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VAZIO INTERVALAR:

O ESPAÇO DO CORPO
E DA ROUPA

Alice Yumi Sinzato


Florianópolis/2015
Dissertação de Mestrado elaborada junto ao Programa
de Pós-Graduação em Artes Visuais, CEART/UDESC, para a
obtenção do Título de Mestre em Artes Visuais, na linha de
pesquisa Processos Artísticos Contemporâneos.

Banca Examinadora

Orientadora
Profa. Dra. Regina Melim
CEART/UDESC

Profa. Dra. Christine Greiner


PUC/SP

Profa. Dra. Raquel Stolf


CEART/UDESC
RESUMO

Palavras-chave
vazio; intervalo; roupa; corpo; estética

Um olhar sobre a relação entre corpo, roupa e mundo,


utilizando como dispositivo o ma, vazio intervalar. Esta
condição de existência presente na arte e na vida japonesa
se insere na pesquisa como acionador poético para a criação
e reflexão. Ma é um intervalo vazio pleno de possibilidades,
um vazio como potencialidade, que aciona as fronteiras,
corredores e divisórias entre arte, moda, roupa, performance
e arquitetura. O texto é acompanhado de imagens deslizantes
que agem como frestas, corpos adjacentes à escrita. O olhar do
ma é um olhar de estrangeiro, de quem se localiza no intervalo
entre uma coisa e outra, e a partir deste posicionamento
observamos as obras vestíveis de Laura Lima, traçando
relações entre corpo, pele, vestimenta e superfícies.
ABSTRACT

Keywords
void; interval; clothing; body; aesthetics

An outlook on the relationship between body, clothing


and the world, using ma, interstitial space, as dispositif. This
condition of existence is present in Japanese life and art, and is
within this research as an activator of poetics for creation and
reflection. Ma is an empty interval full of possibilities, void
as potentiality, that activates frontiers, hallways and dividers
between art, fashion, clothing, performance and architecture.
The text os accompanied by sliding images that act as fissures,
bodies that are adjacent to what is written. The point of view
of ma is that of a foreigner, of someone who is located between
one thing and another, and from this position we observe
the wearable works of Laura Lima, tracing relations between
body, skin, costume and surfaces.
Sumário

13 Buscando o vazio

19 Lugar da fala

23 Tempo da roupa

31 Vazio intervalar

49 Olhar de estrangeiro

57 Laura Lima pelo olhar estrangeiro

71 Referências
BUSCANDO
O VAZIO

Por que olhar a roupa e a arte através do pensamento


japonês? Penso, aqui, na roupa além da moda, roupa como
um conceito abrangente e além do sistema de moda. Evitar
usar a palavra moda é a escolha feita para que a roupa e o
vestuário possam ser pensados através de um ponto de vista
mais amplo. E, quando faço uso do termo moda, refiro-me ao
vestuário, mais do qualquer outra conotação.
Ao falar de arte e vida, Arthur Danto (2010) lembra que
o mais interessante, muitas vezes, está na própria lacuna entre
essas duas instâncias, e ao escolher localizar-se precisamente
nessa lacuna, talvez seja possível compreender algo sobre
ambas, que antes da relação construída encontrava-se oculto.
A lacuna de Danto é o ma japonês, o intervalo vazio pleno de
possibilidades. Se existem fronteiras, corredores ou divisórias
11
entre arte, moda e roupa, elas são frágeis, perfuráveis e
deslizantes, como as paredes de uma casa japonesa.
Flutuo, portanto, nesse vazio intervalar entre arte e vida,
arte e moda, arte e roupa, roupa e corpo. E pautada, ainda,
por mais um intervalo, que é a fronteira entre Brasil e Japão,
ocidente e oriente.
Em japonês, a minha meia-descendência é
coloquialmente chamada de haafu (do inglês half), o
descendente metade japonês, metade estrangeiro. Como Homi
K. Bhahba (em Curi, 2013) sugere, esse lugar é o entre, onde
as identidades são mestiças e não fixas, desterritorializadas. É
o intervalar antes de ser um ou outro, ser nômade. Esse corte
em metades cria mais um vazio, uma passagem sobre a qual
posso observar ambos os lados, sem pertencer a nenhum
deles, como o corpo do butô, que Christine Greiner (1998)
descreve, estrangeiro onde quer que esteja, pois vive no
tempo/espaço intervalar, sem lugar para atracar.
No Japão, pintura e escrita podem ser vistas como
uma coisa só, a escrita em ideogramas é pictórica, é traço, e a
pintura é o ato de inscrever. Herkenhoff (2009) lembra que os
artistas brasileiros nascidos no Japão traziam consigo o traço
pictórico do nome japonês, e por isso pintavam com o mesmo
gesto com que se escreve o próprio nome, pintura caligráfica
e caligrafia pictórica simultaneamente. Quando discorre
sobre o haikai, Barthes indaga se este seria algo escrito “só
para escrever?”, uma escrita sem função de descrição nem
definição. Escrita que não tem como objetivo revelar nada,
mas apenas reproduzir um gesto designador, suspenso no
tempo. Ao observar um poema pintado/escrito, se pergunta:
onde começa a escrita? Onde começa a pintura? Por isso, na
escrita tradicional a ausência da borracha e a instrumentação
do pincel tanto para desenhar e pintar quanto para escrever, “o
paradoxo de uma escrita irreversível e frágil, que é ao mesmo
tempo, contraditoriamente, incisão e deslizamento” (p. 118).
12
A pergunta sobre os limites entre pintura e escrita é aqui
transposta para a relação entre imagem e texto. Onde termina
o texto e começa a imagem, onde a imagem se torna texto e
texto se torna imagem? São imagens deslizantes, produções
visuais acompanham o texto, corpos adjacentes à escrita,
frestas que indicam coisas que estão no texto, mesmo que não
ditas.
A escrita aqui pode também por vezes se apresentar
fragmentária e deslizante, como as imagens e observações
escritas que a acompanham. Seu formato segue a linearidade
que a grafia em si exige, no entanto seus módulos e partes
podem ser intercambiáveis, movediços, em trânsito, como
os móveis (realmente móveis, em constante movimento) de
um cômodo japonês, ou um origami que se dobra, redobra e
desdobra, onde uma linha se encontra na outra, e na redobra
encontra uma outra, e outra. Uma escrita provavelmente
inconclusiva em alguns momentos, já que aqui a estética é a do
inacabado, impermanente e incerto, do espaço aberto deixado
vazio, provendo ainda mais potência ao objeto. As relações se
estabelecem entre diversos objetos e campos: roupa e moda,
roupa e arte, roupa e corpo, moda e arte, Brasil e Japão, os
vazios intervalares são infinitos e, sua existência (ou a não-
existência de algo nesse “entre”) é o que cria a potencialidade
de criação. Como na dobra de Deleuze, o vazio intervalar é
o acontecimento que permite o começo de algo. O próprio
autor faz a referencia de seu conceito com o origami, onde
desdobrar não é oposto de dobrar, mas é apenas outra dobra:
“dobrar não se opõe a desdobrar, trata-se de tender-distender,
contrair-dilatar, comprimir-explodir” (Deleuze, p. 20). Lucília
Borges (2008) define a dobra como “espaço e(ntr)e”, ao falar
das aproximações e contaminações entre música e design,
som e imagem. Seu vazio do e(ntr)e é o vazio intervalar, uma
possibilidade não ocupada por um corpo, mas passível de
ser ocupada. Seu vazio, portanto, é uma potencia, é um lugar
13
fronteiriço onde buscam-se traços dos dois lados e as forças
ecoam entre si. E como Greiner (2013) fala da fissura que se
cria a partir da tradução, podemos pensar na fissura criada a
partir da leitura e do processo de escritura que se segue, onde
“a tradução [ou leitura] encontra seu limite e a imaginação
transborda para inventar novas possibilidades de encontro”
(p. 12).
Cacilda Teixeira da Costa (em Herkenhoff, 2008)
relatou a viagem de Wesley Duke Lee ao Japão e como este
deslocamento afetou seu trabalho. Wesley ganhou um prêmio
através do qual teve a oportunidade de ir ao Japão. Lá recebeu
como premiação um certificado e uma máscara de teatro nô,
e ao recebe-la declarou:

Esta é a máscara do Japão, impassível e aparentemente


sem emoções. Agora eu vou olhar atrás da máscara e
tenho a certeza de encontrar muita coisa, surpresas
talvez. Dessas surpresas nascerão ainda outros
desenhos. (Wesley Duke Lee em Herkenhoff, 2008,
p. 341)

A metáfora da máscara de nô de Wesley Duke Lee está
relacionada ao vazio intervalar e da condição do olhar de
estrangeiro, é o mesmo pensamento que Laura Lima propõe
com suas máscaras/vestíveis da série Nômades, o trânsito pelo
dentro e pelo fora, superfície e profundidade, o vazio que
permite a construção de cada dobra até o infinito. Cacilda
lembra que Wesley chamou a viagem ao Japão de “viagem
arquetípica”, e esta o teria ensinado muito sobre si mesmo
e sobre o ocidente, reformulando conceitos e experiências,
criando novos desdobramentos em seu trabalho.
A necessidade de falar do vazio pode parecer
contraditória, como querer falar sobre silêncio. É da natureza
humana quebrar o vazio e inventar, criar e indagar o mundo
à sua volta. Mas é talvez o excesso de sons, objetos e imagens,
que justamente nos convida a pensar no vazio como um
14
retorno à experiência primária e sua potencialidade para a
criação e reflexão. “É no silêncio que nascem os devaneios, as
lembranças despertam e florescem os sentimentos” (NOVAES,
2014, p. 16). Wisnik (2014) fala de um silêncio eloquente,
um vazio menos niilista e mais como reação crítica, silêncio
como discurso. O vazio como vácuo, como nada, talvez seja
negação absoluta, mas o vazio intervalar é de outra natureza,
é um intermediário que separa e conecta ao mesmo tempo, é
um dispositivo, engrenagem do mundo.

