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PENSAMENTO SISTEl\1ATICO

E CONCEITO DE SISTEl\1A
A

NA CIENCIA DO DIREITO

Introdução e tradução de
A. MENEZES CORDEIRO
A questão do significado da ideia de sistema para
a Ciência do Direito é dos temas mais discutidos da
metodologia jurídica. Em poucas controvérsias estão,
ainda hoje, as opiniões tão divididas. Enquanto, por
exemplo, SAUERexclama com ênfase: «Apenas o sis-
tema garante conhecimento, garante cultura. Apenas
no sistema é possível verdadeiro conhecimento, ver-
dadeiro saber» (1) e H. J. ,WOLFF diz: «A Ciência do
Direito ou é sistemática ou não existe» (2), EMGE
opina, com discrição céptica: «Um sistema é sempre
um empreendimento da razão com um conteúdo exa-
gerado» (3) ~ uma afirmação que está apenas a curta
distância da célebre frase de NIETZSCHEque caracte-
rizou a aspiração ao sistema como uma «falta na
consecução do Direito» e uma «doença no carác-
ter» (4). No que respeita, em particular, ao direito
privado, a discussão metodológica mais importante

(1) Juristische Methodenlehre (1940), p. 171.


(2) Typen im Recht und in der Rechtswissenschaft, StG
1952, p. 195 ss. (205).
(3) Einführung in die Rechtsphilosophie (1955), p. 378.
(4) Gesammelte Werke (1895-1912), voI. VIII, p. 64 e
vaI. XIV, p. 354, respectivamente. Justamente a propósito de
um princípio metodológico das ciências do espírito, BOLLNOW
enfoca a desconfiança contra o sistema; cf. Die Objektivitat der
Geisteswissenschaften und die Frage nach dem Wesen der
Wahrheit, Zeitschr. f. Philosophische Forschung 16 (1962),
p. 3 ss. (15 s.).
deste século - travada entre a «jurisprudência dos VIEHWEGfoi contraditado por DIEDERICHSEN por ter
conceitos» e a «jurisprudência dos interesses» - não conduzido uma «luta contra moinhos de vento» e um
foi mais, em última análise, do que uma controvérsia «combate aparente», visto o sistema axiomático-
sobre o sentido, a forma e os limites da formação -lógico, por ele questionado, não ser, há muito, defen-
do sistema jurídico. Mais recentemente, THEonoR dido por ninguém (7) - e, com efeito, aqui está uma
VIEHWEG,através do seu escrito sobre «Tópica e fraqueza essencial do trabalho de VIEHWEG(8). Não
Ciência do Direito» (5), renovou finalmente a discus- obstante, e na melhor das hipóteses, apenas se encon-
são e encontrou, pela sua crítica ao sistema, quer tram, na literatura, respostas parciais à questão do
assentimento enérgico, quer recusa firme. conceito de sistema, pressuposto a cada passo. Sem
Tais afinco e agudez da discussão não são, de uma clarificação desse conceito falta, à discussão do
modo algum, de admirar, pois subjazem questões cen- sistema, uma base indispensável; na sequência, vai-se
trais da Metodologia e da Filosofia do Direito. Como tentar obter, sobre o assunto, uma clareza maior.
ficaria claro, sobretudo com a discussão em torno das
teses de VIEHWEG,trata-se, afinal, dos fundamentos
da nossa disciplina, em especial do auto-entendimento
da Ciência do Direito como Ciência e da especifici-
dade do pensamento e da argumentação jurídicos.
Mais ainda: como a metodologia jurídica, em toda a
sua extensão, está numa conexão estreita com a Filo-
sofia do Direito em geral, colocamo-nos, com celeri-
dade, perante a problemática dos «valores jurídicos
mais elevados» e da relação entre eles (6).
A discussão travada até hoje padece frequente-
mente da inexistência de clareza quanto ao seu
objecto, - o conceito de sistema - seja no campo
terminológico, seja no material. Assim por exemplo,

(5) 1."ed., 1953,actualmente na 2." ed., 1965. (A ed. mais


recente, a 5.", data de 1974-nota do tradutor). (7) Topisches und systematisches Denken in der Juris-
(6) Cf., com mais pormenores, infra §§ 1 II 2, 4- IV 3, prudenz, NJW 1966, p. 697 S8. (700).
5 lI, 6 I 4 b e 7 lI. (8) Cf., com mais pormenores, infra § 7 e, aí, a nota 64.
§ 1.° A FUNÇÃO DA IDEIA DE SISTEMA
NA CIÊNCIA DO DIREITO

A elaboração de considerações mais pormenoriza-


das sobre o conceito de sistema jurídico pressupõe, .
para já, que se clarifiquem dois pontos: em primeir]
lugar, o do conceito geral ou filosófico de sistema e,
em segundo, o da tarefa particular que· ele pode
desempenhar na Ciência do Direito (1).

1-AS QUALIDADES DA ORDEM E DA UNIDADE COMO


CARACTERiSTICAS DO CONCEITO GERAL DE SiSTEMA

Sobre o conceito geral de sistema deveria domi-


nar - com múltiplas divergências em aspectos
específicos - no fundamental, uma concordância
extensa (2): é ainda determinante a definição clássica

(1) Para a justificação deste procedimento na formação


de conceitos, cf. CANARIS, Die Feststellung von Lücken im
Gesetz (1964), p. 15 S., onde foi utilizado o mesmo caminho
para a determinação do conceito de lacuna.
(2) RITSCHL, System und systematische Methode in der
Geschichte des wissenschaftlichen Sprachgebrauchs und der
philosophischen Methodologie, 1906, dá um bom panorama
histórico sobre a evolução do termo «sistema».
t
e KANT, que caracterizou o sistema como «a unidade, grande unidade» (6), segundo STAMMLER «uma unidade
sob uma ideia, de conhecimentos variados» (3) ou, totalmente coordenada» (7), segundo BINDER, «um
também, como «um conjunto de conhecimentos orde- conjunto de conceitos jurídicos ordenado segundo
i nado segundo princípios» (4). De modo semelhante, pontos de vista unitários» (8), segundo HEGLER, «a
por exemplo, no «Dicionário dos conceitos filosófi- representação de um âmbito do saber numa estrutura
cos» de EISLER (5), define-se sistema: «1. Objectivo: significativa que se apresenta a si própria como orde-
)
um conjunto global de coisas, processos ou partes, no nação unitária e concatenada» (9), segundo STOLL um
qual o significado de cada parcela é determinado «conjunto unitário ordenado» (10) e segundo COING
pelo conjunto supra-ordenado e supra-somativo ( ... ) uma «ordenação de conhecimentos segundo um ponto
2. Lógico: uma multiplicidade de conhecimentos, uni- de vista unitário» (11).
ficada e prosseguida através de um princípio, para
um conhecimento conjunto ou para uma estrutura
(6) System des heutigen rõmischen Rechts, vaI. I (1840),
explicativa agrupada em si e unificada em termos
p. 214 (também p. XXXVI e p. 262).
interiores lógicos, como o correspondente, o mais (7) Theorie der Rechtswissenschaft, 2." ed. (1923), p. 221;
possível fiel, de um sistema real de coisas, isto é, de igual modo Lehrbuch der Rechtsphilosophie, 3." ed. 1928;
de um conjunto de relações das coisas entre si, que concordam, p. ex., BINDER, Rechtsbegriff und Rechtsidee (1915),
p. 158 s. e Philosophie des Rechts (1925), p. 922; ENGISCH, Sinn
nós procuramos, no processo científico, 'reconstruir'
und Tragweite juristischer Systematik, StG 10 (1957), p. 173 ss.
de modo aproximativo». As definições que se encon- (186).
tram na literatura jurídica correspondem-Ihe, também, (8) Philosophie des Rechts, loco cit.; de igual medo
largamente. Assim, por exemplo, segundo SAVIGNY, Rechtsbegriff und Rechtsidee, loco cito e, mais tarde, ZHR 100,
p. 34 S. e 78.
o sistema é a «concatenação interior que liga todos
(9) Zum Aufbau der Systematik des Zivilprozessrechts,
os institutos jurídicos e as regras de Direito numa em: Festgabe für Heck, Rümelin und Schmidt (1931), p. 216.
(10) Begriff und Konstruktian in der Lehre der Int~res-
(3) Cf. Kritik der reinen Vernunft, L" ed. (1781), p. 832
senjurisprudenz, Festgabe für Heck, etc. (cf. nota anterIor),
e 2." ed. (1787), p. 860, respectivamente. p.77.
(11) Geschichte und Bedeutung des Systemgedankes in
(4) Cf. Metaphysische Anfangsgründe der Naturwissen-
.schaft, 1." ed. (1786), preâmbulo, p. IV. der Rechtswissenschaft, Frankfurter Univertitatsreden Heft 17,
citado segundo COING, Zur Geschichte des Privatrechtssystems,
(5) Worterbuch der philosophischen Begriffe, 4." ed.
.(1930), voI. lU, palavra «System». (1962), p. 9; cf., também, COING, Bemerkungen zum überkomme-
nen Zivilrechtssystem, em: Festschrift für Dalle (1963), p. 25.
/ Há. ~u~s características que emergiram em todas I laridades desconexas (14), antes devendo deixá-Ias
, as defIlllçoes (12).i,J! da or~ e a da unidade; elas reconduzir-se a uns quantos princípios fundamentais.
estão, uma para com a outra, na mais estreita reÍação Deve-se, assim, distinguir sempre duas formas ou
de intercâmbio, mas são, no fundo, de separar (13). elhor, dois prismas do sistema: por um lado. o sis;.
No que respeita, em primeiro lugar, à ordenação, pre- tema de conhecimentos, que EI~ba definição
ende-se, com ela - quando se recorra a uma· o cItada, chama de «lógico» e que, na e uêncla, de
mulação muito geral, para evitar qualquer restrição mo o mais genérico, será a~elid~do de «científico» e,
precipitada - exprimir um estado de coisas intrín- ~]Jtro, o sistema dos dl;jectos d;::<Conbecjmen~o,
seco racionalmente apreensível, isto é, fundado na a propósito do qual, com razão.!.-EISLER fala de ~IS-
realidade. No que toca à unidade, verifica-se que este t~ma «objectivo» ou «real». Ambos estão, de facto
facto r modifica o que resulta já da ordenação, por em conexão estreita, devendo o primeiro ser «o cor-
não permitir uma dispersão numa multitude de .':3ingu- respondente o mais fiel possível» (15) do último, de
modo a que a elaboração científica de um objecto
não desvirtue este, falseando, com isso, a sua finali-
(12) Por vezes, aparece ainda referida a característica dade. Segue-se imediatamente daí, para a formação
da plenitude; cf., principalmente, STAMMLER, Theorie der jurídica do sistema. que esta só será possível quando
Rechtswissenschaft, loco cit., p. 221 s., em ligação com KANT: o seu objecto, isto é, o Direito, aparente tal sistema
«O conjunto... pode, na verdade, crescer interiormente (per «objectivo». Qualquer outra precisão sobre o signifi-
intus susceptionem), mas não exteriormente (per appositionem),
como um corpo animal, cujo crescimento não implica qualquer cado da «ideia de sistema» na Ciência do DireitOfl
soma, antes levando, sem modificação das proporções, à melho- sobre o correspondente conceito de sistema pressupõe:
por isso, o esclarecimento da questão sobre se e ate •
ria da força e da capacidade de cada um, face aos seus esco-
pos» (Kritik der reinen Vernunft, loco cit., pp. 833 e 861 res-
pectivamente). Esta característica não pode, em caso a;gum,
onde possui o Direito aquelas orden~ção e unidade,
indispensáveis como fundamento do SIstema. ---/
>
assistir ao sistema jurídico porque este, por força da «abertura»
do «sistema objectivo» (cf., quanto a isto, infra § 3 II), pode
sempre crescer também «per appositionem». O elemento da
«plenitude» poderia, contudo, não ser essencial ao conceito (14) Poder-se-ia, ainda aqui, falar de ordenação uma vez
geral de sistema, mas reportar-se a uma sua delimitação deter- que a conexão já representa, em particular, uma das suas for-
minada. - Quanto à exigência da «plenitude» num sistema mas, enquanto cada ordenação como tal comporta sem dúvida,
axiomático no sentido da logística cf. infra p. 26 e p. 27 S. já em si, a tendência para a unidade (cf. também a nota 13).
(13) Certo STAMMLER, ob. cit., p. 222. (15) Cf. EISLER, ob. e loc. cito
da «interpretação sistemática» (1") ou através da pes-
11- A ADEQUAÇÃO VALORATIVA E A UNIDADE INTERIOR
quisa de «princípios gerais de Direito», no campo da
DA ORDEM JURíDICA COMO FUNDAMENTOS DO SISTEMA
JURíDICO chamada analogia de Direito, colocando-se, com isso,
em consonância com as doutrinas da hermenêutica
geral; de facto, pertence a estas o chamado «cânon
o que se passa então com a ordenação interior e
com a unidade de sentido do Direito? da unidade» ou da «globalidade», segundo o qual o
intérprete deve pressupor e entender o seu objecto
como um todo em si significativo, de existência asse-
gurada (19). ..
1. Adequação e unidade como premissas teorético-
-científicas e hermenêuticas No entanto, o concluir, sem mais, pela eXistên~aJ
da unidade do Direito, a partir da natureza científica
J
Num prisma metodológico, elas pressupõem-se, da jurisprudência ou do postulado metodológico do
normalmente, como evidentes. Isso resulta, desde entendimento unitário, conduz a uma petitio principii. _
logo, de se considerar o Direito como Ciência (lG); Pois o ser a jurisprudência uma Ciência suscita, logi- .
pois, como diz COING:«Em última análise, o sistema camente, a questão prévia, inteiramente procedente,
jurídico é a tentativa de reconduzir o conjunto da de saber se a aceitação desse carácter científico não
justiça, com referência a uma forma determinada de será um erro, por inadequação do seu objecto; assim,
vida social, a uma soma de princípios racionais. os adversários do pensamento sistemático, em parte
A hipótese fundamental de toda a Ciência é a de que na sequência desse seu princípio básico, têm negado
ufua estrutura racional, acessível ao pensamento, o carácter científico da jurisprudência (Z0), reconhe-
domine o mundo material e espiritual» (l7). Por con-
sequência, também a metodologia jurídica parte, nos
(18) Cf., quanto a esse tema, infra § 5, I 1, com mais
seus postulados, da existência fundamental da uni- indicações na nota 21.
dade do Direito. Ela fá-Ia, por exemplo, com a regra (19) Cf., por último, pormenorizadamente, BETTI, Allge-
l11eineAuslegungslehre aIs Methodik der Geisteswissenschaften,
1967, p. 219 8S., com amplas indicações.
(16) A ligação inseparável entre a natureza científica do
(20) Com particulares consequências, EHRLICH, Gundle-
Direito e a ideia do sistema foi acentuada, de forma expressa gung der Soziologie des Rechts, 1913, p. 1 ss., 198 e passim;
e repetida, sobretudo, por BINDER; cf., p. ex., Philosophie des
quanto à recusa de EHRLICH da ideia de unidade da ordem
Rechts, p. 838 s., 852 e já em Der Wissenschaftscharakter der jurídica e quanto à sua crítica ao sistema, cf. Die juristische
Rechtswissenschaft, Kantstudien XXV (1921), p. 321 ss. (356). Logik, 2." ed., 1925, p. 121 ss. (em especial, p. 137) e p. 258 ss.,
(17) Zur Geschichte des Privatrechtssystems, p. 28. respectivamente.
cendo-Ihe apenas h categoria de uma espécie de «arte sobretudo e para além disso a hipótese do carácter
ou de técnica». E o mesmo acontece com as regras científico e as máximas metodológicas conclusivas
da <<interpretação sistemática», da pesquisa dos prin- remetem para o auto-entendimento dos juristas (22),
cípios gerais de Direito e do entendimento unitário o qual constitui, pelo menos, um certo indício (23)
que, como todas as máximas metodológicas, devem para a estrutura do objecto da jurisprudência, a ordem
permanecer meros postulados inalcançáveis, quando jurídica (21); caso esta estivesse em grande oposição
não encontrem no seu objecto, isto é, na ordem jurí- com os pressupostos e os postulados da metodologia,
dica, uma correspondência. o jurista ou iria sofrer, no seu trabalho prático, um
A remissão para hipóteses meto dológicas funda- permanente fracasso ou não tomaria em conta as
mentais, feita tradicionalmente pelo jurista, não é,
contudo, totalmente desprovida de valor. Pelo menos (22) Existe uma ligação estreita entre a metodologia de
ela deveria alertar os críticos do pensamento siste- uma disciplina e a fenomenologia do entendimento (por último,
mático para o facto de eles abandonarem mais do que cf., por todos, GADAMER, Wahrheit und Methode, 2." ed. 1965):
talvez parecesse à primeira vista; assim, é plenamente a fenomenologia pode retirar da metodologia conclusões essen-
duvidoso que VIEHWEG queira negar o carácter cientí- ciais sobre a forma de entendimento nessa disciplina (con-
quanto as máximas da metodologia não surjam como puros
fico da jurisprudência e que os seus seguidores o
postulados, mas antes sejam efectivamente observadas), e,
queiram acompanhar nessa consequência (21). Mas inversamente, cada metodologia deve considerar as leis essen-
ciais do entendimento humano, elaboradas pela fenomenologia,
(21) VIEHWEG caracteriza a tópica como a «técnica do quando não queira expor-se a exigências incomportáveis.
pensamento problemático» - cf. ob. cito (p. 15), e parece (2:1) Esta afirmação pode ser produzida mesmo sem um
conceber a expressão «técnica» como o oposto de «ciência» cmbrenhar na problemática gnoseológica da relação entre
(para uma oposição entre tópica e ciência depõem também as
considerações de p. 25, VII). De facto, dever-se-ia pensar que
um processo que apenas «queira dar indícios» (p. 15), que
sujeito e obJecto.
(21) Cf., a este propósito, também DIEDERICHSEN, NJW
1966, p. 695, na nota 29, o qual, entre outras coisas, objecta
l
"

«evite compromissos» (p. 23), que apoie a legitimação das contra as teses de VIEHWEGque «no mundo concreto das '
suas premissas apenas na «aceitação do interlocutof» (p. 24), realidades» aparece «a sua disciplina, ao jurista, como um
etc. etc., não poderia aspirar seriamente à natureza científica. todo significativo e não como uma mistura de questões des-
No entanto, VIEHWEG parece reconhecer, junto das ciências conexas». Esta afirmação - que, aliás, não é inatacável, na
que trabalham de modo lógico-dedutivo, um segundo tipo de sua generalidade - não assume também, naturalmente, força
Ciência (com que ele concordaria) e no qual quer situar a demonstrativa obrigatória; pois a «experiência de unidade»
Ciência do Direito, também através da afirmação da sua estru- dos juristas, como facto meramente psicológico, não afirma
tura tópica fundamental (cf., p. ex., p. 1 s., p. 53 s., p. 63 s.) I nada de definitivo sobre a estrutura da ordem jurídica, nem,
(o que seria difícil de conciliar, pelo menos com o concei~ ao contrário da metodologia, nada sobre a forma de pensa-
tradicional de Ciência). mento jurídico correcto.
exigências da metbdologia ou ainda apenas aparente- tido do conceito de sistema, e por isso a regra da ade-
mente o faria, - ora nada disto pode ser afirmado q uação valorativa, retirada do princípio da igualdade,
da Ciência do Direito actual. Não obstante, este «indí- constitui a primeira indicação decisiva para a aplica-
cio» permanece bastante inseguro, não podendo (;ão do pensamento sistemático na Ciência do
falar-se de uma verificação obrigatória da hipótese.
A ideia da ordem interior e da unidade carece, por
isso, de uma confirmação que se deve fundamentar
Direito, - o que, por exemplo, FL UME ("5), seguindo
S.AVIGN~ ("6), certeiramente exprime quando caracte-
nza o sIstema como «a consequência do Direito, inte-
J
na própria estrutura do seu objecto, portanto na essên- riormente pressuposta» ("7). _
cia do Direito. De modo semelhante, também a característica da
unidade tem a sua correspondência no Direito, embora
a ideia da «unidade da ordem jurídica» pertença ao
2. Adequação e unidade como emanações e pos- domínio seguro das considerações filosóficas ("8).
tulados da ideia de Direito

(25) Allg. Teil des Bürgerl. Rechts, 2.° vaL, 1965, p. 295
De facto, a demonstração não é difícil. A ordem e 296.
interior e a unidade do Direito são bem mais do que (26) Ob. cit., p. 292. A referência a SAVIGNY não se
pressupostos da natureza cienUfica da jurisprudência reporta contudo, como se poderia retirar das considerações
e do que postulados da metodologia; elas pertencem, de FLUME, imediatamente ao sistema, mas sim à analogia; para
antes, às mais fundamentais exigências ético-jurídicas o conceito de sistema de SAVIGNYcf. a citação supra na nota 6.
(27) Em parte semelhantes também as obras citadas
e radicam, por fim, na própria ideia de Direito. Assim, íntra, na nota 35.
a exigência de «ordem» resulta directamente do reGQ- (28) É fundamental o escrito de ENGISCH de 1935, que tem
nhecido postulado da justiça, de tratar o igual de o mesmo nome: Die Einheit der Rechtsordnung. Sobre este
modo igual e o diferente de forma diferente, de acordo infeliz e relativamente pouco discutido problema cf., do mesmo
com a medida da sua diferença: tanto o legislador autor, Einführung in das juristische Denken, 3." ed., 1964,
p. 156 ss.; EHRLICH, Die juristische Logi.k, p. 121 ss., com uma
como o juiz estão adstritos a retomar «consequente-
panorâmica histórica desenvolvida; STAMMLER, Theorie der
mente» os valores encontrados, «pensando-os, até ao Rechtswissenschaft, p. 209 ss., 211 ss.; WENGLER, Betrachtungen
fim», em todas as consequências singulares e afas- über den Zusammenhang der Rechtsnormen in der Rechtsord-
tando-os apenas justificadamente, isto é, por razões nung und die Verschiedenheit der Rechtsordnungen, em: Fest-
materiais, - ou, por outras palavras: estão adstritos schrift für Rudolf Laun, 1953, p. 719 ss.; LARENZ, Metho-
denlehre cit., p. 135, 353 5.; HANACK, Der Ausgleich
a proceder com adequação. Mas a adequação racional
divergierender Entscheidungen in der oberen Gerichtsbarkeit,
é, como foi dito, a característica da «ordem» no sen- 1962, p. 104 ss.
Também esta não é, de modo algum, apenas um te-se que a «ordem» do Direito não se dispersa numa
«postulado lógico-jurídico» (29), antes se recondu- multiplicidade de valores singulares desconexos, antes
zindo, da mesma forma, ao princípio da igualdade. se deixando reconduzir a critérios gerais relativa-
Por um lado ela constitui - nos seus, por assim dizer, mente pouco numerosos (34); e com isso fica também
componentes negativos - apenas de novo uma ema- demonstrada a efectividade da segunda característica
nação do princípio da igualdade, enquanto procura do conceito de sistema, da unidade (35).
garantir a ausência de contradições da ordem jurídica
(o que já está abrangido pela ideia de adequação (30), quência dele; o puramente individual é, na sua unicidade essen-
cial, sempre «incomparável»; ora a aplicação do princípio da
e por outro - no seu componente positivo (31) - ela igualdade pressupõe, pelo contrário, sempre uma certa abstrac-
não representa mais do que a realização da «tendência ção e generalização que tornam possível uma «comparação»;
generalizadora» da justiça (32), que exige a superação assim a tendência generalizadora da justiça tem, de facto, a
dos numerosos aspectos possivelmente relevantes no sua origem no princípio da igualdade.
caso concreto, a favor de uns poucos princípios, (34) Opõe-se-Ihe, naturalmente, a «tendência individuali-
zadora»; esta não torna impossível a formação do sistema,
abstractos e gerais (33). Através deste último, garan-
apenas lhe apondo limites; cf., quanto a isso, infra § 6 III
(29) Demasiado restrito, quanto a isso, HANACK, ob. cit., e § 7 II 2 b.
p. 107 (cf. também p. 104); trata-se, na verdade, em primeira (35) A conexão entre a ideia da adequação e sobretudo
linha, de um postulado axiológico. a da unidade do Direito e o sistema é muitas vezes salientada,
(30) Assim torna-se de novo clara a conexão estreita ainda que, com frequência, de modo incidental; para além das
existente entre a qualidade de ordem e a da unidade. citações feitas supra, notas 6 a 11, cfr. por exemplo,
(31) A qual tem sido injustamente de5curada, até hoje, na KRETSCHMAR,über die Methode der Privatrechtswissenschaft,
literatura, perante o outro elemento, o da ausência de con- 1914, p. 40 e 42 e JherJb. 67, 264 s., BAUMGARTEN,Die
Wissenschaft vom Recht und ihre Methode, 1920, Bd. I, p. 298
tradições.
(32) Quanto a esta (e quanto à sua inversa, a tendência e p. 344; SAUER, Methodenlehre, ob. cito p. 172; NAWJASKY,
individualizadora) cf., por todos, HENKEL, Recht und Indivi- Al!gemeine Rechtslehre aIs System der rechtlichen Grundbe-
dualiWt, 1958, p. 16 s., 44 S. e passim e Einführung in die griffe, 2." ed., 1948, p. 16 e 264; COING, Rechtsphilosophie,
Rechtsphilosophie, 1964, p. 345 s.; cf. também, por exemplo, ob. cit., p. 276 ss. e JZ 1951, p. 485; ESSER, Gundsatz und
SALOMON, Gundlegung zur Rechtsphilosophie, 2." ed., 1925, Norm, ob. cit., p. 227 e passim; LARENZ, Festschrift für Nikisch,
p. 147 5S.; RADBRUCH,Rechtsphilosophie, 5." ed., 1956, p. 170; 1958, p. 299 s. e Methodenlehre, ob. cit., p. 133 s.; P. SCHNEIDER,
CorNG, Grundzüge der Rechtsphilosophie, 1950, p. 114 s.; VVdDStRL 20, p. 38; RAISER, NJW 64, p. 1204; WIEACKER,
ENGISCH, Die Idee der Konkretisierung in Recht und Rechts- Privatrechtsgeschichte der Neuzeit, 2.a ed., 1967, p. 532; BETTI,
wissenschaft unserer Zeit, 1953, p. 199 ss., com outras indica- Al!. Auslegungslehre, ob. cit., p. 223 s.; ZIPPELIUS, NJW 1967,
ções; EMGE, Einführung in die Rechtsphilosophie, 1955, p. 174 S. p. 2230; MAYER-MALY, The lrish Jurist, vaI. n, part 2, 1967,
(33) Ela não se coloca, aliás, autonomamente perante o p. 375 (cf. também Festschrift für Nipperdey, 1965, Bd. I,
princípio da igualdade, antes sendo, pelo contrário, conse- p. 522).
Longe de ser uma aberração, como pretendem os dade também com frequência possam realizar-se de
críticos do pensamento sistemático, a ideia do sistema modo fragmentado (37).
jurídico justifica-se a partir de um dos mais elevados Assim se atingiu o objectivo fixado no início deste
valores do Direito, nomeadamente do princípio da parágrafo: apurar-se um fenómeno jurídico, que
justiça e das suas concretizações no princípio da constitui um ponto de contacto com um sistema no
igualdade e na tendência para a generalização (3"). sentido da linguagem filosófica; por consequência,
Acontece ainda que outro valor supremo, a segurança torna-se agora possível a tarefa de uma melhor deter-
jurídica, aponta na mesma direcção. Também ela pres- tninação do sistema jurídico. Esta pode, por seu turno,
siona, em todas as suas manifestações - seja como formar os princípios para uma mais exacta análise
determinabilidade e previsibilidade do Direito, como sobre o sentido e os limites do pensamento sistemático
estabilidade e continuidade da legislação e da juris- na Ciência do Direito e permitirá igualmente precisar
prudência ou simplesmente como praticabilidade da e testar as afirmações agora feitas, na sequência ~
aplicação do Direito - para a formação de um sis- ,stUdO (38). O papel do conceito de sistema é, no
tema, pois todos esses postulados podem ser muito entanto, como se volta a frisar, o de traduzir e reali-
melhor prosseguidos através de um Direito adequada-
( z. ar (39) a adequação valorativa e a unidade interior da
mente ordenado, dominado por poucos e alcançáveis .. ordem jurídica.
princípios, portanto um Direito ordenado em sistema,
do que por uma multiplicidade inabarcável de normas
singulares desconexas e em demasiado fácil contradi-
ção umas com as outras. Assim, o pensamento siste-
mático radica, de facto, imediatamente, na ideia de
Direito (como o conjunto dos valores jurídicos mais
elevados). Ele é, por consequência, imanente a cada
Direito positivo porque e na medida em que este ('\7) Esta fragmentação não nega a possibilidade funda-
represente uma sua concretização (numa forma his- mental do sistema; apenas torna claro que são postos certos
toricamente determinada) e não se queda, por isso, limites à sua formação plena (quanto a eles, cf. infra § 6).
('IR) As presentes considerações não são mais do que um
como mero postulado, antes sendo sempre, também,
primeiro esboço do problema do sistema que, na sequência,
pressuposição de todo o Direito e de todo o pensa- ;Iinda irá sofrer múltiplas modificações.
mento jurídico (36) e ainda que a adequação e a uni- ('\!I) Também para realizar; pois a unidade e a adequação
rrito são apenas afirmadas, mas também sempre pretendidas,
(36) Assim falou também SAVIGNY, na citação referida, portanto não apenas pressuposição, mas também um postulado
da «consequência pressuposta do Direito». «'I'. sllpra nota 36 e infra § 5, IV, 2).
Ao atribuir-se, ao conceito de sistema jurídico,
as tarefas acima caracterizadas, afastam-se, de ante-
mão, da multitude dos conceitos desenvolvidos até
hoje (1), todos aqueles que não estejam aptos a
desenvolver a adequação interna e a unidade de uma
ordem jurídica. Isso não implica necessariamente que
eles falhem sem excepção ou que não possam ser
utilizados, em nenhum domínio, para as tarefas da
Ciência do Direito; mas a distinção tem ainda um
certo valor, uma vez que a justificação de um con-
ceito de sistema que não se apoie nas considerações
realizadas no parágrafo anterior é, de antemão, limi-
tada, expondo-se ainda à objecção de poder ignorar
a essência do Direito.

Uma panorâmica encontra-se, por exemplo, em


(1)
){i\DllRUCH,Zur Systematik der Verbrechenslehre, em: Frank-
. Festgabe I, 1930, p. 158 ss.; ENGISCH, Stud. Gen. 10 (1957),
p.l77 SS.
I- CONCEiTOS DE SISTEMA QUE NÃO SE JUSTIFICAM
A PARTIR DAS IDEIAS DA ADEQUAÇÃO VALORATIVA E
DA UNIDADE INTERNA DA ORDEM JURíDICA São também impróprios para traduzir a unidade
interior e a adequação de uma ordem jurídica, todos
os sistemas de «puros» conceitos fundamentais tal
como STAMMLER (3), KELSEN(4) ou NAWIASKY (5) os
A este propósito não releva, em primeiro lugar, o desenvolveram. Trata-se, neles, de categorias pura-
chamado sistema externo no sentido da conhecida mente formais, que subjazem a qualquer ordem jurí-
terminologia de HECK(Z) que, no essencial, se reporta dica imaginável, ao passo que a unidade valorativa
aos conceitos de ordem da lei; pois este não visa, é sempre de tipo material e só pode realizar-se numa
ou não visa em primeira linha, descobrir a unidade ordem jurídica historicamente determinada; sobre
de sentido interior do Direito, antes se destinando, na isso, porém, os sistemas de puros conceitos funda-
sua estrutura, a um agrupamento da matéria e à sua mentais, pela sua própria perspectivação, não querem
apresentação tão clara e abrangente quanto possíveL nem podem dizer nada. Não obstante, dispensa qual-
Com certeza que semelhante sistema não fica, com quer enfoque que o afinamento do instrumentarium
isso, despido de valor; pelo contrário: ele é de grande da Ciência jurídica, através do reconhecimento dos
significado para que o Direito possa ser visto no seu sempre pré-elaborados conceitos fundamentais aprio-
conjunto e, com isso, para a praticabilidade da sua rísticos, tem grande valor; no entanto, o carácter
aplicação, bem como, mediatamente, também para a puramente formal e a generalidade destes conceitos
segurança jurídica, no sentido da previsibilidade da e categorias deixam suficientemente claros os limites
decisão. Mas isto não é o «sistema do Direito», no do seu valor para a elaboração científica do Direito,
sentido de uma ordenação internamente conectada, que existe sempre, apenas, numa determinada indi-
embora possa muitas vezes, pelo menos em parte, vidualidade histórica. Assim, as questões que se
fazer esse papel. .......•.. consideram como típicas para a problemática da

(3) Cf. sobretudo, a Theorie der Rechtswissenschaft,


1." ed., 1911, 2." ed., 1923 e o Lehrbuch der Rechtsphilosophie,
:1." ed., 1928.
(1) Cf., sobretudo, a Reine Rechtslehre, 2." ed., 1960.
(2) Cf. Begriffsbildung und Interessenjurisprudenz, 1932, (õ) Cf. a Allgemeine Rechtslehre aIs System der recht-
p. 139 ss. (142 s.). lidwl1 Grundbegriffe, 2." ed., 1948.
formação do sistema jurídico - em especial, as do Direito alemã, tendo os partidários da chamada
significado do sistema para a obtenção do Direito, «jurisprudência dos conceitos» firmado como objec-
as da vinculação do legislador à ideia de sistema ou tivo a elaboração de um sistema desse tipo (8). MAX
as do manuseamento das quebras no sistema - não WEBER caracterizou o conceito de sistema em causa,
se colocam, por acaso, sempre apenas a propósito de de modo certeiro, na sua Sociologia do Direito, da
uma determinada ordem jurídica (6); e também quando
forma seguinte: «Segundo os nossos actuais hábitos
se fala de «pensamento sistemático» - porventura em
de pensamento. ela' (sic, a sistematização) traduz:
oposição ao pensamento problemático ou à tópica-
a concatenação de todas as proposições jurídicas,
não se tem em vista, habitualmente, um sistema de
puros conceitos fundamentais, mas sim o do Direito jhtidas ~r análise, de tal modo que elas formem,
positivo. ~-----.
. entre si, um sistema de regras logicamente claro, em
.--::--
si logicamente livre de contradições e, sobretudo e..
-principalmente, sem lacunas. o Que requer: que todos
os fact;; possam logicamet:lte snhsumjr-se numa das
~s normas. ou caso contrário, a sua ordem abdica
......-- . ... .. .. ""==.
d~rant~ ess.el1çial» (9). Nos bastidores desta con-
e pção· encont;a-se, manifestamente o conceito posi-
Um sistema lógico-formal (7) é igualmente inade- tivista de Ciência (10), elaborado tendo como ideais
quado para exprimir a unidade interior e a adequação a Matemática e as Ciências da natureza. Assim pode
de determinada ordem jurídica positiva. Não obstante, o filósofo WUNDT dizer que a Ciência do Direito,
este ideal dominou por longo tempo a Ciência do por força do seu processo jurídico-conceptual, é «uma-
Ciência eminentemente sistemática» e que, através
(6) Cf. também ENGISCH,ob. cit., p. 182.
(7) Para a determinação do conceito de «lógica formal», •
sobre o qual poderia haver unanimidade alargada, cf. SCHOLZ,
Abriss der Geschichte der Logik, 2." ed., 1959, p. 15. Segundo (8) Cf. por todos, a exposição de LARENZ,ob. cit., p. 17 ss.
ele, deve entender-se, como lógica formal, a parte da Ciência (9) Cf. Wírtschaft und Gesellschaft, 4." ed. (promovida por
que «formula, para a edificação de qualquer Ciência, as regras JOHANNESWINCKELMANN),1956, 2.° tomo, p. 396 (os itálicos
de conclusão e que, do mesmo modo, fornece tudo o que é pertencem ao texto) - MAXWEBERcoloca-se aliás, em posição
necessário para a exacta formulação dessas regras». Sobre inteiramente crítica a esse tipo de Ciência do Direito; cf.,
outros tipos de lógica e sobre a questão de saber se se pode sobretudo, p. 493 e p. 506 s.
falar, com sentido, de uma lógica não formal, cf. SCHOLZ, (10) Para essa influência na Ciência do Direito ci., em
ob. cit., p. 1 e p. 5, respectivamente. geral, LARENZ,Methodenlehre, p. 34 ss.
----
\
30

do seu ({carActerestritamente lógico» cla é «em cert. í diferente de modo diferente, de acordo com a medida
Lmedida, comparável à Matemática» (11). ~J da diferença, pode ser acatada com os meios da
Esta concepção da essência e dos objectivos da lógica? Os valores estão, sem dúvida, fora do âmbito
Ciência do Direito pode-se hoje, sem reserva, consi- da lógica formal e, por consequência, a adequação
derar como ultrapassada. De facto, a tentativa de de vários valores entre si e a sua conexão interna
conceber o sistema de determinada ordem jurídica (12) não se deixam exprimir logicamente, mas antes, ape-
como lógico-formal ou axiomático-dedutivo está, de nas, axiológica ou teleologicamente (14). Pode, com
antemão, votada ao insucesso (13). Pois a unidade isso, colocar-se a questão difícil de saber até onde
interna de sentido do Direito, que opera para o erguer- está o Direito ligado às leis da lógica e até onde a
em sistema, não corresponde a uma derivação da ausência lógica de contradições da ordem jurídica
ideia de justiça de tipo lógico, mas antes de tipo valo- pode ser incluída, como previsão mínima, na sua uni-
rativo ou axiológico. Quem poderia seriamente pre- dade valorativa (15); mesmo quando isso seja afir-
tender que a regra de tratar o igual por igual e o mado, é indubitável que uma eventual adequação
lógico-formal das normas jurídicas singulares não
implica a unidade de sentido especificamente jurídica
(11) Cf. Logik, vaI. m, 4." ed., 1921, p. 617 (mas cf. tam~
bém p. 595 s.): já essencialmente realista a respeito da viabi-
de um ordenamento.
lidade de um sistema lógico-fomal para a Ciência do Direito, Este carácter axiológico e teleológico da ordem
SIGWART,Logik, 2.0 vaI., 2." ed., 1893, p. 736 ss. jurídica implica que, comparativamente, os critérios
(12) Os sistemas dos «puros conceitos fundamentais», lógico-formais tenham escasso significado para o
pelo contrário, por força da sua natureza puramente formal,
pensamento jurídico e para a metodologia da Ciência
poderiam satisfazer intBiramente as exigências de um sistema
lógico-formal ou axiomático·dedutivo.
do Direito (Ia). Na verdade, a Ciência do Direito, na
(13) Do mesmo modo COING, Grundzüge der Rechtsphilo-
sophie, p. 276 e Geschichte und Bedeutung des Systemgedan-
kens, p. 27; VIEHWEG,ob. cit., p. 53 SS.; ENGISCH,Stud. Gen. (14) No sentido amplo do termo, cf. infra, p. 41.
10 (1957), p. 173 ss. e 12 (1959), p. 86; ESSER, Grundsatz und (15) Cf. quanto a isso, também infra, p. 122 S.
Norm, 2." ed. (1964), p. 221; LARENZ, ob. cit., p. 134 s.; (16) Compreende-se que no domínio do tema aqui em
SIMITIS, Ratio 3 (1960), p. 76 ss.; EMGE, Philosophie der discussão só seja possível uma caracterização do nosso próprio
Rechtswissenschaft, 1961, p. 289 s.; BÃUMLIN, Staat, Recht ponto de vista, devendo desistir-se de uma discussão alarga da
und Geschichte, 1961, p. 27; PERELMANN,Justice et raison, com outras opiniões. Para o significado da lógica na Ciência
1963, p. 206 ss.; RAISER, NJW 1964, p. 1203 s.; FLUME, Allg. do Direito cf., por exemplo; ENGISCH, Logische Studien zur
Teil des Bürgl. Rechts, 2.° vaI., 1965, p. 295 s.; DIEDERICHSEN, Gesetzesanwendung, 1943 (3." ed. 1963), p. 3 ss. (em especial
NJW 1966, p. 699 s.; ZIPPELIUS, NJW 1967, p. 2230; cf. também p. 5 s. e p. 13) e Aufgaben einer Logik und Methodik des
já SIGWART,ob. cit., p. 736 ss. juristischen Denkens, Stud. Gen. 12 (1959), p. 76 SS.; KLUG,
32

~~edida em que aspire à cientificidade ou, pelo meno; esclarecido dos valores, pensando-os até ao fim e, a
à adequação racional dos seus argumentos, está evi- concluir, num último estádio, executando-os. Mas
dentemente adstrita às leis da lógica (17); contudo para estas tarefas, a lógica só assume o significado
essa ligação não é condição necessária nem suficiente de um «quadro» (Z0), enquanto o «entender» ou a
para um pensamento jurídico correcto (18); mais ainda: . «valoração» não se podem, no essencial, alcançar
os pensamentos jurídicos verdadeiramente decisivos através dela, - tão pouco como o «entender» um
ocorrem fora do âmbito da lógica formal (19). Assim outro quadro significativo do espírito como, por
sucede com o que é a essência do Direito, com o exemplo, uma obra artística literária ou um textC?
<fi)ncontrar as decisões de valor, com o manuseamento eológica. A hermenêutica como doutrina do entendiD
mento correcto e os critérios para a objectivação dos .
Juristische Denken, 1951, p. 100 ss. (também publicado em
ARSP 39, p. 324 ss.); SIMITIS,Zum Problem einer juristischen
Logik, Ratio 3 (1960), p. 52 ss., com outras indicações alarga-
G
valores desempenham, aliás, em vez dele, o papel
ecisivo dentro do pensamento jurídico (Z').
Tal resulta, sem excepção, de todas as formas de
-.

das; DIETERHORN, Studien zur Rolle der Logik bei der


conclusão jurídica. Assim, na chamada subsunção,
Anwendung des Gesetzes, Diss. Berlim 1962, em especial
p. 142 ss.; FIEDLER, Juristische Logik in mathematischer Sicht,
apenas a obtenção das premissas é decisiva: quando
ARSP 52 (1966), p. 93 ss. a «premissa maior» e a «premissa menor» sejam sufi-
(17) Isto deve ser vincadamente separado da adstrição cientemente concretizadas e ordenadas entre si - e
do Direito ou do legislador às leis da lógica: a problemática para isso a lógica formal não é essencial - está
resulta aqui de se tratar de proposições de dever-ser ou de concluída a tarefa própria dos juristas; a conclusão
valer, que, como tais, não são verdadeiras ou falsas, apenas
podendo ser válidas ou não válidas; perante isso, o jurista faz
final surge agora, por assim dizer, de modo automá-
afirmações (sobre o Direito) que se sujeitam ao critério do tico (22), e até este último acto, a «subsunção» (23),
verdadeiro ou falso ou do justo e injusto.
('8) Isso acentua KLUG,ob. cito de novo com razão; cf.
por exemplo o prefácio à 1.' ed., p. 2, 173. (20) Assim a sugestiva expressão de ENGISCH, Stud. Gen.
('9) A questão do peso do elemento lógico dentro do 10 (1957), p. 176, col. 1; concordando, também, SIMITIS,ob. cit.,
pensamento jurídico não é, de modo algum, de natureza p. 78, nota 134; mas cf. também KRAFT,Die Grundlagen einer
puramente psicológica e, com isso, sistematicamente desinte- wissenschaftlichen Wertlehre, 1951, p. 214 ss., 260 ss.
ressante (mas cf. KLUG,ob. cit., p. 12, para o problema da (21) Cf., quanto a isso, também infra § 2 II 1 e § 7 II 1.
«sobrevalorização» dos conceitos e das construções), antes (22) Não apenas psicológica, mas também metodologica-
tendo eminente significado teorético e científico; da sua res- mente falando; cf. também supra nota 19.
posta dependem as especialidades da metodologia jurídica, (23) Quanto à questão de se é de reter o conceito mais
assim como a posição específica da Ciência do Direito no lato de subsunção, aqui utilizado, ou antes o que se limita a
círculo das Ciências. um puro processo lógico-formal cf., por um lado, ENGISCH,
34

(~ãO é, de modo algum, apenas de tipo lógico-formal, o mesmo sucede, em medida ainda mais forte,
I antes surgindo, numa parte essencial, ainda que fre- para os restantes «processos de conclusão» jurídicos,
'-..quentemente não explícita, numa ordenação valora- como a analogia, a redução teleológica, o argumentum
tiva (24). Por conseguinte, não aparecem praticamente, e contrario, o argumentum a fortiori e o argumentum
na Ciência do Direito, complicadas cadeias lógicas de ad absurdum. Na verdade, KLUG representou estes
derivação (24a). E por conseguinte também, todas as processos de argumentação recorrendo aos meios da
conclusões lógicas pretensamente adstringentes dei- lógica moderna (25), mas é duvidoso que, com isso,
xam-se muito facílmente desmascarar como lógica se tenha ganho algo de essencial para o trabalho
aparente, porque o erro reside nas premissas e a jurídico. De facto, o elemento decisivo de todos estes
lógica se comporta, perante elas, de modo neutro. ocessos não é, sem excepção, de natureza lógica
Assim, para recorrer a dois conhecidos exemplos, não mas antes de natureza teleológica ou axiológica,
é de modo algum lógico que um contrato nulo não enquanto que a sua justificação metodológica não se
possa ser impugnado ou que na aquisição a non deixa alcançar com os meios da lógica, mas sim ape-
domino pelo adquirente de boa fé o (outrora) não- nas através da sua recondução ao valor da justiça e
-titular deva adquirir o direito, em detrimento do ao princípio da igualdade, nela compreendido (posi-
(outrora) verdadeiro titular; tudo isto resulta da for- tiva ou negativamente) (26). Quando a investigação
mação da premissa maior e, sobre isso, apenas deci-
dem pontos de vista teleológicos (*). tabular do artigo 17.°/1 do Código do Registo Predial e o caso
particular do artigo 291. do Código Civil; nestes casos, joga
0

perfeitamente a afirmação feita, no texto, por CANARIS.


Einführung in das juristische Denken, 3.' ed., 1964, p. 199,
(25) Cf. ob. cit., p. 97 sS., 124 sS., 132 s.; cf., também,
nota 47, com outras citações e, por outro, LARENZ,ob. cit.,
p. 210, nota 1. SCHREIBER, Logik des Rechts, 1962, p. 47 ss., que considera
o referido processo inteiramente inadmissível para as regras
(24) Para a problemática da subsunção cf., por todos,
de conclusão, assim como, em especial para a analogia, HELLER,
ENGISCH, ob. cit., p. 54 ss. com indicações; I LARENZ,ob. cit.,
Logik und Axiologie der analogen Rechtsanwendung, 1961,
p. 210 sS.; cf., também, SIGWART, ob. cit., p. 737 S.
p. 10 sS., 24 ss. e 44 ss.
(24") Certo, VIEHWEG, ob. cit., p. 71, e passim.
(26) Para a analogia cf., por exemplo, COING,Grundzüge
(*) Nota do tradutor: no Direito alemão, tal como no
der Rechtsphilosophie, ob. cit., p. 270; LARENZ,ob. cit., p. 283,
francês mas ao contrário do português vigora, nos móveis, a
288 e 296, assim como as citações feitas em CANARIS,Die
regra «posse vale título»: a pessoa que, de boa fé, adquira
Feststellung von Lücken, ob. cit., p. 72, nota 47; para a redu-
um móvel e obtenha a sua posse, torna-se proprietária mesmo
cão teleológica, LARENZ,ob. cit., 296; para o argumentum a
quando o alienante não fosse o seu titular legítimo; assim, só
tortiOl'i e o argumentum e contrario, CANARIS, ob. cit., p. 78
é possível, em Portugal, documentar hipóteses de aquisição
e p. 45, respectivamente; para o argumentum ad absurdum,
a non domino através das regras do registo predial: a aquisição
não é diferente; em sentido próprio só se pode, com ele, signi-
de KLUG sobre a estrutura lógica da analogia termina mento doloso de um erro do comprador sobre a omis-
com a afirmação - indiscutível - de que a resposta são de um vício mas também, «do mesmo modo»,
à questão, «tão essencial na prática» (poder-se-ia bem perante a simulação de uma qualidade favorável? (*)
dizer: apenas essencial na prática) da admissibilidade Outro tanto se pode considerar para todas as outras
de determinada analogia não se obtém com os meios «fórmulas de conclusão»: quando se tenha determi-
da lógica, mas antes depende da definição do res- nado qual a ratia de uma disposição e porque razão
pectivo «círculo de semelhança», o qual só é possível ela não se «adapta» a determinado facto excepcional,
porque razão um valor «já conhecido» «respeita» a
de acordo com critérios teleológicos (27), então resulta
um caso não expressamente regulado ou porque
muito claro quão pouco a lógica formal (na sua forma
razão um facto é valorativamente tão diferente de
«clássica» ou «moderna») pode oferecer à Ciência
outro que a consequência jurídica não pode ser a
do Direito. O essencial fica resolvido assim que o
mesma (29), já se decidiu, respectivamente, estar-se
«círculo de semelhança» esteja determinado, tal como
perante uma redução teleológica, um argumentum a
ocorre na chamada subsunção (28); o resto funciona, fartiori ou uma conclusão e contrario. Tudo conduz
por assim dizer, automaticamente, por si (22). Ou que pois ao mesmo resultado: a descoberta e a afinação
problema metodológico haveria ainda que enfrentar das premissas constitui a tarefa jurídica decisiva,
quando, por exemplo, se tivesse determinado que a enquanto, pelo contrário, a formulação de conclusões
ratia legis do § 463/2 do BGB reside no aproveita- lógico-formais é de significado muito menor; nelas
nunca poderia ser incluído o «terceiro grau» da argu-
ficar que uma determinada consideração conduz ao «puro mentação jurídica, isto é a obtenção do Direito com
arbítrio» ou que ela iria levar a um resultado em crassa o auxílio de princípios jurídicos gerais, da natureza
contradição com outros valores da lei, isto é, com o princípio das coisas, etc., onde o que se disse vale, natural-
da igualdade ou, numa utilização não puramente negativa do
argumento (meramente contraditante), mas antes positiva (fun-
damentadora de um determinado resultado): que qualquer (*) Nota do tradutor: diz o § 463 do BGB:
outro que não o resultado proposto conduziria ao «puro arbí- (1) Quando, no momento da venda, falte à coisa vendida
trio» ou a uma crassa contradição de valores: também aqui uma qualidade assegurada, pode o comprador, em vez da reso-
o poder convincente seria aferido não perante o valor da ver- lução ou da redução do preço, exigir uma indemnização pelo
dade, mas sim em face do da justiça. inconveniente. (2) Vigora o mesmo regime quando o compra-
(27) Cf. ob. cit., p. 123; para o argumentum a fortiori dor tenha, dolosamente, calado um vício.
cf. p. 137 e para o argumentum ad absurdum cf. p. 138. (29) Para a limitação do argumentum e contrario a este
(28) Cf. também as críticas às considerações de KLUG caso e para a sua distinção da proibição da analogia, cf.
em li>IMITIS,ob. cit., p. 66 ss. CANARIS, ob. cit., p. 44 ss. (46 5.).
\
de KLUG sobre a estrutura lógica da analogia termina mento doloso de um erro do comprador sobre a omis-
com a afirmação - indiscutível - de que a resposta são de um vício mas também, «do mesmo modo»,
à questão, «tão essencial na prática» (poder-se-ia bem perante a simulação de uma qualidade favorável? (*)
dizer: apenas essencial na prática) da admissibilidade Outro tanto se pode considerar para todas as outras
de determinada analogia não se obtém com os meios «fórmulas de conclusão»: quando se tenha determi-
da lógica, mas antes depende da definição do res- nado qual a ratio de uma disposição e porque razão
pectivo «círculo de semelhança», o qual só é possível ela não se «adapta» a determinado facto excepcional,
de acordo com critérios teleológicos (27), então resulta porque razão um valor «já conhecido» «respeita» a
um caso não expressamente regulado ou porque
muito claro quão pouco a lógica formal (na sua forma
razão um facto é valorativamente tão diferente de
«clássica» ou «moderna») pode oferecer à Ciência
outro que a consequência jurídica não pode ser a
do Direito. O essencial fica resolvido assim que o
mesma (29), já se decidiu, respectivamente, estar-se
«círculo de semelhança» esteja determinado, tal como
perante uma redução teleológica, um argumentum a
ocorre na chamada subsunção (28); o resto funciona, fortiori ou uma conclusão e contrario. Tudo conduz
por assim dizer, automaticamente, por si (22). Ou que pois ao mesmo resultado: a descoberta e a afinação
problema metodológico haveria ainda que enfrentar das premissas constitui a tarefa jurídica decisiva,
quando, por exemplo, se tivesse determinado que a enquanto, pelo contrário, a formulação de conclusões
ratio legis do § 463/2 do BGB reside no aproveita- lógico-formais é de significado muito menor; nelas
nunca poderia ser incluído o «terceiro grau» da argu-
ficar que uma determinada consideração conduz ao «puro mentação jurídica, isto é a obtenção do Direito com
arbítrio» ou que ela iria levar a um resultado em crassa o auxílio de princípios jurídicos gerais, da natureza
contradição com outros valores da lei, isto é, com o princípio das coisas, etc., onde o que se disse vale, natural-
da igualdade ou, numa utilização não puramente negativa do
argumento (meramente contraditante), mas antes positiva (fun-
damentadora de um determinado resultado): que qualquer (*) Nota do tradutor: diz o § 463 do BGB:
outro que não o resultado proposto conduziria ao «puro arbí- (1) Quando, no momento da venda, falte à coisa vendida
trio» ou a uma craS3a contradição de valores: também aqui uma qualidade assegurada, pode o comprador, em vez da reso-
o poder convincente seria aferido não perante o valor da ver- lução ou da redução do preço, exigir uma indemnização pelo
dade, mas sim em face do da justiça. inconveniente. (2) Vigora o mesmo regime quando o compra-
(27) Cf. ob. cit., p. 123; para o argumentum a fortiori dor tenha, dolosamente, calado um vício.
cf. p. 137 e para o argumentum ad absurdum cf. p. 138. (29) Para a limitação do argumentum e contrario a este
(28) Cf. também as críticas às considerações de KLUG caso e para a sua distinção da proibição da analogia, cf.
em SIMITIS, ob. cit., p. 66 S5. CANARIS, ob. cit., p. 44 ss. (46 5.).
\

mente, em medida ainda maior. Por consequência, KLUG (32), do nosso campo (33). Mas a confecção de
hoje não mais se pode pôr em dúvida que um sistema um sistema axiomático-dedutivo do Direito aparece
lógico-formal não sirva, de alguma maneira, nem a excluída também por outras razões. Deve, designada-
essência do Direito, nem as tarefas especificas do mente, questionar-se que seja possível uma formação
jurista.
plena de axiomas, na Ciência do Direito. Para tal
formação, seria necessário, como é reconhecido, reu-
b) O sistema axiomático-dedutivo no sentido da nir pelo menos duas (34) exigências: a da ausência de
logística

