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B.

Luzes de emergência se acenderão automaticamente.No


fim, foi estelivro que comprei. Procurei, procurei. Pensei,
refleti sobre como a grana está curta e eu não deveria
comprar nada. Ponderei que prefiro livro de papel, pode ser
usado, com parágrafos grifados com marca-texto amarela, mas
com aquela textura que cansa a ponta dos dedos, sabe? Que
tenha cheiro, mesmo que ruim, de mofo e não me obrigue a
achar uma posição confortável que caiba eu e meu enormelap-
top no sofá. (Não vou comprar aquele negócio pequeno de ler
livrosdigital). Luzes de emergência se acenderão
automaticamente, comprei o e-book, porque o de papel estava
mais caro.

Na metade do livro eu já não lembrava mais qual era


seu nome o título. Pesquisei tantos e tantos. Estava
precisavando de um livro legal para me ajudar a escrever.
Aquela velhaancestral e ingênua busca pela inspiração. O
tormento dos prazos e a vida que não cessa de acontecer
para que você escreva – ressaca da qualificação, eleições
presidenciais, decepção amorosa e todos os atropelos que
insistem em nos distrair. E a dívida com a escrita perdura. Commented [S1]: Dá para colocar aqui um enxerto sobre
a idéia de endividamento, acho que no post scriptum do
Então, foi com um tanto de desespero e esperança, que Deleuze, tem uns vale citação.
apostei nas páginas do pequeno livro, na expectativa de que
ele me impulsionasse novamente à escrita.

E lá pela página x, dois personagens recém-saídos do


cinema comentam sobre a frase-título do livro: Luzes de
emergência se acenderão automaticamente. Enunciado típico
daquele momento que figura na tela um pouco antes do pré
trailer, quando se quer informar sobre o risco de incêndios
na sala escura - agora escrevendo tudo isso para você
parece bobo, mas a passagem é muito boa, juro. Um deles
comenta como seria bom se isso funcionasse para a vida,
assim, de um modo mais geral, sabe? Para os momentos mais
nebulosos quando a gente tá confusa sem saber direito o que
está acontecendo ao redor. Pronto! Seria aí então, que as
luzes se acenderiam automaticamente e deflagrariam o sinal
de alerta, cuidado! E, tendo em vista o aviso prévio,
talvez ainda tivéssemos algo a fazer, a
transformar.transformar. Talvez ainda tivéssemos uma chance
de mudar as coisas. Fato é que se essa luz existisse amigo,
ela estaria acesa. Permanentemente acesa, eu diria. E não
sei se alguém deveria apagá-la. E é daí que quero começar. Commented [S2]: Linda!!!!!

Um beijo. Commented [S3]: Será que não vale quebrar página no


fim dos emails?

B.,

Já se passaram alguns dias e você não respondeu nada.


Sem cobranças, é evidente que eu não lhe disse nada que
merecesse resposta. De certo, você, ainda que distante, Commented [S4]: Que baixa auto estima é esta, mulher?
rsrsr
sabe que as luzes de emergência estão acesas por aqui faz
tempo. Talvez você tenha ido embora no exato instante em
que elas insinuaram alguma luz. E, embora, agora pareçam Commented [S5]: Eu não sei se vc faz já comum “jogo de
luz e regime de visibilidade” em algum canto da sua
mais fortes, o alerta do risco de incêndio - diferente do disserta. Mas tlvz valha a pena fazer, inclusive pq o que
comumente trabalhamos quando começamos com esta
cinema - não parece indicar a porta de saída. história de luz e sombra no rastro do Foucault na vida dos
homens infames ou mesmo com os tais vagalumes do
Penso sobre a fala (acusação?), do teu amigo, o tal Huberman é diferente disto que vc enuncia com o as luzes
de emergência.
exílio antecipado - ou podemos dizer, a tua porta de saída?
Commented [S6]: Esta imagem de incêndio pode crescer
E me pergunto como tem sido sua vida por aí, distante não?