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LUGAR
DA FALA

Roland Barthes (2007) pontua que as descobertas feitas


através da experiência são intensas e frágeis. A lembrança nos
faz reencontrá-las e cada encontro é o início de um processo
de escritura. Recorro, aqui, a quatro experiências, a partir das
quais é possível traçar a obstinação em relacionar a estética
japonesa à arte e à vida, e, em descobrir as raízes orientais e o
próprio corpo através da vivência do ma pela roupa vestida.
Em 2008 fiz minha primeira viagem ao Japão. Lá assisti
a uma palestra do professor Yasuki Hamano, da Universidade
de Tóquio, cujo tema era a animação japonesa. Ele entrou na
sala trajando um kimono preto, com um kamon1 bordado
em cada ombro. Falou sobre animação japonesa e cultura
pop contemporânea, mas também falou da importância
do kimono para pensar toda a estética e produção cultural
17
japonesa. Foi a primeira vez que ouvi uma reflexão acerca do
kimono como uma peça carregada de significados, e ponte
para novas relações contemporâneas: uma roupa duradoura
e icônica, cujo tamanho serve a diversos tipos de corpos,
totalmente bidimensional, até ganhar vida quando “vestida
sobre os ombros”2 .
No mesmo ano, assisti na UDESC a uma palestra sobre
o teatro butô, focando na trajetória de Hijikata Tatsumi. A
palestrante era Christine Greiner. O butô do qual Greiner
falava me fez pensar num modo completamente novo de
pensar sobre ser e corpo, corpo e natureza, corpo e vazio.
Também podia pensar em como uma brasileira fala sobre
Japão, o que é falar desse “outro”, e por que falar dele.
A terceira experiência aconteceu alguns anos depois,
em 2012, dessa vez morando e estudando em Tóquio e
Yokohama durante um ano. Participei de uma aula de butô
de Yoshito Ono, filho de Kazuo Ono3. A experiência corporal
deu uma nova significação ao “meu” butô. Foi uma manhã
intensa e inesquecível, um momento de completa suspensão
e consciência ao mesmo tempo. A fala de Yoshito Ono era
esparsa e frequentemente trazia à tona a temática do intervalo,
do ma:

...procurar o espaço e aproveita-lo. É no espaço


vazio que tudo pode acontecer, tudo pode ser criado.
Não há espaço só para a frente: procurem no alto,
embaixo. E mesmo retornando ao mesmo lugar,
sempre há algo novo, um sentimento de encontro e
reencontro.
... equilíbrio entre alegria e tristeza, céu e terra, luz e
sombra. Escuridão é escuridão e não se consegue ver
nada, mas a luz cega os olhos, é escuridão também.
... encontrar o forte pianíssimo: o forte é fácil,
o pianissimo também. Como alcançar o forte
pianissimo?
(Fala de Yoshito Ono registrada por mim após o
encontro)

A quarta experiência não se trata de um acontecimento


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pontual. Desde 2005 tenho praticado o wadaiko, arte dos
tambores japoneses. São tambores tocados em conjunto,
por vezes acompanhados de flautas, sinos e voz. É um tipo
de percussão audiovisual, em que o movimento impresso
no espaço com todo o corpo é tão importante quanto o som
proferido. É uma experiência em que se tem uma vivência da
estética japonesa através da sensação trazida pela vibração
do tambor. No butô de Kazuo Ono o palco era útero, e ele,
a criança. No wadaiko a sensação propiciada pelo ritmo da
percussão está relacionada à criança ainda dentro do útero,
ouvindo a batida do coração da mãe. No wadaiko também
existe ma: ele está no espaço onde o corpo se movimenta e no
intervalo entre uma batida e outra. Tocar taiko é “tocar” os
intervalos de silêncio com a mesma importância do toque que
a baqueta faz no couro do tambor. Esse vazio que é do wadaiko,
do butô e do kimono é o vazio pleno de possibilidades, o ma.
São essas as lacunas em que caminho, e estar entre
uma coisa e outra é, em si, uma forma de liberdade. Moda e
arte, Brasil e Japão, ocidente e oriente. Assim como falei “meu
butô”, anteriormente, é importante lembrar que, quando tento
refletir sobre o pensamento e a estética japonesa, estou, de
fato, falando do “meu Japão”, construído a partir da minha
experiência em conjunto com a minha leitura de outros
autores que escreveram a respeito do assunto. Não sou
japonesa, e olho o Japão com olhos de ocidental, e se olhar o
Brasil, talvez seja com olhos de japonesa.
Assim como o Japão de Roland Barthes, minha
necessidade de estabelecer relações com o Japão se dá, em
parte, ao que este confronto pode resultar, já que ao olhar
para o outro estou na verdade olhando para mim mesma.

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Notas

1. Simbolos heráldicos japoneses, que distinguem famílias ou clãs.

2. Em japonês o verbo vestir – 着る – refere-se especificamente às peças


de vestuário que apoiam-se sobre os ombros, como o kimono. Outras
peças, como uma calça, por exemplo, utilizam outro verbo para designar
o ato de vesti-las.

3. Kazuo Ono (1906-2010) foi um dos precursores e grande mestre do


butô. Seu estúdio de dança existe desde 1961 e hoje em dia é coordenado
por seu filho Yoshito Ono.

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TEMPO
DA ROUPA

Por que a escolha de falar de roupas, vestimentas, e não


de moda? À primeira vista pode parecer que estamos falando
de sinônimos, mas existem diferenças e principalmente
aberturas para interpretações variadas dependendo da
palavra utilizada. Moda se refere às roupas, mas mais do que
isso se refere ao novo, como Walter Benjamin (2006) definiu,
à eterna recorrência do novo. A moda como vestimenta deve
ser considerada como apenas uma faceta de muitas, pois é
difícil conceber um fenômeno social que não seja influenciado
pelas mudanças da moda, seja a linguagem, design, arte ou
política. Claro que o papel das roupas na moda é decisivo,
justamente pela proximidade que a roupa possui com o corpo
e sua facilidade de exercer influência e reescreve-lo. Nas
palavras de Harold Koda, (em Svendsen, 2010) “a moda é a
evidência do impulso humano de aproximar o corpo de um
21
ideal transitório e elusivo” (p. 93).
A influência da roupa no corpo se dá pois a mesma
age como dispositivo, completando o sujeito. Agamben
(2009) define dispositivo como qualquer coisa que tenha
a capacidade de capturar, orientar, determinar, modelar,
e controlar os gestos, as opiniões e os discursos dos seres.
Considerando então, que no mundo existem dois grandes
grupos, dispositivos e seres viventes, o autor chama de sujeito
o resultante da relação entre os dois. Essa relação trata-se de
um processo de subjetivação.
Os dispositivos não deixam de ser mecanismos
de poder, e a todo momento estamos sendo modelados,
contaminados e controlados pelos mesmos. Basta observar
o título do livro Fashion or Invisible Corset (Tsukamoto et
al, 2009), livro da exposição homônima de 1999 organizada
pelo Kyoto Costume Institute. Para exibir o acervo de
indumentária histórica do instituto, percebeu-se que as peças,
se vestidas em manequins atuais, não expressariam a noção
de corpo do período de uso da roupa. Por isso desenvolveram
manequins específicos de cada período histórico, manequins
baseados no corpo da época, modificado pelo estilo de vida e
pelas roupas que se utilizavam. Ao observar estes manequins,
percebemos que mesmo nu o corpo é vestido culturalmente,
e a roupa o modifica não apenas no momento em que veste,
mas deixa sua marca no corpo da mesma forma que o
corpo marca a roupa. O corset é invisível pois apesar de sua
“extinção”, a moda continua a modelar corpos, agora através
de alimentação, exercícios e cirurgia. Fukai (em Tsukamoto et
al, 2009) ainda aponta o fato de que o corpo é de fato maleável
em partes como a cintura e o busto, e que esse corpo passível
de mudanças é reconstruído a partir do senso estético e ideais
sociais de cada época.
Na contemporaneidade, o dispositivo pode produzir
tanto subjetivação quanto dessubjetivação, e surge então
22
a preocupação dos homens com o modo de agir frente aos
dispositivos. Para Agamben (2009) a estratégia ideal não se
trata da pura e simples destruição dos dispositivos, pois seu
papel é essencial na formação do sujeito: “na raiz de todo
dispositivo está, deste modo, um desejo demasiadamente
humano de felicidade, e a captura e a subjetivação deste desejo,
numa esfera separada, constituem a potência específica do
dispositivo” (p. 44). Também não se trata da ingênua ideia
de usá-los de modo supostamente correto. A estratégia
ideal estaria baseada então no conceito de profanação, pois
esta seria uma espécie de contradispositivo, ao retornar à
posse dos homens o que antes se encontrava numa esfera
separada. A roupa como dispositivo também pode subjetivar
ou dessubjetivar, e na contemporaneidade, falar de roupa
simplesmente como roupa é um modo de retornar este
dispositivo ao seu uso comum, retirando-o da esfera separada
e intangível da moda.
A experiência da roupa pode se dar através do tempo
da roupa ou do tempo da moda. A divisão em duas categorias
é aqui feita para expor a existência de duas experiências de
tempo diferentes, o que não significa que o sujeito que se veste
não possa transitar por ambas.
O tempo da moda pode ser relacionado à teoria do
contemporâneo de Agamben. O “agora” da moda é algo
inapreensível, um tempo eternamente adiantado a si mesmo
e eternamente atrasado, sempre entre um “ainda não” e um
“não mais”. Consequentemente, as roupas que são “da moda”
estão inscritas nesse instante inalcançável, separado da vida.
A experiência que se tem da moda portanto acontece mais
através de contemplação do que através da vivência, já que
quando se alcança a moda, ela já não mais o é.
O tempo da roupa pode ser relacionado à teoria do
agora=aqui de Shuichi Kato (2012), pois valoriza a vida vivida
e o presente sobre o passado ou futuro. O autor considera
23
que na cultura japonesa coexistem três modos de tempo
diferentes:

– Tempo histórico: Uma reta de natureza direcional, sem


começo e sem fim. A mitologia japonesa narra o nascimento
um passado distante, mas não o início de tudo, e também não
sugere um fim, uma escatologia. Por isso remonta a um tempo
infinito em ambas direções, passado e futuro.
– Tempo cotidiano: Movimento cíclico sem começo e
sem fim, relacionado principalmente às quatro estações. A
experiência do tempo cíclico das estações é muito explorada
em poemas e através de termos sazonais.
– Tempo universal da vida: Com começo e fim, diz
respeito à efemeridade das coisas. É a condição humana, e
não difere entre culturas, o que difere é apenas o modo de
lidar com esta verdade.

Em todos esses tempos, a ênfase estaria em viver no


“agora”. Quando falamos de tempo, seria a tendência ao
presentismo, e no espaço diz respeito ao comunitarismo.
Como na teoria dos estoicos de Cauquelin (2008), em que o
desenrolar do tempo se trata do presente e sua desaparição,
presente como intervalo. Para Kato a ênfase no agora também
significa a importância dada às partes em relação ao todo.
Nos poemas haiku, que Kato considera o último estágio no
desenvolvimento histórico da poesia lírica japonesa, o tempo
está suspenso, parado. Um tempo sem passado nem futuro,
um mundo que se resume apenas ao agora=aqui. Na música
japonesa, importam mais as partes, a pausa e o timbre do
instrumento do que a sucessão de notas que forma uma
melodia, como na música ocidental. Uma única nota pode
gerar uma música inteira. A culinária japonesa, na descrição
de Roland Barthes, consiste de um prato que é desprovido
de centro, uma coleção de fragmentos, pequenos recipientes
24
dispostos sem sequência nem simetria definida. A capital
japonesa Tóquio é outro exemplo:

(...) paradoxo precioso: possui certamente um


centro, mas esse centro é vazio. A cidade toda gira
em torno de um lugar ao mesmo tempo proibido
e indiferente, morada escondida pela vegetação,
protegida por fossos de água, habitada por um
imperador que nunca se vê, isto é, literalmente,
por não se sabe quem. (...) construída em torno de
um anel opaco de muralhas, de águas, de tetos e de
árvores, cujo centro não é mais do que uma ideia
evaporada, substituindo ali não para irradiar algum
poder, mas para dar a todo o movimento urbano o
apoio de seu vazio central, obrigando a circulação a
um perpétuo desvio. (Barthes, 2007, p. 46)

No espaço, o aqui=agora também está relacionado ao


gosto pela horizontalidade. Mesmo as construções religiosas
prezam pela horizontalidade, ao invés de construir torres
que se elevam ao céu. Uma exceção seria o pagode dos
templos budistas, mas trata-se de uma religião originalmente
estrangeira. No Japão os mesmos foram construídos com
menos andares e linhas mais rentes ao chão. Na dança
tradicional também existe a prevalência da horizontalidade,
a exemplo do teatro nô, onde o dançarino se move com os
pés rentes ao chão, sem nunca levantá-los ao mesmo tempo,
como no salto de uma bailarina.
Este tempo do aqui=agora se opõe ao contemporâneo
intangível da moda, e profanar o objeto roupa é retorna-
lo ao uso cotidiano, à vida, ao presente. Numa tentativa
de simplificar as coisas, podemos dizer que a roupa como
dispositivo pode ser dessubjetivadora, se for a roupa do
tempo da moda, inalcançável e utópica; e subjetivadora,
se inserida no tempo do aqui/agora, na vida e na memória
do vivido. A estratégia de ação frente à moda seria então de
profanar seu dispositivo-roupa, permitindo que seja vestido/
experienciado/questionado.
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28
VAZIO
INTERVALAR

