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m enos n ão é só frear o con- vida simR]~? ; sAo PAUlO: Avenida Presidente Juscelino Kubitschek. 1400, tl' andar, conjs.
131/13~ Jarrf:m Paulista, CEP 04S43·000, SP. Brasl. te!.: 111) Z197-2000. fax. (11)
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sumo, é se distanciar daqui- andar, CEP 2229{).160, RJ, Brasj, tel; (21) 2ttJ.2100. fax. (21) 25Cl ·16S7
lo que nos distrai. E, assim, VIDA SIMPlES1671SSN (977167876000~ ano 14, n'02 e uma pubbcaç~o mensal
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sidades do que clama a nos- ~·......>~'"'S.~ com
O mundo
está ao redor
Série mostra como estamos
imersos no celula r sem nos darmos
conta da realidade que nos cerca
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as usando seus celulares. E elas nem
perceberam a nossa presença", con-
ta. O efeito que Antoine criou para as
fotos, como se nossos rostos estives-
sem entrando dentro dos aparelhos,
tornou-se uma metáfora sobre como
somos sugados por eles. "As fotos es-
tão sendo veiculadas em muitos sites.
E as pessoas estão vendo as imagens
em suas telas, e gosto disso, porque
permite refletir. Você vê as imagens e
pensa 'Nossa, esse sou eu agora'. Ide-
almente você e ntão desliga o apare-
lho e passa a olhar ao redor", observa.
Rostos que parece m sugados pe las telas de
celulares são como um a metáfora: será que SU R- FAKE
est amos percebendo o mu ndo para além do http://bit.ly/1Y3YIG F
que vemos nesses pequenos aparelhos?
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M ensagens
literárias
NA INICIATIVA Leitura de
Bolso é possível receber
peq uenos trechos de
crônicas ou poesias, t odos
os dias, pelo W hatsApp.
Desenvolvido pelos pu-
blicitários Julian Vilela e
Paulo Santos, o objetivo
é incentivar a leit ura e
facilitar seu acesso. Para
receber as mensagens,
é preciso cadastrar seu
número no site. Escritores
interessados em participar
do projeto também podem
ANIMAIS EM FOLHA
~ LIBÉLULAS, AVES E INSETOS. Feitos com folhas e, muitas vezes, do
~ tamanho de uma moeda. O trabalho encantador é da artista e ilustra-
dora britânica Helen Ahpornsiri, que recolhe diminutas folhas de suas sa-
mambaias para compor cada detalhe da f igura. As folhagens são pressiona- .~
das por pelo menos um mês para ganhar o aspecto desejado. Depois, são §
recortadas e delicadamente posicionadas para criar belíssimos desenhos. ~
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10 vidasimples • FEVEREIRO 20 16
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Uma nova
ciclovia
O PROJET O London
Underline, da empresa
de design Gensler, está
propondo algo diferente
para os ciclistas de
Londres: a utilização de
túnei s abandonados do
m etrô como vias para eles
(e até para pedestres). A
ideia é aliviar um pouco
do tráfego nas ruas da
capital inglesa e gerar
energia, com tecnologia
de captação de energia
cin ética - aquela que
transforma movimento
em eletricid ade.
Construção transparente
Empresa de arquitetura italiana cria painéis de cime nto que perm item a
T H E LONDON UND ERLINE entrada de luz solar e aj udam a economizar energia elétrica
htto·//bit.ly/11Ygflliy
Qt, UM PAINEL DE C IMENTO com de a luz solar atravessa, iluminando
~ pequenos orifícios que permi- o ambiente e funcionando como uma
tem a e ntrada de luminosidade po- grande janela. Adequado para ser uti-
dem reduzir o uso de energia e lé- lizado sobre uma subestrutura, pode
trica em uma construção. Este é o ser aplicado em escadas, paredes e
i.light, um painel de concreto cria- tetos, fornecendo luminosidade, que
do pela empresa de arquitetura ita- varia ao longo do dia.
liana Italcementi para uma feira em
Xa ngai, na China. A placa utiliza re- I.LI GHT
sina plástica com micro furos , por on- http://bit lv/1MYGn..fu
KI NDME I http://bit.ly/11Ygcvl
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Um ar puro
OS DEJETOS da criação
de suínos de Entre Rios
do Oeste, no Paraná -
cerca de 130 mil animais
-vão virar energia elé-
trica para as edificações
e a il uminação pública
dessa cidade. A notícia
é tão importante porque
esses resíduos liberam
na atmosfera o gás me-
tano, que é ve nenoso. A
iniciativa é uma parce-
ria entre a Companhia
Paranaense de Energia
e o Centro Internacional
de Energias Renováveis.
Presente com história Agora essa experiên-
cia deve ser replicada
Campanha divulga a t rajetória e a história da feitura de objetos
em outras regiões de
produzidos por diversas comunidades de artesãos do Brasil
produção pecuária.
G\ A T ÉCN ICA DA C ER ÂMICA da faz parte da campanha Presenteie
'C!J foto acima envolve a modela- Histórias, uma iniciativa do Coletivo
gem, a secagem do barro, a pintura e de Fato e a ONG Artesol, que apoia a
a que ima. E esse ritual de criação re- tradição de trabalhos manuais. O ob-
monta a uma história de dedicação e jetivo é incentivar o comércio justo
precisão d as mulheres que passavam dos artigos feitos à mão e difundir as
longos períodos à espera de seus ho- histórias e a tradição do nosso povo.
mens- eles migravam para os centros
urbanos durante a época da seca. Es- PRE SENTEIE HI STÓRIAS
se relato segue junto com o objeto e faceb ook.com/presenteie-h istorias
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REENCONTRO DE DESAPARECIDOS
:1:
Ideia no5
Excentricidade
O excêntrico é mu ito mais do que alguém diferente. É aquele que
desenvolve um pensamento crítico sem seguir modelos
preestabelecidos e questiona a superficialidade das coisas
POR José Francisco Botelho ILUSTRAÇÃO Monstro Studio
SE VOCÊ ESTIVESSE andando pelas ruas de Ate- enfio os dentes na perna dos canalhas". O filó-
nas em meados do século 4 a.C., teria grandes sofo de Sinope pregava urna indiferença zombe-
chances de topar com um mendigo barbudo, en- teira às convenções sociais: orgulhava-se de seu
fiado em um tonel sobre a calçada. Seria sábio pé rapado e dava mais valor a um tonel na calça-
deter-se para trocar urna ou duas palavras com da que aos palácios. Além disso, mostrava pou-
ele: o sem-teto poderia brindá-lo com epigra- co apreço pelos demais filósofos de seu tempo.
mas ácidos, que lhe dariam bom material de re- Certa vez, seu grande contemporâneo, Platão,
flexão para os próximos dias. Ocorre que esse definiu o ser humano como "um bípede sem
maltrapilho desgrenhado era um dos maiores fi- plumas". Diógenes apanhou uma galinha mor-
lósofos de sua época: Diógenes de Sinope (400- ta, arrancou-lhe as penas e entrou na academia
325 a.C.), também conhecido como "o Cínico". onde Platão dava aulas, bradando: "Eis aqui o
Na época, a palavra cínico tinha um signi- tal homem platônico!" Segundo outra anedota,
ficado diferente do que lhe damos hoje. O ter- Diógenes costumava andar por Atenas, em ple-
mo vem do grego kynos: "cachorro". O apelido no dia, com um lampião, vasculhando os cantos.
de Diógenes significava, portanto, algo como Quando lhe perguntavam o que procurava, ele
"canino"- e ele se dedicava, de fato, a viver co- dizia: "Um único homem honesto".
mo um cão. "Sou um cachorro, porque lambo A fama do grande esquisitão espalhou-se
a mão de quem me atira uns trocos; fico ganin- por todo o mundo antigo - e, um dia, seu tonel
do se ninguém me dá comida; e, quando posso, recebeu a visita de Alexandre da Macedônia, o
IDEIAS PARA UM NOVO MILÊNIO é urna minissérie de seis textos sobre conceitos que precisam ser
ressuscitados, pois, de tão usados e repetidos, se perderam ao longo do tempo. Nosso objetivo é re-
encontrar o verdadeiro significado dessas ide ias e assim clarear a nossa razão.
maior conquistador da época. Quando o guer- benéfico. É uma coisa estranha, esse negócio de
reiro aproximou-se, Diógenes estava tomando sermos humanos; por que não abraçamos nos-
um banho de sol, na calçada. "Faça-me qual- sa estranheza, em vez de tentar domá-la? Este é
quer pedido, e eu atenderei", disse Alexandre. o caminho do excêntrico: viver profundamente
"Muito bem", retrucou o Cachorro, "então saia sua irredutível natureza pessoal.
