
educadores envolvidos e realçar os conhecimentos das realidades social e educativa das
crianças e suas famílias. Com essa abordagem da dimensão local, buscamos reafirmar
o protagonismo dos professores, a valorização das especificidades de cada região e o
enriquecimento da prática pedagógica na Educação Infantil.
Nessa etapa de trabalho, em ações compartilhadas com os professores, os gestores
registraram entrevistas, relatos de mini-histórias e projetos. Tudo isso com o auxílio das
coordenadoras do projeto e de uma profissional que se dedicou ao acompanhamento
desta escrita via e-mail. As avaliações das experiências apresentadas nesta obra foram
realizadas ao longo do projeto de formação, entretanto, parte dela está registrada após
cada relato.
(VI) No Seminário de conclusão, apresentamos a análise comparativa dos dados do
questionário de aproximação da realidade educativa do município realizado no último
encontro com as professoras, discussão dos temas abordados no projeto, por meio de
relatos das práticas pedagógicas contidas nesta publicação. A proposta foi organizarmos
uma atividade aberta à comunidade, com exposição de trabalhos desenvolvidos pelas
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professoras junto de seus alunos, apresentações culturais da região, confraternização e
lançamento desta publicação.
Pela dinâmica do trabalho proposto de uma escrita compartilhada entre profissionais
de diferentes áreas de conhecimento e regiões, esta produção foi elaborada durante o
ano de realização da formação, com a escrita de vários profissionais e participantes4 locais,
de acordo com as temáticas abordadas.
Trata-se, portanto, da documentação de uma vivência, que revela ao mesmo tempo
uma análise histórica com um novo olhar para práticas anteriormente realizadas quanto à
proposição de novas ações pedagógicas, gestadas e analisadas no período deste projeto.
Esta é uma documentação educativa que fornecerá elementos teórico-práticos
das ações voltadas para crianças de zero a cinco anos de idade. É o resultado de um
esforço coletivo, com relatos de experiência registrados por professoras gestoras, que,
com o olhar atento e interlocução de Marcia de Assis Fonseca5 e Ana Paula Rodrigues,6
persistiram e conduziram o fio da meada da escrita reflexiva.
É com muito orgulho que concluímos este trabalho e presenciamos as professoras,
auxiliadas e apoiadas pelas gestoras, abraçando o desafio de escrever e refletir a própria
prática e compartilhá-las com seus pares próximos e leitores distantes, num exercício claro
de empoderamento e apropriação de seus saberes. Nesse conjunto de acontecimentos, a
presente publicação representa uma referência inicial de um longo trabalho que está por
vir, pois educar é um projeto a longo prazo.
Nossa postura foi a de manter uma respeitosa relação com o fazer pedagógico de
cada município, sem atropelos, preservando os valores e as identidades postos em seus
projetos pedagógicos. Um exemplo disso é o uso da nomenclatura tia para se referir à
maneira como as crianças chamam as professoras, realidade tão comum nos variados
contextos da educação infantil.
Apesar de considerarmos as discussões iniciadas por Paulo Freire acerca da
contradição entre ser tia e professora, entendemos que práticas como essas se reproduzem
ao longo dos tempos por força da cultura escolar. Destacamos as implicações dessa
questão, pois ser professora pressupõe estabelecer um laço político, ético, profissional,
interpessoal, social e afetivo, com vistas ao ensino e à aprendizagem das crianças. Ser
tratada pelo próprio nome significa respeitar a professora como sujeito que tem um
nome, uma identidade. Por outro lado, ser tia independe do ano letivo e de uma escola
como espaço definido para acontecer.
Assim, respeitando a preferência das professoras, não insistimos, porém indicamos à
elas o livro Professora sim, tia não, de Paulo Freire, para que possam refletir sobre o tema.
Dessa forma, a situação dialógica de escutar e acompanhar as experiências das
professoras, suas histórias, conhecer as escolas e as crianças nos fazia repensar na condução
do trabalho. Conhecer as culturas locais, aproximar-se da educação do campo, dos valores
quilombolas nos forneceu elementos para também refletirmos sobre a educação das
crianças pequenas pertencentes a esses contextos. O contato íntimo que tanto crianças
como os adultos têm com a natureza, as experiências que trazem sobre os hábitos rurais,
ou como habitantes de pequenos municípios, as suas curiosidades, conhecimentos e
formas de viver foram percebidas e motivaram novos redirecionamentos, como a forma
de selecionar as atividades a serem desenvolvidas nas oficinas práticas.
Outro aspecto relevante é o acesso fácil das famílias às escolas. Como a maioria
reside próximo às elas e em comunidades onde muitos se conhecem, essas condições
4. Embora não conste o registro da prática de todos os profissionais que participaram da formação, de algum modo,
eles estão representados direta ou indiretamente e os nomes citados na sessão de agradecimentos.
5. Neste projeto, teve a função de revisora dos registros de prática produzidos pelas professoras.
6. Neste projeto, foi a Formadora de referência nos municípios e Orientadora da escrita das práticas compartilhadas.
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permitem que se envolvam com as intervenções escolares e os projetos ganhem mais
sentido e força de transformação situada localmente. Essa possibilidade é um anúncio de
que é possível criar uma consonância entre a realidade que acontece fora da escola com
aquela do seu interior.
Faz-se necessário dizer aqui que o compromisso e o entusiasmo de todos, mesmo
diante dos desafios enfrentados ao longo desse percurso, são marcas da dedicação e
persistência dos profissionais da Educação Infantil que, adotando uma visão global de sua
condição de professor, vêm há tempos lutando pela qualidade e pelo reconhecimento
do trabalho pedagógico com a criança de zero a cinco anos.
Por fim, ressaltamos que o presente documento se refere a um momento histórico,
a um conjunto de intervenções propostas neste projeto, ao envolvimento do grupo
de educadores e produzido ao longo desses 18 meses de projeto. Portanto, deverá ser
constantemente lido, criticado, revisto e atualizado.
Coordenadoras da formação e organizadoras desta obra.
Contextos educacionais 2
A Educação Infantil em Barão de Cocais
Mara Cristina Almeida Soares7
7. Professora efetiva da Rede Municipal de Barão de Cocais. Atualmente trabalha na Casa do Aprender de Barão de
Cocais, como coordenadora pedagógica da Rede, como formadora para os diversos segmentos escolares. É graduada
em Pedagogia pela FAE de João Monlevade – MG, Pós-graduada em Tutoria em EAD pela UFMT e em Fundamentos
Didáticos pela Faculdade São Luiz - SP.
8. A Casa do Aprender é um espaço aberto à comunidade que busca promover e valorizar práticas educativas, culturais
e sociais por meio de ações de leitura, brincadeiras e cultura digital. Ela é fruto de uma parceria entre a Secretaria
Municipal de Educação do município e a Fundação Vale.
COBAP e Secretaria Municipal de Educação (SME), nasceu o curso de formação organizado
pela Equipe Pedagógica do COBAP e Escola Balão Vermelho. Juntos, durante os anos de
2014 e 2015, buscamos construir uma formação em contexto para os professores de
Educação Infantil da Rede Municipal. A proposta é um estudo contínuo, que assegure
uma mudança de postura e práticas de sala de aula, visando à melhoria da qualidade nas
ações e reflexões pedagógicas.
Segundo a Secretária de Educação de Barão de Cocais, Aguida Soares Nunis de
Moraes:
Aguida ressalta ainda que “as escolas devem ser agradáveis e que precisamos
despertar nos nossos alunos o prazer de estar na escola, porque nesse espaço é onde
acontece a relação de amizade que se conquista, o gosto pelos estudos e a busca por
um ideal”.
Sabemos da importância de um ambiente onde a criança, sendo escutada, pode
interferir no meio em que vive. Assim, entendemos o brincar como uma atividade
essencial da criança para o conhecimento de si e do outro, para as suas vivências e
descobertas.
Com essa visão, os encontros com as professoras aconteciam aos sábados com
a formadora de referência, Ana Paula, e às sextas-feiras que antecediam os grupos
temáticos, com as gestoras. Os registros da prática com revisões e discussões a distância,
além da possibilidade de observação e discussão da prática de algumas professoras da
Escola Balão Vermelho, em Belo Horizonte, contribuíram com a revisão da concepção de
infância e de criança que até então tínhamos.
Após um ano de formação, ainda teremos material para pensarmos e
redimensionarmos nosso fazer cotidiano na escola e no município. A presente publicação,
além de socializar práticas de algumas escolas em Barão de Cocais, nos possibilitará
conhecer outras e ainda realizarmos novas aprendizagens.
Há quem diga que escrever é “desnudar-se”. Alguns consideram uma prática difícil,
às vezes desagradável. Já o poeta Pablo Neruda sugere que escrever é fácil: “começa-se
com letra maiúscula, termina com ponto final e no meio colocam-se as ideias”. Porém, o
que o ato da escrita proporciona ao autor que expõe suas ideias e as revela para si próprio
ao torná-las públicas? E ao leitor que se apropria do texto e o interpreta?
Como revisora dos textos produzidos pelas professoras, não apenas me aproximei
da prática de algumas escolas, mas também do processo de qualificação profissional dos
que participaram dessa formação.
As referências conceituais utilizadas se inspiraram na prática aprendida e
transformada com a experiência nas escolas de Reggio Emilia11 que nos convidam a
observar e escutar. Escutar não apenas o que diz a criança, mas o que diz a infância.
A Pedagogia da Escuta12 nos abre os olhos e os ouvidos para uma realidade sempre
existente, mas só recentemente considerada e interpretada.
Disponibilizar-nos a escutar as crianças nos conduz a explorar o que elas dizem
e o que dizem os adultos ou mesmo quando nos calamos ou como falamos. Registrar
as experiências observadas e vivenciadas, iluminadas pela proposta de documentação,
implica mais do que escrever. Exige da professora, além de organizar as ideias em uma
descrição, utilizar fotos, diálogos entre as crianças, intenções e intervenções das situações
que ela pretende comunicar. A escrita começa bem antes da ação de traçar letras. Envolve
uma intenção. A produção mobiliza o autor em algumas escolhas e definições. Observa o
tema, os dados coletados, um planejamento e uma organização que muitas vezes é clara
para quem presenciou os fatos descritos, mas nem sempre tão evidentes para o leitor que
estabelece relações a partir da sua interpretação.
Desse modo, a ação de escrever se torna uma estratégia de revelação, não apenas para
a comunidade, mas para o próprio autor. Passar por esse processo, muitas vezes, conduz a
uma revelação para si mesma de algo que lhe parecia muito conhecido. As professoras se
tornam pesquisadoras de sua sala, das crianças e de suas ações e intervenções. Alternam
da pesquisa para a ação e vice-versa. Além disso, toda documentação se torna uma fonte
indispensável de materiais que nos possibilitam ler e refletir, tanto individual quanto
coletivamente, sobre a experiência que estamos vivendo em sala de aula.
Introdução
Os textos apresentados a seguir têm como objetivo contribuir para o enriquecimento
e aprofundamento do trabalho realizado na Educação Infantil além de provocar a reflexão
da prática, a partir dos atravessamentos teórico-práticos postos nesta proposta formativa.
Acreditamos que a concretude deste material pode orientar discussões e pesquisas
futuras, subsidiando o aprofundamento das ações educativas de gestores, professores e
auxiliares que atuam nesse segmento da educação.
Conforme explicitado, esse conjunto de escritas produzidas pelas professoras, em
parceria com as gestoras, foi ancorado em 11 Grupos Temáticos, abrangendo concepções
educativas relativas à formação das crianças, a diferentes objetos de conhecimento e
linguagens: A criança como sujeito do processo educativo; Afetividade e aprendizagem;
Educar, cuidar e brincar; Avaliação e documentação pedagógica; A pedagogia da escuta;
Ambiente educativo; Projetos; Linguagens, entre elas Linguagem musical, Artes plásticas
e visuais, Linguagem matemática e Linguagens oral e escrita.
Na estrutura dos textos temáticos, as apresentações e reflexões finais foram
elaboradas por Adriana Torres Máximo Monteiro e Alessandra Latalisa de Sá, relacionando-
as aos relatos. Essas escritas, de caráter avaliativo, se basearam na valorização da
consciência da professora sobre sua prática e no entendimento de que a construção
do saber docente não ocorre de modo fragmentado e isolado. Ao contrário, faz-se de
maneira integrada, global e inter-relacional.
Tema 1
A criança como sujeito do processo
educativo
A concepção de criança vista como ator social e sujeito de direitos dotado de
pensamento reflexivo e crítico é o princípio básico que sustenta essa proposta de
formação pedagógica das professoras da Educação Infantil. Nesse sentido, destaca-se
a superação de concepções tradicionais dominantes sobre a infância, que definem as
17. Doutora e Mestre em Educação – Coordenadora Pedagógica deste projeto, organizadora desta publicação.
18. Doutora e Mestre em Educação – Coordenadora Pedagógica deste projeto, organizadora desta publicação.
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crianças como seres irresponsáveis, imaturos, incompetentes e meros receptáculos das
determinações postas pelos adultos.
O conceito de criança que guia os princípios das práticas discutidas com as
professoras dos municípios de Barão de Cocais e Rio Piracicaba define as escolhas nesse
processo de formação. Falamos da criança como sujeito que tem voz e vez, capaz de
tomar decisões, que apreende o mundo à sua maneira, produz conhecimentos e dialoga
com a cultura por meio das interações com seus pares e com os adultos. Essas relações
são mediadas por produtos culturais, como as linguagens, objetos e artefatos.
Para planejar qualquer projeto pedagógico, é fundamental antecipar que a criança
será a protagonista do processo educativo. Essa consciência é revelada na escrita da
professora Marília Pantuza, de Rio Piracicaba. Para ela, é importante conhecer as crianças
para “considerar o que sabem e valorizar os seus saberes como fundamento de novas
aprendizagens”.
Desse modo, as decisões pedagógicas estão atreladas à interpretação que a
professora tem sobre a criança e como ela vive a sua infância. Por isso, uma das ações
educativas fundamentais para essa abordagem é a escuta19 atenta da professora para
que tenha elementos que respeitem a lógica infantil e, assim, possa construir um projeto
pedagógico com a criança e não por ela. A participação da criança no espaço da Educação
Infantil se dá de diferentes formas. O brincar é a principal delas. É brincando que a criança
experimenta, reproduz e se apropria do mundo adulto.
Para um grupo de professoras de Rio Piracicaba, trabalhar com a concepção da
criança como protagonista é um desafio permanente que coincide com as questões postas
por essa proposta de formação. Assim, sentem-se fortalecidas para o enfrentamento de
suas inquietações. Segundo as professoras, há de se desconstruir o padrão de Educação
Infantil em que as crianças sejam meras receptoras de conhecimentos artificializados. Essa
condição levou as professoras da Escola Mickey e da Creche Eunice Lelis a refletirem sobre
a importância do papel de serem professoras e atuarem de maneira que reconheçam o
valor dos primeiros anos de vida na formação do ser humano.
A ideia da criança como sujeito social e cidadão de direitos está alinhada às políticas
públicas voltadas para a infância e Educação Infantil, pois, sendo a criança um cidadão de
direitos, sua educação deve caminhar na vertente que valoriza o direito ao brincar. Nos
documentos oficiais atuais, como as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Infantil (2010) e em diferentes propostas curriculares municipais, é possível encontrar tal
proposição. O caminho é investir em um currículo que priorize a brincadeira, o educar
e o cuidar no contexto das situações reais vividas em seu dia a dia escolar. Dessa forma,
configura-se a construção de uma escola voltada para a infância.
A gestora Marisa Bueno de Freitas, de Rio Piracicaba, organizou a entrevista a seguir
com algumas professoras sobre o tema, quando explicitaram a concepção que tinham
de criança como sujeito de seu processo educativo, a função da escola em suas vidas e
de suas famílias, além de citarem algumas situações práticas que vivenciam no cotidiano
escolar.