A estética japonesa já foi explorada diversas vezes por


escritores, teóricos e artistas ocidentais. Curiosamente, no
oriente não havia uma tradução para a palavra “estética”, até
1883, quando o Japão cunhou a palavra bigaku (美学)4, para
fins de tradução de filósofos ocidentais. A estética japonesa
ainda não possui uma definição final, existem apenas
termos diversos que se referem às qualidades, “partes de um
suposto mas inominável todo” (Richie, 2007, p. 22). Talvez a
estética, na vida tradicional japonesa, fosse algo tão natural e
dominante que a tentativa de definição seria desnecessária.
Apesar de todos os estudos e categorizações existentes, a
estética japonesa é antes a experiência e percepção do olhar
sobre os objetos e situações do que uma reflexão teórica.
Donald Keene (1969) afirma que na corte japonesa do
29
século X, o esteticismo foi elevado a ponto de se aproximar
de uma religião. Junichirō Tanizaki (2001) lembra que a
qualidade que chamamos de beleza deve sempre nascer da
realidade da vida e Keene propôs que a estética japonesa se
distingue pelas seguintes qualidades: sugestão, irregularidade,
simplicidade e perecibilidade. O que não significa que outras
características, como uniformidade, profusão e durabilidade
não estejam presentes. Um destaque é dado à perecibilidade,
que seria talvez o ideal estético mais distintivo no Japão. Este
conceito está aliado ao termo budista mujō (無常), que define
uma das características da existência e pode ser traduzido
como impermanência.
Podemos observar, então, que o ideal de beleza japonês
sugere a natureza através de meios não-representacionais,
imitando suas características abstratas mais do que o seus
resultados. Donald Richie (2007) aponta que o oriente
reconhece a experiência estética como mais intuitiva e
perceptiva do que racional e lógica, e que buscar uma ordem,
linearidade ou lógica pode ser limitante e, até mesmo, falso.
O que podemos fazer é relatar percepções e tomadas de
consciência. Os termos estéticos são apenas tentativas de
indicar e definir algo indefinível. Se pensarmos em termos de
semiótica, são índices, mais do que símbolos ou ícones, pois
indicam algo que se pode apenas imaginar que está ali.
Consciente da impossibilidade de definição, em
A Tractate on Japanese Aesthetics, Donald Richie tentou
esclarecer termos chave da estética japonesa, e alguns são
descritos a seguir:

– Fūryū (風流): Comumente definido como elegância,


bom gosto e refinamento. Mas Richie acrescenta que a palavra
denominava um tipo específico de elegância, baseada em
simplicidade, não-ostentação e tenuidade. “Na literatura a
arte da elegância escolhe a poesia improvisada, mais próxima
30
do silêncio; na arte, a pintura monocromática, mais próxima
do vazio”5 (Richie, 2007, p. 39).
– Wabi Sabi (侘寂): São termos originalmente separados,
comumente vistos juntos não apenas pela similaridade
fonética, mas também por outras afinidades. Sabi é um termo
estético que fala sobre o tempo e o efeito do mesmo. Tem a
ver, portanto, com o desgaste e o envelhecimento das coisas,
e possui também uma dimensão de solitude e melancolia.
Wabi é um termo mais filosófico e, assim como sabi, descreve
a beleza que existe na solitude, no que é vazio e inabitado,
deserto. Ao olhar para a origem das palavras, ambas podem
significar “sozinho”, mas pode-se observar que, enquanto
sabishi refere-se a um estado emocional, wabishi refere-se a
um estado do objeto ou lugar. Wabi também relaciona-se à
beleza encontrada na pobreza.
– Aware (哀れ): É um termo que se aplica a aspectos
da natureza (da vida e da arte também), e refere-se ao modo
com que se movem e causam emoções no indivíduo através
de uma tomada de consciência da efemeridade das coisas.
Pode ser uma reação de melancolia ou de admiração. Trata-
se do reconhecimento de beleza na impermanência. A versão
mais conhecida desse termo é mono no aware, que significa
literalmente “o pathos das coisas”, e essa versão é considerada
característica marcante e essencial da cultura japonesa. Do
aware nascem as percepções que termos como wabi e sabi
tentam definir. Richie relata que existem comparações de
mono no aware com frases ocidentais como “lacrimae rerum”
e “c’est la vie”.
– Yūgen (幽玄): Yūgen refere-se à escuridão, com seus
mistérios e profundidade. Seus ideogramas possuem as
definições de escuro, calmo, profundo, confinado, misterioso,
oculto. De acordo com Richie é proveniente de um termo
chinês que representava algo profundo demais para ser
compreendido e visto. Por isso possui essas duas dimensões,
31
do que não pode ser expresso em palavras e do que não pode
ser visto com os olhos. No teatro nô, yūgen refere-se ao que
está abaixo da superfície, o que é sutil e que apenas sugere.

Como Keene (1969) adverte, embora seja possível


traçar certos ideais estéticos, é importante considerar que o
gosto japonês não permaneceu o mesmo ao longo dos séculos,
e não ficou imune a preferências sociais e educação. Além
disso, muitas vezes estes termos não passam de uma tentativa
de nominar o indefinível, por isso a descrição e reflexão não
pode conter o que a real experiência proporciona.
O Ma, vazio intervalar, pode ser visto como uma
palavra chave da estética japonesa, mas se estende além
disso. Diferentemente das palavras e expressões citadas
anteriormente, ma é um termo não apenas estético, mas
abrange todos os aspectos da cultura e da vida japonesa, e
pode ser aplicado tanto para a produção cultural e artística
quanto para aspectos práticos da vida e das relações entre
pessoas. Ao buscar esta palavra no dicionário, vê-se que é
um termo plurissignificante, com conotações tanto objetivas
quanto subjetivas. Não é um conceito, mas sim um modo de
percepção, uma potencialidade, um estado de ser que está
imbuído no modo de pensar e agir dos japoneses, sendo
praticamente um senso comum. Não pode ser conceituável
pois de acordo com Okano (2012) é algo que ainda não existe,
é uma mera possibilidade da qual nada pode ser dito. Mais
do que um objeto de estudo e análise, no Japão é um estado
quase inconsciente, que se manifesta na estética, na vida e
nas ações das pessoas. Arata Isozaki, quando entrevistado
por Hans Ulrich Obrist (2011), fala da presença cotidiana do
ma no Japão, como está inscrito na própria sociedade e seus
indivíduos, sem necessidade de conceitualização e reflexão:

Silêncio e interstícios são ambos ma, o que é muito


significativo, mas para os japoneses isso é apenas
32
uma coisa da vida cotidiana, algo que eles entendem
de maneira automática, quase inconsciente. Foi
provavelmente porque não levei a exposição [Ma,
Espace-Temps du Japon] ao Japão, uma vez que para
os japoneses o conceito é apenas um grande lugar-
comum, todos a entenderiam, ninguém veria nada
nela de curioso. (p. 22-23)

O ma pode ser traduzido por “espaço, espaçamento,


intervalo, lacuna, vão, lugar, interrupção, pausa, tempo,
ocasião ou abertura”. (Curi, 2013, p. 7). Michiko Okano (2012)
aponta que no dicionário da língua japonesa, ao ler a definição
de ma podemos encontrar conotações tanto objetivas quanto
subjetivas, termos do cotidiano ou termos conceituais, por
isso podemos considera-lo um termo plurissignificante. O
ideograma que o representa (間) é uma união dos radicais de
portão (門) e sol (日) ou, na versão mais antiga do ideograma,
lua (月). A imagem formada sugere então a luz do sol ou da
lua brilhando pelas frestas do portão. Ma é espaço, intervalo, e
trata, de forma geral, da consciência do espaço que existe entre
as coisas. E espaço aqui é definido como algo também inscrito
no tempo, como instâncias inseparáveis: espaço-tempo.
Derrida (em Matthes, 2013) sugere uma ideia semelhante com
seu conceito de “espaçamento”. Ele chama de espaçamento
ou temporização a concomitância e inseparabilidade entre
espaço e tempo. É condição de que um implica o outro e
vice-versa, em oposição à concepção tradicional que afirma a
impossibilidade de espaço e tempo coexistirem.
Christine Greiner (1998) define o ma como princípio
codificador espaço-temporal da cultura japonesa, um
complexo conceito histórico-mitológico, um intervalo onde
tudo pode acontecer. Por se tratar antes de uma possibilidade
do que uma concretização, Michiko Okano (2012) sugere que
o ma é um quase-signo, um dado preexistente que, quando
materializado, manifesta-se como “espacialidade ma”. Edward
T. Hall (1966) considera que a experiência do espaço é uma
33
das maiores diferenças que se pode encontrar entre a cultura
ocidental e a cultura japonesa, e que o ma é o bloco principal
em que se constrói toda a experiência de espaço no Japão.
Para ele, no ocidente quando se pensa em espaço, pensa-
se nas coisas e na distância entre elas, e o espaço entre elas
como um espaço vazio. Para o japonês, o espaço “vazio” tem
significado, ele é percebido e manipulado como são as coisas
em si.
Ma, Espace-Temps du Japon6, como indicado
anteriormente, foi a exposição organizada por Arata
Isozaki, que como relata Okano (2012) teria sido um marco
na inserção e divulgação do ma no ocidente. No texto do
catálogo (1979), Isozaki definiu ma como um espaço vazio
onde vários fenômenos aparecem, passam, e desaparecem.
Apresentando o ma como modus operandi dos japoneses
no próprio cotidiano, a exposição buscou apresentar o tema
de forma experiencial, utilizando-se de diversos formatos
e exemplificações de modo que o espaço-tempo pudesse
ser experimentado corporalmente. Na organização da
exposição foram definidos nove categorias, nove variedades
de experiência que pudessem indicar a existência de ma. A
descrição das nove variedades apresentadas aqui é baseada no
material original escrito por Arata Isozaki para o catálogo da
exposição, além dos estudos de Okano (2012) e Hall (1983).
Transitando entre o cotidiano, o intelectual, o espiritual e o
estético, os itens eram os seguintes:

神籬 - Hiromogi: se refere a duas coisas, o lugar sagrado


de onde desceram os kami7, e o momento exato quando
isso aconteceu. Este momento no tempo-espaço pode ser
considerado um mito da criação do universo. Hiromogi é um
espaço sagrado, se trata da demarcação (que antigamente era
temporária) do lugar da terra onde os kami podem descer.
橋 Hashi: a palavra possui os significados de ponte ou
34
borda, e implica uma conexão entre tempo e espaço. Existem
diversas palavras de sonoridade igual (apenas o ideograma
diferente) que significam extremidade, palitos para comer e
escadas. É portanto o espaço entre duas coisas e o tempo entre
dois eventos. Também representa bordas, espaços-entre,
ponte como verbo e como substantivo.
闇 – Yami: é o mundo de escuridão do qual os kami
vieram e para o qual retornam. Representa a escuridão em si
e a transição de escuridão para luz. Um exemplo de espaço-
tempo onde ocorre essa transição é na construção do palco de
teatro Nô, onde o hashigakari é a ponte por onde o ator anda
para chegar ao palco, simbolizando a passagem da escuridão à
luz ou do mundo dos mortos para o mundo dos vivos. Okano
(2012) ainda lembra da estreita correlação entre yami e oku (
奥), que representa o fundo, oculto e secreto.
数寄 – Suki: Isozaki indica que “su” em suki significa
abertura, mas que a palavra possui outras conotações como
gosto/gostar (好き) e bom gosto/fūryū (風流). Este tema é
relacionado principalmente à cerimônia do chá e sua estética
e arquitetura. A cerimônia do chá representa um momento
único no espaço-tempo, como indica a expressão 一期一会
(“ichigo ichie”, “uma vez, um encontro”), e Okano ressalta
a importância do mestre de chá, que busca combinar o seu
gosto pessoal ao do convidado na escolha das ferramentas
e objetos utilizados cerimônia. É essencialmente uma
cerimônia efêmera, e termina no espaço vazio com todos
os objetos guardados de volta em seu lugar de origem, à
espera do próximo encontro. A autora ainda lembra que
existem outros significados para o verbo suku, como esvaziar,
criar um espaço intermediário e observar através de algo
transparente. Hall (1983) sugere que suki possa ter relação
com as metáforas ocidentais “uma janela no tempo”, “uma
janela de oportunidade”, “uma janela de vulnerabilidade”.
移 – Utsuroi: compreende o processo de mudança ao
35
longo do tempo. Similarmente ao hiromogi, está relacionado
ao momento em que os kami habitavam o vácuo e as mudanças
subsequentes ao longo do tempo. Trata-se da relação
entre tempo e natureza, o momento exato em que os kami
aparecem e a natureza é transformada, passa de um estado
para outro. Isozaki lembra da fascinação dos japoneses pelos
fenômenos indicadores da passagem e mudança ao longo do
tempo, e a arquitetura tradicional busca uma estética cujas
camadas semitransparentes e partes móveis (biombos, portas
e paredes de papel opaco ou translúcido, cortinas de tecido
ou bambu) permitam a construção de um espaço indefinido e
ambíguo, permitindo mudanças constantes e a percepção de
tais mudanças. Ma é aqui a expectativa, o momento parado à
espera desse tipo de mudança.
現身 – Utsushimi: é o lugar onde a vida é vivida, é a
casa ou lar como modelo de universo. A palavra ma pode
ser traduzida como cômodo, o espaço modular e mutável
das casas japonesas. As casas, os objetos nela contidas e o
movimento dos objetos são o vazio à espera das pessoas e vidas
que ocuparão este lugar. Utsu significa vazio e, numa versão
posterior, projeção, e mi significa corpo. Isozaki interpreta a
palavra como a fisicalidade projetada no espaço real.
寂 – Sabi: diz respeito à força inevitável da natureza e
da vida, à decadência das coisas com o passar do tempo. É
o termo contido em wabi sabi, descrito anteriormente, cuja
principal tradução atualmente é ferrugem, pátina e estética
envelhecida. Trata do processo de morte, decadência, ciclo da
vida.
遊 – Susabi: originalmente é relacionado aos jogos
dos kami. É algo lúdico, transgressor, que existe em meio
ao caos e à desordem. O ideograma é o mesmo do verbo
brincar, e Isozaki considera que a inserção da brincadeira, das
influências multiculturais e do senso de humor na vida das
grandes cidades como Tóquio resultam numa espécie de kitsch
36
japonês, onde muitas vezes a simplicidade do ma dá lugar à
estética do excesso. Este kitsch também acontece quando
elementos da própria cultura japonesa se tornam clichês,
são vulgarizados e retirados de contexto. Os temas susabi e
utsushimi não existiam na primeira versão da exposição de
Isozaki, e foram acrescentados na edição realizada Nova
Iorque. Okano considera estas adições desnecessárias à
experiência da exposição, principalmente no caso de susabi,
que parece ser mais uma crítica à falta de ma na vida do Japão
contemporâneo, até mesmo uma afirmação duvidosa de que
não exista ma na cidade de Tóquio.
道行 – Michiyuki: é a união dos caracteres de “caminho”
e “ir”. São as pausas e paradas no decorrer de uma viagem ou
jornada, intervalos programados de um percurso. O modo de
se mover pelo espaço é ditado pelos passos e pela respiração,
num deslocamento espacial e temporal perceptível através da
experiência. Entre cada pedra no caminho do jardim japonês
existe ma, assim como as rotas de peregrinação no Japão
possuem diversas paradas. No Kabuki, michiyuki representa
o processo de ir de um lugar a outro, onde o tempo e o espaço
são percebidos de acordo com a experiência do personagem.
Nas frequentes histórias que culminam com o suicídio duplo
dos personagens, a lenta caminhada que leva à ação final é
denominada michiyuki.

Talvez o ma seja japonês por sua condição geográfica


de “nação-ilha”, como o próprio Isozaki (1996) aponta. O país
é isolado e possui bordas invisíveis, faz fronteira com ninguém
e só se vê o horizonte no oceano e nada além.
O ma opera, cruza e desconstrói diversas barreiras.
Pilgrim (1995) diz que é uma palavra profunda e viva, difícil
de ser analisada e interpretada, e que está entre as artes
tradicionais e contemporâneas, entre religião e arte, entre
religião e cultura. Talvez a afirmação mais relevante de Pilgrim
37
seja de que o ma tem um caráter fundamental “religioso-
estético”8 (p. 58), e seus significados mais profundos se
encontram, mais explicitamente, nas manifestações artísticas.
É inegável a relação próxima entre Ma e Zen. Como Richie
(2007) relatou, a disciplina do Zen foi gradualmente se
dissolvendo na poesia, cerimônia do chá, teatro e pintura, ou
seja, em arte. Sua afirmação é, então, de que a arte não era
influenciada pelo Zen, mas sim o Zen se tornara arte.
Pilgrim explica que o papel do ma nas religiões
japonesas não é explícito, mas é influenciado fortemente pelo
budismo, taoísmo e xintoísmo. Por exemplo, Matsuoka (em
Pilgrim, 1995) sugere que ma é a base da estética japonesa,
e que o xintoísmo parte da ideia de que pequenas partículas
de kami preenchem todo o ma. O ma é um mundo de “entre-
coisas”, simultaneamente temporal, espacial, estético/poético
e religioso/espiritual; é um paradigma estético, religioso e
cultural.
A subjetividade da experiência do ma pode ser traçada
a partir de elementos externos, e Nitschke (1966 e 1993) tenta
buscar o ma em manifestações como pintura, desenho e
arquitetura. O autor reconheceu cinco instâncias onde o ma
atua, partindo dos modos de uso do ideograma dentro de
palavras e frases do idioma japonês:

– Uma dimensão: linearidade, a medida linear entre


uma coisa e outra.
– Duas dimensões: área, a relação entre duas medidas,
como mensurar um cômodo de uma casa.
– Três dimensões: o espaço tridimensional.
– Quarta dimensão: tempo. A medição do tempo,
intervalo de tempo entre dois polos, tempo finito e infinito.
– Quinta dimensão: subjetividade (como em expressões
do idioma japonês relativas a experiência, arte e sociedade) e
metafísica (utilizado no budismo, o vazio que transcende a
38
forma).

Com o ma como modo de percepção e ação na vida


cotidiana, surgem termos que exprimem o ato de manipular
e capturar este intervalo. Em japonês existem as expressões
ma-dori (間取り) e ma no torikata (間の取方), ambas unindo
ma ao verbo que define tomar, pegar, capturar. São termos
utilizados em diversas áreas como artes marciais, conversação,
arquitetura e design. Produzir um trabalho de arte ou uma
roupa na condição de vazio intervalar, tendo consciência do
ma, é então possuir o ma-dori e entender o ma no torikata.
Para pensar na roupa como espaço vazio, intervalo
espacial/temporal entre roupa e corpo, corpo e ambiente,
podemos observar as investigações feitas acerca do ma em
uma área de atuação que carrega diversas similaridades com
a roupa: a arquitetura. Como Wisnik (2014) indica, as obras
de Tadao Ando, por exemplo, dão expressão visível à poética
da sombra e do vazio. Os trabalhos de arquitetos japoneses
como Isozaki e Ando partem do modo de ser imbuído de
ma, e europeus como Günter Nitschke produziram extensas
pesquisas, buscando a relação entre ma e arquitetura. Outra
área com a qual podemos estabelecer relações são as artes
cênicas e performance, como comprova Curi (2013) e Greiner
(2008).
Nitschke (1993) investiga o ma a partir da consciência
de lugar dos japoneses. Afirma que a evolução da arquitetura
japonesa seguiu uma lógica de descoberta do antigo pelo novo.
Cita a descoberta dos antigos mestres Zen a partir de Sartre,
por exemplo. A arquitetura japonesa teria se modernizado
tentando imitar modelos ocidentais e adaptá-los, até chegar
a um certo ponto quando percebeu que chegara a um estágio
de evolução atingido há milhares de anos. Nitschke parte da
definição de termos-chave para sua pesquisa, como espaço,
objeto e lugar, relacionando-os a termos em japonês como
39
ma. E, como ele mesmo afirma, este é um dos principais
problemas de um trabalho desse tipo, que é o de descrever
fatos de uma cultura com a linguagem de outra. Para ele,
ma é o senso de lugar dos japoneses, e não apenas algo
tangível, é também algo que se localiza na imaginação da
pessoa que vivencia o ma, e, portanto, o define como um
“lugar experiencial”9. Podemos definir este lugar como lugar
que permite, possibilita a experiência. Para Bondía (2002),
experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos
toca. A verdadeira experiência é cada vez mais rara, devido
ao excesso de informação, de opinião, de trabalho, e falta de
tempo. O sujeito dos dias de hoje está sempre em atividade e
mobilizado, e por não podermos parar, a experiência se torna
cada vez mais rara. O autor defende que para que a experiência
seja possível, é necessário um gesto de interrupção:

Requer parar para pensar, parar para olhar, parar


para escutar, pensar mais devagar, olhar mais
devagar, e escutar mais devagar; parar para sentir,
sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes,
suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a
vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar
a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e ouvidos,
falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão,
escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar
muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço. (p. 4)

O espaço intervalar de Nitchske opera então nas


dualidades objeto-espaço, tempo-espaço, mundo subjetivo-
objetivo, interior-exterior. A tradução de ma para “lugar”
é do próprio autor, no intuito de pensar no lugar como
produto do espaço e tempo vividos e, também, de afastar-se
da concepção puramente subjetiva de um espaço imaginário.
Esta proposição permite que se pense no ma do corpo, pois o
corpo também é “lugar”.
No campo dos estudos do corpo existe a proposição
de utilizar o ma como acionador poético de criação do corpo,
40
pois como Alice Curi afirma, é apenas esvaziado que o corpo
abre-se para novas criações.

O corpo esvaziado, tornado latência pura (ou


quase, se isso for utopia), se abre a um fluxo
‘impermanente’ entre interno e externo, abre-se,
assim, à possibilidade de experiência e de criação
(…) um corpo vazio em devir, corpo-passagem,
é poroso à dimensão da alteridade, se deixa afetar,
se contamina, se expõe, doa-se, se redescobre e
redimensiona o mundo” (Curi, 2013, p. 5-8).