da frente do sol!" O macedônio não se ofendeu- Alguns milênios após Diógenes, o filósofo e
e talvez tenha até invejado o tonel do cínico. Al- economista inglês John Stuart Mill (1806-1873)
gum tempo depois, diria: "Se eu não fosse Ale- escreveu a obra Sobre a Liberdade, em que refle-
xandre, gostaria de ser Diógenes". te sobre o oscilante equilíbrio entre os impul-
O filósofo canino fez muitos discípulos - sos da individualidade e da coesão social. Se-
tanto em sua época quanto depois dela. Ainda gundo o filósofo, essas duas forças se alternam,
hoje, ele é o grande padroeiro dos excêntricos. A se combatem e se complementam na história
excentricidade, conforme Diógenes a praticou, humana. Ambas são importantes, e nenhuma
não se resume à rejeição das convenções: ela é deve sobrepujar a outra. Os hábitos e tradições
uma afirmação da individualidade humana; e de uma sociedade são resultado da experiência
também uma exploração lúdica daquelas fron- das gerações passadas: alguém um dia percebeu
teiras ambíguas que nos separam do resto da que é mais prudente dar bom-dia ao seu vizi-
humanidade- mas que também nos unem a ela. nho, do que cuspir no chão ao encontrá-lo- e as-
sim nasceram as regras da cortesia. Com o tem-
f. pr,g s seres ~"::llnc po, no entanto, a lógica da experiência é esque-
Existe um mistério essencial em toda existên- cida, e os hábitos tendem a se tornar mecânicos,
cia humana. Platão bem podia definir a huma- vazios de sentido. A adoção automática das con-
nidade como uma raça de bípedes sem plumas; venções sociais embota as faculdades que nos
outros preferem dizer que somos primatas fa- tomam indivíduos; por outro lado, a rejeição a
lantes; definições alternativas abundam, mas todas as tradições pode, também, tomar-se ir-
nenhuma delas dá conta de explicar um úni- refletida, obtusa- convencional, enfim.
co indivíduo. Há sombras que nos unem, e há Uma excentricidade saudável inclui a ado-
sombras que nos diferenciam. Sendo humano, ção inteligente e seletiva dos costumes e ide ias
sei que há algo em comum entre mim e Semíra- de um tempo ou lugar- a simples saudação cor-
rnis, rainha da Mesopotâmia, que viveu há uns tês ganha significado renovado quando passa de
trinta séculos. Ainda assim, um abismo existen- ação robótica a prática consciente. O ato de di-
cial me separa até mesmo de meu mais leal e ín- zer "bom-dia" e "como vai" deixa de ser mera
timo amigo. Esse abismo não é diabólico, mas etiqueta, para tornar-se uma forma de ética. O
JOSÉ FRANCISCO BOTELHO éjornalista, escritor e tradutor, autor da coletânea de contos A Árvore Que
Falava Aramaico (Ed. Zouk) e mestre em Letras pela UFRGS. MONSTRO é um estúdio de CGI e ilustra-
ção. Possui uma equipe que transforma trabalhos em monstruosidades.
FEVEREIRO 20 16 • vidasimpleS 17
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P OR O NDE andará aquele vestido amarelo de da minha filha era o mais com plicado, com
flores brancas ? Aquele que, embora eu não brinquedos, bonecas, bichos de pelúcia, lápis-
usasse há séculos, vivia ali, pendurado no ar- -de-cor, cadernos, canetas, canetinhas, blocos,
mário, feito testemu nha de tantos verões? Ele bloquinhos, jogos, joguinhos, em um cenário
era apenas mais um, sufocado entre dezenas de digno dos livros da série Onde está Wally?. Um
cabides, dizendo: " Um dia você vai precisar de dia, na nossa ausência, alguém invadiu a casa e
mim". Hoje, não sei do seu paradeiro. Meu ves- roubou alguns aparelhos eletrônicos. Resolvi ra-
tido floral se foi, em uma das caixas de roupas pidamente pela m uda nça. E que dali sairia so-
que doei para o Exército da Salvação ou em uma mente com o essencial. Anunciei móveis e obje-
mala que despachei para a casa dos meus pais. tos em sites. Organizei um bazar. Cada cadeira
A lem brança desse vestido me pegou porque é vendida era um alívio. Cada brinco que ganha-
o único do qual não me dei conta do destino, de- va uma nova orelha me fazia feliz.
pois que decidi me desfazer de metade de mi- No segundo round, fui além. Em vez de alu-
nhas coisas. Coisas e mais coisas acumuladas. gar logo outro espaço, decidi por uma casa de
Há pouco menos de um ano, eu morava em temporada do Airbnb, plataforma que permi te
uma casinha de vila, em São Paulo, e comecei a alugar toda ou parte do imóvel. Os futuros in-
sentir o espaço cada dia mais ape rtado. Entrava quilinos da casinha da vila topa ram guardar por
na cozinha e tinha a sensação de que o teto es- um tempo os objetos que sobraram. Dessa ma-
tava m ais baixo, que as paredes haviam enco- neira, protagonizei a mudança mais leve da mi-
lhido e eu era gigante. As prateleiras lotadas de nha vida: saí com uma mala e m inha filha com
pratos, tigelas, panelas, me sufocavam. Não ti- uma malinha. Chegam os na nova casa em cli-
nha armário suficiente para as roupas, que aca- ma de férias. Tudo isso para contar que, um mês
bavam aper tadas em m alas e caixas, em cima depois, nem eu nem ela sentía mos falta do que
do guarda-roupa ou debaixo da cama . O quarto havia ficado para trás, guardado nas caixas. >>
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)) Viver com dez peças de roupa dá uma sensa- valorizar as experiências e desenvolver uma re-
ção incrível de liberdade", diz a editora de mo- lação mais saudável com o consumo. Na Box
da Biti Averbach. Ela passou por um processo 1824, agência especializada em tendências de
parecido com o meu quando se mudou de São comportamento, esse movimento foi batizado
Paulo para a pequena Tiradentes (MG). Não deL01vsumerism (do inglês "low", baixo, e "con-
sentiu saudade dos vestidos. Depois de criar o sumerism", consumismo). Você pode não ter
Bazar Bem Bom, em três edições, Biti reduziu ouvido essa definição ainda, mas deve te r sen-
pela metade seu acervo pessoal. Uma casa de tido a demanda crescente para refletir sobre a
herança foi o ponto de partida para cortar custos forma como nos relacionamos com marcas e
e excessos. O mais difícil, lembra, foi se desfa- produtos. O objetivo é repensar a lógica do con-
zer da coleção de revistas de moda que lotava m sumo e agir com calma nas compras. "O espíri-
três módulos de estante, do teto ao chão. Rou- to do nosso tempo tem se voltado para a ide ia
pas, sapatos e bolsas ocupavam os guarda-rou- de que menos é mais. É ingênuo acreditar que
pas de dois quartos. "Comecei com um ques- o que utilizamos e descartamos não interfere
tionam ento geral sobre moda, estereótipos e na vida de mais ninguém. O consumismo é um
padrões de beleza, e o quanto isso tudo nos faz comportamento ultrapassado do qual em breve
consumir", le mbra. Resumir, no seu caso, sig- sentiremos vergonha", comenta o pesquisador
nificou refinar. " Fiquei com as roupas que mais de tendências Eduardo Biz, da Box 1824. Esse
comportamento se reflete em microtendências:
do movimento biker a rituais como preparar jan-
Cacarecos acumu lados são um a tares caseiros, frequentar a manicure do bairro,
metáfora das decisões que não comprar alimentos em feiras ou direto de pe-
quenos produtores tornaram-se uma forma de
consegu imos tomar. O excesso parali sa aquecer o contato humano congelado pela frie-
diversos aspectos da existência e desvia za dos meios digitais. "O ato da compra passa a
ser revisto como um ato social, e com isso retor-
o foco daquilo que nos incomod a nam hábitos de consumo ligados a valores locais
e tradicionais", diz Biz. De maneira geral, dá pa-
tê m a ver comigo", conta ela, dona de um estilo ra sentir um cansaço coletivo das pessoas em re-
atemporal, marcado, hoje, por algumas peças lação aos seus empregos com o horário fixo que
de grife, batas de algodão, jeans, apenas duas engessa a vida. Não à toa, cresce paralelame n-
bolsas e poucos pares de tênis, sapatilhas e um te o êxodo urbano, puxado por jovens famílias
par de chinelos. "Não tenho mais impulso fast- em busca de um dia a dia mais simples, assim
-fashion, do tipo comprar uma blusa de estampa como a economia compartilhada em movimen-
de zebra porque estão usando zebra", diz. Pas- to ascendente. "Vemos cada vez m ais pessoas
sar roupa? Nem pensar. "Ter tempo livre é o lu- trocando, doando, comprando usado, dividin-
xo de viver com menos", diz. Na cozinha "da ro- do, gerando novos tipos de economia - susten-
ça", a porcelana deu lugar à ágata. Detalhes que tável, colaborativa, coletiva. Iniciativas empre-
traduzem os ganhos da mudança em uma pala- endedoras que permitem que ideias deixem de
vra: leveza! E, assim, Biti chegou à sua morada, gira r em torno do dinheiro", analisa Biz.
e m Minas, com uma bagagem mais leve e uma
alma mais disponível para ocupar a nova rotina Dois elefantes em um fusca
com a vida que, agora, ela deseja ter. Ou seja, em vez de tentar colocar dez elefan-
tes em um fusca, por que não deixar que ape-
Keep calm and compre pouco nas dois caibam sem aperto? Enquanto o hiper-
"As me lhores coisas da vida não são coisas." O consumo ainda domina a vida de milhões de
recado carimbado em murais reais e virtuais re- pessoas, esse novo movimento cresce silencio-
flete a forte tendência de minimizar a bagagem, samente e ganha adeptos, que acham insano ))
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)) carregar uma bagagem enorme e bancar um status e consumo gera desgaste e desequilíbrio.
