Sei sulla pagina 1di 4

Endereço da página:

https://novaescola.org.br/conteudo/877/circe-bittencourt-o-
bom-livro-didatico-e-aquele-usado-por-um-bom-professor

Publicado em NOVA ESCOLA Edição 269, 01 de Fevereiro | 2014

Planejamento

Circe Bittencourt: "O bom


livro didático é aquele
usado por um bom
professor"
Historiadora, é docente da Faculdade de Educação da
Universidade de São Paulo e da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo
Fernanda Salla

Circe Bittencourt Historiadora, é docente da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) e
da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)

Mesmo com muito tempo de vida - ele surgiu no Brasil no século 19 - e com
tantas novas fontes de informação cada vez mais comuns na vida de educadores
e alunos, como a TV e a internet, o livro didático não perde o posto de material
pedagógico mais utilizado na história da Educação. Além de ser um objeto usado
pelos estudantes, ele serve ao professor e já fez (e ainda faz em alguns lugares) o
papel de currículo, fonte de informação para o planejamento de aulas e até de
orientador da prática docente. Tudo isso sem nunca deixar de ser ideológico.

Ao mesmo tempo que o conteúdo desse tipo de publicação é influenciado pelas


demandas do mercado, pelas diretrizes educacionais governamentais e pela
conjuntura cultural de cada época, ele também é capaz de afetar tudo isso. Uma
contradição, na opinião de Circe Bittencourt, pesquisadora que se dedica a
estudar os livros didáticos há duas décadas. Ela defende ser imprescindível que os
educadores saibam usar as obras como mais um entre os diversos instrumentos
à disposição da aprendizagem dos estudantes. Não como o único recurso.

A função do livro didático mudou com o passar do tempo?


Evidentemente, sim. No Brasil, esse tipo de obra nasceu junto com
CIRCE BITTENCOURT
o currículo, quando a Educação escolar se ampliou, no século 19, e deixou de ser
algo a que somente a elite tem acesso. Na época, a função das publicações dessa
natureza era reunir os conteúdos que deveriam ser ministrados aos alunos. No
mesmo século, o ensino começou a ser dividido em disciplinas, e os próprios
professores de cada área produziam o livro a ser usado, fazendo dele o material
que organizava as aulas. Pouco depois, surgiram as cartilhas e os métodos de
aprendizagem. E, como não havia muitos cursos de formação de docentes na
época, os livros didáticos assumiram a função de formar o professor - o que
acontece até os dias de hoje porque muitos preparam as aulas com base no que
consta neles.

As concepções pedagógicas que surgiram ao longo da história da Educação


influenciaram essas mudanças de função de alguma forma?
CIRCE Sim,os livros didáticos acompanharam diversos movimentos. Do ponto de
vista metodológico, até meados do século 19 acreditava-se que o aprendizado se
dava pela repetição. Nessa mesma época, houve momentos em que a concepção
era a de que o aluno aprendia ouvindo o professor, outros em que a escrita
passou a ser valorizada. No fim do século 19, com a revolução tecnológica
marcada pelo surgimento do rádio, da TV e do telefone, começa a chamada
Educação pelos sentidos. Tudo isso aparece de algum jeito no material em
questão.

Hoje, o fato de os alunos terem contato com muitas informações não faz com que o
livro didático pareça obsoleto e perca o sentido?
CIRCE Não.Mesmo com muitos saberes à disposição, ele tem a função de
sistematizar o conhecimento escolar. Os sites e programas de TV, por exemplo,
podem ser usados como materiais didáticos, mas o papel da escola é reunir e
organizar essas informações, se valendo do que o material impresso contém,
além do conhecimento apresentado pelas crianças, é claro.

O que define o conteúdo apresentado nas publicações?


CIRCE Oslivros seguem os currículos das redes e os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCN), que orientam as disciplinas e os conteúdos a ser apresentados
na escola. Além disso, existe uma relação de mercado que influencia o conteúdo.
As editoras se adaptam às demandas dos educadores fornecendo, por exemplo,
mais materiais com atividades para os estudantes. Ao mesmo tempo, são as
grandes editoras que fazem circular as publicações. Então, os livros didáticos
também determinam o currículo das escolas no Brasil. É uma contradição.