A recusa de um sistema lógico-formal conduz, con- (32) Este exige a axiomatização do Direito; d. ob. cit.,
sequentemente, também à recusa de um sistema p. 172 55. (cf. também KRAFT,ob. cit., p. 263; HARLEN,ob. cit.,
p.477 55.). Poder-se-ia, a isso, objectar que KLUG vê bem os
axiomático-dedutivo (30). Este pressupõe que todas as
limites da lógica na jurisprudência e que ele acentua expres-
proposições válidas dentro de um determinado âmbito samente o significado do elemento teleológico (do, por exem-
material se deixem deduzir de axiomas, através de plo, p. 123, 137, 138 e 176 ss.); tal não seria, porém, exacto
uma dedução puramente lógico-formal (31). Porque pois KLUG pretende proscrever expressamente o elemento
isso, como acima foi dito, é inconciliável com a essên- teleológico do processo de conclusão, mantendo-o na formação
cia da Ciência do Direito, o método axiomático-dedu- das premissas, não determináveis logicamente (a esse propó-
tivo exclui-se, desde logo, contra a opinião de sito a crítica de DIEDERICHSEN,NJW 66, p. 700, nota 40, ao
ent~ndimento de RAISER da afirmação de KLUG, em minha
opinião, não procede); ele não pode, porém, ser seguido
(30) Para o sistema axiomático-dedutivo d., por tod ,
nesse ponto, por força de integração, em cada «conclusão»
HILBERT-AcKERMANN, Grundzüge der theoretischen Logik, 3." edo,
jurídica, de um elemento da ordenação valorativa.
1949, p. 31 ss. e p. 74 SS.; FRAENKEL,Einführung in die Men-
(33) Isso corresponde à opinião dominante; d. as indi-
genlehre, 3." ed., 1928, p. 268 ss. e, sobretudo, p. 334 SS.;
CARNAP,Abriss der Logistik, 1929, p. 70 s. e Einführung in cações dadas supra, nota 13.
die symbolische Logik, 1954, p. 146 ss.; uma panorâmica curta (34) Além disso, é requerida ainda, muitas vezes, a <muto-
e fácil encontra-se em BOCHENSKI,Die zeitgeni5ssischen Denk- nomia», isto é, a indedutibilidade dos axiomas uns dos outros
methoden, 1954, p. 85 s. e em POPPER, Logik der Forschu~ (d., por exemplo, HILBERT-AcKERMANN,ob. cit., p. 33 s.;
1966, p. 413. . FRAENKEL,ob. cito, p. 340 5S.). Esse postulado pode, contudo,
(31) Cf. FRAENKEL,ob. cit., p. 334 e p. 347; CARNAP, não ser considerado no presente desenvolvimento, uma vez
Symbolische Logik cit., p. 147; d., ainda, por exemplo, HARLEN, que tem a natureza de mera economia de pensamento ou é
ARSP 39 (1951) p. 478 5.; VIEHWEG,ob. cit., p. 55; ENGISCH, talvez, também de tipo estético; seria, em qualquer caso, de
Stud. Gen. 10 (1957) p. 174, cal. 1 e 12 (1959), p. 86, coI. 2; acatar na Ciência do Direito, caso, no restante, singrasse uma
KLUG, ob. cit., p. 181; BULYGIN,ARSP 53 (1957), p. 329 s. axiomatização.
contradições (35) e a da plenitude (36); ora se a viabi- porque o sistema, devendo exprimir a unidade agluti-
lidade da primeira é, desde logo, extraordinariamente nadora das normas singulares não pode, pelo que lhe
problemática, a da segunda é de recusar, sem toca, consistir apenas em normas; antes deve apoiar-se
objecções. nos valores que existam por detrás delas ou que nelas
No que respeita, em primeiro lugar, à ausência de estejam compreendidos (40) Além disso, num sistema
o

contradições, é seguro, como geralmente se reco- de normas, a ausência de contradições só se deixaria


nhece, que se deve negar uma contradição entre duas alcançar quando, para além das normas básicas, todas
normas, em todas as circunstâncias, tendo a metodo-

'
as excepções que as limitam fossem elevadas à cate-
, logia jurídica desenvolvido um instrumentarium que, goria de axiomas; ora estes podem ser tão numerosos

j~ em caso extremo através da aceitação de uma


,,' «lacuna de colisão» (37), o possibilite (38). Contudo,
, isso só funciona para verdadeiras contradições de
normas, enquanto que as contradições de valores e
que nos devemos interrogar se, na realidade, não se
trataria de uma axiomatização aparente; é, de facto,
mais do que questionável se proposições como «os
negócios são consensuais salvo quando a lei comporte
de princípios não se deixam evitar sem excepções (S9); uma prescrição de forma» ou «os contratos devem ser
por consequência, o postulado da ausência de contra- acatados, a menos que a lei conceda uma justificação
dições só se alcança num sistema de normas e não, ou uma excepção» possam ser consideradas, propria-
também, num sistema de valores ou de princípios. mente, como axiomas ('11). Acrescente-se ainda que as
Esta objecção não deve ser tomada com ligeireza excepções muitas vezes surgem «não-escritas» e, em
(35) Cf. HILBERT-AcKERMANN, ob. cit., p. 31 So e 74 ss.;
certas circunstâncias, só podem ser obtidas atravm'
FRAENKEL, ob. cit., p. 356 ss.; CARNAP, Abriss, ob. cit., p. 70 s. da «interpretação criativa do Direito»; então torna-sD
e Symbolische Logik, p. 148 s.; LEINFELLNER, Struktur und
Aufbau wissenschaftlicher Theorien, 1965, p. 208; HÃRLEN,
ob. cito, p. 477; ENGISCH, Stud. Gen. 10 (1957), p. 174; KWG,
totalmente claro que dificuldades levanta o postulado
-
da ausência de contradições. _ -
A realização da segunda característica, da pleni-
ob. cito, p. 176; BULYGIN, ob. cit., p. 330.
('36) Cf. HILBERT-AcKERMANN,ob. cito, p. 31 e 33 ss. (35);
tude, é, no entanto, totalmente impossível (42). Sob
FRAENKEL,obo cit., p. 347 ss.; CARNAP, Abriss, ob. cit., p. 70 s. ela é de entender, segundo HILBERT-AcKERMANN (no
e Symbolische Logik, ob. cit., p. 149 (cf. também p. 147);
HÃRLEN, ob. cit., p. 477 So; ENGISCH,ob. cit., p. 330.
(37) Cf., quanto a isso, infra § 6 I 4 a. (40) Cf. infra, p. 48 S.
(38) Cf., quanto a isso, por todos, ENGLISCH, Einheit cit., (41) Cf. também ENGISCH, Stud. Gen. 10 (1957), p. 176.
p. 46 ss. e Einführung cit., p. 158 S. (42) A crítica à possibilidade de um sistema jurídico
(39) Cf., quanto a isso, infra § 6 l, em especial po 119 S8., nxiomático-dedutivo não tem ponderado suficientemente, na
126 ss. e 130 s.
minha opinião, esta característica.
mínimo) (43), «que todas as formas correctas, dentro poucas proposições novas, mesmo quando se incluam
do âmbito a caracterizar, se deixam retirar do sistema as «premissas maiores», concretas antes elaboradas
de axiomas» (41). Aceitando-se, com isto, que nenhu- para a solução de um determinado caso concreto (47).
mas proposições com conteúdo material autónomo pos- Talvez ainda se possa reconduzir esta objecção a
sam ser introduzidas fora dos axiomas, antes devendo uma questão de terminologia; há, no entanto, uma
resultar todos os «teoremas» de puras operações segunda objecção procedente. Se, conforme o reque-
lógico-formais (45), então, em consequência, o postu- rido, todas as proposições de uma ordem jurídica se
lado da plenitude iria exigir, não só que as normas deixassem retirar de axiomas, então também as pro-
fundamentais de uma lei, com as suas excepções, posições jurídicas destinadas à integração de lacunas
mas também todos os preceitos (escritos e não escri- se deveriam compreender neles. Mas isso pressuporia
·fos!) devessem ser elevados à categoria de axiomas. que aquelas fossem, sem excepção, imanentes, ao
I
De facto, quase todas as disposições legais têm um Direito positivo - do qual se desenvolveram os axio-
\ conteúdo material autónomo e modificam ou concre- mas! - o que só sucede por pura casualidade, de tal
...~. tizam as decisões jurídicas fundamentais numa ou modo que se pode ter como excluído. De facto, há
/\ noutra direcção; de outro modo, elas seriam supér- um determinado tipo de lacunas, no qual a incomplei-
"\ fluas o que, mesmo em leis mal elaboradas, Só de tude da lei resulta indubitável, no campo do Direito
c\ poucas normas é possível dizer. Não há regras rígidas
.
vigente: com a simples determinação dessas lacunas,
v a propósito do número de axiomas que podem cons- não se progride um mínimo quanto às possibilidades
tituir um sistema axiomático; não obstante, tal da sua integração (48) e aí, em certas circunstâncias,
número não é, por seu turno, indiferente (46); ele o conjunto da restante ordem jurídica não compreende
deveria, em qualquer caso, ser essencialmente menor qualquer indicação para as colmatar; o exemplo clás-
do que o número dos «teoremas» dele derivados. sico é a falta de uma prescrição sobre o estatuto das
Através da combinação de proposições jurídicas sin- obrigações no Direito internacional privado. Pois a
gulares entre si, só é possível formular relativamente axiomatização do Direito pressuporia aí que, para
(43) Ainda mais estreitamente falam HILBERT-AcKERMANN todos os casos de lacunas, houvesse, na ordem jurí-
da plenitude dos axiomas «quando pela introdução no sistema
de fõrmulas básicas, de uma fõrmula até então não derivável (47) Questão contudo diferente é a de que, com auxílio
surja sempre uma contradição» (cf. ob. cit., p. 35). ' destas proposições, possa ser possível resolver um número
(44) Cf. ob. cit., p. 35.
infinito de «casos da vida».
(45) Cf. supra, na nota 31. (48) Cf. CANARIS,Die Feststellung von Lücken, ob. cit.,
(46) Cf. também ENGISCH,Stud. Gen. 12 (1959), p. 86 p. 144 ss. onde o correspondente tipo de lacuna é caracterizado
e a conversa aí relatada com KLUG. como «lacuna de ordenação» ou «de recusa do Direito».
dica, uma valºrização integrativa; ela resultaria do sões de valor necessárias se deixam formular definiti-
postulado da compleitude teleológica do Direito' ora vamente - decorre, portanto, de um pré-julgamento
não se contradita apenas, sem objecção, a teoria da tipicamente positivista (51), que hoje pode conside-
compleitude lógica; também a compleitude teleoló- rar-se como definitivamente rejeitado.
gica é pura utopia (49). Em estreita conexão com
esta crítica está, finalmente, o facto de a lei com-
preender uma porção de cláusulas gerais «carecidas
de preenchimento com valorações», tais como a boa
fé, os bons costumes, a exigibilidade, o cuidado neces-
sário no tráfego, etc. Nestas, a concretização da a) O conceito de sistema de MAX SALüMON
valoração e a formação de proposições jurídicas só
podem operar perante o caso concreto ou em face de Como que do lado oposto, surge a tentativa de
grupos de casos considerados como típicos; semelhan- conceber o sistema como uma conexão de problemas.
tes normas são, assim, de antemão, de dogmatiza- Tal foi o empreendimento de MAX SALOMON (52) e
ção inviável. Acresce ainda que a passagem de tais como essa concepção tem hoje, sem dúvida, de
cláusulas carecidas de preenchimento com valorações novo uma actualidade especial, vai, de seguida, tra-
para as demais disposições é inteiramente fluida tar-se dela mais de perto. O ponto de partida de
podendo mesmo dizer-se que todas as determinaçõe~ SALOMONfoi o objectivo de fundamentar o carácter
da lei carecem, numa ou noutra direcção, de concre- científico da jurisprudência. Mas na sua opinião só
tização valorativa. Estas complexidade e variabilidade pode ser considerado como Ciência o empreendimento
de sentido opõe-se, em última análise, sempre à dirigido a um objecto permanente (53). Nesse ponto, a
axiomatização. jurisprudência falha, enquanto se ocupa de uma deter-
A confecção de um sistema axiomático-dedutivo minada ordem jurídica histórica, - e com isso SALO-
não é, assim, possível (50) e contradiz a essência do MON, inelutavelmente fascinado pela célebre confe-
Direito. Semelhante tentativa decorre, tal como, sobre- rência de VONKIRSCHMANN sobre «A ausência de valor
tudo, as considerações sobre a necessidade da «pleni- r
tude» dos axiomas deixaram claro, da utopia de que, (51) Com isso a censura do positivismo, contra a qual!"
dentro de determinada ordem jurídica, todas as deci- KLUG, ob. cit., p. 173 s. se tinha precavido, procede inteiramente!
(52) Grundlegung zur Rechtsphilosophie, 2." ed., 1925, em
especial p. 26 S8. e 54 ss.; concordando, BURCKHARDT, Methoden
(49) Cf. CANARIS, ob. cit., p. 173. und System des Rechts, 1936, p. 131, nota 24.
(50) Bem como as citações supra, nota 13. (53) Cf. ob. cit., p. 11 SS. e 18 ss. (21).
da jurisprudência como Ciência», fica expressamente Para além disso, deve também questionar-se que
ligado (54) ao lema proferido: «Três palavras adequa- seja possível o desenvolvimento de um sistema de
das do legislâdor e bibliotecas inteiras tornam-se em problemas (59); um tal «sistema» seria, antes, uma
papel de embrulho» (55). Como saída, SALOMON vê contradição em si. Falta-lhe, necessariamente a uni-
apenas a ocupação com os problemas (permanente) e dade indispensável para o conceito de sistema, a cone-
não, pelo contrário, com as suas soluções (não per- xão interna (00). Os problemas, como tais, não são
manentes). Retira-se, assim, sem mais, o que até hoje mais do que questões isoladas, que se podem esco-
se chamava Ciência do Direito, do círculo das Ciên- lher arbitrariamente e que, por isso, para poderem
cias (50), ficando apenas, como objecto da verdadeira integrar uma relação sistemática, carecem de um ele-
Ciência do Direito, a formação do «sistema dos pro-- mento instigador de sentido e de unidade, que só pode
blemas da legislação possível» (57) . existir fora deles próprios. Assim, logo o pr:meiro
Fica claro, à primeira vista, que semelhante sis- problema imaginável- a questão das tarefas de uma
tema de problemas e das suas conexões é inadequado ordem jurídica - requer que, de certo modo, se saiba
para traduzir a unidade interior e a adequação da ou se pressuponha o que é o Direito; o perguntar sem
ordem jurídica. Pois o Direito não é um somatório ',,'qualquer pressuposição é impossível, porque a coloca-
de problemas, mas antes um somatório (58) de solu- ção de uma pergunta implica sempre, em si, um certo
ções de problemas; por isso a sua unidade de sentido ( «ponto de vista». Isto sucede em todos os graus da
também só pode ser encontrada nesses pontos de ,/ conexão de questões. Assim, a problemática da auto-
vista de base e não em questões isoladas. O conceito \ nomia privada e do negócio jurídico só se põe quando
de sistema de SALOMON também não é, por isso, capaz . a questão prévia da ordem das relações humanas
de contribuir para o esclarecimento do tema colocado tenha sido respondida em certo sentido, designada-
na presente investigação. mente a favor da criação de um Direito privado (01);
só esta resposta coloca novas questões como, por
(54) Die Wertlosigkeit der Jurisprudenz ais Wissenschaft,
exemplo, a da necessidade de forma para os actos de
1848, p. 17.
(55) Cf. ab. cit., p. 13 e p. 21. (09) Cf., quanto ao que segue, a óptima crítica de BINDER,
(56) Também é esta a opinião de SALOMON;cf., por exem- Kantstudien 25 (1921), p. 321 ss.
plo, p. 24, 54 ss., 63 e passim. (00) A opinião contrária de SALOMON,ob. cit., p. 58 ss.
(57) Cf. p. 54 ss., 67. é uma mera afirmação.
(58) Somatário não de entender-se como mera adição, (01) Cf., quanto a isso, F. V. HIPPEL, Das Problem der
mas antes como conjunção de sentido, rechtsgeschiiftlichen Privatautonomie, 1936.
autonomia privada, a do tratamento das perturbações, bilidade de escolha, sempre resultante da resposta às
como os erros, e a dos limites da autonomia privada; questões prévias; contra o carácter científico de um
só que das suas respostas surgem novas sub-questões tal empreendimento não se podem, por certo, alegar as
como, por exemplo: a partir da necessidade de princí- objecções de SALOMON (63).
pio de forma obrigatória, o problema de excepções
eventuais e a sua diferenciação plena e, aí, de novo
o do tipo de forma a observar e a sua diferenciação;
a partir da consideração de princípio dos erros, o pro-
blema da determinação dos erros relevantes, da ale- A muito discutida (64) pesquisa de FRITZ VON
gabilidade do erro e da indemnização do dano da HIPPEL sobre a construção do sistema jurídico é
confiança da contra parte; a partir da afirmação de aparentada com as ideias de SALOMON (05). Este preo-
princípio dos limites da autonomia privada, o pro-
(63) Elas também não procedem, aliás, contra uma Ciên-
blema da sua determinação, seja através de normas cia do Direito que se ocupe de uma determinada ordem jurídica,
estritas, como no § 134 BGB, seja através de regras desde que se veja o Direito legislado como uma das possíveis
flexíveis, como no § 138 BGB, cuja formulação pode soluções do problema «perpétuo» da justiça, sob as exigências
ainda, em cada caso, ser de tipo positivo ou do nega- de uma situação histórica concreta. Por isso também a afirma-
ção de VONKIRCHMANN àcerca das bibliotecas que se torna-
tivo (escolhido, e bem, pelo § 138) (G2), etc., etc. Tudo
riam papel de embrulho é improcedente; toda a história do
isto não permite contestar a impossibilidade de um Direito privado e, em especial, o surgimento do BGB, que seria
puro sistema de problemas. Possível é apenas pro- impensável sem os trabalhos preparatórios da Ciência, são a
jectar uma conexão de pergunta e resposta, de nova melhor refutação. As ideias desenvolvidas pela Ciência do
pergunta (daí emergente) e de nova resposta, etc. Direito não ficariam, de modo algum, sem valor, «através de
um risco do legislador», antes sendo, no desenvolvimento do
O objectivo de uma Ciência que não queira limitar-se
Direito (em sentido hegeliano) ou «suprimidos» ou «enrique-
a um determinado Direito positivo deveria ser a ela- cidos», como que esperando a existência «perpétua» de pos-
boração das soluções dos problemas então possíveis, síveis soluções de problemas. Que as obras que contenham
cujo número é, aliás, limitado, das subquestões daí estas ideias envelheçam, passa-se também com todos os tra-
resultantes e das possíveis subrespostas, bem como, balhos científicos; e de outra maneira todo o progresso
científico seria impensável.
a propósito das subrespostas, da limitação na possi-
(64) Cf. VIEHWEG, ob. cit., p. 66 ss.; EssER,Grundsatz und
Norm cit., p. 5 s.; ENGISCH,Stud. Gen. 10 (1957), p. 179,
DIEDERICHSEN, NJW 1966, p. 699.
(62) Não se deve, pois, determinar que o negócio jurídico (65) Cf. Zur Gesetzmassigkeit juristischer Systembildung,
corresponde aos bons costumes, mas sim que ele não os 1930; citado segundo F. V. HIPPEL, Rechtstheorie und
contradiz. Rechtsdogmatik, 1964, p. 13 ss.
cupou-se em descobrir a «conexão imanente de pro- de causa; antes prossegue, no local citado (69): «Nós
blemas» necessariamente consubstanciada com o reco- podemos, daqui em diante, ordenar a massa de conhe-
nhecimento da autonomia privada e desenvolveu, com cimentos singulares jurídico-privados como respostas
base nesse exemplo, ideias gerais sobre a construção históricas a questões permanentes de uma determi-
do sistema. No âmago da sua concepção coloca-se o nada conexão de problemas ... ». VON HIPPEL também
significado daquela «conexão imanente de proble- acentua, com bastante clareza, que esta conexão de
mas»; diz ele: «conheçamo-Io e conheceremos a sis- problemas não resulta, de modo algum, a priori, mas
temática jurídico-privada» (66). Não havendo aqui um apenas na base de determinada resposta, designada-
equívoco, fica a ideia de que VON HIPPEL vê o sis- mente da decisão a favor da autonomia privada.
tema, tal como SALOMON, exclusivamente na conexão A conexão inseparável da resposta com o problema e
de problemas. Assim entendeu de facto VIEHWEG as i" da nova resposta com o novo problema é, para VON
suas explicações, tendo-as resumido do seguinte . HIPPEL, totalmente consciente. Ele també~ não ~i.sse
modo: «Com isso, tal conexão imanente de problemas
forma a procurada sistemática jurídico-privada»; a j que a conexão de problemas «forma» a slstematlCa,
sendo pois, como lhe atribui VIEHWEG, a ela idêntica,
sua especialidade está em que ela não é mais pro-
mas apenas que nós podemos «conhecer» a sistemá-
curada «do lado do Direito positivo», antes lhe «cor-
'\ tica, porque nós podemos agora ordenar as diferentes
respondendo», «manifestando-se como que uma estru-
tura de perguntas» (67). I soluções.
, Todavia, mantém-se assim uma certa impressão
Um tal «sistema» ma expor-se a todas as
discrepante, mesmo quando se tem em conta que
objecções que acima foram feitas contra SALOMON e,
na verdade, nem poderia aspirar ao nome de sistema.
É, contudo, duvidoso que VIEHWEG tenha, efectiva- ralidade com que VON HJPPEL fundamentou a ideia de sistema
devia levar VIEHWEGa duvidar da justeza da sua interpretação;
mente, entendido bem VON HIPPEL (68). De facto este
como VIEHWEGe contra DIEDERICHSEN,agora também WIEACKER,
não deixa, de forma alguma, o lado da resposta, fora Privatrechtsgeschichte der Neuzeit, 2." ed., 1967, p. 597,
nota 48 (*).
«W) Deve salientar-se que ambas as proposições estão
(66) Cf. ob. cit., p. 19. ligadas por dois pontos, que deixam clara a sua estreita liga-
(67) Db. cit., p. 67. ção interior.
(68) Isso contesta DIEDERICHSEN,ob. e loc. cito De facto, (*) Nota do tradutor: Traduzida em português por ANTÓ-
não basta para tanto, a mera referência à intenção de VON NIO HESPANHAe publicada pela Fundação Calouste Gulbenkian
HIPPEL de construir um sistema, pois esta poderia relacionar-se sob o título História do Direito Privado Moderno; vide, aí, a
eom um mal-entendido na ideia de sistema; no entanto a natu- p. 690-691, nota 48.
VON HIPPEL devia naturalmente salientar o aspecto não dando também, por isso, um projecto próprio de
problemático como o realmente novo da sua pesquisa.
tiistema (72). Ele apenas faz, aliás em total correspon-
Na verdade, ele disse com toda a razão: também o
dência com o título do seu trabalho, considerações
legislador, na medida em que «responda a estas ques-

t
«para a regularidade da formação do sistema jurí-
. tões, cria um Código Civil» (70); no entanto, devia-se \,
dicQ», com o que salienta a conexão imanente de pro-
ainda acrescentar: «ele apenas faz um sistema na ~\
blemas, necessariamente ligada a uma determinada
medida em que responda». Mas VON HIPPEL, não diz, I"
contudo, o que dá, a essas respostas, o sentido uni- decisão fundamental- isto é, desde já: a uma solução
tário, nem segundo que pontos de vista valorativos de problemas. É indubitáveI que aquela conexão
sobre-ordenados resolve o legislador os problemas (71), existe, merecendo, por isso, as ideias de VON HIPPEL,
inteira concordância; mas ele não chegou a dar uma
determinada concretização do conceito de sis-
(70) Ob. cit., p. 22. tema (73) - tal como se trata neste parágrafo.
(71) Na linha desta objecção, a crítica que VON HIPPEL
faz ao sistema do iluminismo não é inteiramente convincente.
Nesse projecto esteve-se sempre perante a ideia de que a uni-
dade de sistema, para a qual todo o Direito essencialmente
apontava, só se poderia obter na base de alguns princípios
ético-jurídicos pouco numerosos - e isso constitui a sua indu- À semelhança das conexões de problemas,
bitável grandeza. Que esses princípios tenham sido unilateral- enquanto tais, tão-pouco as relações da vida e a sua
mente sobrevalorizados ou que, pelo menos, hoje isso assim
nos pareça - e que, por isso, eles precisem de complementação
através da aceitação, no nosso sistema, de outros princípios
fundamentais (cf., quanto a isso, sobretudo, COING, Festschrift (72) É duvidoso que ele o tenha querido; cf. o título do
für DalIe, 1963, 1.0 voI., p. 25 ss., em especial p. 29 ss.) apenas seu trabalho e, igualmente, o texto. Mas para a afirmativa a
significa que a escolha da ordenação (de forma, aliás histo- essa pergunta depõe, no entanto, o facto de ele colocar a sua
ricamente compreensível) foi feita de modo unilateral, e não, própria concepção no plano da sistemática do iluminismo e do
em caso algum, que a «regularidade da formação do sistema século XIX; cf. p. 23 e p. 36. ,
jurídico tenha sido desconhecida»; de facto, enquanto res- (73) Poder-se-ia, contudo, em ligação com, as suas :onsl-
posta ao problema fundamental da justiça, este projecto é derações, dar a definição de que o sistema serIa a soluçao de
inteiramente compreensível- em oposição à «teoria dos fac- uma conexão de problemas; manter-se-ia, porém, por um lado,
tos jurídicos», assim chamada por VON HIPPEL - a qual, de a dúvida se VON HIPPEL quis efectivamente considerar a «face
facto, menosprezou a essência da formação do sistema jurídico das respostas» no conceito de sistema e, por outro, não seria
(sem no entanto, dever ser equiparada, em globo, à «sistemá- também a definição suficiente, por lhe faltarem os elementos
tica do século XIX»; .cf., porém, VON HIPPEL, ob. cit., p. 36). essenciais do conceito: a unidade e a ordem.
ordem imanente (74) são suficientes para a construção
contra uma identificação desta ordem com a conexão
do sistema. Pois elas são apenas objecto do pireito,
específica das normas jurídicas, pois haveria aí um
sendo formadas por ele, na sua forma específica; elas
sociologismo alheio ao valor do Direito CG).
não podem, por isso, formar em si próprias a unidade
do Direito nem, também, comportá-Ia por si sós. Isso
não quer, naturalmente, dizer que elas não possam,
por seu turno, influenciar o Direito, como «natureza 6. O «sistema de decisões de conflitos» no sentido
das coisas» e, com isso, em certas circunstâncias, de HECKe da jurisprudência dos interesses
actuar no seu sistema; este, porém, com isso, ainda
não está plenamente implantado nas relações da vida.
Também não deve, evidentemente, negar-se que a Fica por investigar um último conceito de sistema:
ordenação das relações da vida tenha uma influência o de Heck e da jurisprudência dos interesses. Deriva,
essencial no sistema «externo» do Direito - pense-se como se sabe, de HECK a distinção fundamental entre
apenas no apoio de âmbitos jurídicos como do Direito o sistema «externo» e o «interno» (77). Para apurar a
de Família e das Sucessões, do Direito Comercial, do . unidade e a adequação da ordem jurídica releva, de
Trabalho ou de Autor ou dos tipos singulares do . antemão, apenas o sistema interno; pois entre as suas
Direito das obrigações em especial, nos corresponden-
. tarefas deve haver, segundo as palavras de HECK, no
tes fenómenos da vida (75)! Mas deve prevenir-se /... domínio de uma «conexão material», uma «ordem
(74) LARENZ, ob. cito atribui a HECKa opinião de que o -I. imanente» (78). Onde fica, então, este sistema <<in-
sistema interno é «logo dado nas conexões da vida» (cf. p. 57 terno», segundo a opinião de HECK?
e p. 362). De facto, encontram-se afirmações nesse sentido
(cf. p. ex. HECK,ob. cit., p. 149 s. e p. 158); no entanto,este
aspecto do entendimento do sistema de HECKrecua perante
a ideia de um «sistema de decisões de conflitos» (cf. sobre isso, (76) Um exemplo disso ê a poslçao de EHRLICH,que
o texto, infra, n.O6). Elas poderiam ser s6 o prosseguimento nega a «unidade do Direito nas suas proposições» (cf. Die
consequente das proposições sociológicas da «teoria dos inte-
juristische Logik, 2." ed., 1925, p. 137) e apenas a quer reco-
resses genéticos» (cf. infra nota 100); mas também aqui se
mostra que a jurisprudência dos interesses não se reporta a nhecer como «unidade na conexão da sociedade» (cf. p. 146).
isso, antes remetendo para o significado- não casualmente EHRLlCH deveria, consequentemente optar pelo conceito de sis-
determinado - do valor legislado. tema indicado no texto; cf. também infra, nota 100.
(75) Também aqui surge uma estreita relação, determi- (77) Cf. Begriffsbildung und Interessenjurisprudenz, 1932,
nada pela natureza das coisas, entre o sistema «externo» e o p. 139 ss. (142 s.).
«interno».
(78) Cf. ob. cit., p. 143.
juízos de valor expressos nas normas singulares, assim
a) A posição da jurisprudência dos interesses quanto como os mais altos valores do Direito, como a jus-
à ideia da unidade do Direito tiça, a equidade, etc., descurando, no entanto,,,i<O g,.ue_
fica entre. eles, os escopos fundam~n.tai.S-,_e.specif.kD.$
"""
HECK rejeita expressamente a ideia - em si evi-
dente (79) - de que os elementos da ordem imanente ..---
dãr~spectiv:.o asp~cto juri~~(;;) ou, como diríamos
hoje: os princípios gerais do Direito; e de modo
sejam visíveis nos interesses singulares (80) e caracte-
característico, ele associou-lhe a censura da falta de
riza o sistema como «sistema de decisões de confli-
formação do sistema. E também OERTMANN teceu
tos» (81). A questão, porém, de saber até onde este
críticas com palavras persuasivas, dizendo que, ape-
realiza a unidade interior e a adequação da ordem
jurídica conduz imediatamente à questão prévia de sar de todas as «considerações singulares certeiras
como se coloca a jurisprudência dos interesses perante e muitas vezes convincentes» «não se encontra
a ideia da unidade do Direito - e, com isso, a um nenhum todo» nos trabalhos da jurisprudência dos
ponto crítico nas bases filosóficas desta doutrina. interesses e que «nunca e não mais um quadro uni-
Aqui, a jurisprudência dos interesses oferece, de tário» pode ser obtido, e que ele não se pode defender
facto, aos seus adversários, pontos fracos essenciais, de «um certo sentimento de desespero científico» (84).
tendo assim a sua relação com a ideia da unidade COING, por fim, resumiu estas objecções contra a
do Direito sido sempre objecto de crítica. Já no ano
de 1914, KRETSCHMAR, no seu excelente discurso de
reitor, onde ponderou soberanamente as fraquezas e (8~) Zum Gediichtnis von Max Rümelin, Kanzlerrede
1931, p. 19.
as vantagens da jurisprudência dos conceitos como da
(84) Cf. Interesse und Begritf in der Rechtswissenschatt,
dos interesses, criticara, nesta, o abandono da ideia
1931, p. 40; cf., quanto a isso, a réplica de HECK, ob. cit.,
de unidade (82). De modo semelhante, HEGLER criticou
p. 207 ss. e 212 ss. A propósito da interpretação da carta do
jurisprudência dos interesses por ace~~ os estudante, HECK pode ter certa razão (cf. p. 216 s.), mas no
restante, a sua resposta passa, de modo muito característico,
(79) Cf. supra nota 74. ao lado da afirmação de OERTMANN;assim ele confirma a sua
(80) Cf. ob. cit., p. 150. redução do perguntar pela unidade interior à do «panorama
(81) Cf. ob. cit., p. 149 ss. geral» (p. 207 ss.) assim como o reportar das conexões gerais
(82) Über die Methode der Privatrechtswissenschaft, 1914, da ordem jurídica meramente às «necessidades da vida» (p. 214)
em especial p. 39 ss.; cf. também KRETSCHMAR, Grundfragen que na opinião representada no texto, HECK contrapunha, em
der Privatrechtsmethodik, Jher. Jb. 67 (1917), p. 233 <3S., em última análise, sem sentido, ao princípio da unidade de sentido
especial p. 271 sS., 285 s. e 291 ss. do Direito.
jurisprudência dos interesses com estas palavras: monias e de conexões multifacetadas» e"); que isso
«o Direito não é assim, para a jurisprudência dos não chega já foi acima (DO) pormenorizadamente expli-
interesses, quer lógica quer moralmente, uma ordem cado. Mas para além disso, o meio com cuja ajuda
unitária. Ele não tem qualquer unidade» (8ü) . HECK pretende captar a unidade do Direito também
Mas o que dizem os próprios partidários da juris- não é frutuoso. Ele apenas considera como adequada
prudência dos interesses a estas questões? As toma- a esse escopo a formação c1assificatória de «conceitos
das de posição são pouco numerosas, mas compreen- de grupos de generalidade sempre crescente» (91).
dem uma adesão clara à ideia da unidade do Conceitos gerais abstractos são porém, inteiramente
Direito (86). Cabe agora perguntar o que entendem inadequados para captar a unidade de sentido, sem-
eles com isso. Vêm a propósito duas afirmações de pre concreta, do Direito (92) e tornam-se totalmente
HECK. A primeira parte da equiparação entre a uni-
inutilizáveis para esse escopo quando se lhes deixe
idade .do Direito e a ausência de contradições (87); apenas a função rudimentar que HECK atribui aos
/ , este e, por certo, um elemento essencial, mas repre- seus «conceitos de grupo». Estes só devem, designa-
damente servir duas «necessidades»: por um lado,
L~en.ta apen~s, por assim dizer, o lado negativo da
eles devem «aligeirar» a «concepção» das realidades
ldela da umdade e não deixa, de forma alguma, reco-
complexas, porque o «espírito humano só pode captar,
nhecer onde está a unidade de sentido do Direito ,
em simultâneo, um número limitado de representa-
positivamente considerada (88). A segunda afirmação
ções singulares» e, por outro lado, devem «facilitar
relaciona-se com a conexão interior da ordem jurí-
a rememoração» (":1). É evidente que, perante tal
dica, procurando-a na relação das normas com «par-
«subjectivização», para não dizer «psicologização»
tes da vida que estão ligadas entre si através de har- do significado dos conceitos, que os reduzem a um
mero veículo auxiliar para as insuficiências das capa-
cidades humanas de representação e de rememoração,
(85) Cf. System, Geschichte und Interesse in der Privat-
rechtswissenschaft, JZ 1951, p. 481 ss. (484); concordando,
LARENZ, Methodenhlere cit., p. 133; essencialmente positivo o
juizo de BINDER, ZHR 100, p. 63 s. (89) Ob. cit., p. 149 s.; cf. também a referência aos
(86) Cf., por todos, STüLL, Begrift und Konstruktion in «conflitos da vida» (em vez dos critérios adequados para a sua
der Lehre der Interessenjurisprudenz, Festgabe für Heck, solução).
Rümelin und Schmidt, 1931, p. 96; HECK, ob. cit., p. 87 s. e (DO) Cf. n." 5.
p. 149 s. (Dl) Ob. cit., p. 150.
(87) Ob. cit., p. 87 s. ('2) Cf. infra p. 49.
(88) Cf., a tal propósito, supra § 1 V 2 e nota 31. (f''') Cf. ob. cit., p. 82 s.
não se considera em nada a unidade objectiva de sen- gia e restrição; ~e-lhe logo, sem comunicaçãQ.,....a
tido e de adequação do Direito. «própria valoração»dQjYL~.Jla não reconhece, pelo
Assim fica apenas uma última indicação: a refe: "'contrário,- uma' função essenCial ao terceiro «grau»
rência de HECK ao «efeito remoto» dos juízos de valor da obtenção do Direito, ao trabalho com os «esco-
legais (01), dos quais apenas haveria um passo até à pos específicos fundamentais» (97), portanto aos prin-
«pressuposta consequência interna do Direito» (05) . cipias fundamentais de um domínio 'urídico; por
Está fora de qualquer discussão que uma das contri: e rás da lex e da ratzo legis colocam-se imediata-
buições metodológicas essenciais da jurisprudência mente os mais altos valores jurídicos como a justiça,
dos interesses está na elaboração deste momento. a equidade e a segurança do Direito. E no que toca
Põe-se agora a questão de onde se encontram esses ao trabalho prático-dogmático dos representantes da
juizos de valor: só nos valores singulares do legisla- velha jurisprudência dos interesses - quem poderia
dor ou também nas camadas mais profundas do não sentir perante largas passagens (98), o mal estar
Direito? Presumivelmente responderia HECK no de OERTMANN (S4), porque, em todas as «considerações
segundo sentido (DG) e então a censura de HEGLER de singulares acertadas e muitas vezes convincentes»,
que a jurisprudência dos interesses negligencia «as não aparece qualquer «quadro de conjunto unitário»?
realidades mediadoras» procederia no essencial. Isso Não há dúvidas: a força da jurisprudência dos interes-
fica igualmente claro na sua instrumentação metodo- ses localizou-se na discussão do problema singular e
lógica como nos seus trabalhos práticos. NlJ.JlLP,ris..ma não na elaboração das «grandes concatenações» (9D),
,metodológico, a jurisprudência dos interessJ:,S__,~ó<.
-- , ",',. '<--~-~'--'-~'-'
con~~~:sen~~l, os aõ1s, pr~e!LQ~.{<gtID!~ULJ1,ª (97) Cf. HEGLER, ob. e loc. cit., nota 83.
obteriçãõdõ Direito:c>dãTriterpretação e o da analo- (98) Há, evidentemente, excepções. Pense-se apenas nos
trabalhos de MÜLLER-ERZBACH sobre a responsabilidade pelo
risco ou de STOLL sobre as perturbações na prestação, ainda
(04) Cf. ob. cit., p. 150; quanto à «efiCácia remota», hoje, em larga medida, modelares, quer metodologicamente
fundamental, HECK, Gesetzesauslegung und Interessenjurispru- quer quanto ao conteúdo.
denz, 1924, p. 230 ss. (OU) HECK, perante as críticas de OERTMANN e de HEGLER,
(05) Cf. § 1, nota 27. responde, na verdade, que colocou no seu manual de Direitos
(9G) Assim ele remete - Gesetzesauslegung cit., p. 231 s., Reais, previamente, uma parte geral; no entanto, em minha opi-
por exemplo - para o efeito remoto da igualdade no Direito nião, justamente nessa parte geral, pouco se torna claro da
Civil; no entanto, não é nenhum acaso que HECK não tenha «unidade interior de sentido» dos nossos Direitos Reais e dos
aqui escolhido nem uma valoração singular nem um princípio seus princípios fundamentais. Poder-se-ia replicar a HECK que
«intermédio»; mas antes, como o princípio da igualdade, uma não é nenhum acaso, antes se ligando estreitamente ao entendi-
das mais elevadas valorações do Direito; cf., também, o texto. mento de sistema e de unidade da jurisprudência dos interesses,
- o que aliás é plenamente compreensível, no prisma suposto para efectuar também um juízo sobre o seu
da história da metodologia, como contra-movimento conceito de sistema: é muito pouco adequado para
antitético contra os exageros da época anterior. ASSil}},.,/. exprimir a unidade interior e a adequação da ordem
dever-se-ia confirmar inteiramente o duro juízo de . jurídica. Um «sistema de decisões de conflitos» não
COING(S5) de que ele corresponde sobretudo apenas., diz praticamente nada sobre a unidade de sentido do
ao princípio sociológico fundamental da «teoria dos ! Direito, ainda quando BECK também acentue a neces-
interesses genéticos» (100). ~~.. i
sidade de destacar «as concordâncias e as diferenças
nas decisões de conflitos» (101). Assim, as ideias bási-
cas do nosso Direito privado, que formam, por exem-
b) As fraquezas do conceito de sistema da jurispru- plo, o seu sistema>-- como os princípios de auto-deter-
dência dos interesses
minação, da responsabilidade própria, da protecção da
confiança, etc. (102) não são idêntiCas às decisões de
Com estas considerações sobre a ideia da unidade conflitos: antes lhes subjazem, dando-Ihes o «sentido»
na jurisprudência dos interesses, obteve-se o pres- e sendo, aliás, mal-entendidos, na sua substância,
quando se quisesse reduzi-Ias a meras «decisões de
que os grandes manuais da parte geral do Direito Civil não pro- conflitos» (l03): ficariam privados do seu conteúdo
venham dos típicos juristas dos interesses, mas sim, desde ético-jurídico. Também na tomada de posição de
VON TUHR, passando por NIPPERDEY e até FLUME e LARENZ,
BECI\: quanto a problemas práticos e singulares do
de Cientistas do Direito cujo pensamento se estende para lá
dos relativamente estreitos limites metodológicos da jurispru- sistema se mostram quão estranha lhe é, no fundo,
dência dos interesses; na realidade, tais limites nunca se a conexão entre o sistema e a ideia da unidade de
puderam mostrar tão claros como perante as exigências da sentido do Direito. Escolha-se, por agora (104), apenas
«parte geral».
um exemplo, o das «teorias dos títulos de crédito»,
(100) Cf., quanto a isso, também supra, nota 74. Conse-
que o próprio HECK caracterizou como especialmente
quentemente, aliás, EHRLICH, Logik cit., partindo da sua posi-
ção sociológica chega ao resultado de que não existe uma típico para o seu entendimento de sistema. BECE: con-
unidade do Direito como unidade das suas normas e continua: sidera decisivo que as proposições jurídicas vigentes
«Para a interpretação histórica, a única científica - isso cor-
responde exactamente à opinião de HECK! - cada proposição
jurídica é uma individualidade, um ser autónomo, que vive a (101) Cf. ob. cit., p. 150.
sua própria vida e tem a sua própria história» (p. 137). Com (102) Cf. infra p. 47 s. e 53 SS.
estas bases, o Direito só pode ter uma unidade no facto de
(103) O que HECK também não faz; ele pura e simples-
«elas (as proposições jurídicas) só vigorarem em conexao com mente o omite.
a sociedade». (Cf. ob. cit., p. 146).
(104) Cf. mais pormenorizadamente infra, § 5 lH.
provenham das necessidades da vida, e, por isso, pr~~) sões sistemáticas incluem, em si, valores, a que haverá
tende reduzir toda a controvérsia das teorias a uma / ainda ocasião de voltar (l07).
pura «questão de formulação» ('05); daí resulta, por(' Assim, o conceito de sistema da jurisprudência
consequência «em grande medida, a possibilidade de." dos interesses não pode, tudo visto, satisfazer plena-
formulações de teor diferente mas equivalentes, isto é, { mente; por outro lado, admite-se que a crítica, por
duma equivalência de construções científicas» (106)..) causa das muitas obscuridades e ambiguidades nas
Poucos lapsos haverá maiores do que este. Na ver- tomadas de posição dos seus seguidores, não seja fácil
dade, não se trata de menos do que da defesa da e que as explicações acima efectuadas não possam
unidade de sentido do nosso Direito privado, designa- aspirar à pretensão de esclarecimento pleno desta
damente da questão de saber se o princípio do con- questão, tão interessante no que toca à história dos
trato, geralmente dominante, pode ser quebrado, com métodos (108). Para além disso, é de acentuar que a
perigo para a unidade, e a favor da possibilidade de jurisprudência dos interesses produziu um trabalho
vinculações unilaterais ou se, em vez disso, se reco- muito valioso, no próprio domínio da problemática do
sistema ('09) e que, sobretudo com a ideia de sistema
nhece, preservando a unidade, o princípio do con-
trato, o qual apenas poderia ser complementado atra-
vés do princípio da aparência jurídica, alargado aliás
(107) Cf. infra § 5 m.
por vastas áreas através da sua ligação com o princí- (108) Totalmente insatisfatório a este propósito é, infe-
pio da auto-responsabilização, igualmente incluído lizmente, o há pouco surgido trabalho de EDELMANN, Die
entre os princípios básicos. Em estreita conexão com Entwicklung der Interessenjurisprudenz, 1967; quando muito
podem-se salientar as considerações de p. 102 s. nas quais,
isto está o não-entendimento de HECK de que as deci-
contudo, o mais digno de nota é a curiosidade de EDELMANN
referir o comentário do § 242 do BGB, feito por WEBER no
STAUDINGER / Kommentar, com referência ao seu âmbito pouco
(105) Cf. Grundriss des Schuldrechts, 1929, § 137.
comum (!), como elemento para os esforços da CiênCia do
(106) Cf. ob. cit., p. 473, nota 2, com referência expressa
Direito na «construção sistemática» (ou será ironia?).
ao § 137. Pelo contrário, com razão, STOLL, ob. cit., p. 117,
('09) STOLL deveria aliás estar mais próximo do que
nota 2 (cf. também p. 110) a cujo desejo HECK, na sua réplica
HECK do entendimento de sistema hoje dominante e defendido,
(Begriffsbildung cit., p. 211) não faz justiça, porque ele per-
também, neste trabalho (cf. STOLL, ob. cit., 77 s., 96 e 100),
manece circunscrito ao erro fundamental do seu modo causal
tal como as ideias de STOLL, em muitos aspectos, foram mais
de consideração; igualmente insatisfatório é o que HECK,
avançadas do que as de HECK; não foi por isso, por acaso que
ob. cit., p. 100 ss. contrapõe contra a crítica plenamente
STOLL foi conotado com a expressão «jurisprudência das valo-
justificada de LEHMANN; cf., quanto a isso, também ínfra
rações» (cf. ob. cit., p. 67, nota 1 e p. 75, nota 5), dando,
p. 96 s.
assim, o mote metodológico à actual dogmática jurídico-civil.
«interno» e com a referência ao seu carácter teleoló- mas sim no sentido mais lato de cada realização de
gico (110), obteve pontos essenciais que cabe receber e escopos e de valores, portanto no sentido no qual a
desenvolver (111).
«jurisprudência das valorações», é equiparada à juris-
prudência «teleológica». Não se entende, porém, só
por si, que semelhante sistema teleológico seja pos-
11- O DESENVOLVIMENTO DO CONCEITO DE SISTEMA A
PARTIR DAS IDEIAS DE ADEQUAÇÃO VALORATIVA E DA
sível. Assim poderia, pelo contrário, a jurisprudência
UNIDADE INTERIOR DA ORDEM JURíDICA dos conceitos ter partido, por exemplo, de que ou
existe um sistema lógico, ou de que não há nenhum.
As considerações críticas feitas até agora facul- E não foi por acaso que a limitação de STAMMLER aos
taram também as bases para o desenvolvimento de «puros» conceitos fundamentais e a sua renúncia
um conceito de sistema que esteja apto para captar resignada à sistematização de uma determinada ordem
a adequação interior e a unidade da ordem jurídica. jurídica positiva, teve a sua base neste entendimento
do conceito de sistema (114). TambémWALTHER
BURCKHARDT distinguiu, ainda em 1936, de modo
estrito, entre a «justeza lógica» do Direito e a «justeza
ética» e limitou o sistema à extrapolação da pri-
Sendo o ordenamento, de acordo com a sua deri- meira (115). Finalmente cite-se o mais recente ULRICH
vação a partir da regra da justiça (112), de natureza
<)' Keuo que considera o significado da ideia de sistema
valorativa, assim também o sistema a ele correspon-
como uma demonstração essencial do peso do pensa-
dente só pode ser uma ordenação QxiológicQ ou teleo-
mento lógico-formal na Ciência do Direito; pois logo
lógica - na qual, aqui, teleológico não é utilizado no
/ o próprio conceito de sistema é um termo especifica-
sentido estrito da pura conexão de meios aos fins (11),