estilo de vida que requer muita grana. Diz asa- Um exemplo atual é o das pessoas que se preo-
bedoria popular que, quanto mais chaves uma cupam mais em postar fotos do que em apreciar
pessoa tem, mais complicada é a vida dela. Né?! a viagem", comenta a psicóloga capixaba An-
Ter menos bens significa precisar de menos di- gelita Scardua. Ao mesmo tempo, ela percebe o
nheiro para manter o patrimônio, o que tam- impulso do desapego se manifestar em pessoas
bém demanda menos trabalho e me nos preo- qu e já experimentaram muito de diversas coi-
cupação. A simpatia internacional despertada sas e que começam a se dar conta de que valores
pelo ex-presidente uruguaio Pepe Mujica é um materiais não equivalem a riqueza de experiên-
exemplo contemporâneo desse estilo de vida cias. "É um processo de autoconhecimento, de
despojado de ser. Enquanto presidente, Muji- partir para uma perspectiva mais refinada, e se
ca abdicou do d ireito de ocupar a residência ofi- pergunta r: 'O que, afi nal, tem valor para mim?'"
cial para continuar na mesma casa de campo em Esse questionamento não deixa de ser uma
que vivia há décadas, cultivando flores, ao lado contratendência em resposta ao hiperconsumo
da mulher, Lucia, e de sua ilustre cadela de três que tomou conta da nossa vida desde o final do
patas, Manuela. Com propostas do tipo ocupar a século 19. Com a Revolução Industrial, a rela-
casa oficial para acolher desabrigados do inver- ção das pessoas com o ato de consumir foi su-
no rigoroso, foi chamado de "presidente mais bindo, fortalecida pelo ideal do sonho america-
no, até chegar a filosofia yuppie e individualis-
ta da década de 8o. A partir dos anos 90, então,
O desapego e o impu lso de se desfazer o consumo virou consumismo. "Vivemos a era
das coisas é também um processo dos excessos. Subiram os índices de obesidade,
depressão, ansiedade e pânico. O planeta pediu
profundo de autoconhec im ento no qual socorro, veio a reflexão", resume a psicóloga.
aprendemos a definir e a valorizar o que O despertar para um consumo m ais cons-
ciente, na última década, deu origem a alterna-
de fato tem valor para a gente tivas econômicas e de comportamento menos
gananciosas e mais humanas. Tanto que não se
pobre do mundo". Título que recusou. Segundo pode mais avaliar a classe social de alguém pe-
Mujica, pobre é quem precisa de muito para vi- lo número de televisões que possui. Até porque
ver. "Não sou pobre, sou sóbrio, de bagagem le- há quem a dispense. Lembrando que a máxima
ve. Vivo com apenas o suficiente para que as coi- de viver com menos não significa existir pobre-
sas não roubem minha liberdade", declarou. E me nte. "A melhor tradução para o lowsumerism
deixou o governo com lindos 65% de aprovação. seria o consumo equilibrado. Cabe a cada um
identificar o seu descontrole", diz o pesquisa-
Sobras, acúmu lo e obesidade dor Eduardo Biz. No outro extremo, há o risco
Tirar o entulho da frente gera clareza. Aquilo de a onda de simplicidade ser tragada pelo con-
que fica parado deixa a energia estagnada, lem- sumo. "Alguém diz que algodão peruano é o má-
bra a cartilha do feng shui. No best-seller A Má- ximo da simplicidade. Mas você precisa de algo-
gica da Arrumação (Sextante), a japonesa Ma- dão peruano?", questiona a psicóloga Angelita.
rie Kondo se transformou em guru da organi- Na prática, o movimento implica pensar antes
zação ao relacionar a técnica do descarte com de comprar e, se for o caso, buscar alternativas
as emoções. Para Kondo, cacarecos acumula- como trocar, consertar e fazer você mesmo.
dos são uma metáfora das decisões que não con-
seguimos tomar. O excesso de bens m ateriais, Necessário, somente o necessário
assim como a overdose de informação, parali- Como na canção do urso Balu, no filme Mogli,
sa diversos aspectos da existência e desvia o fo - um dos preceitos do chamado baixo consumo é
co do que realmente interessa. "A cobrança por ter apenas o necessário. Com isso, limparíamos
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)) nossa vida de tanta bagunça, informação inú- amor sincero de quem eu quero por perto, rea-
til e afazeres sem importância para focar no que lizar minha missão, são os presentes mais pre-
realmente faz sentido: família, amigos, saúde, ciosos que possuo hoje. Se precisar, vendo todas
evolução pessoal. "É impressionante como nos as roupas que restaram. Acúmulo de gordura é
entupimos de coisas, compromissos e tralhas acúmulo de medo de mudar", acredita Rafaela.
que não precisamos", reforça a escritora Rafa-
ela Manzo Barreto Queiroz, autora de Queimei Só o que cabe na bolsa e no coração
os Barcos- Motivação, Inspiração e Outras Dan- O primeiro passo para esse exercício do desape-
ças (Scortecci). "Reduzir o volume do entorno go talvez seja o modo caseiro de "destralhar",
inclusive emagrece", ela garante. Desde quere- como recomenda a advogada e escritora gaúcha
solveu, há dois anos, iniciar um processo de en- Eliana Rigol, com base e m algumas questões:
xugar os bens e investigar os males causados por "Isso serve para quê? Tu gostas mesmo disso?
uma vida pautada por excessos, Rafaela perdeu Ainda usas?" "Depois dessa limpeza, a casa pe-
50 quilos (era superobesa), superou a síndrome saria muitos quilos a menos caso fosse coloca-
do pânico (que se manifestou quando estava da em uma balança", diz Eliana, autora da co-
no topo da carreira corporativa) e disse adeus a letânea de crônicas Moscas no Labirinto (Per-
um salário de cinco dígitos para realizar o sonho gamus). No texto Acumuladores de Tralhas, ela
de ser escritora. "Antes, eu ia a uma joalheria e narra como aprendeu com urna amiga a sedes-
vencilhar das inutilidades e reflete: "Comecei
a entender meu espaço como uma galeria pes-
É preciso livrar nossa vida de tanta soal, lugar em que deveria manifestar meus de-
bagunça, informação inútil e afazeres sejos mais profundos. Tudo o que quero para o
meu mundo está em volta. E, como os quereres
sem importância. Dessa maneira vai se alternam, dançam como folhas ao vento, tu-
sobrar muito mais espaço para família, do muda ao sabor das estações e dos humores.
Não precisamos de móveis caríssimos para viver
amigos e evolução pessoal melhor, precisamos lembrar de renovar o olhar
e tornar tudo novo", diz Eliana.
pensava: 'Eu mereço esse brinco, trabalho mui- Nesse momento, passo os olhos pela minha
to para isso. Essa era a desculpa para comprar'", galeria pessoal e vejo que ainda há muito o que
lembra . No auge da última crise, tinha enxaque- depurar e lapidar. Até porque juntar coisas é rá-
cas insanas e não conseguia levantar da cama pido e fácil. Difícil e demorado é se desfazer de-
sem cair no choro. Depois de dobrar as doses las. Acabei ficando na tal casa de temporada por
dos antidepressivos, o psicanalista deu o diag- mais uma temporada. Trouxe um carreto com
nóstico: "Você sabe que só vai melhorar quando o que havia deixado para trás, somei com o que
sair do seu emprego, né?" A partir do pedido de já havia e abri novos espaços por aqui. Menos,
demissão, Rafaela elaborou uma checklist radi- cada vez mais, é a meta. Sem vestidos de flores
cal. "Mudei para um apartamento menor; levei amarelas amarelando no armário, pratos empo-
um quinto do que tinha; adotei um plano bara- eirados ou livros nunca lidos. Na próxima etapa,
to de celular; aposentei o cartão de crédito; pa- prometo me inspirar na frase da doce poeta mi-
rei de comer só em restaurantes; voltei a fazer as neira Cora Coralina: "Fechei os olhos e pedi um
u nhas eu mesma; e comecei até mesmo a acei- favor ao vento. Daqui para frente levo apenas o
tar amostra grátis de remédios. Com isso, a des- que couber no bolso e no coração". •
pesa reduziu para um terço", conta. O livro, es-
crito em três meses, foi a cereja do cupcake. "O
Universo joga a seu favor quando você decide ROSANE QUE IROZ éjornalista e acumuladora de ex-
com o coração, colocando as pessoas e as situa- periências. É autora de Musas e Músicas- a Mu-
ções certas no caminho. Paz, liberdade, saúde, lher por Trás da Canção (Tinta Negra).