Entrevista
A Criança e a Educação Infantil
Marisa Bueno de Freitas20
Aline Cristina Martins Barino21
Edilane Cristina Lopes de Souza Júlio22
Erlaine da Conceição Miranda Alvarenga23
Marília da Conceição Cota Pantuza24
Maria Aparecida Ezequiel Silva25
Nadir Viana de Andrade26
O contexto
Nesta entrevista, inicialmente as professoras situaram os contextos da escola e
da creche. A comunidade na qual a Escola Mickey está situada pertence a um bairro
de periferia, com demandas específicas a essa realidade, algumas ruas não possuem
saneamento básico, calçamento e iluminação. As famílias são grandes. Há um número
considerável de crianças que vivem com padrastos e/ou com os avós. Quase todos os pais
e/ou cuidadores trabalham fora.
De acordo com a história local, a Creche nasce no ano de 1980, a partir da necessidade
de um lugar onde as mães pudessem deixar suas crianças para poderem trabalhar. Sua
origem, de caráter assistencialista, se deu em uma realidade na qual a fome era um
imperativo e remete aos sopões e mingaus distribuídos à população em fila indiana. A
Educação Infantil se insere nesse contexto na década de 90, embora apenas nos anos
2000, associada ao “Programa de Transferência Direta de Renda”, e passa a desenvolver
um trabalho pautado num ideário pedagógico.27
A acolhida e a vivência plena da diversidade são os pontos fortes da Escola Mickey.
As educadoras vêm estabelecendo uma práxis a partir da intervenção na realidade e no
processo de construção identitária da Educação Infantil. Entretanto, há desafios a serem
superados, pois ainda encontramos em nossa escola práticas enraizadas nos processos
da educação preparatória.28
As professoras atuam na Educação Infantil há, no mínimo, 14 anos. Na Escola Mickey,
elas trabalham com classes de crianças de quatro e cinco anos há pelo menos quatro
anos, sendo que a história de vida profissional de algumas se confunde com a própria
história da escola, uma vez que nela atuam por aproximadamente 29 anos. Ao longo
20. Gestora da Escola Mickey. Licenciada em Pedagogia pela UFOP/MG. Especialista em Gestão Escolar pela UFOP.
21. Graduada em Letras pelo IES/FUNCEC, Especialista em Docência Anos Iniciais e Educação Infantil pela
UCAMPROMINAS.
22. Graduada em Pedagogia pela ULBRA, Especialista em Docência Anos Iniciais e Educação Infantil e Educação Infantil,
Especial e Transtornos Globais pela UCAMPROMINAS.
23. Graduada em Pedagogia pelo IES/FUNCEC.
24. Graduada em Normal Superior pela UFOP, Especialista em Docência Anos Iniciais e Educação Infantil pela
UCAMPROMINAS e em Psicopedagogia pelo IESD/CASTELO BRANCO.
25. Graduada em Normal Superior pela UFOP, Especialista em Docência Anos Iniciais e Educação Infantil pela
UCAMPROMINAS e em Psicopedagogia pelo IESD/CASTELO BRANCO.
26. Graduada em Pedagogia pela UNOPAR.
27. A Educação Infantil passou a atender crianças de zero a cinco anos após a promulgação da Lei do Ensino
Fundamental de nove anos, Lei nº 11.274, de 6 de fevereiro de 2006.
28. Para saber mais, consulte: KRAMER (1987).
28
desse tempo, têm buscado a construção e respeito à infância, em que as crianças são
tratadas como sujeitos de seus processos educativos. A formação em serviço favorece
reflexões e interfere nesse olhar.
29. Como explicado no capítulo 1, p. 14, desta publicação, respeitamos aqui a decisão das professoras dos municípios de
usar o termo tia quando as crianças se referem elas.
29
é um espaço de possibilidades, responsável por desenvolver em nossas crianças uma
autonomia capaz de auxiliá-las na organização de suas ideias e na execução de atividades
que possam desempenhar sozinhas, respeitando o direito essencial de ser criança.
Marisa: E qual o sentido essas crianças têm para a escola?
Marília: Mesmo sendo a educação responsabilidade da escola, da família e de toda
a sociedade, cada criança deve ser protagonista de sua própria educação. Ela precisa
ser reconhecida como sujeito do processo educativo, o que significa considerar o que
já sabem e valorizar os seus saberes como fundamento para novas aprendizagens. As
atividades de cuidado e educação de crianças cujos direitos são reconhecidos e garantidos
pela instituição e por seus educadores devem envolver o respeito à identidade familiar,
ao gênero, à raça e o direito ao brincar. Criar situações com as crianças que possibilitem
o desenvolvimento do autoconceito positivo, aprendendo a gostar de si próprias, bem
como reconhecer e respeitar as diversidades e as características pessoais do outro,
constituindo, assim, uma tarefa educativa das mais importantes.
Marisa: Como nossa escola da Educação Infantil vem tentando desconstruir a
exigência de uma prática preparatória para o Ensino Fundamental tão presente na cultura
educacional, para pensar no brincar, cuidar e educar dentro da lógica infantil?
Aline: Os pais e educadores acreditam numa cultura que dita que “a criança tem
que ir à escola para aprender a ler e a escrever”. Porém, essa forma de compreender a
educação vem mudando gradativamente, uma vez que as políticas públicas e o “Plano
Nacional de Educação” (2014)30 valorizam cada vez mais os direitos das crianças por
meio de mecanismos legais que garantem o direito ao brincar, comunicar e expressar
sentimentos e desejos. Por meio da brincadeira e experimentação, desenvolvem vários
aspectos sociais, cognitivos e intelectuais. Essas aprendizagens contribuem na construção
da sua identidade. Observamos que nossas crianças são, em sua maioria, observadoras,
interessadas, com bagagem de conhecimento de mundo. A expectativa que têm de
aprender é alta, não apenas para a alfabetização, mas para uma aprendizagem mais ampla,
envolvendo a arte, a matemática, a ciência, a linguagem oral, entre outras. Pensamos que
essas aprendizagens acontecem no contexto do brincar, que é a principal atividade da
criança na Educação Infantil.
Marisa: Recebemos uma criança que disse à sua professora:
– Tia, aqui nessa escola os alunos não são bons. Eles são bagunceiros. Aqui
só eu fico quietinha – referindo-se às crianças que conversavam e interagiam dentro
da sala.
Na percepção de vocês, na nossa escola, em que medida uma criança é sujeito de
seu processo educativo?
Edilane: Segundo Vygotsky (1984), o desenvolvimento das crianças ocorre em
função das interações. A imagem acima reflete a ideia de que a criança quieta e calada
é a que aprende. A escola vem desconstruindo esse processo, a partir do momento em
que cria intencionalmente situações para a criança interagir no contexto social em que
atua, quebrando esse paradigma, ao promover situações de interação, proporcionando
à criança construir seus argumentos, falar e escutar, dar sentido à fala do outro, negociar,
posicionar-se, mediadas pela ação do professor. É fundamental incentivar sua autonomia
em rodas de conversa, jogos, brincadeiras, momentos livres, atividades de arte e a hora
da história, por exemplo, de modo que as crianças se sintam ouvidas e fazendo parte do
coletivo da escola.
30. Plano Nacional de Educação (PNE 2014-2024), sancionado em junho de 2014 com a Lei 13.005. O PNE define as bases
da política educacional brasileira para os próximos 10 anos.
30
Marisa: Vocês acreditam que as famílias contribuem para a formação de nossas
crianças nessa perspectiva? Em caso afirmativo, de que maneira? Em caso negativo, o que
as leva a terem tal conduta?
Nadir: Acreditamos que sim. As famílias contribuem à medida que incentivam seus
filhos a virem para a escola e os trazem diariamente. E ainda na vivência dos momentos
que a escola prepara, como festividades, reuniões de pais e entrevistas. Retomar em casa
o que foi aprendido é outra maneira de contribuírem. Os pais dos alunos da Escola Mickey
frequentemente demonstram confiança no trabalho dos professores e na permanência
de seus filhos na instituição. Colaboram para que seus filhos participem do processo
educativo com interesse, respeito e confiança. O choro é um bom exemplo dessa situação.
De imediato, as famílias tendem a querer voltar com seus filhos para casa e retornarem
com eles no ano seguinte, quando estiverem maiores. A confiança conquistada com
os anos de trabalho na Educação Infantil faz com que muitos pais acreditem que os
professores conseguirão ajudar a criança a superar o estranhamento inicial.
Marisa: A Escola Mickey contribui com as famílias para que suas crianças sejam
reconhecidas e respeitadas como sujeitos da própria história? Em que momentos isso é
evidenciado?
Tida: O processo educativo da criança começa na família. Portanto, quando ela
chega à escola, já tem internalizados alguns conhecimentos e valores. A escola continua
esse processo a partir de estratégias nas quais o professor favorece a criança a vivenciar
situações de interação, valores e práticas sociais, ampliando as experiências que podem
resultar em aprendizagens significativas para a constituição delas como sujeitos. Um bom
exemplo é a eleição que realizamos para escolher o nome da boneca da sala. Estávamos
desenvolvendo uma sequência de atividades com o livro a “Bonequinha Preta”, de
Alaíde Lisboa de Oliveira, que, em 2013, fez 75 anos. A escola estava empenhada em
eleger um nome para uma boneca. Cada turma de quatro e cinco anos havia sugerido
algumas possibilidades. Posteriormente, realizaram uma votação secreta, com cabine de
votação, cédula, urna e apuração. Conversamos sobre a questão de o voto ser secreto e
valorizarmos o respeito e a vontade do outro. Todas vivenciaram a condição de eleitores
e a maioria não comentou em qual nome votou, nem quando perguntada. Duas semanas
depois, ocorreram as eleições presidenciais e um menino abordou sua professora:
– Tia, olha só, nem foi o nome que eu votei na Bonequinha Preta que
ganhou e eu não briguei, fiquei triste. Agora as pessoas ficam com uma
“brigaiada”, porque a Dilma ganhou e o Aécio perdeu.
Marisa: Nas nossas conversas do dia a dia, muitas de vocês relatam casos de
crianças que se dispersam facilmente ou concentram muito pouco, não entendem o
comando do professor e que a todo o tempo perguntam:
– Tia, o que é mesmo que é pra fazer?
Enfim, parecem ausentes de corpo presente. Não se situam em certo modelo de
aula. Como o grupo lida com as crianças que não entendem por que estão na escola, não
se encaixam em uma lógica institucional que lhe é específica?
Erlaine: Essa questão não tem uma receita pronta, pois podem existir inúmeros
fatores que levam uma criança a não se situar no universo escolar. Ao olhar cuidadosamente
para uma criança que vai à escola e não se encaixa no universo em que se encontra, faz-se
necessário conhecer o ambiente em que ela vive, o seu histórico familiar. Isso deve ser
encaminhado e orientado pela gestora em parceria com a professora em prol da criança.
A partir daí, o trabalho em sala de aula deve considerar a bagagem de conhecimentos
que ela traz. Conduzir as aprendizagens a partir dos interesses da criança, da escuta e
31
do diálogo, além de possibilitar a socialização com os demais alunos e funcionários da
instituição. Em algumas situações, além das mediações escolares, torna-se necessária a
ajuda de outros profissionais da área da saúde, como fonoaudiologia, neuropediatria,
terapia ocupacional ou psicologia. Nesses casos, a parceria entre os profissionais, a
escola e a família é um caminho fundamental para auxiliá-los no desenvolvimento e na
aprendizagem das crianças.
Marisa: No que a possibilidade de uma formação continuada e a reflexão sobre a
prática educativa na Educação Infantil contribuiu com a ideia da criança como sujeito de
seu processo educativo?
Professoras: Em uma realidade na qual a prática tradicional muitas vezes acaba
sendo mais segura para o professor, a criança estar no centro da prática pedagógica
podendo falar, sendo escutada e construindo significados, é um tanto desafiadora. Diante
da pouca oferta de reflexão e estudos coletivos com nossos pares, a formação continuada
tem a função de nos tirar da zona de conforto, fazendo-nos refletir sobre nosso real
objetivo. A reflexão da prática educativa e o estudo contextualizado são fundamentais na
busca de soluções para os problemas vivenciados no processo. Assim sendo, a formação
promove estudos, debates e troca de experiências entre os professores na busca de
alternativas em prol da criança e de seu desenvolvimento pleno. Essa formação veio ao
encontro das nossas inquietações sobre entender a criança dentro de sua lógica e como
sujeito de seu processo educativo. Levou-nos a pensar sobre o papel que o professor tem
a desempenhar, possibilitando que a criança brinque e aprenda ao mesmo tempo, sendo
cuidada e educada a partir das situações reais vividas em seu dia a dia.
32
31. Para saber mais, consulte: ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente (1990).
33
Tema 2
Afetividade e aprendizagem
A primeira vivência do homem na vida intrauterina é biológica. Desde o dia do seu
nascimento, o bebê passa a transformar sua condição biológica passo a passo, até se
tornar um sujeito social e histórico. Em outras palavras, o bebê se torna uma criança que,
mesmo dependente do adulto, pertence a uma família que faz parte de uma sociedade,
com uma determinada cultura, em um determinado momento histórico.
Esse processo começa no contato físico com a mãe e na sua inserção no ambiente
físico, social e cultural. Esse contato inicial com a mãe (sua forma de acolher, seu toque
físico, tom de voz) marca para a criança pequena o início do estabelecimento de laços
afetivos. Assim, considerando que as interações com as pessoas exercem um papel
fundamental no desenvolvimento infantil, a criança modifica o ambiente e por ele
também é modificada e, desse modo, segue constituindo o seu eu, a sua identidade e a
sua aprendizagem.
Um dos primeiros impulsos para que o aprendizado aconteça é o desejo de
aprender, que mantém a curiosidade acesa, bem como a busca para a resolução das
perguntas, de problemas e o enfrentamento dos desafios que surgem ao longo da
construção e aquisição dos conhecimentos. Afinal, perceber os interesses da criança é
considerar seus modos de pensar para ir além. Essa é uma complexa dinâmica que requer
ações cognitivas, da mesma forma que tais ações pressupõem a presença de aspectos
afetivos.
Assim, consideramos que a afetividade é o centro desse desenvolvimento, pois as
emoções e os sentimentos estão imbricados nas relações entre criança-criança, criança-
adulto, criança-conhecimento e criança com ela mesma. Nesse decorrer, as trocas afetivas
vão dando sentido à vida.
Esse reconhecimento possibilita à criança o autoconhecimento, a socialização e o
conhecimento de mundo. Significa, portanto, compreendê-la como pessoa única em
suas manifestações, como o choro, a ameaça, o ciúme, a disputa e também a alegria e o
contentamento, pois são pistas que revelam o que ela sente diante das situações que lhe
são apresentadas.
Dessa forma, é de fundamental importância acolher as diversas formas de expressão
infantil e ajudar a criança a reconhecer e nomear seus sentimentos, para que aprenda
a lidar com as próprias emoções. E quando surgem situações conflituosas em que ela
não tenha autonomia para resolvê-las sozinha, torna-se necessário que o adulto assuma
um posicionamento firme na busca da resolução conjunta dos conflitos, seja com uma
criança ou mais.
No plano coletivo, é preciso fortalecer as formas de expressão utilizadas nas diversas
linguagens de tal forma que as crianças desenvolvam a capacidade de compartilhar as
experiências afetivas numa convivência social com seus parceiros e professores.
Na presente proposta de formação de professores da Educação Infantil, trabalha-se
explicitamente a necessidade de organizar momentos de brincadeiras para que a criança
identifique e expresse seus afetos, desejo, desagrados e emoções. O pensamento, a
imaginação e a afetividade se entrelaçam por muitas vias.
34
Numa brincadeira registrada sob a forma de uma mini-história, realizada em outubro
de 2014 pela professora Maria da Graça Freitas, de Rio Piracicaba, é possível observar sua
atenção e seu cuidado de disponibilizar objetos, favorecer a participação das crianças na
intervenção do ambiente e na movimentação em diferentes espaços. Observa-se que a
imaginação e o vivido alimentam o jogo de representação de papéis, no qual o que liga
as crianças é o conteúdo afetivo que a brincadeira traz.