(110) Cf. HECK, ob. cit., p. 147, 155, 160 e passim (com
referência a HEGLER). (114) STAMlVILER considera o seu sistema como lógico-
(111) Para o sistema teleológico cf. igualmente infra, n 1, -formal, construído de conceitos gerais abstractos; ele recusa
no texto. expressamente a possibilidade de confeccionar um sistema de
(112) Cf. supra § II 2. determinada ordem jurídica, <dnteiramente preenchido». Cf.
(113) Também neste sentido, a expressão não foi usada Theorie der Rechtswissenschaft, 2.· ed., 1923, p. 222 ss. e
poucas vezes; d., por exemplo, BINDER, ZHR 100 p. 62 s.; Lehrbuch der .Rechtsphilosophie, 3.· ed. 1928, p. 278 ss.
ENGISCH, Einfii.hrung in das juristische Denken, p. 161 s. e (115) Cf. Methode und System des Rechts, 1936, p. 121 ss.
Stud. Gen. 10 (1957), p. 178 s. e 241 ss.
mente lógico» e «só a lógica permite determinar onde tões de terminologia, pode-se naturalmente discutir
existe, afinal, um autêntico sistema» (116).
sobre a justificação de semelhante estreiteza; como
Esta limitação do conceito de sistema ao sistema saída poder-se-ia, com COING (118), distinguir um
lógico-formal não deixa contudo de ter um certo conceito de sistema mais estrito e um mais amplo,
arbítrio (117). Tanto quanto se trate apenas de ques- sendo o mais estrito idêntico ao lógico-formal
enquanto, dentro do mais amplo, haveria ainda espaço
(116) Cf. ob. cito p. 5; cf. ainda, por exemplo SIGWART, para um sistema teleológico. Mas desde que se trate
ob. cit., p. 695: «A sistemática tem, por tarefa, o representar
de uma problemática material, a limitação do conceito
a totalidade dos conhecimentos alcançados num determinado
momento, e cujas partes estejam inteiramente conectadas atra-
de sistema ao sistema lógico-formal, é uma hipótese
vés de relações lógicas» (os itálicos pertencem ao origi- em nada justificada, para não dizer uma petitio prin-
nal), - no qual, contudo, se deve sublinhar a limitação ao cipii. Pois um sistema não representa mais do que a
sistema de conhecimentos (ao contrário dum sistema objec- tentativa de captar e traduzir a unidade e a ordena-
tivo). - Para uma equivalência entre sistema axiomático e
ção de um determinado âmbito material com meios
sistema em geral, vide ARNDT,NJW 63, p. 1277 S.
(117) De facto a possibilidade de um sistema teleológico racionais: a. recusa da possibilidade de um sistema não
é frequentemente reconhecida, sem que a sua problemática lógico-formal equivale, assim, à afirmação de que a
científico-teorética tenha sido sempre vista. Cf., por exemplo, lógica formal representa o único meio possível para
RADBRUCH, Zur Systematik der Verbrechenslehre, Frank-Fest- esse fim. Uma tal restrição no âmbito em que sejam
gabe I, 1930, p. 159; HEGLER,ob. cit., p. 216 ss.; ENGISCH,
possíveis (119) o pensamento e a argumentação racio-
Stud. tien. 10 (1957), p. 178 ss.; neste domínio, também
HECK que, a tal propósito, acentua expressamente, várias vezes,
a sua concordância com HEGLERcf. ob. cit., p. 147, 155, 160 (118) Cf. Zur Geschichte des Privatrechtssystems, p. 9.
e passim. Aí, contudo, a expressão «teleológica» é, em parte, (119) Nem sempre é claramente evidente que uma tal
usada com o sentido estrito, acima caracterizado, na nota 113. restrição corresponda, de facto à concepção dos partidários
Também em escritos não jurídicos se fala, muitas vezes, de
de um sistema lógico-formal ou axiomático-dedutivo. No
«sistemas de valores» e similares; cf., por exemplo, KRAFT, entanto, merece enfoque que KLUG, ob. cit., perante a análise
Die Grundlage eíner wíssenschaftlichen Wertlehre, 1951, lógica de problemas jurídicos, apenas contraponha a intuição
p. 21, ss., com mais indicações; STARK,Die Wissenssoziologie, (cf. prólogo de 1950). Com isso, a questão do significado da
1960, p. 59 ss., 92 ss., 114 55., 252 55. e passim (cf. no índice, lógica formal para a Ciência do Direito não fica respondida.
a palavra «Wertsystem»), onde, diferenciadamente, também o De facto, a intuição é indispensável em todas as ciências - de
termo «sistema axiológico» é empregado; cf. por exemplo, outro modo não poderia haver génios científicos e o processo
p. 93, 146 e 252; cf., a esse propósito, ainda que sem relação das Ciências seria plenamente «fabricáveb> - e, evidentemente,
expressa com a problemática do sistema, LEINFELLNER,Ein- não pode, também, o jurista, viver sem «fantasia científica»;
führung in die Erkenntnis und Wissenschaftstheorie, 1965, a questão não cai, contudo, na alternativa de lógica formal ou
p. 178 ss.
intuição, mas sim naquele «espaço entre elas», portanto na
nais deve justamente ser rejeitada, como inadmissível, possibilidade de exercer racionalmente a jurisprudên-
pelo jurista (120); porque as dificuldades próprias do cia, no seu âmbito decisivo; pois o sistema, no sentido
pensamento jurídico não se deixam transpor com os aqui entendido (tanto quanto está em discussão neste
meios da lógica formal (121), adviria, daí, uma sen- local (123)) não é, por definição, justamente mais do
tença de morte não só para a jurisprudência como que a captação racional da adequação de conexões
Ciência, mas também, em geral, para cada tentativa de valorações jurídicas.
de entender a aplicação do Direito como um pro- Deve-se, por isso, quando não se queira negar
cesso racionalmente conduzido. Como, de facto, tem radicalmente o entendimento tradicional da Ciência
sido dito com frequência, os juízos dos juristas fica- do Direito, enquanto empreendimento metodologica-
riam, no essencial, reduzidos a avaliar um qualquer mente orientado, assente em argumentos racionais,
«sentimento jurídico», que, como tal, é sempre irra- apoiar a possibilidade de um sistema axiológico ou
cional e sobre cujas «afirmações» não há, pelo menos teleológico, pelo menos como hipótese. Vale aqui para
actualmente, um entendimento que possa aspirar a ideia de sistema o que BINDER afirmou, em geral,
sequer a uma parcela de convincibilidade geral. Por para o carácter científico da jurisprudência: assim
outras palavras: quem negue a possibilidade de um como KANTnão perguntou se existe uma Ciência da
sistema teleológico nega, com isso, igualmente a pos- ' Natureza, .mas antes o pressupôs, tendo procurado,
sibilidade de captar racionalmente a adequação do compreendê-lo, também se deve, primeiro, partir de
pensamento teleológico (122) e, com isso, também a . «que existe uma Ciência do Direito e, então, perguntar
. qual o seu sentido e o que fundamenta a sua pre-
possibilidade e importância de uma metódica não lógico-formal, ~ tensão de cientificidade» (124). De facto, ganhar-se-ia
mas ainda especificamente racional e jurídica, segundo o que muito para a moderna discussão metodológica na
se disse no texto, portanto, uma «teleológica formal». Noutros
locais, contudo, KLUGsublinha expressamente a necessidade logia, que transcenda a pura clarificação da sua estrutura
de uma complementação teleológica da lógica formal; cf. as lógico-formal e que, no seu núcleo decisivo, introduza a ques-
indicações supra nota 27. tão do «encaixe» da ratio legis.
(120) Mas também por outros cientistas do espírito e (123) Isto é, a propósito da característica da ordem e não
pelo filósofo. A multiplicidade de tentativas de alcançar uma da da unidade.
lógica material elaborada mostra com suficiente clareza, como (124) Cf. Philosophie des Rechts, 1925, p. 836 ss. (837) e
é forte a necessidade de uma complementação da lógica for- Der wissenschaftscharakter der Rechtswissenschaft, Kantstu-
mal, através de outro tipo de pensamento racional. dien 25 (1921), p. 321 S8., em especial p. 352 ss.; um paralelo
(121) Cf. supra p. 2 ss. digno de nota encontra-se (com referência a uma seriação geral
(122) Devia-se, portanto, por exemplo, considerar impos- de valores, e portanto não especificamente jurídica) em
sível uma fundamentação racional de cada conclusão por ana- LEINFELLER, Einführung cit., p. 180 s.
Ciência do Direito (e, em geral, nas ciências do Espí- exemplo, a Ciência da Literatura - quando tal juízo
rito) quando se adaptasse este ponto de partida de seja permitido a um diletante (no duplo sentido da
BINDER - infelizmente pouco observado - e, em vez palavra) - fez progressos assombrosos e obteve
de pôr permanentemente em dúvida a cientificidade resultados da mais alta evidência, desde que ela não
dos modos de trabalhar específicos das ciências do mais se assumiu exclusiva ou, pelo menos, predo-
Espírito, em especial do pensamento hermenêutico e minantemente como Ciência histórica (128), mas antes
teleológico, se procurassem entender as especialida- tornou a obra de arte, na sua própria e específica
des destes métodos e apenas no final se colocasse a regularidade, sob o lema da «interpretação imanente
questão da natureza científica (125). A discussão sairia da obra» ou da «análise estrutural», no objecto das
então, com brevidade, de ambos os extremos, entre suas pesquisas e, nesse sentido se tornou uma Ciência
os quais ela hoje oscila, para aquele ponto intermédio hermenêutica. E do mesmo modo a jurisprudência
apenas avaliado pelas tarefas específicas da Ciência teleológica moderna pode requerer para si um êxito
do Direito: da improdutividade das meras pesquisas indiscutível; não se deve, finalmente, olhar, de modo
lógicas e logísticas, por um lado (126) e da não permanente, para as cláusulas gerais (129), antes se
inadstringibilidade da pura tópica, por outro lado (127) ,
para uma teleológica e hermenêutica, que facultem
resultados racionalmente verificáveis através de meios (128) Também aqui o conceito positivista de Ciência pro-
razoáveis e, assim, vinculantes, - mesmo que não voca sérios danos. Pois porque fora das Ciências Naturais e
se pudesse alcançar aquele grau de adstringência da Matemática, só se reconhece como Ciência a descrição histó-
que é característico para as Ciências da Natureza ou rica dos «factos positivos», julga-se que a Ciência da Literatura
para a Matemática. só seja possível como Ciência Histórica; expulsa-se, com isso,
do âmbito da pesquisa científica justamente o que é específico
E está-se assim tão mal quanto à verificabilidade numa obra de arte.
da hipótese questionada? De modo algum! Assim, por (129) E também a sua concretização tem feito, em parte,
progressos admiráveis - pense-se apenas, por exemplo, nos
(125) Não se lhes deve colocar na base o ideal de Ciên- trabalhos de SIEBERT e de WIEACKER sobre o § 242 do BGB (*).
cia do positivismo, que, de antemão, não está apto ao pensa- (*) Nota do tradutor: o § 242 do BGB dispõe:
mento hermenêutico ou a qualquer tipo de teleológica- cor- «O devedor está obrigado a realizar a prestação tal como
respondendo inteiramente a outro modelo, para o qual se requer a boa fé, com consideração pelos costumes do tráfego».
orienta. Por isso, a polémica contra a adstringibilidade única Recorde-se que com base neste preceito, a jurisprudência
desse conceito de Ciência é, por exemplo, e com razão, uma e a doutrina alemãs desenvolveram quatro institutos funda-
das ideias centrais da metodologia de LARENZ. mentais: a culpa na celebração de negócios, a boa fé no
(12G) Cf. também supra, p. 31 S5. cumprimento das obrigações, o abuso do direito e a alteração
(127) Cf. também infra, § 7 1II b. das circunstâncias.
devendo incluir também aquelas partes nas quais, especial, pressuposto de um cumprimento, racional-
como por exemplo nos domínios «construtivos» dos mente orientado e racionalmente demonstrável, do
Direitos Reais, do Direito das Sucessões ou do princípio da justiça de tratar o igual de modo igual
Direito dos Títulos de Crédito, é possível, num número e o diferente de forma diferente, de acordo com a
indefinido de casos, um simples juízo de «errado» ou medida da sua diferença.
«certo» sobre um resultado e onde não pode ser ques- A esse propósito deve-se, por fim, focal' expres-
tão de «admissível», etc. De modo semelhante, samente uma especificidade: quando se fala aqui,
devem-se considerar as múltiplas interpretações, ana- constantemente, da adequação dos valores, preten-
logias e restrições «adstringentes», e não elevar ape- de-se significar isso mesmo. Não se trata, portanto,
nas os problemas do aperfeiçoamento «livre» (isto é, da «justeza» material, mas apenas da «adequação»
não mais orientado por valores imanentes à lei) do formal de uma valoração - na qual «formal» não se
Direito a critério da admissibilidade dos métodos deve, evidentemente, entender no sentido de «lógico-
jurídicos. Finalmente, não pode haver dúvidas de que -formal» mas sim no sentido em que também se fala
o pensamento jurídico aparece tanto ao leigo como, do carácter «formal» do princípio da igualdade. Por
com frequência, ao próprio jurista, justamente como outras palavras: não é tarefa do pensamento teleoló-
um caso modelar de pensamento «lógico»; tenha-se gico, tanto quanto vem agora a propósito, encontrar
presente que, na verdade não é um pensamento uma qualquer regulação «justa», a priori no seu con-
teleológico que rege os problemas específicos da teúdo - por exemplo no sentido do Direito Natural
jurisprudência e que só este faculta conduzir a sua ou da doutrina do «Direito justo» - mas apenas, uma
argumentação; torna-se então claro o que verdadeira- vez legislado um valor (primário), pensar todas as
mente subjaz a esse juízo: a experiência de uma evi- suas consequências até ao fim, transpô-Ia para casos
dência especial da adequação e poder convincente do comparáveis, solucionar contradições com outros
pensamento axiológico e teleológico. Embora a sua valores já legislados e evitar contradições derivadas
estrutura possa ser ainda pouco esclarecedora, poder- do aparecimento de novos valores (130). Garantir a
-se-á dizer em resumo: a hipótese de que a adequação adequação formal é, em consequência também a
do pensamento jurídico-axiológico ou teleológico seja tarefa do sistema «teleológico» (131), em total conso-
demonstrável de modo racional e que, com isso, se
possa abarcar num sistema correspondente, está sufi-
cientemente corroborada para poder ser utilizada (130) Seja através de legislação, seja por via da interpre-
como premissa científica. Ela é a condição da pos- tação criativa de Direito.
(131) Quanto ao tema, na medida em que a justiça mate-
sibilidade de qualquer pensamento jurídico e, em
rial se realiza igualmente, cf. infra § 5 IV 3.
nância com a sua justificação a partir do princípio se pode ficar pelas «decisões de conflitos» e dos
«formal» da igualdade. valores singulares, antes se devendo avançar até aos
valores fundamentais mais profundos, portanto até
aos princípios gerais duma ordem jurídica; trata-se,
2. O sistema como ordem de «princípios geraís assim, de apurar, por detrás da lei e da ratio legis, a
do Direito» ratio iuris determinante. Pois só assim podem os valo-
res singulares libertar-se do seu isolamento aparente e
Com a caracterização do sistema como ordem
reconduzir-se à procurada conexão «orgânica» e só
teleológica ainda não foi, contudo, dada resposta à
assim se obtém aquele grau de generalização sobre o
segunda pergunta essencial: a dos elementos consti-
qual a unidade da ordem jurídica, no sentido acima
tutivos nos quais se tornem perceptíveis a unidade caracterizado (132), se torna perceptível. O sistema dei-
interna e a adequação da ordem jurídica. No entanto,
xa-se, assim, definir como uma ordem axiológica ou
ficou já esclarecido que se deve tratar de valores,
tclcológica de princípios gerais de Direito (133), na
ainda que isso não possa constituir a resposta final,
pois se mantém a questão mais vasta de que valores (I "") Para a função dos princípios, constituinte do sis-
se trata: todos ou apenas alguns? Se se quisesse tema, cf. principalmente ESSER, Grundsatz und Norm cit.,
optar pelo primeiro sentido, chegar-se-ia a um con- p. 277 s. e 323 ss. Para além disso, poder-se-ia, quando muito,
aproximar o conceito de sistema aqui adaptado do de COING
ceito de sistema que seria muito semelhante ao «sis- e do de LARENZ (indicações importantes também já em STOLL,
tema de conflitos de decisões» de HECK e perante o ob. cit., p. 77 s. e 96); cf. sobretudo, COING, Grundziige der
qual procederiam as mesmas objecções; ele não pode- Rechtsphilosophie, 1980, p. 275 ss., JZ 1951, p. 481 ss. (484 s.),
ria tornar perceptível, de modo algum, a unidade. Geschichte und Bedeutung des Systemgedankes, p. 9 55. e
Trata-se, pois, de encontrar elementos que, na mul- DõIle-Festschrift, p. 25 ss.; LARENZ, Festschrift für Nikisch,
1958, p. 299 ss. e Methodenlehre p. 133 ss. e 367 ss. No entanto,
tiplicidade dos valores singulares, tornem claras as
ambos colocam o sistema não exclusivamente na conexão dos
conexões interiores, as quais não podem, por isso, ser princípios gerais de Direito, mas sim, em parte, também nas
idênticas à pura soma deles. conexões da vida, dos valores, dos institutos, etc. (cf. COING,
Nesta ocasião, deve-se recordar de novo a carac- JZ cit., p. 485 e Rechtsphilosophie, cit., p. 278; LARENZ, ob. cit.,
terística principal da ideia da unidade, acima elabo- p. 136 s. e 367). Poderia aí, contudo, haver apenas uma opo-
sição relativamente pequena com a opinião representada no
rada (132): a recondução da multiplicidade do singular a
texto. No que respeita, em primeiro lugar, ao significado das
alguns poucos princípios constitutivos. Mas isso signi- conexões da vida, há que separar cuidadosamente o sistema
{ fica que, na descoberta do sistema teleológico, não
externo do sistema interno: elas têm um significado grnnde e
1--- __
imediato para a edificação do externo mas, para a do interno,
(m) Cf. § 1, I. pelo contrário, elas sõ podem ser relevantes mediatamel'l1e,
qual o elemento de adequação valorativa se dirige Não se pode determinar, de antemão, quando deva
mais à característica de ordem teleológica (1~4) e o um princípio valer como «gera!»; também aqui se
da unidade interna à característica dos princípios trata de um critério inteiramente relativo. Para o
gerais (134).
conjunto da nossa ordem jurídica, não se poderiam
actuando sobre a «natureza das coisas» e sobre o que, desta, considerar todos os princípios como «portadores de
o Direito receba, portanto numa forma jurídica específica de unidade» e, com isso, como sistematizadores; e no
pontos de vista transpostos de ordenação e de valoração, que, quanto a essa função, respeita ao Direito pri-
isto é, justamente sobre os princípios jurídicos. Outro tanto vado: neste, nem todos os princípios são, por seu
vale para as «diferenças de estrutura lógico-materiais», por
turno, relevantes para o sistema, como o serão, por
exemplo as que existem entre o Direito das Obrigações e os
Direitos Reais; também aqui se trata de separar entre o sis- exemplo, para o Direito das Obrigações, os Direitos
tema externo e o sistema interno e, quanto ao último, de Reais, o Direito das Sucessões, etc.; dentro desses
aproximar apenas aqueles elementos por detrás dos quais âmbitos, formam-se subsistemas mais pequenos, com
se escondam valores materiais. Quanto aos restantes elemen- princípios «gerais» autónomos, como, por exemplo,
tos, como conceitos, institutos jurídicos ou valores, cf. igual-
o sistema dos actos ilícitos, do enriquecimento sem
mente no texto infra a). - Um sistema no qual todos ou alguns
destes elementos se contivessem em igual posição, no qual, causa, das perturbações na prestação ou da respon-
portanto, por exemplo, conceitos, institutos, valores, conexões sabilidade pela confiança. Em qualquer caso, uma
da vida, etc. estivessem, no mesmo grau, junto dos princípios, parte dos princípios constituintes do sistema mais
parece-me, contudo, poúco conveniente (mas cf. COING e pequeno penetra, como «geral», no mais largo e,
LARENZ,ob. cit.). Com isso, mesmo que não se misturasse,
inversamente, o sistema mais pequeno só em parte
de modo inadmissível, o sistema externo e o interno, tratar-
-se-ia, contudo, de uma equiparação de elementos que estão se deixa, normalmente, retirar dos princípios do mais
em planos distintos. Poder-se-ia, na verdade, em outras cir- largo (135). Assim, modifica-se a «generalidade» dum
cunstâncias, construir o sistema interno com valores, conceitos, princípio com a perspectiva do ponto de vista; final-
institutos, etc. (cf., quanto a isso, igualmente o texto, infra a», mente, é sempre decisiva a questão de quais os prin-
mas melhor seria erguê-Io sobre um desses elementos e não
cípios jurídicos que se devem considerar constitutivos
mudar permanentemente os planos. Poder-se-ia, desta forma,
desenvolver vários sistemas colocados em diferentes planos para a unidade interior do âmbito parcial em causa,
uns por detrás de outros ou em degraus uns sobre os outros, de tal modo que a ordem dele seria modificada, no
que se deixassem reformular uns nos outros, mas que perma-
necessem sistemas (<<científicos»)diferentes, isto é, formas
diferentes de ver e de captar o sistema (<<objectivo»)da ordem (1::") Os princlplOs não são, em regra, materialmente
jurídica (para a relação entre o sistema «objectivo» e a sua bastantes para compreender também todos os pontos de vista
formulação no sistema «científico» cf. supra p. 13). valorativos necessários, para o âmbito mais estreito do orde-
(131) Cf. supra § 1 I e as notas 13 e 14. namento: cf. pormenorizadamente infra p. 96 s.
seu conteúdo essencial, através de uma alteração num No que toca, em primeiro lugar, a um sistema de
desses princípios. Para o Direito civil vigente seriam, normas, surge este como pouco significativo, por-
por exemplo, de reconhecer como constitutivos do quanto se deve procurar justamente, a conexão aglu-
sistema - sem pretensão de exaustividade - os prin- J tinadora das normas - e esta não pode, por seu
cípios da autodeterminação, da auto-responsabilidade,
) turno, consistir também numa norma; de facto, os
da protecção do tráfego e de confiança, da considera-
. princípios jurídicos unificadores e significantes só
ção pelas esferas de personalidade e de liberdade dos
numa parte demasiado pequena se deixam formular
outros e da restituição do enriquecimento injusto (130).
na forma de normas que devam ser firmemente deli-
O significado dos «princípios gerais de Direito»
mitadas segundo as previsões e estatuições normati-
para a formação do sistema precisa contudo, nalguns
pontos, ainda de maior elucidação. vas e, assim, recuam perante a articulação mais
flexível do princípio.
No que respeita agora a um sistema de conceitos
a) As vantagens, na formação do sistema, dos «prin- gerais de Direito, este seria, por certo, pensável não
cípios gerais de Direito», perante normas, con- apenas como um puro sistema formal de conceitos
ceitos, institutos jurídicos e valores. fundamentais gerais (1:;7), mas também como um sis-
tema teleologicamente «preenchido» de uma determi-
Em primeiro lugar, não é de imediato evidente nada ordem jurídica. No entanto, eles deveriam ser
que o sistema deva justamente ser composto de prin- conceitos teleológicos ou «conceitos de valor» (1:\8);
cípios. Põe-se antes a questão de saber se não poderia al<'m disso, também não se deveriam considerar, para
depender de outros elementos «gerais», como por a formação do sistema, os conceitos gerais abstrac-
exemplo, de normas, conceitos, institutos jurídicos ou l.os (' ::0), mas apenas os conceitos concretos no sen-
valores. A resposta não é fácil e não deveria,em tido de HEGEL (140), pois apenas os últimos surgem
última análise, ser determinada pelos pontos de vista capazes de recolher em si o pleno sentido constitutivo
da oportunidade e do acaso.

(l:;ü) Não é objectivo desta pesquisa uma representação (1::7) Cf., quanto a isso, supra § 2 I 2.
do conteúdo do Direito privado actual (cf., quanto a isso, (1:1H) O termo é utilizado por COING, Rechtsphilosophie
sobretudo COING, Dolle-Festschrift cit.); aqui trata-se antes cit., p. 272.
apenas do aspecto metodológico da problemática, e os prin- (l:l!I) Cf. LARENZ,ob. cit., p. 139 s.
cípios referendados no texto visam apenas a ilustração exem- (1,111) Para a significado do conceito geral-concreto na
plificativa. ('il'ncia do Direito é fundamental LARENZ,ab. cit., p. 353 ss.
da unidade interna (141). Mas ainda que um sistema de o sistema deve fazer claramente a adequação valora-
conceitos jurídicos seja possível, isso não quer ainda tiva e a unidade interior do Direito e, para isso, os
dizer que ele também seja adequado. Pelo contrário, conceitos são muito impróprios. Designadamente, e
isso é duvidoso, perante as tarefas aqui em causa. mesmo quando estejam bem construidos, eles apenas
mediatamente contêm as valorações, por assim dizer
(141) BINDER requereu um sistema de conceitos gerais fechadas, enquanto os princípios são abertos; assim
concretos na «Wissenschaftslehre» que deixou depois da sua a valoração é, por exemplo, essencialmente mais
morte; cf. p. 351 ss. (355) do manuscrito na posse do Semi- irnediata e segura no princípio da autonomia do que
nário para a Filosofia do Estado e para a Política do Direito
no (ordenado) conceito de negócio jurídico, e que só
da Universidade de Colónia. Na sua Philosophie des Rechts, de
1925, BINDER fala de um sistema de «conceitos gerais empí- através de considerações relativamente complicadas,
ricos» - cf. p. 921 ss. (924), que ele contrapõe aos «puros» (. possível determinar a valoração que o conceito de
conceitos de Direito; esses conceitos são «empíricos» na direito subjectivo em si contenha. Pode, portanto,
medida em que se devam desenvolver a partir «do conteúdo
dizer-se: No conceito (bem elaborado) a valoração
das ordens jurídicas singulares historicamente dadas». A rela-
ção entre esses «conceitos gerais empíricos» e os «conceitos cslli. implícita; o princípio, pelo contrário explicita-a
individuais históricos» (no sentido de RICKERT), que BINDER e por isso ele é mais adequado para extra polar a uni-
considera, aliás, adequados para a Ciência do Direito (cf. em dade valorativa do Direito. Para além disso, também
especial ob. cit., p. 841 ss. e 888 ss.), não fica bem clara
n[\o se deve esquecer que, de forma alguma, os con-
(para as dificuldades da formação de conceitos de BINDER cf.
também LARENZ, ob. cit., p. 106 s.). BINDER deveria ter visto ceitos correspondentes a todos os princípios funda-
a solução no conceito geral-concreto de HEGEL, ao qual ele Ilwnlnis da nossa on!<'1ll .jurídica já estão elaborados
também se ligou casualmente a este propósito, na Philosophie (' (tIl(' isso, no essencial, é ainda mais difícil do que
des Rechts (p. 842; cf. também p. 888). - Que os conceitos
iI 1'01'111111,11;110 de principias gerais de Direito. Quanto
devam ser de tipo teleológico indiciou BINDER incansavelmente,
como poucos; cf. por exemplo ob. cit., p. 886, 890 e 897 ss. ao reslo. Iliío s(~rú necessário salientar que a formula-
LARENZ pretende que o sistema do conceito geral-concreto (/IU <1(' conceitos não é, por isso, supérflua. Pelo
é o da filosofia do Direito e não o da dogmática jurídica contrúrio: ela é imprescindível para a preparação da
(cf. p. 367), i. é, portanto, não o de uma determinada ordem
jurídica. Parece-me duvidoso que isto proceda e, também, que
isto surja consequentemente no resto da concepção de LARENZ. h(~ln os princípios, os institutos jurídicos ou até as conexões
A justificação de que a Ciência do Direito vigente precisaria, da vida não são inteiramente capazes de subsunção. Pelo con-
para cumprir as suas tarefas, de conceitos gerais abstractos trário: capazes de subsunção são as normas; o sistema, porém,
por causa da sua capacidade de subsunção é, em qualquer deve descobrir as conexões de sentido existentes «por detrãs
caso, pouco convincente. Isso é verdade, mas não é tarefa do ddas» ou «nelas» e pode, por seu lado, não ser susceptível de
sistema oferecer a possibilidade de subsunção imediata; tam- subsunção.
subsunção, devendo, assim, ser ordenado um sistema genação» de princIplOs fundamentais pode demons-
de conceitos jurídicos correspondente aos princípios. trar-se em todos os «institutos jurídicos». Mas assim
Deve-se ter presente que eles são de natureza teleoló- sendo, um sistema com eles formado iria exprimir a
gica e que, por isso, em caso de dúvida, é sempre unidade da ordem jurídica do modo fragmentário,
necessário o recurso à valoração neles incluída isto pois a conexão ainda mais profunda existente entre
é, ao princípio equivalente; por exemplo, sendo pouco os institutos não se tornaria visível; pelo contrário:
claro se um determinado acto deve ser qualificado o facto de, para vários institutos, os mesmos princí-
como negócio jurídico ou se uma posição jurídica pios serem, em parte,constitutivos (144) - por exemplo
protegida pode ser considerada como um direit;~ para o da auto-responsabilidade ou da protecção da
subjectivo, deve perguntar-se sempre se, no caso esfera de liberdade - mostra que, na procura da uni-
ques~ionado, respectivamente, procede a regulação dade do Direito, se regressa, por último, sempre e de
predIsposta por força da auto-determinação privada / novo aos princípios gerais do Direito, - uma vez
ou se se. deparam aqui os valores vigentes no reco- 1 .'1 que o sistema não resulta da sua mera enumeração
nhecimento de direitos subjectivos. ' desconexa, mas antes é constituído através da sua
"-~":':--'--'-' ... ,- jl
Outro tanto vale perante um sistema de institutos eOllcatenação e ordenação interna (145) e desde que
jurídicos (142). Também estes não tornam a valoração contenha uma componente relativamente semelhante
unificadora de modo algum imediatamente visível. aos institutos. - A mesma objecção feita perante um
Mas sobretudo, eles não se reportam, em regra, a um sistema de institutos, também vale, aliás, em face
único valor, mas sim à ligação de várias ideias jurí- dUIlI dI: conceitos, pois também estes, na maioria,
dicas distintas; assim, o complexo regulativo da auto- cOlllp1'('('I1<I<'llI(:111 si v;í1'ios aspectos valorativos:
nomia privada, que se pode considerar como «insti- assitll, o ql\(' acima foi dito a propósito do instituto
tuto» do nosso Direito privado, só se entende a partir da 1I1110llOnlÍap1'ivad;1 procede, de modo semelhante,
de uma acção conjunta dos princípios da auto-determi- para o ClIllceilo de negócio jurídico; também no con-
nação, da auto-responsabilidade e da protecção do C('ilo d(' ado i1fcito e nos seus elementos singulares
tráfego e da confiança (143); uma semelhante «misce- (p1'evisiío legal, i1icitude, culpa) se abrigam vários
p1'illdpios ou valorações diferentes entre si.
(142)Este corresponde sobretudo ao conceito de sistema
de SAVIGNY; cf. System des heutigen romischen Rechts, 1840, (];") Cf. também LARENZ, ob. cit., p. 139: «... os princí-
§ 5 (p. 10 s.); quanto ao «instituto» como factor constitutivo pios ético-jurídicos, captados através dos institutos síngulares
do sistema cf. ainda EssER,Grundsatz und Norm dt., p. 324 ss. (' constitutivos da conexão de um complexo alargado de
e LARENZ, Methodenlehre cit., p. 137 ss. normas ... )}.
(143) Cf. mais pormenorizadamente infra, p. 92 ss. ('1") Cf. mais pormenorizadamente infra, p. 53 e 55 ss.
Segue-se à proposta aqui feita, a tentativa de do prinCIpIO da auto-determinação negocial, está o
entender o sistema como ordem de valores (146). Tam- valor da liberdade; mas enquanto este só por si, ainda
bém isso seria, evidentemente possível; em última não compreende qualquer indicação sobre as conse-

.I"I.
análise, cada Ordem Jurídica se baseia em alguns quências jurídicas daí derivadas, aquele já exprime
> valores superiores, cuja protecção ela serve. Mas ao algo de relativamente concreto, e designadamente que
i mesmo tempo boas razões depõem, também, contra a protecção da liberdade é garantida através da legi-
ela. Na verdade, a passagem do valor para o princí- timidade, conferida a cada um, para a regulação autô-
(pio é extraordinariamente fluida; poder-se-ia dizer, noma e privada das suas relações com os outros.
"<luando se quisesse introduzir uma diferenciação de
O ])rinc.l'.PiOocupa pois, justamente, o pon.to i~te..rm.é-
algum modo praticável, que o princípio está já num dio entre o valor, por um lado, e o conceIto, por
grau de concretização maior do que o valor: ao con- (lU t ro: el@.--e:&G€J.d~tl@.le-pg:f-~-:iá--sufkienteJl1~!!te
trário deste, ele já compreende a bipartição, caracte- f....
ti eterminªclQ.12ara _.~(?1ll
pre~.Dde_cllllla_-i:Q9ic~ã.Q_§()})-!~_
rística da proposição de Direito em previsão e conse-
;1 ~ consequências._jurídiGas--e,--GOill.isso,para .possui~
quência jurídica (147). Assim, por exemplo, por detrás
uma configuração. esp~cWçªrrg~l1t~ jurídica e ultra-
I)assa este poraillda não estar sllficieIitt::Illente deter-
Ininado para esconder a valoração. Uma vez por
(146) Cf. sobretudo COING, ob. cito na nota 133. lodas - e mais uma vez se repete, para evitar mal-
(147) Cf. mais pormenorizada mente CANARIS, olJ. cit.,
,('nlendidos - trata-se, predominantemente, de uma
p. 123 S. Isso não significa, evidentemente, que ele aparente,
qlll'stIio d,' oportunidade c de acaso: um sistema de
no restante, já a forma de uma disposição jurídica; ele dis-
tingue-se antes desta por não estar ainda, em regra, suficiente-
mente concretizado para permitir uma subsunção, precisando,
olc'ol •. p"l"'" .1I1I::llIdo fallll' di' um «valor», pois a realização
por isso de uma «normativização»; cf., mais detidamente,
tllI ('111'11111 d" 1111:;/\11110VIII" por si só, mas apenas pela pro-
ob. cit., p. 160 ss. Contra a opinião de BYDLINSKI (6JBI. 1968,
k",;n" «d" '1"1' ":lU por detrás dela» e, portanto, é precisa
p. 223), isso não modifica, contudo, em nada, a justeza da
II/lli! v(,riOll «vl1lol'<·s». D,~ resto, é de admitir que os valores
diferenciação proposta entre princípio e valor; o princípio, ao
IlIIldl('II:1 :lI' d,'I)(11111f:wilmente reformular nos correspondentes
contrário do valor, indica sempre, pelo menos, a direcção da
prllll'ipío:; " '111(', por' isso, as delimitações são fluidas - tra-
consequência jurídica (ob. cit., p. 161 ss.) embora pormenores
'",ul" :;(' 11i1l'IHl:~dI' diversos graus de um processo de concre-
possam ficar em aberto. No que toca, em especial, ao exemplo
'I'/,/I<;l'io ,'m li! eonlínuo (que, na sua fase seguinte, prossegue
citado por BYDLINSKI, do princípio de que a realização do
do prlllc:lpio para a norma e, aí, aparenta de novo delimita-
capital de base de uma sociedade anõnima deve manter-se .;,.••.s I'Il1ldas). - Em compensação, o que BYDLINSKI diz, ob. cito,
assegurado, é inteiramente reconhecível, nele, a bipartição em
qllanto Ü diferença entre a analogia e princípios gerais de
previsão (<<O capital de base») e estatuição jurídica (<<deve
I lin'ito é corNincente e representa um progresso importante
manter-se realizado»); também parece, neste caso, especial-
IH'::ta questão.
conceitos teleológicos, de institutos jurídicos ou ckl ('ns vezes levam a decisões contrárias. Pense-se ape-
valores superiores deveria assemelhar-se muito a uml
ll;lS nas excepções sofridas pelo princípio da liberdade
sistema de princípios: deveria deixar-se reformulal
_ .i de forma dos contratos obrigacionais, pelo da consen-
neste outro, de modo extenso, quando não total. _.~..
sllalidade da procuração, pela possibilidade de repre-
sentação nos negócios jurídicos, pelo da condiciona-
bilidade dos negócios jurídicos, pelo da liberdade de
b) Os tipos de funções dos «princípios gerais do
aceitação dos negócios do representante legal, etc.
Direito» na formação do sistema
Ou pense-se nas múltiplas limitações do princípio da
autonomia negocial que resultam da consideração de
Apurada e demonstrada a escolha para elementos
princípios contrários e das contraproposições daí
constitutivos unitários dos princípios gerais de Direito,
resultantes, como, por exemplo, a limitação da liber-
surge, como nova tarefa, o tecer considerações mais
dade de celebração, através de várias previsões do
pormenorizadas sobre o modo e a forma pelo qual eles
acatam a sua função sistematizadora. Salientem-se, dever de contratar, a limitação da liberdade de esti-
aqui, quatro características: os princípios não valem pulação dos contratos obrigacionais através do
sem excepção e podem entrar entre si em oposição Direito de protecção das denúncias do Direito social
ou em contradição (148); eles não têm a pretensão da do arrendamento e no Direito do trabalho, na limita-
exclusividade; eles ostentam o seu sentido próprio ção da liberdade de testar através do direito de
apenas numa combinação de complementação e res- legítima, etc., etc. Entre a mera excepção e o princí-
trição recíprocas; e eles precisam, para a sua reali- pio contrário existe, naturalmente, uma passagem
zação, de uma concretização através de sub-princípios fluida; deve verificar-se, quanto a isso, se o valor
e valores singulares, com conteúdo material próprio. que requer a limitação possui uma generalidade e
~ Os princípios não valem sem excepção e podem uma categoria bastantes para, por seu turno, valer
~ entrar em oposição ou em contradição entre si. Esta como princípio constitutivo do sistema. Isso não
característica não precisa de explicação; é para oS) sucede, por certo, nos exemplos acima dados, a pro-
juristas um fenómeno seguro o de que, às decisões t. pósito das ideias jurídicas que subjazem às diversas
prescrições de forma, isto é à protecção contra a
fundamentais da ordem jurídica, subjazem muitas i'
excepções e de que os princípios singulares não pou:,,~ precipitação ou à facilitação de prova; o BGB não
confere a esses valores um significado tal que, aqui,
se possa falar em princípio constitutivo do sistema
(148) Para a diferença entre oposição e contradição cf.
intra, § 6 I 2 d.
do Direito civil ou, sequer, apenas do Direito das
obrigações; trata-se, assim, de meras excepções ao
princlplO da liberdade de forma. Pelo contrário, os respectivamente, não são, de modo algum, previsões
princípios de tutela dos trabalhadores e da protecção excepcionais «contrárias ao sistema» mas antes, pelo
da família, que estão por detrás do direito de pro- contrário, expressões (em parte incompletas) de prin-
tecção dos despedimentos e da legítima, respectiva- cípios gerais. Por certo que o princípio do dever de
mente, têm, sem dúvida, uma função constitutiva para responder pelo ilícito culposo merece ainda uma
os nossos Direitos do Trabalho e das Sucessões e, certa primazia, que se baseia em parte no seu signifi-
para além disso, também para todo o Direito Privado; cado histórico, mas também, sobretudo, na sua espe-
. há, pois, princípios opostos. cial evidência ético-jurídica; mas isso não justifica, de
, Os princípios não têm pretensão de exclusividade. modo algum, que lhe seja reconhecida uma pretensão
Isto significa que uma mesma consequência jurídica, de exclusividade; antes conduz a que, no reconheci-
característica de um determinado princípio, também mento de outros fundamentos de imputação, seja
pode ser conectada com outro princípio. Podia-se cuidadosamente verificada a questão do seu poder de
julgar que isto é evidente. Mas tem sido frequente- convicção interior. Compreende-se, por si, que esta
mente posto em causa, pelo menos a propósito de perspectiva tenha o mais alto significado para a inter-
princípios singulares, e este mal-entendido tem-se pretação comum e para a interpretação criativa do
mostrado, em parte, como um obstáculo pesado para Direito (149). Uma problemática muito semelhante à
o progresso do nosso Direito privado. Assim, por colocada a propósito do princípio da culpa, põe-se,
exemplo, nem sempre foi reconhecido que as presta- também, quanto ao princípio de autonomia privada e
ções de indemnização podiam resultar não apenas de possui, ainda hoje, grande actualidade. Não poucas
violações culposas do Direito; hoje já não é discutível vezes parece dominar o mal-entendido de que pre-
que, ao lado dela, haja uma série de outros princípios tensões «como as resultantes de um negócio jurídico»,
de imputação, também constitutivos do sistema, tais portanto, em especial, pretensões de cumprimento, só
como os princípios do risco, da confiança ou da podem, fundamentalmente, resultar de negócios jurí-
imputação por actos lícitos e que as disposições a
eles respeitantes, como as previsões de responsabili-
('ação; o § 307 manda, àquele que conheça a impossibilidade
dade pelo risco, § § 122, 179, 307 e 904/2 BGB (*), duma prestação assumida, indemnizar a outra parte que se
lenha fiado na viabilidade do contrato; o § 904/2, por fim,
(*) Nota do tradutor: o § 122 do BGB obriga o declarante <ktermina que, quem penetre em prédio alheio para prevenir
a inc!emnizar o dec1aratário ou, em certos casos, terceiros, um dano na própria coisa, o possa fazer devendo, no entanto,
quando a declaração seja declarada nula ou seja anulada; o indcmnizar. As indemnizações são, no entanto, limitadas nos
§ 179 estabelece a responsabilidade do representante que não lrüs primeiros casos ao denominado interesse negativo.
prove os seus poderes, quando o representado recuse a ratifi- (119) Cf. também ínfra p. 120 s. e 176 s.
93

dicos (150). Isso opor-se-ia, por exemplo, ao reconheci- recíprocas (15~~}r


Também para esta proposição encon-
mento da responsabilidade pela confiança como um tramos variaaõs exemplos. Assim, por exemplo, a
princípio constitutivo do sistema de igual categoria, doutrina do negócio jurídico e, em especial, a regu-
na medida em que, dele não resultem apenas pre- lação do erro no BGB só se torna compreensível a
tensões de indemnização, mas ainda, como na respon- partir da ligação dos três princíp:os da autodetermi-
sabilidade pela aparência jurídica, pretensões de cum- nação, da auto-responsabilidade e da protecção da
primento. Na verdade, não se demonstra semelhante confiança. A autodeterminação só é possível em auto-
pretensão de exclusividade do princípio da autodeter- -responsabilidade (154), assim como a autêntica liber-
minação negocial (151), de tal modo que ele não se opõe dade sempre inclui, em si, a vinculação ética. Em
ao reconhecimento de pretensões de cumprimento a consequência disso, o imputável deve ainda respon-
partir da responsabilidade pela confiança ou de outras der, em certas circunstâncias, pela regulação legal
previsões de «imputação objectiva» (m). Em geral, mesmo quando a sua autodeterminação falhe; surge,
pode dizer-se a tal propósito: os princípios não deveni, ·..1'· aqui, a auto-responsabilidade como princípio comple-
fundamentalmente, ser colocados num quadro de! mentador. Esta está estreitamente ligada ao princípio
exclusividade; eles não devem, portanto, ser formula- {. da protecção da confiança, pois, em geral, só perante
~os segundo «só quando ... então ... ». ~ o terceiro de boa fé existe a possibilidade de, hones-
'\ Os princípios ostentam o seu sentido próprio ape- tamente, apesar da falha na autodeterminação, con-
L::~ numa combinação de complementação e restrição servar o negócio jurídico, com recurso ao principio
da auto-responsabilidade. Por exemplo, o princípio
(150) Tal poderia ser, antes de mais, a opinião de FLUME,
da auto-responsabilidade evidencia-se na regra da
uma vez que ele ou não considera os correspondentes fenó- interpretação objectiva, na medida em que se trata
menos como outras previsões especiais capazes de declarações, de fazer imputar ao declarante (pelo menos agora) o
como, por exemplo, a doutrina do documento de autenticação significado objectivo e o princípio da confiança aflora
comercial (cf. Allg. TeU n, 1965, § 36) ou os recusa por quando dê relevo ao modo como a outra parte deve-
inconciliáveis com o Direito em vigor e, em especial, com a
doutrina do negócio jurídico como, por exemplo, a «procura-
ria ter entendido, razoavelmente, a declaração. Subjaz,
ção aparente» (cf. ob. cit., § 49, 4, sobretudo p. 834: {(... de de igual modo, uma ligação entre os três princípios,
tal modo que as regras sobre negócio jurídico não engrenam»).
(151) Cf., quanto a isso, mais desenvolvidamente, CANARIS, (153) São fundamentais os trabalhos de WILBURG; d.,
Die Vertrauenshaftung im deutschen Privatrecht, 1971, p. 431 SS. quanto a eles, pormenorizadamente infra, § 4.°.
(152) Cf., sobre isso, por todos, HÜBNER,Zurechnung statt (154) Cf., quanto a isso, por todos, LARENZ,Die Methode
Filztion einer Willenserkliirung, em Nipperdey-Festschrift, 1965, der Auslegung des Rechtsgeschiifts, 1930; FLUME, ob. cit.,
p. 373 ss. § 4, 8 e 21, 1.
por exemplo, no § 123 II BGB, enquanto a relevância, (, ineficaz, mesmo quando este tivesse uma total cap:l
sem excepção, de uma ameaça, segundo o § 123/1
BGB (*), respeita a uma postergação do princípio da
cidade de julgamento, e ela representasse, portanto: I
lima regulação legal de autodeterminação responSável).'
confiança perante o da autodeterminação que, aqui, e sem falhas; e inversamente, o clausulado por uma ,
por força do peso e.special do vício - segundo a valo- pessoa de vinte e um anos mentalmente atrasada é
ração do BGB - não é modificado através da ideia eficaz, ainda quando não se possa aqui falar propria-
da auto-responsabilidade. Auto-responsabilidade e mente de uma autodeterminação responsável. '--
protecção do tráfego (não a protecção da confiança) Junto de uma tal complementação surge a limita-
estão também por detrás da validade provisória de ção recíproca. Isso já foi acima indiciado, a propósito
um negócio - sobre o qual recaia um erro rele- da discussão do primeiro critério. Assim, o princípio
vante -; a auto-responsabilidade e a protecção da da autodeterminação na nossa ordem jurídica só se
confiança dão ao § 122 BGB o seu sentido (**). O prin- dei.xa apreciar plenamente quando se incluam, na
cípio da protecção do tráfego desempenha um papel ponderação, os princípios contrapostos e limitativos
significativo na regulação da capacidade negocial e o âmbito de aplicação que lhe seja destinado, por-
onde ele, em conjunto com o estreitamente aparen- tanto, por exemplo, quando se actuem as previsões
tado princípio da clareza jurídica, conduziu à imposi- da obrigação de contratar, da protecção no despedi-
ção de estreitos limites de idade; ele tanto modifica mento ou da legítima, de modo útil para a autonomia
o princípio da autodeterminação como o de auto-res- privada. Por outras palavras: o entendimento de um
ponsabilidade: o negócio de um menor de vinte anos princípio é sempre, ao mesmo tempo, o dos seus limi-
tes (lõ5).
(*) Nota do tradutor: dispõe o § 123 do BGB: A combinação mútua dos princípios conduz, no
(1) Aquele que tenha sido levado a emitir uma declara- entanto, a certas dificuldades na formação do sis-
ção de vontade através de dolo ou de ameaça ilícita, pode tema. Designadamente, surgem aspectos diferenciados
anular a declaração.
consoante se descrevam os diversos lugares onde um
(2) Quando o dolo tenha sido cometido por um terceiro,
a declaração destinada a outrem, só é anulável quando este princípio de Direito tem significado jurídico ou se
conheça ou deva conhecer o dolo. Quando qualquer outro que elabore como actua ele num determinado local.
não o destinatário da declaração tenha adquirido, com base É certo, por exemplo, que o facto de os princípios
nela, imediatamente, um direito, é essa declaração anulável da imputação do risco e da protecção do tráfego não
sempre que ele conhecesse ou tivesse conhecido do dolo.
(**) Nota do tradutor: ° § 122, já acima referido, manda
indemnizar a pessoa que creia na validade de um negócio, ('55) Seja dos seus limites imanentes, seja dos «externos»,
quando haja anulação. isto é, dos condicionados pela oposição de outros princípios.
actuarem apenas no quadro da doutrina do negoclO vel a intermeação de novos valores autónomos. Isso
jurídico mas também no enriquecimento sem causa demonstra-se, de novo, com exemplos. Quando, por
e na responsabilidade civil, constitui uma caracterís- exemplo, se saiba que uma determinada vinculação
tica sistemática do Direito vigente. Mas é igualmente respeita ao princípio da auto-responsabilidade, ainda
próprio do sistema que eles tenham conduzido, no se está muito longe de uma norma susceptível de
âmbito negocial, ao princípio da interpretação objec- imputação. A auto-responsabilidade não significa
tiva, no enriquecimento sem causa, à conhecida proi- mais do que imputação, mas esta pressupõe um deter-
bição de ingerência em relações tripartidas e na res- minado princípio de imputação. O Direito civil vigente
ponsabilidade civil, à objectivação da bitola da negli- conhece, como tais, apenas o princípio da culpa, o
gência. Só os dois aspectos levam, de algum modo, princípio do risco e - em todo o caso segundo uma
à representação plena do sistema, sem que se possam opinião difundida, ainda que incorrecta (1Õ1) - o prin-
sempre reflectir ou até formular simultaneamente. cípio da causalidade, cabendo efectuar uma escolha
Eles actuam pois, complementarmente um perante o entre eles. Mas com isso, o processo de concretização
outro, para utilizar um termo que é também empre- não ficou contudo, ainda, concluído. Feita, por exem-
gue no domínio da teorização das Ciências natu- plo, uma escolha a favor do princípio da culpa, surge,
rais (156). .
de seguida, a questão das formas de culpa; determi-
, · L t . " 't
Fma men -e, os pnnclplOs neceSSIam, para a sua <~1
nadas estas, mais pormenorizadamente, como dolo
realização, da concretização através de SUbPrincíPi,osl,. e negligência, cabe ainda esclarecer o que se deve
[ e de valorações singulares com conteúdo matel~~aIr
' entender com jsso; de novo são necessários valores
próprio. De facto, eles não são normas e, por issÕi'i
autônomos, por exemplo, a propósito do tratamento
não são capazes de aplicação imediata (l57), antes
dos erros sobre a proibição, a propósito da questão
devendo primeiro ser normativamente consolidados
de saber se o conceito de negligência se deve entender
ou «normativizados» (158). Para tanto, é imprescindí-
objectiva ou subjectivamente e a propósito da deter-
minação interna do que seja, em determinada situa-
(156) Cf., quanto a isso, WEISSKOPF em Rücl~blick in die ção, o «cuidado necessário no tráfego»; também sur-
Zukunft, 1981, p. 203 s. (na sequência de NIELS BOHR). gem novos valores na determinação da bitola de
(157) Fundamental para a distinção entre principio responsabilidade, portanto a respeito do problema de
e norma, ESSER, Grundsatz und Norm in der richterlichen
Fortbildung des Privatrechts, 2.' ed., 1964.
por que grau de culpa se deve responder: se só por
(158) Cf. CANARIS, Die Vertrauenshaftung cit., p. 474 SS. dolo, se só até ao limite da negligência grosseira ou
se só pela diligência exigível, etc. Outro tanto acon- eípios da protecção da confiança e da auto-responsa-
tece quando, no tocante à imputação, se decida a bilização, e que este último, por seu turno, como
favor de princípios do risco. Também aí se colocam acima se disse, implica toda uma escala de diferentes
problemas de valoração próprios, porquanto se trata possibilidades de concretização, torna-se clara a mul-
de apurar que risco deve ser imputado e até que tiplicidade imaginável de formações previsivas, atra-
limites actua o dever de responsabilidade; pense-se vés da combinação de variantes e subvariantes, - o
apenas na escala de possibilidades, desde a respon- que é confirmado pela consideração do Direito vigente
sabilidade com inclusão da força maior e através de com o seu grande número de diferentes tipos de
várias formas intermédias até à liberação da res- responsabilidades pela confiança.
ponsabilidade pela existência de um «evento inevitá- Mostra-se, assim, amplamente, que as consequên-
vel», no sentido do § 7 II StVG! O mesmo se eias jurídicas quase nunca se deixam retirar, de forma
demonstra com exemplo na responsabilidade pela imediata, da mera combinação dos diferentes princí-
confiança. Assim, feita a afirmação básica de uma pios constitutivos do sistema, mas antes que, nos
protecção da confiança, surge imediatamente a per- diversos graus da concretização, surgem sempre novos
gunta por que forma ela vai actuar: através da con- pontos de vista valorativos autónomos. Em regra, não
cessão de uma pretensão de indemnização pelos se pode reconhecer a estes a categoria de elementos
danos e pelas despesas como, por exemplo, nos constitutivos do sistema, por causa da sua estreita
§ § 122, 179 II e 307 do BGB (*) ou através da con- generalidade e do seu peso ético-jurídico normalmente
cessão de uma pretensão de cumprimento como, por fraco: eles não são constituintes da unidade de sentido
exemplo, nos casos da responsabilidade pela aparên- do âmbito jurídico considerado, portanto, do Direito
cia jurídica? Isso já não se pode resolver com base, privado, nos exemplos citados (1GB).
apenas, na ideia de confiança, de tal modo que devem
ser encontrados novos pontos de vista materiais,
depois de cujo emprego podem, em certas con-
(159) Mas eles podem, naturalmente, ser constituintes da
dições, resultar subproblemas novos e semelhantes. unidade de um âmbito parcial - em regra pequeno. Assim
Aceitando-se que a responsabilidade pela confiança pode-se, por exemplo, considerar um princípio jurídico inteira-
respeita, normalmente, a uma conexão entre os prin- mente constitutivo para um «sistema da responsabilidade pela
confiança», princípio esse que não teria tal categoria no sis-
tema das obrigações ou, até, do Direito privado. Caracterizar
um princípio como «constitutivo do sistema» é, aliás, uma
tarefa relativa; cf. mais pormenorizadamente supra p. 77 s.
que respeita à terceira característica, a complemen-
c) As diferenças dos «princípios gerais de Direito» Lação mútua dos princípios, resulta também um
perante os axiomas paralelo com os axiomas: do mesmo modo estes só
adquirem o seu significado próprio quando se liguem
Para concluir, regresse-se ainda uma vez à pro- entre si, para, a partir de várias premissas maiores
blemática do sistema axiomático-dedutivo (160); tor- axiomáticas, obter a multiplicidade dos «teoremas».
na-se claro, de acordo com as considerações então A concordância cessa, contudo, no elemento da
feitas, que os princípios gerais de Direito são, em. limitação mútua e, inteiramente, na característica
qualquer caso, inadequados para fundamentar tal
interrupção por excepções e das contradições de
sistema. Na verdade, a segunda e, pelo menos em
princípios. Os axiomas exigem uma vigência sem
parte, a terceira das características isoladas apli-
excepções, e admitir, na formação do axioma, todas
cam-se, também, aos axiomas. Pois também estes não
as excepções que surgissem seria uma axiomatização
se devem, essencialmente, edificar segundo a fórmula
aparente (162). Enquanto os princípios conservam o
«só quando ... então ... », antes deixando aberta a pos-
sibilidade de o mesmo resultado poder ser retirado eu sentido «em princípio», segundo o termo tão
de outro axioma (161); uma certa tendência para a característico para os juristas, os axiomas devem
redução a relativamente poucas premissas é também poder ser formulados de acordo com o esquema
inerente a ·um sistema axiomático - uma tendência «sempre que ... , então ... ». Isto não é, de modo algum,
que surge, aliás, em cada sistema por causa do ele- qualquer acaso; surge, pelo contrário, característico
mento da unidade e que também é evidente num das especificidades do pensamento teleológico, perante
sistema de princípios gerais de Direito -; no entanto, a orientação lógico-formal; pois, como diz ESSER(163),
um axioma não adquire por isso, de modo algum, «Os princípios só podem funcionar quando se possam
necessariamente a pretensão da exclusividade. E no quebrar com legitimidade». Totalmente inconciliável
com um sistema axiomático é a possibilidade de
contradições de princípios. É geralmente reconhecido
(160) Quanto a isso cf. pormenorizadamente, supra
§ 2 I 3 b. que tais contradições podem ocorrer (164), não se
(161) Questão completamente diferente é a de se um
axioma pode ser deduzido de outro ou de uma conexão entre
vários outros; isso deve ser negado, pois o axioma seria, (162) Cf. também supra p. 39 s.
então, supérfluo. Mais uma premissa não é, de modo algum, (163) Cf. Grundsatz und Norm, p. 7.
supérflua por o mesmo resultado com ela obtido, se conseguir (164) Cf., por todos, ENGISCH, Einführung in das juristische
a partir de outras premissas, interiormente diferentes. Denken, p. 162 ss., com indicações desenvolvidas na nota 206a.
devendo, de facto, negá-Io (165). Elas não se deixam,
de forma alguma, remover sempre (165), de tal modo
que um sistema de princípios gerais de Direito não
pode satisfazer o postulado da total ausência de con-
tradições. Por isso, os princípios são inutilizáveis
como base de um sistema lógico-axiomático, uma vez
que a ausência de contradições dos axiomas é irre-
nunciável (166). Pelo contrário, a formação de um sis- Com a definição do sistema como uma ordem
tema teleológico não se opõe, de modo algum, à pos- teleológica de princípios gerais de Direito, ficou
sibilidade de contradições de princípios; ela impede, determinado, nas suas características mais importan-
em todo o caso, uma configuração perfeita desse sis- tes, o conceito de sistema; no entanto, são necessá-
tema (167). rias, ainda, precisões nalguns pontos. Duas qualidades
, Finalmente, a quarta característica distingue tam- do sistema desempenham, na discussão jurídica actual,
bém os princípios gerais dos axiomas; a partir destes um papel largo que ainda não foi abordado, no
todos os «teoremas» se devem deixar deduzir, com a decurso, já efectuado, da investigação e que se vai
utilização exclusiva das leis da lógica formal e sem
examinar de seguida: a «abertura» e a «mobilidade»
a intromissão de novos pontos de vista materiais (168)
do sistema. O que se pretende dizer com isso?
enquanto que, como foi mostrado, para a concretiza-
No que toca, em primeiro lugar, à abertura, encon-
ção dos princípios gerais de Direito, são sempre
tram-se, na literatura, utilizações linguísticas diferen-
necessárias, nos diversos graus, novas valorações
parciais autónomas. tes. Numa delas, a oposição entre sistema aberto e
fechado é identificada com a diferença entre uma
ordem jurídica construída casuisticamente e apoiada
na jurisprudência e uma ordem dominada pela ideia
da COdificação (1); nesse sentido, o sistema do Direito