QUANDO CRIANÇA, Ana tinha como Hoje, Ana Thomaz está com 48 quando era criança, havia uma pro-
objetivo ser mãe. Na adolescência, anos, mora em Piracaia, no interior fessora muito dura na escola, e la
descobriu a dança. Formou-se bai- de São Paulo, e viaja pelo país divi- parecia não gostar do que fazia. Um
larina. Nas viagens a trabalho, com dindo os aprendizados adquiridos dia, eu a vi indo embora sozinha e
o grupo de dança, os conflitos sur- em quase duas décadas de obser- pensei: "Ela tem as próprias esco-
giam. E ela pensava que não havia vação. Ela conversa com pessoas de lhas, ninguém a está obrigando a na-
sido preparada para lidar com aqui- olhares variados: "Posso falar para da. Então por que ela continua a fa-
lo. Com menos de 25 anos, já era uma comunidade alternativa noVa- zer algo de que não gosta?". Eu tinha
mãe de um menino. O pequeno nas- le do Capão, na Bahia; ou para um 5 anos e já começava a questionar o
ceu depois de uma cesárea desne- grupo de executivos em São Paulo". que fazia sentido ou não. E, com o
cessária e Ana voltava a se questio- Em comum, todos estão se questio- passar dos anos, muitas coisas fo-
nar por que não se sentia preparada nando: qual o sentido de tudo isso? ram não fazendo sentido.
para aquele papel que, desde sem- Pergunta, aliás, que tem inquietado
pre, era seu grande querer. "Come- cada vez mais pessoas que buscam Como é esse "não fazer sentido"com
cei a desconfiar da escola. Eu tinha um caminho para a própria existên- que algumas pessoas, em algum ins- "'~
a sensação de ter passado boa parte cia. VIDA SIMPLES foi atrás dessa tante, se deparam? É físico, é insa- "
dos meus anos Já dentro e, de repen- resposta e encontrou uma mulher tisfação, infelicidade com a vida. A ~
:o
ili
te, percebi que pouco ou quase na- que sorri com os olhos. gente segu e um roteiro, faz a esco- !2
da do que aprendi estava me ajudan- la , a faculdade e de repente vai pa- "'~
~
do a lidar com a vida." A partir daí, Como você define seus caminhos? ra o mercado de trabalho e percebe 8
ela começou a mergulhar no que se- Eu não os defino. Não faço planos. que não está feliz. Isso acontece por- ~
;:
ria uma formação facada, principal- E isso é um conforto, é libertador. que passamos uma boa parte da vi- ~
mente, na vida, e não no mercado de Porque ser livre é não ter que esco- da aprendendo coisas que não ser- ~
<Jo
trabalho ou naquilo que a socieda- lher, mas fazer apenas aquilo que vem para nada. Somos criados pa- ~
de quer ou dita para cada um de nós. é coerente para você. Lembro que, ra um mundo condicionado. Mas ;J
FEVEREIRO 20 16 • VidasimpieS 27
ENTREVISTA
)) Como isso aconteceu para você? de uma área no interior de São Pau- precisava, mas aconteceu. Não pre-
O dinheiro é fluxo, uma invenção do lo, um lugar onde as pessoas vão po- cisava ocorrer no meu ideal. Mas, no
ser humano, assim como a comida der vivenciar essa forma de olhar a real, precisava. E é preciso olhar pa-
e as relações. E eu tenho uma visão vida. O dinheiro vai para a constru- ra isso. Porque não tem nada que eu
muito lúdica do mundo. Eu sei que ção do acesso à estrada, para o po- viva que não seja, da minha perspec-
algumas coisas eu posso fazer por ço de água, para fazer a cozinha, a tiva, a apresentação de mim mesma.
troca e outras eu preciso de dinhei- área de camping. Eu não cobro para O problema é que a gente fica se ilu-
ro, porque ele faz parte da nossa so- as pessoas darem valor ao meu tra- dindo com outras coisas e, dessa
ciedade. O que acontece quando vo- balho, mas para construir o Amalaya maneira, compensando a vida. E daí
cê muda seu olhar perante a vida é (nome do lugar, que significa "onde não se dá conta de que a vida está es-
que altera a maneira como enxerga os milagres se realizam"). Eu estou tagnada. Ou seja, existe uma falta na
essa questão. O dinheiro, por exem- arriscando esse caminho. Mas é al- vida, mas eu não a reconheço. Fico
plo, não precisa ser retido ou econo- go que faço com responsabilidade, consumindo, me distraindo.
mizado. Isso não significa gastar tu- com lucidez, porque estou atenta a
do o que tem, mas você não deixa isso, aos meus filhos e à minha vida. Você considera seu olhar de vida li-
de gastar por receio da falta. E vo- bertador? Sim, porque faço aquilo
cê também não usa esse recurso em Você é uma otimista em relação aos que faz sentido para mim. Não tem
um processo anti vida. Não vai des- caminhos que a humanidade es- escolha. A escolha é ser feliz .
perdiçar, torrar, gastar para preen- tá tomando? Me chamam muito de
cher uma falta interna. O dinheiro otimista. Mas é que eu sou realista. O tempo todo você sorri com os
é usado para potencializar algo. Ho- E a realidade não é ideal. Ela é per- olhos ... Só o outro consegue ver is-
je, eu cobro pelas palestras e pelos feita. Se eu estou numa situação de- so. A gente só se desenvolve quan-
projetos que desenvolvo para diver- sagradável é porque ela me é neces- do se relaciona com o outro. Nunca
sos grupos pelo país. E o que ganho sária, mesmo que você pense "Puxa, me fecho em um canto. Ninguém se
está sendo usado para a construção não precisava acontecer isso". Não torna uma pessoa m ais tole rante u
28 vidasimples • FE VERE I RO 20 1 6
sozinha. Ou alguém melhor no estava incorporado. E assim foram e não da especulação, da raciona-
mundo. Nada acontece apenas em retirando cada um dos cinco maca- lidade. Você não precisa se encai-
torno do meu umbigo. É sempre: cos originais, até não ter mais ne- xar numa profissão, num mercado
"Essa situação me incomodou, dei- nhum. E nenhum deles tentou mais de trabalho. Precisa, sim, entrar em
xa eu ver o que em mim ela reflete". pegar o cacho de bananas. Pronto, o contato com você e perceber o que
paradigma estava instalado. O que existe de singular aí dentro.
A gente nunca deve parar de ques- as pessoas fazem? Resolvem conver-
tionar nossas verdades? Nunca. sar sobre "por que não conversar so- O que é a vida, afinal? Uma brinca-
E eu gosto de ilustrar essa questão bre pegar o cacho de bananas- as- deira, mas sem a ilusão de que brin-
com uma história de uma experi- sim não é preciso que todos fiquem car é algo irresponsável. Quando
ência na qual cinco macacos foram vigiando". E não se discute sobre você observa uma criança brincan-
colocados numa jaula com uma es- o que importa: "Por que n ão estou do, percebe que ela tem um respei-
cada e um cacho de bananas no te- pegando esse cacho de bananas?". to enorme por aquilo, uma concen-
to. Quando um macaco subia a es- É assim que a sociedade funciona: tração, uma seriedade. Ela está vi-
cada para pegar a banana, todos re- não questiona. Quando a pessoa es- vendo aquilo. E ela não está fazendo
cebiam uma ducha de água fria e tá angustiada com seus caminhos aquela atividade para melhorar a co-
violenta. E assim foi até condicio- de vida, deve se questionar. Você só ordenação motora, para se preparar
nar esses animais a não pegar a fru- faz algo (por mais radical que pare- para o mercado de trabalho, para
ta. Então os cientistas tiraram um ça) quando isso passa a ser a coisa vender algo. Ela está fazendo aqui-
animal antigo e colocaram um ma- mais normal do mundo para você. lo porque não tem escolha. Eu vejo
caco novo na jaula. Quando ele ten- E quem te indica isso é o seu corpo. a minha filha brincando com as bo-
tou subir para pegar uma banana, Você tem a sensação física de que necas, e é de uma inteireza ... É brin-
os outros o impediram batendo ne- está fazendo o que é certo para vo- cadeira para o resto da vida. Mas é
le. Não havia mais ducha ou casti- cê. Esse é o caminho da intuição, do a brincadeira da infância séria, em
go. Mas aquele comportamento já instinto, da conexão, da afinidade, que você se envolve. •
Terra do
branco
Série retrata as paisagens
cobertas de neve no Ushuaia e ,.
nos desperta para a beleza de
uma região quase intocada --
TEXTO Débora Zanelato
I •
FOTOGRAFIA Maya Brasiliano
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HORIZONTES
As imagens nos
trazem a riqueza
poética do branco.
E parecem ampliar a
nossa capacidade
de contemplar com
tão pouco e refletir
sobre nossa relação
com a natureza
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COMER
Da fazenda
para a cidade
Cada vez mais o cultivo de alimentos tem se aproximado dos
centros urbanos, das hortas comunitárias às grandes plantações.
Tudo para nos manter mais perto de uma comida fresca e saudável
TEXTO Rafael Tonon
ESSA É UMA HISTÓRIA que começou há muito Dessa forma, mais e mais pessoas foram
tempo- cerca de 10 mil anos, segundo os estu- seguindo esse ciclo emigra tório. Hoje, no Bra-
diosos. Mas, desde que o homem desenvolveu sil, mais de 8o% da população brasileira já vive
maneiras de cultivo e criou a agricultura, a pro- em áreas urbanas, segundo o IBGE . A expecta-
dução de alimentos cresceu brutalmente, pos- tiva é que esse número passe de 93% em 2050 .
sibilitando saciar a fome de mais gente, de uma Ficamos aqui, nas cidades, e as plantações lá,
forma melhor. A comida também passou a ficar no campo, a muitos quilômetros de distância.