Isso significa dizer que é papel da professora de Educação Infantil promover
situações interativas entre as crianças, em que a ludicidade torne esses encontros em
momentos prazerosos. Para tanto, como o fez a professora Graça, foi preciso fornecer
às crianças a possibilidade de participar, negociar e serem sujeitos ativos das atividades.
35
Mini-história
O registro da brincadeira: diálogos, afetos,
ações e emoções
Maria das Graças Freitas32
O contexto
Nesta turma, algumas crianças costumam se organizar espontaneamente para
as brincadeiras. Ao acompanhar a movimentação delas em um desses momentos, foi
possível captar que revelam a maneira particular como compreendem o mundo dos
adultos, suas interações entre seus pares e adultos, bem como as preocupações que têm
diante das situações da vida.
Pode-se observar que, na brincadeira descrita a seguir, são destacados quatro
momentos distintos, quando as crianças começam formando uma família extensa, com
filhos, pais, avós e tios. A família, como pano de fundo, passa por situações inusitadas.
32. Professora de crianças de quatro a seis anos de idade, turma do 2º período da Escola Municipal Sebastião Araújo, no
município de Rio Piracicaba. Licenciada em Pedagogia pelo IES/FUNCEC. Especialista em Educação Especial/Faculdade
de Educação São Luís.
36
E a brincadeira segue...
Luiz Fernando: – A gente vai brincar de quê?
Giovana: – É de papai, mamãe e filhinhos.
Luiz Fernando: – Eu sou o Henrique, o filho de 10 anos.
Giovana: – Eu sou a Andréia, filha de 4 anos.
Amanda: – Eu sou a Maria: mãe dos filhos e Halley é o Mauro, pai dos filhos.
Júlia: – Eu sou Maria Alice, a tia dos filhos, que é irmã da mãe, e Luiz Felipe é
o tio Rafael, que é irmão do pai.
Amanda: – Mariane vai ser a vó e Arthur é o avô. Como vai ser seu nome
Mariane? Qual é o nome que você quer ter?
Mariane: – Meu nome é Gabriela.
Mariane: – E o seu Arthur?
Arthur: – É Anderson.
Voltando do passeio.
Hábitos locais
Giovana: – Ele é meu pai e nem conversa comigo.
Andréia: – É só com meu irmão.
Mauro: – Eu vou conversar com você também, filha. Se ficar obediente, vou
levar todo mundo pra praia. E é amanhã. Pode arrumar a mala. Nós vamos ficar
muito tempo lá.
Maria: – Agora estamos felizes, né, Mauro? Passeamos muito e vimos o mar
com os filhos, tios e avós. – concluindo a brincadeira.
39
Tema 3
Educar, cuidar e brincar
A indissociabilidade entre educar e cuidar está presente em todos os momentos do
cotidiano escolar. A criança está em constante aprendizado e, por isso, a importância de
manter o princípio de contribuir para a sua formação integral de tal forma que todos os
adultos, sobretudo as professoras, sejam responsáveis por criar condições de bem-estar
e preparo de ambientes/espaços/contextos em rotinas de trabalho que atendam as
necessidades e os interesses da criança.
Na concepção abordada no presente curso de Formação de Professores da
Educação Infantil, cuidar vai para além de atender às necessidades físicas das crianças.
Significa também valorizar seus processos de conhecimento, tornando as estratégias
cognitivas visíveis e compreensíveis, para que as crianças participem e se apropriem dos
diferentes percursos de aprendizagem que realizam.
Desse modo, organizamos situações que favorecem a interatividade, a socialização,
a cooperação e o desenvolvimento de habilidades, sem perdermos de vista a formação
de hábitos que incentivam o aprender a cuidar de si, a cuidar do outro, sobretudo seus
pares, e cuidar do ambiente de acordo com a visão sistêmica e planetária: agir local e
pensar global, portanto, cuidar do planeta. Sinteticamente, envolver-se em ações que
levam ao aprender a cuidar de si, do outro e do planeta.
Os estudos recentes sobre a infância33 indicam que a identidade da criança se forma
no interior das suas atividades diárias. Esse é um modo específico de agir e significar
o mundo que ocorre especialmente por meio das brincadeiras, sejam elas advindas
de nosso patrimônio cultural ou inventadas simbolicamente. Elas, por sua vez, estão
referenciadas no contexto do mundo adulto. Seus elementos constitutivos, como dito
anteriormente,34 são os jogos, os brinquedos, os rituais, as movimentações, os gestos e
as palavras.
O relato seguinte, fruto do trabalho realizado com crianças de seis meses a cinco
anos, em 2014, na Escola Municipal de Pré-Escolar Mickey,35 localizada no bairro Córrego
São Miguel, funciona no mesmo prédio da Creche Eunice Lelis, no município de Rio
Piracicaba. Trata-se de um projeto construído a partir do olhar da professora, que é
educadora física. Conforme seu olhar investigativo, as crianças necessitavam de maior
destreza em alguns movimentos corporais que fazem parte de atividades rotineiras.
Respeitando cada criança, Maria Aparecida Caldeira planejou uma série de movimentos
interligados a objetos, em que ela explorou atenta e cuidadosamente o potencial de seus
alunos.
33. Para saber mais, consulte: CORSARO (2002 e 2003); GOUVÊA (2003); ROCHA (2008).
34. Ver Tema 2 sobre Afetividade e aprendizagem.
35. A escola atende aproximadamente 200 crianças, de seis meses a cinco anos, nas modalidades Creche e Educação
Infantil. Aproximadamente 20% das crianças permanecem na escola em horário integral. Atende a um bairro da camada
popular e muitas crianças têm na escola uma importante referência social.
41
Relato de Projeto
O cuidar e educar nas brincadeiras de
circuito motor
Maria Aparecida Caldeira36
Marisa Bueno de Freitas37
O contexto
No início do ano, momento em que a professora realiza observações do grupo
para uma avaliação diagnóstica sobre diferentes aspectos, um deles chamou mais a
sua atenção: o uso do corpo em situações de brincadeiras com regras. Destacou-se o
embaraço das crianças em pular com um pé só, brincar de corda e amarrar os cadarços
dos sapatos. Ainda, precisavam de ajuda nos movimentos necessários para realizarem
brincadeiras, como “Coelhinho sai da toca”, pois muitos não se mantinham de mãos dadas
no círculo para brincar de roda. Partindo dessa avaliação, entendemos ser importante
ampliarmos seus repertórios de brincadeiras de tal forma que o corpo das crianças fosse
abordado como um todo, tanto nos jogos com regras, como nas brincadeiras livres.
Desse modo, a concepção de corpo da qual tratamos aqui propõe a integração das
dimensões física, social, cultural, cognitiva, política e emocional, de maneira a favorecer
uma relação das crianças com o meio em que estão inseridas, com os outros e com elas
mesmas. Para tanto, é condição essencial respeitar as diferentes habilidades das crianças e,
ao mesmo tempo, proporciona-lhes o maior número possível de experiências corporais.
Nesse contexto, optamos pela exploração corporal em situações de circuito motor.
Tal recurso foi utilizado para que as crianças pudessem explorar diferentes posturas
corporais, como assentar-se em diferentes inclinações, deitar e ficar em pé. Assim, ao se
movimentarem com maior precisão diante dos desafios proporcionados pelo percurso
proposto, poderiam adquirir maior consciência dos próprios movimentos, seus limites e
possibilidades.
36. Graduada em Educação Física pelo ICMG- Instituto Católico de Minas gerais. Especialista em Orientação Educacional
pela Universo – Universidade Salgado de Oliveira. Especialista em Educação Física para pessoas com deficiência pela
UFJF – Universidade Federal de Juiz de Fora.
37. Gestora da Escola Mickey. Licenciada em Pedagogia pela UFOP/MG. Especialista em Gestão Escolar pela UFOP.
42
agilidade, coordenação, concentração, além do desenvolvimento das habilidades
motoras.
Durante as brincadeiras nos circuitos, observo como as crianças vibram. Quando
concluem o trajeto, é possível ver, em seus sorrisos, a satisfação. Em outras situações,
percebo a ansiedade dos colegas quando alguém apresenta dificuldade, chegando a
levantar a cadeira para o outro conseguir passar.
Pular nos arcos com um ou dois pés. Rolar no colchonete frente ou para o lado.
Passar por baixo das cadeirinhas Usar diversos materiais criando situações
enfileiradas. inusitadas. – Crianças do berçário.
43
Com as traves de equilíbrio, delimitamos um espaço retangular que possibilitou um
jogo de faz de conta:
Professora: – E agora? O que está acontecendo, minha
gente?
Rafaela: – A gente tá na piscina.
Davi: – Eu vou dar um pulo, olha tia!
Professora: – Cuidado na hora de nadar. Esta piscina
tem muita gente.
Vitor Hugo: – Eu sou um tubarão.
Rafaela: – Ai, o tubarão mordeu o meu pé.
Vitor Emanuel: – Na piscina não tem tubarão. Ele é
muito grande.
Professora: – Vitor Hugo, nessa piscina não cabe um
tubarão?
Vitor Emanuel: – Não. Essa piscina é só de crianças.
Alguém bate o pé nas traves.
Davi: – Ah... Acabou a água toda. Esvaziou tudo!
– reclama.
Nesse instante, as crianças saem da área delimitada, “a piscina”, e Vitor Emanuel fecha
as laterais, simulando pegar uma mangueira e começar a encher a piscina novamente. E
a brincadeira recomeça.
Essas situações de espontaneidade e diversão são para elas momentos de
descoberta e integração. Além disso, a brincadeira de faz de conta desenvolve não só
a imaginação, mas alimenta afetos, elabora conflitos e, nesse caso, explora habilidades
corporais das crianças.
Professora orienta, fica por perto para que a criança se sinta segura. A criança arrisca e
experimenta novos movimentos.
44
Brincando com arcos
Isabela: – A gente pode brincar de coelhinho na toca, colocar no chão e ir
pulando. – criança de seis anos.
Geralmente, prevemos que a forma como as crianças brincarão com os arcos será
“bamboleando” na cintura ou colocando-os no chão para pular. Porém, podemos pensar
numa infinidade de maneiras de explorar o material, bastando ofertar-lhes e permitir que
elas explorem e utilizem os arcos como um brinquedo.
As crianças jogam os arcos para cima, tentam pegá-los, colocam-nos na cintura para
rodar. Quando experimentam rodá-los em um braço, um novo desafio:
Professora: – Se já sabe com um braço, tente com o outro.
É praxe que alguém venha mostrar como faz, dizendo:
Criança: – Tia, olha o que eu consigo.
É comum uma criança demonstrar o que é capaz de fazer e um colega que está por
perto tentar fazer igual.
No jogo simbólico, as crianças fazem do arco o volante do carro, brincam de dirigir,
saem para comprar algo no supermercado, vão à rua, ao centro da cidade, ou mesmo
realizam uma viagem em que cada um traz aquilo que comprou.
Nesses eventos, a criança experimenta várias habilidades motoras: corre, pula,
desloca-se, faz a condução do bambolê, abaixa e levanta. Para quem está de fora, tudo
pode parecer confuso, todavia, nesse momento, a criança experimenta, cria, transforma
um objeto em outro, conhecendo suas próprias possibilidades e as dos outros.
45
Brincando com as traves de equilíbrio
Sabrina: – É só a gente montar alguma coisa,
subir em cima e andar. – criança de seis anos.
38. Teste de Coordenação Corporal para Crianças (Körperkoordinationstest Für Kinder - KTK)
46
Escolher, explorar, inventar e organizar
Em outra aula, propus às crianças escolherem o material para brincar entre os que
foram apresentados anteriormente.
Kauã: – Eu quero aquele brinquedo que brilha e que a gente faz piscina. –
criança de quatro anos.
Virando cambalhotas!
Ao perceber que alguém tenta virar de cambalhota, consideramos que, por
uma questão de segurança, é o momento de parar, explicar como se faz e conduzir o
movimento com um apoio:
Posição inicial. Execução.
As bolas utilizadas são de diferentes tamanhos, cores e pesos, sendo uma para cada
criança. Essa é uma oportunidade de apresentar para elas os diferentes tipos de bolas e
seus respectivos esportes. Algumas já nomeiam a bola de futebol, futsal, handebol, tênis,
ping-pong; outras crianças sabem que são diferentes e têm usos distintos.
Jogar a bola usando as mãos. (crianças Conduzir a bola com uma das mãos.
do 2º período).
48
O uso de materiais diversificados, como as diferentes bolas descritas, possibilita às
crianças estabelecerem comparações entre tamanho, peso, velocidade. É nesse sentido
que nossa concepção é ampla, pois atividades como as descritas abrangem outras esferas
de informação, não focam apenas o exercício motor.
Tema 4
A pedagogia da escuta
A escuta é uma atitude receptiva por parte dos adultos – gestores, professoras e
auxiliares –, que pressupõe uma disponibilidade para interpretar as mensagens expressas
pelas crianças por meio de diferentes linguagens. Nesse sentido, se a criança elabora
teorias e hipóteses, então ela é protagonista e participativa, e os verbos mais importantes
que guiarão a ação educativa não serão o falar/transmitir, mas sim o escutar/conhecer a
infância em suas formas de expressar e se comunicar.
Escutar para agir é atender às necessidades postas pelas crianças e, assim,
organizarmos as situações educativas que as levem a conhecer, gerar e articular
conhecimentos socioculturais, combinar sentimentos, imagens e pensamentos. Nas
palavras de Rinald (2012, p. 124):
Relato de projeto
Alimentação Saudável
Alcione Gonçalves Cruz40
Eliza Aparecida dos Santos41
O contexto
Este relato de projeto42 foi elaborado pela professora Alcione Gonçalves Cruz com
a diretora Eliza Aparecida dos Santos da Escola Municipal Pedro Gonçalves, localizada no
povoado Córrego da Onça, de uma área rural situada no município de Barão de Cocais.
Essa escola atende crianças de quatro a dez anos.
Alcione era professora regente da turma “Prestígio”, no ano de 2014. Uma turma
multisseriada, composta por 12 alunos de quatro a oito anos, que compreendem os 1º
e 2º períodos da Educação Infantil e os do 2º ano do Ensino Fundamental. Ela ressalta
que, nesse contexto, os maiores respeitavam o tempo e o espaço dos menores e,
quando necessário, os ajudavam, principalmente na hora do conto e das brincadeiras
direcionadas. Na condução do trabalho pedagógico, a professora procurou organizar
projetos que atendiam à diversidade da turma.
O projeto destacado aqui foi desenvolvido nos meses de agosto a outubro de 2014.
Na finalização, foi realizada uma apresentação para os pais, quando cada criança explicou
o que tinha curiosidade em saber no início do projeto e o que havia aprendido com ele.
40. Formada em Pedagogia e Pós-graduada em Psicopedagogia, leciona há 13 anos na Escola Municipal Pedro
Gonçalves, em Barão de Cocais.
41. Formada em licenciatura básica para Ensino Fundamental UFOP.
42. Sobre projetos de trabalho, leia no tema Projetos desta publicação, em que perceberá a distinção do modo como
o projeto relatado foi organizado e a concepção de “Projetos” discutida nesta formação. O projeto aqui registrado foi
realizado em momento anterior ao grupo temático 5, mas é pertinente nesta publicação como ilustração das reflexões
sobre a Pedagogia da Escuta.
54
– Hambúrguer;
– Pizza;
– Sucos naturais;
– Sucos de pacotes;
– Pastel.
Com essa lista, ficou evidente que as crianças enumeraram o que gostavam de
comer e não necessariamente a relação dos alimentos com a saúde. Conduzi, então, a
conversa com elas para o que é saudável e faz bem e o que, mesmo sendo gostoso, pode
fazer mal para nossa saúde. Selecionei imagens de alimentos tendo como referência
aqueles feitos pela nossa cozinheira na escola e o que as crianças disseram que comem
em casa. Propus-lhes que separassem os alimentos em dois grupos: o que é saudável e
não saudável.
As próprias crianças começaram a dar sugestões sobre o que elas mais gostavam
de comer e o que era muito doce e gorduroso. Comentaram sobre familiares obesos e
hipertensos:
Criança: – Professora, minha vó é gorda e tem pressão alta.