dessas tragédias (acho tragédia um termo ruim - não que meu Commented [S7]: Tá um parêntese enormeeeee! Tira isso
do parêntese. A idéia de tragédia pode ser explorada mais
pobre dicionário de bolso seja claro em relação a isso -, lentamente, até pq esta presente nos mais variados disursos
políticos td vez q dá merda!
mas, falar em tragédia me remete à um acontecimento
inesperado,uma catástrofe acidental, o que sabemos, não é o
caso, mas vou usá-la na falta de uma palavra melhor)
sequenciais que assolam o cotidiano brasileiro, e mais
especificamente, para nós, o cotidiano carioca.Já faz um
tempo dá sua ida. Você está com saudades?
Eu estou. E adianto que usarei esses e-mails para te
contar um pouco de como as coisas andam por aqui e caso
isso se torne um diálogo enfadonho demais, me diga. Eu sigo
caminhando em busca das portas de saída, as vezes distantes
demais, as vezes trancadas por mais fechaduras do que as
chaves que trago no bolso demais. Você sabe que estou
imersa na pesquisa, correndo contra o tempo e sendo Commented [S8]: Tempo do capital, vai com a Abbês
aqui, que dá bom. Se achar que dá para inserir citação sem
atropelada por uma série de acontecimentos que sequer me quebrar a cadência do texto. Que esta ótima, aliás.
deixam respirar.

Pois bem, recentemente, o Ministério da Saúde publicou


uma Nota Técnica, você teve notícias? Nota Técnica nº
11/2019. Ah...eu poderia escrever uns dez e-mails ou cartas
para você enumerando todos os retrocessos contidos neste
recente documento.Poderia te dizer que, segundo a Nota:“Não
cabe mais a ideia que hospitais psiquiátricos devam abrigar
moradores. Porém, também não cabe mais a ideia de que tais
Serviços devam ser fechados”(REFERENCIA). Ou, da expressa
“Posição contrária à legalização das Drogas” (REFERENCIA)e
das inúmeras estratégias de tratamento que “terão como
objetivo que o paciente fique e permaneça Abstinente, livre
das drogas”(REFERENCIA). Ou ainda, lamentar junto a ti a
expansãodos Serviços Residenciais Terapêuticos que “passam
a atender até 10 moradores”(REFERENCIA) numa mesma casa. E,
por fim, eu poderia falar da inclusão da aparelhagem da
Eletroconvulsoterapia (ECT) no Sistema de Informação e
Gerenciamento de Equipamentos e Materiais do Fundo Nacional
de Saúde, afim de, ofertar “o melhor aparato terapêutico
para a população”(REFERENCIA). Commented [S9]: Tu já podia insinuar aqui os efeitos
cotidianos que estas notas geram. Não? Dar mais lastro. Se
não os adjetivos que seguem, “grave” e “cruel” perdem um
Eu sei, isso tudo é muito grave. Tão grave quanto o
pouco a força.
discurso cruel de naturalização da internação de crianças
em hospitais psiquiátricos também presente na Nota. Mas,
sabemos que ele é apenas a expressão, a corporificação
Legal da política que vem se afirmando nos últimos tempos.
Ai é que está, amigo.Se, o fio tênue da democracia foi
rompido à base de golpes parlamentares e balas de alto
calibre, nada parece restar à nós que sonhamos com uma
sociedade sem manicômios. Será?

Um beijo.

Tua amiga.

Amiga querida,

“É possível sentir saudades da pobreza, da


intolerância, da prepotência, da injustiça?”, é
Bolaño(REFERENCIA) quem pergunta, - ao ser convidado a
falar da relação exílio/literatura quando na ocasião do
simpósio Europa e América Latina: literatura, migração e
identidade realizado no ano 2000 em Viena. E, é ele mesmo
quem responde: “O trabalhador não pode nem deve sentir
nostalgia: suas mãos são sua pátria”. Contudo, ele segue
dizendo: “a solidão é capaz de gerar desejos que não
correspondem ao senso comum nem à realidade” ele segue
dizendo. Portanto, sim, sinto saudades. Commented [S10]: Sente saudades mas não nostalgia.