ao alcance das m ãos, uma tremenda conveni- Perdemos tanto o contato com a natureza das
ência para nossos ancestrais. Quando a terra já coisas que nossos filhos ainda têm dificuldade
não produzia mais, era preciso sair em busca de de entender que por trás de uma bandejinha de
novos lugares, e levar a aldeia toda junto. A pre- isopor existe um ciclo de vida enorme . Mas tu-
missa era sempre do alimento- e de tê-lo ali, nu- do bem, estamos felizes vivendo na metrópole,
ma despensa natural e ao ar livre, o que permitia com comida do mundo todo à venda nos merca-
frutas e verduras bem pertinho e, claro, frescas. dos, certo? Nem tanto: a questão é que a como-
Desde então, a gente aprendeu a viver perto didade da vida urbana nos relega alimentos pio-
dos nutrientes: por comodidade, principalmen- res, menos frescos e saudáveis. Nosso distancia-
te. Mas vieram as cidades, os grandes centros mento teve um preço. Nos EUA, por exem plo,
urbanos se desenvolveram e as pessoas migra- 95% da comida percorre mais de 1,6 mil km pa-
ram do campo para perseguir uma vida moder- ra chegar aos pontos de venda. Toda a alface dis-
na. Graças à industrialização dos comes e bebes ponível nos varejões do país demora uma sema-
(e as conquistas químicas para preservá-los), na para vir da Costa Leste e ser distribuída. O
foi possível deixar as plantações para trás. Por frescor, mesmo, só nas fotos das embalagens.
transporte, tudo isso chegaria até nós no merca- Para reverter essa situação, a saída d e al-
do da esquina, não tinha problema. A premissa guns produtores, consumidores e ativistas foi
se inverteu : vai indo que a comida te alcança ... trazer, então, a agricultura novamente para »
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Existem m uitas maneiras de trazer o aliment o f resco e saudável para perto da gent e. As fazendas urbanas são uma alt ern ativa
para a produção em larga escala, mas qualqu er um pode fazer sua parte cultivando pequenas hortas em casa
COMER
» perto, de forma a resgatar a nossa relação com permite à BrightFarms entregar produtos usan-
a terra e com os alimentos. Foi assim que surgiu do 75 por cento menos terra, menos 90 por cen-
a tal agricultura urbana, que começou como um to de água, 98 por cento menos combustível do
movimento de subsistência e resistência de pe- transporte e menos energia em geral, custando
quenos grupos que queriam ir contra o sistema ao consumidor final o mesmo valor do cobra-
atual. Mas, aos poucos, a proposta foi ganhan- do por grandes supermercados. A empresa pro-
do mais adeptos e apoiadores. E, dessa forma, duz cerca de 500 toneladas de alimentos ao ano.
as pequenas hortas comunitárias serviram co- A BrightFarms faz parte de um movimento
mo inspiração para um modelo de negócio, com que está revolucionando a nossa relação com os
produção maior e em áreas próximas a nós. alimentos. "Não existe como negar que o renas-
cimento das feiras de produtores na década pas-
Fazendas na cidade sada fez com que as pessoas lembrassem (ou se
A BrightFarms é uma dessas empresas inovado- educassem sobre) o que é um produto fresco e
ras que investiram em criar fazendas em gran- sazonal", afirma Jennifer Cockrall-King, autora
des metrópoles americanas- e por fazendas en- do livro Food in the City: Urban Agriculture and
tenda-se a produção em média e larga escala, the New Food Revolution (A Comida na Cidade:
não necessariamente aquele modelo dos livros Agricultura Urbana e a Nova Revolução Alimen-
de ciências, com vaquinhas e galinhas. No caso tar, sem tradução no Brasil). Ela defende que a
da empresa, com bases de distribuição em No-
va York, Chicago e Washington, o modelo ado-
Perdemos tanto o contato com a natureza
tado foi o do cultivo hidropônico, por permitir
maior produtividade com menos recursos na- das coisas que nossos filhos ainda têm
turais (água e solo) . "O design dos sistemas hi-
dificuldade para entender que, por trás
dropônicos permite a recirculação de água. Is-
so significa que usamos menos água do que a de uma simples bandejinh a de isopor,
agricultura convencional e não há escoamen-
existe um c iclo de vida enorme
to agrícola. Para os tomates, por exemplo, po-
demos usar até 25 vezes menos água", afirma
Paul Lightfoot, CEO da BrightFarms. "Só u sa- indústria da comida se tornou tão grande e sua
mos sistemas hidropônicos porque só cultiva- distribuição, tão global que passamos a questio-
mos alimentos nas mesmas comunidades nas nar a qualidade do que compramos, já que, se-
quais eles serão consumidos. Do contrário, não gundo ela, "os estragos que elas podem causar
seria viável trabalhar assim", acrescenta. têm agora dimensões internacionais". Jennifer
Com fazendas em pontos estratégicos como cita um caso de uma linha de suco de pera orgâ-
Kansas City, Bucks County e Elkwood, os ali- nico para crianças que foi fabricado na China e
mentos produzidos pela BrightFarms, de baby que, em 2008, teve que ser recolhido dos EUA,
rúcula a tomates e espinafres, chegam nomes- Canadá e Hong Kong pela alta quantidade de
mo dia aos seus clientes - elas ficam a menos de arsênio. "Tem se tornado impossível ignorar os
uma hora de distância, e a de Kansas City, por riscos da produção de alimentos em alta esca-
exemplo, se localiza a singelos seis minutos do la em nome da conveniência e dos preços", afir-
centro. "Além de locais, frescos e saudáveis, pe- ma. "Por isso as preocupações em torno da ética
la não necessidade de utilizarmos agrotóxicos, dos produtos baratos e uma política por igualda-
os alimentos são cultivados de uma maneira de de acesso a alimentos mais frescos e saudá-
mais sustentável", afirma. "Precisamos de um veis finalmente se tornou um assunto comum
ambiente controlado (não exposto ao tempo) nas nossas conversas", acredita. A saída encon-
para atingir uma produção durante todo o ano, trada pelas pessoas que querem uma alternativa
e assim termos uma alta produtividade por me- aos fertilizantes químicos, pesticidas e um siste-
tro quadrado." O cultivo hidropônico em estufas ma que usa milhares de litros de combustíveis ,,
» fósseis para ser distribuída foi voltar aos prin- no extremo, fundaram suas propriedades agrí-
cípios dos nossos antepassados: assumir o con- colas. Foi o caso do chef americano Dan Bar-
trole de sua comida ao plantá-la bem perto. ber, que criou um ecossistema completo numa
área em Stone Barns, local bem próximo a No-
Uma horta para chamar de sua va York. "O Blue Hill at Stone Bames (restauran-
E bem perto, em alguns casos, pode significar o te que o chef abriu ali) foi concebido com a pre-
quintal e até a varanda de um apartamento de missa de encurtar a cadeia alimentar, de termos
um dormitório. Ninguém precisa ter uma fazen- um maior controle do que servimos", conta ele.
da como a de Paul Lightfoot para cultivar seus Tudo que é colhido é imediatamente incorpora-
alimentos. Pelo menos é o que defende a startup do ao menu, sem nenhum tipo de atravessador.
luso-brasileira Noocity, que desenvolve e vende Quando criou a fazenda, há dez anos, Barber es-
equipamentos para hortas urbanas como forma tava em busca de melhores sabores para seus
de contribuir para uma sociedade mais cons- pratos. Além disso, ele tinha o objetivo de apro-
ciente. A empresa desenvolve soluções espe- veitar sua visibilidade como chef- Dan Barber
cíficas para facilitar o cultivo, baseada nas três é considerado um dos melhores do mundo - pa-
principais dificuldades do novo agricultor urba- ra influenciar outros profissionais e instigar are-
no : tempo, espaço e conhecimento. Seu princí- flexão em torno do processo produtivo. "Nossa
pio está no Growbed, uma espécie de jardineira crença de que podemos criar uma dieta susten-
com designe materiais inteligentes que neces-
sitam de menos água para as plantações. Assim,
quem cultiva nela não precisa fazer a rega diá-
Plantar, mesmo que seja uma pequena
ria. "O sistema de capilaridade faz com que o horta na varanda, e acompanhar o
substrato esteja sempre úmido, dispensando o
conhecimento sobre o quanto cada espécie pre-
crescim ento de uma planta, nos torna
cisa de água. As dimensões também são com- mais co nscientes em relação ao que
pactas e podem ser feitas a partir de 6o em pa-
ra espaços pequenos. A instalação também dis-
comemos e nos reaproxima da natureza
pe nsa reformas e instalações complicadas, com
questões hidráulicas ou de solo", diz Rafael Los- tável para nós mesmos ao escolher a dedo mag-
chiava, um dos sócios da empresa. "A horta faz níficos ingredientes está errada. Não podemos
com que a gente se torne mais consciente, gas- pensar em mudar as partes integrantes de nos-
te menos e se alimente melhor. As cidades tam- so sistema. Precisamos pensar em redesenhar o
bém estão vivendo uma crise existencial por seu sistema", acredita Barber, que acaba de lançar,
afastamento da natureza, e muitos de seus ha- por aqui, o livro O Terceiro Prato- Observações
bitantes já sentem a necessidade de se reapro- Sobre o Futuro da Comida (Bicicleta Amarela).
ximar do verde", defende Rafael. "A maior par- Hoje as pessoas que moram nas grandes ci-
te das pessoas não sabe de onde vem aquilo que dades não sabem de onde vem seu alimento e
está no seu prato. Quando acompanhamos todo têm pouco contato com os meandros que per-
o processo de crescimento de uma planta, pas- passam a comida até chegar a mesa. "A comida
samos automaticamente a respeitar mais o que não precisa ser paga, pode ser plantada. E plan-
comemos e também a natureza ao nosso redor." tá-la é a coisa mais transformadora que você po-
Essa máxima também começou a rodear a de fazer pela sua alimentação." Seja você uma
gastronomia, há alguns anos, com o conceito de pessoa comum ou um chef estrelado. •
fann-to-table (do campo a mesa), no qual chefs
e cozinheiros passaram a se aproximar mais de
seus fornecedores e produtores. Alguns até ar- RAFAEL TONON não cultiva todo o alimento que co-
rendaram fazendas para ter maior controle dos me. Mas tem um promissor sítio de café em Minas,
ingredientes que chegam às suas cozinhas ou, onde pretende começar com uma horta.