Considerando as realidades de escola rural e famílias com menos contato com livros
e revistas, responsabilizei-me por fazer pesquisas informativas e trazer para os alunos
materiais que ampliassem nossas discussões. Além disso, propus-lhes que perguntassem
para os conhecidos e familiares o que sabiam sobre esse tema. Depois de coletarmos as
informações, registramos o que foi falado no quadro.
Para termos melhor visibilidade das nossas questões e do desenvolvimento de
nossa pesquisa, fizemos uma roda de conversa diante do mural e fixamos nele alguns
títulos para pesquisarmos ao longo do trabalho. Minha intenção com essa documentação
era dar visibilidade às intenções, intervenções e aos saberes construídos com o grupo.
O mural é um dos suportes que utilizamos para tal fim. A participação das crianças
em sua composição foi fundamental para a compreensão e o envolvimento com o
Projeto. Assim, combinamos de organizar as nossas questões, separando-as da seguinte
maneira: O que sabemos? E o que queremos saber?43
Na montagem do painel, as crianças discutiram sobre sua organização e fixaram as
informações. Nós intitulamos o Projeto de Qualidade de vida, saúde e nutrição.
43. Essas perguntas são típicas de um determinado referencial teórico distinto do estudado nesta formação no grupo
temático 5.
55
Selecionando e classificando as informações
Em uma roda de conversa, apresentei às crianças a Cartilha do MEC sobre alimentos
saudáveis do Sítio do Pica-Pau Amarelo, que citava os hábitos alimentares do Sítio,
seguindo as receitas de Dona Benta. Após a conversa, partimos para informações e
esclarecimentos dos alimentos saudáveis.
As crianças começaram a comentar como era a alimentação em casa e questionaram
se ela estaria adequada. Perceberam que, na escola, a merenda oferecida é saudável e
que eles poderiam fazer da mesma maneira em casa.
Fragmentos desse diálogo:
Criança: – Lá em casa a gente come muita carne e arroz.
Criança: – Eu não gosto de comer salada.
Nossas rodas de conversas passaram a acontecer sempre em frente ao painel,
quando fazíamos leituras, acrescentávamos e alterávamos as informações.
As crianças de oito anos questionaram qual a caloria dos alimentos e quais vitaminas
têm as frutas e verduras. As de seis anos queriam saber qual a diferença entre verduras e
legumes. As de quatro anos queriam saber se hambúrguer e sorvete fazem mal à saúde.
Com a intenção de favorecer que uma criança aprendesse com a outra e promover
trocas, coletivizei as dúvidas dos maiores e conduzi o diálogo procurando responder-lhes
algumas questões.
Com os conhecimentos adquiridos em livros e nas discussões das rodas de
conversa, chegamos a algumas definições sobre os alimentos que, se comermos em
excesso, podem não fazer bem à saúde e quais poderiam ser comidos para termos uma
alimentação mais saudável.
Ingredientes:
1 abacaxi
1 litro de água filtrada
Modo de preparo:
Lavar bem o abacaxi e descascá-lo. Depois colocar a polpa
do abacaxi e a água no liquidificador e bater bem.
Sirva o suco em seguida.
Ingredientes:
Casca de um abacaxi
1 lata de leite condensado
1 colher de manteiga
Modo de preparo:
Bater a casca e o leite condensado no liquidificador;
depois colocar a manteiga em uma panela e levar ao fogo até
o conteúdo se desgrudar da panela. Depois de esfriar, untar as
mãos com manteiga e enrolar o brigadeiro.
Tema 5
Avaliação e documentação pedagógica
Avaliação é um tema recorrente na formação de professores da Educação Básica,
mas vem ganhando mais relevância na Educação Infantil, especialmente com a sua
crescente oferta. Considerando que há diferentes concepções e modos de se realizá-la,
a novidade aqui é a documentação e o modo como esse conceito se inter-relaciona,
integra, complementa a avaliação.
Defendemos a ideia de implementar na escola uma avaliação que seja
verdadeiramente formativa, não somente para a criança, mas também para seus pais
e professoras. Sendo assim, o desafio é romper com a avaliação cujo propósito é dar
uma nota ou classificar uma criança. Diferentemente disso, propomos uma avaliação
que orienta as crianças para a realização de seus trabalhos e de suas aprendizagens,
ajudando-as a localizarem suas dificuldades e potencialidades, redirecionando-as em
seus percursos. Trata-se de uma avaliação que ajuda a criança a aprender e o professor
a ensinar. Para isso, observamos, registramos e analisamos os percursos educativos, a
fim de compreender o vivido e obter dados que direcionem os próximos passos para a
progressão do trabalho pedagógico e a trajetória da criança.
Com essa visão, chamamos esses registros de “documentação”, tal como indicado
por Edwards e Gandini (2002, p. 151):
Mini-história
O trabalho pedagógico
compartilhado: a força da parceria
Vânia Barbosa Carvalho44
Élida Soares Silva45
O contexto
Esta mini-história foi elaborada a partir de uma conversa entre a gestora Élida Soares
Silva e a professora Vânia, da Escola Municipal Trenzinho da Alegria, também conhecida
por Núcleo Infantil Recanto Feliz. Essa escola fica localizada no município de Barão de
Cocais e as crianças que a frequentam estão na faixa etária de três a doze anos.
Em uma conversa com a gestora Élida, Vânia relata um momento em 2004, como
professora de crianças de três anos, em que compartilhou com uma colega as propostas
pedagógicas que ela desenvolveria em seu trabalho. Sua colega, na ocasião, escutava,
criticava, sugeria, colocando-se como parceira nesse planejamento.
Vânia acolhia as contribuições e repensava suas ações. Embora procurasse assumir
uma atitude reflexiva, sua escuta com as crianças - para ajustar cada vez mais as atividades
às vivências junto delas - não era seguida de registros escritos e fotográficos. A professora
enfatiza que ela e as crianças aprenderam muito e que foi uma ótima experiência. Salienta
ter saudade dessa época quando, ao planejarem as aulas, consideravam as expressões e
manifestações da criança. Mas, com a ausência de documentação, muito do que foi vivido
se perdeu na memória. Hoje, diz que aprendeu nesta formação que esse “olhar” sobre a
prática e os processos da infância devem ser repensados todos os dias e registrados no
cotidiano escolar.
Vânia relata que, no Maternal III, as crianças estão dispostas a muitas descobertas,
além da aquisição e ampliação da linguagem oral. Sendo assim, ela procurou considerar
outras linguagens, como as visuais, teatrais e musicais.
Diante do desafio do registro dessa experiência, Vânia percebe a importância de
um olhar sensível e escuta atenta das crianças e a falta do registro mais significativo de
ações praticadas e vivenciadas. Esses registros possibilitariam representar e identificar
os percursos educativos das crianças no cotidiano escolar. Contribuiriam ainda para
intervenções e aprimoramento das aulas, valorizariam o potencial dos alunos na
construção dos saberes nas diversas atividades propostas. Mesmo com poucos dados
específicos, a professora construiu um portfólio de desenvolvimento individual do aluno,
que foi apresentado aos pais em reuniões pedagógicas.
Entretanto, ao longo dessa entrevista e com a proposta de escrita de uma
mini-história, deparamo-nos com indagações feitas tanto pelas parceiras nesta produção,
quanto por nós, em função das novas discussões estabelecidas nesta formação.
Diante disso, decidimos realizar novamente intervenções antes feitas na primeira
experiência, a fim de apurarmos nossa escuta, experimentarmos diferentes registros
44. Formada pela UNIPAC em Normal Superior e Pós-Graduada em Educação Infantil pela FINOM, a Professora Vânia
Barbosa Carvalho completou uma década lecionando na rede municipal de educação de Barão de Cocais, na Escola
Municipal “Trenzinho da Alegria”, onde atua há sete anos na Educação Infantil.
45. Formada em Pedagogia e Normal Superior pela UniPac, atua na coordenação da Núcleo Infantil Recanto Feliz.
64
e coletar dados que pudessem enriquecer esse novo relato e especialmente a nossa
formação. Embora com a mesma professora (Vânia), as crianças dessa segunda experiência
são mais velhas, têm cinco anos e estão no 2º período.
Compreendemos as limitações e complexidade da nossa escolha, mas, naquele
momento, a intenção era experimentar na prática os pressupostos teórico-metodológicos
apresentados e discutidos na formação do grupo temático 2: Avaliação e documentação
pedagógica e pedagogia da escuta.
Aqui, além da riqueza da experiência pedagógica, pode-se verificar a postura
e disposição da professora para as mudanças que esta formação de profissionais da
Educação Infantil pretendeu, especialmente, no que diz respeito à documentação e
avaliação.
Sabe-se que os registros representam uma escolha entre muitas outras. Ao realizar
a documentação que segue, Vânia demonstra envolvimento com sua prática e com seu
percurso de amadurecimento profissional, e, ao mesmo tempo, um olhar diferenciado e
cuidadoso para as crianças: seus avanços e desafios.
46. Vilma Teixeira da Conceição é formada pela UFOP e atua na Rede Municipal há 18 anos na Educação Infantil e no
Ensino Fundamental.
65
de aprendizagem, trouxe para sala acerolas, com a intenção de desencadear uma
conversa sobre germinação das plantas relacionada aos cinco sentidos, destacando cores
e sabores.
Mediante a curiosidade das crianças nas rodas de conversa, quando me perguntavam
se eu tinha dado aula para os seus irmãos ou primos e querendo saber o que faziam e
como a escola era antes de eles chegarem, contei-lhes sobre o Projeto.
Consciente de que essa oportunidade poderia
gerar momentos para aprendizagem, resgatei essa
história com o intuito de trabalhar temas propostos
no Planejamento Anual do 2° período. O que deu
certo no passado poderia ser resgatado, porém, com
aprimoramento de registros fotográficos, filmagens,
textos, bem como atenção às especificidades do novo
grupo de crianças.
Os desenhos foram expostos no mural da escola para que outras turmas apreciassem
os trabalhos.
Enquanto realizavam suas representações, comentavam umas com as outras:
Nathiely: – Eu fiz o galho, ele é de pau e fiz muitas acerolas vermelhas.
Milenia: – Eu fiz a acerola vermelha porque ela tá boa, ela tá doce.
41
Essas perguntas são típicas de um determinado referencial teórico distinto do estudado nesta formação no grupo temático 5.
68
Relato de projeto
O que o professor aprende quando
documenta o cotidiano com as crianças
Eduarda Diniz Mayrink47
Elaine Neide Silva Paulo48
O contexto
A escola Municipal Murillo Garcia Moreira atende crianças de Educação Infantil de
quatro a cinco anos, que possuem uma rotina planejada de acordo com um currículo
definido pela escola, a partir de estudos realizados com o grupo de professores que
atuam nessas turmas.
A situação educativa aqui relatada foi realizada no primeiro semestre de 2015. Tem
como principais autoras a coordenadora pedagógica Eduarda Diniz Mayrink e a professora
das crianças de cinco anos, Elaine Neide Silva Paulo, de Rio Piracicaba.
A prática de sala de aula e as aprendizagens cotidianas, como planejamento e
reflexão, já eram registradas pelas crianças em um caderno de atividades, cujo principal
objetivo era ser um meio de comunicação entre criança, escola e família.
A partir desta formação para Educação Infantil, ampliamos o conceito e o
entendimento da documentação pedagógica com um enfoque reflexivo e com a
intenção de dar maior visibilidade aos costumes e interesses das crianças e das mediações
realizadas pela professora. Desde então, modificamos a maneira de registrar os processos
vividos pelas crianças, suas experiências e as estratégias utilizadas no processo de
aprendizagem.
Hoje, o nosso modo de registrar ampliou muito. Utilizamos vídeos, fotos, produções
dos alunos, falas das crianças, registro das interações entre elas. A nossa comunicação
com a família também foi aprimorada. Tornar visível o processo de aprendizagem e as
estratégias de cada criança possibilitou a leitura, a revisão e avaliação do tempo e espaço
da sala de aula como parte integrante do cotidiano. O caderno do aluno ainda é utilizado,
mas outras formas de documentar ganham espaço. Passamos a anotar o que falam as
crianças, registrar, gravar, fotografar como forma de representar fragmentos de uma
memória que, aos poucos, torna-se objetiva no cotidiano das atividades realizadas dentro
e fora da sala.
Muitas vezes, para que as crianças tenham aprendizagens significativas,49 precisamos
planejar a forma de avaliar e documentar as experiências realizadas. Como exemplo da
documentação que estamos realizando atualmente, registramos uma pesquisa realizada
na classe das crianças de cinco anos.
Dentro da rotina da classe, realizamos projetos em sala de aula. Planejamos várias
atividades e formas de documentar a partir das pesquisas, leituras, discussões em
47. Licenciada em Pedagogia pelo IES/FUNECE João Monlevade. Especialista em Psicopedagogia Institucional pela
Universidade Castelo Branco, RJ.
48. Professora da classe de Educação Infantil de cinco anos, formada em Magistério de 1º grau – 1º ao 5º ano, na Escola
Estadual Antônio Fernandes Pinto, em Rio Piracicaba.
49. Para saber mais, consulte: COLL (1994).
71
sala, visitas à biblioteca da escola realizadas pelos alunos. O interesse e o estudo pela
metamorfose das lagartas foram um episódio que mereceu destaque.
Uma das primeiras ações foi selecionar textos e informações que chegavam até as
crianças por meio de pesquisas e leituras realizadas por mim.
Após alguns dias, no início da aula e durante uma reunião de pais que aconteceu
durante a realização do projeto, recebemos relatos das famílias de como a experiência
estava chegando a casa.
Assistimos a vídeos com imagens e explicações da metamorfose. Organizei materiais
na sala de aula para que as crianças pudessem acompanhar a transformação da lagarta
em borboleta e, dessa maneira, compreender melhor todo o processo.
Em sala, tiveram a chance de acompanhar, em tempo real, lagartas se transformarem
em borboletas. Para tanto, contamos com a colaboração das famílias nas fases iniciais de
estruturação do projeto.
Fase 1 - Pedimos aos pais para enviarem lagartas para a escola.
Fase 2 - Colocamos as lagartas em uma caixa de vidro cheia de folhas e galhos para
sua alimentação. As crianças observaram as lagartas por aproximadamente um mês.
Lagartas transformadas em
borboletas dentro da caixa de vidro.
Registro da experiência em
formato de notícias.
50. Este é um dos formatos de documentação apresentado e trabalhado nesta formação. Ressalta-se a disponibilidade e
investimento da professora em experimentar e compartilhar sua produção e seu processo de formação.
75
• O material que se produz e as formas de registros servem de apoio à memória
para consultas futuras e também como instrumentos de reflexão.
• Reconhecimento pela professora de que a documentação pedagógica organiza
o trabalho.
• Maior visibilidade do trabalho realizado em sala e da relação com as famílias.
• Possibilidade de escutar e de rever os acontecimentos em que as crianças foram
protagonistas.
• Escutar mais as crianças e se aproximar delas, tornando visíveis suas
aprendizagens e necessidades.
Para as crianças:
• Maior envolvimento e participação das crianças ao fazer registros.
• Maior comprometimento com as experiências realizadas, tornando-se mais
responsáveis por si e pela turma.
• Ter o professor como seu ouvinte.
76
Tema 6
Ambiente educativo
Iniciamos a abordagem desta temática conceituando os termos espaço e ambiente:
Para dar mais visibilidade ao que estávamos propondo bem como conduzir
o olhar das professoras sobre o ambiente educativo em que atuam junto às crianças,
problematizamos este tema a partir das seguintes questões:
Mini-história
Redescoberta de espaços e ambientes
educativos
Raquel Machado Martins de Barros51
Das diferentes reflexões feitas sobre ambiente educativo, neste texto um grupo de
gestoras enfatiza as mudanças ocorridas na rotina e no olhar das professoras sobre as
crianças a partir da formação oferecida pela parceria entre Fundação Vale, COBAP e SME.
O contexto
As instituições escolares Creche Dona Rita e Escola Municipal Bernardo Ferreira
Guimarães são vizinhas e estão situadas na Praça José Júlio de Souza, no distrito Padre
Pinto e pertencem à rede de ensino da Secretaria Municipal de Educação de Rio
Piracicaba, Minas Gerais. O distrito é reconhecido pela Fundação Cultural Palmares como
comunidade Quilombola, com forte influência cultural étnico-racial.