Distante da realidade brasileira, e de tudo isso que


você tem vivido por aí, eu agradeço pelas tuas palavras,
que me chegam em com tons de tormenta e inquietude e me
resgatam da aparente tranquilidade que por aqui, me
consome. Te leio e rio ao imaginar você saindo irada das Commented [S11]: Ser consumido pela tranqüilidade é
curioso. Penso se não devia explorar mais este paradoxal
reuniões de militância, dizendo que só conhece três ou sentimento.
quatro pessoas verdadeiramente antimanicomiais e que é um
absurdo ninguém ler Basaglia hoje em dia! Te imagino fraca, Commented [S12]: Tem um texto da Heliana que ela
narra q quando começou a dar aula a mili anos atrás achava
dizendo que nunca mais bota o pé numa reunião dessas porque um absurdo ngm ler basaglia.” Formação de psicólogo e
escola pública. Ta na internet e vale a pena ler pq a Heli é
elas te fazem mal e retornando na semana seguinte, com Hilária! rsrs
brilho nos olhos repetindo o famoso enunciado da esquerda Commented [S13]: Pelbart, diria que é fortaleza se saber
fraco e precário. que vale mais do que ostentar forca frente
de que só a luta muda a vida! Saudade. a tudo,
Teus e-mails me chegam como um pedido doce de te fazer
companhia nessa busca por portas de saída, ou talvez,
sejamos realistas, as portas possíveis sejam apenas Commented [S14]: Tentemos o impossível! risos

pequenas brechas. Primeiro, preciso dizer que é bonito ver


o modo como a tua questão te conduz através dos problemas.
Problemas que pareciam mortos, caquéticos. Daqueles que não
valem nosso debruçar. Afinal, supomos ingênuos, tanto já se
passou, se consolidou, será que ainda nos cabe fazer
perguntas em torno da consigna “por uma sociedade sem
manicômios”? E como num susto, aquilo tudo que nos parecia
findo ou arcaico demais para ser debatido, ressurge, berra. Commented [S15]: Eu sei, eu sei que se sair botando
umas citações quebra o ritmo, mas Poe uma
Meses atrás - em um antigo e-mail - você me lembrava, Ganebin/Benjamin aqui, vai. Outra relação com a história e
tals
da carta-manifesto que em 1987 inaugurava o movimento
nacional da luta antimanicomial e já deixava claro que o
manicômio é apenas a expressão de uma estrutura, presente
em diversos mecanismos desse tipo de sociedade. Este
documento - ao meu ver, um dos mais belos e radicais até
então produzidos pelo Movimento - expressa a compreensão
dos que ali estavam de que a luta por uma sociedade sem
manicômios não se reduz a extinção dos hospitais
psiquiátricos - ainda que este seja um ponto inegociável.

Neste sentido, Peter Pal Perbart (PELBART, 1990) já


nos presenteou com a afirmativa de que para que as quedas
dos muros dos hospícios sejam de fato efetivas e
transformadoras daquilo que nomeamos como “estigma da
loucura, a derrocada desses muros de concreto precisa vir
acompanhada da quebra de um olhar racionalista por séculos
impregnado em nós. Ele chamou a atenção para a ameaça do
corte sutil produzido pelo “bisturi da racionalidade
explicativa” (PELBART, 1990, p. 136), que aloca todos os Commented [S16]: Mais de 3 linhas tem que fazer o tal
do recuo... estas coisas que Babi sabe fazer rs
corpos à luz da razão.
Então, não basta abrir os portões do hospício e
convocar a loucura às ruas sem que junto a isso façamos o
eterno exercício do direito a desrazão.

De certo, que a virada de Peter é fundamental para


nós. Mas, ao que me parece, a tua questão - atenta as
invocações do presente – convoca um olhar cuidadoso àquilo
que o Manifesto de Bauru descreve como as opressões nas
fábricas, nas instituições de adolescentes, nos cárceres, a
discriminação contra negros, homossexuais, índios e
mulheres. Ou seja, aquilo tudo que fere o que estava em
pauta na década de 80/90 no Brasil - quando em ascensão o
movimento da luta antimanicomial - a democratização da
sociedade. Commented [S17]: Aqui tu entra numa onda professoaral
que to achando um pouco over. Acho que um pouco de
A relação entre luta antimanicomial e democracia, é um cotidiano pode por mais cor na narrativa. Que o
personagem apareça mais afetado com o que narra e
vínculo que apesar de fundador, nunca nos pareceu óbvio. Me enuncia. Pois ele esta a falar das afetações da amiga e das
implicações das carta de Bauru, larga uns adjetivos cá e lá,
pergunto se, se trata de um problema geracional. Não tendo, mas não aparece muito afetado, sabe? Será que dá para
entremear neste fragmento um pouco mais do cotidiano
a nossa geração, vivido os primeiros passos do movimento da dele em “exílio”??