(1) Cf. ESSE R, Grundsatz und Norm, p. 44 e 218 s. e


(165) Cf., pormenorizadamente, intra § 6 I 3-5. passim, seguindo FRITZ SCHULZ, History of Roman Legal
(166) Cf. supra, nota 35. Science, 1946, p. 69, cuja utilização linguística não se fixou,
(167) Cf., pormenorizadamente, intra § 6 I 5. contudo, claramente, neste sentido; cf., ainda, LERCHE, DVBl.
(168) Cf. as citações feitas supra, nota, 31. 1951, p. 692.
alemão actual deve-se considerar, pela sua estru- Ássim, e enquanto factos construtivos ou modificati-
tura (2), sem dúvida como fechado. Na outra, enten- vos do sistema, desenvolveram-se: o princípio do
de-se por abertura a incompleitude, a capacidade de risco, na responsabilidade objectiva, o princípio da
evolução e a modificabilidade do sistema (3); neste
confiança, na responsabilidade pela aparência jurídica
sentido, o sistema da nossa ordem jurídica hodierna
e na doutrina da culpa in contrahendo e o princípio
pode caracterizar-se como aberto. Pois é um facto
da equivalência material no instituto da alteração
geralmente conhecido e admitido o de que ele se
das circunstâncias; de modo semelhante, o princípio
encontra numa mudança permanente e que, por exem-
da boa fé demonstrou, na exceptio do li, na doutrina
plo, o nosso sistema de Direito privado surge, no
da suppressio (*) ou na multipIicidade dos deveres
essencial, diferente do imediatamente posterior à
promulgação do BGB ou do ainda há trinta anos exis- de comportamento desenvolvidos a partir dela, uma
tente. Esta mudança, em cujo decurso foi descoberta inegável força de alteração do sistema.
uma série de «novos» princípios, tem sido descrita Em que se fundamentam estas modificações do
com frequência (4) e só precisa, aqui, de ser indiciada. 1istema e em que sentido é o sistema aberto? A res-
posta só se obtém quando se separem, com clareza,
~. os dois lados do conceito de sistema, isto é, o sistema
(2) Segundo as considerações de ESSER, ob. cit., passim, ~ científico e o objectivo (5).
devia ser hoje geralmente reconhecido que a oposição não é
exclusiva, mas apenas tipológica e que, portanto, os dois tipos
I
de sistema convergem; cf., também, ZAJTAY,AcP 165, p. 97 ss.
(106).
(3) Cf. SAUER, Juristische Methodenlehre, 1940, p. 172; voI. 2, 1960, p. 1 ss. e Privatrechtsgeschichte der Neuzeit, 1967,
ENGISCH,Stud. Gen. 10 (1957), p. 187 s.; LARENZ,Methoden- p. 514 ss. e 543 ss.; F. V. HIPPEL, Zum Aufbau und Sinnwandel
lehre, p. 134 e p. 367; EMGE, Philosophie der Rechtswis- unseres Privatrechts, 1957.
senschaft, 1961, p. 290; RAISER, NJW 1964, p. 1204; FLUME, (5) Cf., quanto a essa diferença, supra, p. 13.
All. Teil des Bürgerlichen Rechts, 2.° vol., 1965, p. 295 s.; (*) Nota do tradutor: a expressão latina medieval
MAYER-MALY,The Irish Jurist, voI. lI, part 2, 1967, p. 375;
«&uppressio» foi proposta em MENEZESCORDEIRO,Da boa fé no
KRIELE, Theorie der Rechtsgewinnung, 1967, p. 122, 145 e 150.
Direito civil, 2.~ voI. (1984), 797, para traduzir a Verwirkung,
Esta utilização linguística corresponde à utilização teorético- spm correspondente na língua portuguesa.
-científica geral; cf. as citações infra nota 8.
A «suppressio» pode definir-se como o instituto pelo qual
(4) Cf., quanto a isso, por todos, WIEACKER, Das () direito que não seja exercido durante bastante tempo, não
Sozialmodell der klassischen Privatrechtsgesetzbücher und die mais poderá ser actuado quando o seu exercício retardado seja
Entwicklung der modernen Gesellschaft, 1953, Das Bürgerliche contrário à boa fé. No Direito português, a «suppressio» é
Recht im Wandel der Gesellschaftsordnungen, DJT-Festschrift, uma subcategoria do abuso do direito.
Contudo, ninguém ma afirmar que o fenómeno
I- A ABERTURA DO "SISTEMA CIENTíFICO" COMO INCOM- da «abertura» do sistema na jurisprudência se possa
PLEITUDE DO CONHECIMENTO CIENTíFICO
reconduzir, apenas, à provisoriedade do conhecimento
científico. Aceitar que as referidas modificações do
No que toca ao primeiro, portanto ao sistema de sistema respeitam, exclusivamente, a progressos de
proposições doutrinárias da Ciência do Direito, a penetração científica na matéria jurídica seria pura
abertura do sistema significa a incompleitude e a utopia. Mas isso leva, naturalmente, à conclusão de
provisoriedade do conhecimento científico. De facto, que subjazemmudanças no sistema objectivo, isto é,
o jurista, como qualquer cientista, deve estar sempre na própria unidade da ordem jurídica, e de que ele,
preparado para pôr em causa o sistema até então por isso, deve ser aberto.
elaborado e para o alargar ou modificar, com base
numa melhor consideração. Cada sistema científico é,
assim, tão só um projecto de sistema (5a), que apenas
11- A ABERTURA DO "SISTEMA OBJECTlVO" COMO MODIFI-
exprime o estado dos conhecimentos do seu tempo; CABILlDADE DOS VALORES FUNDAMENTAIS DA ORDEM
por isso e necessariamente, ele não é nem definitivo JURIDICA
nem «fechado», enquanto, no domínio em causa, uma
reelaboração científica e um progresso forem possí-
Não é discutível e resulta mesmo evidente, que o
veis. Em consequência, nunca podem ser tarefas do
Direito positivo, mesmo quando consista numa ordem
sistema o fixar a ciência ou, até, o desenvolvimento
jurídica assente na ideia de codificação, é, notoria-
do Direito num determinado estado, mas antes, ape-
mente, susceptível de aperfeiçoamento, em vários
nas, o exprimir o quadro geral de todos os reconheci-
campos. Os valores fundamentais constituintes não
mentos do tempo, o garantir a sua concatenação entre
podem fazer, a isso, qualquer excepção devendo,
si e, em especial, o facilitar a determinação dos efeitos
assim, mudar também o sistema cujas unidades e
reflexos que uma modificação (do conhecimento ou adequação eles corporizem. Hoje, princípios novos e
do objecto), num determinado ponto, tenha noutro, diferentes dos existentes ainda há poucas décadas,
por força da regra da consequência interior.
podem ter validade e ser constitutivos para o sistema.
Segue-se, daí, finalmente, que o sistema, como uni-
dade de sentido, compartilha de uma ordem jurídica
concreta no seu modo de ser, isto é, que tal como
esta, não é estático, mas dinâmico, assumindo pois lida (7). Que o legislador possa, contudo, colocar um
a estrutura da historicidade (6). sistema inteiramente novo no local do anterior con-
Não se deve encobrir esta realidade com o facto tende, evidentemente, com isso; não é esse, aliás,
de, em vez dum sistema em si mutável e, por isso, o problema de que aqui se trata.
aberto, se partir de uma sucessão de sistemas dife-
rentes estáticos e, assim, fechados. Na verdade, teori-
camente, sempre que um novo princípio constitutivo
111- o SIGNIFICADO DA ABERTURA DO SISTEMA PARA AS
para o sistema obtivesse validade, poder-se-ia aceitar POSSIBILIDADES DO PENSAMENTO SISTEMATICO E DA
o nascimento de outro sistema, que absorvesse o até FORMAÇÃO DO SISTEMA NA CI~NCIA DO DIREITO
então existente; mas com isso, não se teria resolvido
o fenómeno aqui em causa. Pois esta modificação do
À abertura como incompleitude do conhecimento
Direito não se verifica com saltos bruscos, antes ci(mtífico acresce assim a abertura comq modificabi-
operando num desenvolvimento paulatino e contínuo; !idade da própria ordem jurídica. Ambas as formas
isso vale mesmo quando não se trate de um aperfei-
de abertura são essencialmente próprias do sistema
çoamento jurisprudencial, mas sim de mera interven-
jurfdico e nada seria mais errado do que utilizar a
ção do legislador: por exemplo, se este, ao consagrar
abertura do sistema como objecção contra o signifi-
sempre mais previsões de responsabilidade pelo risco,
cado da formação do sistema na Ciência do Direito
elevar assim um novo princípio jurídico à categoria
ou, até, caracterizar um sistema aberto como uma
de um elemento constitutivo do sistema, não fica,
contradiçfío em si. A abertura do sistema científico
por isso, modificada a identidade do nosso sistema de
resulta, aliús, dos condicionamentos básicos do tra-
Direito privado; este apenas se modificou, - nada de
1>111110 científico que sempre e apenas pode produzir
diferente, aliás, do que o que ocorre com a identidade
projectos provisórios, enquanto, no âmbito questio-
de uma individualidade que não é negada pelas modi-
nado, ainda for possível um progresso, e, portanto, o
ficações no tempo, se esta comparação for permi-
trabalho científico fizer sentido; o sistema jurídico
pa rtilha, aliás, esta abertura com os sistemas de todas
(6) Para a historicidade do Direito cf., por exemplo,
G. HUSSERL, Recht und Zeit, 1955; ARTHUR KAUFMANN,
Naturrecht und Geschichtlichkeit, 1957 e Das Schuldprinzip, ('I) Cf., quanto a isso, HENKEL, ob. cit., p. 40, que equi-
1961, p. 86 8S.; LARENZ, Methodenlehre, p. 189 8S.; HENKEL, P:lI'<l expressamente a ordem jurídica a uma «individualidade
Einführung in die Rechtsphilosophie, 1964, p. 36 ss. I'rúprim>.
as outras disciplinas (8). Mas a abertura do sistema mente modificável (10). Retira-se, de facto, daqui, que
objectivo resulta da essência do objecto da jurispru- a formulação do sistema jurídico - possivelmente em
dência, designadamente da essência do Direito posi- oposição a outras Ciências - nunca pode chegar ao
tivo como um fenómeno colocado no processo da His- fim, antes sendo por essência, um processo infindá-
vel (11); aí reside também um certo sentido prático,
tória e, como tal, mutáve1. Esta forma de abertura
derivado do sistema ser aberto. De qualquer modo,
não se encontra necessariamente em todas as outras
isto traduz uma evidência, que de modo algum merece
Ciências (9), pois o seu objecto pode ser imutável;
um significado tão fundamental como o que lhe con-
pode até haver aqui uma especificidade da Ciência
fere a moderna discussão do sistema; em especial, a
do Direito; não se justifica então, de modo algum,
abertura do sistema não tem qualquer significado para
colocar em dúvida a capacidade da ideia de sistema a admissibilidade da interpretação criativa do Direito;
para a Ciência do Direito: pois as especialidades do
nosso objecto devem corresponder a especialidades
do nosso conceito de sistema e um sistema (em sen- (tO) A questão tem, aliás, o seu paralelo na discussão
:wbre o carácter científico da jurisprudência, na medida em que
tido objectivo) em mudança permanente é tão ima-
,·:{tc seja negado com a fundamentação de que o jurista se ocupa
ginável como uma unidade de sentido duradoura- de um objecto «efémero». Por fim, em ambos os casos deveria
Iratar-se de um pouco significativo prablemade definição.
(11) Enquanto uma ordem jurídica está em vigor, ela
(8) A ideia da abertura do sistema é inteiramente cor- modifica-se e assim que deixe de vigorar, ela já não é mais
rente na nova teoria científica; cf., por exemplo, RICKERT, objccto da dogmática jurídica, como Ciência do Direito
System der Philosophie I, 1921, p. 350; PLESSNER, Zur Soziolo- v igente, mas sim objecto da História do Direito. O modo de
gie der modernen Forschung und ihrer Organisation in der trabalhar do historiador, contra a opinião de GADAMER
deutschen Universitat, em: Versuche zu einer Soziologie des (Wahrheit und Methode, 2.' ed., 1965, p. 307 ss.) não é, porém,
Wissens, publicado por MAX SCHELER, 1924, p. 407 ss. (413); li mesmo do do jurista dogmático, pois não lhe compete a
JASPERS (e ROSSMANN), Die ldee der Universitat, für die IIplicação do Direito, a um caso actual, tão essencial para o
gegenwiirtige Situation entworfen, 1961, p. 44; FREYER, Die dogmático, bem como o seu aperfeiçoamento; que GADAMAR
Wissenschaften des 20. Jahrhunderts und die ldee des Ruma- d"sconheça isto tem a ver, sobretudo, com a polissemia do seu
nismus, Merkur 156 (1961), p. 101 ss. (113); SCHELSKY, ('OI1l:eito de «aplicação»; d. WAGNER, AcP 165, p. 535 s. que
Eisamkeit und Freiheit, Idee und Gestalt der deutschen Uni- n'nSllnl a GADAMER,com razão, neste ponto, uma troca de
versitat und ihrer Reformen, 1963, p. 287 S. ('onceitos; contra GADAMER, com pormenor e convincente,
(9) Cf., por exemplo, a propósito da Física, a este pro- HI':TTI. Dic Hermeneutik aIs allgemeine Methodik der
pósito, C. F. VON WEISACKER, Abschluss und Vollendung der (;I'ísleswissellschaften, 1962, p. 44 ss. e WIEACKER, Notizen
Physik, publicado na Süddeutsche Zeitung de 25.10.1966, 2./11' rechtshistorischen Hermeneutik, 1962, p. 21 (cf. também
n.O 255. p. 8 SS. (' IH s.).
esta não é admissível por aquele ser aberto; antes enquanto o sistema objectivo, pelo seu lado, não é
aquele surge aberto porque esta - por razões exte- Influenciado por modificações dentro do científico.
riores à problemática do sistema - é admissível. Um exame mais cuidado mostra que a problemá-
lleu não é assim tão simples, antes conduzindo ime-
diatamente a duas questões prévias altamente com-
IV - OS PRESSUPOSTOS DAS MODIFICAÇÕES DO SISTEMA plexas: ao problema da validade e das fontes do
E A RELAÇÃO ENTRE MODIFICAÇÕES DO SiSTEMA
Direito (12) e ao problema, decerto modo ligado
OBJECTIVO E DO SISTEMA CIENTIFICO
com aquele, da relação entre o Direito vigente «objec-
livo» e os seus conhecimentos e aplicação; pois a
o círculo de questões da abertura do sistema não questão dos factores e pressupostos de uma modifi-
está totalmente esgotado com a mera justaposição clIção do sistema objectivo é idêntica à da admissibili-
da incompleitude do sistema científico com a modifi- dllde de uma modificação do Direito vigente, portanto
cabilidade do sistema objectivo, tanto quanto tal lIO problema das fontes do Direito e a questão da
separação esteja, também, certa, em princípio. O pro- relação entre o sistema objectivo e científico é apenas
blema, na prática altamente significativo, de saber 11111 sub-problema da questão geral das relações entre
sob que condições são possíveis modificações num o Direito vigente «objectivo» e o seu conhecimento.
dos dois sistemas tem ficado, até aqui, por esclarecer, Por não serem ambos problemas específicos da pro-
assim como a questão, com ele estreitamente ligada, hll~I1Híticado sistema, compreende-se por si que não
da relação na qual ambos os sistemas (ou ambos os possam ser pormenorizadamente discutidos no quadro
lados do sistema) se encontram entre si e, por conse- do presente trabalho; na sequência, apenas se vai
quência, que. influência têm as modificações dum
deles, no· outro. À primeira vista, pode parecer que a
resposta não seja difícil de dar: o sistema científico (I") A validade e as fontes do Direito devem, natural-
modifica-se quando tenham sido obtidos novos ou 11ll'llln, entender-se aqui, em sentido normativo e não em
111'11 lido fúctico, isto é, como o enunciado das proposições
mais exactos conhecimentos do Direito vigente ou
1III'Idkilsque devam, acertadamente, ser aplicadas e não como
quando o sistema objectivo ao qual o científico tem
" 1"vlIllLamentodas proposições jurídicas muda consoante a
de corresponder, se tenha alterado; o sistema objec- Illlllórill- é, na minha opinião, fundamental para a doutrina
tivo modifica-se quando os valores fundamentais dll vlllidade e das fontes do direito e não deve, apesar da
constitutivos do Direito vigente se alterem. Em conse- nll icll snmpro retomada, ser abandonada ou, sequer, confun-
quência, o sistema científico está em estreita depen- <11<111 (mlls d., também, infra nota 36). Para os diversos tipos
ri" l'llllc<'iLo de validade d., por todos, HENKEL, Einführung in
dência do objectivo e deve mudar-se sempre com este,
.ti" 1~"('I""l'lli/oso1Jhie, p. 438 ss., com outras indicações.
(~ que, na forma da eficácia externa imediata ou
esquematizar, com brevidade, o nosso próprio ponto
de vista (13), na medida em que isso seja necessário mcdiata, modificou essencialmente o nosso sistema
para tornar segura, em toda a extensão, a problemá- de Direito privado; o tema do Direito geral da perso-
tica da abertura do sistema (13). nalidade torna-o particularmente claro. Segue-se a
força modificadora do sistema do Direito consuetu-
dinário. Assim o sistema dos nossos Direitos Reais
foi alterado através do reconhecimento da transmissão
de garantias que, apesar de todas as tentativas de
justificação, deve ser considerada como aperfeiçoa-
Ocupemo-nos, primeiro, das modificações do sis- nwn to contra legem do Direito e, assim, só se pode
tema objectivo. De acordo com a doutrina tradicional apoiar na força derrogadora do Direito consuetudi-
das fontes do Direito, deve partir-se do princípio de n{Il'ío.
que, em primeira linha, a modificação cabe ao legis- Mas serão a legislação e o Direito consuetudinário
lador. Como exemplo, recorde-se mais uma vez o os únicos factores significativos para as modificações
alargamento paulatino da responsabilidade pelo risco do Histellla objcctivo? A doutrina tradicional das fon-
e a modificação do nosso sistema de Direito privado, I!'s do Direito deveria, consequentemente, afirmá-Io,
com isso provocada. No entanto, não é sempre neces- coloclIndo'oSe, enUío, o problema de como esclarecer
sário verificar-se semelhante intervenção directa. As t odlts lIS 1I1odíl'icaçi'í('s do si::;tema que se reconduzam
modificações do sistema podem antes resultar de 1I I'I/(H;()('/I jllli:Jl'fI/(/I'lIcioi:J do Direito. Como enten-
actos legisla ti vos que respeitem, primeiramente, a 111'1', por I'Xt'l1Iplo, li lal propósito, a culpa in con-
domínios jurídicos inteiramente diferentes; nota-se, //fIlllJlldo I' li )'(\:lptllINahilidadl~ pela aparência jurídica,
aqui, de modo particular, o postulado da unidade valo- 11 vltlllt(~llo po:JillvlI do cródito e o contrato com efi-
rativa e, com isso, a força do pensamento sistemático. 4'flda pl'of<'Ctorll dI' terceiros, a exceptio dali e a
Um dos exemplos mais visíveis, que surge a tal pro- 111/1'/)/(':11110, () dl~ver de contratar e a doutrina da alte-
pósito, é a doutrina da eficácia externa dos direitos I'IlI;l\odas c.írcullsUlncias, o desenvolvimento dos deve-
fundalTIel1taisque só 'se torna compreensível sobre n's dI' :INsísWncia e de lealdade no Direito do Trabalho
o pano de fundo da ideia da unidade da ordem jurídica (I IlO Direito das sociedades ou a doutrina das socie-
dlll"'S e das relações laborais de facto? Estes institu~
t m; surgiram inteiramente independentes de uma i
(13) Tanto se assumem conscientemente a renuncIa a inlt'rvI'llção do legislador e apoiar a sua validade no i, •
uma discussão pormenorizada com opiniões divergentes como I )ireí'o consuetudinário é pouco satisfatório porque
certas simplificações inevitáveis nos problemas.
os pressupostos deste - ainda que hoje já existen- mente ramificada desenvolveu-se, quase toda (15), a
tes - não se verificavam, de modo algum, no partir das in.dicações relativamente estreitas dos
momento do seu primeiro reconhecimento, de tal ~~ 171,172,405 e 794 do BGB (*), com base em ana-
modo que se deveriam, inicialmente, considerar como logia singular ou conjunta (16); isto vale, sem limita-
«inválidos» e só posteriormente legitimados através (;IJcs, para a violação positiva do crédito bem como,
de um Direito consuetudinário derrogante. Fica ape- para a doutrina da sociedade de facto (17). Em tais
nas uma saída: poder-se-ia, nestes casos, negar qual- casos, o reconhecimento de um novo instituto não
quer modificação do sistema objectivo e afirmar que , Hignifica, de facto, qualquer modificação do sistema
o desenvolvimento dos referidos institutos apenas I (lbjcctivo, mas apenas uma alteração no científico,
conduziu a uma modificação do sistema científico.
E porque o sistema objectivo é constituído, segundo
a opinião aqui apresentada, por valores fundamentais (1 r,) Apenas há uma excepção para a chamada «pro-
ou por princípios fundamentais de Direito, isso iria ('lII'lI(;ão aparente» que é altamente problemática por causa
dll contradição de valorações com a regulação da falta de
pressupor que aquelas figuras novas respeitam a consciência da declaração; cf. mais desenvolvidamente, infra
valores que, de antemão estavam imanentes ao nosso 1'. l.IH.
Direito privado; a problemática em questão desem- (!lI) Cf.CANARIS, Die Vertrauenshaftung im deutschen
boca assim na questão do fundamento da validade /'rival.recht, 1971, p. 106 s., 107 ss. e 133 5S.
(17) No que toca à violação positiva do crédito, ela
dos princípios gerais do Direito (14).
d"riVll directamente, da analogia com os casos legalmente
Como tal deve-se, em primeiro lugar, referir o I'I'/',ullldos de vícios na prestação. No que respeita à sociedade
Direito legislado, do qual, frequentemente, se deixam d(' I'ado, resulta, para as relações externas, do princípio da
obter princípios gerais, através da analogia ou, upnri"ncia jurídica imanente à nossa ordem jurídica (d. supra,
tlll Imcto) e para as relações internas, do facto de os §§ 812 ss.
melhor, da indução. De facto, algumas das referidas
do BGB não se adaptaram, tipologicamente, à sociedade,
construções novas, derivam, sem mais, dos valores I'icundo pois sem aplicação, por força de redução teleológica,
da lei. Isso respeita, por exemplo, à responsabilidade dl'V\'lldo substituir-se através da aplicação analógica dos pre-
pela aparência jurídica, pois a sua construção vasta- " •.ilos sobre liquidação, como regulação material da dissolu-
1:110; para este entendimento da sociedade de facto cf. LARENZ,
lVll'lllOd<>.nlehre p. 298 s. e Schuldrecht, BT. § 56 VII.
("') Nota do tradutor: o § 171 dispõe a eficácia da pro-
(14) Este é relativamente pouco esclarecido; fiz uma
I"II'IU>IO perante quem ela tenha sido anunciada pelo repre-
tentativa - ob. cit., p. 95 ss. (97 ss., 106 ss. e 118 ss.) de
Ij('lIlado; o § 172, sobre a eficácia do documento onde tenham
progredir algo nessa direcção, na qual se edificaram as con-
Iildo conferidos os poderes de representação; o § 405 estipula,
siderações que seguem.
lIil C!'sé;fio de créditos, a inoponibilidade, ao novo credor, de
uma vez que os valores relevantes já se continham,
IllOdificações no sistema científico, mas não no obj,ec~
de antemão, na lei e apenas não eram reconhecidos
Uvo:) A resposta só se obtém quando se pergunte
no seu alcance total.
por que razão aqueles valores, apesar de não consta-
No entanto, nem todos os referidos institutos se
relll da lei, devem ser ainda parte do Direito, isto é,
podem apoiar, desse modo, nos valores da lei; muitos
quando se coloque, de novo, a questão do seu funda-
" deles não são «exigidos» através da teleologia ima-
mento de validade. E porque a lei e o costume, tendo
[" nente da lei, mas apenas «inspiradas» por ela (18);
I'm conta a especialidade do enquadramento do pro-
) I doutros, nem isso se pode dizer. Como WIEACKER
I blema, se colocam, de antemão, de parte, surge, obri-
/ / acertadamente disse, existe uma «ordem jurídica
gatoriamente, a necessidade de uma reformulação das
)) extra-legal» (19); as modificações no sistema podem,
Iradicionais fontes do Direito (20), a qual pode, no
I I também, partir dela. A maioria das novas formações,
I'ssenciaI, seguir apenas duas direcções: ou se decide
acima referidas, permite exemplificá-Io; em regra e
I'levar a jurisprudência à categoria de fonte autónoma
em todo o caso, elas dispõem de um «apoio» jurídico- do Direito (21), junto da lei e costume, ou se devem
-positivo (assim, para a exceptio dali e a suppressio,
reconhecer critérios de validade «extra-positivos»,
o § 242 BGB) mas que não obtêm, da lei, uma verda-
oferecendo-se então, como tais e antes de tudo, a
deira legitimação. Poder-se-á dizer, em semelhantes
<dcteia de Direito» e a «natureza das coisas».
casos, que os valores de base já estivessem imanentes
A primeira solução é, porém, inconciliável com
à nossa ordem jurídica e tenham, apenas, sido desco-
li posição do juiz na nossa ordem jurídica: a proposi-
bertos, tratando-se portanto, também aqui, apenas de ('fio colocada pelo tribunal como fundamento de uma
(')ecisão não vale por ter sido exteriorizada pelo juiz,
Hlas sim por estar convincentemente fundamentada,
quanto não conste do título; o § 794 fixa a responsabilidade
isto (" porque deriva de critérios de validade bastan-
do subscritor dum título ao portador pela obrigação em causa,
mesmo quando o título lhe tenha sido subtraído. Todas estas lI's, exteriores à sentença judicial. Esta opinião não
figuras tem o seu correspondente no Direito português, excepto ~i() corresponde inteiramente à orientação domi-
o § 405: a cessão de créditos portuguesa, ao contrário da
alemã, é causal e não abstracta.
(18) Assim a formulação acertada de LARENZ, Nikisch-
e") Também 'WIEACKER, ob. cit., retira expressamente
-Festschrift, p. 276. ('f;Sa consequência da descoberta da «ordem jurídica extra-
h'gu!»; cf. p. 15 s.
(19) Cf. o subtítulo do seu escrito Gesetz un Richterkunst,
(" I) No sentido normativo; não é discutível que a sen-
1958: «Zum Problem der aussergesetzlichen Rechtsordnung»
It'!H.:a judicial seja fonte do direito facticamente vigente, isto é,
(<<Para o problema da ordem jurídica extra-legal»).
dt'div<lmente aplicado (para a diferença cf. supra, nota 12).
nante (22), mas também se acolhe ao auto-entendi- !'olltes do Direito, subsidiárias em face da lei e do
mento da jurisprudência como da doutrina: a pri- em;tume (24); a partir delas, e através de um pro-
meira, nas suas decisões, mesmo quando ela, cons- cesso de concretização inteiramente material e muito
cientemente, «aperfeiçoa» o Direito, da ideia de que COlllplicado, desenvolvem-se proposições jurídicas de
as proposições jurídicas de base não obtêm validade conteúdo claro e de alto poder convincente e").
através da sentença judicial (21), mas antes a possuem o que significa isto para a questão aqui colocada?
já previamente sendo, pois, apenas «descobertas»; a Significa, em primeiro lugar, que, para além da lei
última, quando propaga um instituto jurídico novo, (~ do costume, também podem conduzir a alterações
modificativo do sistema, apresenta, desde logo, a pre- d(~ sistema objectivo aqueles princípios gerais do
tensão de que a solução por ela defendida seja Direito que representam emanações da ideia de
Direito vigente e não coloca apenas, à jurisprudência, Direito e da natureza das coisas (26). No entanto,
uma proposta não vinculativa, cuja aceitação, por ela, ('stes critérios não se devem entender de modo
fosse uma questão de mera oportunidade ou, até, de 1I"llistórico e, em simultâneo, estático (27); pelo con-
livre vontade. De facto, fica apenas o segundo cami-
nho e este parece ser inteiramente praticável, apesar
C") Isso significa que os princlplos jurídicos desenvol-
da problemática estar ainda pouco pensada: os prin-
vidos a partir deles só podem vigorar, na medida em que não
cípios gerais de Direito podem ter também o seu contrariem os valores da lei e do costume; cf., mais porme-
fundamento de validade para além da lei, na ideia de lIorizudamente, CANARIS, ob. cit., p. 95 S.
Direito, cuja concretização histórica eles largamente ("Ií) No tocante a singularidades no campo dos exem-
representam, e na natureza das coisas (23); por isso, plos, devo, de novo, limitar-me a uma remissão para as minhas
('onsiderações em ob. cit., p. 93 ss. e p. 160 ss. (cf., também
ambos estes critérios devem ser reconhecidos como
o n~sumo, p. 170 s.).
('!li) Os princípios imanentes à lei não são, como acima
lil: disse, pontos de erupção para modificações no sistema
(22) Na literatura sobre o Direito jurisprudencial, entre o/JjeeUvo; mas existem, materialmente, passagens; sobretudo
os mais recentes, sobretudo HIRSCH, JR 1966, p. 374 S8. com por vezes, a generalidade de um princípio contido na lei só
indicações extensas; ESSER, Festschrift für F. V. HippeJ, 1967, lil' fundamenta convincentemente através do recurso a critérios
p. 95 ss.; H. P. SCHNEIDER, Richterrecht, Gesetzesrecht und como a ideia de Direito ou a natureza das coisas e, pelo menos
Verfassungsrecht, 1969. t\l'SSI$ casos, subjazem-lhe também certas mudanças; cf. tam-
(23) Sublinhe-se, de novo, que, aqui, apenas se visa uma ht'ml infra, nota 38.
esquematização do próprio ponto de vista, o qual foi apre- ("'{) Cf., quanto a isso, sobretudo, ESSER, Grundsatz und
sentado e fundamentado noutro lugar (cf. as remissões nas NOl'/Il in der richterlichen Fortbildung des Privatrechts, passim;
notas 14 e 25) e que se renunciou conscientemente a uma I,AIlI':N/:, Nikisch-Festschrift, p. 299 ss., em especial p. 301 e 305
discussão pormenorizada. " /V1el./lOdenlehre,p. 314 ss.
trário, os princlplOs redutíveis à ideia de Direito só
tI/lo se basearam sempre, em todo o tempo, no prin-
ganham o seu poder concreto em todas as regras atra-
í'lpio da confiança, portanto não «vigoraram» neces-
vés da referência a uma determinada situação histó-
rml'iamente desde o princípio; mas apenas puderam
rica e da mediação da «consciência jurídica geral» (2')
llHpirar ao reconhecimento como fundamentos legí-
respectiva, outro tanto sucedendo com a natureza das
Iimos de aperfeiçoamentos jurídicos depois de uma
coisas (2D). No entanto, através da modificabilidade
dderminada modificação na consciência jurídica geral,
desses «pontos de referência», aqueles critérios assu-
qlH~ tivesse conduzido a um acentuar mais forte de
mem, consequentemente, um carácter relativo, isto é,
villores ético-jurídicos. Outro tanto se demonstra para
mutáve1. Assim, por exemplo, o «princípio da con-
o ('xemplo a partir de uma argumentação retirada
fiança», que nenhuma ordem jurídica pode, total-
da natureza das coisas. Assim, por exemplo, as con-
mente, deixar de considerar (3D), é de considerar como
cepções sobre a «natureza» da relação de trabalho
uma emanação da ideia de Direito; assim, este prin-
sujeitaram-se a fortes mudanças e, assim sendo, o
cípio é justamente um exemplo modelar da capaci-
d(~ver de assistência, dela derivado (31) e as conse-
dade de modificação interna: para soluções claras de
quüncias múltiplas que hoje com este se relacionam,
princípios jurídicos, ele não se deixa precisar a priori,
poderiam não ter sido necessariamente, desde o início
mas antes apenas perante uma certa situação histó-
(d(~ modo objectivo e não apenas por desconheci-
rica, que é determinada, essencialmente, através do
mento) parte do nosso Direito privado, antes tendo
Direito legislado e do estado da «consciência jurídica
ohtido validade apenas num processo paulatino (32).
geral» - e assim se poderá, por exemplo, afirmar que
Por fim, o mesmo sucede, no essencial, com as cláu-
a doutrina de culpa in contrahendo ou da suppressio
!>u/w; gerais «carecidas de preenchimento com valo-
raçiJes», como as remissões para os bons costumes
(28) O conceito é aqui entendido no sentido de LARENZ,
Methodenlehre, p. 192 s.
ou a boa fé, nas quais a própria lei deixa uma mar-
(29) Esta foi caracterizada por RADBRUCH justamente 1'.('1l1para a erupção de valorações extra-legais e,
como fundamento para a ({multiplicidade de formações jurí-
dicas históricas e nacionais»; cf. Festschrift für R. Laun,
1948, p. 158. - Da vasta literatura sobre a natureza das coisas
cf., nos últimos anos, sobretudo SCHAMBECK:,Der Begriff der C' I) Assim, com razão, LARENZ, Nikisch-Festschrift,
1'- :'.H/I I-ó.
Natur der Sache, 1964, com indicações desenvolvidas; ARTHUR
KAUFMANN, Analogie und Natur der Sache, 1965; DRElER, (':!) Para além da mudança na consciência jurídica
Zum Begriff der Natur der Sache, 1965. 1',I'ml, - e, por outro lado, tanto, em parte, provocada por ela
(ao) Em todo o caso, depois de ter, uma vez, tomado ,', >1110. também, agindo sobre ela - outros factares ainda,
consciência dele. ":lfurnllllcnte, o influenciam, como os avanços na protecção
11'1',al do:; trabalhadores e similares.
necessariamente, mutáveis: também aqui existe um vulorativa e não de mera subsunção - só se pode
indício da modificação do sistema objectivo, que I'ntcnder como dialéctica ("r;): ela está na argumen-
decorre de modo inteiramente semelhante ao da con- tação a partir de um princípio geral de Direito cuja
cretização de princípios gerais de Direito (para os vigência pressupõe sempre desde logo, enquanto este,
quais as cláusulas gerais remetem com frequência). por seu lado, também só se concretiza no processo
da sua aplicação (36), - assim, por exemplo, o reco-
nhccimento da doutrina da suppressio ou de novos
institutos superiores não só pressupõe uma modifica-
<;ão da consciência jurídica geral mas também a
exprime, e a estimula (37).
o facto de a mudança de conteúdo do sistema não Em resumo, pode dizer-se o seguinte: as modifica-
ser determinada por princípios retirados da lei e, com «lCS do sistema objectivo reportam-se, no essen-
isso, através das modificações da «consciência jurí-
dica geral», não exclui, por outro lado, que ela seja
fundamentalmente, não «posta» ou «postulada» mas (:Ir;) Fundamental, LARENZ, Methodenlehre, p. 189 ss.
antes «descoberta» ou «encontrada» (33). Mas isso (I!J:{ s.).
significa, no que toca à relação entre o sistema objec- (:I") Nesta dialéctica, a oposição entre o Direito norma-
tivo e o científico, que de novo a mudança do pri- tivo e facticamente em vigor (cf. supra, nota 12) fica, em
meiro precedeu a mudança do segundo (34); também Jl;lrte, superada, uma vez que ambas as formas de validade
li<' influenciam mutuamente, no processo da aplicação do
então, em casos deste tipo, a doutrina e a jurispru-
Díreito. Aliás, a sua ligação é assegurada, sobretudo, pelo
dência exprimem o que, «em si», já vigorava. Torna-se Direito consuetudinário: uma regulação que vigora fáctica,
então particularmente claro que a relação entre o lllas não normativamente, pode obter esta última qualidade
Direito objectivo e o seu conhecimento e aplica- alravés do costume e inversamente: uma regulação que pos-
ção - pelo menos onde se trate de concretização sua, na verdade, validade normativa mas que, por falta de
aplicação, perca a validade fáctica, pode perder também a
v:t1idade normativa, através do desuso consuetudinário, de tal
111()(!O que o Direito consuetudinário, com o tempo, vai impedir
(l3) Assim, com razão, LARENZ, Methodenlehre cit., p. 315. IlIlln nil.o coincidência de ambos os tipos de validade.
(l4) As coisas são diferentes no tocante ao Direito facti- C") Desta dialéctica deve, sobretudo, esclarecer-se que
camente em vigor, ao «law in action», no qual, em regra, a li:: princípios gerais de Direito só são formulados relativa-
nova opinião coincide com a aplicação modificada ou, até, é IIH'IIID muito depois da sua primeira «aplicação» e, com espe-
precedida por esta (para a diferença entre vigência normativa cial r/"(~quência, permanecem muitos anos sob fundamentações
e fáctica cf. supra, nota 12). 11pu rl'lllps.
cial C"), a modificações legislativas, a novas forma-
ções consuetudinárias, à concretização de normas
carecidas de preenchimento com valorações e à
erupção de princípios gerais de Direito extra-legais,
que têm o seu fundamento de validade na ideia de.
Direito e na natureza das coisas. As modificações do
sistema científico resultam dos progressos do conhe- A «mobilidade» do sistema é, muitas vezes, con-
cimento dos valores fundamentais do Direito vigente" fundida com a sua «abertura». Esta utilização lin-
e traduzem, por outro lado, a execução de modifica- guística seria em si inteiramente possível, pois a

"
ções do sistema objectivo. As modificações do pri- palavra «mobilidade» exprime também a proviso-
meiro seguem, fundamentalmente, as alterações do riedade e a modificabilidade do sistema (1); mas não
último; os sistemas objectivo e científico estão se recomenda; o termo foi fixado por WILBURG com
também ligados na dialéctica geral entre o Direito utro sentido (2), e para evitar mal-entendidos, tam-

U
objectivo em vigor e a sua aplicação. bém só se deve usá-Io com o significado que lhe deu
WILBURG. Na sequência, a «mobilidade» será, por
isso, distinguida da «abertura» e só se falará de um
sistema móvel» quando surjam as características
essenciais para o conceito de sistema de WILBURG.

I- AS CARACTERISTICAS DO "SISTEMA MÓVEL», NO CON-


CEITO DE WILBURG

Essas características tornam-se claras, da melhor


maneira, num dos exemplos com os quais WILBURG
desenvolveu a sua concepção: na sua teoria da res-

(1) Utiliza-o, nesse sentido, por exemplo, ZIPPELIUS, NJW


1967, p. 2231, coluna 2; também ZIMMERL, Aufbau des Straf-
(38) Também têm ocorrido, naturalmente, modificações rechtssystems, 1930, prefácio, p. V; d. também as citações
no sistema através da interpretação comum, porquanto e na infra, nota 29.
medida em que também esta passa pela mediação da «cons- (2) Fundamental, Entwicklung eines beweglichen Systems
ciência jurídica gera!» e, por isso, é susceptível de alterações. im Bürgerlichen Recht, discurso do Reitor em Graz, 1950.
ponsabilidade civil. WILBURG recusa procurar um
também bastar a existência dum único dos elementos,
princípio unitário que solucione todas as questões da desde que este apresente «um peso especial» (7).
responsabilidade indemnizatória e coloca, nesse lugar,
Para a mobilidade do sistema, é característico, por
uma muItiplicidade de pontos de vista que ele carac-
um lado, que WILBURG negue a determinação de uma
teriza como «elementos» ou como «forças móveis»; determinada hierarquia entre os «elementos», que
são elas: «1. Uma falta causal para o acontecimento
coloca, pois, ao mesmo nível e, por outro, que eles
danoso, que se situe do lado do responsável. Esta
não devam surgir sempre todos, mas antes se possam
falta tem peso diverso consoante seja provocada pelo
substituir uns aos outros. As características essen-
responsável ou pelos auxiliares ou tenha até surgido
ciais do «sistema móvel» são, pois, a igualdade funda-
sem culpa, como, por exemplo, por uma falha mate-
rnental de categoria e a substituibilidade mútua dos
rial irreconhecível de uma máquina. 2. Um perigo
competentes princípios ou critérios de igualdade-
que o autor do dano tenha originado, através de uma
pois é de facto disso que se trata quando WILBURG
actuação ou da posse de uma coisa e que tenha
fala de «elementos» ou de «forças móveis» (8). Como
levado ao dano. 3. A proximidade do nexo de causali-
dade, que existe entre as causas provocadoras e o
dano verificado. 4. A ponderação social da situação (7) Cf. ob. cit., p. 13.
patrimonial do prejudicado e do autor do pre- (8) Esta terminologia poderia ser pouco feliz. Ambas as
uxpressões recordam muito intensamente categorias das Ciên-
juízo» (3). A consequência jurídica só surge e isto
r.-
cias Naturais (elementos químicos, forças físicas! cf. também
é decisivo - «a partir da concatenação destes ele- ob. cit., p. 17, onde se trata da «energia motora» da lealdade
mentos, segundo o seu número e peso» (4) e é deter- contratual), e com estas não se resolvem problemas jurídicos
minada pelo juiz «segundo a discricionariedade materiais, - o que WILBURG, aliás, não desconhece, de modo
orientada» (5). As «forças» não são, pois, «absolutas, algum (cf., por exemplo, a sua crítica ao método «histórico-
-natural» de JHERING, ob. cit., p. 4 s.). Por isso, teriam sido
de dimensões rígidas, antes decidindo o efeito con-
melhores os termos «princípios de valoração» ou «critérios de
junto da sua articulação variável» (G); pode mesmo justiça», pois se chamaria o significado directamente pelo
nome e, ao mesmo tempo, exprimir-se-ia claramente também
11 posição histórico-metodológica de WILBURG: com efeito, ele
n Cf. ob. cit., p. 125, seguindo Die Elemente des
:;II!lerou largamente as representações da velha jurisprudência
Schadensrechts, 1941, em especial p. 26 ss e 283 ss.; cf. ainda
dos interesses e do «pensamento jurídico causal», nos quais
Zusammenspiel der Krafte im Aufbau des Schuldrechts, AcP
"h, constata um certo parentesco (cf. ob. cit., p. 5) e que de
163, p. 346.
r:l('lo influenciaram a sua terminologia e deve, por isso, ser
(4) Cf. AcP 163, p. 347.
('unlado entre os primeiros e mais avançados representantes
(5) Cf. Entwichlung eines beweglichen Systems, p. 22.
da Illoderna «jurisprudência das valoraç5es» (quanto a esta,
(6) Cf. ob. cit., p. 13.
4'1', I ,AIUo:NZ, Methodenlehre, p. 123 ss.).
se vê com facilidade, isto não tem praticamente nada do pensamento tópico (U) - e isso quer dizer não-sis-
a ver com a abertura do sistema (9): a modificabili- lemático - e pergunta-se, de facto se e até onde,
dade dos valores e dos princípios, característica para neste ponto (12), se pode ainda falar verdadeiramente
este, não precisa, de modo necessário, de ocorrer de um «sistema» ou se um sistema «móvel» não tra-
num sistema móvel, pois os competentes «elementos» duz, antes, uma contradição em si. Típicas do sistema
podem ser inteiramente firmes, e, inversamente, a sào, como foi dito no início (13), as características da
abertura do sistema não tem fatalmente, como conse- unidade e da ordem. A primeira verifica-se, sem
quência, a igual categoria dos seus princípios e a dúvida, em WILBURG. Como deve ser expressamente
renúncia a previsões firmes; um sistema móvel pode, acentuado perante múltiplos mal entendidos, todo o
portanto ser aberto ou ser fechado (10) e um sistema seu pensamento se dirigiu para a elaboração de
aberto pode ser móvel ou rígido. alguns poucos princípios constituintes, de cuja con-
catenação resulta toda a multiplicidade das decisões
singulares; o sistema móvel deve, pois, tornar per-
ceptível a unidade na pluralidade. Isso exprime-se, por
exemplo, na exigência de WILBURG ao legislador de,
através de uma «clara orientação das ideias», conter
Com a sua concepção, WILBURG não quis, de modo a enchente de normas singulares desconexas (14), bem
algum, dar uma ideia global de sistema, mas apenas como, com clareza, na sua polémica contra a orienta-
apresentá-Io como «móveb>; ele insiste também ção do juiz para a pura equidade (1"), que ignora o
inequivocamente no termo «sistema». Não obstante, «conjunto dos princípios gerais» (1G). Perante isso, é
VIEHWEG incluiu-o, sem mais, entre os representantes

(11) Cf. Topik und Jurisprudenz, p. 72 ss.; concordante,


(9) Não procede pois a frequente equiparação do sistema WIEACKER, Privatrechtsgeschichte der Neuzeit, 2." ed., 1967,
«móvel» deWILBURG a um simples sistema «aberto»; mas p. 597, nota 48; cf. quanto a isso, também infra, nota 28.
cf., porém, ENGISCH, Stud. Gen. 10 (1957), p. 187 s. (188); (12) A terminologia, por fim, não é, naturalmente, deci-
WIEACKER, Juristentag-Festschrift, vaI. lI, 1960, p. 7; LARENZ, :iiva, ainda que VIEHWEG, ao exprimir o seu entendimento de
JuS 65, p. 379, coluna 2; MAYER-MALY,The Irish Jurist, voI. lI, WILBURG, não a devesse, simplesmente, passar em silêncio; cf.
parte 2, 1967, p. 375, nota 2. lambém DJEDERICHSEN,NJW 1966, p. 699.
(10) O próprio WILBURG poderia considerar o seu sistema (1:1) Cf. supra § 1 L
móvel, simultaneamente como aberto, pois ele salienta de (1'1) Cf. ob. cit., p. 4.
forma expressa que poderiam surgir também <movas forcas e (I") Cf. ab. cit., p. 22.
pontos de vista»; cf. ob. cit., p. 14. - (111) Cf. ob. cit., p. 6.
irrelevante que VIILBURG se negue a reconduzir todas
a existência de ordem interior. E, por fim, não pro-
as normas jurídicas a um único princípio jurídico,
cede com WILBURG'- e seria entendê-l o mal quando
pois um sistema pode perfeitamente consistir - e em Ia I se pretendesse - o considerar todos e quaisquer
regra consiste - em vários princípios fundamentais. pontos de vista relevantes na Ordem Jurídica, funda-
Mas com a característica da unidade deve, canse- Inentalmente, como iguais; pelo contrário: a ideia
quentemente, afirmar-se também a da ordem, pois
de uma certa hierarquia não pode, de modo algum,
aquela não pode existir sem esta (17); assim, WIL-
ser estranha à concepção de WILBURG, pois em mui-
BURG acentua sempre, também a necessidade de tos problemas particulares, surgem, para os elemen-
«ordem interior» ou de «consistência interna» do los por ele elaborados, pontos de vista secundários,
Direito (18). Isto não está, de modo algum, em contra-
aos quais um pensamento tão diferenciado r como o
dição com o facto de os critérios decisivos surgirem, dele não pode, justamente, renunciar e os quais pos-
como se viu, mutuamente substituíveis; pois nunca suem, perante aqueles, um peso menor. Só dentro
pode um ponto de vista ao acaso substituir qualquer dos princípios fundamentais - ordenadores - existe,
outro ---< tal não seria, de facto, ordem, mas caos- portanto, igualdade de categoria - e mesmo aqui,
antes apenas um elemento de entre um determinado WILBURG não exclui, evidentemente, de modo pleno,
número pode, para uma matéria regulativa concreta, a possibilidade de uma ordenação (19) - ao passo que
colocar-se no lugar de outro, portanto, por exemplo, na relação entre estes e os restantes critérios rele-
para a solução do problema da pretensão de indemni- vantes para um problema singular, se pode falar intei-
zação, apenas um dos quatro factores acima referi- ramente de certa hierarquia (20). Por tudo isto, a
dos, pode ir para a posição de um outro. E tão-pouco
a igualdade fundamental nas categorias dos critérios
de justiça competentes se coloca em contradição com
('9) Cf., por exemplo, ob. cit., p. 15, onde WILBURG
a característica da ordem, pois a igualdade na orde- (perante um problema de enriquecimento) quer, «em caso de
nação é, ainda, uma forma de ordem. Apesar da ideia dúvida», ponderar a situação patrimonial dos implicados, por-
de uma certa hierarquia estar ligada ao conceito (anto apenas onde os restantes critérios não permitam uma
tradicional de sistema, esta categoria não surge irre- :;o!ução justa, isto é, apenas subsidiariamente, o que implica,
nunciável, desde que a sua falta não torne possível sem dúvida, uma relação de hierarquia. Mais tarde, também
na responsabilidade civil, WILBURG exprimiu certas dúvidas
quanto à admissibilidade de uma consideração igualitária da
::iluação patrimonial; cf., por exemplo, AcP 163, p. 346, nota 2.
('7) Mas, inversamente, a ordem é possível sem unidade;
("O) Se tal é, efectivamente, a opinião de WILBURG tor-
cf. também supra, p. 12 s.
na-se difícil de decidir em definitivo, por falta de uma posição
('8) Cf. ob. cit., p. 12 e p. 22, respectivamente.
lIuivoca quanto a esta questão.
concepção de WILBURGmerece, com razão, a qualifi- 11GB) (*), etc. Não há aqui qualquer espaço para uma
cação de sistema (2]), mesmo quando não se deva ponderação de critérios «de acordo com o número
desconhecer que se trata aqui de um caso limite. e o peso» e isso vale, no fundamental, também para
lodas as outras partes do nosso Direito privado e da
nossa ordem jurídica.