Na Creche Dona Rita, são atendidas crianças de seis meses a seis anos que, a partir
dos quatro anos, quando ingressam na Educação Infantil, passam a frequentar a Escola
Municipal Bernardo. Assim, pela manhã, as crianças estão na creche e, à tarde, são levadas
para a escola.
Essas instituições escolares buscam trabalhar em conjunto, valorizando o cuidado
e a aprendizagem das crianças desde os primeiros anos de vida, considerando seus
conhecimentos prévios.
As professoras, da creche e da escola, em uma produção conjunta com as gestoras,
diretora e secretária52 de divisão pedagógica, refletiram sobre o processo de transformação
de profissionais e espaços em ambientes educativos na produção de conhecimento.
51. Chefe da Divisão Pedagógica da Secretaria Municipal de Educação, graduada em Enfermagem pela UFMG e
Direito pelo IES/FUNCEC de João Monlevade; Especialista em Gestão Regional da Saúde pela Faculdade Senac/MG e
Planejamento Financeiro e Orçamentário do SUS Municipal pela PUC/MG. Especialista em Direito Processual pelo IES/
FUNCEC.
52. Creche Dona Rita - Gestora: Andréa Silva- Graduada em Pedagogia pela FUNCEC, Pós-graduada em Educação –
Pitágoras, Especialista em Psicopedagogia pela FUMEC. Professora: Suelen Cerqueira Barros- Graduada em Pedagogia.
Escola Municipal Bernardo Ferreira Guimarães - Diretora: Elizara Aparecida Mendes- Graduada em Pedagogia (UNINTER),
Pós-graduada em Gestão em Prática pelo Instituto Pró-Minas. Gestora: Marinersi Pessoa Cota Bueno Guimarães-
Graduada em Normal Superior pela FUNCEC, Pós-graduada em gestão escolar UFOP. Professora: Simone Catarina
Pereira- cursando Pedagogia a distância – UFOP.
80
às crianças conhecimento, cultura, lazer e prazer, considerando o conhecimento prévio e
o meio em que vivem.
A mesma proposta educacional era referência tanto para a Creche quanto para a
Escola, mesmo sendo instituições distintas com diferentes objetivos. As práticas eram
semelhantes e focadas na decodificação do nosso sistema de escrita alfabética de maneira
restrita, além de priorizar atividades motoras, como colorir desenhos estereotipados para
um treinamento motor descontextualizado.
Desenhos sobre os
habitantes do fundo do mar.
Tema 7
Linguagens
Nós, seres humanos, utilizamos diversas linguagens para nos comunicarmos. A
função simbólica e a dimensão lúdica são as principais fontes para o surgimento das
linguagens que o ser humano constrói ao longo da vida. “A possibilidade de construir
símbolos é dada pela constituição genética da espécie e a realização efetua-se por um
complexo processo de natureza cultural e biológica. Este processo efetua-se, também,
como uma realização social e individual”. (LIMA, 2002,2003, p. 2).
Portanto, as linguagens são múltiplas e só ganham sentido se forem vividas
socialmente no interior da dinâmica das interações vividas pela criança, que, por sua vez,
se apropria das informações que recebe do adulto e produz modos específicos de se
comunicar, por exemplo, o desenho, o movimento, a dramatização e a brincadeira.
Assim, cabe à professora da Educação Infantil explorar ao máximo essas situações
de maneira lúdica, pois isso permite que a criança organize as ações e os pensamentos,
desenvolvendo diferentes formas de ser, estar e se comunicar com o mundo.
Nos grupos temáticos organizados para este curso formativo, abordamos
as linguagens oral e escrita, as brincadeiras, a corporeidade, as artes, a música, e a
matemática. Nesta seção, destacamos o projeto de artes visuais, no qual cada criança
é encorajada a se expressar por meio das mais diferentes linguagens: desenho, pintura,
palavras, movimento, montagens, dramatizações, colagens, escultura, música.
Artes plásticas
A arte está presente no mundo. Desde a pré-história, o homem faz arte.
Considerando essa prática e o pensamento infantil potente, entende-se que a presença
da arte na escola se faz necessária, visto que a criança, pela via da experiência artística,
constrói e reconstrói o mundo, expressando-se e se comunicando com ele.
Essa experimentação só se torna possível na exploração de materiais, na
contemplação das artes produzidas pelos inúmeros artistas, na apreciação de produções
individuais ou coletivas, nas construções da natureza, no mergulho nas cores, movimentos
e sons.
A apropriação das múltiplas linguagens realizada pelas crianças tem como fonte
primordial a imaginação e a criatividade. Entretanto, ninguém cria do nada. É preciso
interagir com as construções estéticas e artísticas para servir de alimento criação e
imaginação. A arte para as crianças se entrecruza entre o fazer e o pensar artístico. As
professoras podem fazer muito para que isso aconteça.
Segundo Barbieri e Baroukh (2012, p. 19):53
Relato de projeto
Aprender e fazer arte com o outro e a
diversificação de propostas
Rosa Magna de Barros Machado Vilela54
Solange Maria Martins dos Santos55
O contexto
O projeto foi desenvolvido pela professora Rosa Magna de Barros Machado Vilela, na
turma de 2º período, composta por 19 alunos. Maguinha, como é conhecida, considera-
se uma pesquisadora de sua prática. Mais do que dotar seus alunos de conteúdos e
habilidades técnicas, instiga as crianças a desenvolverem a sensibilidade a partir de
vivências artísticas, propõe ações que possibilitam experiências de criação que provocam
um novo sentido para a arte na escola de Educação Infantil.
As artes plásticas fazem parte da rotina das crianças nas modalidades de pintura,
desenho livre com diferentes suportes, recorte, colagem, desenho com interferência e
gravura. Também é associada a esse trabalho a linguagem oral e escrita, como parlendas
e textos relacionados aos interesses das crianças.
Observei que elas apresentavam questões relativas às suas próprias produções,
como a ocupação do espaço do papel, o recortar e explorar a diversidade das cores. A
partir da vontade das crianças em querer aprimorar suas performances relativas a essas
questões, passei a intervir nas aulas de arte com a intenção de aproveitar as possibilidades
de cada criança, bem como explorar seus processos criativos. Para isso, propus-lhes
alguns procedimentos:
• trabalhar com diferentes suportes e ferramentas;
• usar a tesoura para criar formas e figuras;
• realizar pinturas em etapas para explorar mais possibilidades;
• repensar as suas produções e as dos colegas;
• utilizar e combinar várias cores em um único desenho.
54. Graduada em Pedagogia pela Funcec - Faculdade de Educação de João Monlevade. Pós-graduada em Processo
Ensino-Aprendizagem pela Faculdade Claretiana, São Paulo e em Ensino a Distância pela UFOP (Formação de
orientadores acadêmicos). Começou sua carreira na Educação Infantil no Instituo da Criança em BH. Trabalha há 30 anos
na rede municipal de Rio Piracicaba, sendo 28 anos nas escolas Rurais, nas funções de professora, supervisora e diretora.
Atualmente, ajuda na gestão da Escola municipal Pré-Escolar Dona Rita Martins.
55. Graduada em Pedagogia, com ênfase em Supervisão pela Funcec - Faculdade de Educação de João Monlevade e
Pós-graduação em Psicopedagogia Institucional pela da Faculdade Castelo Branco, Rio Grande Sul. Hoje aposentada,
trabalhou por 30 anos na rede estadual como professora do Ensino Fundamental em seu maior tempo de carreira, e
exerceu as funções de supervisora e vice-diretora por um período menor. Atualmente, trabalha na Escola Municipal
de Pré-Escolar Dona Rita Martins, no 2º período da Educação Infantil, perfazendo quase 17 anos de trabalhos na rede
municipal de Rio Piracicaba.
90
Professora: – Qual será o animal que vai aparecer na parlenda?
Primeiro momento:
Professora: – Com as canetas hidrocores, façam o desenho desse animal.
Segundo momento:
Antes mesmo de começar a dar pistas, as crianças perguntaram:
Ana Laura: – É um bicho grande ou pequeno?
Victor Augusto: – Ele morde?
Juan Pablo: – Será que é de boca grande ou boca pequena?
Ester: – Ah, eu tenho medo de bicho bravo!
Terceiro momento:
Depois de responder às questões colocadas pelas crianças, cada uma representou
suas ideias de acordo com o que havia imaginado.
Depois da apresentação dos desenhos para os colegas, passei a dar as pistas.
Quarto momento:
Lista construída no quadro coletivamente a partir do que as crianças falavam:
Pista 1:
Professora: – A parlenda tem dois bichos. Um é ave e o outro um mamífero.
Lucas Gabriel: – Eu sei. Ave tem penas. É a águia.
Professora: – Ave é isso mesmo. Tem pena e o que mais?
Renan: – Tem pés.
Ester Luíza: – Acho que é galinha.
Davi Diogo: – Não é. É passarinho.
Professora: – Mas têm tantos passarinhos! E agora?
Pista 2:
Professora: – A ave tem penas coloridas, aprende a falar e nasce do ovo.
Henrique: – Ah, já sei! É o papagaio.
Professora: – Muito bem! Acertou um bicho e o outro?
Lucas Gabriel: – Professora, tem também o papagaio que é pipa.
Professora: – Gente, o Lucas falou que tem papagaio que é Pipa, o que vocês acham?
Érick: – É mesmo! Eu já fiz um de papel.
91
Professora: – É mesmo, este papagaio é chamado de pipa, pandorga, arraia,
papagaio. E agora? O papagaio animal é de quê?
Crianças: – É de penas, tem dois pés, tem bico.
Professora: – Então, o papagaio é uma ave. E o outro animal? É um mamífero.
Hiago: – Ma-mí-fe-ro?! Ah, ah, ah.
Professora: – Você já sabe, Hiago?
Hiago: – Não. É que é engraçado.
Pista 3:
Professora: – Tem o corpo coberto de pelos.
Crianças: – É leão, tatu, onça, jacaré, cachorro, tartaruga, macaco, baleia,
borboleta.
Pista 4:
Professora: - Os mamíferos nascem da barriga da mãe e mamam quando filhotes.
Retomei os nomes da lista de animais citados por eles e analisamos um a um os
animais de acordo com suas características.
Guilhermina: – Lá em casa tem cachorro.
E outros nomes foram citados:
Crianças – Cavalo, gorila, tigre, bezerro.
Lavínia: – Eu gosto de gatinho, ele tem pelo também.
Professora: – É isso mesmo, os bichos que vão aparecer na nossa nova parlenda são
o gato e o papagaio.
Linguagem musical
O texto a seguir é uma descrição das oficinas realizadas, pela professora Bianca
Luar, nos encontros formativos deste projeto. Nosso objetivo é oferecer às professoras
uma memória dos encontros e material de consulta sobre os processos práticos de
musicalização para a infância.
Bianca Luar56
56. Professora especialista em educação musical pela UFMG; trabalha na Educação Infantil Balãozinho.
97
Contudo, a depender do investimento do educador, a tríade: brincadeira,
corporeidade e assimilação do sentido rítmico, quando trabalhadas de forma consciente
e verdadeiramente musical, poderá trazer para a criança uma maior organização interna
dos sentidos. E ainda, diversas influências emocionais e de dimensões sensíveis advindas
das brincadeiras inspiradas no trabalho com o ritmo lógico (a periodicidade similar de
tempo que se repete).
A formação ainda defasada por parte dos professores generalistas em sua
apropriação metodológica e experienciais acerca da linguagem musical e sobre quais
aspectos as crianças estão expostas a essas experiências sonoras no ambiente escolar foi
o disparador de nossas discussões e que nortearam a nossa prática.
Na maioria dos ambientes escolares, é comum encontrar a música pejorativamente
denominada “musiquinha”, a que estamos habituados a entoar. Apresentamos às
crianças canções em sua maioria carregadas de valores morais, por meio de práticas
imitativas mecânicas e estereotipadas, e como suporte de formação de hábitos,
postura e comportamentos, calendário de eventos, formação de bandinhas rítmicas e
memorização de conteúdos. A música entendida apenas como canção ou como barulhos
que contrariam as regras do silêncio e não como som e melodia.
Segundo França (2015), no início da década de 70, a disciplina música foi abolida do
currículo escolar brasileiro. Além de empobrecer a formação das crianças, os chamados “30
anos de silenciamento” contribuíram para a progressiva banalização da música comercial,
diante da desinformação e passividade crítica do público. Com a aprovação da Lei 11.769,
de 18 de agosto de 2008, a música voltaria a integrar o currículo da Educação Básica.
Portanto, para que os benefícios da prática musical se estendam a todas as crianças, é
imprescindível que os professores se qualifiquem para que possam oferecer a elas uma
vivência musical significativa e consistente.
A homologação dessa Lei torna a música conteúdo obrigatório, mas não exclusivo
do ensino de arte, determinação que deveria ser cumprida até o segundo semestre de
2011. Dessa forma, a formação das professoras generalistas, ao vivenciarem experiências
práticas a que chamamos de “Práticas musicais na escola”, tem surtido efeitos
surpreendentes, mágicos, intuitivos e que as remetem às suas habilidades lúdicas e inatas
de sua infância mais viva, repleta de variados traços culturais riquíssimos e consistentes de
significados. Isso demonstra o quanto somos, em nossa essência, seres verdadeiramente
musicais.
Nesse contexto, a importante tomada de consciência coletiva, por meio de
experimentações brincantes em que descobrimos significados como pulso, dinâmica,
melodia, altura, duração, escalas..., nos leva a um lugar mais seguro e consciente para um
melhor desenvolvimento e organização de variadas práticas musicais.
É preciso perceber que, para musicalizar e viver a música em sala de aula, não é
preciso ser especialista ou dominar técnicas instrumentais. Trata-se de uma prática que
não objetiva a formação de músicos e sim buscar e criar vivências que possam tocar a
dimensão humana de uma criança, a fim de que ela possa ouvir mais atentamente, criar
e expressar-se musicalmente.
O professor deve trazer para o universo da sala de aula práticas de apreciação
musical em que amostras da música mundial e regional de qualidade possam alimentar
a memória afetiva musical das crianças, ampliando largamente seu universo estético
sonoro.
98
São habilidades que podem ser desenvolvidas e elaboradas gradativamente, uma
vez que sejam vividas por meio de brincadeiras, cantorias, histórias, rodas e performances
musicais em que haja a preocupação com a expressividade e a emoção do Educador.
Para tanto, faz-se necessário tornar acessíveis também outros objetos, como balões,
cabos de vassouras, papéis, sementes, lápis, corpo, voz e vários recursos que podem servir
de materiais preciosos para a exploração sonora e o desenvolvimento da escuta crítica e
da criação musical.
Portanto, fazer música é ter a oportunidade de se reconhecer como fonte criadora,
de se sensibilizar e se conectar a experiências sonoras que possam fazer parte do
cotidiano escolar de forma musical, consciente e sensível.
A seguir serão apresentadas as dinâmicas trabalhadas nas oficinas com as professoras
de Barão de Cocais e Rio Piracicaba, para que possam lançar mão dessas dicas, quando
necessário for.
Notas musicais
Para uma melhor compreensão das notas musicais, importante componente na
música, inventei a história “ O bruxo Olho de Banana”.
Dinâmica
A dinâmica representa um importante elemento expressivo do som, que pode ser
fraco ou forte. Quando experimentamos alguns instrumentos, podemos experimentar
diversas maneiras mais apropriadas e confortáveis de se obter o som, de acordo com
nossa intenção musical.
Linguagem matemática
O ensino da linguagem matemática na Educação Infantil tem sido amplamente
debatido. É nessa etapa de escolarização que as crianças começam a adquirir o conceito
de número. Entretanto, há muitas dúvidas sobre como promover as primeiras aquisições.