Explorando a teoria dos estoicos sobre os incorporais,


Cauquelin (2008) vai em busca do invisível, inexistente
e imaterial do mundo, incluindo o vazio. Os incorporais
estão no nosso mundo, e são designados a partir de quatro
elementos concretos: o tempo, o lugar, o vazio e o exprimível.
O mundo e o vazio compõe o todo dos estoicos. Mais do
que um vazio que circunda, este vazio é, como o ma, um vazio
de possibilidades, vazio-potência. O vazio portanto também é
um lugar, pois é o que contém o mundo, e o incorporal é o vazio
intervalar, a passagem entre vazio e lugar. Os lugares também
são incorporais pois são efêmeros, surgem e se dissolvem, e
o tempo também, pois é a passagem entre o presente, que é
existente, e o passado e futuro, que não existem. O exprimível
diz respeito à linguagem e sua parte que é incorporal, sendo
o espaço entre as palavras e as coisas, entre as palavras e os
sentidos possíveis, entre a fala e o silêncio. A marcha do
mundo é então o fluxo, o movimento entre espaço com corpo
e sem corpo, mundo e vazio. E o vazio nunca deixa de existir,
pois se ele é a condição do lugar, sempre fará parte do mesmo.
A partir do vazio intervalar do corpo e do espaço,
podemos buscar o ma da roupa. Nesse fluxo entre interno e
externo do corpo com o ambiente também está a relação entre
roupa e corpo, corpo vestido e espaço. O espaço arquitetônico
é habitado pelo corpo, da mesma forma que a roupa o veste.
Hiramitsu (2005) afirma que Issey Miyake produz
41
roupas que ressonam física e espiritualmente com o portador,
num processo que o estilista define como deixar o ar preencher
o espaço entre corpo e roupa, este ar sendo o ma, resultando
na finalização do processo quando o corpo se move com a
roupa e a presença de um corpo é então revelada. A roupa
é um vazio de possibilidades, um vazio capaz de conter um
corpo. Ela é, em si, corpo, e este corpo, como o corpo cênico
de Curi, trata-se de um corpo tornado passagem, aberto à
experiência de despertar percepções, ressonâncias, vivências
e poéticas, agindo como suporte para a vida e para a arte.
Apesar de se inserir no campo comercial da moda, Hasegawa
(2008) lembra que interessa a Miyake, mais do que a moda, o
próprio ato de vestir, e o estilo de vida do ser que se veste.
As roupas são uma segunda pele, uma extensão
do corpo, um dispositivo tornado órgão mutável do corpo
humano. E elas exercem sua influência sobre esse corpo. A
estilista Elsa Schiaparelli (em Svendsen, 2010) afirmou que as
roupas é que se adaptam ao corpo, e não o contrário. Mas
também é verdade que a roupa reescreve o corpo, seja ele
vestido ou despido, como o espartilho invisível de Akiko
Fukai. Valerie Steele (em Svendsen, 2010) compartilha o
pensamento de Fukai, observando que o espartilho nunca
desapareceu, e ao longo dos anos foi convertido em outras
peças de roupa de baixo, culminando no corpo moderno
bem-exercitado, também “vestido” culturalmente. Svendsen
considera o corpo nu não mais “natural” do que o corpo
vestido, pois de fato não existe nenhum momento em que o
corpo não está vestido, mesmo que nu. Como na fala de Rei
Kawakubo, “o corpo encontra a roupa, a roupa encontra o
corpo”10.
A relação entre roupa e corpo passa pela pele, e
primariamente através do tato. Borges (2008) afirma que o
tato está longe de ser apenas “um” sentido, pois através dele se
sente a pressão, a posição, a textura, a vibração e a duração das
42
coisas, tanto materiais quanto imateriais. A pele espalha olhos
e ouvidos pelo corpo, é o lugar onde se estabelece nossa relação
com o mundo, o maior e mais externo órgão que temos. É o
lugar onde as coisas podem se relacionar, nesse vazio “onde
tudo se encontra, como se tudo tivesse pele” (Borges, 2008, p.
188).
Nesse encontro de roupa e pele, podemos afirmar que
a roupa inscreve o corpo, mas o corpo também inscreve a
roupa em retorno. A roupa que é realmente vestida, recebe o
cheiro, o suor, as memórias, até mesmo a forma do portador.
Nas notas para o texto Hagoromo de Zeami, transcriação por
Haroldo de Campos (2006), o autor explica os cinco estigmas,
gosui:

Quando um ser celeste está para morrer (transmigrar


para outro dos seis mundos budistas) aparecem
os seguintes sintomas: 1) as flores de seu diadema
começam a murchar; 2) suas vestes cobrem-se
de poeira; 3) de suas axilas brota o suor; 4) suas
pálpebras tremem; 5) o cansaço o toma. (p. 43)

A roupa dos homens é, portanto, aquela que não só


se inscreve no corpo mas é inscrita, marcada pelo mesmo.
Stallybrass lembra que as jóias também são trajadas no corpo,
e podem possuir uma história, no entanto sua forma resiste aos
corpos que a vestem. O autor explora a relação entre as pessoas
e os objetos, objetos como presenças materiais e ao mesmo
tempo, códigos para outras presenças materiais e imateriais.
Afirma que, apesar de toda a crítica ao materialismo na vida
moderna e contemporânea, a atenção ao material é justamente
o que falta às nossas vidas. Num mundo de mercadorias, os
objetos não possuem um valor além do monetário, e amar as
coisas é algo constrangedor, já que não possuem vida.

Não havia “meras coisas”. As coisas eram os materiais


– as roupas, as roupas de cama, a mobília – com os
quais se construía uma vida; elas eram o suplemento
43
cujo desfazer significava a aniquilação do eu.
Tornou-se um clichê dizer que nós não devemos
tratar as pessoas como coisas. Mas trata-se de um
clichê equivocado. O que fizemos com as coisas
para devotar-lhes um tal desprezo? (...) Por que os
prisioneiros são despojados de suas roupas a não ser
para que se despojem de si mesmos? (Stallybrass,
2012, p. 80)

No mundo da moda, as roupas são sempre novas, e suas


vidas adquirem uma existência fantasma. O autor defende
que a recusa à vida da matéria está presa a um paradigma
cartesiano e pós-cartesiano, onde o que realmente importa
existe apenas na pureza das ideias, e não na impureza das
coisas. A valorização da roupa como objeto para vestir é a
aceitação da vida do presente, da relação entre seres viventes
e objetos, da superficialidade por profundidade. A poesia
da vida seria então “uma poesia da superfície vestida, da
superfície permeada: uma poesia das roupas” (Stallybrass,
2012, p. 31), da marca que o ser imprime no objeto e que o
objeto imprime no ser.

44
Notas

4. União dos ideogramas de “beleza” (美) e “estudo” (学).

5. Frase de Sato Haruo, traduzida para o inglês por Richie como “In
Literature the art of elegance chooses impromptu poetry, closest to silence;
in art, monochrome painting, closest to emptiness.”

6. Esta exposição se trata do principal evento a difundir a ideia de ma


no ocidente. Aconteceu no Cooper-Hewitt Museum em Nova Iorque em
1976 e passou por Paris e Tóquio subsequentemente. O texto do catálogo
e organização da exposição é de autoria de Arata Isozaki.

7. Deuses ancestrais do Japão. No catálogo organizado por Isozaki (1979),


Seigow Matsuoka define kami como Deus em japonês, deuses que não
possuem corpo físico, cuja presence preenche o vazio de energia ki.
Originalmente, kami é um deus abstrato no tempo-espaço, e sua natureza
é a de vir ao nosso mundo, e depois partir, num movimento de ir e vir
constante.

8. No original em inglês, religio-aesthetic.

9. O termo original, experiential place, poderia também ser traduzido como


“lugar experimental”, mas a escolha da palavra “experiencial” foi feita tendo
em mente a relação mais próxima do termo com o conceito de experiência
(como em Bondía, 2002) do que com o conceito de experimento. Bondía
alerta que é preciso evitar a confusão de experiência com experimento,
pois “se o experimento é genérico, a experiência é singular. Se a lógica
do experimento produz acordo, consenso ou homogeneidade entre os
sujeitos, a lógica da experiência produz diferença, heterogeneidade e
pluralidade (...) a experiência não é o caminho até um objetivo previsto,
até uma meta que se conhece de antemão, mas é uma abertura para o
desconhecido, para o que não se pode antecipar nem pré-ver nem pré-
dizer” (p. 7).

10. Referência à coleção primavera-verão de 1997 da Comme des Garçons,


intitulada “body meets dress, dress meets body”.

45
46
OLHAR DE
ESTRANGEIRO

São muitos os casos de estrangeiros que visitaram


o Japão e lá encontraram parte de si mesmos, viram-se
confrontados com novos questionamentos e tal encontro
mudaria sua produção artística e/ou teórica dali em diante. A
visita ao Japão não precisa sequer ser física, pode ser fictícia
e mental, através de outros autores, como no caso dos tantos
artistas contemporâneos que leram Daisetz Suzuki na segunda
metade do século XX.
Roland Barthes (2007) foi uma dessas pessoas, quando
escreveu O Império dos Signos. Sua jornada pelo país do
ideograma já começa antes do próprio texto começar, na nota
escrita na primeira página, buscando a abolição da hierarquia
e diferenciação entre texto e imagem: “o texto não ‘comenta’
as imagens. As imagens não ‘ilustram’ o texto” (p. 5). Além de
47
aceitar as imagens como texto e vice-versa, também aceita as
zonas de sombra do seu próprio olhar e experiência, também
o desconhecimento do idioma. Busca o processo de escritura
mais do que o resultado em si, escritura que é, “em suma e
à sua maneira, um satori: o satori (o acontecimento Zen) é
um abalo sísmico mais ou menos forte (nada solene) que faz
vacilar o conhecimento, o sujeito: ele opera num vazio de
fala.” (p. 10).
O autor faz uso e percebe sua posição de estrangeiro, e a
partir dela inicia o processo de escritura do seu próprio Japão,
não apenas aceitando mas buscando como objetivo o vazio,
o intraduzível, o incompreensível. O olhar de estrangeiro se
torna, então, um dispositivo de criação e poética, um modo
de percepção a partir da aceitação do vazio intervalar, do
abismo entre o eu e o outro.