1. A prevalência fundamental das partes rígidas


do sistema

o presente trabalho ocupa-se da problemática do Mas isso, contudo, só em princípio! O Direito


sistema perante o Direito vigente alemão, em especial 11Icmão vigente da responsabilidade civil compreende
o Direito privado alemão; põe-se pois, a questão das igualmente um contra-exemplo que torna clara a
relações dele com o sistema de WILBURG.A consi- necessária limitação: a erupção do princípio do
deração da nossa ordem jurídica não deixa dúvidas tudo-ou-nada no § 254 BGB. Segundo esse preceito,
quanto à resposta: o sistema do Direito alemão o montante da indemnização depende «das circuns-
vigente não é, fundamentalmente, móvel mas sim tâncias», desde que tenha havido igualmente culpa do
imóvel. Pois ele atribui, em regra, aos princípios sin- lesado (**) ou - como hoje, em geral, se reconhece-
gulares, âmbitos de aplicação delimitados, dentro dos tenha actuado também um perigo imputável do
quais eles não são substituíveis e prefere a formação empreendimento. Surge aqui, exactamente, o quadro
rígida de previsões normativas, que exclua uma característico do sistema móvel deWILBURG: devem
determinação variável d::ls consequências jurídicas, ponderar-se vários factores entre si, podendo um
em função da discricionariedade do juiz, ainda que substituir o outro e sem que exista entre eles qual-
«vinculada». Assim, para manter o exemplo da res- quer hierarquia rígida. Assim, por exemplo, em vez
ponsabilidade civil, está claramente determinado no
Direito alemão quais são as competências do princí- (*) Notas do tradutor: o § 829 do BGB determina, em
pio da culpa e do princípio do risco, sob que pres- síntese, que o inimputável autor de certos danos possa, não
1
supostos se pode, excepcionalmente, considerar a (>bstante, ser obrigado a indemnizar segundo a equidade, desde
situação patrimonial dos implicados (cf. § 829 que não seja possível obter tal indemnização do terceiro obri-
III 1:11<10 a vigiá-Ia e na condição de o inimputável em causa não
I II
ficar privado dos meios materiais necessários.
(21) Cf., também, BYDLINSEI, aVB!. 1965, p. 360; DIEDE- C"*) O § 254 do BGB, cujo conteúdo é explicado no
RICHSEN, NJW 66, p. 699. I(~;-(lo, corresponde assim ao artigo 570 °/1 do Código Civil.
I

II

1 'J
.....
~""- """"".".~.=,llJji'l!l!_
do concurso de culpas, pode operar também um p risco; por outro lado, também não relevam uns
perigo do empreendimento; uma culpa do lesado leve quaisquer pontos de vista - o juiz não pode, sem
pode, através da ocorrência, na esfera do lesado, de dúvida, considerar o estado civil ou a nacionalidade
circunstâncias agravantes do perigo, levar também a dos implicados. e apenas pode considerar as relações
uma diminuição equivalente na sua pretensão putrimoniais no caso excepcional de aplicação analó-
indemnizatória; de igual modo, uma grave culpa do gica do § 829 BGB - mas apenas critérios de imputa-
lesado (22), ou um risco de empreendimento «especial» ç[ío específicos, geralmente rígidos, com a intensidade
ou «elevado» podem compensar em parte uma culpa da culpa, a perigosidade de um empreendimento ou
pesada, etc.; também um risco concorrente do de uma coisa, o grau de adequação ou a «proximi-
empreendimento pode actuar de modo a diminuir a dade» do nexo de causalidade (24), - portanto aqueles
pretensão de indemnização perante a responsabilidade princípios que também dominam o nosso Direito da
pela culpa (23), na ocorrência de culpa leve, perante responsabilidade civil. O seu sistema compreende
a negligência grosseira e, em certas circunstâncias, assim, junto de uma «imobilidade» de princípio, um
até em face do dolo, e, inversamente, a responsabili- scctor no qual os pontos de vista valorativos compe-
dade pelo risco não é necessariamente excluída pela tentes são «móveis}).
culpa do lesado e a responsabilidade por «culpa Outro tanto acontece noutros âmbitos. Encon-
levíssima» não é, sem mais, afastada por grave culpa tram-se numerosos exemplos da mobilidade do sis-
do mesmo lesado. Não é possível confeccionar uma tema, em especial onde as previsões normativas
previsão normativa rígida, mas apenas ponderar entre rrgidas se complementam e acomodam através de
si determinados critérios «de acordo com o número cláusulas gerais: para determinar se um despedimento
e o peso», no sentido de WILBURG, sem que se fixe é anti-social, se existe um fundamento importante,
uma relação de hierarquia, por exemplo entre culpa se um negócio jurídico ou um comportamento são
contrários aos bons costumes, etc., é necessário pon-
derar entre si determinados pontos de vista «segundo
(22) Pois a culpa e a sua graduação são apenas uma das
circunstâncias relevantes, no cálculo do montante da indemni-
o número e o peso», sem uma relação hierárquica
zação; quanto à questão de quais os factores competentes,
cf., principalmente LARENZ, Schuldrecht A. T. 9. ed. 1968,
ft

§ 15 I e; EssER, Schuldrecht, 30 ed. 1968, § 47 IV e VII;


ft
(24) Ainda não está plenamente esclarecido que factores
SOERGEL-SCHMIDT, 10." ed. 1968, § 254, anoto 7 ss. se devam considerar, em cada caso; mas fica fora de questão
(23) Esta é hoje, a doutrina inteiramente dominante; cfo, que se trata sempre, aí, de pontos de vista de imputação e
por exemplo, LARENZobo cito, em b e ESSER obo cit., em 5, que não se deve aplicar um qualquer «topos». Cf., quanto à
com outras indicações. Ilroblemática, a literatura indicada supra, nota 22.
firme (2õ). No entanto, a formação rígida de proposi-
algo de específico para ele, antes sendo imaginável,
ções normativas>- pode-se dizê-lo sem mais - repre-
senta a regra; a «mobilidade» traduz a excepção G). e também, num sistema «rígido». Trata-se da exigência
de WILBURGde uma diferenciação mais marcada e
O Direito positivo compreende, portanto, partes do
da sua crítica à absolutização de um determinado
sistema imóveis e móveis, com predomínio básico
princípio. Deve-se, sem dúvida, concordar com ele - e
das primeiras.
já acima (27) se considerou justamente isso como uma
característica essencial da função sistematizadora dos
lV - o SIGNIFICADO LEGISLATIVO E METODOLÓGICO DO
princípios -- em que estes não têm uma pretensão
SISTEMA MóVEL
de validade exclusiva, antes surgindo numa comple-
mentação mútua, portanto numa concatenação e,
Do ponto de vista metodológico e jusfilosófico não além disso, carecem, para a formação de proposições
jurídicas, de uma concretlzação diferenciadora através
se pode, porém, ficar por este resultado. Cabe antes
de critérios de valoração novos e autónomos. Esta
ainda indagar como se deve julgar a concepção de
consideração surge tão acertada e encontra um reco-
WILBURG,independentemente da sua realização mais
nhedmento tão geral - não por último sob a impres-
ou menos extensa numa ordem jurídica concreta e
são dos próprios trabalhos de WILBURGsobre o enri-
que significado ela tem, em consequência, de lege
quecimento sem causa e a responsabilidade civil- na
jerenda, isto é, para o legislador.
dogmática civil e actual quanto pouco uma tal dife-
renciação mais acentuada se liga justamente a um
sistema móvel (8). Quando WILBURG, por exemplo,
1. O sistema móvel e a necessidade de uma diferen-
ciação mais marcada
(27) Cf. p. 53 ss. e 55 ss.
(28) É totalmente incompreensível o facto de VIEHWEG,
Para responder deve-se, em primeiro lugar, isolar ob. cit., p. 72 ss., em especial p. 74, ver na luta de WILBURG
uma qualidade que também é característica do «sis- contra a absolutização de determinados princípios uma {<prova
tema móvel» deWILBURG, mas que não representa da estrutura tópica da civilística actua1». Que um princípio
deva aspirar sempre à exclusividade não vale apenas para o
(2õ) O «sistema móvel» não se deve, contudo, identificar sistema considerado por VIEHWEG como lógico-axiomático; uma
com as cláusulas gerais; cf., mais pormenorizadamente, infra certa tendência para a redução a alguns poucos princípios
-p. 82 e 85. antes é também inerente a este (como a qualquer) sistema e
(2G) Não apenas numericamente, mas, sobretudo, quanto corresponde ao seu ideal. A elaboração de alguns e poucos
.à sua importância. princípios constitutivos do sistema é, como se diz no texto.
justamente a intenção de WILBURG, de tal modo que essa
exige, no processo executivo, substituir o princípio pio da igualdade de todos os credores perante a
rígido da igualdade de todos os credores que não falência, através de excepções claramente delimitadas;
tenham garantias reais, através de uma concatenação dever-se-ia mesmo dizer que uma tal configuração no
«mais elástica» de diferentes princípios jurídicos e processo executivo, na verdade diferenciadora mas
quando ele considera como tais o ponto de vista do rígida, é essencialmente justa e que não se poderia
«prosseguimento do valor», da concessão não cuida- renunciar a uma hierarquização rígida entre os diver-
dosa de crédito e da protecção social perante «peque- sos tipos de crédito a executar e, com isso, também
nos» credores (29), então pode-se obter esse objectivo aos diversos pontos de vista valorativos. A diferen-
através de um sistema rígido, tão bem como através ciação e a luta contra a falsa absolutização de princí-
de um móvel: pode-se, inteiramente, confeccionar pios singulares não pressupõe, necessariamente, a
previsões normativas rígidas (como já acontece, no mobilidade (31), e assim a grande diferenciação do
processo executivo alemão, a propósito da prevalência pensamento de WILBURG não afirma, como tal, ainda
da indemnização no § 46 KO (30) ou a propósito de nada de essencial sobre o valor de um sistema
determinados credores especialmente dignos de pro- móvel.
tecção, no § 61 KO) (*) e, com isso, limitar o princí-

asserção de VIEHWEG surge como particularmente infeliz; se,


para isso, ele tivesse recorrido ainda à renúncia de WILBURG Apenas as especificidades do sistema móvel são
à formação de previsões normativas firmes, nem assim VIEHWEG
decisivas, isto é, a ausência de uma formação rígida
teria podido demonstrar que a jurisprudência, no seu conjunto,
apresenta uma estrutura tópica, mas sim que se deveria limitar de previsões normativas assim como a permutabili-
a cláusulas gerais e a fenómenos semelhantes (com isso ele dade livre e a igualdade fundamental de categoria dos
ter-se-ia aproximado da verdade; cf., mais pormenorizada-
mente, infra § 7 II 2).
(29) Cf. ob. cit., p. 6 ss, na sequência de aVEl 1949, uata de 15 de Julho de 1986; o § 46 da KO confere à pessoa
p. 29 ss. que tivesse o direito de separar, da massa falida, determinada
(30) O facto de essa formulação corresponder, no parti- eoisa, a faculdade de exigir, dessa mesma massa, a contra-
cular, às exigências de WILBURG - e com certeza que não!- prestação, quando a coisa em causa tenha sido alienada; por
não releva para a problemática dos princípios fundamentais, seu turno, o § 61 da KO estabelece a ordem da graduação dos
aqui em causa. eréditos, na falência.
(*) Nota do tradutor: a sigla KO corresponde a Kon- (31) Mas antes a abertura, na medida em que a exigência
hursordung, a lei alemã das falências de 10 de Fevereiro de de uma diferenciação mais marcada não se dirija, apenas, ao
1877, com alterações subsequentes, das quais a mais recente legislador mas também ao aplicador do Direito.
princípios de valoração. A primeira característica, em
especial, sugere a questão de a identificar de acordo 3. A posição intermédia do sistema móvel entre
com a relação entre previsões rígidas e cláusulas a cláusula geral e a previsão normativa rígida
gerais. Com isso não se entenderia, contudo, WIL- e a necessidade de uma ligação entre estas três
BURG (32). É característico para a cláusula geral o ela possibilidades de formulação
estar carecida de preenchimento com valorações,
isto é, o ela não dar os critérios necessários para a Embora o sistema móvel não aparente a mesma
sua concretização, podendo-se estes, fundamental- estrutura das cláusulas gerais carecidas de preenchi-
mente, determinar apenas com a consideração do caso mento com valorações, não se deve negar um certo
concreto respectivo: a aspiração de WILBURG, pelo parentesco com estas (35): o sistema móvel ocupa uma
contrário, é de determinar, em geral, os «elementos» posição intermédia entre previsão rígida e cláusula
competentes, segundo o conteúdo e o número e con- geral. Daqui provêm as suas vantagens e as suas fra-
feccionar a sua «relação de interpenetração» de modo quezas. No que toca às últimas, é evidente que um
variável, deixando-a independente das circunstâncias sistema móvel garante a segurança jurídica em menor
do caso (I:'). Assim WILBURG bate-se também expres- medida do que um sistema imóvel, fortemente hierar-
samente contra as decisões segundo a mera equidade quizado com previsões normativas firmes. Nos âmbi-
porque - num argumento altamente decisivo para o tos onde exista uma necessidade de segurança jurí-
seu pensamento -lhe falta a «presença de princípios dica mais elevada, deve-se preferir o último e o
fundamentais» (34); as cláusulas gerais, pelo contrário, próprio WILBURG não iria, por certo, dissolver as
são sempre caracterizadas, e pelo menos em parte, ordenações firmes do Direito cambiário e dos Direitos
com razão, como «pontos de erupção da equidade». Reais (36) ou sequer do Direito das Sucessões ou das
Sociedades num sistema móvel. Deve-se também, pen-
sar que seria exigir demasiado do juiz se deparasse,
('32) A crítica de ESSER, AcP 151, p. 555 s. e RabelsZ 18
sem excepção, com um sistema móvel ficando por
(1953), p. 165 ss. não faz por isso, na minha opinião, inteira isso, em cada caso, perante as dificuldades da ponde-
justiça a WILBURG. ração entre o relativamente frequente número elevado
(33)WILBURG não se desliga, apenas, da situação do
caso concreto mas sim «à situação do caso concreto, com
consideração pelos pontos de vista apresentados e co-actuantes» (35) Quanto ao significado do sistema móvel para a con-
de acordo com a sua formulação característica; cf., ob. cit., cretização de cláusulas gerais cf. também infra p. 85, nota 45
p. 17, 13, 18 e passim.
(34) Cf. ob. cit., p. 6; cf. também p. 22.
I" sobretudo, p 152 s.
(lc,) Quanto a este cf., expressamente, ob. cit., p. 4.
de «elementos» (37). E finalmente, não se deve ainda
ignorar que, para além do valor da segurança jurí- então é necessário cuidado. Por um lado, uma certa
dica, também o da justiça pode entrar em contra- individualização é também possível através de uma
dição com um sistema móvel; pois a tendência «gene- forte diferenciação de um sistema rígido intensamente
ralizadora» do princípio da justiça, que resulta do hierarquizado e, por outro, o sistema móvel tão-pouco
princípio da igualdade, contraria cada consideração e
permite uma individualização ilimitada Sa), uma vez
das circunstâncias do caso singular e, com isso, tam- que é constituído por um número limitado de «ele-
bém uma ponderação de «elementos» - ainda que mentos». Na verdade, não se pode ordenar totalmente
fixados genericamente. o sistema móvel em nenhuma de ambas as tendências
A justiça, no entanto, não remete apenas para da justiça: ele reporta-se à tendência generalizante
uma tendência generalizadora mas, também para uma na medida em que determina, em geral os competen-
individualizadora :(38): compreende-se que se recorra tes critérios de justiça, e comporta a vertente da
a esta para justificar o sistema «móvel». Mas ainda tendência individualizadora porquanto faz depender
as consequências jurídicas concretas da concatena-
ção, no caso singular, desses pontos de vista. Com
('17) 'WILBURG apercebe-se inteiramente dessa obieccão
isso, transparece a sua maior vantagem: o sistema
(cf. ob. cit., p. 23) e replica que a posição do juiz é aind~ ~ais
difícil «quando ele deva aplicar princípios que conduzam a móvel representa um compromisso particularmente
consequências inaceitáveis». Isto só em parte é convincente; feliz entre os diversos postulados da ideia de
em primeiro lugar, consequências verdadeiramente inaceitáveis Direito - e também a segurança jurídica sempre é
em leis pensadas de modo razoável são um caso excepcional; garantida em maior medida do que perante uma mera
em segundo lugar pode-se-lhes opõr com frequência, de modo cláusula de equidade - e equilibra a «polaridade» (9)
inteiramente legítimo, com auxílio das cláusulas gerais relati-
deles numa solução ponderada e «intermédia»; tanto
vizadoras do Direito «estrito»; em terceiro lugar a aceita cão
de uma grande injustiça pode muito bem, perant~ outros v;lo- se afasta do rigorismo das normas rígidas como da
res jurídicos como, em especial, a segurança jurídica, ser o ausência de contornos da pura cláusula de equidade.
mal menor; e em quarto lugar não resulta necessariamente Mas faltam-lhe, como já foi dito, pelo menos em
da preocupação de WILBURG, que o sistema deva, no sel; parte, as vantagens daquelas outras modalidades;
todo, ser móvel, mas apenas que ele deve compreender partes
móveis (e também verdadeiras cláusulas gerais) como «vál-
assim, a consequência só pode ser o edificar o Direito
vula» (cf. também, no texto). a partir de uma concatenação de todas estas possibi-
('38) Quanto a essas duas tendências da justica e ao seu
condicionamento mútuo cf., principalmente, HENKEL: Recht und ("sa) Ou já não haveria qualquer sistema!
Individualitat, 1958, p. 16 ss. e Einführung in die Rechtsphilo- ("9) HENKEL, ob. cit., p. 345 ss., em especial p. 349 ss.,
sophie, p. 320, 323 ss. (325), e 351 ss. demonstrou convincentemente que se trata de «polaridade» e
11:10 de verdadeiras antinomias.
lidades de formulação: entre a formação rígida de limitação essa que é indispensável para a responsa-
previsões normativas, por um lado, e a pura cláusula bilidade pelo risco, por ser necessária para o cálculo
de equidade, do outro lado, figura o sistema móvel. do risco e a possibilidade de efectuar seguros (42)?
Não é de prescindir, de modo algum, das primeiras, Torna-se, aqui difícil contestar que a regulação legal
pelo menos em certos âmbitos, como acima se expli- «rígida» seja o mal menor. - Mas, inversamente,
cou, podendo estas representar a solução mais ade- também não se deve desconhecer que a plena consi-
quada, em especial quando o sistema «imóvel» apre- deração de todas as circunstâncias do caso concreto
sente fortes diferenciações. Recorde-se o exemplo, possa ser igualmente razoável e, por isso, não deve
acima (40) discutido, da falência ou, também, o exem- ser totalmente excluída pelo legislador; a «equidade»
plo de WILBURG retirado do âmbito da responsabili- é, também, um valor jurídico específico (43); apenas
dade pelo risco: perante a especial alta perigosidade determinações inteiramente abertas como, por exem-
de uma coisa, por exemplo, de um avião, a excepção plo as cláusulas de imputabilidade a comportam.
de força maior não exonera o proprietário, mas A multiplicidade dos postulados singulares da ideia
perante um objecto menos perigoso, como um veículo de Direito solicita, por isso, o legislador a fazer uso
automóvel, a ocorrência de um evento «inesperado» de todas as referidas possibilidades formulativas e
exterior já actua, pelo contrário, em termos de excluir apenas uma escolha criteriosa entre elas dá bons
a responsabilidade (41); deve uma tal diferenciação resultados perante o problema da «polaridade» (39)
dos fundamentos da exoneração segundo o grau - de dos mais altos valores jurídicos. Não se pode, porém,
perigosidade do objecto - que surge razoável e, até, dizer em geral qual a solução preferível; isso depende
inteiramente «imanente ao sistema» do Direito ale- da estrutura particular da matéria em causa e do
mão - ser, efectivamente, deixada ao juiz de cada valor que lhe subjaza (44). Neste campo cabe, ao sis-
caso ou será do interesse da segurança jurídica como
(42) Neste problema poderá residir uma das objecções
da observância da regra da igualdade, aqui não essen-
principais contra uma cláusula geral de responsabilidade pelo
cialmente adequada, que o legislador se ocupe delas risco; esta deveria, pelo menos, ser complementada por uma
de modo generalizador, de acordo com traços previ- série de previsões normativas específicas que fixassem, de
sivos claros (avião, combóio, automóvel, etc.)?! modo diferenciado, os limites máximos da responsabilidade e
E como fica, por fim, a limitação da responsabilidade, outras questões especiais, e assim, ao mesmo tempo, pudessem
também oferecer bitolas para a concretização da cláusula geral.
através de limites máximos numericamente fixados , (43) Assim, expressamente e com razão, HENKEL, ob. cit.
j), 324.
(40) Cf. p. 8I. Não se pode aqui desenvolver uma discussão porme-
(44)
(41) Cf. ob. cit., p. 13. norizada sobre o mérito e o desmérito das cláusulas gerais e
tema móvel, um papel especialmente importante uma
vez que ele, como se disse, dá, de modo muito feliz,
um meio termo entre as previsões normativas firmes
e as cláusulas gerais e confere uma margem quer à
tendência generalizadora da justiça, quer à individua-
lizadora. É, porém, apenas uma das várias possibilida-
des formulativas a considerar não devendo, por outro
lado, sobreestimar-se a sua capacidade. Com esta
limitação pode-se, no entanto, dizer que a ideia de
um sistema móvel, tal como foi desenvolvida por
o conceito e as qualidades do sistema jurídico
WILBURG, constitui um enriquecimento decisivo do ()stão suficientemente esclarecidas para se poder pas-
instrumentário quer legislativo quer metodológico (45) sar à questão que, em última análise, é decisiva para
devendo, por isso, incluir-se sem dúvida entre as o significado do pensamento sistemático na Ciência
«descobertas» jurídicas significativas (46). do Direito: a da relevância «prática» do sistema. De
facto, uma pesquisa sobre a problemática do «pensa-
lnento sistemático e conceito de sistema», tornar-se-ia
sobre a extensão conveniente do seu âmbito de aplicação; cf., pouco significativa se não implicasse tomadas de
sobre isso, por todos, HEDEMANN, Die Flucht in die Gene- posição que assumissem, também, importância «prá-
ralklauseln, 1933; F. V. HIPPEL, Richtlinien und Kasuistik im tiea»; de facto, a Ciência do Direito é, como poucas
Aufbau von Rechtsordnung, 1942;mais recentemente, sobretudo
HENKEL, ob. cit., p. 357 ss. e 360 ss. outras Ciências, imediatamente dirigida e preparada
(45) Metodologicamente, deve-se distinguir, quanto ao para efeitos «práticos»; a questão do seu «valor na
significado, as partes móveis do sistema das cláusulas gerais vida», para utilizar a linguagem da jurisprudência dos
e, nessa linha, interpretá-Ias restritivamente, admitindo, por
interesses, coloca-se, assim, no meio da discussão do
exemplo, no § 254 BGB, apenas pontos de vista específicos de
imputação; por outro lado, deve-se conferir à ideia de sistema Hisl:ema. Neste sentido, a «praxis» é a aplicação do
móvel também um papel particular na própria concretização [)ireito aos factos concretos; o problema reside, então,
das cláusulas gerais; d., quanto a isso, infra, p. 152 ss. Nota 110 explícitar de modo preciso, se cabe ao sistema um
do tradutor: recorde-se que o § 254 do BGB se reporta à culpa
qualquer significado no tocante à obtenção das pro-
do lesado.
(46) O conceito de «descoberta jurídica» provém de posiçiles jurídicas convenientes.
DOLLE que, no entanto, o exemplificou em dimensões dogmá- Esta possibilidade é negada, com convicção, por
ticas; cf. a intervenção perante o 42. deutschen Juristentag, ll1l1a opinião muito difundida. Segundo ela, o sistema
voI. II das «Verhandlungem>,Tübingen, 1959.
11:\0 possui qualquer «valor na vida» e, em especial,
qualquer «valor de conhecimento» e>,
nem qualquer Iliio poderia ganhar qualquer alento ao aceitar um sis-
valor para a obtenção do Direito; apenas valor de tema pré-elaborado» (i); pois: «O sentido de um tal
«representação ou de ordenação». Este entendimento sistema poderia ser múltiplo: ele serve objectivos
do sistema remonta à jurisprudência dos interesses didácticos, serve a repartição exterior e, com isso,
mais antiga e) , podendo, contudo, ainda hoje contar a orientação àcerca da ordem jurídica, serve, na polí-
com apoio predominante. Como representativa cite-se, (ica legislativa, a elaboração apurada das leis... e
desde logo, a tomada de posição do KRIELE. Ele pre- coisas semelhantes. Só não serve a interpretação (ü)>>.
tende que hoje «as tentativas de obtenção do Direito,
Também neste ponto, a discussão é confundida
a partir de um sistema, através da dedução, desem-
pelas obscuridades quanto ao conceito de sistema
penham na prática, apenas um papel relativamente
subjacente. Tudo o que é alegado pelos adversários
pequeno» (3) e que, de facto, «a obtenção do Direito
do pensamento sistemático respeita, designadamente,
a apenas dois tipos bem determinados de sistema: ao
(1) No sentido de conhecimento do que seja o Direito sistema «externo» ou ao sistema axiomático-dedutivo.
vigente; em compensação, não se nega, em geral, ao sistema, Assim, a polémica de HECK contra a «construção sis-
um valor didáctico no sentido da facilitação do entendimento
da lei. temática» (6) prende-se, imediatamente, com a luta da
(2) Cf., principalmente, M. V. RÜMELIN, Bernhard Wind- jurisprudência dos interesses contra o «método da
scheid und sein Einfluss auf Privatrecht und Privatrechtswis- inversão», utilizado pelos partidários da jurisprudên-
senschaft, 1907, p. 40 ss. e Zur Lehre von der Juristischen cia dos conceitos e só pode, por consequência, visar
Konstruktion, ArchRWirtschph. XVI (1922/23), p. 343 ss.
o sistema lógico-dedutivo que subjaz àqueles (7).
(349 ss.); HECK, Das Problem der Rechtsgewinnnung, 1912,
2." ed. 1932, p. 9 ss. e Begriffsbildung und Interessenjurispru- E também KRIELE deveria ter em vista um conceito
denz, 1932, p. 66 S8., 84 8S., 91 S8. e 188 ss.; STOLL, Begriff de sistema muito semelhante, pois ele fala, expres-
und Konstruktion in der Lehre von der Interessenjurisprudenz,
Festgabe für Heck, Rümelin und Schmidt, 1931, p. 60 ss.
(p. 68 s., 76 ss. e 112 ss.). A óptima justificação do pensamento (1) Ob. cit., p. 97.
sistemático, perante os ataques da jurisprudência dos interesses,
(li) Ob. cit., p. 98 (os itálicos foram acrescentados).
feita por KRETsCHMAR,Über die Methode der Privatrechtswis-
(n) Cf., principalmente, Begriffsbildung, p. 66 ss. (69 s.)
senschaft, 1914, p. 42 ss. e Jher. Jb. 67, 264 sS., 273 ss. e 285 ss.,
(~ 188 ss.
nunca obteve, infelizmente, uma atenção bastante. Cf., mais por-
menozidamente, também BAUMGARTEN,Juristische Konstruktion (7) Com isso, HECK equipara-o também, simplesmente,
und Konstruktionsjurisprudenz em: Festgabe für Speiser, 1926, 110 si:;tema «externo», o que torna a sua polémica ainda menos
p. 105 ss. I'xada; d., por exemplo, ab. cit., p. 196 (refere-se, aí, aliás, o
('3) Cf. Theorie der Rechtsgewinnung, 1967, p. 97. r:i,:t<'lila externo da Ciência e não o da lei).
samente, de «dedução» a partir de um sistema (8) e «interno» de uma ordem jurídica como axiológico ou
refere-se ao sistema «axiomático)} (9). Finalmente, lelcológico (10); o· argumento sistemático é, então,
ainda hoje, o pensamento sistemático é, na maioria apenas uma forma especial de fundamentação teleoló-
dos casos, equiparado sem mais e de forma totalmente I:íca e, como tal, deve, desde logo, ser admissível e
acrítica, à «jurisprudência dos conceitos»; reside aí n.'lcvante. Pode-se, nessa linha, falar de uma «capaci-
uma das objecções mais preferidas para afastar um dade de derivação teleológica ou valorativa» do sis-
argumento sistemático considerando-o, sem discussão lema, desde que se enfoque que a «derivação» não
de maior, como «conceptual» e, por isso, ultrapas- NU deve entender no sentido de dedução lógica mas
sado:-- num processo que gosta de passar por HiITIno de ordenação valorativa. Isto não se deve
moderno, mas que no estado actual da doutrina, antes reconhecer apenas para o sistema, acima proposto,
surge antiquado. Como se viu no parágrafo segundo, de princípios gerais de Direito, mas sim para qualquer
existe uma multiplicidade de conceitos diferentes de sistema teleológico, em especial para os dos corres-
sistema e não se pode, de modo algum, afirmar de pondentes conceitos ou valores, nos quais os resul-
antemão, que a crítica feita, com razão, à possibili- tados práticos, perante uma correcta configuração
dade de obtenção do Direito a partir de um sistema Histemática que corresponda à articulação dos dife-
lógico ou axiomático-dedutivo proceda, sem mais, em rentes sistemas teleológicos entre si (11) devem ser
relação aos restantes tipos de sistema. sempre os mesmos (12).
Pelo contrário! O significado do sistema para a Com isto, apenas se evidenciou a possibilidade
obtenção do Direito torna-se evidente quando se fundamental de aproveitar o sistema para a obtenção
subscreva a opinião, aqui defendida, do sistema do Direito; trata-se, agora, de elaborar o seu signifi-
cado particular nesse domínio, bem como em especial
(8) Cf. ob. cit., p. 97. ns cspecificidades do pensamento sistemático perante
(9) Cf. ob. cit., nota 1. No entanto, os exemplos dados outras formas de argumentação teleológica. Também
por KRIELE, na nota 2, depõem em sentido contrário, uma vez nqui se pode, de novo, trabalhar com os dois elemen-
que os seguidores das opiniões ai citadas não podem partir de
um sistema axiomático dedutivo. Infelizmente, KRIELE não
debateu, em pormenor, as teorias por ele citadas e assim não
se reconhece, com clareza, onde vê as fraquezas delas. As ('0) Cf. supra, § 2 II 1.
objecções por ele inseridas no texto procedem apenas contra (l') Cf., quanto a isso, supra § 2 II 2 a.
um sistema axiomático-dedutivo; por isso, é de respeitar que (' ,,) Ê evidente que o mesmo argumento sistemático tanto
também KRIELE incorra no mal-entendido de, quando se trate 111' pode obter, por exemplo, a partir do conceito de negócio

de um sistema jurídico, apenas referenciar uma realidade iurfdico teleologicamente entendido, como do princípio da auto-
daquele tipo. ',"mia privada.
tos do conceito de sistema: o da ordenação teleoló-
l'Ill' sem significado prático, para a jurisprudência dos
gica e o da defesa da unidade valorativa e da ade-
conceitos, a discussão sobre a qualificação de um
quação do Direito.
determinado acto das partes como negócio jurídico;
pelo contrário, quando se pergunta pela natureza dos
('sponsais, pergunta-se se estes se devem considerar
1- ORDENAÇÃO SISTEMÁTICA E DETERMINAÇÃO DO CON-
TEÚDO TELEOLóGICO
como um contrato, como uma pura relação de facto
ou como uma relação obrigacional «legal» especial,
baseada na confiança e se, em consequência, o rom-
Quando se «ordena sistematicamente», de certa
pimento dos esponsais representa uma violação con-
forma, um fenómeno jurídico, está-se, em regra, com
tratual, um delito ou uma quebra na confiança (Ir5).
isso, a fazer uma afirmação sobre o seu conteúdo
Outro tanto acontece na célebre querela entre a
teleológico. Por exemplo, quando se qualifica um pre-
I (~oria da criação e a teoria contratual (entre
ceito como uma previsão de responsabilidade pelo
outras (17» àcerca da «natureza» do acto de forma-
risco, de responsabilidade pela aparência jurídica ou
<';üode um título de crédito.
de responsabilidade por facto lícito ou quando se
No entanto, este processo de «determinação da
caracteriza uma pretensão como pretensão sub-roga-
essência» não é, por assim dizer, um processo de
tória, não se servem, apenas, «escopos de represen-
s(~ntido único, pelo qual o objecto seja, primeiro,
tação ou de ordenação» (13). Pelo contrário: com isso,
lota!mente desconhecido e, depois, de repente, atra-
solicitam-se de imediato os valores e, em especial,
V(~S da ordenação sistemática, se tornasse compreen-
os princípios gerais da ordem jurídica que estejam
por detrás das normas questionadas. Uma querela
sobre uma ordenação sistemática é, por isso, em ('n) Cf., também BEITZKE, Festschrift für Ficker, 1967,
p. R4, que, com razão, pergunta qual das teorias pode «dar
regra, também uma querela sobre a «essência» de
lima melhor explicação da essência dos esponsais e das suas
um fenómeno jurídico (14), isto é, predominantemente ('ollscquências jurídicas». Não se deve entender aqui a «expli-
àcerca do seu conteúdo valorativo dentro do Direito C;]I;i:íO»como uma derivação causal a partir da teoria - um
vigente (15). Por exemplo, não seria falacioso conside- 11Ial·cntendido no qual caiu, em especial, a velha jurisprudência
do:; interesses - mas antes como descoberta do sentido inte-
(13) Cf., na sequência, vários exemplos. rior do instituto e da adequação (valorativa) das consequências
(14) Assim, com razão, ENGISCH, Stud. Gen. 10 (1957), illrídicas singulares.
p. 188 S. (I 'I) Trata-se, além disso, da defesa da unidade do nosso

(15) Não se trata, pois, em regra, de uma consideração Diwito (cf. já supra p. 39 s.), o que não pode ser rigidamente
a priori. ::('parad~ da determinação da natureza (cf., mais pormenori-
/'adamcnte, infra II (1».
sível. Existe, antes, um efeito mútuo entre o conhe- e o especial, também bem conhecido na Hermenêu-
cimento do objecto em causa e a sua qualificação tica ("0); ele é próprio de todas as ciências do espírito
sistemática (18). Deve-se, por exemplo, conhecer pri- c nunca se deixa excluir de antemão.
meiro a ratio legis do § 833/1 BGB antes de poder Com isto, não se pode duvidar do «valor para o
ordenar esse preceito na responsabilidade pelo risco. conhecimento» da ordenação sistemática; daí resulta,
Mas por outro lado, a descoberta dessa ratio seria também o seu significado para a obtenção do Direito;
bem mais difícil se a categoria sistemática da res- como se trata aqui do esclarecimento do conteúdo
ponsabilidade pelo risco não estivesse já disponível. teleológico, ela não pode, perante a jurisprudência
Além disso - o que é ainda mais importante - só a preponderantemente virada, hoje, para a argumenta-
ordenação sistemática permite entender a norma ção teleológica, surgir sem influência na interpreta-
questionada não apenas como fenómeno isolado, mas (;ão e no aperfeiçoamento do Direito. As ordenações
como parte de um todo. O § 833/1 do BGB, por exem- sistemáticas desempenham, de facto, um papel con-
plo, entende-se mais cabalmente e melhor quando se siderável, em todos os níveis da obtenção do Direito.
veja como uma previsão de responsabilidade pelo
risco, entre outras, do que quando se reconheça a sua
ratio legis - o dever de indemnizar pelos riscos pro-
vocados por um animal. Inversamente, o sistema
sofre, através da ordenação de uma nova previsão A «interpretação sistemática» ocupa assim um
normativa, em certas circunstâncias, um enriqueci- lugar firme entre os «cânones da interpretação» jurí-
mento ou uma modificação interiores, pois o especial
não é, aqui, uma mera sub-espécie, antes surgindo
como elemento constitutivo do geral (19). Existe por- ("0) Quanto a esta problemática cf., principalmente,
SCIILEIERMACHER, Werke I 7, 1838, p. 37 e 143 ss.; DILTHEY,
tanto, um processo dialéctico de esclarecimento duplo.
(;{'I/wnmelte Schriften VII, p. 212 S.; COlNG, Die juristischen
Não se pode negar que, desse modo, não ameace o IlIIsl('[;ungsmethoden und die Lehren der allgemeinen Herme-
perigo de um círculo fechado; no entanto, trata-se 1i"/lIi!?, 1959, p. 14; BETTl, Zur Grundlegung einer allgemeinen
apenas de um caso especial do círculo entre o geral i\IlHlegungslehre, Festschrift für Rabel, 1954, vaI. 11, p. 102 ss.
" IIlll:elneine Auslegungslehre ais Methodik der Geisteswissen-
(18) Cf. ob. cit., p. 189; concordante, também
ENGI5CH,
,"'1/(/)1('11, 1967, p. 219 5S. O círculo referido no texto não é
ic!(\nlicn ao «círculo hermenêutico» no sentido de HElDEGGER e
DIEDERICH5EN, NJW 66, 701.
.I•. (;AIJAMElt (noutro sentido, este próprio, ob. cit., p. 275 5S.),
(19) O geral não se deve aqui entender como «geral-
-abstractQ», mas sim como «geral-concreto», no sentido de 'iJl(' n·sl)(~il.a ü relação do «pré-entendimento» do interpretando
HEGEL. 111111 " I'l'::ultado da interpretação.
dica (21). A tal propósito pensa-se, normalmente, na
l11entação retirada do sistema externo tenha um certo
interpretação a partir do sistema exterior da lei, por- valor. Assim, por exemplo, não é totalmente inadmis-
tanto nas conclusões retiradas da localização de um sível retirar conclusões da colocação de um preceito
preceito em determinado livro, secção ou conexão de nu parte geral ou na parte especial de uma lei, no
parágrafos, da sua configuração como proposição tocante ao seu âmbito de aplicação; também se deve
autónoma ou como mera parte de uma proposi- esquecer que a divisão de uma lei é, muitas vezes,
ção, etc., etc. No entanto, apenas haveria aqui um influenciada pela «natureza das coisas» e que, por
ponto de apoio relativamente estreito e, além disso, isso, a natureza de um preceito como por exemplo,
não poucas vezes a localização de um preceito surge norma de Direito de família ou de Direito comercial,
materialmente errada; pense-se, por exemplo, para
pode tornar-se frutuosa para o seu entendimento.
referir apenas dois casos, na inclusão do § 833/1
Tais argumentos só são, porém, efectivamente efica-
do BGB na sequência dos delitos ou na remissão para zes quando os valores resultantes da inserção siste-
o § 278 do BGB, feita no § 254/lI, 2 (em vez de no
mática sejam extrapolados; trata-se, então, porém,
número III) (*). No entanto, não se nega que a argu-
já de uma argumentação retirada do sistema interno.
E esta é, de facto, do maior significado. Enquanto a
(21) Cf., por todos, BAUMGARTEN,Die Wissenshaft vom interpretação a partir do sistema externo apenas tra-
Recht und ihre Methode, 1920-22, voI. I, p. 295 ss. e lI, p. 617 ss. duz, em certa medida, o prolongamento da interpre-
e Grundzüge der juristischen Methodenlehre, 1939, p. 35 ss.;
tação gramatical, a argumentação baseada no sistema
ENGISCH, Einführung cit., p. 77 ss.; LARENZ, Methodenlehre
cit., p. 244 ss. interno, exprime o prolongamento da interpretação
(*) Nota do tradutor: de facto, o § 833/1 do BGB, refe- tcIeológica (22) ou, melhor, apenas um grau mais ele-
rente à responsabilidade do detentor de animais, surge na vado dentro desta, - um grau no qual se progrida
sequência dos §§ 823 e ss., relativos à responsabilidade por da «ratio legis» à «ratio iuris», e tal como a inter-
actos ilícitos; o § 278 estabelece a responsabilidade dos repre-
pretação teleológica (22) em geral a argumentação a
sentantes e dos auxiliares no domínio obrigacional, corres-
pondendo, pois, ao artigo 800.°/1 do Código Civil português. partir do sistema interno da lei coloca-se, com isso,
Por seu turno, o § 254/1 do BGB estabelece a regra da redução no mais alto nível entre os meios da interpreta-
da indemnização por culpa do lesado, enquanto o § 254/II <:;10 e:\).
alarga essa regra às hipóteses em que tal culpa se restrinja
ao facto de o lesado não ter prevenido o devedor do perigo (22) Teleológica no sentido mais amplo; cf. supra p. 41.
de um dano excessivamente elevado, perigo esse que este não
conhecesse; nessa sequência, o § 254/II, 2 vem remeter para
e:l) A opinião frequente de que não existe qualquer
llier<lrquia firme entre os diversos meios de interpretação não
o § 278, não havendo qualquer n.O III no § 254. Assim se 11H'rece qualquer concordância. Deve-se, antes, conferir à inter-
compreende a ilustração feita, no texto, por CANARIS. pl'('laç[ío tcleológica a primazia e isso é, hoje, quase sempre
Alguns exemplos práticos tornam perceptível o
do § 833/1 do BGB é consideravelmente solicitada
significado da interpretação sistemática para a obten-
pela sua qualificação como previsão da responsabili-
ção do Direito. Assim, por exemplo, a interpretação
dade pelo risco. Resulta dela, entre outros aspectos,
que, como sempre sucede na responsabilidade pelo
reconhecido, no seu resultado prático. No que toca, primeiro, risco, apenas se responde pelas consequências de um
à relação entre a interpretação teleológica e a gramatical, é «comportamento arbitrário tipicamente animal» e
geralmente aceite a proposição de que «o sentido e o escopo
não, por exemplo, por uma fractura duma perna
da lei estão mais altos do que o seu teor»; quanto ao «sentido
literal possivel» constituir, segundo a doutrina dominante, os sofrida por alguém que tropece num gato adormecido
limites da interpretação e, nessa medida, suplantar o escopo ou pelos danos que um cão açulado cause a uma
da lei é apenas - descontando proibições de analogia ou fenó- pessoa. Também para a delimitação do conceito de
menos similares - um problema puramente terminológico, pois detenção (do animal) se conseguem indícios essen-
perante um ultrapassar do sentido literal, apenas se transitou
ciais quando se tente concretizá-lo em conexão com
da interpretação em sentido estrito para o grau seguinte, o da
analogia e da restrição e, com isso, o escopo da lei é, de outras previsões da responsabilidade pelo risco, por-
qualquer modo, erguido à frente do teor literal - demasiado tanto de modo conforme com o sistema. É certo que
estreito ou demasiado lato. No que respeita, agora, à relação os mesmos resultados se podem obter apenas com
entre a interpretação teleológica e a sistemática, deve-se colo- a interpretação teleológica do § 833/1; no entanto,
car a interpretação efectuada a partir do sistema externo, por
não se deve duvidar de que eles, através de uma
causa da sua grande insegurança (cf. precisamente, o texto),
em qualquer caso, atrás da interpretação teleológica, enquanto argumentação baseada nos princípios gerais da res-
a própria interpretação a partir do sistema interno, como se ponsabilidade pelo risco, não só se tornam mais
diz no texto, é apenas uma forma de interpretação teleológica. ráceis de fundamentar mas, também, mais convin-
No que, finalmente, se prenda com a relação entre a interpre- centes ("'1). Há, também questões para cuja solução
tação teleológica e a histórica, também aqui é de conceder o
primado à teleológica. Para a teoria objectiva, isso não carece
de qualquer justificação; mas também não é duvidoso para a
(24) Não há qualquer objecção em que as regras sobre o
subjectiva, pois também esta não realiza as representações do
perigo de animais e o conceito de detenção se devam aplicar,
legislador histórico em todas as singularidades, mas antes pre-
segundo a doutrina dominante, também ao n." 2, apesar deste
tende promover a prossecução dos seus objectivos; a interpre-
11,10ser uma previsão de responsabilidade pelo risco, mas sim
tação processa-se, portanto, aqui, de modo subjectivo-teleoló-
lima previsão de culpa presumida. Pois por um lado, não é, de
gico e passa inteiramente por cima das representações visíveis
modo algum, fatal antes carecendo, apesar da estreita ligação
do legislador, quando estas sejam inadequadas para a obtenção
.'xterior das duas prescrições e por força do princípio da rela-
dos escopos por ele pretendidos, - um processo que um par-
Iividade dos conceitos jurídicos, de uma fundamentação autó-
tidário tão decidido da teoria subjectiva da interpretação, como
110ma,adequada ao escopo especial do n." 2. Por outro lado, os
HECK, verteu na conhecida máxima da «obediência pensante».
pontos de vista do risco desempenham um papel essencial
apenas resta o recurso ao instituto articulado da res- Da mesma forma, o significado da ordenação sis-
ponsabilidade pelo risco. Assim, por exemplo, em temática torna-se patente na questão discutível de
casos como os do comodato de um animal ou da sua se o § 281 do BGB tem aplicação à pretensão do
entrega a um treinador ou a um veterinário, não se ~ 985 do BGB (*). De novo a argumentação retirada
deve tentar resolver a problemática com ficções como do sistema externo designadamente da inserção do
a da construção de uma exclusão contratual de res- ~ 281 no Direito das Obrigações é pouco convincente.
ponsabilidade ou da aceitação de um concurso de Pelo contrário, a interpretação feita com base no sis-
culpas (25), mas antes apoiar a exclusão da responsa- tema interno alcança logo o objectivo. O § 281 com-
bilidade no ponto de vista da «livre exposição de preende, reconhecidamente, uma pretensão de sub-
interesses» (26), imanente ao sistema e desenvolvido -rogação e, portanto, só pode actuar, existindo os
na doutrina geral da responsabilidade pelo risco (27). pressupostos do princípio da sub-rogação, desde que
a pretensão do § 985 esteja prejudicada. Esta, porém,
não desaparece com frequência, dada a sua natureza
também para o n.O 2; a simples inversão do ónus da prova real, antes se dirigindo contra o novo possuidor; por
compreende um elemento do risco do qual se pode, de facto,
retirar uma consonância ampla entre o conceito de detenção e
o surgimento de deveres especiais de comportamento, como () titular do animal não possa responder, do mesmo modo,
os que subjazem ao § 83312, ligando-se à particular perigosi- independentemente de culpa. Só que isto não é um problema
dade do animal: caso o animal provoque um dano sem ser de responsabilidade pelo risco, mas sim uma ordenação do
pelo «comportamento arbitrário tipicamente animal», a ocor- risco contratual, que se deve distinguir dele quer dogmática
rência prejudicial verifica-se, em qualquer caso, fora do escopo quer praticamente (fundamental quanto à diferença, WILBURG,
de protecção da norma, e já não se trata, então, da eventual Die Elemente des Schadensrechts, 1941, p. 157 ss.); este
prova da ausência de culpa. Aliás, ESSERfaz notar, com razão, remete, por exemplo, no comodato, o risco para o comodatário,
que o preceito do n.O 2 está hoje ultrapassado, em termos de tal modo que a atribuição de uma responsabilidade ao titular
materiais e que, em consequência, a prática o considera quase do animal só ocorre havendo culpa, enquanto que no mandato
como uma previsão da responsabilidade pelo risco (cf. Schuld- ou na gestão de negócios, pelo contrário, o titular do animal
recht, 2." ed., 1960, § 203, 4 a). suporta o risco, com base nos princípios desenvolvidos pela
(25) Para essa problemática cf., principalmente, ENNECCE- opinião dominante em analogia com o § 670 do BGB. [Nota
Rus-LEHMANN, 15." ed., 1958, § 253 V. do tradutor: o § 670 do BGB estabelece a responsabilidade do
(25) Fundamental, MÜLLER-ERZBACH, AcP 106, p. 351 ss., mandante pelas despesas necessárias do mandatário].
396 ss. e 409 ss.; quanto ao assunto, também ESSER,Grundlagen (*) Nota do tradutor: O § 281 do BGB estabelece o
und Entwicklung der Geführdungshaftung, 1941, p. 109 s.; commodum da representação, em termos semelhantes aos do
LARENZ, Schuldrecht A. T., § 15 I C. artigo 794.° do Código Civil português; o § 985 do BGB, por
(27) A rejeição de uma responsabilidade pelo risco !H)U turno, determina que o proprietário possa reclamar do
segundo o § 833/1 do BGB não significa necessariamente que I)()ssuidor a restituição da coisa.
consequência, em todos estes casos fica excluída a
aplicação do § 281. Cessando, pelo contrário, a pre- donal à coisa e não em face da ordenação real mais
tensão do § 985 através da perda da posse, já não há rorte?! Quando se parta da ordenação do § 281 no
qualquer obstáculo contra a aplicação do § 281. I>istema interno da nossa ordem jurídica, chega-se
Quando a supressão derive de um terceiro de boa fé rapidamente a uma solução convincente: só quando
ter adquirido a propriedade, deve-se, então, conferir - mas, também, sempre que - caiba uma sub-roga-
a primazia ao § 816 I 1 BGB como lex specialis <;ão, isto é, a substituição de um direito extinto por
(apesar da aceitação de um concurso de pretensões um novo direito surgido no seu lugar e, portanto,
parecer defendível) (*). Quando a supressão, pelo tenha desaparecido a pretensão do § 985, tem apli-
contrário, se deva a outros fundamentos - isto é, no cação o § 281. Com isso, tanto se evitam as dificul-
essencial, ao próprio perecimento da coisa - então dades, receadas pela doutrina dominante, que possam
a aplicação do § 281 surge como inteiramente justifi- surgir através da co-existência de pretensões do pro-
cada; porque razão não poderá, por exemplo, o pro- prietário contra o novo possuidor, com base no § 985
prietário pretender o montante do seguro ou a even- e contra o antigo, por força do § 281 (29), bem como
tual indemnização (28), quando o § 281 já a concede, as iniquidades a que leva, por seu turno, a doutrina
perante a mera existência de uma pretensão obriga- dominante (30), com a sua recusa geral de aplicação
do § 281 (31).
(28) Baseada, por exemplo, no contrato, em ligação com
o § 278 do BGB, desde que, acessoriamente, jogue também a (29) Em compensação, não se mostra que a aplicação do
problemátíca da liquidação do dano a terceiro. - Na entrega * 281 BGB possa atingir iniquamente o possuidor de boa fé,
da prestação indemnizatória ao possuidor - em vez de ao por ele, porventura, já ter utilizado o sucedâneo para os seus
verdadeiro proprietário - aplica-se, em certas circunstâncias próprios fins, na crença de que ele lhe competia. Ele ficaria,
o § 816/II BGB, em conexão com o § 851. <mtão, normalmente, liberado, nos termos do § 275 BGB.
(*) Nota do tradutor: O § 816 lIdo BGB dispõe: INota do tradutor: o § 275 do BGB estabelece a regra da
«Quando um não-titular pratique, em relação à coisa, um acto liberação do devedor pela impossibilidade superveniente da
de disposição que seja eficaz perante o próprio titular, fica prestação, que lhe seja imputável].
o não-titular obrigado a restituir ao titular o que tenha obtido (lO) Quanto a esta cf. principalmente, WESTERMANN,
através de disposição.» A possibilidade de um não-titular pra- Sachenrecht, 5.a ed., 1966, § 31, IV 4.
ticar, em relação à coisa, actos eficazes perante o titular (:n) Através do § 818 I/2 também nem sempre se deixa
liga-se, em primeira linha, ao princípio «posse vale título» o obter um resultado satisfatório, quando se aplicam os preceitos
qual, como já foi dito, embora comum na generalidade dos ~obre o enriquecimento junto dos §§ 987 ss. do BGB (o que, de
ordenamentos continentais, não vigora no Direito português. I'acto, não levanta problemas a propósito da sub-rogação).
Neste, o caso poderia ser posto perante uma aquisição pelo .Junto da pretensão baseada no § 985 não necessita de estar
registo. a do § 812; segundo o § 819 I, também só o conhecimento posi-
Iivo prejudica (no entanto, poder-se-ia pensar em alargar o
Refira-se ainda um terceiro exemplo. Quando se servação da unidade valorativa com as restantes
ordenem os § § 171)1 e 172/1 do BGB na responsabili- previsões normativas de responsabilidade pela apa-
dade pela aparência jurídica (*), segue-se, daí, que rência jurídica (*) (33).
apenas será protegido o terceiro de boa fé e que este
deve ter tid() conhecimento da previsão aparente,
isto é, da declaração questionável - resultado que
não poderia convincentemente ser retirado apenas
dos §§ 171/1 e 173, por causa da sua redacção o que foi concluído para a interpretação em sen-
pouco feliz (e que, por consequência, também são tido estrito, isto é, para a interpretação das normas
discutíveis). Só a ordenação dos § § 171 e 172 numa no quadro do seu sentido literal vale, mutatis mutan-
conexão sistemática geral (32) permite assim captar dis, para a integração de lacunas. A afirmação da
plenamente o seu conteúdo teleológico e determinar, jurisprudência dos interesses de que a integração das
em cada caso, as consequências jurídicas; joga aqui, lacunas não seria possível através duma argumenta-
ao contrário do último exemplo e em medida mais ção a partir do sistema é improcedente para um sis-
larga do que no primeiro, ainda um segundo ele- tema teleológico (34) e, do mesmo modo, também para
mento, ao qual se irá, em breve regressar: o da pre-
(33) Como exemplo, cf. ainda a esse propósito, a inter-
pretação conforme com o sistema dos § § 370 e 405 do BGB,
§ 819, para garantir a unidade de valoração com as restantes
infra p. 117 s.
previsões, de modo correspondente: cf., também, o problema
(34) Isso não quer naturalmente dizer, de forma alguma,
análogo no § 281 e, sobre isso, vide a antepenúltima nota).
que a integração de lacunas a partir do sistema seja sempre
(32) Coloca-se, nesta, de novo um problema circular. Para
possível. A jurisprudência dos interesses tinha toda a razão
o minorar, é necessário um critério que não esteja em conexão
quanto à rejeição da tese de que a compleitude da ordem jurí-
com a questão da relevância de má fé; desde que este se
dica se podia basear no sistema; cf. mais pormenorizadamente
encontre, resolve-se o problema. infra IV, 4 e § 6 III 1.
I (*) Nota do tradutor: O § 171/1 do BGB confere poderes
(*) Nota do tradutor: Os §§ 171/II e 172/II do BGB
de representação perante um terceiro ou perante a generali-
determinam, respectivamente, que os poderes de representação
dade das pessoas, respectivamente, àquele que, por notificação
estabelecidos nesses preceitos subsistam até que a indicação
especial dirigida a esse terceiro ou por anúncio público, seja
do procurador seja revogada pela mesma forma por que se

I havido como procurador do declarante; o § 172/1 do BGB, por


seu turno, assimila à notificação especial de concessão de
poderes de representação a entrega, ao representante, por
realizou ou até que o documento seja retirado ao terceiro ou
dnclarado sem vigor. Nessa sequência, o § 173 do BGB vem
c~;tabelecerque os preceitos referidos não se apliquem quando
documento adequado, seguida da apresentação desse documento
() terceiro conheça ou deva conhecer, aquando da celebração
a terceiro.
I do negócio, a cessação dos poderes de representação. Todos

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este não faz sentido a contraposição tão apreciada de responsabilidade pelo sacrifício, a correspondente
entre a «construção apreensora» e a «construção Incuna, em concordância com as regras gerais e com
integradora de lacunas» (35). Pois, quando no desen- u consequência interna do princípio do sacrifício, deve
volvimento do sistema interior de uma ordem jurídica, integrar-se no sentido de o beneficiário ser o obri-
se trate da descoberta dos valores fundamentais gado (*). Outro tanto vale no tocante à necessidade
constitutivos, surgem aqueles elementos, com cujo de imputabilidade do responsável: caso se trate de
auxílio não só a determinação (35a) mas também a responsabilidade pela intervenção, ela é exigível, por
integração de lacunas é possível numa série de casos: analogia com os § § 827 s. do BGB; se se tratar de
os princípios gerais. responsabilidade pelo sacrifício, ela é irrelevante (39).
Os exemplos confirmam, de novo, essa afirmação. Assim, com exemplo no § 904/2 do BGB, não só
Quando, por exemplo (com a doutrina ainda plena- resulta claro como os pontos de vista decisivos para
1\ integração de uma lacuna provêm, directamente, de
mente dominante (36» se qualifica o § 904/2 do BGB
como uma previsão normativa de uma responsabili- uma ordenação sistemática, mas também como o
dade por intervenção (31), obtém-se desde logo, a par- resultado se modifica igualmente, com a qualificação
tir daí, a solução para o preenchimento da lacuna sistemática, - o que não admira quando se repara
contida nesse preceito e, designadamente, para a ques- que na diversa ordenação do § 904/2 se exprimem
tão do obrigado a pretensões: o interventor é res- opiniões opostas sobre o seu conteúdo material.
ponsável. Se, pelo contrário, se vir no § 904/2 (de
acordo com a opinião mais convincente (38» um caso
(39) Cf., ainda CANARIS,N. J. W. 64, 1963.
(*) Nota do tradutor: Segundo o § 904/1 do BGB, o pro-
estes esquemas visam a tutela da confiança de terceiros, em
termos semelhantes aos determinados no artigo 266.° do Código pt'ietário de uma coisa não pode proibir a actuação, sobre ela,
Civil português. de outrem, quando tal actuação seja necessária para obstar a
11 III perigo actual e quando, com isso, se provoquem, ao pro-
(35) Esta terminologia pode ser reconduzida a TRIEPEL;
cf. Staatsrecht und Politik, discurso do Reitor em Berlim, prietário danos relativamente pequenos; trata-se, pois, duma
1927, p. 22 s.
previsão de estado de necessidade objectivo. Nessa sequência,
(35a) Quanto a este cf. de seguida, o texto, infra II 2. Cl ~ 904/1I vem declarar que o proprietário pode exigir uma
(36) Cf. a explicação e as indicações em HORN,JZ 1960, indcmnização pelo dano que lhe tenha sido infligido. Com-
p. 350 ss.
pmende-se, assim, a lacuna de que fala CANARIS:a lei não
(37) Este conceito é, no entanto, dogmaticamente, ainda diz quem deve indemnizar: se o interventor ou se a pessoa
um tanto difuso. lJl'neficiada pela sua actuação. Perante a lei portuguesa,
(38) Cf., principalmente, LARENZ, Schuldrecht/B. T., 8." ed. H(~gllndoo artigo 339.°/2 do Código Civil, qualquer deles poderá
~i('1' chamado a indemnizar, de acordo com a decisão do tribunal.
1967, § 72, 1.
Do mesmo modo, das teorias da criação, do con-
direcção, ou renovam-se as suas consequências, e
trato, ou da aparência jurídica resultam, no Direito
assim por diante. Portanto, não se integra primeiro a
cambiário, consequências práticas, a propósito de uma
lacuna e, então, se confecciona a teoria; a lacuna é
série de problemas singulares (40). Não procede, pois,
antes integrada aquando da formação da teoria e a
a afirmação de HECK de que a decisão por uma ou por
teoria é elaborada aquando da integração da lacuna.
outra destas teorias não contém «qualquer juízo de Este processo não é apenas confirmado pela pesquisa
valor» e não deveria ser tomada «antes da integração fenomenológica (4:\) da formação das teorias jurídicas;
da lacuna, mas só depois» (41). Existe antes aqui, ele nem poderia, de antemão, apresentar-se de outra
precisamente, aquele efeito mútuo que foi acima (41a) forma, pois só assim a justeza e a unidade da ordem
descrito: procura-se, primeiro, entender as determina- Jurídica poderiam ser garantidas: apenas um perma-
ções da lei com o auxílio de uma das teorias e nente «vai e vem» pode prevenir o perigo de se
ordená-Ias nos valores fundamentais do nosso Direito solucionar a multiplicidade de questões de que se
privado; de seguida, retiram-se, da teoria, as conclu- trata numa problemática tão complicada como a das
sões para os casos não regulados; pondera-se a con- «teorias dos títulos de crédito», segundo pontos de
vincibilidade dos resultados assim obtidos (42); modi- vista contraditórios, assim como apenas teorias pro-
fica-se, disso sendo o caso, a teoria, numa ou noutra visórias e modificáveis preservam a unidade interior.
O referido efeito duplo existe apenas a propósito dos
problemas mais importantes, enquanto que para ques-
(40) Quanto a estes cf., por exemplo, JACOBI,Ehrenbergs Iôos singulares pouco significativas em termos de
Handbuch IV 1, 1917, p. 304 ss., ENNECCERUS/LEHMANN, ob. cit.,
formação de teorias, pode não assumir uma particular
§ 208 II = p. 844.
(41) Cf. Begriffsbildung cit., p. 103; certo, LEHMANN,ob. consideração; as lacunas podem ser desde logo inte-
e loco cito gradas a partir delas, isto é, do ou dos princípios
(41a) Cf. p. 89 S. constituintes básicos ou seja, sem que se ordenem os
(42) Como se faz tal ponderação é uma questão ainda resultados obtidos nem o seu influxo para uma modi-
pouco esclarecida. O sentimento jurídico joga aqui, por certo,
um papel essencial; no entanto, e para além disso, dever-se-ia
ficação da teoria; para estes casos vale precisamente
ainda tentar assentar a «justeza material» de um resultado o contrário da citada proposição de HECK, remeten-
em critérios objectivos tais como a «natureza das coisas», a do-se de novo para a justificação do princípio da
praticabilidade, a consonância com valores expressos noutros
lugares normativos, a confluência com princípios ou valores
gerais de Direito tais como a tutela do tráfego ou simi-
lares, etc. (I::) Psicologicamente o processo pode, evidentemente, ser
divl'I'SO.
vador, quer dinamizado r, travando, pois, ou acele-
adequação valorativa. Mas com isso acede-se já ao
rando o aperfeiçoamento do Direito. No primeiro caso,
segundo elemento essencial que confere ao sistema a
uma determinada solução é censurada como «contrá-
seu significado para a obtenção do Direito.
ria ao sistema»; no segundo, ela desenvolve-se, de
novo, como determinada pelo sistema; no primeiro
caso trata-se essencialmente da prevenção de contra-
11- O SIGNIFICADO DO SISTEMA PARA A DEFESA DA UNI-
dições de valores, no segundo da determinação de
DADE VALORATIVA E DA ADEQUAÇÃO NA INTERPRETA-
lacunas.
çÃO DO DIREITO

Esse significado emerge da elaboração já efec-


tuada neste trabalho a partir do papel acima (44) atri-
buído ao conceito de sistema e da definição daí
derivada (45). Esta função do sistema distingue-se Esta primeira função do sistema é, antes de mais,
fundamentalmente da descoberta do conteúdo valora- frequentemente acentuada (45a). Assim, LARENZ con-
tivo de um preceito ou de um instituto, acima tratada, sidera, com razão, como um «indicativo de uma inter-
embora esteja, com ela, numa relação estreita. Pois pretação judicial do Direito bem sucedida», o de que
enquanto naquela o centro de gravidade reside em a nova proposição jurídica não entre em contradição
entender o especial - ainda que como parte do com o sistema legal mas antes se deixe «incluir sem
geral-, trata-se, agora, predominantemente do quebra no todo pré-existente da ordem jurídica) (4G).
inverso, isto é, de preservar o geral - ainda que na Como exemplo de uma interpretação criativa con-
especialidade. Ambas as funções do sistema se arti- trária ao sistema e, por isso, infeliz, refere LARENZ a
culam entre si, aquando da obtenção do Direito, num cessão de garantias (47). Um outro exemplo que se
efeito mútuo dialéctico, remetendo uma para a outra, apresenta nesta sequência poderia ser o da «procura-
mas distinguindo-se, também, entre si.
No que toca ao modo de eficácia do sistema na
preservação da unidade e da adequação no processo (45a) Cf., por fim, principalmente, ESSER, Wertung, Kons-
da obtenção do Direito, pode ele ser quer conser- /Tuktion und Argument im Zivilurteil,
1965, p. 14 5S., que
rl'metc expressamente para a «função de controle» das orde-
naçfíes sistemáticas.
("I:) Cf. Kennzeichen geglückter richterlicher Rechtsfort-
(44) Cf. sobretudo os §§ 1 II e 2 II 2.
IJildungen, 1965, p. 6 5S., 13.
(45) Ele surge claramente em KRETSCHMAR, Methode der
("') Cf. ob. cit., p. 6 S5.
Privatrechtswissenschaft cit., p. 42 e Jher. Jb. 67, p. 273.
ção aparente», quando se utilize, como hoje fazem a o significado prático do sistema para a prevenção
jurisprudência e a doutrina dominante, alargando-a,
de contradições de valores não se mostra apenas na
para além do Direito comercial, até ao Direito civil
questão de saber se o Direito deve, de todo em todo,
e considerando suficiente o desconhecimento descul-
ser aperfeiçoado, mas também no problema de como
pável, do dono do negócio, do aparecimento do talsus deve ocorrer tal aperfeiçoamento (depois da sua
procurator; pois então, segundo o regime do erro do admissibilidade já ter sido determinada). Pois tam-
BGB, existiria apenas, no caso de falta de consciência bém aquando da concretização da lei não bastam
da declaração, uma responsabilidade pelo interesse
princfpios jurídicos formativos para a preservação da
negativo, segundo o § 122, e não uma responsabili-
unidade interior de uma ordenação sistemática (4D).
dade pelo cumprimento, como na responsabilidade Assim, por exemplo, o princípio da ponderação dos
pela aparência, nada se alterando também quando o hens só conduz a normas susceptíveis de subsunção
erro ou o desconhecimento sejam culposos. O regime através da sua inclusão dogmática na causa de justi-
do erro do BGB coloca, assim, limites inultrapassáveis
f'icação do estado de necessidade «supra legal» - no
a uma interpretação criativa do Direito em tal direc-
qual esta ordenação sistemática é de relevância prá-
ção, e fenómenos como a procuração aparente ou as tica imediata, ou a propósito da possibilidade de legí-
regras sobre a declaração comercial escrita devem lillla defesa contra uma actuação em estado de neces-
ser tomadas de forma a aparecerem como excepções sidade ou da questão de uma pretensão delitual con-
substancialmente justificadas e estritamente delimi-
ITa o que agiu em estado de necessidade. Também
tadas de decisão fundamental do legislador, e não eom referência a isso surge a concretização do prin-
como quebras sistemáticas arbitrárias (48). De outra dpio da protecção da personalidade. Também aqui,
forma, não se consegue resolver a questão fundamen- ('omo já foi suficientemente salientado, o sistema do
tal de quando e em que circunstâncias se pode, em
IlG 13, ou de modo mais exacto, o princípio da limita-
casos semelhantes, encetar uma interpretação cflativa <;{\nda tutela delitual a direitos absolutos, teria exi-
do Direito, com a consequência inevitável de uma gido que não se elaborasse um direito de personali-
quantidade de decisões singulares desconectadas e
dade «geral» do tipo das cláusulas gerais, mas antes,
contraditórias, ou seja, de injustiça e de insegurança
t'l\1 vez dele, direitos de personalidade assentes em
no Direito.
previsões firmes.