Em seu dia a dia, as crianças têm contato com os números em diferentes situações
de uso e suportes: jornal, revista, calendário, roupas e sapatos, eletrodomésticos, telefone,
régua, agenda, convites. Elas usam esses números para identificar tamanhos, mudar
o canal de televisão, reconhecer seus pertences, telefonar, identificar uma data, usar
material escolar. Esses são apenas alguns exemplos, pois a lista pode ser enorme.
Normalmente, as crianças se sentem atraídas pelos números, considerados como
instrumentos de comunicação que pertencem ao mundo dos adultos. É evidente o
entusiasmo em recitar a sequência numérica em brincadeiras, contar a quantidade de
colegas, identificar o número de guloseimas a ser dividido. Falam também com muita
vaidade a data para a professora escrevê-la no quadro ou marcar o dia no calendário da
classe, bem como se oferecem para fazerem esses registros.
Para contribuir com a construção do conceito de número pelas crianças, é preciso
criar no cotidiano escolar contextos em que elas utilizem procedimentos numéricos em
situações de quantificação, ou seja, em que tenham o desafio de nomeá-los, contá-lo
e colocá-los em relação de inclusão. O mesmo ocorre com as representações quando,
para exprimir suas ideias e conhecimentos lógico-matemáticos, possam utilizar e inventar
símbolos (risquinhos, objetos, dedos...) e sinais (o numeral “4” ou o seu nome “quatro”, por
exemplo).
Ressaltamos que o conceito de número é construído enquanto as crianças utilizam
a numeração escrita e falada, bem como experimentam e criam seus próprios recursos de
quantificação e registros em contextos que façam sentido para elas.
Foi a partir dessa perspectiva de linguagem matemática que conduzimos a
abordagem desse tema na formação. Tal como no tema Documentação Pedagógica
e Avaliação, iniciamos com a análise de algumas afirmações. O desafio foi conhecer se
tais afirmações eram verdadeiras ou falsas e sua relação com a prática pedagógica na
Educação Infantil. Nessa dinâmica, o primeiro ponto discutido foi o pressuposto de que
a escola deve promover a exploração pela criança de uma grande variedade de ideias
matemáticas, para além daquelas que envolvem explicitamente números e quantidades.
São ideias relacionadas à comparação, medição e representação por meio de diferentes
linguagens – fala, desenho, gestos, por exemplo – a fim de que elas adquiram e ampliem
suas formas de perceber e intervir na realidade.
Foi ressaltada e exemplificada a necessidade de se criar um ambiente positivo que
encoraje a criança a propor soluções, explorar possibilidades, levantar hipóteses, justificar
seu raciocínio e validar suas próprias conclusões. Um ambiente acolhedor, em que erros
e acertos façam parte do processo de aprendizagem. Nesse caso, o erro é construtivo e
105
constitui fonte de informação para o professor compreender a criança e orientá-la em seu
percurso de formação contínua.
De acordo com Smole, Diniz e Candido (2000, p. 13, Vol.1) “brincar é tão importante
e sério para a criança quanto trabalhar é para o adulto”. Acreditamos e apostamos
nisso. Nesse sentido, foi apresentada e analisada uma gama de jogos e brincadeiras de
diferentes naturezas, realizadas em salas e pátios, com material estruturado, como jogos
de tabuleiros comprados ou produzidos pelas crianças, bem como materiais alternativos
e inusitados, tais como pedrinhas, folhas, rolinhos de papel, elásticos, tecidos.57
No contexto de jogo, além da ludicidade, que é muito importante, a criança lida
com uma infinidade de situações problema, em que informações, respostas alternativas
e soluções estão em cena. Soma-se a isso a flexibilidade, a convivência, a confiança, o
raciocínio, a descoberta, as regras, a lida com o ganhar e o perder, o conflito social e sua
solução.
O trabalho proposto nessa formação está alinhado à “crença de que para além das
habilidades linguísticas e lógico-matemáticas é necessário que os alunos da Educação
Infantil tenham chance de ampliar suas competências espaciais, pictóricas, corporais,
musicais, interpessoais e intrapessoais” (SMOLE, DINIZ E CANDIDO, 2000, p. 10, Vol. 1).
Os conhecimentos físico, lógico-matemático e social, descritos por Piaget,58 foram
reapresentados, tendo em vista que esse é um conjunto de informações que há tempos é
divulgado nos cursos de formação de professores e muito presente nas reflexões quando
o assunto é a construção do número pela criança.
Com as educadoras dessa formação não foi diferente. A nossa opção para essa
abordagem foi a de apresentar uma breve síntese e, em seguida, identificar o modo como
esses tipos de conhecimentos estão presentes, de forma integrada, em diversos jogos.
Para isso, descrevemos e vivenciamos os seguintes: Jogo das cores; Jogo dos pratinhos
(encher e esvaziar); Pontinhos; Jogo da Velha; Descubra o número; Loteria; Aposta secreta;
Cubra os números; Trilha (com e sem legenda); Jogo dos toquinhos; Jogo dos ovinhos.
Nesse contexto de discussão, a professora Maria Aparecida Silva relatou seu trabalho
buscando reconhecer em sua prática alguns pontos abordados na formação, bem como
analisar novas possibilidades didáticas. Leia a seguir, o registro dessa prática.
57. Para saber mais, consulte: volumes 1, 2 e 3 de SMOLE, DINIZ E CANDIDO, (2000).
58. Para saber mais, consulte: KAMII, (1995).
106
Mini-história
O Jogo das cores
Maria Aparecida Silva59
O contexto
Este relato, elaborado pela professora Maria Aparecida Silva, descreve o “Jogo das
cores” criado com a coordenadora Ericka Maria Viegas Carlos60 e a professora Izabel
Cristina Roza Sá.61 Ele foi realizado com sua turma denominada Maternal Verde, na Escola
Infantil Amiguinhos de Jesus, no município de Barão de Cocais, MG.
Apesar de as atividades dinâmicas e fora da sala de aula já serem uma prática da
escola, um novo olhar foi lançado a partir da formação com a equipe da Escola Balão
Vermelho e COBAP, quando estudamos vários temas. Passamos a nos preocupar mais
com a documentação pedagógica, a sermos mais críticos com os objetivos das atividades
e reafirmamos o que já acreditávamos: que a criança de Educação Infantil aprende muito
mais com atividades em que elas são protagonistas da ação.
O grupo é composto por 18 crianças, sendo dez meninas e oito meninos na faixa
etária de três anos, que gostam de brincadeiras coletivas e com muito movimento. A
maioria mostra-se interessada, sendo que alguns ainda precisam de muito estímulo
para participarem das atividades de maneira independente. Nessa idade, as crianças
solicitam maior investigação da professora na busca de atividades mais diversificadas e
desafiadoras, compatíveis com o desenvolvimento e conhecimento que possuem.
59. É graduada em Pedagogia para Educação Infantil /anos iniciais e Pós-graduada em Práticas Pedagógicas pela UFOP.
Leciona há sete anos na rede municipal, sendo cinco para Educação Infantil. Atualmente trabalha na Escola Infantil
Amiguinhos de Jesus, onde atua há três anos com as turmas de maternal.
60. Professora efetiva da Rede Municipal de Educação. Atualmente coordena a Escola Infantil Amiguinhos de Jesus.
Graduada em Letras pela FUNCEC e Pós-graduada em Práticas Pedagógicas pela UFOP.
61. Graduada em Pedagogia e Pós-graduada em Supervisão, Orientação e Inspeção escolar pela SOCIESC.
107
O jogo das cores
As cores já fazem parte do nosso ambiente de trabalho de maneira dinâmica, a partir
do interesse e da interação entre as crianças. Na Escola, são realizadas várias atividades
envolvendo nomes e comparações de cores, como: jogo das cores com massinha, pintura
coletiva, localizar objetos de acordo com a cor sinalizada pela professora.
A escolha do “Jogo das Cores” teve como objetivo observar o que cada criança
conhecia em relação às cores, perceber as dificuldades ainda existentes, trabalhar de
forma lúdica considerando o interesse da turma.62
O espaço para a atividade foi previamente preparado com papéis das cores verde,
azul, rosa, vermelha, amarela e laranja, fixados em cada pilastra do salão da escola.
Fomos da sala para o local onde as
crianças se assentaram no chão e ouviram
atentamente minha explicação:
Professora: – Hoje, vocês vão
conhecer uma brincadeira muito legal. É o
Jogo das Cores. Observem as pilastras do
salão. Vamos falar o nome da cor que está
em cada uma delas.
As crianças falaram o nome das
cores. Em seguida, separei a turma em dois
Instrução da professora para o Jogo das grupos. Um permaneceu assentado e o
Cores. outro de pé.
Professora: – Vamos contar quantas
meninas e quantos meninos têm nesses
grupos?
Professora: – Agora, vou falar o nome
de uma cor e todos correm para perto da
pilastra que tem a cor que eu falar.
Alguns alunos correram rapidamente
para a pilastra da cor citada, outros, que
ainda não reconheciam a cor pelo nome,
seguiram os colegas.
62. A professora teve como objetivo o trabalho sistemático com as cores, especialmente sua identificação pelo nome. A
reflexão sobre a relação frágil entre o objetivo de ensinar cores e o trabalho com a matemática foram pontos analisados
durante a formação e registrado ao final desse relato.
108
Professora: – Agora vou falar o nome de uma criança e de uma cor. O nome da
criança que for falado deverá ir para a pilastra que tem essa cor.
Professora: – Davi, na pilastra verde. Mariana, pilastra vermelha.
Aqueles que se enganaram foram questionados por mim e sugeri-lhes que um
colega fosse ajudá-los:
Professora: – Mariana, você tem certeza que esta é a vermelha? Thiago, vá com a
Mariana até a pilastra vermelha. - Professora
Professora: – Vou falar o nome de alguns alunos que devem ir para dentro do
bambolê da cor que eu disser.
Depois que as crianças se localizaram de acordo com o meu comando, eu perguntei
a elas:
Professora: – Vocês estão dentro ou fora do bambolê? - E eu?
Com outro material colorido, dei-lhes as seguintes instruções:
Professora: – Vocês devem pegar as pecinhas que estão espalhadas no chão e
colocá-las dentro do bambolê da mesma cor.
Conferimos os nomes das cores das peças e dos bambolês:
Professora: –Que cor é essa?
Crianças: – Verde!
Professora: – Então, vocês colocarão dentro do bambolê...?
Crianças: – Verde!
109
Até que apresentei uma peça vermelha, que não tinha bambolê da cor
correspondente:
Professora: – Que cor é essa?
Crianças: – Vermelho!
Professora: – Então vocês colocarão dentro do bambolê...?
Crianças: – Vermelho!
Tiago: – De nenhum.
Vinícius: – Do lado de fora.
Luiz Otávio: – Deixar no mesmo lugar!
Cada criança criou sua estratégia para participar do jogo: uma peça de cada vez;
três peças juntas ou muitas de cores variadas.
As peças brancas e vermelhas, que não tinham cores correspondentes, foram
colocadas por mim, propositalmente. Uma das crianças percebeu e comentou:
Vinícius, mostrando a peça branca: – Não tem nada para
essa aqui, ó!
Professora – Essa cor é aqui? E agora, o que vamos fazer?
Uns ajudaram aos outros.
Ao terminar essa atividade, as crianças brincaram livremente
com as pecinhas e comentaram:
Lavínia, apontando para o esmalte: – Ô professora, essa
cor aqui é igual ao meu dedo.
Professora: – E qual é a cor do seu esmalte?
O colega ao lado responde:
Kevelly: – É vermelho!
As crianças começaram a comparar a cor do esmalte nas
unhas com as peças e com a calça do uniforme.
Seguiram brincando livremente, encaixando as peças,
identificando e comparando cores e nomeando o que montavam.
Essa atividade possibilitou que se movimentassem,
explorassem o espaço, trocassem ideias com seus pares, dando
significado à situação.
Ao finalizar esse registro, algumas questões discutidas com a coordenação desse
projeto de formação me levaram a novas reflexões:
• Como foi o processo de registro dessa atividade?
• Após esse registro e os encontros de formação sobre o tema “Linguagem
matemática”, quais foram as novas reflexões?
• Quando fizer esse jogo novamente com a turma, além das cores, quais outras
intervenções seriam possíveis para ajudar as crianças a ampliarem suas ideias
110
em relação à matemática, mais especificamente àquelas referentes ao conceito
de número, às figuras, formas e à geometria espacial?
Como educadores, buscamos enxergar a criança como sujeito de ação, que
traz consigo uma bagagem e tem uma história que precisa ser considerada. Para que
desenvolva o seu potencial, devemos oferecer-lhes situações que promovam construção
de conhecimento.
Partindo desse pressuposto, elaborar esse relato, aqui apresentado, foi a
oportunidade de registrar, refletir e amadurecer as propostas de atividades que venho
desenvolvendo e que têm o objetivo de promover, de forma dinâmica e prazerosa para as
crianças, vivências de conteúdo selecionados por nós. Digo isso porque, em nossa escola,
organizamos nosso trabalho pedagógico a partir de conteúdos que selecionamos.
111
No processo de produção deste texto, por meio das indagações sobre o trabalho
pedagógico bem como sobre as intervenções da professora, foi interessante acompanhar
suas reflexões, tomada de consciência e abertura para mudanças. Maria Aparecida
reconheceu o potencial dessas atividades e, ao mesmo tempo, identificou outros aspectos
que poderiam ser trabalhados e que estão para além das cores. Exemplo disso seria o
reconhecimento e a valorização dos números, a realização de operações numéricas, de
contagens orais, bem como as noções espaciais e a identificação das formas dos objetos
e do espaço.
Com a elaboração desse registro, atrelado à formação temática e ainda o diálogo
com os diferentes profissionais envolvidos nesse processo, a professora concordou que
se abriu um leque de possibilidades relacionadas às intervenções didáticas, à escolha de
material, ao agrupamento das crianças, às provocações para a aprendizagem.
Ficou claro, em seu relato, que as crianças exploram as possibilidades oferecidas
durante o jogo, também em outras situações. É provável que o façam a partir de agora
com frequência. Essa proposta abriu portas para novas investigações que as crianças não
se proporiam sozinhas. Isso é uma das maneiras de avaliar o sentido da atividade para a
turma.
112
Relato de projeto
Projeto salada de frutas: compartilhando
sabores, vivenciando textos
Beatriz Aparecida Ferreira67
Andrea Cristina Ventura Oliveira68
O contexto
O relato apresentado a seguir foi elaborado pela professora Beatriz Aparecida
Ferreira, que trabalha com uma turma multisseriada Pré I e Pré II, composta por crianças
na faixa etária de quatro a seis anos, na Escola Municipal Deputado João Nogueira de
Rezende, situada na zona rural da cidade de Rio Piracicaba em Minas Gerais.
Beatriz desenvolveu com sua turma um projeto a partir da temática receita de
salada de frutas, abordando diversos usos da leitura e da escrita. Nessa escola, frequentam
crianças de quatro a nove anos.
Por se tratar de crianças vindas de várias comunidades rurais e pelo fato de muitos
pais trabalharem na agricultura, as frutas estão muito presentes no cotidiano dessas
crianças, motivo que inicialmente moveu minha escolha. Após trocar ideia com a
especialista em educação Andréa Cristina Ventura Santos Oliveira, decidimos que poderia
ser uma ótima prática a ser realizada.
Sendo uma turma multisseriada, a diversidade é ainda mais evidente. As informações
de receitas disponibilizadas para a criançada do Pré-escolar II não foram novidade,
mas para a turma do Pré-escolar I essas receitas foram trabalhadas pela primeira vez
sistematicamente na escola.
Como começou
A primeira proposta que fiz para as crianças foi a construção de uma lista de frutas
conhecidas por elas.
Antes mesmo de escrevê-las, a fim de ressaltar uma das diagramações de lista,
perguntei-lhes:
Professora: – Crianças, como se escreve no formato de lista?
Crianças: – É uma debaixo da outra.
Enquanto falavam, eu as escrevia no quadro. A cada palavra, eu intervia,
ressaltando algumas letras, questionando ou comparando suas partes sonoras e gráficas,
relacionando-as com outras escritas registradas em cartazes afixados em nosso mural.
Professora: – Banana começa com qual letra?
Débora: – B e depois A.