Assim, no estrangeiro, que repouso! (...) A língua


desconhecida, da qual capto no entanto a respiração,
a aeração emotiva, numa palavra, a significância
pura, forma à minha volta, à medida que me desloco,
uma leve vertigem, arrasta-me em seu vazio artificial,
que só se realiza para mim: vivo no interstício, livre
de todo sentido pleno. (Barthes, 2007, p. 17-18)

Arata Isozaki (1996) afirma que “Japão” é puramente


uma invenção, uma ficção, construída pelo olhar do outro.
Chega a dizer que hoje em dia os próprios japoneses olham o
Japão com um olhar estrangeiro, resultante da modernização
através da ocidentalização da cultura.
O olhar de estrangeiro está relacionado aos nômades de
Laura Lima, pois nômade é o estrangeiro onde quer que ele
esteja, estrangeiro até de si mesmo. O nômade é estrangeiro
onde quer que esteja pois está sempre na fronteira, no
intervalo entre duas coisas. A fronteira separa dois elementos,
mas simultaneamente os une e cria espaços de contato.
Okano (2012) lembra que na matemática, por exemplo, a
48
palavra fronteira define um conjunto de pontos que pertence
simultaneamente ao espaço interno e externo, e fronteira
portanto é o lugar onde ambos coexistem. A obra de Laura
Lima é nômade pois transita entre diversos intervalos; entre
ateliê e museu, parede e corpo, à frente e detrás, o olhar de
estrangeiro é o que pertence e não pertence, está ora de um
lado, ora do outro, ou melhor, em nenhum dos lados, mas
no intervalo entre eles. Este olhar é o que guia esta própria
pesquisa. Como citado no início do trabalho, o olhar que gera
o presente texto está no vazio intervalar entre ser brasileiro
e ser descendente de imigrantes japoneses. Assim como em
Toquiogaqui de Greiner e Fernandes (2008), o olhar é de
desvio, intermitência e poética: “um lugar-pensamento criado
por ocidentais e brasileiros, desenhando um Japão de cabeça
para baixo. Um espelho de nós mesmos e do mundo virado
pelo avesso” (p. 13).
Tanto em Toquiogaqui (2008) quanto em Laços do
Olhar (2009) e Quando vidas se tornam forma (2008), é
evidente a aproximação entre Brasil e Japão. O Japão com sua
estética que transforma e imprime seu traço no que tocar, e o
Brasil com seu caráter antropofágico e cultura permeável. O
Brasil ainda é a maior comunidade de migrantes japoneses do
mundo, com 1,5 milhão de japoneses, enquanto no Japão vivem
muitos brasileiros descendentes de japoneses, na condição de
trabalhadores temporários. Hasegawa (2008) ainda sugere
que, diferentemente do processo de canibalização cultural
no Brasil, que passa por uma seleção crítica e construtiva, o
processo de japonização é naturalmente híbrido, não possui
hierarquia e talvez ainda menos fronteiras em certos aspectos:

A falta de princípios no processo de japonização


evidencia-se na coleção de costumes da qual se
participa, em que um recém-nascido é abençoado
em um templo, o casamento acontece em ima
igreja cristã somente devido a uma enfatuação com
a cultura visual ou com o design do catolicismo, o
49
Natal é celebrado, e os funerais acontecem em um
templo budista (...) é um produto da total indiferença
ao contexto em que reside a origem. (p. 30)

Na lista de teóricos e artistas que se fascinaram com


o Japão e foram influenciados por esse império dos signos,
muitos são artistas, escritores e pensadores brasileiros. Além
dos nipo-brasileiros e japoneses imigrantes como Tomie
Ohtake, Manabu Mabe e Roberto Okinaka, muitos não
possuem descendência mas foram igualmente afetados pela
estética e pensamento japonês, como Mário Pedrosa, Haroldo
de Campos, Augusto de Campos, Lygia Clark, Helio Oiticica
e Wesley Duke Lee. Pedrosa, por exemplo, foi o primeiro
intelectual a realizar uma viagem brasileira de investigação
estética ao Japão, e a partir disso escreveu cerca de 20
artigos sobre arte japonesa, sendo que seus textos afetariam
a produção de diferentes artistas como Lygia Clark, Helio
Oiticica e Mira Schnedel.
Na trajetória da influência do Japão na arte brasileira,
Herkenhoff (2009) faz uma divisão de três períodos: o
primeiro seria pautado pelo japonismo do fim do século
XIX, nos moldes do japonismo europeu, e coincidindo com
o início da imigração japonesa no Brasil. O segundo período
vê o surgimento de artistas nipo-brasileiros e sua tentativa
de inserção no ambiente artístico brasileiro. Os japoneses
deixam de ser objeto para serem sujeitos da linguagem
artística brasileira. A terceira etapa de Herkenhoff analisa
as contribuições filosóficas e estéticas japonesas para a arte
brasileira através de viagens ao Japão e leituras de autores
japoneses, tanto pode artistas nipo-brasileiros quanto de
outras origens. Para o autor, este terceiro período é marcado
por três viagens de grande importância de brasileiros ao
Japão: Mário Pedrosa em 1958, Wesley Duke Lee em 1965 e
1969, e Haroldo de Campos em 1991.
50
Os valores espirituais e a cultura visual do Japão,
que antes tinham um dificultoso espaço na cultura
brasileira do entre-guerras, agora passarão a ser
objetos de interesse, absorvidos por diversos campos
da cultura brasileira (...) passa-se a compreender
no Brasil ser necessário incorporar a contribuição
do Japão para a invenção da linguagem, expandir
o campo de expressão, refinar a poética, ampliar
horizontes, enriquecer-se com a diversidade,
construir uma dimensão harmoniosa e, sobretudo,
reconciliar-se com sua nova formação sociocultural.
(Herkenhoff, 2009, p. 94)

Dentre os artistas brasileiros influenciados pelo Japão,


podemos destacar dois entre muitos, que se aproximaram
do conceito de ma: Lygia Clark e Hélio Oiticica. Segundo
Herkenhoff, na obra de Clark as influências nipônicas se dão
através do círculo imperfeito, origami e o vazio. Seus bichos
possuem lógica do origami em sua dinâmica e movimento
estrutural. O círculo imperfeito do zen, chamado de enso,
pode ser aproximada ao Ovo Linear de Clark, “pois remete à
vida e ao tempo, que é criação do homem, e ao vazio” (p. 153).
Além do vazio do ovo, é imprescindível comparar o vazio do
zen ao “vazio pleno” de Lygia Clark. E de Hélio Oiticica temos
o parangolé, que Herkenhoff define como uma desconstrução
do kimono, e a primeira aproximação desse tipo teria sido
feita por Haroldo de Campos (2006), quando estudou e
“transcriou” o Hagoromo de Zeami, comparando o hagoromo
(manto de plumas) ao parangolé de Oiticica, culminando
no que Campos chamou de fusão hagoromo/parangolé, no
poema Parafernália para Hélio Oiticica: “onde se lê hagoromo,
leia-se parangolé / onde se vê monte fuji, veja-se morro da
mangueira”.
Como Nômades de Laura Lima propõe, estamos
sempre no interstício, sempre estrangeiros, e este
reconhecimento do vazio intervalar permite infinitas dobras
e redobras, investigações e delírios. Herkenhoff lembra
51
que talvez sejamos estrangeiros, não importa em que país
estejamos, pois antes disso já somos estrangeiros de nós
mesmos, e a moda conceitual como a de Jum Nakao e outros
estilistas talvez seja uma moda, uma roupa que torna o corpo
estrangeiro, que o posiciona precisamente no intervalo onde
tudo é possível, tudo é questionado, é potência e possibilidade:
“a roupa só pode ser agora a pele estrangeira. A roupa, sendo
o abrigo e desterro do ser, é o paradoxo proposto por [Jum]
Nakao” (p. 302).
Os nômades de Laura Lima, e os nômades que
transitam Brasil e Japão citados aqui, são seres abertos ao
vazio intervalar, e portanto aberto a experiências, sempre em
trânsito no “lugar experiencial”. Bondía define experiência
e o sujeito da experiência como um território de passagem,
uma superfície sensível, um espaço onde têm lugar os
acontecimentos:

A palavra experiência tem o ex de exterior, de


estrangeiro [extranjero], de exílio, de estranho
[extraño], e também o ex de existência. (...) Em
alemão experiência é Erfahrung, que contém o
fahren de viajar (...) a palavra experiência contém
inseparavelmente a dimensão de travessia e perigo.
(Bondía, 2002, p. 4)

O olhar de estrangeiro permite estar no intervalo


entre duas coisas, ser nômade e transitar por diversas áreas,
numa oscilação entre pertencimento e não-pertencimento.
Rancière, quando entrevistado por Obrist (2011), afirma que
tenta ignorar as fronteiras entre disciplinas, buscando sempre
a transversalidade entre abordagens intelectuais, já que para
ver com os próprios olhos é necessário ultrapassar as fronteiras
de conveniência. O designer Tokujin Yoshioka (2009) acredita
estar em algum lugar entre arte e design. Admirador de Issey
Miyake e Isamu Noguchi, Yoshioka tem seu método inspirado
em suas trajetórias, cujo trabalho parte de uma ideia ou um
52
conceito, sem se preocupar inicialmente em que categoria
se encaixar. Depois de pronto, talvez possamos procurar o
lugar onde o trabalho pertence, mas para sua concepção é
necessário estar alheio a categorizações predeterminadas.
Este olhar é um que está sempre no espaço entre, e
sempre atuando na lógica da tradução. Michiko Okano (2012)
analisa os ideogramas que compõem a palavra tradução em
japonês, e observa-se que ela se forma da união do caractere
que significa “voar, virar, pôr do avesso, subverter”, com
o de “ver o significado, traduzir”. A tradução, e o olhar de
estrangeiro também, nunca é a mesma coisa que o original, é
sempre uma perspectiva diferente, uma busca de afinidades,
um confronto necessário do qual nasce algo novo.
Ao levantar a produção bibliográfica acerca do ma,
Okano observou que a maioria da produção intelectual sobre
o tema, seja por parte de autores estrangeiros ou japoneses,
aconteceu após a exposição que Isozaki levou ao ocidente
em 1978. Para os estrangeiros a ideia do vazio intervalar
foi fascinante e proporcionou um novo olhar, e para os
japoneses esta exposição talvez tenha encorajado falar sobre
algo que era apenas intrínseco à cultura mas não havia sido
estudado ou analisado, levando ao autoconhecimento e
reflexão sobre o próprio modo de viver. Okano lembra que
a descoberta da diferença é sempre enriquecedora, pois o
processo de interação entre culturas e pontos de vista permite
um novo olhar sobre o outro e sobre si mesmo. No caso do
ma, Isozaki, um japonês, provocou o olhar de estrangeiro
sobre algo instrínseco à sua cultura, e este olhar exterior deu
um novo enfoque à esta condição da sociedade e cultura
japonesa. Isozaki (1996) lembra que o próprio processo de
montagem da exposição mudou o seu processo de trabalho
na arquitetura. “Durante este processo, as teorias que eu
considerava peculiarmente japonesas se dissolveram, como se
algum tipo de solvente tivesse sido derramado nelas” (p. 48).
53
Isozaki relatou que um intervalo havia se formado quando
o ocidental e o japonês foram sobrepostos, e a partir daí seu
processo de criação se tornou ambivalente, com o objetivo de
produzir algo nem ocidental, nem oriental, mas sendo os dois
ao mesmo tempo. O arquiteto descreve este processo como
ser atraído por um vórtice de análise e interpretação a partir
da colisão de culturas heterogêneas.
O ma no olhar dos estrangeiros é este vórtice, é um
acionador poético de criação, o vazio intervalar como
potência criativa e reflexiva para a arte, a filosofia e o modo de
vida. E o olhar de estrangeiro é a condição, o estado e modo
de percepção que permite este modo de ser do ma.

54
LAURA LIMA
PELO OLHAR
ESTRANGEIRO

A obra de Laura Lima está repleta de elementos


vestíveis, como em Costumes e Nômades. Não se tratam no
entanto de meras roupas: Lagnado (2014) destaca na obra de
Lima a vontade de criar um dépaysement, um deslocamento
do objeto de seu lugar de origem, que no caso de Costumes, por
exemplo, teria como finalidade incitar mudanças nos hábitos
culturais, modos de pensar e na própria indumentária. Apesar
de inseridos na instituição, seus trabalhos buscam se associar
à práxis vital, mesmo que o faça através do deslocamento do
objeto.
As escolha de produzir obras vestíveis no caso de
Laura Lima também está relacionada com o que a própria
artista chama de Filosofia Ornamental, conceito que perpassa
por toda a sua obra, notadamente Costumes, Novos Costumes,
55
Galinhas de Gala, Faisões com Comida, Ouro Flexível e
Nômades:

Não é bem que o foco esteja numa estetização


do cotidiano, mas na doutrina que provoca uma
estetização. Depois de um século em que imperou a
necessidade do conceito – me refiro à transformação
ocorrida com o ready-made (…) o conceito acabou
sendo usado com a finalidade de reduzir a forma
(…) foi um século justificado pela frugalidade
e a eficiência do resultado, sob a égide de um
puritanismo tirânico em relação às possibilidades da
arte (…) Irônica, a Filosofia Ornamental abandona
a veste de superficialidade puritana e salta para
outras formas de “pura” superficialidade: de beleza,
de prazer, e de gozo. É como se, no salto dentro do
vazio, Yves Klein se permitisse duas piruetas antes de
se esborrachar. (Laura Lima em Lagnado e Castro,
2014, p. 24-26.)