(18) Cf. CANARIS, Die Vertrauenshaftung im deutschen


(1!J) Cf. mais pormenorizadamente, CANARp, Die Fest-
Privatrecht, 1971, p. 271 ss.
.·;ldlul1g von Lücken cito pp. 162 s., 164 ss.
mas não escritas, e assim não é de admirar que, mui-
tas vezes, a partir de previsões singulares aparente-
mente limitadas como, por exemplo, os §§ 122, 179
Por outro lado, não se devem subestimar os impul-
(~ :·W7 do BGB ou os §§ 171, 172 e 405 BGB ou o
sos originados pela ideia de sistema, para a comple-
mentação do Direito. A ideia da adequação e da ;~42 BGB (*), se tenham elaborado novos institutos
unidade do Direito demonstra, designadamente, uma pa ra o sistema: os valores corporizados naqueles pre-
extraordinária força dinamizadora, desde que não se ceitos são «gerais» segundo o seu peso interior, não
entenda, de modo resignado, o Direito como um se podendo pois excluir que eles tenham influenciado
conglomerado causal de decisões singulares histo- ll1ais ou menos consideravelmente o sistema e o con-
ricamente acumuladas. Pois o problema de saber se I.(~úd()do Direito vigente. Por isso é altamente contes-
um determinado princípio de Direito é «constitutivo I.úvel que se censure à jurisprudência o ela procurar
para o sistema» inclui a questão de indagar se ele é «apoios» na lei, para o aperfeiçoamento criativo do
«significante» para o âmbito jurídico em causa e este Direito. Isso não deveria ser considerado como um
é de novo equivalente à questão da «generalidade» «resquício positivista», nem a aspiração de fidelidade
de um princípio. Mas quando se tenha reconhecido :" lei, daí resultante, critica da como fundamentação
uma vez um princípio como «geral», e, em especial, a parente, antes se reconhecendo que, sob esse pro-
se tenha determinado o seu peso ético-jurídico e a cedimento, existe um conhecimento metodológico e
sua hierarquia jurídico-positiva, ele pode conduzir, filosófico correcto: é designadamente mais fácil
em ligação com a regra da adequação valorativa, a demonstrar a mera adequação «formal» de um valor,
um aperfeiçoamento inesperado do Direito: não é do que comprovar a sua justiça e adstringibilidade
outra coisa o que sucede com a determinação de uma «material» (de lege lata!); e em consequência já se
lacuna com recurso a um princípio geral (50). Em
consequência, a elaboração consequente do sistema
tem, também neste ponto (50a) inflUência na comple- (*) Retorde-se que os § § 122, 179 e 307 do BGB estabe-
mentação de uma ordem jurídica. Pois quando um i"cem, respectivamente, os deveres de indemnizar do decla-
princípio «geral» é elaborado, o princípio da igualdade rante quando a declaração seja declarada nula ou anulada, do
conduz, em muitos casos, ao reconhecimento de nor- rt'qucrente que não prove os seus poderes quando o represen-
I 'Ido recuse a ratificação e daquele que conheça a impossibilidade
duma obrigação assumida; os §§ 171, 172 e 405 têm, por seu
(50) Cf., quanto a isso, CANARIS, ob. cit., p. 93 SS.
turno, a ver com a tutela de terceiros perante a procuração
(lU perante documentos que atestem um débito; o § 242 firma,
(50a) Cf., também supra, I 2.
por fim, o princípio da boa fé.
conseguiu muito quando se apurou, num preceito, «construções» do legislador (5:l). Tê-Io desconhecido
certo princípio jurídico, mantendo-se apenas em foi um dos erros mais pesados de HECK e da juris-
aberto a questão de porque não vale ele como «geral». prudência dos interesses na sua crítica ao sistema;
Esta questão implica com frequência ainda o pro- pois a consideração de que o juiz não está vinculado
blema espinhoso da valoração (51) e fica-se, aqui, sem- às construções do legislador, devendo considerá-Ias
pre no perigo de se perder no círculo entre o geral e o como um modo de redacção (!) (54), contradiz, numa
especial: tais dificuldades são, em regra, mais estrei-
(5:1) Em consequência, é altamente contestável a afirma-
tas do que as de derivar a adstringibilidade de um
(;fio divulgada de que o legislador não poderia «prescrever
princípio de Direito apenas a partir da sua justiça directrizes dogmáticas, mas apenas consequências jurídicas».
material (52). Na verdade, é de concordar em que o legislador não pode
Assim surge junto à primeira e de algum modo eslatuir a justeza de determinada teoria como tal, mas pode
negativa função do sistema, de prevenir o apareci- decidir-se por ela através das consequências jurídicas. Por isso,
mento de contradições de valores, a função, em certa w, formulações dogmáticas que o legislador tenha utilizado,
bem como as suas tomadas de posição cognoscíveis a favor
medida positiva, de desenvolver o Direito de acordo
ou contra determinada teoria não são, por si, vinculativas para
com o peso interior dos seus princípios constitutivos 11 Ciência; no entanto, esta está-Ihes vinculada, quando as
ou «gerais»; em ambos os casos trata-se da defesa da l'Onsequências jurídicas em causa se deixem esclarecer com
unidade valorativa, que constata, também, numa Iluxilio das referidas teorias ou quando elas as contradigam.
lacuna não integrada contra a regra da igualdade, uma Igualmente problemática é a prevenção ao legislador de que
de deveria evitar tomadas de posição em polémicas científicas.
contradição de valor, em sentido amplo.
De facto, ele deveria guardar-se de «desenvolvimentos de nível
doutrinador» e não intervir perante diferenciações materiais
que ainda não tenham sido teorética ou sistematicamente
«uclaradas»; no entanto não é, por outro lado, tão perigoso
com um «inoperante» compromisso entre várias teorias; pois
este vai necessariamente conduzir a contradições de valores
A ordenação sistemática inclui valores em si. Isso
() à perturbação da unidade interior da ordem jurídica e, com
não vale apenas para a formação do sistema através isso a injustiças; assim, e a tal propósito, também se deve
da Ciência e da jurisprudência, mas também para as acentuar expressamente que o legislador também está ligado
ii ideia de sistema (até em sentido constitucional!) - cf. mais
pormenorizadamente infra § 6 I 4.
(51) Que se alarga bem para lá do problema de uma (54) Cf. HECK, ob. cit., p. 86 s. e para o exemplo depois
mera analogia singular. referenciado, Sachenrecht, § 78 IV 2; também STüLL, Jher. Jb.
(52) Quanto à relação entre sistema e justiça material d. 75, p. 171, nota 2, com indicações; mas diferentemente e com
também infra IV 3. razão, RÜMELIN, ob. cit., p. 351 ss.
questão importante, o princípio da lealdade à lei, tam-
l'uludu ti aJllica(~üo jurfdica; e, com razão, ele acres-
bém assegurado pela jmisprudência dos interesses.
(~(1ntaque esta rc1a(~fio corresponde também «à pro-
Também isso, como era de esperar, conduziu, em
Jt1C~çt\o econômica que, ao contrário do pretendido por
questões práticas, a decisões falaciosas.
1111:C1<, n:ío se deixa apenas determinar através da
Um dos mais conhecidos exemplos, que o próprio Rurantia, mas sim, segundo o caso normal que cor-
HECK, sintomaticamente, considerou característico responde ao decurso usual das coisas, isto é, ao paga-
para a sua concepção metodológica (55) é a sua dou-
IlHmto do crédito» ("8). A construção não é, pois, aqui
trina da «comunidade de escopo» entre o crédito e a
«contrária à vida» - e mesmo nesse caso ela seria
garantia real. Ele polemisa contra o «dogma da imita- villculativa, pois a lei pode também valorar os fenó-
ção», segundo o qual o direito de garantia é acessório
IW'Il0S da vida contrariamente à substância, isto é,
perante o crédito e preconiza, em sua substituição, a
/) na l:urcza das coisas sem, só por isso, perder a sua
teoria da comunidade de escopo, pela qual o crédito
1I(lIüringibilidade - abstraindo de casos de puro arbí-
e a garantia, porquanto igualmente dirigidos, em ter-
Irio no sentido do artigo 3 GG (59). Por isso, é tam-
mos económicos, à satisfação do interesse do credor,
b('1I1 totalmente inexacto que HECK aplique a sua
também formam, para o Direito, uma comunidade
tcoria até à dívida fundiária e daí derive de uma
«paritária»; ao contrário da construção legal, a rela-
comunidade de escopo económico uma comunidade
ção entre crédito e garantia real não deve, por conse-
de destino jurídico cOm o crédito garantido (60) com
quência, ser considerada como a do crédito e da
a consequência de as modificações na existência de
fiança, mas antes como a de múltiplos créditos con-
um dos direitos actuarem, sem mais, de igual modo,
juntos entre si (56). Esta opinião não se divulgou e
tUl1lbém no outro. Ora a lei, pelo contrário, pôs à
bem. Na verdade, não se trata aqui, de forma alguma,
disposição, na hipoteca e na dívida fundiária dois
de uma «construção conceptual privada de valora-
tipos diferentes e quando as partes se tenham deci-
ção» (57), mas sim de uma valoração nas vestes de
dido pela dívida fundiária - portanto pelo tipo que
uma construção. Diz acertadamente WESTERMANN que
«a letra e o sistema da lei» teriam «colocado univoca-
mente o crédito e a hipoteca numa relação de direito
(58) Cf. Sachenrecht, 5." ed. 1966, § 93 II 4 c; cf. também
determinante e determinado» ficando, a tanto, vin-
~ 114 11 1 c (para a dívida fundiária) e § 12 6 I 3 (para o
penhor).
(ti9) Cf. também infra § 6 I 4 b.
(55) Cf. Sachenrecht, Preâmbulo, p. 111,nota l.
(60) Cf. ob. cito § 100, 5 a; pelo contrário, com razão por
(56) Cf. Sachenrecht, § 78; cf. também § 82 e § 101,6.
exemplo WOLFF/RAISER, Sachenrecht, 10." ed. 1957, § 132 I 2
(57) Assim HECK, ob. cit., § 78 IV 2 a.
com nota 7; WESTERMANN, ob. cit., § 116 11 1 a.
confere ao credor uma poslçao mais forte - elas lindo o ponto de vista correcto mas a resposta deve
escolheram, com isso, ao mesmo tempo, também uma sor exactamente a inversa: a lei, ao tratar o penhor, a
ponderação de interesses diversa, mais favorável ao propósito da transmissão, como anexo não autó-
credor. I,omo (!) do crédito (<;4), o qual, por seu turno, não é
A questão de saber se a aquisição, de boa fé, de configurado como objecto do tráfego, deixa justa-
um penhor na verdade não existente '- portanto da lItonte entender (66) que ele também não surge como
segunda, terceira ou quarta aquisição de um penho- ohjecto de tráfego; pois só assim se pode entender
rante aparente - é possível, oferece um segundo plenamente o §1250, prevenindo-se uma contradição
exemplo igualmente sugestivo. A doutrina domi- de valores: a colocação, entre as regras do Direito,
nante (61) nega-o com referência à construção da da cessão vale igual e consequentemente para um
transferência do penhor, no § 1250 I 1 BGB: o penhor lItero «anexo», também a propósito da exclusão fun-
transmite-se ipso iure, independentemente da tradição damental da aquisição de boa fé, tal como ela é pró-
da coisa com a cessão do crédito ao novo credor, pria deste sector jurídico (66), (67). A construção con-
faltando por isso um dos pressupostos típicos da
aquisição de boa fé no Direito dos móveis, em
("1) Para o carácter de anexo, portanto para a renúncia
conexão com o princípio da tradição. HECK preconiza, n uma eficácia constitutiva da tradição não é decisivo o facto
com apelo às necessidades de vida, a opinião contrá- do se tratar de uma aquisição por força da lei; este último
ria e defende «a dignidade de protecção do adqui- ponto de vista poderia ser contraditado com a objecção de
rente» não poderia «ceder à construção jurídica que o § 1250 I apenas exprimiria a vontade presumível das
pnrtes, havendo, por isso, uma forma de transmissão negocial
injusta do caso anterior» (62). WESTERMANN segue-o,
IOI',almentetipificada, de tal modo que se possa afirmar uma
por não ser evidente que a lei não queira tratar o rwcessidade de protecção do tráfego diferente do caso normal
penhor como objecto de comércio (63). Deve seguir-se dll aquisição por lei.

a doutrina dominante. WESTERMANN elaborou na ver- ("6) Isso vale igualmente pelo prisma da teoria objectiva!
Aliús a exclusão da aquisição de boa fé; da parte dos autores
da lei, propositada (cf. Mot. llI, p. 837, 2), de tal modo que
os partidários da teoria subjectiva devem reconhecer a decisão
(61) Cf. por todos WOLFF/RArsER, ob. cit., § 170 II 1 com como vinculativa.
nota 4; BAUR,Sachenrecht, 4." ed. 1968, § 55 B V 3. [Nota do (liO) Quanto à hipoteca, o BGB sujeitou consequentemente
tradutor: segundo o § 1250/1 do BGB,«o penhor transmite-se li cessão do crédito às regras do Direito imobiliário!
para o novo credor, através da cessão de créditos. O penhor (li7) Mesmo quando a tradição fosse constitutiva e a
não pode ser cedido sem o crédito}}.] Iransferência de penhor seguisse, portanto as regras do Direito
(62) Cf. ob. cit., § 105 V. mohiliário, a admissibilidade da aquisição de boa fé seria
(63) Cf. ob. cit., § 132 I 1 b. extremamente questionáveI. A posse confere, na verdade,
tém pois, de novo, a valoração (68); declará-Ia irrele- lima aplicação analógica do § 401 BGB, de tal modo
vante significa assim desconsiderar a valoração em qlloa pré-notação se transmita ipso iure com a cessão
causa. du crMito garantido (69). Mas com isso decide-se
Deve-se aliás ter em conta, também na interpre- IHuuhnente - o que não é suficientemente enfo-
tação criativa do Direito, que as construções legais cado - sobre a questão de saber se é possível uma
incluem, em si, valores. Este ponto de vista ganha l.Jügunda, terceira ou quarta aquisição de boa fé de
significado prático, por exemplo, a propósito da trans- uma pré-notação constituída por quem não tenha
ferência de uma pré-notação. Esta não está expres- poderes para isso. Vale, então, exactamente, o que
samente regulada na lei e a doutrina inteiramente t'ni dito para o correspondente problema quanto ao
dominante resolve, por isso, o problema através de penhor: porque se trata de uma aquisição exterior ao
rogisto O), portanto segundo as regras da cessão de
c •.(-ditos e não de acordo com o Direito imobiliário (70),
segundo o BGB, a propriedade, mas de modo algum, sem fica excluída uma aquisição de boa fé (71). A coloca-
mais, o penhor; é, de facto, muito provável que o possuidor
(;flo da transmissão da pré-notação sob o § 401 em
seja, igualmente, proprietário; mas nenhuma verosimilhança
comparável joga a favor de que o possuidor não proprietá- vez de sob o § 873 BGB (*) só pode ter o sentido de,
rio - o terceiro conhece pois aqui a falta da propriedade!-
seja credor pignoraticio: ele pode igualmente ser comodatário,
locatário, comissionário, etc. No exacto reconhecimento desta ('"1) Cf. por todos RGZ 142, 331 (333); BAUR,ob. cit.,
situação, a lei negou a protecção da boa fé perante o poder Il 20 V 1 a; WESTERMANN, ob. cit., § 84 V 1. Nota do tradutor:
de disposição e seria uma contradição de valores proteger a (l ~ -101 BGB dispõe a transmissão das garantias, com a cessão

boa fé na existência de um direito de penhor, a propósito do do eréditos; corresponde ao artigo 582.° do Código Civil.
qual a mera posse não oferece nenhum fundamento mais ('10) Em compensação, é irrelevante que se trate de uma
seguro do que a propósito do poder de disposição. A partir Ilquisição por força da lei; vale aqui a nota 64.
destas considerações não se poderá, aliás, aplicar também o (71) Muito duvidoso; quanto à problemática cf., sobre-
§ 1006 para além do 1227. tudo, BGHZ 25, 16 (23); MEDIcus, AcP 163, 1 ss. (8 ss.);
(68) Que WESTERMANN, ob. cit., o negue, seguindo HECK, IÜ:INICKE, NJW 64, p. 2373 ss. (2376 ss.); BAUR,ob. cit.,
não parece consequente perante a sua tomada de posição con- \l 20 V 1 a; WESTERMANN, ob. cit., § 85 IV 4, onde, noutra
trária (cf. em geral § 93 II 4 a e para o penhor, § 126 I 3) à posição, se toma expressamente posição também quanto à
polémica de HECKcontra o «dogma da acessoriedade»; pois problemática metodológica e, contra as considerações do texto,
também para a configuração do § 1250 I 1, a opção funda- N(' nega o conteúdo valorativo da construção (mas cf. quanto
mental do legislador a favor da acessoriedade das garantias 11 isso supra, nota 68).
reais jogou, indubitavelmente, um papel considerável e assim (*) Nota do tradutor: o § 873 BGB exige a inscrição no
o relaciona HECK,ob. cit., também expressamente à sua recusa I'('gisto predial para a transmissão ou oneração de direitos
geral do «dogma da acessoriedade». ~;obr() imóveis; o regime português é, sabidamente, diverso.
nela, não se ver um direito de tráfego imobiliário, mas
antes, apenas, um meio de garantia independente
perante o crédito, ou um anexo do mesmo e assim,
tão pouco como em face deste poderá, a propósito Urn primeiro limite resulta da natureza teleológica
daquele, haver uma aquisição de boa fé (72). Com a do todos os argumentos sistemáticos bem entendidos.
primeira questão fica pois decidida a segunda; sobre IkV(l nomeadamente ter-se em conta que o sistema
a solução da primeira pode discutir-se; a da segunda lIilo formula de modo adequado o valor em questão e
está, porém, traçada e aquela divergência deve con- que, por isso, seja sempre necessário um controlo
duzir a uma contradição perante a valoração firmada Ideológico - pelo menos implícito - quanto a saber
na primeira questão, - por onde se verifica, de novo, se a premissa maior ou o conceito mais vasto toma-
o elevado significado assumido pelo sistema para a dos ao sistema comunicam plena e acertadamente o
garantia da adequação valorativa. conteúdo valor ativo significado. Assim, por exemplo,
n proposição muito utilizada como argumento siste-
IlIÚ tico, de que na aquisição por força de lei não é
d(~ considerar a tutela da boa fé só muito condicio-
IV - OS LIMITES DA OBTENÇÃO DO DIREITO A PARTIR DO
SISTEMA nalmente é utilizável. Na verdade, ela prende-se com a
cOllsideração acertada de que ela se relaciona com a
uquisição ex lege independente da vontade das partes
As considerações produzidas até este momento (~ que, por isso, falta nela, em regra, a necessidade
acentuam o significado do sistema para a obtenção de protecção do tráfego indispensável para a aquisi-
do Direito mais do que o habitual; no entanto, não (;1\0 de boa fé; não obstante, ela vai, na sua formula-
se deve sobrestimar este, desconhecendo em especial (:fio, para além desta sua ratio. Mas isso é peri-
os limites que se põem à obtenção sistemática do goso porque, desse modo, não se atingem todas as
Direito (73). Cabe, a tal propósito, distinguir vários formas de aquisição legal (74), uma vez que uma trans-
aspectos. fer0ncia ex lege pode, em cer~os casos, ser apenas o

(72) Para a objecção de que no § 401 esteja também


referenciada a hipoteca e de que, quanto a esta, não procedem (71) Assim a hipoteca conforme com o § 1153 I BGB
as considerações do texto cf. supra, nota 66. transmite-se, por força da lei (!) com a transferência do crédito
(73) Cf. quanto a isso HERSCHEL, BB 66, p. 761 S8., que ", simultaneamente, não se duvida que, segundo o § 892 BGB,
tem contudo em mente, sobretudo, a argumentação baseada no Jlossa ser adquirida de boa fé. A proposição criticada também
sistema «externo». niw se harmoniza, na sua generalidade, com o § 366 lU HGB.
revestimento técnico de uma transmissão (mediata- Ilislemu (desenvolvidamente discutida no antepenúl-
mente) negocial (75). Assim por exemplo o direito liIII o parágrafo). Desta resulta, designadamente que
«legal» de penhor do empreiteiro, segundo o § 647 IIflo se deva tomar como resultado final a determina-
BGB poderia ser, na verdade, apenas um penhor
(;flo de que o sistema (até então existente) exige ou
«negocial» tipificado na lei, para que se pudesse afir-
contradita uma determinada solução, mas antes ape-
mar a possibilidade de uma aquisição de boa fé (76) ;
1111M como a possibilidade de um aperfeiçoamento do
o § 647 apenas ordena o que as próprias partes de
.'lÍs/,ema; o que pareça, ou, até, seja, em certa altura,
forma típica e razoável teriam acordado (77). A pro-
posição arvorada a argumento sistemático, sobre a como contrário ao sistema, pode, pouco mais tarde,
recusa de protecção da boa fé na aquisição por força liurgir ultrapassado. Do mesmo modo deve-se evitar,
de lei só pode, por isso, ser utilizada quando, em perante a obtenção do Direito a partir do sistema,
princípio, se lhe veja, por detrás, o seu princípio () mal-entendido de que o sistema é sempre dado, de
jurídico constituinte e, sendo o caso (através de uma antemão, como pronto e, desde logo, faculta as solu-
espécie de «redução teleológica»), ele seja conse- l:i)es para os problemas. Antes vale também para o
quentemente limitado. sistema o que ENGISCH (78) averiguou para a ideia de
«unidade da ordem jurídica» - a este subjacente: não
(. apenas axioma mas, também, postulado, não apenas
pré-dado mas, também, a elaborar e significa, para as
l'l~lações entre formação do sistema e obtenção do
Um segundo limite essencial à obtenção do Direito, que entre estes não existe uma dependência
Direito a partir do sistema resulta da abertura do
unilateral mas sim uma relação mútua (79); tal como o
sistema influencia a obtenção do Direito, assim se
(75) Tal é, por certo, o caso com o § 1153 I BGB, mas
deveria, por exemplo proceder também perante os § 401 e desenvolve, de modo inverso, a formação plena do
§ 1250 do BGB; nos dois últimos casos não é contudo igual- sistema apenas no processo de obtenção do Direito.
mente possível qualquer aquisição de boa fé; cf. supra, m. /'ura além de sob a prevenção do «controlo teleoló-
(76) Quanto à discutida questão cf. principalmente, por
um lado, BGHZ 34, 122 e 153 e, por outro, WESTERMANN,
ob. cit., § 133 I, com extensas indicações.
(77) Caso não houvesse § 647 BGB, a jurisprudência cau- C''') Cf. Die Einheit der Rechtsordnung, p. 69 s. (cf. tam-
telar já teria há muito retirado a inclusão de um direito de IJt"1ll p. 83 s.); concorde, LARENZ, Methodenlehre, p. 135 s.
penhor nas cláusulas contratuais gerais do empreiteiro e o ('") Esta só se pode entender inteiramente como dia-
§ 1207 BGB seria, então, imediatamente aplicável! It"dica.
gico», cada argumento sistemático coloca-se assim IIrgumentos slstemãticos, por definição, nada mais
ainda sob a da possibilidade de um desenvolvimento I'l'presentam do que os valores fundamentais da lei
ou modificação do sistema (80) . Jl('nsados, até ao fim, em termos de igualdade e que
/I sua legitimidade e a sua força reguladora resultam,
n\ll simultâneo, da autoridade do Direito positivo e
da dignidade do princípio da justiça.
Num exemplo particularmente característico do
I)ireito do trabalho, torna-se patente como é duvidosa
Recomenda-se cuidado quando se critique uma " tentativa de, com recurso à justiça material, deter
solução «justa perante o sistema» com recurso à soluções sistematicamente alcançadas. Corresponde,
«justiça material» (81). Pois a oposição que subjaz a reconhecidamente, à jurisprudência constante e à dou-
uma tal argumentação não existe, fundamentalmente, Irina que um trabalhador, perante uma «actividade
de forma alguma; pelo contrãrio: o sistema, como lendencialmente danosa» não seja, em certas circuns-
conjunto de todos os valores fundamentais constitu- ([meias, obrigado a indemnizar o empregador ou, pelo
tivos para uma ordem jurídica, comporta justamente menos, não totalmente, apesar da presença dos pres-
a justiça material, tal como esta se desenvolve e supostos de uma «violação positiva do crédito» ou de
representa na ordem jurídica positiva; com razão um facto ilícito. Isto é tão claro em princípio quanto
caracterizou, por isso, COINGo sistema como a ten- obscuro nos aspectos singulares, havendo, aí, sobre-
tativa de «comportar o conjunto da justiça com refe- tudo discussão quanto à questão de saber as circuns-
rência a uma determinada forma de vida social num tâncias requeridas para a presença de uma indemni-
conjunto de princípios racionais (82), e tendo mesmo zação e para calcular o seu montante em concreto;
LARENZequiparado-o a uma «ideia de Direito histori- em especial, é duvidoso se, em tal sequência, também
camente concretizada» (83). Nesta sequência deve-se, silo de ter em conta pontos de vista «sociais» tais
por isso, acentuar ainda mais expressamente que os como a idade, o estado familiar e as relações patri-
rnoniais do trabalhador. Por fim, contraria claramente
(80) Quanto aos aspectos singulares pode remeter-se para o sistema do Direito civil que tanto a respeito do
as considerações do § 3; cf. ai, em especial, o n: IV. fundamento do dever de indemnizar como a propósito
(81) Ê típica a forma - em regra usada de modo total-
do seu montante (§ 254 BGB!) se considerem apenas
mente irreflectido - de que a justeza sistemática ou a unidade
do sistema não pode «singrar às custas da justiça material». critérios de imputação e não, também, aspectos
(82) Cf. zur Geschichte des Privatrechtssystems, p. 28. sociais do tipo citado. No entanto, é conforme ao
(83) Cf. Festschrift für Nikisch, p. 304. sistema uma solução erguida apenas sobre critérios
de imputação e perante um ilícito culposo por parte 1m!" necessano um desvio aos princlplOs gerais do
do trabalhador ponha em campo o princípio da IIOSSO Direito de responsabilidade civil. Mas poder-
imputação pelo risco contra o empregador, em termos se-ú verdadeiramente afirmar que na relação de tra-
que minorem ou excluam a responsabilidade (84). balho, aquando da determinação de um dever de
A opinião contrária não considerou, de facto que ela illdemnizar, apenas (86) a consideração das relações
seja «adequada ao sistema», mas tenta justificar a patrimoniais, do estado familiar, etc., corresponde
sua contrariedade ao sistema - expressa ou implici- li justiça material? Colocar a questão é negá-Ia.
tamente - através do apelo a pretensas exigências Pode-se, pelo contrário, considerar até como uma
da justiça material (8:» que, aqui, com base na parti- patente injustiça que, por exemplo, um trabalhador
li L1C casualmente recebeu uma herança ou que é ainda
cular natureza da relação de trabalho, deveriam tor-
solteiro, em restantes circunstâncias idênticas, deva
Ilagar uma indemnização mais elevada do que o seu
colega mais pobre ou casado? O que corresponda,
(84) Quanto a esta consideração, cf., principalmente,
GAMILLSCHEG/HANAU, Die Haftung des Arbeitnehmers, 1965, aqui, à justiça material não se deixa determinar
p. 34 ss.; LARENZ, Schuldrecht B. T., § 48 II d; CANARIS, RdA (/ priori, mas apenas se pode decidir perante o Direito
66, p. 45 ss. positivo vigente na altura, no qual a justiça encontrou
(85) Característico, por último, WIEDEMANN, Das Arbeits- a sua realização concreta; esta opõe-se aqui, como
verhiiltnis aIs Austausch- und Gemeinschaftsverhaltnis, 1966, foi dito, claramente à consideração daqueles pontos
p. 20. Pode-se facilmente inverter a censura de que as exi-
gências da justiça material contundem com a unidade do sis- de vista sociais.
tema, jogando-a contra o próprio WIEDEMANN; pois a ordena-
ção sistemática por ele adoptada previamente leva-o a limitar cipio do risco desempenha também em WIEDEMANN um papel
as regras sobre trabalho tendencialmente perigoso à relação 1<'10 considerável (cf. sobretudo as considerações da p. 18 S.
de trabalho e isso pode, como o deixou claro sobretudo o que, no essencial, merecem total aplauso, enquanto também
«caso da ultrapassagem do automóveh>, decidido pelo BGH () caso da ultrapassagem do automóvel, na minha opinião,
(AP Nr. 28 ao § 611 BGB Haftung des Arbeitnehmers com ((pveria ter sido decidido de outra forma, d. RdA 66, p. 48),
ano A. HUECK),provocar injustiças consideráveis. Finalmente, que não é bem compreensível porque não o reconhece como
o próprio WIEDMANN parece subentender, que, com um «acordo fundamento jurídico da limitação da responsabilidade e assim
táctico», poderia auxiliar, do seu ponto de partida, de caso em :w possibilitando a reinclusão desse instituto no sistema do
caso, uma repartição adaptada de riscos (cf. p. 19); a aceitação 110SS0 Direito de responsabilidade civil.
de convenções «tácitas» entre as partes é, por causa do seu (8U) Caso o ponto de vista contrário, conforme com o
carácter fictício, reconhecidamente, sempre um indício claro de ::istema, pudesse ser reconhecido como materialmente justo,
que existe uma fundamentação aparente e que, em conse- c:liria por terra a exigência de considerações de circunstân-
quência, as premissas carecem de correcção. De resto, o prin- cias sociais.
o exemplo do trabalho tendencialmente danoso Illio podendo, por isso, ser aqui mais discutida (88).
é ainda, nesta sequência, rico em doutrina, noutro I)('qualquer modo, resulta do que se disse - e ape-
propósito. Mesmo quando, de acordo com a opinião IlUS isso é, aqui, decisivo - que os pontos de vista da
aqui sufragada, se derive a solução apenas a partir Justiça material não podem, sem mais, ser contrapos-
da confluência de específicos elementos de imputação tos a argumentos do sistema, mas sim que aqui é
de ambos os lados, não se trata ainda, precisamente, nntes necessária uma justificação especial (e normal-
de um exemplo modelado de fidelidade ao sistema, mente muito difícil) de que carece qualquer interpre-
pois o Direito escrito não compreende qualquer apoio ta(:[(o criativa e, em particular, aquela que se apoie
para uma limitação da responsabilidade do trabalha- em critérios extra-legais (89). No que toca ao insti-
dor perante o empregador. Na verdade, não se pode tut.o do trabalho tendencialmente danoso, verifica-se
negar que surgiram aqui exigências de justiça mate- de imediato que essa justificação reside na intenção
rial contra o sistema (originário) do nosso Direito de restringir a responsabilidade do trabalhador (90) e,
da responsabilidade civil e que conduziram à forma- accssoriamente, na ideia de considerar, contra o sis-
t.ema do nosso Direito de responsabilidade civil, cir-
ção de um novo e não escrito fundamento de imputa-
ção. Tão-pouco se deve negar que em casos especiais
(88) Na minha opinião, um semelhante aperfeiçoamento
possa ocorrer um conflito entre justeza sistemática e
juridico - descontando crassos vassos de «injustiça legal» - é
justiça material e que, em certas circunstâncias, ele admissivel sob a dupla pressuposição de que, por um lado,
possa ser decidido a favor da última; pois como se nfio se oponham aos valores do Direito positivo e que, por
apresentou desenvolvidamente no § 3, o sistema é outro, um «princípio geral do Direito» a exija, residindo o
rundamento da sua validade ou na «ideia de Direito» ou na
«aberto», portanto permeável a uma modificação; um
«natureza das coisas»; cf., mais desenvolvidamente, CANARIS,
tal aperfeiçoamento pode resultar também de exi- Die Feststellung von Lücken, ob. cit., p. 95 s., 106 ss., 118 ss.
gências da justiça material (87). Sob que circunstân- e supra, p. 69 s.
cias cabe a estas a primazia não é, contudo, nenhuma (89) Cf., quanto a isso, a nota anterior.
questão específica da problemática do sistema, mas (90) Onde fica ela, de modo exacto, é uma questão de
direito do trabalho que não se aprofunda, em particular, a este
antes pertence ao tema da admissibilidade da inter- propósito. Decisiva, em último lugar, deveria, de facto, ser a
pretação judicial criativa, em especial, à obtenção do natureza especial da relação de trabalho (e contratos apresen-
Direito com recurso à «ordem jurídica extra-legal», tados) e a situação atípica de risco, perante os outros contratos
(quanto à opinião própria, cf. RdA 66, p. 45 ss.); do ponto de
vista metodológico trata-se, pois, de uma argumentação com
(87) Cf. a tal propósito, sobretudo o § 3 II e IV 1, em auxílio de um princípio jurídico geral legitimado pela «natureza
especial p. 70 s.
das coisas» (o do princípio do risco).
cunstâncias sociais como as relações patrimoniais, o ',',0111, no fundo, apenas a consequência evidente de
estado familiar, etc., independentemente do facto de ,Iolmminadas qualidades do sistema, que existem com
cada aperfeiçoamento ou modificação do sistema não lolal independência da problemática da obtenção do
poder prosseguir, como as circunstâncias o exigi- Direito: da sua natureza teleológica e da sua «aber-
ram (91). 1lira». Perante elas há contudo também casos nos
Resumindo, deve dizer-se: a solução adequada ao quuis ocorrem autênticos - e altamente perturbado-
sistema é, na dúvida, vinculativa, de lege lata e é, I"'S - atentados à obtenção do Direito a partir do
fundamentalmente de reconhecer como justa, no Ilistema. Não seria apenas ingénuo acreditar que
domínio de uma determinada ordem positiva; pontos ('(Ida questão jurídica se deixaria solucionar a partir
de vista de justiça material contrários ao sistema só do sistema, sucedendo ainda, além disso, que a deci-
podem aspirar à primazia perante argumentos do ~{l\l) consentânea com o sistema seja inconciliável com
sistema quando existam as especiais pressuposições o Direito vigente: lacunas no sistema e quebras no
nas quais é admissível uma complementação do .'Ii.o.;(,ema são um fenómeno familiar para o jurista.
Direito legislado com base em critérios extra jurídico- A obtenção do Direito a partir do sistema vê-se, em
-positivos. ('onsequência, confrontada com limites inultrapassá-
vcis, que são os mesmos que se deparam à formação
do sistema. Mas estes últimos colocam um círculo
4. Os limites da formação do sistema como limites próprio de problemas, que assume o maior signifi-
da obtenção do Direito a partir do sistema cudo para o papel do pensamento sistemático na
jurisprudência e, por isso, deve ser discutido de
As prevenções até aqui realizadas quanto à obten- seguida (92).
ção do Direito a partir do sistema não representam
verdadeiras falhas nele mas, tão-só, como que limites
imanentes; pois tanto a necessidade de controlo teleo-
lógico como a possibilidade de um aperfeiçoamento
do Direito - e na última devem-se também contar
os poucos casos nos quais a justiça material pode
prosseguir contra a adequação sistemática - tradu-

(91) Já acima foi dito que não se trata aqui da conside-


ração de pontos de vista sociais.
§ 6.° OS LIMITES DA FORMAÇÃO
DO SISTEMA

A referência aos limites de uma obtenção do


Direito a partir do sistema, que constitui a conclusão
tio último parágrafo, indicou logo os limites postos
ao pensamento sistemático na Ciência do Direito.
De facto a formação de um sistema completo numa
determinada ordem jurídica permanece sempre um
objectivo não totalmente alcançado. Opõe-se-Ihe,
invencivelmente, a natureza do Direito e isso a dois
tftulos. Por um lado, uma determinada ordem jurídica
positiva não é uma «ratio scripta», mas sim um con-
junto historicamente formado, criado por pessoas,
apresentando como tal, de modo necessário, contradi-
ções e incompleitudes, inconciliáveis com o ideal da
unidade interior e da adequação e, assim, com o pen-
samento sistemático. Mas por outro, há na própria
ideia de Direito um elemento imanente contrário ao
sistema e, designadamente, a chamada «tendência
individualizadora» (1) da justiça que contracenando
com o pensamento sistemático - assente na «tendên-

(I) Quanto à oposição


entre tendências individualizadora
n ~~eneralizadora da justiça
cf. as citações supra § 1, nota 32;,
d. ainda supra § 4 IV = p. 83 s. e infra, § 7 n 2 e 3.
cia generalizadora» (2)! - tem como consequência o unUlo uma quebra no sistema tem de reportar-se a
surgimento de normas que a priori se opõem à deter- wna perturbação dessas unidade e adequação e, com
minação sistemática. «Quebras no sistema» e «lacunas iN~(), a uma inconsequência valorativa. O perguntar
no sistema» são, por isso, inevitáveis. pula possibilidade e pelas consequências de quebras
110 sistema desemboca assim na questão da possibili-
dade e do significado de contradições de valores e
de princípios (5).

1. Quebras no sistema como contradições de valores


e de princípios 2. Delimitação das contradições de valores e de
princípios perante os fenómenos aparentados

No que respeita, em primeiro lugar às quebras no


sistema, colocaram-se elas a propósito da fundamen- Para o esclareoimento deste tema é necessário, em
tação do conceito de sistema acima apresentado (3) JlI'imeiro lugar, circunscrever o conceito das contradi-
como contradição de valores e de princípios (4); pois çôes de valores e de princípios. Para tanto, há que
se o sistema mais não é do que a forma exterior da delimitá-Ias dos fenómenos aparentados.
unidade valorativa e da adequação da ordem jurídica,

(2) Cf. § 1 lI, 2.


(3) Cf. § 2 lI.
(4) As contradições de princípios representam apenas, A tal propósito, devem-se excluir, em primeiro
uma forma particular de contradições de valores, designada- lugar, as meras diferenciações de valores; tradu-
mente contradições nos valores fundamentais da ordem jurí- zem-se, com isso, as diferenças valorativas que se
dica; diferentemente, ENGISCH,Einheit, p. 64, nota 2 e
Einführung, p. 160 e 162, que não subordina as contradições
.iu~tificam materialmente, podendo ainda quebrar apa-
de princípios às de valores, mas antes as coloca lado a lado rentemente um princípio geral a favor de uma previ-
(cf., porém, também Einheit, p. 64, nota 2, última proposição
e Einführung, p. 164); tal é, do seu ponto de vista, adequado, (0) Quanto a estas cf., em geral, ENGISCH,Einheit,
pois ao contrário da opinião aqui defendida, ele também conta Il. 59 ss. e Einführung, p. 160 ss.; LARENZ,Methodenlehre,
como contradições de princípios, casos nos quais não há qual- p. 254 s., com outras indicações assim como os contributos em:
quer verdadeira contradição de valores, mas apenas meras l'lmELMAN(editor), Les Antinomies en Droit, Travaux du
oposições de princípios; cf., assim, infra, 2 d, no texto. Ct'lltre Nacional de Recherches de Logique, Bruxelles, 1965.
são especial- valorativamente atípica - e que, por incapacidade ou se é o inverso. Uma oposição entre
isso, não representam nenhuma autêntica «contra- dois princípios só se poderia, quando muito (6), acei-
dição». lur (7) caso o princípio da confiança, pela sua essência
ou pela sua configuração jurídico-positiva, exigisse
openas para si a protecção de quem confia. Mas não
(~esse o caso. O princípio da confiança informa ape-
nas algo sobre um dos lados - o do que confia - mas
Além disso, também são de excluir os limites
nfio sobre o outro lado, o do que responde; ora uma
imanentes de um princípio, pois estes não contrariam,
conclusão sobre as consequências jurídicas só pode
verdadeiramente, o princípio, mas apenas tornam
ter lugar quando se obtenham os critérios de justiça
claro o seu verdadeiro significado. Assim, por exem-
de ambos os lados; por conseguinte, outros elementos
plo, seria incorrecto falar de uma «contradição» entre
devem contribuir para a ideia da protecção da con-
o princípio da autonomia privada e a regra do res-
peito pelos bons costumes, nos termos do § 138 do fiança, justificando a responsabilidade da outra parte,
BGB. Pois como qualquer liberdade, a verdadeira os quais, em regra, se situam no princípio da auto-
liberdade inclui uma ligação ética e não é arbítrio; -responsabilidade, portanto numa imputação da pre-
assim também os limites dos bons costumes existem, visão de confiança a quem lhe deu azo (8). Caso este
de antemão dentro da autonomia privada; falar aqui
de uma «contradição» conduz a uma absolutização
da ideia de autonomia privada que confunde o seu (6) Na verdade, nem mesmo então; cf. infra, d), no texto.
(7) Fá-Io, por exemplo, LARENZ, Festschrift für Nikisch,
conteúdo ético-jurídico e desnaturaria, assim, o pró-
p. 302. Também os restantes exemplos aí referidos por LARENZ
prio princípio. não são, na verdade, verdadeiras contradições de princípios,
mas antes pertencem ou ao grupo da necessária ligação entre
dois princípios ou (predominantemente) ao grupo das meras
oposições de princípios (depois discutidos).
(8) Pode-se abdicar dela, como por exemplo nos casos
de protecção tabular, quando ocorram outros elementos que
Não poucas vezes se fala, sem razão, de contra- justifiquem a perda do Direito atingido ou a actuação da res-
dições de princípios onde, na realidade, apenas se ponsabilidade, como sejam, uma necessidade agravada da pro-
trata de uma ligação entre dois princípios. Exemplo tecção do tráfego perante a mera protecção da confiança ou o
disso é o problema de saber se a protecção do tráfego aumento da previsão de confiança perante a simultânea redução
das fontes de erros, através da colaboração de um órgão esta-
e da confiança tem a primazia sobre a tutela da
dual, e havendo, para mais, possibilidade de regresso, segundo o
não seja plenamente capaz, falta-lhe, em consequên- lt'lIdCncia de requerer, só por si, a tutela do confiante,
da, a imputabilidade (9) e, por isso, não se concretiza llnO se poderia ainda falar de uma «contradição».
a sua responsabilidade. Não se trata, pois, na ver- A problemática cairia então no quarto - e mais
dade, de que aqui, os princípios da protecção da IIllport.ante I--- grupo que deve ser separado: o das
confiança e da tutela das incapacidades tenham en- O]HISi(ões de valores e de princípios. Como já foi
trado em conflito entre si e de que esta «contradição» dit.o 11 outro propósito (10), pertence à essência dos
tenha sido decidida a favor do último, mas sim de 11l'lndpios gerais de Direito que eles entrem, com
que o princípio da confiança só se torna, basicamente "l'oquCncia, em conflito entre si, sempre que, tomados
relevante em conexão com o princípio da auto-res- Mil) cada um, apontem soluções opostas. Deve-se,
ponsabilidade e que, por isso, na falta de imputabili- ('IIU\O, encontrar um compromisso, pelo qual se des-
dade, falta também a protecção da confiança. Deve-se, 1111(', a cada princípio, um determinado âmbito de
pois, distinguir da contradição entre dois princípios, llpllcnção. Trata-se, pois, aqui da característica, acima
a não existência dos pressupostos de um de dois prin- Mlllhorada (I0), da mútua limitação dos princípios.
cípios relevantes apenas na sua conjunção. (:OIllO exemplo, recorde-se a tendência divergelJte
1'1tl.1'O o princípio da liberdade de testar e o da pro-
l(~c(:II() da família, que encontram o seu equilíbrio na
It'gltimu. Contra a opinião de ENGISCH (11) não se deve
considerar semelhante «compromisso entre dois dife-
Mesmo quando não se aceite este entendimento I'c'lltes princípios gerais» da ordem jurídica como uma
do princípio da confiança, antes lhe contrapondo a
('ollU'aclição, mas sim como uma oposição. Pois uma
contradição é sempre algo que não deveria existir e
§ 839 BGB, etc. Nota do tradutor: este preceito estabelece a
responsabilidade do funcionário que viole o seu dever perante
terceiro.
(9) No entanto, apesar de estas se poderem também deci- ('0) Cf. p, 53.
dir fundamentalmente segundo a analogia dos § § 827 ss. do (") Einführung p. 162, nota 206 b; cf. também LARENZ,
BGB, os §§ 104 ss. BGB adaptam-se melhor, pois se trata das ','('III.schrift für Nikisch, p, 301 e Methodenlehre, p. 314, onde
consequências de um tráfego no âmbito negocial e porque tam- I,AllJ':NZ fala igualmente de contradições, a tal propósito apesar
bém aqui as consequências jurídicas típicas, se conectam aliás dn ele, segundo a matéria, ter meras oposições de princípios
com os negócios jurídicos. Nota do tradutor: os §§ 827 ss do ('111 vista (cf. também nota 7); LARENZ substitui também até o
BGB estabelecem previsões de inimputabilidade, enquanto os \1'1'1110 «contradição» pelo termo «desacordo» - essencialmente
§ § 104 sS., do mesmo diploma se reportam às incapacidades /IIais adequado - sem contudo, presumivelmente, se querer com
negociais. íli:;O (~XI)fimiruma diferença material.
que por isso, sendo possível, deve ser eliminado ou
seja, como diz ENGISCH, uma desarmonia (12), enquanto :1. As possibilidades de evitar contradições de valo-
as oposições de princípios aqui em causa pertencem res ou de princípios, através da interpretação
necessariamente à essência de uma ordem jurídica e criativa do Direito
só a esta dão o seu pleno sentido (13); eles não devem,
por isso, de modo algum ser eliminados (14), mas antes Alcançou-se, com isto, o círculo seguinte de pro-
«ajustados» através de uma solução «intermédia», blemas: a questão de como se deve comportar o
pela qual a sua oponibilidade interna se «resolva» Jurista, aquando da aplicação do Direito, perante tais
num compromisso, no duplo sentido da palavra (15). ('ontradições de valores e de princípios e em que
A expressão contradições de princípios deveria por dimensões devam, por conseguinte, manter-se as
isso ser reservada para as verdadeiras contradições, quebras de sistema. ENGISCH é de opinião de que as
isto é, para as contradições de valores que perturbam contradições de valores e de princípios «devem, em
a adequação interior e a unidade da ordem jurídica J:l'ral, ser aceites» (16). Isso não deve ser admitido,
e a sua harmonia e que, por isso, devem basicamente Semelhantes contradições representam uma violação
ser evitadas ou eliminadas. da regra da igualdade (17) à qual tanto o legislador
como o juiz estão vinculados (18). O jurista tem, por
isso, de recorrer a todo o seu arsenal metodológico

(12) Ob. cit., p. 162. ('11) Cf. Einführung, p. 161 e para as contradições de
(13) Acertadamente, ESSER,Grundsatz und Norm, p. 81 princípios (ainda mais fortemente diferenciador), p. 164; cf.
e p. 159, onde se diz que através de um princípio se mantém IlImhém jã Einheit, p. 63 s. e p. 84 ss., onde ENGISCH também
o outro em «dimensões razoáveis»; cf., ainda, LARENZ, l'I'conhece que, na verdade, a eliminação de contradições de
Festschrift für Nikisch, p. 301 s. valores - assim como as de normas pode ser «incondicional-
(14) Também ENGISCH não o quer; cf. ob. cit., p. 164; no , Ilwnte necessãria» (cf. p. 84); pergunta-se contudo por onde
entanto, ele não limita essa reserva às oposições de princípios, SI' deve medir a «necessidade» de uma eliminação e na res-
antes incluindo nela (em parte) também as autênticas contra- posta a essa questão, não se pode evitar o recurso à regra
dições (no sentido da terminologia utilizada no texto); no da igualdade, assim como surge a regra fundamental da elimi-
último caso ele não pode, contudo, ser seguido (cf. infra, 3, llaçilo recomendada no texto. - Em qualquer caso a termino-
no texto), e porque o tratamento jurídico de ambos os fenô- logia de ENGISCH,em parte diversa, merece consideração; cf.
menos é diferente, também por isso se recomenda uma clara quanto a isso, as notas 11 e 14.
delimitação terminolôgica. (11) Assim também LARENZ, Methodenlehre, p. 254; reser-
(15) A oposição é, pois, simultaneamente superada e vado, ENGISCH, Einheit, p. 62 s. (<<talvez»).
ainda mantida no compromisso. (lH) Cf. de seguida infra, 4, no texto.
para contrariar o perigo de contradições de valores e 111(;l)cS de valores e de princípios (20), portanto em
de princípios podendo, quando muito, perguntar-se ("/lHOS nos quais a ordem jurídica associou numa norma
que êxito já se obteve desse modo (10). Ó pt'(~vjsão P1 a consequência C e noutra norma a
lIlIllI previsão P2 valorativamente semelhante, no
t'liNl'neial, a consequência jurídica não-C. Além disso
podem-se evitar contradições de valores com recurso
l~ interpretação sistemática na medida em que se
Como meio auxiliar metodológico surge primeiro ílll(~t'pt'ete o teor de diferentes preceitos em confor-
ã interpretação sistemática e, dentro desta, sobretudo
Illidndc com o sistema, isto é, de modo unitário.
os princípios sobre a lex specialis, a lex posterior e a
AI1Nltn, por exemplo, só surge uma responsabilidade
lex superior (19a). Apesar de, inicialmente, elas só
pl'lll confiança pela emissão de uma procuração,
terem sido desenvolvidas a respeito de contradições
IIl'I',undo o § 172 I BGB, quando o sacador tenha
de normas - portanto em casos nos quais a ordem
«1'111 regue» o documento ao procurador e não quando
jurídica associa, à previsão P, numa norma, a conse-
quência C e noutra, a consequência não-C - pode-se t+ Ilw tenha sido roubado, ao passo que dois outros
transferi-Ia, pelo menos em parte, para as contradi- prl'ceitos da responsabilidade pela aparência, estrei-
IUlflente aparentados, a saber os § § 370 e 405 BGB

(19) De forma semelhante, LARENZ, ob. cit., com nota 1.