Professora: – E maçã?- Começa com qual letra?
Crianças: – M.
Professora: – E o que tem em cima do A?
Crianças: – Til.
67. Graduada em Pedagogia pela Universidade Luterana do Brasil e Pós-graduada em Docência na Educação Infantil e
Anos Iniciais pela Universidade Cândido Mendes.
68. Licenciada em Pedagogia e Habilitação em Supervisão Escolar e Orientação Educacional e especialista em Gestão
Organizacional pelo IES/FUNCEC, João Monlevade.
115
Percebendo que um dos alunos não se manifestava, aproximei-me dele e perguntei-
lhe:
Professora: – Qual das frutas é a sua preferida?
Então, ele respondeu:
Warley: – Suco.
Professora: – Você gosta de qual sabor de suco?
Warley: – Vermelho.
Professora: – Como é essa fruta?
Warley: – Bolinha.
Professora: – Qual fruta que é uma bolinha e é vermelha?
Warley: – Morango.
E todos me ajudaram a escrever a palavra morango, falando as letras e associando
aos sons de nomes já conhecidos, por exemplo:
Crianças: – M de Manu! (Nome da colega).
Como nessa turma uma aluna já estava alfabética, no momento em que os alunos
não conseguiam associar a letra, ela os ajudava.
Os alunos associaram a letra R ao nome de Rafaela, a letra A, ao nome Anádia, que
eram colegas de sala. Já a letra G foi associada à palavra gato.
Depois de pronta, o ajudante do dia69 entregou o caderno de desenho e os alunos
copiaram a lista do quadro. A escolha do ajudante do dia foi feita seguindo a lista de
nomes em ordem alfabética que ficava fixada na parede da sala. As crianças já sabem
quem será a cada dia. Em seguida, solicitei a eles que desenhassem as frutas diante de
cada nome copiado.
69. A função do ajudante é auxiliar a professora na entrega de materiais, nas tarefas do dia a dia e chamar algum
funcionário da escola quando necessário.
116
A leitura a partir do que se sabe sobre o texto: O que está
escrito aqui?
Primeiro, para fazer a lista das frutas, solicitei aos alunos que falassem o nome das
que conheciam enquanto eu escrevia no quadro. Em seguida, copiei-as em um cartaz
que fixei no mural.
Em outro momento, a fim de retomar a nossa conversa e direcionar a leitura da lista,
fiz alguns questionamentos:
Professora: – Quais frutas vocês disseram que estão na lista?
Crianças: – Goiaba, bacaxi, laranja.
Professora: – Débora, leia a lista para nós.
Débora: – Abacate, abacaxi, banana, carambola.
Professora: – Anádia, mostre no cartaz a palavra laranja. Começa com a mesma letra
do nome Larissa.
Professora: – Warley, mostre onde está escrito uva.
Professora: – Isabelly mostre a palavra banana.
Professora: – Por que você acha que está escrito banana?
Isabelly: – Porque começa com B.
Professora: – Então, pedi que Isabelly lesse as palavras no cartaz.
Isabelly: – A-BA-CA-XI.
Professora: – Que tal fazermos uma salada com essas frutas? Vocês me ajudam a
escrever a receita?
Pessoal de casa,
No dia 13 de abril de 2015 iremos fazer uma salada de frutas. Precisare-
mos de laranja, mamão ou banana. Contamos com sua ajuda.
Obrigada,
Turma do Prezinho.
Convite
As turmas do Pré I e Pré II convidam a turma de tia Magda
para comer salada de frutas, no dia 13 de abril, às 10 horas.
Esperamos vocês!
Depois do convite coletivo feito no quadro, duas crianças foram chamadas para
copiá-los e encaminharmos às duas turmas convidadas. Logo após, professoras e alunos
foram entregar o convite para as turmas.
Essa prática contribuiu para que os alunos pudessem estar em contato com diversos
gêneros textuais: lista, receita, convite e bilhete em situações reais de comunicação.
Tiveram participação na prática, ao confrontar percepções; contribuição nas escritas
e leituras, possibilitando uma maior interação entre elas; ampliação de repertório; e o
desenvolvimento da leitura e escrita.
O processo de aprendizagem deve ser gradativo e o professor, como mediador,
deve favorecer à criança a construção do sentido do que é significativo para ela.
Tema 8
Projetos
A aprendizagem acontece quando há significado e elaboração de sentido pela
criança, se a atividade estiver situada em seu contexto histórico e cultural. É na relação
direta com sua vida social que ela constrói modos de interpretar suas experiências,
aprender sobre si mesma e sobre o mundo. Esse foi um dos grandes desafios enfrentados
nesta formação.
Nos relatos de experiências das professoras cursistas, pode-se ver certa sobreposição
entre método e postura pedagógica. A organização do trabalho nos projetos registrados
seguia três momentos que visavam estabelecer o que as crianças já sabiam do tema
investigado, o que queriam saber e o que aprenderam após a conclusão do projeto.
O investimento nos encontros de formação foi na busca pelo esclarecimento de
que os projetos de trabalho são concebidos como uma postura pedagógica que gera
situações de aprendizagens nas quais os conhecimentos que fazem parte do patrimônio
cultural, artístico, científico e tecnológico da sociedade são ferramentas de apoio na
busca de soluções para o problema proposto.
Problema, nesse contexto, é algo desafiador e não apenas uma dificuldade ou um
desconhecimento de determinado conteúdo. Essa dimensão foi explorada, trazendo
novos desafios para reflexão e amadurecimento da prática pedagógica.
Outro ponto explorado foi a ampliação dos projetos desenvolvidos por uma só
turma, para a possibilidade de abranger duas ou mais turmas, do mesmo turno, entre
turnos ou de toda a escola – exemplo disso são as datas comemorativas, por exemplo,
festa junina.
Focalizando temas que sejam significativos para as crianças e também para os
professores, os projetos são percursos de descoberta, de planejamento e resolução de
problemas. Envolve criação, imaginação, ação, inteligência. Promove a coordenação
de ideias e pontos de vistas, cooperação e tomada de decisão. Trata-se de um modo
próprio de viver o cotidiano pedagógico e a complexidade que envolve a aprendizagem
compartilhada entre crianças e adultos.
O tempo de duração de um projeto deve ser avaliado ao longo de todo o
processo. Insistimos na referência da significação para as crianças e contextualização dos
problemas que surgem durante as investigações. Sendo assim, o calendário escolar, as
datas comemorativas ou demais marcadores cronológicos não devem se sobrepor aos
interesses e às necessidades observados por um professor com escuta e olhar atentos.
Portanto, um projeto pode ser de longa duração e perpetuar até os anos seguintes
de escolaridade ou serem curtos e substituídos por outras questões decididas junto à
turma.
Tal como discutido e analisado nos encontros temáticos que fizeram parte dessa
formação, os projetos de trabalho não se tratam de um “método”, mas sim de uma
maneira de entender o sentido da escolaridade baseado no ensino para a compreensão,
podendo ser caracterizados da seguinte maneira:
• Um percurso por um tema-problema que favorece a análise, a interpretação e a
crítica (como contraste de pontos de vista).
• Onde predomina a atitude de cooperação?
126
• O professor é um aprendiz e não um especialista (pois ajuda a aprender sobre
temas que irá estudar com os alunos).
• Um percurso que procura estabelecer conexões e que questiona a ideia de uma
versão única da realidade.
• Cada percurso é singular e se trabalha com diferentes tipos de informação.
• O docente ensina a escutar o que os outros dizem, e assim também podemos
aprender.
• Há diferentes formas de aprender aquilo que queremos ensinar (e não sabemos
se aprenderão isso ou outras coisas).
• Uma aproximação atualizada aos problemas das disciplinas e dos saberes.
• Uma forma de aprendizagem na qual se leva em conta que todos os alunos
podem aprender se encontrarem o lugar para isso.
• Por isso, não se esquece de que a aprendizagem vinculada ao fazer, à atividade
manual e à intuição também é uma forma de aprendizagem. (HERNANDEZ,
1998, p. 82).
Em síntese, o trabalho pedagógico proposto nessa formação é centrado nos
projetos em que a participação da criança ocorre desde a definição do tema ou do
problema de investigação à seleção dos conteúdos, ferramentas e estratégias de estudo
que contribuirão para as descobertas.
Por sua vez, das descobertas emergem novas demandas de pesquisa. É fato que
quanto menor é a criança (um e dois anos, por exemplo), mais se exige da professora
a observação atenta e cuidadosa, e, a partir de sua interpretação, ela conduz o projeto,
organizando ambiente, oferecendo materiais e vivências em que as crianças possam se
manifestar de diferentes maneiras.
E assim seguem adultos e crianças, aprendendo, cada qual com seus desafios,
com suas possibilidades, suas interpretações e significados na busca incessante pela
compreensão e aquisição do mundo a sua volta.
O texto a seguir foi elaborado a partir das análises que Eduarda Diniz e Elaine
Neide fizeram do Projeto METAMORFOSE DA LAGARTA, descrito no tema “Avaliação e
Documentação Pedagógica”, nesta publicação.
Elas esclarecem que, ao elaborarem o registro, o objetivo era dar visibilidade
e problematizar as documentações feitas e o modo como elas contribuíram para a
avaliação do percurso vivido. O propósito da reflexão que se segue é olhar, com mais
atenção e análise, para o Projeto, dando relevância para o tratamento dado a esse tema,
nesta formação.
Essa análise nos oferece a oportunidade, mais uma vez, de tematizarmos a delicada
e necessária atenção e tensão entre o ensino e a aprendizagem, entre o professor e a
criança, entre a expectativa e a vivência, entre o previsto e o genuíno.
127
Relato de projeto
Reflexão sobre projetos a partir da
experiência “A metamorfose da lagarta”
Eduarda Diniz Mayrink70
Elaine Neide Silva Paulo71
70. Licenciada em Pedagogia pelo IES/FUNECE João Monlevade. Especialista em Psicopedagogia Institucional pela
Universidade Castelo Branco, RJ.
71. Professora da classe de Educação Infantil de cinco anos, formada em Magistério de 1º grau – 1º ao 5º ano, na Escola
Estadual Antônio Fernandes Pinto, em Rio Piracicaba.
128
O nosso papel na condução de um projeto é de mediador, um provocador de
novos sentidos e curiosidades. A intervenção acontece quando as crianças pedem uma
investigação sobre um assunto e quando identificamos uma necessidade e consideramos
que há tempo adequado para acrescentar novas perguntas ou informações.
A nossa atuação deve oferecer apoio constante para ampliar os saberes que
circulam no grupo. A cada momento, devemos tomar atitudes que considerem a
curiosidade das crianças, as intenções da pesquisa, a possibilidade de intercâmbio de
opiniões, a negociação conjunta durante os momentos de socialização e a oportunidade
de sistematizar os conhecimentos construídos pelo grupo para serem retomados e
discutidos ao longo do processo.
Outro aspecto destacado é o foco do trabalho. Considerávamos antes o foco do
trabalho com projetos mais voltado para a leitura do que para a investigação junto às
crianças. Porém, vimos que podemos trabalhar tanto com leitura e escrita como com os
conteúdos de Ciências. Nesse caso, o projeto deve desenvolver atividades relacionadas
a esses usos, como: leitura feita pelo professor, procedimentos para o estudo de um
texto, seleção de elementos que dialogam com a curiosidade das crianças, registro
pelo professor de textos orais elaborados pelo grupo. E, para abordar os conteúdos de
Ciências, esse mesmo projeto deve incluir observação de fatos e fenômenos, formulação
de hipóteses, demonstrações e experimentos, reflexão sobre as leituras em diferentes
fontes, registros, além das discussões e conclusões feitas de forma coletiva e individuais.
Ou seja, também devem estar presentes atividades que fomentem a curiosidade e a
construção de novos questionamentos relacionados às Ciências.
E, por último, o que gostaríamos de destacar é o tratamento que podemos dar à
curiosidade das crianças, ao desejo de ver, conhecer, experimentar o novo, vontade de
aprender, saber e pesquisar. Isso ficou muito claro para nós. Porém, é preciso perceber o que
é essencial para determinado processo de pesquisa e cuidar que as perguntas elaboradas
sejam de fato ferramenta para a reflexão. Colocar as crianças como protagonistas de suas
aprendizagens significa interagir com as suas narrativas e expressões, interpretá-las e
sempre relacioná-las com a intencionalidade do projeto.
Enfim, durante todo o processo formativo, o que ficou de aprendizagem e que
vamos incorporar a nossa prática é que trabalhar com a modalidade Projetos torna o
professor um pesquisador do pensamento das crianças, dos conhecimentos pertencentes
à cultura e da sua prática.
O nosso desafio (que, sem dúvida, requer empenho) é criar condições para que as
crianças expandam as suas experiências e não para que fiquem dando voltas em torno do
que já sabem. Tudo isso demanda uma grande flexibilidade nas intervenções, pois não é
possível prever tudo o que elas podem falar, pensar e relacionar após serem estimuladas
por perguntas, pelos contextos de pesquisa, pelo acesso às informações de variadas
fontes e, sobretudo, pela socialização dos conhecimentos com o grupo. Certamente,
essas ações não nos parecem fáceis, mas, pelo resultado alcançado, vale muito a pena.
129
Nessa reflexão, elaborada por Eduarda e Elaine, fica claro um dos pontos-chave
da discussão sobre projetos: o sentido da aprendizagem. Quem atribui o sentido da
aprendizagem são os sujeitos nela envolvidos, não podendo ser uma imposição externa.
É emocionante ver as professoras/aprendizes revelando suas conquistas e, mais que isso,
valorizando-as. Entretanto, cabe a nós dar continuidade à reflexão, diversificando-a e
aprofundando-a.
O primeiro ponto a ser destacado é o modo como abordaram os conteúdos.
Mais que selecionar conteúdos ou áreas de conhecimento, o que pretendemos com
os projetos é contribuir para que as crianças interpretem e compreendam o mundo a
sua volta, bem como reconheçam a si mesmas nele. Quando visamos às aprendizagens,
devemos considerar esse sujeito e esse mundo, bem como as inter-relações entre ambos:
o mundo da criança e a criança no mundo.
Nesse sentido, um contexto de aprendizagem rico é aquele que promove a
realização, pela criança, de conexões e relações entre sentimentos, ideias, palavras, gestos
e ações. É aquele que desafia e motiva a criança a lançar-se em investigações, a colocar
indagações, a querer saber e se sentir capaz de compreender os fenômenos que a cercam.
E os temas? E os problemas de investigação? E o percurso de descobertas? Esses
emergem do cotidiano, identificados e tematizados pela professora. E são eles, problemas
reais ou abstratos, que definem o tempo, a profundidade, as ferramentas de pesquisa,
as áreas de conhecimento ou disciplinas, as informações relevantes e suas fontes. Ao
professor, cabe exercer papel fundamental de guia.
Ou seja, os projetos são percurso de investigação em que professor e alunos
aprendem, cada qual em seu nível, sobre os diferentes conhecimentos construídos e
valorizados na história da humanidade, proporcionando a aquisição e o uso de múltiplas
linguagens. Consideramos legítima a preocupação de Eduarda e Elaine quanto à
linguagem escrita, pois é, sem dúvida, muito importante, mas é uma entre tantas outras
a serem aprendidas.
Acreditamos que as crianças são competentes e potentes, capazes de, à sua
maneira, indagar, criar teoria, interpretações. Como dissemos no tema “A criança como
sujeito do processo educativo”, nesta publicação, as crianças podem ser protagonistas na
construção dos processos de conhecimento, quando encontrarem ambiente para isso.
Sendo assim, propomos que envolvam as crianças durante todo o percurso do projeto,
desde a definição do problema de investigação, ao planejamento do trabalho, a coleta, a
organização e o registro das informações, a documentação, a avaliação e a comunicação.
Outro fator importante que nos entusiasma a trabalhar por projetos é o modo
como podem estar presentes diferentes dimensões e relações de tempo, de espaço, de
interações entre crianças e crianças, crianças e professor, crianças e comunidade escolar,
criança e família.