luta antimanicomial no Brasil não enxergamos com tanta


clareza, dentro deste movimento,certas pautas presentes já
em 1987. Ou, se de fato, podemos falar de um amortecimento
de determinados debates ao longo dos anos, reduzindo a luta
por uma sociedade sem manicômios a uma luta meramente
institucional, marcada pela necessidade de criação de uma
rede de saúde mental substitutiva ao manicômio.

Certamente, não estou diminuindo a importância dessa


dimensão institucional, apenas atestando sua insuficiência.
E se, o manifesto de Bauru é explícito quanto a necessidade
de uma luta mais ampla, quanto a importância de não
isolarmos nossas pautas ou quanto a imposição de “uma
aliança com o movimento popular e a classe trabalhadora
organizada” (REFERENCIA), o percurso do movimento ao longo
dos anos deixa dúvidas quanto a real efetivação dessas
alianças. Commented [S18]: Sei La... narrar as alianças que ele tem
feito por lá, por exemplo.
Não quero, aqui, fugir ao cerne da questão, e entrar
nos meandros das escolhas do movimento da luta
antimanicomial ao longo dos últimos anos. Mas, a tua
pergunta ‘Como [hoje] é possível almejar, sonhar e lutar
por uma sociedade sem manicômios?’ao situar o presente - um
presente marcado por certa falência democrática ou pela
naturalização de um Estado de exceção - nos convoca a olhar
para esse jogo que se estabelece entre uma sociedade sem
manicômios e a pautas como a “discriminação contra negros,
homossexuais, índios e mulheres”(REFERENCIA). Ou seja,
olhar para a luta antimanicomial e a luta pela democracia
com mais calma. Vamos?

Um beijo,

B.

Olá amigo.

Que alegria tumultuada essa de receber seus e-mails.


As considerações que você fez acerca da relação entre luta
antimanicomial e democracia me atiçaram o pensamento e me
fizeram percorrer várias lembranças e bibliografias que,
aos poucos, tento ir linkando. Estávamos ainda na
graduação, quando iniciei meu primeiro estágio em saúde
mental.Era 2010 ou 2011? Você lembra? Lula ou Dilma? O
campus ainda esbanjava aquele gramado extenso onde todo
mundo matava aula. Eu estava no quarto ou quinto
período...animadíssima. Você ia fazer a prova em breve. A
gente se reunia no diretório acadêmico, lembra? Aquela sala
apertada, toda pichada, cheirando a cigarro, parecia o
lugar mais revolucionário do mundo. Eu, você e mais três
gatos pingados planejando debates, rodas de conversa, e
seminários antimanicomiais.
Tínhamos pressa, as expectativas eram boas. Sonhávamos
em nos formar e ir trabalhar no SUS, na rede de saúde
mental. Naquele tempo, ao menos para mim, não havia muita
diferença entre o trabalho e a militância. No fim, tudo se
tratava da mesma coisa - construir uma sociedade sem
manicômios - e faríamos tudo com muita alegria. Afinal,
aqueles que eu admirava, aqueles que estavam dia a dia
trabalhando nos serviços territoriais, indo aà casa das
pessoas, cuidando com afeto e tentando evitar a todo custo
as internações psiquiátricas, transmitiam certa dose de
alegria, por mais que o trabalho, muitas vezes, carregasse
em si o peso da miséria, do sofrimento e da violência.

Não digo que de minha parte não houvesse certa


romantização com aquilo tudo. Claro, eu estava empolgada
com aquele primeiro contato com “o campo”, como se costuma
dizer. Mas, a despeito disso,eu via certa alegria
transparecer em gestos cotidianos de trabalho e isso me
animava. No CAPS onde estagiei, na zona norte do Rio, entre
um atendimento e outro alguém pegava uma bola de futebol,
iniciava um jogo, outros divertiam-se com os gatos
espalhados no quintale as sextas-feiras o videokê ficava
ligado até mais tarde,fazendo a equipe esticar o expediente
por pura vontade.