(10a) «Lex» pode ser também uma norma consuetudinária. ("") A questão está pouco esclarecida e careceria de uma
Assim a contradição de valor entre o § 307 I 2 BGB e as Íflvl'Htigação autónoma. Com frequência, a problemática poderá
regras gerais sobre a «culpa in contrahendo», i.V.m. § 254 BGB rH'1' ('('solvida através da concretização, numa norma, da valora-
(quanto à problemática d., por um lado, LARENZ, Schuldrecht l;ílo em jogo encontrando depois as regras sobre a lex superior,
A. T. p. 83, nota I e, por outro, ESSER, Schuldrecht A. T. p. 206, potllorior ou specialis aplicação imediata; mas esse caminho
nota 16) pode-se eliminar através da - aliás problemática- 1Il'1l1 Hempre é praticável. De resto, a transferência do prin-
ideia de que a proposição jurídica sobre a «culpa in con- I'lpio da primazia da lex supel'ior poderia ser o mais justificado,
trahendo», hoje consuetudinariamente reconhecida, tem prece- "nqllllnto a relação entre valores e princípios contraditórios
dência como lex posterior (generalis) e, por isso, está derrogado I1nll'riol'es e posteriores, portanto o círculo de problemas da
o § 307 I 2. Quando se não queira segui·lo, chega-se também
à nulidade do § 307 I 2, com base na regra desenvolvida no
'.'X /losterior, apresenta dificuldades maiores; cf. por último,
pOI' exemplo, ENGISCH, Einheit, p. 84 e Einführung, p. 164 s.,
texto, 4 b, pois a valoração subjacente a esse preceito, em com- com indicações desenvolvidas; LARENZ,Methodenlehre, p. 266 Ss.,
paração com o § 254 e as proposições sobre a «culpa m con- l'OIl1 o exemplo interessante da relação do § 254 BGB com o
trahendo» só pode, hoje, ser considerada como «evidente li I RJ-IaftPflG; BE'ITI, Allgemeine Auslegungslehre, ob. cit.,
arbítrio». p, n:lH, Cr. neste âmbito o exemplo em nota-de-rodapé 19 a.
não fazem tal limitação, pelo menos de modo 11IClIna, pois a lei apenas exige a «emissão» do
expresso. Ela deve-se, no entanto, interpretar assim docurnento e a inclusão da característica da «entrega»
para minorar ou evitar neles uma contradição de Jn nfío fica no quadro do possível sentido verbal (24).
valores, com base numa interpretação conforme com
o sistema (21), porque não se detecta um fundamento
razoável para a diferenciação (22) e porque também h) As possibilidades da complementação sistemática
o § 935 I BGB aponta na mesma direcção (*). Assim, das lacunas
no caso do § 370, poderia ainda haver uma inter-
pretação (restritiva) ou sentido estrito, pois seria Com isso alcançou-se já um segundo degrau na
inteiramente viável dizer que, em termos linguísticos, ('Iiminação de contradições de valores e de princí~
o ladrão não é necessariamente considerado como pios: junto da interpretação conforme com o sistema
«transmissário» de um recibo (2:3); no caso do § 405 Il"rgetambém a complementação de lacunas conforme
trata-se, pelo contrário, de uma complementação de ('OIH ele. Também aqui se devem utilizar os proces-
111 IH lradicionais, tais como a analogia, o argumentum
li forl:iori e a redução teleológica que nada mais tra-
(21) Opinião dominante; cf. para o § 370, por todos, dllzem do que exteriorizações metodológicas do prin-
PALANDT/DANCKELMANN, § 370, nota 1 e para o § 405 STOLL,
AcP 135, p. 107. I'Ipio da igualdade. Assim por exemplo a contradição
(22) Na circulação dos títulos, não ocorre a supressão da de valores, discutida por ENGISCH(25) em conexão
vinculação do sacador o que se justifica desde logo pelo escopo COll1 uma decisão do RG (26), entre a pena mais leve
da circulação e pela elevada necessidade de tutela do tráfego, peio infanticídio do que pelo abandono de uma
a ela ligada, de tal maneira que não há, então, nenhuma con- niança, a que se siga a morte, cometidos pela mãe,
tradição de valores a eliminar, mas antes uma significativa
diferenciação de valores. illl(~djatamente depois do nascimento, poderia, ao con-
(23) Cf. já o protocolo ao ADHGB,1858, 1. 1323 s.;
REYSSNER, Festgabe für R. Roche, 1903, p. 142; GOLDBERGER,
Der Schutz gutgliiubiger Dritter im Verkehr mit Nichtbevollmach- ('11) Ela não é por isso inadmissível. Existe antes um
tigten nach Bürgerlichen Gesetzbuch, 1908, p. 82. Também particular tipo de lacuna - pouco tratada, até hoje, na sua
os autores aqui citados representam contudo, com a doutrina particularidade: uma «lacuna normativa escondida», na qual a
dominante, a opinião de que o § 370 também se aplica no caso dderminação da lacuna com recurso ao princípio positivo da
de desaparecimento. il~lIl1ldadeé bem sucedida; cf., quanto a isso, em geral, CANARIS,
(*) Nota do tradutor: o § 935 I BGB excepciona 11 aqui- /)íe Feststellung von Lücken, p. 81 e p. 137 s.
sição a non domino através da posse de boa fé - portanto ao ('ir.) Einführung, p. 160.
abrigo do princípio «posse vale título» - as coisas roubadas. ('111) RGSt. 68, p. 407 (410).
trário da opinião de ENGISCH e do RG, ser eliminada l'rdnçfío criativa do direito (28). Quando, por exem-
através de um argumentum a jortiori: quando na pró- plo, os ~~ 370 e 405 BGB, contivessem a afirmação
pria morte de uma criança, possam ser consideradas nx pressa «mesmo quando o documento tenha sido
circunstâncias atenuantes, então também no aban- tirado ao emitente», não se poderia eliminar a con-
dono, no fundo menos valorado pela lei, assim deverá Irndição de valorações com o § 172 I BGB - igual-
suceder; não há, então, de modo algum, uma decisão mente inequívoco na letra como no sentido - através
claramente contraditória do legislador; este apenas da interpretação e da complementação de lacunas
não considerou a previsão especial no quadro do (lendo também em conta a aceitação, proximamente
§ 221 8tGB, de tal modo que, mesmo do ponto de discutida, de uma lacuna de colisão). Os §§ 28, 130
vista de partida da teoria subjectiva da interpretação, n 173 do HGB (*) podem oferecer um exemplo,
não se trata de uma correcção inadmissível da lei. ('!'tirado do Direito vigente, para semelhante contra-
diçito de valores: enquanto pelo ingresso no estabele-
cimento de um comerciante singular, a responsabili-
c) Os limites da eliminação de contradições de valo- dade pelos antigos débitos pode ser afastada, segundo
res e de princípios através da interpretação o ~ 28 lI, com eficácia perante os credores, ela está,
criativa do Direito IIquando do ingresso numa sociedade em nome colec-
ti vo ou em comandita, injuntivamente prescrita,
segundo os § § 130 II e 173 lI, - uma diferença para
Com isso ficam também indicados os limites que
ti qual não se encontra uma fundamentação razoá-
se colocam à complementação de lacunas em confor-
y('] ("0). A contradição de valorações, aí presente,
midade com o sistema: eles surgem onde, em geral,
residam os limites da integração das lacunas (27).
Assim, ela é, antes de mais, vedada quando o teor e o
('lR) Aqui se integram junto da proibição de analogia,
sentido da lei se oponham claramente à presença de mais vezes referida a este propósito, também a proibição de
uma lacuna ou quando haja uma proibição de inter- restrição ou de indução; quanto à última, cf. CANARIS, ob. cit.,
p. l!n, e respectivamente, p. 184 ss. e 194 ss.
("lJ) Isso pode, em qualquer caso, ser aqui apoiado, para
('sdarccer a problemática metodológica (e constitucional, cf.
(27) Esta problemática e, em especial, a delimitação entre
ínfra, 4 b).
lacuna e erro jurídico-político não pode ser aqui aprofundada;
(*) Nota do tradutor: HGB é a sigla de Handelsgesetz-
cf., quanto a isso, mais desenvolvidamente, CANARIS, Die
/Juel1,o Código Comercial Alemão, de 10 de Maio de 1897, com
Feststellung von Lücken, p. 31 ss., com indicações pormenori-
nll:erações posteriores. O sentido dos preceitos citados vem
zadas a p. 55 ss.
('xplicado no próprio texto.
não se pode eliminar nem com recurso à interpreta- I'ssencial, pela categoria, pela dignidade e pela neces-
ção nem à complementação de lacunas: o § 28 II por sidade de protecção do bem jurídico em jogo. Em
um lado e os § § 130 II e 173 II, por outro, são igual- ~i1I1111ltâneo,não é admissível penalizar a tentativa
mente claros, pelo teor como pelo sentido: não se de ofensas corporais com o argumento seguinte: se
trata aqui de uma lacuna mas de um «erro jurídico- 11 tcmtativa de danos materiais é punível, então tam-
-político». - Semelhantes dificuldades podem também h('m o será a de ofensas corporais. Pois em seme-
ocorrer quando uma regulação contrária ao sistema Ihonte argumentum a fortiori residiria uma comple-
surja num nível consuetudinário; recorde-se, apenas, Ilwntação de lacuna in malam partem e esta, pelo
a transmissão de garantias e a contradição daí resul- nwnos na parte especial do StGB, é proibida pelo
tante com a proibição de um penhor sem posse. ÃI'L 103 II GG. Não se pode, pois, remediar a contra-
Como exemplo para os limites que são postos à d içüo de valores.
eliminação de contradições de valores através de uma Finalmente, os limites à interpretação criativa do
proibição da interpretação criativa do Direito, pode Direito, tal como surgem no fenómeno das lacunas
citar-se a diversa regulação da punibilidade da ten- iHintegráveis (31), opõe-se à eliminação de uma con-
tativa nos danos materiais por um lado e das meras tradição de valores. Por exemplo, é uma grave quebra
ofensas corporais, por outro lado; enquanto a tenta- do sistema que a responsabilidade segundo o § 22
tiva, no primeiro, cai expressamente numa pena, falta, WIIG não tenha um limite máximo (32); pois uma
no último, uma regulação correspondente; daí resulta quantia máxima é prevista em todas as restantes pre-
uma desagradável contradição de valores (30), pois o visües de responsabilidade pelo risco (com excepção
nosso Direito valora, basicamente, de modo mais ele- do ~ 833/1 BGB (33)) e é também requerida pelos
vado, a inviolabilidade do corpo e, em consequência, princIpios fundamentais constituintes desse instituto,
protege-a de modo mais forte do que a propriedade, lima vez que apenas assim pode ser prevenido o
e ainda porque a punibilidade da tentativa se pauta, perigo de uma «imputação ruinosa de danos» e só
segundo a sistemática do StGB (entre outros), no . (1Pstü modo se pode garantir a plena segurabilidade

(30) Ela foi, como exemplo para tanto, apresentada por ('11) Cf., quanto a isso, em geral, CANARIS, ob. cit.,
ENGISCH, Einführung, p. 160, com razão. A polémica de p. 172 ss., com indicações.
SCHREIBER,Logik des Rechts, p. 60, contra ENGISCH é inopor- (:t,,) Cf. principalmente a crítica de LARENZ, VersR 63,
tuna (cf. a penetrante réplica de ENGISCH, ob. cit., nota 198a) p. !l!)( 55. (603) e Schuldrecht B. T., § 71 VIII. Nota do tradu-
e demonstra, tal como outras afirmações de SCHREIBER (cf., 101': quanto ao WHG vide a nota do tradutor, infra, p. 237.
quanto a isso, infra, notas 44 e 67) uma incapacidade alarga da ('''') Neste não se pode, contudo, falar de uma quebra
para colocações problemáticas axiológicas e teleológicas. 110 ~:isl.('ma; cf. infra, p. 128.
do risco - indispensável para a responsabilidade pelo
risco. A falta de uma quantia máxima no § 22 WHG 4. A problemática da vinculabilidade de normas con-
deve assim ser considerada como uma lacuna pois trárias ao sistema e a ligação do legislador ao
os princípios imanentes da responsabilidade pelo risco pensamento sistemático
exigem uma regulação correspondente e porque, por
outro lado, nem a redacção do preceito nem a his- Não foi, com isso, dito que semelhantes contradi-
tória do seu aparecimento deixam pensar que o legis- ções de valores e as quebras no sistema deles deriva-
lador tenha conscientemente pretendido encontrar uma dos devessem ser aceites sem excepção. Tendo-se
decisão contrária. Esta lacuna não pode, porém, ser designadamente presente que as contradiçõs de valo-
preenchida pelo juiz, por não haver disponíveis cri- res representam violações contra o princípio da
térios jurídicos específicos para a necessária deter- igualdade e que este é, de modo reconhecido, tanto
minação de uma quantia certa e porque uma seme- uma emanaç"io da ideia de Direito como também parte
lhante decisão, por força do factor de arbítrio que da lei fundamental, levanta-se a questão de saber se,
sempre contém, deve permanecer reservada ao legis- pelo menos em certas condições, não será, no caso
lador (34). Também aqui os meios de interpretação de uma contradição de valores, de negar eficácia às
criativa jurisprudencial estacam perante contradições normas em questão. Com isso passa a examinar-se
de valoração (35). um novo aspecto da problemática do sistema: a ques-
Em resumo, fica assim determinado que há con- tão da vinculabilidade de normas contrárias ao sis-
tradições de valores que não podem ser ultrapassadas tema e, consequentemente, a questão da ligação do
com auxílio dos métodos legítimos da interpretação legislador ao pensamento sistemático (36). Na sua res-
e da interpretação criativa do Direito. Tal o caso em
que a contradição de valores não se traduza numa
(36) Esta está, até hoje, ainda relativamente pouco estu-
lacuna, .mas num «erro jurídico-político» ou em que
dada. Remete-se, contudo para os trabalhos de ZIMMERL (Der
existia, na verdade, uma lacuna, mas a sua integração Aufbau des Strafrechtssystems, 1930,Strafrechtliche Arbeitsme-
seja proibida ou impossível. thode de lege ferenda, 1931, em especial p. 14 ss., 54 ss. e
146 ss.), nos quais, no entanto, o centro de gravidade não está
na problemática metodológica, mas sim na substantivo-penaIís-
tica; ZIMMERL argumenta também, predominantemente, de lege
(84) Quanto aos fundamentos cf., mais de perto, CANARIS, ferenda, de tal modo que a questão da adstringibilidade de
ob. cit., p. 175 s.
normas contrárias ao sistema, de lege lata, fica, nele, total-
(85) Quanto à questão da validade do § 22 WHG cf. mente subjacente. Cf. também BELING, Methodik der Gesetzge-
infra, p. 128 s., com nota 60. bung, insbesondere der Strafgesetzgebung, 1922, p. 20 s.
posta resultam aspectos metodológicos e ainda, tal Trata-se, agora, também de processar a existência
como perante a problemática da validade não poderia dI' lima contradição de valores e aí, de igual modo,
deixar de se esperar, aspectos constitucionais. lIImentar em que as normas contraditórias se supri-
llltlll c surgem, em consequência, lacunas de coli-
tll'lo C'H). Contra isso levanta-se, de imediato, a objec-
a) A solução com auxílio da aceitação de uma I;f\o de que existe para a eliminação de contradições
«lacuna de colisão» cHltro normas uma necessidade mais forte do que para a
c-litninação de uma contradição de valores C'D). A rele-
No que toca à primeira, reconhece-se na metodolo- vf\l1cia desta prevenção só pode ser ponderada quando
gia tra:dicional, há já muito uma figura que, em certas :w indague pelo fundamento que obriga à exclusão de
circunstâncias, também se pode revelar frutuosa na cOl1l.radições e quando se coloque este perante a
,presente problemática: a das chamadas lacunas de dirl'l'ença entre ambos os tipos de contradições. À pri-
colisão (37). Fala-se, tradicionalmente, de tal figura Illt'il'<l vista, parece jogar aqui um papel a ideia de
sobretudo nos casos de contradição de normas: quando qUI', no caso de uma contradição de normas, há uma
~ a lei, à previsão P, associe, em simultâneo, as con- 1'011 tradição lógica (40), e no de uma contradição de
"sequências jurídicas C e não-C e esta contradição vnlores, pelo contrário, apenas uma contradição axio-
r' não se deixe dirimir com recurso à interpretaçgo~)'
lcomum e à interpretação criativa, desaparecem então, ( ('i") Esta possibilidade já foi vista por ENGISCH,Einheit,
mutuamente, ambas as ordenações normativas do;' p. H~, c afirmada, não em geral, mas antes apenas para casos
Direito, surgindo uma lacuna. Mas com isso já sê' r:i1II~uJares (infelizmente não mais determinados). Contra, con-
ludo, CANARIS,ob. cit., p. 66, nota 32, onde as lacunas de
ultrapassou o âmbito da complementação da lacuna e
mlisfío (teleológicas) são claramente delimitadas das contra-
se penetrou no da derrogação, o que não tem sido, .lil;Cies de valores; a opinião aí expressa é aqui, por mim,
até hoje, suficientemente enfocado na literatura; pois lIhnndonada; d., em breve, no texto.
o passo decisivo ocorre antes da afirmação de uma ('li) Esta é a posição básica de ENGISCH,d. Einheit, p. 63
lacuna, designadamente na aceitação de que se deba- ,. lIihtührung, p. 161; cf. ainda BETTI, Allgemeine Ausle-
1:lIllgs1ehre, cito p. 638 (para a relação entre lex prior e lex
tem normas contraditórias e que, por isso, ambas ) 11 )~, lt~rior).
são nulas. (10) Assim SCHREIBER,ob. cit., p. 60; CANARIS,ob. cit.,

(37) Cf. quanto a isso, por todos, ENGISCH,Einheit, p. 50


e p. 84, assim como Einführung, p. 159; CANARIS,ob. cit.,
p. 65 ss. com indicações desenvolvidas, na nota 28.
I
'\
p. (}(i; d. também, ENGISCH,Einführung, p. 234, nota 198a, que
llIuna conexão similar, igualmente a propósito da «identidade
lIuWntica das questões de direito», - que sempre existe nas
mntradições de normas! - afirma uma contradição lógica; mas
d. tamhém KELSEN, Reine Rechtslehre, p. 209 s.
lógica ou teleológica; a primeira não poderia em caso ~H!hllletem apenas ao critério do certo ou errado e
algum aceitar-se porque o Direito se submete às leis IIllo, pelo contrário, para proposições de dever-se que
da lógica (41), ao passo que a última seria admissível, llll o se medem por essa bitola, mas sim pela validade
uma vez que a ordem jurídica determina os seus pró- ou invalidade (44). Mas mesmo quando se aceite que
prios valores (42) e porque, além disso, uma decisão 11 111 a contradição de normas deva, efectivamente, ser
contraditória do legislador deve ser respeitada. Ora lnltuda como uma violação às leis da lógica, não se
é já muito duvidoso e deveria, pelo menos, ser con- l1l'gue daí que também sejam razões lógicas que
siderado por esclarecer, se e até onde subjazem, efec- conduzam à solução do problema que aqui interessa,
tivamente, as leis da lógica à ordem jurídica (43); pois designadamente à aceitação de uma lacuna de colí-
estas valem - pelo menos na sua configuração habi- SiiO. Pois tal como da contradição de duas afirmações
tual- apenas para proposições que, como tais, se sú se pode concluir que uma delas deve ser falsa

(.fI) Cf., principalmente, SCHREIBER,ob. cit., p. 60, que (11) Quanto à problemática, cf. por exemplo, KELSEN,
considera a necessidade de eliminação de contradições de nor- U"illc Rechtslehre, p. 76 s. e ARSP 52 (1966), p. 545 ss. (548);
mas como «exemplo para o facto de que as leis da lógica são ARSP 52 (1966), p. 195 ss.-A
I'III/,]]'PS, tentativa de SCHREI-
parte evidente do Direito». 111m, ob. cit., p. 63 ss., de encontrar um conceito superior
(42) Nesta direcção, SCHREIBER,ob. cit., p. 60. comum é totalmente errada. Pois quando ele escolhe «válido»
(43) SCHREIBER,ob. cit., p. 90 ss., faz uma tentativa para (~omo tal, isso traduz de novo uma facilmente detectável troca
fundamentar que as leis da lógica sejam parte do Direito. do conceitos: válido tanto pode ser utilizado como sinónimo
As suas considerações são, porém, desesperadamente confusas. dI' verdadeiro (<<uma afirmação válida») como sinónimo de
Em especial, .ele troca, de modo ostensivo a «ligação» às leis vig(~nt:o (<<uma prescrição válida»), tendo, no entanto, em
da lógica com a «ligação» do juiz à lei e ao Direito (cf. p. 93 s), IImbos os casos, um significado totalmente diferente e sendo,
e torna-se, com isso, culpado de uma primitiva troca de con- por isso, um conceito comum impraticável. SCHREIBERreconduz
ceitos, pois a força vinculativa de uma proposição enunciativa depois a transformação ilimitada de regras lógicas às regras
e de uma proposição de dever-ser é qualitativamente diferente. .Iurídicas e, finalmente, a sua própria teoria para o absurdo
Além disso, a citação de KLUG, p. 93, e o apelo às decisões quando ele afirma do conteúdo de uma norma jurídica exis-
jurídicas tomadas em revista, p. 94, deixam pairar a suspeita Il'ote: «Ê legal: os autores de dissertações sobre a lógica do
de que SCHREIBERconfundiu mesmo o carácter jurídico das Direito são relegados ou não relegados» (cf. p. 65 s.) e não
leis lógicas com o da ligação, a estas, do aplicador do Direito considera esta proposição jurídica, que confere escárnio a
(cf., quanto a isso, muito claro, KLUG, Juristische Logik, p. 142; qualquer conceito de validade, como a pura falta de sentido,
a propósito de «regras técnicas» especificamente jurídicas pode qU(~ela é, mas apenas como exemplo de uns «certos rigores
ser diferente, porque e na medida em que estas sejam expres- ti ue proposições jurídicas lógicas comportam» (p. 66). Só se
são de verdadeiras máximas de justiça; cf., quanto a isso, pode ver, nestas considerações, uma auto-crítica - aliás muito
ESSER, Grundsatz und Norm, p. 110 ss.). Infeliz.
assim só se pode, em termos puramente lógicos, 11I(;ÜO de invalidade de ambas as normas (16). Esse
concluir da contradição de duas normas que uma ('rif(-rio assume no entanto, também nas contradições
de elas deve ser inválida; trata-se, no entanto, de dt, valores, um papel decisivo, pois elas representam
explicar porque razão não são ambas inválidas - pois violações do princípio da igualdade, estreitamente
é através desta aceitação que a contradição de nor- ligado à proibição de arbítrio e assim se impõe de
mas deve ser eliminada - não se deixando, assim, facto a conclusão de que também na contradição de
resolver a problemática, de modo algum, com recurso valores se pode ser auxiliado pela aceitação de uma
à lógica. Im.:una de colisão.
Só nos aproximamos da efectiva fundamentação Não deve, a tal propósito, esquecer-se no entanto
da aceitação de uma lacuna de colisão quando per- lima diferença essencial para com as contradições de
guntemos quais de ambas as normas devem ser, res- normas: enquanto nestas o juiz, deve, em qualquer
pectivamente, válida ou inválida, e, ao mesmo tempo, caso, negar obediência a pelo menos uma norma, pode
se deixe claro que uma resposta juridicamente expli- ele, naquelas, seguir ambas as normas; enquanto no pri-
cável não é aqui possível porque, por força da par- meiro caso o juiz não tem pois qualquer possibilidade
ticular problemática da insolúvel contradição de de justificar o atentado à proibição de arbítrio com a
normas, faltam os correspondentes critérios de vali- sua vinculação à lei, pode ele, no segundo, apelar à
dade (45). Nada mais ficaria, aliás do que a mera autoridade do legislador, a cuja determinação respeita
decisão por qualquer de uma ou de outra norma. Mas a violação do princípio da igualdade e cuja vontade
isso seria puro arbítrio equivalendo a uma solução ele não pode desconsiderar. Nesta diferença deveria,
que, por natureza não seria jurídica. Em última aná- por fim fundamentar-se a ideia de que as contradições
lise surge a proibição de arbítrio que conduz à acei- de valores são mais comportáveis do que as contra-
dições de normas. Sendo-lhe atribuído tal significado,
efectivamente decisivo, levanta-se de imediato a objec-
(15) Quando seja possível fundamentar a primazia de
qualquer de ambas as normas, não há nem uma insolúvel .<.;50 de que um tratamento diverso entre as contradi-
contradição de normas, nem uma lacuna de colisão. Uma tal fun. ções de normas e as de valores e a preterição aí
damentação pode não só resultar das regras sobre a lex specialis
mas também de outros pontos de vista, como, por exemplo, de
que uma de ambas as normas contraria o sistema interno, a (iG) Que exista, através disso, uma lacuna de colisão,
natureza das coisas, a ideia de Direito ou os valores morais ~aí se deixa aceitar quando se aceite a proibição de denegar
reconhecidos na comunidade de Direito, enquanto a outra justiça; pois só esta bloqueia a saída existente de considerar
esteja em consonância com esses critérios; então vale apenas insolúvel a questão jurídica, por força da contradição; cf.
a última e não existe uma lacuna de colisão. Ctd\IARIS, ob. cit., p. 65 5S.
expressa do princípio da igualdade a favor da lealdade l.ituição, tanto mais que ela não está apenas assente
à lei deveriam ser rejeitados como um resquício posi- 110 art. 3 I mas antes «para além disso vale em todos
tivista. Esse aspecto pode, contudo, por agora ('Ga) os domínios como princípio constitucional autónomo
ficar em aberto; pois também do ponto de vista de I ilo escrito ... » (48). Com este pano de fundo ganha
um positivismo extremo, não fica o juiz, de modo () 'pensamento sistemático um novo aspecto do mais
algum, submetido sem excepção a normas infra-cons- alto significado prático: as normas contrárias ao sis-
titucionais, antes podendo negar-Ihes obediência com lema podem, por causa da contradição de valores
a fundamentação de que elas são inconstitucionais. nelas incluída, atentar contra o princípio constitucio-
Porque as contradições de valores são violações do nal da igualdade e, por isso, serem nulas. De facto,
princípio da igualdade, surge, precisamente, uma afe- o Tribunal Constitucional manifestou-se, também,
rição pela bitola do art. 3 I GG. A problemática tor- diversas vezes neste sentido e, por exemplo, consi-
na-se assim uma problematização constitucional. derou nula uma norma com a fundamentação de que
() legislador «se afastou do seu próprio princípio»,
sem que «houvesse razões bastantes e materialmente
b) A solução com auxílio do princípio constitucional figuráveis para esta contrariedade ao sistema» (49).
da igualdade Noutro local disse-se que embora o legislador fosse,
na verdade, livre «de se afastar de um certo círculo
Resulta imediatamente do art. 1 III GG que o jurídico de regras fundamentais que ele próprio colo-
a,rt. 3 I GG obriga também o legislador. É também cara» poderia um tal afastamento «ser um indício de
indubitável que ele vale para todos os domínios jurí- arbítrio, ... , quando com isso o sistema da lei fosse
dicos e em especial também para o conjunto do Direito abandonado sem razões materiais suficientes» (50) e,
privado (47), pois a legislação é sempre o exercício em lugar diferente, de novo afirmou o Tribunal Cons-
de um poder soberano e, por isso, não se trata da ti tucional que uma violação contra o art. 3 GG pode-
problemática da «eficácia externa» dos direitos fun- r.ia residir numa «regulação de tipo novo que caísse
damentais. Por consequência, as contradições de valo- fora do sistema, negando o sentido e o escopo da lei
rações não devem ser tratadas de modo diferente do até então existente» (51).
das restantes violações à regra da igualdade da Cons-

('18) Cf. BVerfGE 6, 84 (91).


(46a) Cf., púrém, infra, nota 58a. (19) BVerfGE 13, 31 (38).
(47) Cf., por exemplo, BVerfGE 11, 277 (280 5.); 14, 263 (no) BVerfGE 18, 315 (334).
(285); 18, 121 (124 55.). (r,l) BVerfGE 7, 129 (153); 12, 264 (273).
Não quer isto dizer que cada norma contrária ao 1":, em primeiro lugar, imaginável que não seja de
sistema deva, sem mais, ser nula. O Tribunal Consti- Ill'gar uma certa desarmonia de valoração, mas que
tucional fala apenas num indício de uma violação do l'sf a não haja, contudo, alcançado o grau necessário
artigo 3 e introduz, diversas vezes e cautelosamente 1)(1 ra afirmar um efectivo arbítrio, e que, portanto, a
o termo «talvez» ("2), - por onde se pode reconhecer «n[lo substancialidade da regulação aprontada» não
que lhe subjaz uma outra ideia mais extensa de con- ~I('ja«evidente» (54), (55). Assim, deve-se pensar que o
ceito de sistema do que o que aqui representado e, legislador, para além do objectivo de uma regulação
possivelmente não pensa apenas no sistema «interno». Illuterialmente justa, harmónica na totalidade da
Mas sobretudo, é de enfocar que, segundo a juris- ordem jurídica, ainda tenha de prosseguir outros
prudência constante do Tribunal Constitucional, o t'seopos e que, por isso, nem toda a contradição deva
artigo 3 I se deve entender no sentido de uma proibi- I raduzir a violação da proibição de arbítrio. Antes
ção de arbítrio: «o princípio da igualdade é violado «l' mais, deve-se aqui pensar no valor da segurança
quando não se possa apontar um fundamento razoá- Jurídica. Esta pode, por exemplo, justificar uma proi-
vel, resultante da natureza das coisas ou material- hit;ão de analogia (56) e com isso opôr-se à eliminação
mente informado para a diferenciação legal ou para (fp contradições de valores; recorde-se apenas o
o tratamento igualitário, ou, mais simplesmente, ('xemplo acima discutido da não punibilidade da sim-
quando a disposição possa ser caracterizada como ples tentativa de ofensas corporais. Não pode, em tal
arbitrária ("3) ». Deparam-se, de facto, contradições de (,:ISO, falar-se de arbítrio, porque a segurança jurídica

valores e, em consequência, quebras no sistema em PJ'oíbe aqui a igualização a casos em si similares, mas
todas as regras que «não permitam encontrar... um niío expressamente referenciados. Mas também se
razoável. .. fundamento para a diferenciação», pois suscitam outros escopos. Por exemplo, pense-se em
elas, por definição, não se reportam a afastamentos que o legislador, para a obtenção de uma unifica-
justificados dos valores da lei; no entanto, não resulta (;::ío jurídica internacional - por exemplo, dentro da
daí necessariamente sempre uma violação contra a CEE - adopta e sanciona legislativamente em deter-
proibição de arbítrio. Apesar de uma contradição de
valores, tal pode ser negado por razões diversas.
(51) Esta formulação corresponde à jurisprudência cons-
!nntc do Tribunal Constitucional; cf. por exemplo BVerfGE 18,
(52) Cf., por exemplo, BVerfGE 9, 20 (28); 12, 264 (273); 121 (124), com indicações extensas.
18, 315 (334). (5[;) Cf. também o exemplo do § 25 I 1 HGB infra, II 1 a. E.
(53) BVerfGE 1, 14 (52). (511) Cf., quanto a isso, ainda CANARIS,ob.· cit., p. 183 ss.
minados âmbitos, regulações que conduzem a que- Ulo-- mas hoje já (58) - considerar como nulos os
bras com princípios fundamentais constitutivos do preceitos da lei sobre sociedades de responsabilidade
nosso Direito, mas que por outro lado, não se pode limitada que não se harmonizavam valorativamente
decidir a revogar de uma maneira geral os princípios com as disposições comparáveis da nova lei das socie-
aprovados e introduzidos na consciência jurídica e· dades anónimas, em vista da planeada reforma do
modificar todas as prescrições comparáveis, em cor- Direito das sociedades de responsabilidade limitada,
respondência com os valores constitutivos da nova por não se «poder encontrar um fundamento para a
regulação. Também então, apesar da quebra do sis- diferenciação».
tema, não se pode falar de uma violação contra a Há assim casos nos quais uma quebra no sistema
proibição de arbítrio. Finalmente o facto de a ordem náo representa uma violação da proibição de arbítrio.
jurídica ter surgido em diversos tempos pode também Não se duvide da vinculabilidade da norma contrária
conduzir a quebras de sistema não elimináveis atra- ao sistema, pois também o fundamento de nulidade
vés da interpretação e da interpretação criativa do primeiro discutido, a aceitação de uma lacuna de coli-
Direito, sem que, por isso, deva sem mais haver sfío, se reporta à proibição de arbítrio e dela
«arbítrio». Na verdade, não se pode reconhecer a mera resulta (58a). Mas em regra haverá, na quebra do sis-
referência a um «crescimento histórico» de uma regu-
lação como justificação satisfatória para uma con- (58) Num certo momento, poderia de novo depender da
tradição de valores; pode no entanto haver um fun- tomada de posição quanto ao problema da omissão legislativa;
damento material para que o legislador não nivele não se duvida de que do princípio da igualdade se pode retirar
imediatamente a parte antiga pela nova. Ele pode, uma determinação constitucional de eliminação de contradi-
ções de valores.
por exemplo, residir em que «o tempo ainda não (58a) Seria por certo imaginável em si colocar na base um
amadureceu», para a nova regulação de outras áreas outro conceito de arbítrio do que o do art. 3 GG e concluir
jurídicas (que podem pressupor ainda, em certos assim pela nulidade dos preceitos contraditórios. Isso levaria
no .entanto o juiz a poder recusar obediência a uma norma
casos, uma quantidade de outros problemas!), ou
que não atentasse contra a Constituição o que parece conci-
muito simplesmente, por força da dificuldade do pro- Iiúvel com a sua adstrição constitucional à lei e com o princípio
cesso legislativo, que ainda precise de um certo da divísão de poderes, quando muíto naqueles casos extremos
tempo (57). Assim, por exemplo, não se deveria en- de «injustiça legislativa», expressos pela conhecida «fórmula
do RADBRUCH»: o reconhecimento de um semelhante caso
exl:remo não é, evidentemente, possível perante contradições
de valores ligeiras, antes pressupondo «arbítrio evidente» ou em
(57) A problemática poderia aqui transferir-se para a da ~mmelhantecritério «extremo», de tal modo que se chega assim
«omissão legislativa». ao mesmo resultado do artigo 3 GG. Aliás trata-se aqui, par-
tema, uma violação do princípio constitucional da t1lUifl do ~ 22 WHG (*). Aqui poderiam ocorrer danos
igualdade, no qual se deve ainda recordar que são dts IlHll1tante verdadeiramente inimaginável, de tal
apenas visadas autênticas quebras do sistema e não mndo que se pode afirmar o perigo da ruína econó-
as meras modificações do sistema, portanto apenas rukl1 do obrigado a indemnizar, colocando-se de facto
casos nos quais, efectivamente, exista uma contradi- -m Cllusa a possibilidade de uma cobertura integral
ção de valores e não apenas uma diferenciação de do dHl;O,através de um seguro. A falta de um mon-
valores - ainda que porventura pouco convincente titlllo Illúximo não se justifica, assim, em comparação
do ponto de vista jurídico-político, mas ainda admis- tHlIl1 nH outras previsões da responsabilidade pelo risco
sível. Como exemplo, pode ainda uma vez, remeter-se " "Ionta por isso contra o artigo 3/1 GG (60). Pelo
para a problemática, acima (59) discutida, da falta, 1111111011 l;onstitucionalmente, muito problemática deve
nalgumas previsões determinadas da responsabilidade Il'unb('1ll ser considerada a contradição acima citada
1'1111'0 o ~ 28/II e os §§ 130/II e 173/II HGB(61)-
pelo risco, do montante máximo. No § 833/1 BGB
('01110 em geral toda a regulação da responsabilidade
não se deve ver uma quebra no sistema mas apenas
1101' débitos antigos pela aquisição de um estabeleci-
uma modificação, porque os danos tipicamente cau-
IIll'nlo comercial ou pelo ingresso nele ou numa
sados por animais não são tão altos que ameacem o
Moelüdade comercial é valorativamente contraditório e
perigo de imputações de danos ruinosas e que o risco
não possa ser calculado totalmente, segundo técnicas (li") Se por isso o § 22 WHG é nulo ou se, do artigo 3 GG,
dos seguros, sem um limite máximo geral; e também fi pt'llWIderiva uma incumbência constitucional de uma corres-
por essa razão, mesmo quando se queira aceitar uma pondí'llle complementação do regime (cujo desrespeito deve
verdadeira quebra do sistema, não há aí uma evidente HI'I'lrnl.udo segundo as regras sobre a omissão legislativa) é
IIl1lnquestão geral de Direito constitucional relativa à presente
contrariedade material, de tal modo que não é alcan- pmhll·mál.ica; como conclusão poderia aqui ser dada a primazia
çado o grau necessário de diferença valorativa injus- li Nl\gundaalternativa.
tificada, em proporção bastante para a aplicação do (li I ) Se hã, efectivamente, ou não um desrespeito pela
art. 3 I GG. Diferentemente sucede, no entanto, no ('OIlH tiluição não tem de ser aqui definitivamente decidido.
hJIIlJ dl'ptmde de a contradição de regras atingir uma tal dimen-

/1(/0 que a injustiça se torne «evidente» e se, portanto, não se

ohllv('" nenhum ponto de vista admissível que ampare a dife-


ticularmente a propósito da questão da desobediência legítima 1'/'111;11; li problemãtica não é, por último, nem do tipo consti-
perante normas inconstitucionais, de um âmbito problemãtico flll'ional nem metodológico, mas sim comercial.
próprio e altamente complexo, que não pode ser discutido no ('I') Nota do tradutor: WHG corresponde à sigla do
domínio deste trabalho. WWlIlcrltaushaltsgesetz de 10 de Outubro de 1976, ou seja, a
(59) Cf., p. 120 s. 11,1 •.l'Iu Uva ao fornecimento de ãgua.
totalmente inconsequente: segundo os § § 25 e 27 HGB
verifica-se a manutenção da firma, segundo os § § 26, b, O significado das quebras si$temáticas que se
130 e 173, pelo contrário, não; pelos § 25/Il e § 28/I1 mantenham para as possibilidades do pensamento
a responsabilidade é dispositiva, segundo os § § 130/I1 sistemático e da formação do sistema na Ciência
e 173/Il, injuntiva, etc.; não se reconhece, de facto do Direito
uma ratio legis clara das determinações (62)! É por
isso muito questionáve1 se o conjunto da regulação Com isso, tudo aponta para que o pensamento
da responsabilidade por débitos antigos - pelo menos Histemático permaneça confrontando basicamente com
na medida em que ela dispõe não apenas uma res- u possibilidade de quebras sistemáticas, e que estas,
ponsabilidade com o património adquirido ou comum, 110 entanto, sejam de significado prático menor do que

respectivamente, mas também com o património pes- wmllmcnte se aceita. Às possibilidades da interpre-
soal - se pode manter perante a proibição constitu- Lm;llo c da interpretação criativa conformes com o
cional do arbítrio (61). Mas com isso deveriam consi- sistema (61'i) respeita, como saída mais lata, a aceita-
derar-se todas as disposições como nulas (em qual-
pio t.ratado no texto do § 22 WHG, as prescrições sobre a
quer caso nas suas partes contraditórias) (63) e não
quuntia máxima nas restantes previsões de responsabilidade
apenas uma disposição singular, pois não é evidente pI,lo risco - conformes com o sistema e de acordo com os
qual das normas é mais justa material ou sistematica- prlndpios! - não se devem, naturalmente, considerar nulas,
mente ou qual é «mais razoável», - enquanto noutros PUI'll evitar a contradição de valores; antes se deve comple-
casos pode permanecer uma de entre as várias nor- monlar o § 22 UWG através de uma regulação correspondente.
(<ltI) Esta poderia ser como um subcaso da interpretação
mas contraditórias entre si (64).
(l da interpretação criativa conformes com a Constituição,
I1wHlu que se veja o problema das quebras do sistema sob o
prl:iIl1!l, aqui representado, da proibição constitucional do arbí-
(62) Cf. quanto à crítica do § 25 HGB, PISKO, Ehrenbergs t.rio. Contudo, a interpretação e a interpretação criativa siste-
Handbuch des gesamten Handelsrechts, voI. II, 1914, p. 243 s., nllHica não se esgotam na eliminação de contradições que
245 s. e 255; para a crítica do § 28 HGB, Fischer, anotação a 'I'nlllim atingido uma tal dimensão que se ponha o problema
BHG LM Nr. 3 ao § 28 HGB. lh, lima violação do artigo 3/1 GG. Na verdade, poderia inver-
(63) Se o «resto» pode ainda ser considerado como válido IIllJlwnte a interpretação conforme com a Constituição (mesmo
e se, sendo o caso, surge uma lacuna a integrar pelo juiz é quundo não processada perante o artigo 3) ser um subcaso da
um outro problema que não compete a este círculo e que, i1111'J'pretação a partir do sistema (interno!) pois ela vê as
em geral, se coloca nas normas parcialmente inconstitucionais; 1I0J'IIH1Ssingulares perante o pano de fundo da totalidade da
cf., a tal propósito, também KNITTEL, JZ 67, p. 79 ss. onh-nl jurídica e poderia encontrar a sua legitimação última
(64) Vale o mesmo que acima foi dito a propósito das uo prinCÍpio da unidade e da ausência de contradições do
lacunas de ocasião (cf. nota 45). Assim, a propósito do exem- Dll'l'ilo.
ção da inconstitucionalidade e com isso da nulidade c;(IVel, essa discrepância entre o ideal de um sistema
de normas contrárias ao sistema. Estas podem, na 1111 sua realização não implica nada de decisivo con-
verdade, manter-se, em certas circunstâncias, perante lt'll () significado do sistema para a Ciência do Direito.
a Constituição, mas os exemplos acima introduzidos 1'010 contrário, resultou, no decurso dos presentes
a tal propósito deveriam ter tornado claro como são 11/ltudos,um aspecto no qual a formação do sistema
pouco numerosos semelhantes casos, nos quais exista t" de relevância prática: através da possibilidade de
uma verdadeira quebra do sistema, mas nenhuma vio- nulidnde das normas contrárias ao sistema.
lação contra a proibição de arbítrio. Que elas sejam
imagináveis é, de facto «perturbador» para a <<uni-
dade» do sistema, mas não o impossibilita. Pois
enquanto um sistema lógico-axiomático logo se torna
inutilizável perante uma única contradição entre os 1" Normas estranhas ao sistema como violação do
seus axiomas, porque toda a proposição é derivável princípio da unidade da ordem jurídica
dele (66), a contradição deixa-se «isolar» no sistema
axiológico ou teleológico: a formação do sistema é, A problemática das normas estranhas ao sistema
na verdade, impossível nesse ponto - e, consequente- ('I.;l{t estreitamente aparentada à das quebras do sis-
mente, também a obtenção do Direito a partir do lellla. Mas enquanto nestas e, em especial, nas nor-
sistema - mas todos os restantes domínios não são,
pelo contrário, perturbados por isso (67). Ainda quando
l.I'fIrio deve transmitir com fidelidade (cfo, quanto a isso, tam-
uma formação plena do sistema permaneça inalcan-
I)(11l1o~upra, § 2, nota 124). Além disso, SCHRElBER teria final-
Illl'nt.e reconhecido, através de uma simples leitura que LARENZ,
(66) Cf., por exemplo, LEINFELLNER, Struktur und Aufbau COIllOos exemplos claramente mostram, segundo a matéria,
wissenschaftlicher Theorien, 1965, p. 208; BOCHENSKI, Die nno teve em vista, apesar das suas formulações admissivel-
zeitgenossischen Denkmethoden, p. 80; POPPER, Logik der mente mal entendidas, contradições autênticas (e isso até nem
Forschung, p. 59. ('111~ome da lógica), mas apenas meras oposições de princípios
(67) Daqui parte a crítica de SCHREIBER, Die Geltung von I' rl~n6menos semelhantes (cf. mais desenvolvidamente supra,
Rechtsnormen, p. 199, a LARENZ, Festschrift für Nikisch, p. 301, /lolas 7 e 11), que deixam totalmente intocada a própria
e mostra apenas como SCHREIBER captou pouco as especialida- posi(;uo de SCHREIBER, da possibilidade de derivações plenas.
des do pensamento jurídico, i. é, predominantemente teleoló- Ik resto, afasta-se efectivamente do próprio uma proposição
gico (cf., quanto a isso, também as notas 30 e 44); o que vale como «Os vectores e princípios do Direito histórico global são
para um sistema lógico ou para uma proposição lógica não IllIprúprios, por razões lógicas, para mostrar ao juiz que nor-
é por isso necessário para um sistema teleológico e para Illas devem subjazer no domínio da criação juridica da solução
princípios gerais do Direito, cujas regras próprias, pelo con- 11('UIll conflito de interesses» (cf. SCHREIBER, obo cit., p. 198 so).
mas contrárias ao sistema, é violada a regra da ade- que a boa fé do antigo credor não desempenha qual-
quação valorativa, existe, naquela, uma inobservân- quer papel, porque não é, da sua parte, requerida
cia do postulado da unidade interior: trata-se de propo- IIllla «disposição» e também porque não existe
sições jurídicas que não estão numa contradição de nenhuma previsão objectiva de aparência (69). Na
valor com outras determinações ou com os princípios opinião do autor da lei, o sentido do § 25 I 1 HGB
fundamentais da ordem jurídica, mas que, por outro nl\o reside num desses dois princípios do Direito, mas
lado, também não se deixam reconduzir aos princípios ulltes em que se quis «corresponder» à experiência
jurídicos gerais, permanecendo, por isso, valorativa- du tráfego, segundo a qual «o respectivo proprietário
mente isoladas dentro da ordem jurídica global; elas da firma é considerado como titular e obrigado» (70) .
também não formam simplesmente uma modificação Protege-se, pois, a confiança numa falsa aquisição do
no sistema, porque (e na medida em que) a sua ratio direito (e com isso ainda independentemente de o
não possui convivência suficiente para poder valer lllltigo credor ter in concreto as representações jurí-
como enriquecimento consequente dos valores funda- dicas inteiramente acertadas!) Uma tal ratio legis tra-
mentais do âmbito jurídico em causa. duz, na nossa ordem jurídica, uma singularidade par-
Um exemplo retirado do Direito privado poderia ticular e não tem, em si, o mínimo poder convincente.
advir do § 25 HGR À primeira vista, poderia de facto () ~ 25 HGB não se pode, pois, de modo algum, orde-
parecer que ele seria ou (tal como, por exemplo, o 1I11 r sistematicamente.
§ 419 BGB) uma emanação do princípio da indissocia-
bilidade do activo e do passivo ou um subcaso da
responsabilidade pela aparência jurídica (68); mas am-
bas as hipóteses não subsistem a um exame mais /. Interpretação e validade de normas estranhas ao
profundo; não subsiste a primeira porque ela não sistema
poderia depender da manutenção da firma, porque a
responsabilidade deveria ser limitada ao património C::om referência ao manuseamento prático destas
recebido e porque a determinação também não deve- lIurmas estranhas ao sistema vale, de modo inteira-
ria ser dispositiva; não subsiste a segunda uma vez

(li") Cf. mais desenvolvidamente, CANARIS, Die Ver-


(68) Nesse sentido, toda a doutrina dominante; cf. por 'rwwnshaftung im deutschen Privatrecht, 1971, p. 184 s.
exemplo, RGZ 149, 25 (28); 169, 133 (138); BGHZ 18, 248 fi") Cf. Entwurf eines Handelsgesetzbuchs mit Ausschluss
(250); 22, 1 (3); A. HUECK, ZHR 108, p. 8; SCHLEGELBERGER! ,'I'S Seehandelsrechts nebst Denkschrift, edição oficial, Berlim,
HILDEBRANDT,4.' ed., 1960, § 25, nota 2 e 6, entre outros. IHHn, (l. 38.
mente semelhante, o que se viu a propósito dos pre-
ceitos contrários ao sistema. Em especial afastam-se,
evidentemente, as possibilidades da interpretação e
de complementação sistemáticas de lacunas e isso
conduz com frequência - como aliás no caso do
§ 25 HGB (71) - a que uma interpretação cabal não Os perigos das «lacunas no sistema» ameaçam a
seja, de todo, possível. Mas em qualquer caso ter-se-á flUlI formação em termos bem mais pesados do que
de restringir tais «corpos estranhos» ao mais curto <1:-; quebras no sistema, relativamente remediáveis e
espaço possível dentro da ordem jurídica, de tal modo dI) que as também pouco frequentes normas estranhas
que se possa apresentar como máxima interpretativa ilO sistema. Relativas, como quaisquer outras, à con-

fundamental uma regra de interpretação restritiva ou, IrmJitoriedade ou à singularidade de determinados


pelo menos, uma proibição de interpretação extensiva. vnlorcs legais, elas exprimem-nas na sua total falta.
De resto, levanta-se também aqui a problemática da Porque, ex definitione, o sistema apenas representa
11 forma exterior da unidade valorativa do Direito,
validade e de novo ela deve ser resolvida segundo o
f nela a formação do sistema indicia algo por, em geral,
artigo 5 GG: também os preceitos estranhos ao sis-
Ilnver valores; as lacunas de valores implicam por
tema devem ser medidos pela proibição de arbítrio.
isso, como consequência, sempre lacunas no sistema.
Aí o § 25 HGB oferece um bom exemplo de que nem
N[ío se duvide de que semelhantes lacunas de valores
toda a perturbação do sistema deve conduzir à uni-
possam ocorrer, pois não só não há nenhuma «com-
dade da norma correspondente; pois se a ratio posta
plcitude lógica» do Direito, como, também, não existe
pelo legislador sob o § 25 HGB é tudo menos con-
/H'nhuma «compleitude teleológica» (73). Só isso já
vincente, ela não é tão desconexa que se deva carac-
d('lnonstra a existência de tais lacunas na lei, para
terizar o preceito como evidentemente contraditório
cu.ia integração o Direito positivo coloca, à disposição,
e, por isso, arbitrário (72).
valmes suficientes; pense-se apenas num exemplo tão
clússico como a falta de uma regulação do estatuto
das obrigações no EGBGB alemão. Provam-no tam-
(71) Cf. nota 69 e FISCHER,anotação a BGH LM n.O 3
ao § 28 HGB. bÜln as numerosas normas «carecidas de preenchi-
(72) Se ele, por força de contradição de valores com
outros preceitos (cf. supra, p. 129) é nulo, deve ser separado
da questão da arbitrariedade da sua ratio - que respeita ape- (7::) Cf. ainda CANARIS,Die Feststellung von Lücken,
nas a si. l'iL p. 173.
mento com valores» (74), que nem sempre se deixam
concretizar inteiramente com auxílio das valorações ~, Lncunas no sistema como erupções de modos de
do Direito vigente e que, muitas vezes, se dissociam, ponsnr não-sistemáticos
de um caso singular para o outro, em determinações
valorativas independentes. Deve-se, a tal propósito, No que toca ao tratamento metodológico de seme-
ser claro em que a presença de tais lacunas legisla- 1I1111l1t'N lacunas de valores, negam-se aqui as possibi-
tivas de valores nem sempre se devem julgar negati- IldlldeN do pensamento sistemático; pois este, pela sua
vamente. Na verdade, as lacunas da lei primeiro refe- t\NITlllun.l, está ligado a um trabalho com auxílio do

ridas são uma falha pesada; também muitas normas prilldpio da igualdade e só pode, em consequência
dí'NN(~ carácter «formal», (pelo menos em parte) «pen-
em branco nada mais representam do que uma desa-
rlll r n 1(\ ao fim» valores já existentes, mas nunca
gradável solução de embaraço; mas por outro lado
1I1('III1(Ur valores inteiramente novos. Na verdade, as
as cláusulas gerais «carecidas de concretização» têm
1111 rleN questionáveis da ordem jurídica não devem
frequentemente uma função totalmente legítima e
)Wrlllill1eCer para sempre fora do sistema, mas antes
opõem-se a uma generalização demasiado rígida,
,'W podem tornar, depois de serem suficientemente
facultando a penetração da «equidade» no sentido da
l'ollcretizadas e determinadas para uma sistematiza-
justiça do caso concreto (75). Nesta posição torna-se (;i\o e uma incorporação, acessível ao sistema (77);
portanto notável que à formação do sistema, como 110 entanto, isto apenas é possível em parte, no melhor
já foi salientado (76), não só se oponha a origem his- dos casos e, sobretudo, nem sempre é desejável; pelo
tórica do Direito e a limitação das possibilidades 11]('1108 naquelas lacunas de valoração que respeitam
humanas linguísticas e de conhecimento mas tam- ;'1 erupção da «tendência individualizadora» da justiça,
bém - como limites de certo modo imanentes - a lima determinação sistemática sem sobras seria con-
«tendência individualizadora» da justiça. I r((ria à função. Abre-se, assim, um campo legítimo
pant uma forma de pensamento não sistematizada.
('omo tal refira-se, em primeiro lugar, a «tópica»
cujo significado para a Ciência do Direito vai ser ave-
(74) Estas são separadas, pela doutrina dominante na
Alemanha, das lacunas da lei, mesmo nos casos em que con-
riguado no parágrafo seguinte.
têm lacunas de valoração; cf. pormenorizadamente, CANARIS,
ob. cit., p. 26 ss., com indicações desenvolvidas.
(75) Cf. também supra § 4 IV 3, p. 85 e infra, § 7 II 2.
(76) Cf. p. 112.
No seu escrito
«Topik und Jurisprudenz» (1),
'l'11I<OIlOI{ apresentou a tese de que a estru~
VIEHWEG
Imil da Ciência do Direito não poderia ser captada
1'0111 o auxílio do pensamento sistemático (1a), mas

(I) 1953, 3." ed., 1965; cf. também Stud. Gen. 11 (1958),
IL :\:\/1 (338 s.). De entre as inúmeras recensões cf., princi-
flS.