A Filosofia Ornamental e a “pura superficialidade” de


Laura Lima podem ser relacionadas à teoria da superficialidade
de Patrice Bollon (1993), que define o “superficial por
profundidade” como o paradoxo final. O autor percebe
a aparência e o estilo como uma espécie de “pensamento
selvagem” do social, uma forma de arte cotidiana e popular
do viver. Em sua visão, é justamente a aparente futilidade que
garante a liberdade da aparência e do estilo frente à palavra,
tornando-a um modo de expressão autônomo.
A superficialidade de Bollon é baseada na distinção de
Nietzsche entre dois tipos de superficialidade. A primeira seria
a “superficialidade por superficialidade”, a forma mais leve e
opaca, que vê o mundo sem realmente olhá-lo. A segunda
seria a “superficialidade por profundidade”, que permite estar
num estado de constante oscilação e desdobramento entre
interior e exterior. Esta não se opõe à profundidade, mas é
consequência, conclusão do mergulho na mesma. O autor
associa este mergulho e retorno à descrição que Nietzsche
faz da superficialidade dos gregos, que ao mergulhar na
56
profundidade teriam decidido retornar à superfície, à
epiderme das coisas. O desvio é necessário pois a inocência do
olhar, que antes era ingenuidade, retorna como uma segunda
inocência, um novo olhar sobre as coisas, mais agudo e sutil.
Assim como Laura Lima define a pura superficialidade
como aceitação da beleza, do prazer e do gozo, Bollon
afirma que a superficialidade grega é uma arte do sentir e do
viver. A artista fala de um salto dentro do vazio, enquanto
o autor diz que essa superficialidade conserva às coisas e ao
mundo exterior sua natureza inexplicável. Bollon define a
superficialidade por profundidade como paradoxo final pois
nela existe simultaneamente uma aceitação e um combate,
é paradoxo pois o desapego é a condição do verdadeiro
conhecimento:

Além de a verdade ser inconcebível sem seu


véu, como escrevia Nietzsche, só podemos nos
aproximar dela e agarrá-la por inteiro por seu
véu. (…) O mundo, para ser real e profundamente
compreendido, deve ser abordado, repetimos, na
sua totalidade, na totalidade de seu aparecimento –
como aparência. (Bollon, 1993, p. 173)

A superficialidade nietzschiana é, portanto, o


reconhecimento de que o mundo só pode ser compreendido
para além da razão, através da emoção estética. Talvez seja
esta a doutrina que provoca uma estetização presente no
trabalho de Laura Lima.
Sobre a filosofia ornamental aplicada a elementos
vestíveis, podemos voltar o olhar para dois trabalhos de Laura
Lima: Nômades e Costumes11.
Nômades é o trabalho de Laura Lima que une o uso da
roupa como dispositivo à ideia de vazio intervalar e olhar
estrangeiro, através de um vestível-paisagem que permite ao
portador estar diante e detrás da paisagem, ser dela e ser ela,
tudo simultaneamente, no constante deslocamento nômade,
57
estrangeiro, sobre o vazio intervalar. Sugere um trânsito entre
parede e corpo, corpo e obra, bidimensional e tridimensional.
A artista inicialmente utilizou a reprodução de uma
paisagem acadêmica que existia na casa de sua família no Rio
de Janeiro, e posteriormente criou seu trabalho em cima das
pinturas figurativas de uma artista que vende seus trabalhos
para turistas no calçadão da praia de Copacabana. Sobre estas
pinturas em tela, Lima executou se gesto ornamental, com
recortes que criavam um novo tipo de costume, que transita
entre a parede e o corpo do espectador, que pode vestir a
paisagem como máscara. As imagens criadas com pessoas
vestindo as paisagens são imagens de ateliê, e no espaço
expositivo eram exibidas apenas como pinturas, nas paredes.
Ao contrário de outros artistas e/ou estilistas que usam a
roupa como agente de interiorização, Lima se interessa pelas
exterioridades produzidas por sua obra. Em Nômades, o olhar
e a pele do corpo se contaminam com o olhar e a pele da
pintura. O espectador pode estar diante da paisagem, atrás
ou dentro dela. Como no corpo desterritorializado do ma,
condenado e libertado a estar constantemente num entre-
espaço, “os Nômades sugerem estarmos diante e estarmos
por detrás, sermos delas e sermos elas… nômades sempre
se deslocam em paisagens e são paisagem”.(p.28). A roupa, o
costume, representa o delírio da pele na poética da artista,
onde “tudo é desejo e devir, metamorfose que impede a
contenção da exterioridade em identidades fixas”. (p. 28)
Essa metamorfose é a pele-roupa, roupa como pele mutável e
não fixa, no entre-espaço entre corpo e exterior, eternamente
estrangeira de si mesma.
Em Costumes, Laura Lima criou roupas para
efetivamente serem vestidas pelos visitantes da exposição.
Em sua segunda versão, Novos Costumes, as roupas assumem
formas transparentes, enfatizando ainda mais a incorporação
da obra no corpo e a relação portador-vestimenta. As peças
58
são expostas num contexto remanescente de uma loja de
roupas, incluindo atendentes. São vestíveis porém de difícil
nomeação, pois vestem partes do corpo numa dinâmica
diferente do vocábulo tradicional (blusa, calça, saia, etc). São
peças para ombro, para o pulso, para o braço, peças difíceis
de reconhecer e que talvez possam ser vestidas em locais
diferentes do corpo.
Ao falar sobre este trabalho, Laura Lima se utiliza do
termo arquitetura para denotar não apenas um volume no
espaço, mas uma rede de relações, semelhante às reflexões
acerca de ma e arquitetura. Em sua fala ainda descreve os
Costumes como originalmente um plano bidimensional,
que ao ser dobrado, cortado e amarrado forma o “costume”,
semelhante à construção do kimono. A escolha da palavra
costume sugere uma peça que possa originar modos
diferentes de pensar e agir. Laura Lima denomina então como
arquitetura esse conjunto de novos princípios sociais, regidos
pelos verbos construir, desfazer e sobrepor. “Não estou falando
de sobreposição de peças para vestir, ou de uma fantasia para
ser usada, mas de uma arquitetura de sentidos” (p. 25).
Não é à toa que Laura Lima denominou seus vestíveis
de costumes, e que estes costumes podem ser relacionados ao
kimono. Uma roupa é a representação de uma cultura, de um
ser pertencente a uma sociedade que tem seu próprio modo de
agir e se comportar, seus próprios costumes. Rudofsky (1976)
viu a importância que o kimono tinha na vida dos japoneses,
chegando a utilizar o termo kimono mind para definir a
sociedade japonesa. Ele observa que este item de vestuário
possui um papel importante no modo com que os japoneses
habitam o espaço ao seu redor. Num país onde as casas e
cômodos são pequenos e compactos, o uso de uma roupa que
modera o tamanho dos passos tomados e dos movimentos do
corpo ajudam a harmonizar o ritmo da vida doméstica com o
espaço físico disponível. O uso do kimono, em conjunto com
59
o tipo de calçado, também resulta num modo específico de
caminhar. Para os japoneses, o modo de caminhar da mulher
que veste o kimono é objeto de contemplação, talvez por
isso também a fascinação com a vista de trás, o obi com seu
laço ornamental nas costas e especialmente a visão da nuca
feminina. O modo de caminhar da mulher (um caminhar
que aos nossos olhos é lento, restringido pela roupa e pelo
tipo de calçado) é mais atraente do que o corpo em si, e
podemos perceber um deslocamento quando uma japonesa
acostumada a vestir kimono caminha nas ruas com sapatos e
roupas ocidentais (da mesma forma que o contrário também
acontece). Diferente da roupa ocidental que busca como ideal
a perfeita anatomia do corpo na modelagem da roupa, o
kimono é uma peça plana, composta das formas geométricas
mais simples, e quando não está sendo usado é dobrado,
em retorno à sua forma bidimensional. O ato de vestir um
kimono, para um estrangeiro, é um modo de deslocamento,
forçando o corpo a um novo modo de se comportar no tempo
e no espaço, como sugere Michiko Okano (2012). Começa-se
vestindo a peça sobre os ombros, uma peça que pode vestir
diversos tipos de corpos, e no lugar de botões e fechamentos
entra o transpasse de camadas, fixo por uma faixa na cintura.
Após vestida, é preciso se acostumar com as possibilidades
que a roupa proporciona no modo de caminhar, movimentar
os braços, se abaixar e levantar, até mesmo no modo de ficar
parado, na postura. É a simples descoberta da diferença, a
experiência no corpo do outro que pode contribuir para o
autoconhecimento.
Vestir o costume, assim como qualquer roupa, é uma
forma de mediação entre o eu e o outro, interior e exterior.
Laura Lima se interessa nas exterioridades produzidas pela
relação entre corpo e roupa, relações essas possíveis através
do vazio de possibilidades, vazio intervalar, entre uma coisa e
outra. A roupa media o ser e o espaço assim como o corredor
60
das casas tradicionais japonesas cria uma zona híbrida onde
dentro e fora se fundem. Nas construções antigas japonesas
o engawa é um corredor que contorna todo o espaço da
casa, sem as paredes dos cômodos internos mas posicionado
acima do espaço interno, na mesma altura da construção.
Okano sugere que o engawa seja uma zona ambivalente de
conexão, uma zona prenhe de possibilidades e, portanto, uma
espacialidade ma.
Laura Lima afirma não se interessar pela construção
do sujeito pela experiência e pela interiorização da obra, como
seus predecessores Lygia Clark e Helio Oiticica. Seu interesse
no uso da roupa e corpo como matéria, a roupa em conjunto
com o corpo (mesmo que um corpo=carne), propõe uma
nova forma de construção de sujeito (de “costumes”), dessa
vez através das exterioridades e da pura superficialidade.
A ideia de roupa como superficialidade pode ser
relacionada à descrição de Barthes acerca das embalagens e
pacotes japoneses. O autor diz que o invólucro passa a ser o
objeto em si, e embora gratuito é considerado precioso:

a caixa brinca de signo: como invólucro, écran,


máscara, ela vale por aquilo que esconde, protege e
contudo designa (...) aquilo mesmo que ela contém
e significa é, por muito tempo, remetido para
mais tarde, como se a função do pacote não fosse
a de proteger no espaço, mas a de adiar no tempo;
é no invólucro que parece investido o trabalho da
confecção (do fazer), mas exatamente por isso
o objeto perde algo de sua existência, torna-se
miragem. (p.61)