O valor daquilo
que somos
Humildade em nada tem a ver com aquilo que é menor.
Essa virtude nos ajuda a enxergar com lucidez
aqu il o que somos, sem arrogância e comparações
EDIÇÃO Débora Zanelato""
ELA É constantemente associada a da Ordem Sufi Halveti Jerrahi no no fundo comparamos excessiva-
submissão, pobreza e até inferiori- Brasil, escola do islamismo que bus- mente nossos atributos e façanhas
dade. Aí, entender a humildade co- ca o conhecimento e a humildade com os dos outros. Segundo Ragip,
mo urna virtude que nos aproxima como orientação da conduta. o valioso é buscar o equilíbrio: "To-
de nós mesmos não parece um tra- No cotidiano, uma pessoa hu- dos temos qualidades e pontos fra-
balho fácil. Mergulhar nessa desco- milde é vista de forma equivocada cos, mas não podemos nos fechar
berta, no entanto, pode nos trazer como quem se humilha ou acata tu- e perder a consciência do Univer-
um aprendizado profundo sobre do o que os outros falam. Mas ela so". O conhecimento e a aceitação
quem somos de verdade. E não ape- passa longe disso: humildade é sinô- de seus próprios limites é o princi-
nas em relação às nossas fraquezas nimo de distinção, gentileza, simpli- pal instrumento a favor dos humil-
e dificuldades mas também sobre cidade e principalmente de autoco- des. Buda dizia: "De que servem ca- "'
o nosso valor. Momentos de tragé- nhecimento. "Não significa perder belo e manto impecáveis se tudo ~
dias, como a lama que invadiu a re- a dignidade pessoal, mas valorizar dentro de ti está confuso e no en- ~
gião de Mariana, em Minas Gerais, o próprio esforço sem se compa- tanto penteias a superfície?" Autori- =
~
<
após o rompimento da barragem da rar aos outros", diz Ragip. Com fre- dade máxima do budismo tibetano, u
::;
mineradora Samarco, ou até mesmo quência, essa qualidade também é o dalai lama Tenzin Gyatso costu- ~
os atentados a Paris, no final do ano confundida com o hábito de subes- ma dizer que é "um simples mon- Si
~
passado, parecem nos fazer desper- timar a si mesmo, um vício tão pre- ge budista, nem mais nem menos". ~
tar para a humildade enquanto fra- judicial quanto a arrogância. Es- Para o psicólogo paulista Rober- ~
gilidade da vida. "Só percebemos sa falsa modéstia acontece quando to Rosas, a dificuldade em praticar !2
nossa impotência nesses momen- fingimos ignorar o nosso valor, fun- a humildade reside na nossa cultu- g
~
tos porque o choque nos reconec- cionando até como tática para re- ra narcisista, que privilegia o ego- ~
ta com a realidade e dá a dimensão ceber mais elogios. Outra faceta de ísmo e a performance. Vivemos ca- ~
de nosso tamanho. Na m aior parte uma humildade forjada é o autodes- da vez mais em função do sucesso, .§
do tempo, vivemos a ilu são de ter- prezo, quando sinceramente des- da riqueza, da diferenciação social. ~
o
mos o poder absoluto", diz o xeique valorizamos o que é nosso não por- Dessa forma, acredita Rosas, "é ~
Muhammad Ragip, representante que somos humildes, mas porque mais fácil tomar antidepressivo a >> ~
encarar a insegurança e rever o or- René Descartes (1596-1650), escre- de si mesma. E a humildade não se
gulho". Segundo ele, crises pesso- veu que "os mais generosos costu- subestima: é justa e nítida com suas
ais, financeiras, mortes e doenças mam ser os mais humildes" e, para forças e suas limitações.
podem ser momentos de aprendi- Santo Agostinho (354-430), "onde
zagem e reflexão. E não é vergonha está a humildade também está a ca- Vt Ucf(\ d rr1 dida
admitir o erro e perguntar: como é ridade". Parece que esse valor tem a O professor e teólogo Edmundo Pe-
possível melhorar? "Quando olha- ver com olhar para o outro de igual lizari, da Associação Palas Athena,
mos para nós mesmos e enxergamos para igual, não na comparação ou na de São Paulo, soube tirar do dia a dia
nossas falhas, te mos a chance de superioridade, e sim no sentimento profissional a lgumas lições sobre
crescer e desenvolver a virtude da de reconhecer que cada um de nós humildade e orgulho: "Temos sem-
modéstia", afirma o xeique Ragip. tem a sua própria jornada, e todos pre os dois lados convivendo dentro
som os humanos. da gente, mas devemos saber a dife-
s -.c. ode l•d nça O curioso é que essa qualidade rença entre baixar a cabeça e ser hu-
A falta de humildade é um sintoma pode ser até uma parceira na con- milde e ter uma postura firme sem
de que algo precisa ser mexido no in- quista dos nossos objetivos. Embo- ser arrogante", diz ele.
terior de cada um de nós. Segundo o ra pareça fragilidade ou inferiorida- Certa vez, o professor m an-
filósofo francês André Comte-Spon- de, ela na verdade fortalece nossa dou um aluno "calar a boca", pois
ville, da Universidade Paris I e autor autoestima. Traz o poder de confor- ele não parava de conversar duran-
do livro Pequeno Tratado das Grandes tar, ajudando-nos a nos sentir bem te uma aula. Imediatamente o es-
Virtudes (Martins Fontes), "a gran- inclusive com o que temos e com tudante e a classe reclamaram. "Se
deza dos humildes é ir ao fundo de aquilo que somos, sem compara- fosse outra época, ia apenas ser au-
sua pequenez, expostos sem másca- ções. Mas não funciona forjar a hu- toritário com a turma, m as preci-
ra ao amor e à luz". O te ma, aliás, já mildade. Quem afirma com toda a sei exercitar a humildade e admitir
foi bastante abordado na filosofia. O certeza "sou muito humilde" está se que h avia outros modos de chamar
também francês Blaise Pascal (1623- contradizendo. Dizer "falta-me hu- a atenção sem perder o respeito, co-
1662) dizia que o home m perdeu o mildade" se torna o primeiro passo mo dizer para ele se retirar da classe
contato com Deus e disfarça uma se- em direção à virtude. A modéstia é se não estava interessado no assun-
gurança que não tem. Outro francês, tão modesta que geralmente duvida to", diz. "Admiti o erro, pedi para ele
n ..
i . ..
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•. ~I
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Adaptação não
é acomodação
Precisamos olhar para os novos tempos com vontade de
aprender m ais e sempre. Essa é a verdadeira mudança
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PoR Eugenio Mussak
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ERA JANEIRO em Londres. O frio cor- cipalmente, Charles Datwin. Todos nos referimos a Newton, costuma-
tava, mas o dia estava bem ensola- fazem parte de meu panteão de he- mos dizer "Leis de Newton". Quan-
rado, combinação que costuma fa- róis intelectuais, mas Darwin ocu- do nos referimos a Darwin, usamos
cilitar a vida dos turistas. Inclusive pa um lugar de destaque. Ele me im- a expressão Darwinismo. Não há
a minha, que sou quase íntimo da pressionou no colégio e influenciou um Newtonismo. Por quê? Porque
cidade, pois lá tenho família . É on- minhas escolhas, como ter estuda- a abrangência de Darwin é maior,
de mora minha filha Melissa, que foi do medicina, e ter sido professor de saiu da biologia, e pode ser perce-
estudar e se radicou, e a minha neta biologia por mais de 25 anos. Tinha bida em muitas outras áreas, como
Isabel, princesa que lá nasceu. Ape- planos de visitar sua casa, a Down na economia, na tecnologia e no co-
sar disso, tenho comportamento de House, em Kent, mas ela fecha em nhecimento em si mesmo.
primeira viagem, pois a cidade cos- janeiro para reparos. Bad luck ... Ir Estou certo que você, que es-
tuma me surpreender. a Westminster era uma espécie de tá le ndo este texto, sabe quem foi
Naquele dia o programa era bási- consolo. Belo consolo, aliás. Charles Darwin e reconhece sua in-
co: visitar a Abadia de Westminster, No local, um fato curioso. Você fluê ncia sobre o pensamento mo-
a imponente catedral gótica, às mar- olha para o túmulo de Newton ao de rno. Você o estudou no colégio,
gens do Tâmisa. Os séculos se pas- mesmo tempo em que está parado como e u. Caiu na prova, le mbra?
saram e a abadia sofreu incontáveis sobre o de Darwin. Impossível não Como também estou certo de que
reformas e ampliações, foi o palco sentir uma emoção contida. Dois gi- sabe pouco sobre a teoria do evolu-
da coroação de reis e rainhas e, obe- gantes da ciência, tão próximos. Não cionismo, pelo fato de que Darwin é
decendo a um rito anglicano, tor- há como não admirar esses homens mais conhecido por aquilo que nun-
nou-se mausoléu de importantes sú- que, com os poucos recursos dispo- ca disse. Ele nunca afirmou, para co-
ditos que fizeram por merecer essa níveis na época, criaram teorias que meçar, que o homem descende do
nobre morada eterna. Westminster se comprovaram pela observação e macaco. Isso foi dito por seus detra-
comporta cerca de 3 mil túmulos, experimentação, e que viraram mar- tores. Segundo ele, teríamos evolu-
que podem ser vistos, tocados, e até cos da inteligência humana. ído a partir de um ancestral comum,
pisados, uma vez que muitos se es- Em minha formação intelectu- em uma linha evolucionária própria,
palham pelo chão dos corredores. al, e ntretanto, Darwin foi mais for- o que é totalmente diferente.