De lá, eu lembro de um rapaz muito jovem que chegou ao


serviço acompanhado de sua mãe. Negro, forte e tatuado
chegava sempre com uma expressão muito invocada. A mãe,
técnica de enfermagem, cuidava de muitos e dizia não poder
mais cuidar do filho. SPT, ela dizia. Ele é SPT. Sem
possibilidades terapêuticas, concluía a respeito do filho.
Todos se espantaram com o enunciado, mas para ela, seu
filho, usuário de drogas, HIV +, já acumulava tantos
diagnósticos que só lhe restava descrença e desesperança.
Foi um dos primeiros atendimentos que participei. Em
uma sala ampla e capenga, duas trabalhadoras e eu, tão
empolgada quanto inexperiente. Do lado de dentro, a
expressão indócil do menino que nos fitava com certo
desprezo e do lado de fora, a mãe incrédula aguardava. Eu,
sem saber exatamente o que fazer, carregava uma ficha nas
mãos na pretensão de anotar tudo quanto pudesse sem perder
nenhuma informação importante. Sentada frente ao rapaz eu
assumia uma posição discreta, olhando para os lados, um
tanto perdida.

Não lembro como começou. Já faz tanto tempo. Mas, me


recordo do jeitão de carioca marrento que ele exibia. Um
jeitão que no fundo soava meio bobo (eu penso nele e canto
“esse humor é coisa de um rapaz que sem ter proteção foi se
esconder atrás da cara de vilão”). Mas, a trilha sonora
desse dia era outra, era Menino do Rio.

Não lembro mesmo como começou. Mas, em um instante, as


duas profissionais, se deram por cantar e dançar no meio do
atendimento. Faziam piadas e dançavam em torno do rapaz,
performatizando o dragão tatuado no braço, o calção corpo
aberto no espaço e o coração de eterno flerte. Em música,
dança e riso, elas pediam para Deus proteger-lhe. Fugiam a
todo e qualquer prescrito fazendo aquela ficha na minha mão
perder completamente o sentido. Não sei como terminou. Mas
ele gargalhava, e eu nunca o tinha visto sorrir.

Se me pus a lembrar disso tudo, foi a partir dos teus


apontamentos sobre democracia e luta antimanicomial. Pois,
essas lembranças, mais do que tudo, são lembranças de um
enfrentamento sutil e alegre e hoje parece mais difícil de
ser efetuado. Lembranças das expectativas que haviam em
relação ao futuro, a carreira. Expectativas que essa
falência democrática, como você nomeou, vem quebrando. Ao
contrário do que possa parecer, não pretendo afirmar nenhum
pessimismo, ressentimento ou mesmo nostalgia. Mas, é
impossível negar que de lá para cá, algo se perdeu no meio
do caminho.

Se hoje, os amigos com quem compartilhávamos os mesmos


sonhos seguem desmotivados, com poucas perspectivas em
relação aà profissão e mergulhados em uma situação
financeira precária e instável, não é à toa. O que vejo, do
lado de cá amigo, é a multiplicação veloz de práticas
empreendedoras em detrimento de práticas vinculadas ao
Estado. O que vejo, sou eu pedindo demissão, você saindo do Commented [S19]: Vai devagar com esta contraposição,
pois há praticas estatais empreendedoras
país, e um tanto de amigos demitidos. Trabalhadores
comprimidos junto ao esmagamento do Sistema Único de Saúde,
buscando alternativas possíveis.

É claro, caberia aqui um enorme desvio para pensarmos


políticas públicas, capitalismo e neoliberalismo. Não é a
minha intenção. Esta análise um tanto apressada, é apenas
para pensar sobre: o que significa, apostar em uma
sociedade sem manicômios, ou seja, apostar em uma sociedade
necessariamente democrática quando mergulhados no atual
panorama político? Ou, se quisermos ser mais específicos,
como cavar brechas antimanicomiais em meio a atual
configuração dos três níveis do poder executivo?

Pois bem, querido amigo, antes de buscar essas brechas


me parece fundamental entender melhor isso que tomamos como
equivalente à soberania popular, a democracia. Me preocupa,
cairmos em uma acepção estática da mesma ou na fantasia
ingênua de um passado recente onde o poder era distribuído
de modo equânime entre os cidadãos. Não nos aliamos a esta
ideia de poder, nem tampouco, cremos nesse passado de
glórias.