Por último, ainda cabe ressalvar que não existe uma única estrutura de projeto a
ser seguida, nem tampouco é possível ser reproduzido. Cada história é única. O projeto
é exclusivo, é situado, historicamente datado, socialmente construído, singularmente
vivido.
Reflexões finais e
desdobramento
Revolvendo o jardim de infância
Raquel Machado Martins de Barros72
A reflexão de Quintana nos remete à imagem do jardim, lugar que instiga os sentidos
de homens e animais que, encantados com as diferentes cores e formas, se inebriam e
quedam encantados ante o perfume das flores, as diversas texturas e sabores das plantas,
os sons dos pássaros, águas e folhas. A jardinagem é uma arte e como tal requer mãos
hábeis e vocacionadas para revolver o solo e torná-lo fértil e propenso a fazer brotar a
vida e a beleza.
Outrora chamadas de “Jardim de Infância”, tais instituições foram idealizadas pelo
pensador alemão Friederich Froebel, criador do modelo no século XIX. Para ele, a criança
é como uma planta em sua fase de formação, exigindo cuidados periódicos para que
cresça de maneira saudável. Esse autor comparava os professores a jardineiros, daí a
denominação “Jardim de Infância”.
Das reflexões de Froebel aos dias atuais, as evidências científicas demonstram que o
professor é o facilitador no processo de busca de conhecimento que deve partir do aluno.
O professor coordena as situações de aprendizagem e, por meio de um planejamento
sistemático, organiza ações que respeitam os alunos como sujeitos únicos e, por fim,
promove suas capacidades e habilidades intelectuais.
Com tais reflexões, finalizamos a presente obra, que reuniu os profissionais da
Educação Infantil, da rede pública municipal de Rio Piracicaba, cursando a formação
propiciada pela parceria com: Secretaria Municipal de Educação de Rio Piracicaba,
Fundação Vale e Equipe do Congresso Brasileiro de Ação Pedagógica (COBAP).
A formação possibilitou a reflexão sobre o processo educacional da Educação Infantil
com a discussão de temas relevantes entre os quais: A criança como sujeito do processo
educativo; Educar, cuidar e brincar; A Pedagogia da Escuta, Avaliação e Documentação
pedagógica; Projetos; Ambiente educativo; e Linguagens – oral e escrita, artes plásticas,
musical, matemática.
A partir dos encontros aos sábados, os profissionais assimilaram o conhecimento
compartilhado pelas formadoras, incorporando-o à sua prática diária. Para a professora
Rosa Magna (Maguinha, Esc. Dona Rita), a formação veio para ampliar as possibilidades e
72. Chefe da Divisão Pedagógica da Secretaria Municipal de Educação, Graduada em Enfermagem pela UFMG e
Direito pelo IES/FUNCEC de João Monlevade; Especialista em Gestão Regional da Saúde pela Faculdade Senac/MG e
Planejamento Financeiro e Orçamentário do SUS Municipal pela PUC/MG. Especialista em Direito Processual pelo IES/
FUNCEC.
132
confirmar, dentro de um conhecimento já adquirido, o que se pode considerar possível
de realizar, fortalecendo e enriquecendo a sua prática.
Reconhecemos que o processo é paulatino e acontece em estágios diferenciados,
uma vez que havia uma prática consolidada em anos anteriores, influenciada pelo
modelo alfabetizador, no qual o aluno não é protagonista do processo. Para a professora
Dircilene (Escola Sebastião Araújo), conhecer outras realidades é muito importante e nos
faz refletir sobre nossa prática: “achei muito interessante a conduta, a postura e o jeito que
os professores da Escola Balão Vermelho lidam com as crianças”.
Alguns profissionais incorporaram novas práticas ao seu fazer e acreditaram na
proposta trazida pelas formadoras. Ainda que sejam consideradas mínimas, as mudanças
significaram muito já que foram incorporadas a partir de uma reflexão dialogada.
Segundo a professora Sheila (Escola Sebastião Araújo), ela aprendeu e cresceu muito com
a formação; a riqueza dos jogos e sugestões de atividades aplicados em sala de aula
contribuíram, consideravelmente, para o desenvolvimento dos alunos.
Importante destacar que o aprendizado proporcionado não anulou a prática
realizada ao longo dos últimos anos, mas promoveu a integração entre saberes diferentes,
que se uniram para elevar a qualidade da Educação Infantil. Para as professoras Marília e
Edilaine (Escola Mickey), muito da prática aprendida já era aplicada, mas a importância da
formação é enxergar por um novo prisma uma rotina que pode ser modificada.
Elas citaram, como exemplos, o calendário escolar e a rotina da escola onde
trabalham. Tais práticas eram realizadas por meio da oralidade do professor e sem
envolver o aluno no processo de construção. Com a formação, elas aprenderam a incluir
a criança como sujeito ativo do processo (protagonista) e passaram a incluir a opinião dos
alunos no planejamento das aulas.
As mudanças incomodam porque tiram o sujeito da “zona de conforto”, mas, ao
mesmo tempo, promovem um renovar da postura e do fazer. Com o revolver da terra,
busca-se nas camadas inferiores o frescor e a vitalidade que se incorporam à camada
superior fazendo nascer um novo solo. Os modelos de avaliação e documentação
pedagógica apresentados pelas formadoras da Escola Balão Vermelho despertaram uma
mudança de mentalidade nas formandas.
O modelo até então adotado se baseava em uma grande quantidade de atividades
(matrizes), produzidas pelo professor e reproduzidas pelos alunos. As professoras Elaine
e Goreth (Escola Murillo Garcia) relataram que os tradicionais portifólios elaborados por
elas não retratavam o processo de construção do saber dos alunos com o professor.
Os modelos de documentação sugeridos durante a formação retratam os registros,
demonstrando o passo a passo do trabalho do professor em sala de aula, dando-lhe mais
visibilidade de todo o processo para a escola, pais e familiares.
Segundo Goreth (professora do Pré I), ela não acreditava que seus alunos, por
estarem sendo introduzidos, “não dariam conta de acompanhar o novo modelo” e
grande foi sua surpresa ao vê-los mais participativos e interagindo com ela na elaboração
diária da rotina.
Merece especial destaque as produções escritas, que compõem esta obra e é
importante ferramenta de reflexão e formação. Elas retratam o processo de transformação,
que aconteceu nas escolas de Educação Infantil, a partir dos aprendizados possibilitados
pela formação realizada nos meses de junho de 2014 a agosto de 2015.
Deixamos aqui nossa mensagem de agradecimento a todos aqueles que
acreditaram na proposta e participaram dos encontros presenciais e mensais às sextas
e sábados; das visitas à Escola Balão Vermelho em Belo Horizonte e ao árduo trabalho da
133
escrita. Esperamos que a presente publicação sirva de estímulo para que a reflexão da
prática continue acontecendo e oriente outros projetos e escritas.
Resta-nos agora a inenarrável missão de voltarmos aos Jardins de Infância e
aguardarmos as crianças, que, leves e faceiras como borboletas, virão ao encontro do
surpreendente universo do conhecimento.
73. Professora efetiva da Rede Municipal e, atualmente, trabalha na Casa do Aprender de Barão de Cocais, como
Coordenadora Pedagógica da Rede e como Formadora para os diversos segmentos escolar. É Graduada em Pedagogia,
pela FAE de João Monlevade - MG e Pós-graduada em Tutoria em EAD pela UFMT e em Fundamentos Didáticos pela
Faculdade São Luiz -SP.
134
para o sucesso da aprendizagem. Por meio dele, posso acompanhar o desenvolvimento
de cada aluno”.
Já para Éricka Maria Viegas Carlos Santos, diretora da Escola Amiguinhos de Jesus,
“todas as práticas contribuíram de alguma forma, mas algumas deixaram marcas mais
fortes, como preocupar com a documentação pedagógica, que é o trabalho de informar,
registrar e detalhar a prática”.
No grupo temático sobre o Ambiente Educativo, os professores discutiram e se
identificaram muito com a construção da rotina e dos murais de sala. Essa prática vem
sendo desenvolvida e aplicada pelos professores, com o entendimento de que os
recursos didáticos usados para compor o ambiente educativo precisam ter significado
para a criança e, principalmente, ajudá-lo na construção do conhecimento.
Na linguagem matemática, os professores viram como é importante identificar e
incentivar o raciocínio lógico-matemático das crianças e aprenderam como os jogos e
oficinas podem favorecer tais relações.
Para Margaretti Bretas Diniz, diretora da Escola Municipal João Raimundo, “a
matemática oferece subsídios para estabelecer e associar o conhecimento de forma
prazerosa dentro do contexto educativo, relacionando a vivência da matemática com a
vida das crianças”.
Nas linguagens, os professores tiveram oportunidade de vivenciar práticas de arte e
da música, que permitem a aprendizagem, sem seguir o modelo de repetição dos padrões
artísticos e musicais. Isso é comprovado pela fala da professora Nilza Cássia de Souza
Gonçalves da Escola Municipal Carmem Martins, que considerou a temática “Linguagem
Musical” como a que mais marcou, “pois, por meio de objetos simples e até pelo próprio
corpo, é possível criar uma aula, produzir sons e momentos ricos de aprendizagem”.
Sobre a temática de projetos, que já é uma vivência nas escolas da rede, foi
importante ver outra concepção, além de novas possibilidades. Trabalhar não apenas
temas infantis e sim de acordo com curiosidades da turma e com um tempo maior foi
uma das aprendizagens.
As proposições apresentadas no tema “Linguagem Escrita” foram muito bem
aceitas pelos professores, sendo um estudo de grande demanda e vivência deles. A
alfabetização na Educação Infantil para algumas escolas da Rede é vista como necessária
e até prioritária. A apresentação de situações de escrita e leitura em contextos funcionais
foi um momento de muitas trocas. As dicas, com novas possibilidades de levar para sala
de aula o que não está acessível na mídia, com a liberdade de criação, para que a escola vá
além do senso comum, indicou a direção de que devemos ajustar o currículo e a prática,
para que possamos ter novas ações para o dia a dia.
Dessa forma, o estudo coletivo com o grupo de professores da Educação Infantil
provocou importantes debates sobre posturas e questões didáticas vivenciadas ao longo
dos anos. É importante lembrar que é necessário que as professoras trabalhem com a
interação, mediação e intervenção, para aprofundar conceitos, procedimentos e atitudes
diante das crianças. Desse modo, os conhecimentos, os aspectos cognitivo, afetivo,
social e motor, bem como a produção de saberes passam a ter cada vez mais sentido
para as crianças. Além disso, a formação apresentou para as professoras novas reflexões,
confirmando que os primeiros passos na vida escolar das crianças são de fundamental
importância para a longa caminhada que terão pela frente.
Um ponto importante que devemos ressaltar foi a mediação feita pela formadora
de referência da Escola Balão Vermelho, Ana Paula Rodrigues, que acompanhou todos os
encontros e soube alinhar bem as diversidades e conflitos que surgiram durante esses
135
encontros. Com um grupo de 55 professores, que tinham uma prática de sala de aula
já consolidada, já era previsto que, diante de uma nova formação, geraria insegurança
e medo do novo. Mudar a prática e quebrar paradigmas, de certa forma, imposta pela
Rede Municipal e vinda de profissionais de uma escola particular, provocou discussões e
incômodos. Muitos professores pensavam que as propostas só seriam possíveis para um
público diferenciado de escola particular, com poucos alunos na sala e com monitoras.
Realidade diversa das escolas da Rede Municipal.
Nas discussões dos registros, muitas dúvidas surgiram, pois não temos a prática
de escrever o que estamos fazendo com as crianças e o que elas estão aprendendo.
Tínhamos a prática de reproduzir textos xerocados e enviados para casa. A formadora
de referência, Ana Paula Rodrigues, ajudou o grupo de gestoras e de professores a
estabelecer um olhar entre o velho e o novo e a real necessidade de aprendizagem dos
alunos de Educação Infantil.
Segundo a opinião de Gilvânia Bittencout da Silva, diretora da Escola Municipal
Casinha Feliz, “Ana Paula, nos encontros com as gestoras, fazia uma sondagem do que
acontecia nas escolas e falava do tema do encontro seguinte. Isso facilitava o entrosamento
com os professores”. Por outro lado, ainda segundo Gilvânia, “as visitas do grupo de
gestoras à Escola Balão Vermelho mostraram que as técnicas usadas e trabalhadas com
os professores na formação são reais e dão certo”.
Em se tratando de um legado que essa formação deixou para os professores de
Barão de Cocais, fica expresso, nas palavras da professora Giselda Conceição Pereira, da
Escola Municipal Norma Horta, que “ganhamos com a formação em atividades mais
criativas, novos olhares e atitudes sobre reações das crianças, novas estratégias de ensino,
novas posturas e intervenções mais elaboradas diante de atividades cotidianas na sala
de aula”.
A professora Maria Aparecida Silva, da Escola Municipal Amiguinhos de Jesus,
conclui que “a criança, como sujeito do processo educativo, nos faz refletir sobre todas as
áreas, pois temos que levar em conta que ela é capaz de construir e não somente receber
informações. É preciso adaptarmos a pedagogia da escuta, a documentação pedagógica,
a afetividade e aprendizagem, a educação do cuidar e educar e brincar, da educação
matemática, do ambiente educativo da linguagem musical, da linguagem oral e escrita,
dentro da visão da criança, como sujeito do processo educativo, para que de fato isso
tudo faça sentido para ela”.
Considerações finais
Adriana Torres Máximo Monteiro74
Alessandra Latalisa de Sá75
À guisa de uma finalização, salientamos que, durante todo o processo formativo das
professoras de Barão de Cocais e Rio Piracicaba, apostamos na busca coletiva de opções
de ações pedagógicas que reconhecessem a criança como sujeito ativo e competente.
Analisamos e indagamos práticas cristalizadas, que, pela força da cultura escolar, há
tempos vinham sendo desenvolvidas de uma mesma maneira. Oferecemos às professoras
a oportunidade de se incluírem no processo de formação como sujeitos participativos.
Assumindo o papel de aprendizes e autoras de seus ideais educativos, movidas pelo
desejo de aprender; lançaram-se a um caminho que não tem volta: transgrediram as
próprias práticas e teceram um fazer educativo que tem nas crianças a sua centralidade.
Por ora, o resultado dessas conquistas se torna evidente nesta publicação. Aqui,
confirmam-se as reflexões e experiências de todas nós. Afinal, também somos sujeitos
desse processo e nos empenhamos em contribuir para a formação de uma sociedade
alegre e justa. Seguindo esse princípio, acreditamos ter criado boas condições para
ampliação da qualidade das práticas pedagógicas de Educação Infantil existentes nos
municípios de abrangência, bem como o rigor por parte das professoras e gestoras da
necessidade de registrar e refletir a prática permanentemente para se chegar à execução
de uma educação voltada para a infância. Sempre lembrando que, se quisermos ensinar,
compreender e intervir na realidade, não devemos abrir mão de aprender, não é mesmo?
Agradecemos a Fundação Vale pela oportunidade de nos receber como parceiros
técnicos. O apoio dispensado a nós foi fundamental para a total execução, desenvolvimento
e conclusão do CURSO DE FORMAÇÃO DE EDUCADORES PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL.
Vale destacar que os beneficiários diretos são as professoras, mas as crianças, as famílias e
a comunidade ganham quando as suas participações são valorizadas.
Destacamos também a presença constante dos Secretários de Educação dos
municípios, que, além de nos receberem com cordialidade e carinho, apostaram neste
projeto e foram parceiros na empreitada. Essa condição tornou possível o enfrentamento
e o desafio necessário para a implementação de uma educação que prevê e fomente a
formação permanente dos profissionais (professores, gestores e auxiliares).
Mais uma vez, registramos aqui nossos genuínos agradecimentos a todos os que
participaram desta formação.
74. Mestre e doutora em Educação – Coordenadora Pedagógica deste projeto, organizadora desta publicação.
75. Mestre e doutora em Educação – Coordenadora Pedagógica deste projeto, organizadora desta publicação.
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Formação de
professores a partir de
relatos de experiências:
O trabalho pedagógico na Educação Infantil dos
Municípios de Barão de Cocais e Rio Piracicaba