Eu não sou um necroturista, mas te. Ele está para a biologia assim co- Darwin também não negou a in-
queria experimentar uma vez a sen- mo Newton está para a física, só que tenção divina, apenas explicou que
sação de estar perto de Newton, sua teoria ultrapassou as frontei- haviam fortíssimas evidências de
Dickens, Laurence Olivier e, prin- ras da ciência que a gerou. Quando que seríamos resultado de um lon-
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go processo evolucionário basea- Interessante essa lógica darwi- mais exigentes, concorrentes ficam
do na seleção natural. Ele também niana. Uma espécie nunca é exter- mais competitivos, novas tecnolo-
nunca salientou o tamanho ou a for- minada por outra. O que a fulmina gias surgem, solavancos na econo-
ça como determinantes da seleção. é sua incapacidade adaptativa. E o mia e na política. Mudanças que exi-
O que ele disse foi que, na luta pe- homem atual nisso tudo? Viver na gem adaptação permanente.
la sobrevivência, venceu o que tinha sociedade contemporânea é um ato O mesmo vale para nossas car-
mais aptidão. Apenas isso. darwiniano? Sim e não. Longe de re iras. Difícil manter a performan-
Entenda-se por aptidão a capaci- mim defender o darwinismo social. ce profissional se não estivermos
dade de obter alimento. A qualida- Spencer fez isso e foi criticado, com estudando, aperfeiçoando o que fa-
de da relação do indivíduo com seu justa razão, pelo simples fato de ter zemos, nos tra nsformando. Q}.tase
ecossistema determina sua sobrevi- esquecido que possuímos qualida- impossível viver sem o auxílio das
vência e a perpetuação da espécie. des inexistentes nos bichos. A com- tecnologias modernas. Não àdepen-
Nada mais lógico, pensando bem. paixão, por exemplo, nos estimula dência, sim ao uso racional e produ-
Aptidão - esta é a primeira palavra a proteger os menos aptos à sobre- tivo. Adaptação em estado puro.
essencial para se compreender o vivência. Não, não somos orienta- Mas, cuidado, adaptação não é
darwinismo. A segunda é adaptação. dos puramente pelo darwinismo em acomodação. Alguém acomodado
Como o ecossistema está em per- nossa evolução social. Apenas o fo- apenas aceita as coisas como são,
manente mudança, seus habitantes mos enquanto espécie. a vida como chega. O adaptado in-
terão que se acostumar com isso e, Entretanto, há um lado do pen- terage, entende, muda, mas não se
de certa forma, mudar também para samento do inglês sobre o qual pre- acomoda. A adaptação ativa é prota-
poder continuar vivendo ali. Terão cisamos prestar atenção total - a tal gonista, atuante. É a maravilhosa ca-
que se adaptar, então. Adaptação é adaptação. Em um mundo cuja prin- pacidade humana de acreditar e de
a capacidade de o indivíduo man- cipal característica é a velocidade da mudar para melhor. Que nosso pac-
ter- ou recuperar- a aptidão, ape- mudança, quem não a percebe e não to com a evolução, principalmente
sar da mudança do meio ambiente. a compreende perde a qualidade de da consciência, nunca tenha fim, an-
Os adaptados sobrevivem, se repro- viver em harmonia com seu espa- tes, seja sempre um novo começo. •
duzem e se perenizam. Os não adap- ço. Uma empresa, por exemplo, é
tados não conseguem competir pelo um organismo vivo que habita um
espaço e pelo a limento, diminuem ecossistema chamado mercado, e EUGENIO MUSSAK escreve para VIDA
sua taxa de reprodução e terminam, que está em constante transforma- SIMPLES desde sua origem, e diz que
com o tempo, por desaparecer. ção. Clientes mudam, tornam-se evoluiu, mas não se acomoda jamais. ,. •
FEVER EIRO 20 16 · Vida simpleS 49
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AS PEQUENAS brincavam de bone- Um número cada vez maior de jo- Beauvoir avisou que não nascemos
ca, absortas no chão da sala, quan- vens assume hoje a atração por pes- mulheres, tornamo-nos, infinita e
do a mãe escutou o seguinte diálogo: soas do mesmo gênero ou transita interminavelmente. O corpo nunca
-A minha tá namorando! amorosamente entre amar iguais fica pronto: tinge, alisa, depila, pre-
-Homem ou mulher? e diferentes. O que muda é a per- enche, paralisa, define, maquia, ta-
-Homem. centagem. Isso para falar de amor. tua, enfeita. Para os homens, cuja
As duas meninas são fruto de fa- Quanto à identidade sexual, ou se- vida era fazer coisas consideradas
mílias heterossexuais e não con- ja a atribuição de gênero masculino m asculinas, agora n ão basta ser,
vivem com casais homoeróticos. ou feminino, ainda causa curiosida- tem que parecer ostensivamente.
Tampouco tiveram na escola uma de, porém não mais espanto, conhe- No que diz respeito às questões
educação voltada para a variedade cer uma mulher que tenha nascido de amor, já não é preciso ter uma
de identidades de gênero, onde so- homem ou vice-versa. Ao conviver definição unívoca entre homo e he-
freriam algum tipo de doutrinação, com pessoas transgênero ou traves- teroerotismo, é possível oscilar, ou
como é temido por fundamentalis- tis, o olhar dos mais velhos resiste: não. Nas aparências, os exageros e
tas. Elas têm 8 anos e nasceram nu- ficam procurando os detalhes, em hipertrofias que observamos em ter-
ma época diferente da dos seus pais. busca dos indícios da fraude, mos- mos de músculos, tórax, seios, cin-
Na mesma linha, uma jovem de tram curiosidade com a dinâmica de turas, h·aseiros, lábios, cabelos e co-
20 e poucos anos me explicava ser sua vida sexu al. Considerá-los aber- xas correspondem a ênfases apelati-
70 por cento heterossexual e 30 rantes é no mínimo cômico. Como vas. Funciona dentro do princípio de
por cento homossexual. Ela não sa- se, entre os cisgêneros (que assu- que aquele que mais grita é também
be se será sempre assim ou se teve mem a mesma identidade sexual da quem mais teme a incerteza.
azar com seus encontros com outras aparência anatômica do seu corpo Senhores e senhoras, as bonecas
mulheres. Suas amigas respondem a ao nascer), houvesse alguma natu- já são livres para amar que m elas
outras percentagens, mas nenhuma ralidade no processo de sentir-se au- quiserem, não se assustem se, em
considera-se gay. Elas seriam clas- têntico no corpo que os representa. breve, até elas assumirem uma apa- I 4 I ~
sificadas como bissexuais, a letra B Como mulher, apesar de ter pre- rência mais andrógina. •
de LGBTT (Lésbicas, Gays, Bissexu- enchido todas as etapas às quais mi-
ais, Travestis, Transexuais)- porém nha anatomia e me us hormônios
uma classificação começa a tornar- me predispuseram, acho que nunca DIANA CORSO é autorado livro Tomo
-se sem sentido quando as catego- chegarei a sentir-me genuinamen- Conta do Mundo - Conficções de
rias diluem-se umas nas outras. te feminina. A escritora Simone de um a Psican alista.
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... NO FIM DE UM ensinamento do la- Isso é pensamento mágico. Domes- cursiva nos leva a ignorar as cama-
,,...... ma Padma Sam ten , por volta de mo modo, sempre que alguém dis- das sutis onde a vida acontece: nós
2002, me aproximei, todo orgulho- ser "Tô aprendendo a lidar com mi- emocionais, desequilíbrios de âni-
so, e disse: "Acho que já compreen- nha raiva", a grande pergunta que mo, flutuações de energia, tensões,
di as visões mais elevadas, mas nada precisamos fazer é: como? Exata- bolhas, qualidades e inteligências
mudou!" O lama respondeu: "Então mente de que modo você está fazen- do coração. Porque mal olhamos
agora é o momento de sentar em si- do isso? Qual o método? para a sujeira de nosso mundo in-
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lêncio". Logo depois avisou que ha- Ler e assistir a palestras são mé- terno, somos reféns do autoengano
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veria um retiro de prática começan-
do no dia seguinte. Não fui, demorei
todos pelos quais cultivamos um
corpo torto na cadeira e uma mente
("Já sou espiritualizado ..."), temos
baixa imunidade contra picaretas
mais dois anos para tanto. que se entretém com novos conteú- da autoajuda e compramos mais e
..•
..