Por isso, fui até Deleuze na expectativa de clarear


essas acepções. Veja, Deleuze(REFERENCIA) está interessado
em mapear os últimos passos de Michel Foucault e o retorno
à Grécia irá ajudá-lo a compreender o terreno que
possibilitou o surgimento da filosofia. Esse terreno, que
possibilita o aparecimento da filosofia, Deleuze vai nomear
como uma “nova organização de um espaço cósmico e social em
Atenas”(REFERENCIa). Uma configuração inédita que se
contrapunha ao pensamento mágico-religioso, regido pelo
caos e pela guerra entre os deuses.

Ora, se antes a definição de toda e qualquer coisa


passava pela guerra, o que agora se coloca é uma espécie de
jogo argumentativo, uma agonística entre os homens
livres.“E o que seria a relação agonística, que não é uma
relação de guerra, que não é uma relação polêmica? Vê-se
claramente na cidade grega: é uma relação de rivalidade, é
um vínculo de rivalidade.”(REFERENCIA)Rivalidade esta que
só existe na medida em que, o que rege o novo espaço social
é a igualdade entre os homens livres, ou a ideia de
isonomia.“A localização de um espaço homogêneo cujas partes
eram todas, de certa maneira, simétricas em relação ao
centro. [...]E qual era o centro? A ágora, a famosa ágora
da cidade grega. Ou seja, o foco comum. [...] Diremos, sem
dúvida, que se trata da democracia ateniense.”(REFERENCIA)

Para Deleuze, a rivalidade ateniense está mais próxima


de um jogo retórico, um jogo argumentativo que de uma
relação de guerra. Ou seja, para defender uma ideia é
necessário argumentar. E quem pode argumentar? No caso de
Atenas, “cidadãos, homens atenienses maiores de 18 anos,
filhos de pai e mãe atenienses, excluindo-se da categoria
de cidadão as mulheres, os estrangeiros e os
escravos.”(referencia)

Está claro, portanto, que a democracia ateniense nunca


foi absoluta, e a igualdade sempre relativa. O que nos faz
crer, que desde o surgimento da democracia, a possibilidade
de jogar o jogo argumentativo só estava posta para alguns.
E o que é a afirmação democrática, senão o embate por
expandir esse jogo? O que é a luta antimanicomial, senão a
luta por expandir esse jogo?

No final dos anos 80, quando nascente o movimento da


luta antimanicomial, o terror às práticas de tortura fazia
crescer os movimentos de oposição à ditadura militar. Nesse
contexto, experiências como a 8º Conferência Nacional de
Saúde, marcam definitivamente o caráter da reforma
sanitária ao abrir, pela primeira vez, esse tipo de espaço
deliberativoa participação da sociedade civil. No campo da
luta antimanicomial, a transformação do Movimento de
Trabalhadoresem Saúde Mental/MTSM em Movimento Nacional da
Luta Antimanicomial/MNLA ganhava o mesmo sentindo de
expansão. (nota, ver mais)

Assim, podemos dizer que a entrada no jogo


argumentativo nunca foi ampla e irrestrita e mesmo nos
momentos em que “a democracia brasileira se afirmava nos
movimentos e nas ruas”(REFERENCIA) a luta sempre foi pela
ampliação deste campo.

Todavia,esse entendimento não deixa de nos fazer


experimentar as recentes modulações na política brasileira,
não deixa de lado, o enorme constrangimento democrático
experimentado desde o golpe parlamentar, o assassinato da
vereadora Marielle Franco e a eleição de um presidente
militar afeito a ditatura e as práticas de tortura.Frente a
este constrangimento ou a imersão em um verdadeiro Estado
de Exceção, eu me pergunto,qual jogo ainda é possível
jogar? Commented [S20]: Este fim de fragmento me remete ao
primeiro da disserta. Os Omi vendo o jogo no bar. Uma luta
ou uma festa. Acho que podemos aproxima-los na hora da
montagem... não seguidos do outro necessariamente, mas
mais próximos para fazer a imagem/ideia ecoar e
*** transvalorar. rs
Commented [S21]: Ahhhh, esqueci de dizer: te amo!!!!

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