O que faz um livro didático ser bom?


CIRCE O
uso que se faz dele - e isso tem a ver com, entre outras muitas coisas, fazer
da publicação um dos recursos possíveis para os estudantes, não o único. É
possível trabalhar com fontes primárias de pesquisa, idas a campo e
experimentos e outros mais. O bom livro didático é aquele usado por um bom
professor.

O que é preciso levar em conta na hora de escolher uma obra a ser usada em classe?
CIRCE Paraselecionar o material adequado, o educador precisa conhecer bem para
quem vai lecionar. Tem de observar os alunos para saber qual livro mais os
ajudará a aprender. Com base nisso, pode ser que o docente julgue necessário
que a obra tenha uma linguagem mais simples ou muitas atividades, por
exemplo.

Por que em algumas publicações escolares antigas e até mesmo em recentes


encontramos visões reducionistas e até preconceituosas sobre fatos históricos?
CIRCE Para entender isso, é preciso situar as publicações no contexto em que
foram escritas. Os autores repetem o que os historiadores afirmam, o que por
sua vez reflete as crenças de uma época. Há acusações, por exemplo, de que o
livro didático tenha sido o responsável por criar a ideia de índio como alguém
selvagem e ignorante. Porém, quem ditou tudo o que se falou por muito tempo
sobre os indígenas foi o historiador Francisco Adolfo de Varnhagen (1816-1878),
autor de História Geral do Brasil, de 1854. Ele se coloca como um anti-indigenista.

O livro didático é inevitavelmente um portador de ideologia?


CIRCE Sim,porque por princípio a Educação é ideológica. Valores são transmitidos
na escola o tempo todo. Por causa disso, os professores devem cuidar da escolha
das obras didáticas. É necessário que eles se preocupem, por exemplo, com a
maneira com que são apresentados os conceitos fundamentais de cada disciplina
nos livros, com as recomendações de leituras extras, a que autores elas remetem
e também com a qualidade das imagens e das legendas. Todo curso de formação
de professores deveria ter um espaço para leitura e análise da produção didática.

Qual a influência do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), do Ministério da


Educação (MEC), no que diz respeito à produção de livros didáticos?
CIRCE Oprograma avalia o conteúdo das obras em busca de erros conceituais, e
isso faz com que, nesse sentido, elas estejam melhores atualmente. É um ganho.
Porém, como só as grandes editoras conseguem dar conta dos prazos e das
demandas estabelecidas pelo PNLD, o mercado está concentrado nas mãos delas,
que são poucas.

Quais outros problemas são encontrados nas publicações?


CIRCE Muitascarecem de conteúdos regionais. Questões locais quase não
aparecem, principalmente nos materiais de História e Geografia. A regionalização
é necessária para compreender o lugar onde se está e estabelecer relações com
outros tempos e espaços. Mas não interessa às grandes editoras livros assim,
pois eles terão uma vendagem pequena. Outro mal é que atualmente as
publicações estão muito iguais. Antes era possível identificar nos livros de
História, por exemplo, a linha marxista, outra mais ligada à história social e ainda
outra à história cultural.

Cada vez mais surgem sistemas de ensino apostilados no Brasil. O que acha deles?
CIRCE Elesimpedem que os professores tenham autonomia. Para começar, não são
os docentes que escolhem o material, é a rede ou a escola. Além disso, o
conteúdo deve ser seguido à risca, diferentemente do que ocorre com o livro
didático, que o educador usa como apoio pedagógico, elegendo as leituras, os
capítulos e os trechos que vai trabalhar em sala. Outros problemas graves
referentes a esse tipo de material são a falta de regularização e a presença de
muitos erros conceituais. As apostilas não passam por processos de avaliação do
MEC.

Potrebbero piacerti anche