Nossa cultura é tão teórica que
parece que o único jeito de come-
dos. Ler não é um método que libe-
ra o ciúme na raiz, mesmo quando
mais livros, técnicas e cursos isola-
dos, que nos dão a sensação ilusória
çar a fazer algo é primeiro ler. O li- lemos sobre o ciúme, por exemplo. de que estamos avançando.
vro funciona como um substituto Passar de novo e de novo por situ- Nossa cultura teórica é produto
da prática -eu não preciso agir, pois ações aflitivas também não funcio- de seres presos na cabeça, cheios
já comprei vários livros sobre isso. na como um método eficaz. A prá- de conceitos. Desconfio de qual-
Quando a pessoa pede por livros so- tica de sentar imóvel, soltar a fixa- quer transformação que não passe
bre meditação, costumo sugerir gru- ção às histórias, relaxar as tensões pela investigação em primeira pes-
pos de prática e professores qualifi- mais sutis e depois investigar a natu- soa do corpo e da mente, pelo con-
cados. Se alguém pergunta por tex- reza das perturbações olhando dire- tato direto com o sofrimento e por
tos sobre traição, melhor conversar tamente para seu surgimento inter- todos os cantos da vida cotidiana. A
" I sobre como aproveitar a situação pa- no, sim, com certeza, tal habilidade ge nte já entendeu, agora é hora de
..
4, •
ra iniciar um treinamento que dure a
vida inteira, não algo paliativo.
Nós somos como uma pessoa que
será muito útil em meio a uma crise.
A gente já teve dezenas de boas
ideias, mas não foi suficiente para
praticar. Como já ensinou o escritor
argentino Jorge Luis Borges, "Tudo
está dito: falta aposta." •
L
deseja ir a Barcelona, mas não pes- transformar a mente. Temos a cren-
quisa passagens, não sabe onde fi- ça de que vamos a algum lugar ape-
car, não conversa com quem já foi ... nas pensando, conversando, trocan- GUSTAVO GITTI é professor de TaKeTiNa
Se alguém pergunta como chegará do de conteúdos e narrativas. Nossa (florescimento humano pelo ritmo).
a Barcelona, ela diz: "Tô tentando!" aposta na supremacia da mente dis- Seu site égustavogitti.com
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ONTEM, JÚ LIA, minha filha caçula, savô plantou nela e, de certa forma, Hoje acordei em terra, longe do
voltou da escola com a tarefa de ou- em mim. Acredito que é essa mes- vele iro que nos últimos 13 anos foi
vir as narrativas de seus ancestrais. ma obstinação que, hoje, me m an- a nave dos meus sonhos e que abri-
Sentamos juntos no sofá e contei a tém vivo neste mundo de poucos so- gou minha família em uma jornada
ela um pouco de nossa curta histó- nhos e muitas coisas. Minha avó Ma- de descobertas em torno de meio
ria de migrantes pobres vindos para rina procurou, então, o professor da planeta. Estava feliz e com novos
o Brasil de Portugal, Espanha, Itália escola e ouviu dele que que m ensi- sonhos. Passei duas horas em frente
e Líbano. A partir da minha menina na 12, ensina 13. Sua jornada foi mar- ao computador com um amigo que,
não sei mais do que cinco gerações. cada pela humildade de saber pedir acredito, pode ser um dos meus par-
A história que mais a tocou é ajuda e de fazer valer as oportunida- ceiros na nova jornada àminha fren-
também a que sai do meu peito com des que a vida lhe deu. Concluiu o te: sonho em mapear caminhos para
mais força. Minha avó, Marina de magistério e, depois, a faculdade de que este planeta lindo, que conheci
Carvalho Tauil, cresceu na pequena contabilidade. E, em meados do sé- com minha família a bordo do ve-
cidade de Caçapava, no interior de culo passado, foi uma das primeiras leiro Santa Paz, sobreviva à ganân-
São Paulo. Era filha de Cristo e Ma- mulheres a ter um alto cargo no te- cia e a estupidez da jovem humani-
ria. Em um tempo no qual a mulher sourinha, atual imposto de renda. dade. Nossa conversa gira em torno
existia apenas para criar os filhos e Seus três filhos também foram de um projeto de econ omia colabo-
cuidar da casa, Marina sonhou em para a universidade. O mais velho rativa e de com partilhamento de re-
estudar. Seu pai, um homem sensí- se formou médico. É cardiologista cursos. Sonhamos com um siste ma
vel e carinhoso, a apoiou em sua pai- e cuida do mal que levou seu avô e de direito de uso de bens e produtos
xão até que um ataque do coração o um tanto dos seus tios. O Patau, co- ao invés do atual modelo apoiado na
levou. Quando isso aconteceu , ela mo o chamamos, é um atleta de 6o posse. Saí do encontro revigorado,
tinha apenas 10 anos. anos, não bebe, não fuma e vai atrás sem o cansaço que a tela do compu-
A menina, que foi chacoalha- do que a vida tem de melhor, nossas tador costuma dar. Acredito que po-
da pela cena do pai que tombou à famílias e am igos. Júlia, minha pe- demos sonhar e viver nossa mais ou-
sua frente, logo levantou e sacudiu quena, ficou com os olhos molhados sada imaginação. Vem comigo! •
a dor, apenas para descobrir outra. e aprendeu a sentir-se parte de algo
Quando disse à mãe que ia voltar à maior do que ela. E eu me lembrei
escola, escutou que a família não ti- do barro com o qual fui amassado. LUCAS TAUIL DE FREITAS é um entusiasta
nha como pagar por seu s estudos. Minha mania de sonhar vem de lon- de narrativas transformadoras e acre-
Ali nascia a obstinação que meu bi- ga data. Lá do bisavô Cristo. dita que histórias são vacinas da alma.
Frutas à mão
No verão, é possível encontrá-las em grande quantidade e
também incrivelmente doces. O ideal é saboreá-las in natura.
Mas, para os momentos em que isso não for possível, vale ter
outras alternativas saudáveis ao alcance das mãos
De bar em bar
Os botequins fazem parte do
cenário e da cultura do carioca.
Para preservar a memória des-
ses lugares, os jornalistas Paulo
Thiago de Mello e Zé Octávio
Sebadelhe t iveram a (nem um
pouco) árdua tarefa de mergu-
lhar nesse universo. O resultado
pode ser conferido em Memória Afetiva do Botequim
Carioca, que traz 26 verbetes sobre os botequins
que acompanharam as transformações da cidade. A
obra conta fatos interessantes sobre a arquitetura, a
história, as bebidas e os famosos quitutes desses lu-
gares. E, claro, revela alguns de seus personagens -
famosos e anônimos. O Café Nice, por exemplo, era
ponto de encontro de compositores como Noel Rosa,
Pixinguinha, Francisco Alves e Aracy de Almeida.
Catálogo o-......
.,.
{•. . . . Peanuts
saboroso
Seja para a vida
Valente
A chef Ana Luiza Trajano, de "Não existe nada mais
São Paulo, é apaixonada pelos agradável do que um belo
sabores do Brasil. Prova disso sorriso... dentro dos lim ites do
é que há mais de dez anos ela razoável, é claro." A frase é do
dedica parte do seu tempo para pesquisar os ingre- adorável personagem Charlie Brown, o garotinho e
dientes e os modos de fazer da nossa cultura, tão dono do cão mais famoso dos quadrinhos, Snoopy,
diversa. Ana já se embrenhou em diversas regiões, e que faz parte de Seja Valente, livro que compõe
conheceu gente de cidades distantes e desvendou a série A Sabedoria de Peanuts para a Vida. Por
temperos que boa parte de nós nem seq uer ou- enquanto são quatro volumes. O livro traz ilustra-
viu falar- tampouco conseguiu provar. Todo esse ções da turma formada por Snoopy, Charlie Brown,
vasto conhecimento foi reunido numa obra incrível, Linus e Lucy e frases simples mas que nos ajudam
Misture a Gosto - Glossário de Ingredientes do Brasil. a refletir sobre o nosso cotidiano. Peanuts é uma
São mais de 500 ingredientes, devidamente fotogra- criação do cartunista americano Charles Schulz e
fados e catalogados. O livro é também um legado ficou famosa a partir da década de 1950. Primeiro
que ajuda a manter viva a história ali mentar do como tirinha de jornal, depois como livros e anima- .<>-i5,
nosso país e, dessa maneira, a nossa própria história. ções. E o interessante é perceber que o sucesso e a g
empatia dessa turma perdura até os dias de hoje. ">õ
MISTURE A GOSTO- GLOSSÁRIO OE INGREDIENTES DO
"'o
BRASIL. Ana Luiza Trajano, editora Melhoramentos, R$179 SEJA VALENTE. Charles M. Schulz, editora L&PM, R$18,90 ê
"Tem uma família de saguis que passa com frequência ao lado da minha casa. Um dia, consegui
fazer este registro. Vê-los é sempre muito divertido. Eles sobem nos fios e param para descansar no VIDA SIMPLES quer
muro, onde em geral se alimentam. Estão sempre famintos. Oferecemos a eles frutas, ou melhor, saber como você
bananas, que eles amam. É uma ajuda consciente. Nesses momentos, aproveitamos para observar enxerga as ruas, as
o comportamento do grupo e o treinamento dos filhotes. Descobrimos que é o macho quem carrega cenas, os personagens
e educa os pequenos, que aprendem levando muitos tombos. Todos os saguis estão sempre atentos da sua cidade.
e trocam sinais. A sobrevivência de les, afinal, depende do empenho do grupo. Esse h ábito de Mande sua fotografia
observar a natureza nos e nsina muito e manda mensagen s urgentes sobre cuidado e respeito" para vidasimples@
- Kelly Santos, Amparo, SP maisleitor.com.br