A roupa é em si um invólucro, e como na descrição de


Barthes, é um vazio, nesse caso a ser preenchido pelo corpo. A
ampla presença e valorização de pacotes, embalagens, panos,
e bolsas tratam-se de signos vazios, um contorno dado ao
objeto. Como na frase de Paul Valéry, “o mais profundo é a
pele” (em Borges, 2008).
61
As embalagens japonesas estão próximas da ideia
de oku, que significa o fundo, oculto e secreto. Como se o
interior de todas as coisas (ou o fundo delas) fosse o vazio. A
cidade de Tóquio e seu centro vazio, as embalagens compostas
de diversas camadas de papel e tecido, a antiga vestimenta
feminina da nobreza japonesa composta de doze camadas.
Entre cada camada, e entre as camadas e o conteúdo, existe
ma. Michiko Okano lembra que no Japão, tudo que tem valor
parece oculto, e que quanto mais ma é criado, mais precioso
é o conteúdo. O objeto vira uma simples miragem, uma
possibilidade oculta pelas diversas camadas do invólucro.
A roupa, além de invólucro, é um vazio, pois como na
definição de Maria Luíclia Borges (2008), vazio é potencia, é
uma possibilidade não ocupada por um corpo mas passível
de ser ocupada. Quando vestida deixa de ser possibilidade,
no entanto seu drapeado e movimento, seu estado de ser entre
corpo e espaço, permite que continue se drapeando, dobrando
e redobrando sobre a pele do corpo. Além da dobra, Borges
também se utiliza da ideia de espaço liso, “onde os pontos de
fusão ou de encontro são sempre nômades” (p. 18).
O trabalho Nômades se diferencia de outras obras de
Laura Lima que fazem uso dos vestíveis como Costumes e
Novos Costumes. As roupas não mais vestem apenas o corpo,
o vestível pode vestir outras corporeidades, como a própria
parede do museu. Essa roupa pode vestir qualquer corpo,
sua definição como roupa não se dá a partir de quem veste,
mas sim através da relação que se estabelece no espaço. A
superfície de Nômades alcança profundidade através do oku,
da “sobreposição de dobras espaciais” (Okano, 2012, p. 90)
entre dentro e fora, frente e atrás, ser paisagem e fazer parte
dela. O salto de Laura Lima para esta ampliação no conceito
de corpo pode ser analisado a partir da obra de outro artista,
Félix González-Torres. O artista cubano-americano utiliza-se
de conceitos de corpo, vazio e trânsitos em seu trabalho. Ao
62
pensar a obra de González-Torres, podemos pensar no passo
que Laura Lima tomou no corpo de sua obra com Nômades.
Muitos trabalhos do artista envolvem a participação
do público de “consumir” a obra, seja levando um pedaço dela
para casa como em Untitled (Passport #1), ou consumir se
alimentando dela, como no caso de Untitled (Portrait of Ross
in L.A.). Faz parte da obra o consumo dela mesma, o processo
de esvaziamento do espaço causado pela ação do público.
Em alguns trabalhos, o artista repõe os objetos à medida
que são consumidos, tentando manter aproximadamente
as dimensões originais, criando um movimento rítmico de
esvaziamento e preenchimento. Este é um fator de diferença
do seu trabalho com as estruturas minimalistas, por exemplo
(Tallman em Ault, 2006). É uma estrutura em estado de fluxo.
A alternância entre esvaziamento e enchimento do trabalho
pode ser correlacionada com a espacialidade ma, no modo
que o espaço vazio de possibilidades é preenchido por algo
que, em seguida, não está mais lá, como no caso dos espaços
sagrados himorogi e do ambiente da cerimônia do chá.
A temática do esvaziamento causado pelo consumo do
público também é presente na exposição curada por Hans
Ulrich Obrist da Serpentine Gallery em 1995, Take me (I’m
yours). Jens Hoffmann (2003) descreve o trabalho de Christian
Boltanski, por exemplo, que consistia de um espaço repleto de
roupas de segunda-mão, arranjadas de um modo escultural.
Essas roupas podiam ser vendidas aos visitantes a um preço
simbólico, e o público podia deixar o museu com um saco
plástico em mãos contendo parte da obra. Em consequência,
no decorrer do evento o trabalho que enchia o espaço foi
esvaziando o mesmo.
Nancy Spector (2004) produziu um texto para a
proposta curatorial de Jens Hoffmann na revista Pulgar, que se
tratava de uma exposição em palavras. Ela descreve o trabalho
que realizou organizando a exposição de Félix González-Torres
63
como talvez o mais utópico dos seus projetos. Fala da obra que
é tomada e consumida e acaba por se esvaziar completamente,
deixando apenas o próprio espaço expositivo. A partir de
González-Torres, Spector entendeu que não há razão para
temer o vazio, pois é nele mesmo que reside o significado. É
um vazio intervalar que se cria na duração temporal-espacial
da obra, que abre as possibilidades de relação entre obra e
espaço, espaço e público, público e artista. A arquitetura do
vazio baseia-se também na impermanência e no fluxo entre
vazio e cheio, construção e destruição. Os templos japoneses
são tradicionalmente reconstruídos de tempos em tempos,
em intervalos de dezenas de anos. Existe uma consciência de
que a arquitetura não é a construção em si, mas sim o todo que
compõe o fluxo de construção e reconstrução, num constante
movimento, uma arquitetura que nunca se completa. De fato,
Okano (2012) aponta que uma das técnicas de composição
utilizadas na arquitetura tradicional japonesa se chama saobi,
e determina um design que se constrói e reconstrói ao longo
do tempo, sempre observando a relação com seu contexto.
Em seu texto para uma exposição de palavras, Spector
imagina uma arquitetura que é o vazio de possibilidades, uma
arquitetura flexível que se transforma em vapor para envolver
tudo que se deseja mostrar, e passível de desaparecer, para
permitir fluxos entre cidade, cultura e paisagem.
A concepção de corpo presente na obra de González-
Torres é um desdobramento, uma ampliação do entendimento
usual do mesmo. O corpo para Félix Gonzalez-Torres é
passível de ser mais do que carne, mais do que performance,
mais do que materialidade e presença.

o corpo, nesse momento da nossa história, nesse


momento da cultura, é definido não apenas pela
carne, mas também pela lei, pelas legislações, e pela
linguagem, antes de tudo (Félix González-Torres em
Obrist, 2011, p. 116-17)

64
Torres não utiliza o corpo no sentido literal, mas seu
trabalho é seu corpo, e também tem uma corporeidade própria.
Muitas vezes a obra faz alusão ao seu próprio corpo ou ao
corpo de outra pessoa, como em Portrait of Ross in L.A., corpo
composto de um empilhado de doces a serem consumidos
pelo público. Além do corpo estar abstraído, Fuchs (em
Ault, 2006) lembra que ele também se funde com o corpo do
espectador quando este participa da obra. Os empilhamentos
do artista muitas vezes possuem inclusive as dimensões em
medida e peso similares ao corpo que o artista está retratando.
Esta noção de corporeidade vai além do corpo da moda e do
corpo-carne das artes visuais. Trata-se de um corpo abstraído,
no limiar entre uma coisa e outra, corpo como corporeidade,
uma possibilidade, algo em constante movimento e mudança.
Como o corpo que Borges (2008) descreve a partir de Artaud,
uma mistura de pele, carne e ossos, mas também de fluxos e
afectos, um corpo que afeta outros corpos e é afetado por eles
em retorno, corpo que extrapola as fronteiras da carne para
encontrar outros corpos.

Um corpo pode ser qualquer coisa, pode ser um


animal, pode ser um corpo sonoro, pode ser uma
alma ou uma ideia, pode ser um corpo linguístico,
pode ser um corpo social, uma coletividade.
(Deleuze em Borges, 2008, p. 141)

A ideia de que tudo é corpo está presente também na


teoria dos incorporais de Anne Cauquelin (2008). Em seguida
à afirmação da existência dos quatro incorporais – o lugar,
o vazio, o tempo e o exprimível – segue-se a afirmação de
que tudo é corpo, inclusive os incorporais. Eles pertencem ao
corpo e, ao mesmo tempo, estão livres dele. Como no caso
do vazio, ele faz parte do todo, do corpo, pois o todo admite
o existente e o não-existente, o que contorna12 este corpo que
é o mundo. O vazio de possibilidades que existe do lado de
fora do mundo é um corpo infinito e capaz de conter outros
65
corpos ou não. Aliás, é justamente esta capacidade que define
o vazio e o diferencia dos outros corpos.

“É chamado vazio um espaço que não contém corpo


algum, mas que é capaz de contê-lo (...) Incorporais,
o lugar e o vazio são uma mesma coisa, que é
chamada ‘vazio’ quando nenhum corpo a ocupa, e
‘lugar’ quando é ocupada por algum corpo” (p. 31)

Cauquelin lembra que na arte moderna e contemporânea


há uma demanda pelo corpo, e na arte contemporânea este
desejo tem se manifestado através do amor ao vazio, ao ato de
tratar do assunto corpo através dos incorporais e da percepção
de que tudo é corpo.
A partir deste corpo abstraído, a definição de roupa
também se expande. Artistas e estilistas podem criar roupas
que não são feitas para serem vestidas, mas sim para serem
expostas numa parede, ou penduradas sobre outro objeto, ou
envolvendo uma arquitetura. O ato de criar ou fazer o vazio
das obras de arte podem se expandir além do branco e da
ausência, pois o vazio é o espaço de possibilidades entre uma
coisa e outra, como no caso da roupa e de qualquer obra que
inclua o espaço vazio que a contém. Essas roupas não vestem
o corpo-carne mas vestem uma corporeidade, um outro tipo
de corpo. Em alguns casos esse território é híbrido, e é nesse
território que transitam os nômades de Laura Lima: do corpo
para a parede, da parede do ateliê para a parede da galeria, da
parede para a fotografia, da paisagem para o corpo, do olhar
de dentro para o olhar de fora e vice-versa.
O espaço pode ser definido como soma de paisagem
e sociedade (Santos em Okano, 2012), a relação dialética de
fluxos entre os dois. O espaço é então por definição um entre,
um vazio intervalar que se manifesta como espacialidade. A
roupa é um desses espaços-entre, que relaciona o dentro e o
fora, o eu e o outro. Sua fluidez de tecido é talvez uma metáfora
para o que caracteriza todos os espaços, a efemeridade,
66
impermanência e constante estado de mudança, a alternância
entre vazio-potência e espacialidade.

67
Notas

11. Laura Lima também fez uso da roupa no trabalho RhR. A artista
não considera RhR uma obra, mas um movimento, uma instância, onde
ela mesma não é artista nem criadora, é mais um integrante dentro
do organismo povoado de subjetividades, elementos orgânicos e não
orgânicos. Dentro do RhR, Laura Lima criou uniformes-desenhos. A
descrição de Piskur (em Lagnado, 2014) a respeito dessas roupas lembra a
fala de Issey Miyake e outros estilistas japoneses: “O uniforme-desenho foi
feito como um plano bidimensional – um tecido cortado com tesoura –,
dobrado e colado para ganhar espaço real e ser preenchido por um corpo.
O uniforme-desenho-devir tornou-se um espaço arquitetônico do corpo.”
(p. 259).

12. Em 2009 o museu 21_21 Design Sight (Tóquio) realizou junto à Issey
Miyake Foundation uma exposição intitulada The Outline: the unseen
outline of things, com objetos de design de Naoto Fukusawa fotografados
por Tamotsu Fujii, de modo a captar o contorno – e entorno – dos objetos.
Fukusawa sugere que o contorno do objeto é como o ar que o circunda,
é tudo que existe em volta: experiências, memorias, gestos, tempo,
circunstância, cultura, tecnologia, história.
68
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