PIlItIWt1tl" SCHILLING,Philos. Literaturanzeiger VIII, p. 27 ss.;


('Oli'l';, ARSP 41 (1954/55), p. 436 ss.; WÜRTENBERGER, AcP 153,
p. !.(J() Sfl.; WESENBERG,JZ 1955, p. 462; ENGISCH, ZStrW 69,
p, !i!J(i ss.
(111) Recentemente,
VIEHWEG reage contra a interpretação
lh' qU(~a sua posição se dirige contra qualquer tipo de pensa-
munto sistemático na Ciência do Direito e limita a sua crítica
ex prussamente à utilização de um «sistema dedutivo»; cf.
S.\i"/.(·fHprobleme in Rechtsdogmatik und Rechtsforschung, em:
SYH!<'mund Klassifikation in Wissenschaft und Dokumentation,
I f)nR, p. 96 ss. (p. 102, a nota 13). Por consequência, ele não
V(\ l'ntre o pensamento tópico e o sistemático nenhuma oposição
fundamental, antes juntando ambos, expressamente até, num
mdstcma tópico»; cf. ob. cit., p. 104. Isso é, no entanto, uma
contradição em si; pois um processo que seja «parco em
COTH:XÕes»(cf. VIEHWEG, Topik cit., p. 23), que apenas «pre-
tenda dar indicações» (cf. VIEHWEG, Topik cit., p. 15) e que
"st<'ja orientado essencialmente ao problema singular o mais
apenas com base na doutrina da tópica. A discussão
t'lílri oncontraram deixa, de antemão, presumir que
em torno desta afirmação não mais amainou desde
VII·:r IWI':G, com a sua afirmação central de que a Ciên-
então; também o presente trabalho deve a sua exis-
1'111 do Direito é, pela sua estrutura, tópica, deve ter
tência, não por último, aos estímulos provocatórios
tocado num ponto essencial do auto-entendimento jurí-
que as ideias de VIEHWEG em si incluem para cada
tlk:o. Pelo menos essa ideia fundamental merece ser
seguidor do pensamento sistemático. O reconheci~
1I01npre discutida de novo; contra a sua justeza não
mento (2) como a vivacidade de oposição (3) que
dl'p(Jom também, de modo decisivo, muitas fraquezas
I' ohscuridades que têm sido opostas em pontos par-
estreitamente formulado que possível, logo ao caso singular
(cf. quanto a isso infra, nota 67) nunca prossegue a ideia da Ueulares, a VIEHWEG pelos seus críticos - na minha
unidade e da ordem interior, não servindo, por isso, os pos- opinifio, predominantemente, com razão. Como está,
tulados básicos do conceito de sistema; assim VIEHWEG não pois, a «tese da tópica»? A resposta a isso pressupõe
anda em torno daqueles poucos princípios gerais que consti- 11111 curto esclarecimento da essência da tópica que
tuem a unidade de uma disciplina, mas antes pelo contrário,
"NUI, no essencial facilitada através das investigações
de multiplicidade de pontos de vista mais ou menos precisos
(cf. a descrição de «topos» em VIEHWEG, Topik cit., p. 10 e 18). dI' DmDERICHSEN (4), HORN (5), KRIELE (6) e ZIPPE-
Quando ele fala agora num «sistema tópico» não só ele nada I.II1S ('1).
traz para o esclarecimento da problemática, como pelo con-
trário retira ao conceito já fortemente confuso do «topos» os
seus últimos contornos.
(2) Cf., p. ex., COING, ob. cit.; WÜRTENBERGER,ob. cit.;
ESSER, Grundsatz und Norm, pp. 6 S., 44 ss. e 218 SS.; BXUMLIN,
Staat, Recht und Geschichte, 1961, p. 27 ss.; ARNDT, NJW 63,
p. 1277 s.; PETER SCHNEIDER,VVdDStRL 20, p. 35 ss.; EHMKE,
VVdDStRL 20, p. 53 ss.; WIEACKER, Privatrechtsgeschichte der Na opinião de VIEHWEG é «o ponto mais impor-
Neuzeit, 2." ed., 1967, p. 596 s., nota 48; EGON SCHNEIDER, 'ante na consideração da tópica a determinação
MDR 67, p. 6 ss. (8 ss.); N. HORN, NJW 67, p. 601 ss.
(3) Cf., p. ex., FLUME, Steuerberater-Jahrbuch 1964/65,
. (') Topisches und systematisches Denken in der Jurispru-
p. 67, Allg. Teil des Bürg. Rechts, 2.° voI., 1965, p. 296, nota 9
//r'flZ, NJW 1966, p. 697 ss.
e Richter und Recht, conferência perante o 46. Deutschen
(li) Zur Bedeutung der Topiklehre Theodor Viehwegs für
Juristentag, 2.° voI., Teil K, 1967, p. 34, nota 85; DIEDERICHSEN,
eirw einheitliche Theorie des juristischen Denkens, NJW 1967,
NJW 1966, p. 697 ss.; fundamentalmente crítico, ainda que
p. (iOl 5S.
pouco duro no tom, também p. ex. ENGISCH, ob. cit.;
(li) Theorie der Rechtsgewinnung, 1967, p. 114 ss.
WESENBERG, ob. cit.; ENN./NIPPERDEY, Allg. Teil des Bürg.
(7) Problemjurisprudenz und Topil<.,NJW 1967, p. 2227 sS.;
Rechts, 15." ed., 1959, § 23 II e § 58, nota 35; LARENZ,
d. lambém Wertungsprobleme im System der Grundrechte,
Methodenlehre, p. 133 ss.
1!l(;;~, p. 79 ss. e Das Wesen des Rechts, 1965, p. 64 ss.
daquela técnica do pensamento que se orienta pelo IH'gllillte: «o modo de pensar sistemático parte do
problema» e, em conformidade, define sinteticamente Ilido. A concepção é, aqui, o primórdio e mantém-se
a tópica como «a técnica do pensamento problemá- ilO1l1ílli.lIlte.Segundo este ponto de vista aqui não se
tico» (8). Mas com isso pouco se ganhou; pois com procura; antes de mais, inclui-se. E a partir dela são
razão diz um partidário do pensamento sistemático e t'Nco!llidos os problemas. Os conteúdos problemáticos
iadversário da tópica tão decidido como FLUME: «Todo 11111' IIÜOcoincidem com o ponto de vista são elimina-
o pensamento jurídico é pensamento problemático e dONo Eles surgem como questões falsamente coloca-
cada regulação jurídica é-o de um problema» (9) , IIIIH. « ... » O modo de pensar aporético processa-se,
podendo-se acrescentar: todo o pensamento científico mil tudo, inversamente. « ... » Ele não duvida de que
é em geral pensamento problemático - pois um «pro- hú sistema e isso talvez seja determinante, latente
blema» nada mais é do que uma questão cuja res- 1111seu próprio pensamento. Por isso ele é certamente
posta não é, de antemão, clara (10). NC'U,mesmo quando não o saiba (13)>>. Destas propo-
VIEHWEG tem por isso de fundamentar um con- ~dc;ücs resulta sem dúvida claro que NICOLAI
ceito mais estreito do «problema» (11) e ele fá-Io, de 11i\1~'I'Mi\NN não aceita uma posição frontal contra o
facto, para o que se liga à diferença de NICOLAI pl'w-:nrnento sistemático - também o pensamento
HARTMANN entre modo de pensar «aporético» e «sis- lIporótico parte da existência do sistema! - mas
temático» (12). HARTMANN caracterizou-os do modo IInlt's polemiza só contra um certo tipo de pensa-
nll'llto problemático que recusa como problemas apa-
(8) Cf. ob. cit., 15; os itálicos são do original. rcntes as questões não ordenáveis no sistema. Ele
(9) Cf. Allg. Teil, cit., p. 296. dirige-se apenas contra uma concepção que vê no
(10) De modo semelhante define o próprio VIEHWEG o sistema algo de definitivo e não apenas um projecto
«problema» como «cada questão que, aparentemente, permita provisório, modificável a todo o tempo, portanto con-
mais do que uma resposta» (cf. ob. cit., p. 16),
tra um sistema «fechado». Este, porém, não é o da
(11) Cf., a este propósito e, para a sequência, também
KRIELE, ob. cit., p. 119 ss. ('j0ncia do Direito nem o de qualquer outra Ciência,
(12) Cf. HARTMANN,Diesseits von Idealismus und Realis- ,,(do menos enquanto um progresso nos seus conheci-
mus, Kantstudien, vol. XXXIX (1924), 160 ss. Deve salientar-se mentos fundamentais ainda for possível (14); e assim,
que MAX SALOMONjá vários anos antes do aparecimento do a través da identificação de VIEHWEG da tópica com o
trabalho de VIEHWEGnão só caracterizou a Ciência do Direito
)wnsamento aporético não resultou de modo algum
como «Ciência problemática» mas também se reportou expres-
samente a N. HARTMANNe a ARISTÓTELES;cf. Grundlegung zur
Rechtsphilosophie, 2.° ed. 1925, p. 54 ss. (58); quanto à cons- (''') Cf. ob. cit., p. 163 ss.
trução de SALOMON,cf. aliás supra, § 2 I 4 a.
("') Cf. ainda supra, § 3 I e m.
uma definição satisfatória da tópica. Pelo contrário: plll' ImJO, Sl'r conduzidos a uma implicação à qual o
ela é, na mais alta medida, falaciosa (15), pois a WOIJIt'111II Se Inantenha ligado. Qualquer outra é de
forma de pensar em Ciência, sem objecções conside- I'VIt,tI'J> ('i). Isto é ou falso ou trivial. É falso quando
radas não-tópicas, é também «aporética» no sentido Vlli:llwl.:n queira ligar os «conceitos e proposições da
de HARTMANN, porque a recusa de problemas não sus- ('I/'Ilwiu do Direito» ao problema concreto a propó-
ceptíveis de ordenação no sistema (até então exis- l'ilto do qual eles foram descobertos e desenvolvidos
tente) deve ser considerada, em qualquer disciplina, (Ill/lil! ou menos por acaso): que, por exemplo, o «con-
como pecado contra o espírito da Ciência; por certo tl'lllo com eficácia protectora de terceiros», no início,
nenhum físico ou nenhum químico iria ignorar um I t'1l11llencontrado aplicação exclusivamente a coh-
fenómeno contraditório perante os princípios até 11'11 tWl de locação não diz, só por si, nada contra a
então existentes, mas a ninguém ocorreria ordena~.1 1I11l1:t.ll(tío desta construção também noutros tipos con-
por isso, a Física e a Química na tópica. O pensa- ll'ulllnis. Tudo depende antes de saber se o «novo»
mento aporético não conduz assim, de modo algum, pl'Obll~maconflui, materialmente, no essencial, com o
necessariamente à tópica mas sim, apenas, à «aber- f nl!' (,li tão resolvido. Quando VIEHWEG, pelo contrário,
tura» do sistema (16). . j COlll o trecho citado, apenas queira dizer que cada
A conexão entre pensamento problemático e conceito ou cada proposição jurídicos representem um
tópica torna-se, de todo, duvidosa quando se consi- dd(~nninado problema jurídico e por isso devam
deram as consequências que VIEHWEG retira daí para I'('/"-:W perante esse pano de fundo, ele merece, sem
a «estrutura da Ciência do Direito». Para além da dúvida, concordância; mas com isso nada mais se
proposição, que nada diz, de que «a estrutura global di/'. do que cada resposta se relaciona com uma per-
da Ciência do Direito só pode ser determinada pelo gunta e, por consequência, é determinada por esta,
problema», expõe ele duas outras «necessidades»: «os ossencialmente, no seu significado. É sem dúvida útil
elementos da Ciência do Direito, os seus conceitos colocá-lo sempre diante dos olhos e, por isso, por
e as suas proposições têm de permanecer, de modo cX(~lnpl0, elaborar sempre, muito exactamente, o con-
específico, ligados ao problema e só podem, por isso, teúdo teleológico dos conceitos ou proposições jurí-
ser entendidos a partir do problema» e «Os problemas dicos (iR); no entanto, não reside aí nada de específico
e proposições da jurisprudência só podem, também da tópica e, em especial, nenhuma diferenciação
perante o pensamento sistemático, mas sim uma evi-
(15) Falta também em HARTMANN, ob. cit., como ZIPPE-
L1US, ob. cit., p. 2227, nota 1, indica, com razão. (17) Cf. ob. cit., p. 66.
(16) Com razão KRIELE, ob. cit., p. 121 s. (I") Cf. também supra, § 5 IV 1.
dência que vale, mutatis mutandis, para cada pensa- r'rwllll'ccillWlllo sobre a «estrutura da Ciência do
mento científico. I )ll'l'ilm), tal como se trata na discussão sobre a
A «orientação pelo problema» não é pois, de modo lnpir'll. Deve-se insistir nisso, expressamente, ou não
patente, o decisivo; para além disso, ela não poderia lllld('H:-W o fascínio que a tópica tantas vezes exerce,
traduzir em termos teorético-científicos nenhum cri- IIIWt'lllar, não por último, no mal-entendido de que só
tério de decisão utilizável (19). Não se nega, natural- l'lu garante o verdadeiro pensamento problemático.
mente, com isso que exista, psicologicamente, uma Nu verdade, os seguidores da tópica assumem, porém,
oposição entre pensamento problemático e pensa- 1'111'11 si, com esta afirmação, um serviço que lhes não
mento sistemático, e que portanto o pensamento de 1'0111 pdc ou, em qualquer caso, apenas a eles.
um cientista se inflame mais facilmene perante pro-
blemas concretos, e se interesse com mais força pelas
suas soluções, enquanto o de outro receba os seus :' Tópica e legitimação de premissas através de
estímulos antes por via do sistema e encontra satis- I.'VIJIJ;U ou de «common sense»
fação na construção dele; no entanto, também esta
contraposição não pode ser considerada como um A ligação entre tópica e pensamento problemá-
ideal típico (Z0), pois também o pensador de proble- Iico colocada por VIEHWEG em primeiro plano não
mas não deixará totalmente fora de atenção o sistema, 'Pode, assim, dar o esclarecimento decisivo, mas ape-
sob cujo pano de fundo só, em regra, se pode for- IHIS o recurso ao que a «tópica» significou, para além
mular claramente e resolver, por fim, o problema e, de lima tradição filosófica milenária. O conceito pro-
inversamente, o pensador do sistema se deve afastar V{'lll, como se sabe, de ARISTÓTELES e VIEHWEG acei-
plenamente dos estímulos provenientes do problema, I:H) expressamente (2'). Mas em ARISTÓTELES, a
para um enriquecimento e modificação do próprio lúpica reconduz-se às chamadas conclusões «dialéc-
sistema. Seja como for, a contraposição entre o pen- ficas» (Top. 1.1.2) (Z2) e estas são, por seu turno,
samento problemático e o sistemático não se pode ca rílcterizadas por se alcançarem z; ev~rJ;4)lI, por-
reduzir a uma diferença puramente psicológica, ina-
dequada, em qualquer caso, para dar um qualquer
C"')
Cf. ob. cit., p. 6 ss.; quanto à questão de até onde
I('111 sido ARISTÓTELES mal entendido e deturpado na moderna
('9) Cf. supra, nota 10. diseussão tópica cf., desenvolvidamente, KUHN, Zeitschr. für
(20) Cf. também DIEDERICHSEN, ob. cit., nota 64 (p. 702) l'olitik, 1965, p. 101 ss., em especial p. 112 ss.
com referência à diferença de NICOLAI HARTMANN entre o pen- e~) Segue-se aqui, quanto ao modo de citar, VIEHWEG;
samento «sistemático» e o «aporético». d. oh. cit., p. 7, nota 8.
tanto, «por adequação opinativa», como VIEHWEG tra- lodos, il maioria ou aos sábios e, de entre os sábios,
duz (23) e muito bem (Top. I.lA.). Ao contrário das 'wlll ú rllaioria ou seja aos mais conhecedores e con-
conclusões «apodícticas» que se podem obter a par- 1't'lllllldos (Top. 1.1.5.3.).
tir de postulados cuja veracidade é demonstrável, as A isso corresponde o que os partidários da tópica,
conclusões dialécticas operam sobre premissas que C'1I1 regra, consideram como o critério decisivo para
não podem ser estritamente comprovadas, mas apenas o Ilcerlo de uma solução de um problema: o «sensus
mostradas, apresentadas ou inteligidas. O processo (,ollllnunis» (2") ou o «common sense» (27) e que
para a obtenção de semelhantes premissas é a V 11':IIWEG chama «a discussão, única instância de con-
tópica (24), que se caracteriza não por quaisquer par- 1rolO» C"). Aspira-se, com isso, a verdadeiras indica-
ticularidades do processo de decisão por ela utilizado, (;fie:,; porque não se trata de «meras opiniões ao
mas tão só pelas especialidades das premissas em que ;ICIlS())) eU) mas antes de proposições que têm de
ela se baseia (25) ou mais precisamente: através do IH'('star provas perante o forum de «todos» ou dos
modo particular pelo qual se fundamentam essas pre- {mwlhores e mais conceituados» ou que poderiam
missas. 'Evoo;a são, designadamente, segundo ARISTÓ- I (\-10 feito.
TELES, as proposições «que parecem verdadeiras a
Mas com isto ainda a tópica não está plenamente
caracterizada; até agora, ficou propositadamente de
rora uma característica essencial: a relação da tópica
(23) Cf. ob. cit., p. 7 com nota 9; cf., nesta sequência,
também a concepção de LERCHEde um «pensamento opinativo»
CO/ll. a retórica. Num prisma histórico, tal relação
(DVBl. 61, p. 695 ss.) que ele, no entanto - com razão, con- fica-lhe de antemão imanente e joga, de ARISTÓTELES,
trapõe claramente à tópica (cf. p. 67 s.).
(24) PERELMANocupou-se, de modo abrangente, da pro-
blemática da elaboraçã.o das premissas (por oposição à obten-
("li) A tópica e o sensus communis ficaram assim inse-
ção de conclusões a partir delas), reconhecendo com isso um
pllravelmente ligadas em VICO (De nostri temporis studiorum
significado decisivo à «retórica» e à «tópica»; cf., sobretudo,
l'Iliiorte, 1708, edição latino-alemã na tradução de WALTER F.
Rhétorique et Philosophie, 1952, e (em conjunto com L. 0.•.. 1'0, 1947); cf. quanto a isso, por todos, GADAMER,Wahrheit
OLBRECHTS-TYTECA), Traité de l'argumentation, 1958, com o 1/1/(1 Methode, 2." ed., 1965, p. 16 ss.
sobretítulo característico «La nouvelle rhétorique» (quanto à ("7) Ê característica, por exemplo, a ligação entre tópica
tópica cf., p. 112 ss.); quanto ao aspecto jurídico da problemá-
,. common sense em ESSER, ob. cit.; cf., p. ex., p. 44, 46, 47
tica cf., sobretudo, Justice et raison 1963, agora parcialmente l' pltssim.
em alemão em : Vber die Gerechtigkeit, 1967. ("") Cf. ob. cit., p. 24.
(25) Remete-se sempre, e bem, para isso; cf. VIEHWEG, <"li) Assim VIEHWEG,ob. cit., p. 25; cf. também KRlELE,
ob. cit., 8; KRIELE, ob, cit., p. 134; HORN, ob. cit., p. 602 s. oh. cit., p. 135 e GADAMER,ob. cit., p. 16.
através a CÍCEROe até VICO um papel considerá-
vel (30). Trata-se, aí, por um lado, de discussões con- 11 o SIGNIFICADO DA TóPICA PARA A CIÊNCIA
duzidas de acordo com determinadas regras de jogo, DO DIREITO
pela quais uma proposição, uma vez admitida, não
mais poderia ser retirada (31), e por outro, também
simplesmente da preparação de discursos que seria
:t) A impraticabilidade da vertente «retórica» da
facilitada através da utilização de catálogos de
tópica
tópicos. É evidente que não está aqui em causa a
busca da verdade mas antes do «sucesso retórica» Quando se pergunta o que pode prestar a tópica
puramente exterior, portanto do triunfo não poucas dentro da Ciência do Direito, torna-se de antemão
vezes bastante fácil (32) sobre o parceiro na discussão claro que ela é impraticável na medida em que se
ou, ainda, apenas do «aplauso da multidão». A tópica ligue à retórica; pois o indagar pelo justo não é
poderia assim agradecer também à sua ligação com nenhum problema de pura retórica, por muito que
a retórica o seu desdém alargado como resulta, por sempre se possa alargar também esse conceito (34).
exemplo da afirmação de KANT de que a tópica «pode- Que, apesar disso, VIEHWEGnão tenha tomado clara-
ria servir mestres e oradores a procurar, sob certos mente posição, mas antes, pelo contrário, também
títulos do pensamento, o que melhor convenha para queira, de modo patente, utilizar também esta com-
a sua matéria em causa e para matutar ou cavaquear ponente da tópica para a sua análise da Ciência do
com verbalidade sobre ela, com uma aparência de I)ireito é um lapso pesado e prejudicou gravemente a
fundamentação» (33). discussão em torno da sua tese; uma afirmação como
a «de que as premissas fundamentais são legitimadas

Cf. também FLUME, Richter und Recht, ob. cit., p. 34


('1'1)
t' ob. cit., p. 67: «A convivência entre a Ciência e a
I<ASER,
.Retórica encontra contudo, a breve trecho, o seu termo ...
1\ arte do discurso tende muitas vezes para resultados total-
mente exteriores e muitas vezes criticáveis, quando ponderados
(30) Cf. as descrições em VIEHWEG, ob. cit., 6 ss., 10 ss., através de bitolas éticas. Ela deixa-se, com efeito, conduzir,
2 ss. e KRIELE, ob. cit., 136 ss., 141 ss., 144, 125 ss. ::eguindo os seus modelos gregos, por tópicos de todos os
(31) Cf. a descrição explícita em KRIELE, ob. cit., p. 136 s. domínios da vida, para cuja valorização ela se serve de uma
(32) Cf. os esquemas que propõe ARISTÓTELES, descritos apurada dialéctica. Por muito elaborada que esta técnica se
em KRIELE, ob. cit., p. 137. apresente, ela coloca-se muito aquém da Ciência do Direito,
(3:1) Cf. Kritik der reinen Vernunft, 1." ed. 1781, p. 269 s. informada pela mais alta Ética jurídica)}.
através da aceitação do parceiro na conversa» ('JG), 1'I)llI'llISi)(~Sdialécticas no sentido de ARISTÓTELES
pode, na verdade, ajustar-se a determinadas formas pl'oNseguem este objectivo. Não se deve pôr em dúvida
de discussão (3G), mas é, dentro da Ciência do Direito, 11111' isso possa proceder também quanto à (boa) retó-
puramente inaceitável: as premissas são fundamental- I'leu; RÚ que esse objectivo não pertence necessaria-
mente determinadas para os juristas através do 1II('II1e à essência da retórica (em sentido moderno ou
Direito objectivo, em especial através da lei e não são IllltigO) ("1), recomendando-se, por isso, uma separa-
susceptíveis de uma «legitimação» por via do «par- 1;[\0 clara, terminológica e substantiva, entre a tópica
ceiro na conversa» (qual?!), nem disso carecem. « reI órica» e a «dialéctica» (38). Deve-se, pelo menos,
IlIl'IIar esta última frutuosa para a Ciência do
I)ireito?
b) A insuficiência da tópica perante o problema da
validade e da adstringibilidade jurídicas Como define VIEHWEG(em interpretação a ARIS-
TÚTELES), os tópicos são «pontos de vista de múltipla
A tópica não se esgota, contudo, na sua referência Illilização e aceitáveis em geral, que podem ser a
à retórica. Assim como cada discussão autêntica e l'avor e contra a adequação opinativa e que podem
cada diálogo efectivo podem ser um processo para a conduzir à verdade» (39). O pensamento tópico pode,
descoberta da verdade - basta pensar nos diálogos de acordo com a sua configuração, concretizar-se em
socráticos - também a forma tópica de argumenta- dois planos (40). No primeiro, captam-se «pontos de
ção pode «conduzir à verdade» (37); ora de facto, as vista mais ou menos casuais, num qualquer tipo de
lentativa de escolha», enquanto, no segundo, se pode
(35) Cf. VIEHWEG, ob. cit., p. 24. recorrer a um «repertório de pontos de vista», que
(36) Em especial, naturalmente, nos sítios em que a retí- se agrupam nos chamados catálogos de tópicos sob
rada de determinadas premissas, jã concedídas, seja inadmis- uma determinada ordenação exterior, particularmente
sível (cf. nota 31); mas também cada discussão assenta, de
alfabética, mas que não aparenta qualquer conexão
resto, sobre premissas comuns às partes, por elas reconhecidas
expressa ou tacitamente, desde que um acordo não deva ser, interna e, portanto, qualquer sistema (40a).
de antemão, excluído. Também o jurista se pode comportar dessa forma
(37) Cf. a definição de tópica em VIEHWEG, ob. cit., p. 10, perante um determinado problema e pode ser inteira-
supra; cf., ainda, GADAMER, ob. cit., p. 16: «O 'bem falar' ... é,
desde sempre, uma fórmula duplamente significativa em si e de ("R) Razão pela qual se põe a possibilidade de inter-
modo algum apenas um ideal retórica. Ele traduz o afirmar i'('r('ncias.
do justo, isto é, do verdadeiro e não apenas: a arte do discurso, ('10) Cf. ob. cit., p. 10.
a arte de dizer algo». Cf. porém também KUHN, Zeitschr. für (tO) Cf. VIEHWEG, ob. cit., p. 18.
Politik 1965, p. lU.
('10 a) Mas cf., agora, nota Ia).
mente correcto que as deliberações colegiais decor- dOllos causados aquando do seu funcionamento, inde-
ram, nesse estilo (11); no entanto ainda não se disse pi'IHlentcmente de culpa; pode-se tomar em conside-
o mínimo sobre a aplicabilidade da tópica na Ciência 1'1\(;[10 a situação patrimonial de ambas as partes, mas
do Direito. Só a partir de agora se levanta a questão IlIllI hém é possível dizer que ela nada tem a ver com
decisiva de porque devem ser competentes os «pontos 11111 adequado cálculo de danos; pode-se perguntar
de vista casualmente captados e qual de estes tópicos, /I te, onde contribuiu o comportamento do ferido para
com frequência contraditórios entre si, recebe a pri- li aeidente, se esteve em jogo uma força maior, se um
mazia perante os restantes. Quando, por exemplo, terceiro qualquer não terá, só por si, causado o dano,
alguém exija, de outrem, uma indemnização, por este devendo por isso, suportá-lo, independentemente do
o ter atropelado com o seu automóvel, à primeira perigo de utilização do automóvel; pode-se reter se
vista, recorre-se a diversos «pontos de vista»: pode-se 11m dos intervenientes tem um seguro; pode-se afir-
assentar em que o condutor agiu com culpa; mas tam- Illar que o Estado devia incorrer nos danos, uma vez
bém se pode dizer que quem utilize uma coisa tão que admite um perigo tal como o derivado do funcio-
perigosa como um automóvel deve responder pelos namento de um automóvel, etc., etc. Todos estes pon-
tos de vista poderiam por certo ser relevantes para
(41) Isso invoca SCHNEIDER, MDR 63, p. 653 e 67, p. 8 ss., a solução do nosso problema (por si sós ou em con-
com muita ênfase, a favor da tópica. Com isso ele desconhece, junto com outros) mas eles não surgem, por isso,
sobretudo, duas coisas: em primeiro lugar, não se trata, a
de modo algum vinculativos no sentido de serem
propósito da discussão da tópica, de uma questão fáctica mas
sim de uma questão metodológica e portanto não de como os Direito vigente (42). Um tópico é portanto, apenas e
tribunais habitulamente funcionam, mas sim de como deveriam sempre uma proposta de decisão (43) e, assim, ele
funcionar com correcção (cf., quanto a isso, também infra, precisa de um critério complementar para proporcio-
nota 58), e assim o argumento de SCHNEIDER, por essa razão, nar a sua adstringibilidade e para possibilitar a esco-
poderia, no máximo, ser mediatamente relevante; e em segundo
lugar - e sobretudo - e a tal propósito, não é, de modo algum . ('12) Cf. também DIEDERICHSEN, ob. cit., p. 703, coluna 2
significativo o estilo da deliberação judicial mas apenas o da (também po 702, coluna 2).
decisão e da fundamentação e tanto assim que ninguém iria (13) Cfo também ZIPPELIUS,obo cit., p. 2233, coluna 2 e
afirmar que os nossos tribunais apenas procedem topica- Das Wesen des Rechts, ob. cit., p. 67, assim como, principal-
mente e não rejeitam, por exemplo, em certas circunstâncias mente, KRIELE,ob. cito, p. 146 ss., 151 e 153. A solução própria
um ponto de vista suscitado na deliberação como «contrário ao de KRIELEdo problema da obtenção do Direito soçobra, no
sistema» (no que, naturalmente o termo «contrário ao sistema» ('ntanto, em minha opinião, no mesmo erro que ele cen-
não tem de ser expressamente utilizado). - Quanto ao mais, ~:ura- com razão - aos partidários da tópica; pois a «razão
os ataques de SCHNEIDER, ob. cit., contra DIEDERICHSEN, ob. cit., jurídica» tida por KRIELEcomo decisiva (cfo p. 157 ss.) pouco
estão a um nível que exclui uma discussão com ele. mais é do que uma forma especial da ~vaoEa.
lha entre os diversos pontos de vista, consoante as vOllha a atribuir à lei (!) «estrutura tópica» (46) e
circunstâncias, para a solução de um determinado oJloie a sua «validade» de proposições e princípios
problema. Como tal, a tópica oferece apenas - uma JlII'ftlicos reconhecidos na MO~a (47). É evidente que
vez excluída, segundo acima se viu, a «aceitação pelo f ot!a a doutrina da validade jurídica contradita HORN:
parceiro na conversa», como totalmente inutilizável IIlna lei «vale» ainda quando não se apoie «em todos,
para o jurista - a zvao~a ou o common sense, por- nu maioria ou nos mais sábios» e, de modo inverso,
tanto a opinião «de todos ou da maioria ou dos mais " opinião de «todos, da maioria ou dos mais sábios»
sábios» sobre o que é verdade ou mutatis mutandis pode ser inteiramente falsa, isto é, pode proclamar
sobre o que é justo, respectivamente; «a discussão ,ligo que não seja, de modo algum, Direito vigente (48).
permanece a única instância de controlo» para mais Nem VIEHWEGnem HORNdistinguem, de modo reco-
uma vez repetir esta citação (44), na qual desde logo 111 wcível, entre a actividade do legislador e a do juiz, de
se pode ver que o saber dos «melhores e mais con-
ceituados» se insere. ('r., a este propósito, VIEHWEG, ob. cit., p. 68, onde ele diz
Mas torna-se, com isso, claro que a tópica des- da tópica: «Ela entende-a (a techne jurídica) como uma forma
conhece, no fundamental, a essência da Ciência do d(' aparecimento daquela inalienável busca do justo adequado,
Direito. Pois não se determina qual seja o Direito qllC~se prossegue com base no Direito positivo». Isto é carac-
j('rístico dos perigos da tópica: o jurista vinculado ao Direito
vigente ou qual o ponto de vista vinculativo, em
positivo não busca o «justo adequado» «com base» (!) nele,
regra, através do «common sense» ou da «opinião mas antes deve aceitar a decisão jurídico-positiva, no funda-
de todos ou da maioria ou dos mais sábios», mas Ir\l:ntal (isto é, descontando a possibilidade- extrema - de
antes através do Direito objectivo. Toca-se, por isso, «injustiça legislada») como justa e não, em regra, colocar a
no cerne do problema quando DIEDERICHSEN censura questão de um «justo adequado» independente dele; cf. quanto
a isso, também supra, § 5 IV 3.
VIEHWEGque em parte alguma da sua obra se encon-
(411) Concordante, F. MÜLLER, Normstruktur und Norma-
tre «um reconhecimento da ordem jurídica vigente e IiviWt, 1966, p. 59, «A norma torna-se ... para a tópica, um
da proposição, evidente para cada jurista, da adstri- tópico entre outros».
ção, aquando da aplicação jurídica, à lei e ao ("7) Cf. ob. cit., p. 606 s.
Direito» (45). E é assim tão consequente como ine- (48) Assim sucede quando alguém critica a opinião domi-
nante ou a jurisprudência constante, evidentemente com a
xacto, que HORN,na prossecussão da ideia de VIEHWEG
afirmação de que apenas a «opinião minoritária» por ele
defendida está «certa» no sentido de ser Direito vigente e
nilo faz apenas uma proposta totalmente não-vinculativa para
(44) Cf. VIEHWEG, ob. cit., p. 24.
a modificação da situação jurídica até então existente, como
(45) Cf. ob. cit., p. 702, coluna I; de modo semelhante deveria ser se ela apenas se baseasse na ~vooEa; cf., a este
com razão, também FLUME, ob. e loco cit. (como na nota 2). propósito também supra, p. 69 s.
tal modo que fica com a impressão de que as suas l!lu reconhecera a categoria de uma «lógica das Ciên-
considerações se mantêm, primacialmente, ligadas à c1ml práticas» (õ3). Deveria aí, de facto, residir uma
primeira. pl'l'cisüo fundamental da essência da tópica. Onde se
1mte da questão da acção justa e, em especial, onde
NO façam afirmações ou prescrições que pretendam
c) A tópica como doutrina da actuação justa e a
el'icúcia para terceiros, uma legitimação dessas pro-
jurisprudência como Ciência do entendimento
justo
posições através do consenso de «todos, ou da maio-
ría ou dos mais sábios» ainda aparece sempre, pelo
Não deve ser por acaso que a tópica tem, de facto, Jlwnos numa democracia, como a melhor saída perante
essencialmente mais a oferecer ao legislador - e, por () facto de não serem, nesse domínio, possíveis
consequência a uma disciplina como uma poli tolo- dernonstrações adstringentes, do tipo das Ciências
gia (49) normativamente entendida (50) - do que ao Naturais; ou, para citar ainda uma vez HORN: «Quem
juiz. HORN, por exemplo, fez notar com razão que os nfio tenha uma razão omnisciente, com a qual possa
exemplos da tópica aristotélica são, na maior parte, resolver as questões de facto e de valor de forma
retirados da ética e que ARISTÓTELES, por conseguinte, a ritmética, deverá recorrer a proposições sobre as
«pensa, aí, claramente nos domínios científicos que quais haja entendimento, na comunidade social na
ocupam da actuação humana, portanto na filosofia qual se coloque a questão da 'justeza' (54)>>.
prática em sentido amplo: ética economia e 'política', Para o legislador, tal é, certamente, nos casos
isto é, Direito e Ciência Política» (51). HORN caracte- normais (55), uma máxima de grande valor e assim se
riza, por isso, a tópica como «método das Ciências podem designar de facto as premissas pelas quais
da acção» (52) e, da mesma forma, já antes HENNlS ele se oriente, como tópicos (56) e se pode chamar o

(49) Quanto ao significado da tópica para a Ciência (1):1) Ob. cit., p. 109; contra ab. cit., p. 110, 112 e 119.
KUHN,
Política cf., por um lado, HENNIS, Politik und praktische Philo- ~I>'i) Cf. ob. cit., p. 607, coluna
1.
sophie, 1963, p. 89 ss. e por outro HELMUT KUHN, Aristateles (55) Nos casos excepcionais ele deve, naturalmente, ter
und die Methode der politischen Wissensscha.ft, Zeitschr. für H coragem de decidir contra a opinião de «todos» ou da
Politik, 1965, p. 101 ss. «maioria» e, sobretudo quando esta não coincida com a opinião
(50) Quanto à questão de até onde assim é cf. o artigo dos mais «sábios»; que a possibilidade de semelhante dis-
informativo de GRIMM, JZ 65, p. 434 ss. crepância resultava já da fórmula de ARISTÓTELES, sem que
(51) Cf. ob. cit., p. 603, coluna 2; cf. também GADAMER, surjam critérios para a sua solução, aparece como uma fra-
ob. cit., p. 18 s. (<<saber prático»); WIEACKER, Privatrechtsge- queza essencial da tópica.
schichte cit., p. 596 (<<justeza prática»). (50) Cf. HENKEL, ob. cit., p. 418 ss. que fala, a tal pro-
(52) Cf. ob. cit., p. 603 s. pósito, de «tópicos do Direito justo a procuran}.
processo pelo qual elas se encontram, como tópico, Por consequência, a Ciência do Direito também
- só que a arte legislativa não é Ciência do Direito Ili\o é, no fundamental (59), uma «Ciência da acção»
no sentido tradicional da palavra; e não se pode
colocá-Ia simplesmente, com esta, no mesmo plano, p()r em causa como se deve argumentar com correcção.
I(IOI<LE mostra, por todas as vias, que ele retira da possibili-
pois de outra forma a diferença fundamental entre finde do legislador de colocar valorações claramente apreen..
argumentação de lege ferenda e de lege lata seria sfveis; assim por exemplo na sua polémica contra o «ideal
abandonada (57). - um resultado inconciliável com a da ~;ubsunçãO»(p. 47 ss.) ou na sua afirmação desmedida-
repartição de poderes e a vinculação da jurisprudên- nwnte exagerada de que «a existência de uma proposição
ria à «lei e ao Direito» estatuída no Art. 20 lU GG (58). .Iurf<.licaque se torne, pelo simples 'entendimento', adequada
pura a subsunção» seja «um caso limite» e que o conceito
(57) Não se deve, naturalmente, negar que haja transi- de lacuna actue, por isso, «de modo mais perturbador do que
ções e casos-limite; isso não impede, contudo, de considerar ('scIarccedon> (p. 196; cf. também p. 205 s.). A opinião de
a diferença como, no essencial, certa (cf., também, a nota KI!IELE não se orienta apenas, de modo evidente, com dema-
seguinte). Não se pode, no âmbito deste trabalho, aprofundar ::iut1a intensidade, pelo Direito constitucional com a sua por-
mais as questões prévias altamente complexas que aqui se c;[ío de cláusulas gerais «carecidas de preenchimento com
conexionam; no entanto, a manutenção da diferença, apesar vIiiorações» mas também, demasiado unilateralmente, pela
de críticas sempre repetidas, corresponde ainda à opinião total- uctividade dos tribunais superiores e da Ciência; pela natu-
mente dominante; caso ela não se efectue, vai-se, naturalmente, reza das coisas, estes ocupam-se quase exclusivamente com
considerar também a tópica de modo totalmente diferente prohlemas de valorações que não foram claramente decididos
ainda que se não devam passar em branco as posições extre- 1)(,10 legislador mas nada depõe contra a existência de um
mas nesta questão prévia. número ilimitado de casos regulados de modo totalmente
(58) Ninguém quereria seriamente afirmar que não seja claro (e que, por isso, na maioria nem são seriamente litigio-
de todo possível uma diferenciação entre política do Direito ~;os!).Que «o BGB abra mais problemas do que os que resolva»
e aplicação do Direito e que, por isso, o Art. 20 lU GG con- (assim, KRIELE, ob. cit., p. 209), é, no entanto, uma afirmação
tenha um postulado inacatável e, assim, vazio. Por isso, contra qUl~ nada faculta e que, na minha opinião, deve ser rejeitada

a opinião de KRIELE, ob. cit., p. 149, não é, de modo algum, como aventureira (HECK é, sem razão, chamado por KRIELE
uma objecção sem sentido que o pensamento jurídico não como testemunha: no local citado, ele apenas diz que segundo
«possa ou não deva ser tópico». A «tese tópica» antes só llmCl 'determinada terminologia «talvez a maior parte das ques-

pode, pelo contrário, de modo razoável, entender-se metodoló- tlJes duvidosas respeita à existência de lacunas na lei»;
gica e normativamente e não fáctica ou fenomenologicamente; KIUELE desconhece aqui (tal como na p. 196), de modo evi-
seria uma afirmação despropositada o dizer que o jurista, ciente, a limitação a questões «duvidosas», sobre cuja relação
«inelutavelmente» (cf. KRIELE, ob. cit.) pensa de modo tópico, numérica com as não duvidosas HECK não diz um mínimo, bem
portanto só pode necessariamente (!) apoiar os seus argu- como sobre o significado puramente terminológico da posição
mentos, de forma exclusiva, na EvlloEa e no common sense na qual se trata de uma delimitação linguística entre «sub-
mas não na ordenação da lei, independentemente disso, e HIIIl<';ÜO» e «complementação da lacuna» e nada mais).
com bastante frequência em contradição com ela e só pode (110) Mas cf. também infra, n.O2.
no sentido em que HORN utiliza o conceito, mas sim fllllll'S (li'). A tópica deveria formar a necessária
uma ciência hermenêutica: ela é, largamente (59), ('lIll1plementação das proposições da lógica formal
uma Ciência do entendimento correcto e não da 1111 Cillncia do Direito; no essencial, apenas um
actuação certa (60). No essencial, o Direito objectivo pt'llsamento teleológico-sistemático, como acima foi
impõe as determinações sobre esta última, devendo, 11Iais detidamente explanado (65) e que corresponde
em regra, o juiz, complementar apenas, de modo 11lI.ie, de modo pleno, ao entendimento metodológico
consciente, os seus valores (61) e não colocar em seu dominante (nro,,), o poderia fazer. Ele distingue-se da
lugar as intuições de outros, sejam elas «as de todos, lópica, sobretudo, em dois pontos: orienta-se em
ou da maioria ou dos sábios». Que este «entendi- t.mll\os hermenêuticos (nn), isto é, visa a execução
mento» não poucas vezes contenha um elemento de
valoração própria - cujo significado não deve ser ("1) Isto tem sido, muitas vezes, contraposto a VIEHWEG;
substimado - e que não se deixe enquadrar com os 1'1' •• p, ex., ENGISCH, ZStrW, 69, p. 600; DIEDERICHSEN,ob. cit"
meios da lógica formal, nada diz a favor da tópica; p. ()!)!) s.; KRIELE, ob. cit., p. 120 ss., em. especial p. 124,
110(a '12; cf., mas cf. ainda a citação da nota Ia).
pois esta não é, de modo algum, a única alternativa
('11\ ) Cf. § 2 lI.
à lógica formal e, de nenhuma forma, o único pro- ("~n) Cf. as indicações do § 2, notas 117 e 133.
cesso para a obtenção de premissas (62) e por isso, as ("11) Perante a multiplicidade de sentidos da expressão
permanentes afirmações de VIEHWEG quanto ao êxito «topos» é de recear que muitos partidários da tópica não
limitado do pensamento lógico-formal na Ciência do vt'nham aqui, a ver qualquer oposição (cf. VIEHWEG, ob. cit.,
p. 24 e sobretudo, bem para além da tornada de posição em
Direito (63) são tão pouco demonstrativas da sua «tese
caul>a na p. 24 e não justificado pelo aí dito, p. 59. Cf. ainda
tópica» como a sua polémica contra um sistema COlN(;, Auslegungsmethoden, p. 22 s. e F. MÜLLER, ob. cit.,
axiomático-dedutivo (63), que já não tem represen- 1'. 45 ss., que fala justamente de «hermenêutica tópica», pon-
do-a, contudo, em oposição à tópica). Mas isso iria apenas
caul>ar confusão terminológica e embaraçar as contraposições
materiais - que existem no essencial, entre uma doutrina do
(60) Nesse sentido, com clareza, WIEACKER, JZ 57, p. 704 «t'nt"endimento justo» e da «actuação justa». Desde que exis-
e 706; d. também Zur rechtstheoretischen Priizisierung des tam certas conexões - por exemplo entre o «pré-entendimento
§ 242 BGB, 1956, p. 19 e Festschrift für Erik Wolf, 1962, p. 451.
hermenêutico» no sentido de HEIDEGGERe GADAMERe a liv õ o E IX
(61) O conceito da «jurisprudência das valorações» não que, p. ex., EHMKE (VVdDStRL 20, p. 53 ss.) relaciona de modo
é isento de confusões pelo que foi, p. ex., recusado por HECK; original (cf. quanto a isso também F. MÜLLER, ob. cit.,
cf. Begriffsbildung und Interessenjurisprudenz, p. 50 s. p. 45 ss.), -, põe-se a necessidade de uma diferenciação básica,
(62) As Ciências Naturais não se servem, por exemplo, t.anto mais que ambas as formas de pensar se completam, em
sem dúvida, da tópica para a descoberta das suas premissas. IHI rlicular na Ciência do Direito e, em parte, se interpenetram
(n3) Cf., sobretudo, p. 53 ss.
lllut.uamente (d., quanto a isso, também no texto infra, 2 e 3).
de criações espirituais objectivamente pré-dadas e COlIlO resultado intermédio pode-se pois conside-
recusa-se, por isso, a apoiar as suas premissas apenas I'/:ll' lJIW a tópica não alcança satisfatoriamente, tão-só
na EliaO~Gl ou no common sense; e não considera todas Jlo l'I'lscncial, a estrutura da jurisprudência. Isso
as questões que surjam como problemas singulares 1'f11H1ltll, sobretudo, de que um tópico, como tal, é
isolados, como é característico da tópica (67), mas fllltllHlHlima proposta de solução e não, desde logo,
antes procura, seguindo a tendência generalizadora DI/'oito positivo e isso ainda que ele se pudesse impor
da justiça (68), e procedendo, assim, de «modo siste- <lU purtir do problema» mesmo quando fosse «mate-
mático», reduzi-Ios a problemas mais gerais, tão I'llllllwllte justificado». A tópica só pode resolver a
extensos quanto possível (68a) a solucioná-Ios sobre o 1I11ostL\oem aberto da adstringibilidade dos pontos de
pano de fundo da «totalidade da ordem jurídica» isto vlHtll, assim levantados, e da escolha entre eles, atra-
é, do sistema teleologicamente entendido. Vt114 do recurso à «opinião de todos ou da maioria
I III dos sábios» ou ao common sense, assim se situando
Cf., ainda, também APEL,Die Idee der Sprache in der Tradition IlJII forte oposição à doutrina jurídica da validade e
des Humanismus von Dante bis Vico, 1963, que quer (p. 143)
c111N fontes do Direito. Por conseguinte, os seus segui-
englobar a tópica numa «hermenêutica transcendental (exis-
tencial)>>,embora assentando, tal como HEIDEGGER, num sentido
di )I'('H nfio distinguem suficientemente entre as tarefas
muito englobante da palavra hermenêutica. Ilu Il'gislação e as da jurisprudência e desconhecem
(67) A tal propósito, também é característico que qUI' li Ciência do Direito tem a ver, em primeira
VIEHWEG considere como tarefa da Ciência do Direito sempre Iínl111,com a execução consciente de valores já legis-
e de novo a busca da «justiça permanente» pela qual «algo se IlIdos e não com a escolha tópica de premissas; por-
justifica aqui e agora» (cf., respectivamente, ob. cit., p. 63 e
p. 65 e passim e também supra, nota 45). Cf. ainda GADAMER,
lunto ó uma doutrina do «entendimento justo» e não
ob. cit., p. 18 s. que coloca a tópica em conexão com a do «comportamento justo».
phronesis aristotélica, caracterizando-a como o conhecimento
«prático» e retratando-a do seguinte modo: «... ela dirige-se
à situação concreta. Deve, portanto, abarcar as «circunstân-
cias» na sua infindãvel variedade». Cf. ainda EHMKE, VVdDStRL
20, p. 55: «A solução do problema deve ser encontrada com
a ponderação de todos os pontos de vista relevantes para o Com isto fica também já claro, como e em que
caso concreto ... ».
circunstâncias tem o pensamento tópico uma função
(68) Quanto à contraposição entre a tendência generali-
sigllificativa a cumprir dentro da Ciência do Direito:
zadora e a individualizadora do princípio da justiça, cf. supra,
§ 1 II 2 com indicações na nota 32 e o § 4 IV 3. ~Wllllll'e que faltem valorações jurídico-positivas sufi-
(68a) Cf., a tal propósito, também, ENGISCIl,Wahrheit cil'lItcmente concretizadas. Pois nesse caso, não só as
und Richtigkeit im juristischen Denken, 1963, p. 20 s. possibilidades do pensamento sistemático deparam
com limites inultrapassáveis (60), como também se
verificam, em regra, as características da tópica: as problema singular e, até, para o caso concreto no
normas só podem aqui ser preenchidas, em termos qual surge o remeter há muito dominante - para a
«vontade hipotética das partes» (70).
de conteúdo, através do juiz, de tal modo que este
deve actuar como o legislador, decidindo, afectiva-
mente, àcerca da máxima do «comportamento cor-
recto»; ele fica adstrito, no campo da sua «auto- b) A tópica como processo adequado perante remis-
-valoração», a considerar os valores e as intuições sões legislativas para o «common sense» e perante
decisões de equidade
jurídicas, culturais e sociais dominantes na comuni-
dade jurídica em causa, o que é dizer: ele deve reme-
ter-se à E\laO~a. De que círculos de problemas se trata, o segundo grupo aqui em causa é o das cláusulas
circunstanciadamente? gerais carecidas de preenchimento com valorações.
Também nestas se deixam surpreender ao caracterís-
ticas do pensamento tópico. Assim, por exemplo a
a) A tópica como meio auxiliar perante a falta de fórmula da consideração «de todos quantos pensam
valores legais bastantes, em especial nos casos justa e equamente», utilizada pela jurisprudência para
de lacunas 11 concretização do § 138 BGB (*), está próxima de
lima definição de ElIaO~a (71): de igual modo, a deter-
Devem-se, em primeiro lugar, referir certos casos Ininação do conteúdo do «cuidado necessário no trá-
de lacunas da lei, para cuja interpretação o Direito feg(»}, no sentido do § 276 BGB (**), só é possível
positivo não compreenda valorações. O exemplo clás-
sico que ocorre, a tal propósito, é a falta de uma (''') Quanto ao estado actual
de discussão cf., principal-
regulação sobre o estatuto das obrigações no Direito 11Il'n t.l', SOERGEL-KEGEL, Bürg. vaI. V, 9." ed., 1961,
Gesetzbuch,
internacional privado alemão. Aqui, nada mais resta 1111 rodução ao artigo 7 EGBGB, notas 167 ss.; SANDROCK,Zur
"I'I:<'i!'zenden Vertragsauslegung im materiellen und Schuldver-
do que recorrer a diversos pontos de vista mais ou
(rju,:srccht, 1966, p. 132 ss.
menos procedentes, experimentá-Ias em face do pro- <li) eL, a tal propósito, também EHMKE, VVdDStRL 20,
blema e ponderá-Ios uns perante os outros, isto é, I', 'lI, onde o poder convincente dos argumentos tópicos se
proceder em termos tópicos, num movimento, carac- IlJil)in no «concurso de todos 'os que pensam razoável e jus-
101111'11""».
terístico para a tópica, fortemente orientado para o
('I-) No/a do tradutor: segundo o § 138 BGB, «um negócio
(69) Quanto a estes cf., mais pormenorizadamente, supra,
IlIl'Idl,'o qlW at.ente contra os bons costumes é nulo».
6, em especial o n. o IH. (""') No/a do tradutor: segundo o § 276 I, 2 BGB, «Actua
'''111 I'lIlpll '1l1('rtl n[[o observe o cuidado necessário no tráfego»,
numa distanciação perante o caso concreto conside-
rado através do que o «comerciante ordenado», o :.L A Interpenetração e a múltipla complementação
«condutor razoável», etc. façam, portanto através da dos pensamentos sistemático e tópico
formulação de regras do «comportamento justo»
- trata-se, justamente, disso! - com auxílio do re- disse que os pensamentos tópico e sistemático
.11'1
curso à opinião «de todos, da maioria ou dos 11110 NÜO opostos exclusivistas, mas antes se comple-
sábios» (72). Perante o pensamento sistemático, a !lH'llllllll mutuamente (75). Assim, eles não estão, como
tópica tem, assim, aqui, uma função complementadora Illlv(':I. possa ter resultado das considerações feitas
inteiramente legítima a cumprir; pode-se mesmo dizer I1lc'·aqui, isolados um frente ao outro, antes se inter-
que, nesta questão, se exprime de novo a «polari- p"lldrando mutuamente. Assim, também quando à
dade» dos valores jurídicos mais elevados (7~): a tópica Iôpkn seja conferida a primazia, não se torna a siste-
ordena-se na equidade, portanto na tendência indivi- 1I1IHica totalmente sem sentido. Isto fica bem patente
dualizadora (68) da justiça (13a); ela representa o pro- III! circulo problemático primeiro referido, portanto
cesso adequado para um problema singular formulado !laqueies casos de lacunas nos quais o Direito posi-
o mais estritamente possível ou uma argumentação Iivo nilo contenha valorações para a integração: a
de equidade, orientada para o caso concreto, na qual, Iópica nada mais é aqui do que um meio auxiliar
no essencial, nenhum ponto de vista discutível se 1l'lllllnc1o-sc então de substituir o mais depressa pos-
pode rejeitar liminarmente como inadmissível, tal IJlvol os inseguros tópicos por claras valorações, isto é,
como é típico do pensamento sistemático abstracto, dI' determinar sistematicamente a resolução.
apoiado na tendência generalizadora (68) da jus- Mas também na concretização de cláusulas gerais
tiça (71). carecidas de preenchimento com valorações, nas quais

(72) Onde, em oposlçao à fórmula aristotéIica, está fora lt'I!f(·S. mas apenas certas soluções de problemas como aten-
de dúvida de que se não trata de uma bitola estatística, mas I"dos contra os princípios fundamentais constitutivos do Direito
sim normativa. VI)~('l\le.

(73) Cf. também supra, § 1 IV 3 nota 390 (th) Para uma ligação da tópica e da sistemática, com
(73a) Quanto à equidade como expressão da tendência IllIrll.iplas variações particulares, cf. também ESSER, ob. cito,
individualizadora da justiça, cf. HENKEL, Einführung in die 1', li N,. 44 5S. e passim e Stud. Gen. 12 (1959), p. 104 e 105,
Rechtsphilosophie, p. 327, com indicações na nota 2. ""I. 2; KASER, ob. cit., p. 53; PETER SCHNEIDER,VVdDStRL 20,
(74) Não há aqui uma contradição perante a «abertura» 1'- :\'1 (' fil; I-fENKEL,ob. cit., p. 426; RAISER, NJW 64, p. 203 s.;
do sistema no sentido do pensamento «aporético»; pois o sis- I )llllI'l(I('IISEN, ob. cit., po 704 s.; F. MÜLLER, obo cito, p. 57 e
tema não exclui determinados problemas como questões apa- 1', 'i'1; /:II'I'El.IlJS, ob. cit., p. 2233, d.
a tópica é bem mais de que um mero auxiliar, surge a4111 111\1(,olljunto de preVlsoes firmes - móveis no
uma tendência clara para sistematização (76). Não só
/:lt1lllfdo de WILllURG ("0) ---e totalmente aberto, num
as cláusulas gerais se devem interpretar sempre à luz
íll11hlto I'miitlual só captável em termos tópicos: a
da ordem jurídica global, portanto sobre o pano de
f1ltC!\IH;1l0do «dolus praeteritus» poderia já ser uma
fundo do sistema - assim, por exemplo, o § 138 BGB
Iln1v!lll1o fixa, largamente preenchida em termos valo~
tem sido interpretado com recurso a valores expres-
IrttlVO~jlldequados (ainda que também com o elemento
sos noutros locais da ordem jurídica e, portanto,
Illll'l1wlivo (''') do «dolo»); a excepção da suppressio
sistematicamente conectados, e não a partir da
l't'prl'Hl'llta, pelo contrãrio uma previsão móvel, na
ElIa()~a (77) --- como ainda, e sobretudo, se verifica que
qllld ümbora os «elementos» estejam firmes (82), a
a sua concretização ocorre, largamente, através da
1'!IIHl!'qll~ncia jurídica só resulta em cada caso da sua
formação de tipos, isto é, em parte, através da for-
«l'olu(;l)o de composição» (83) enquanto a excepção do
mação clara de previsões normativas (78), pressionan-
«V(\lIil'l' contra factum proprium» se poderia, ainda
do-se, com isso, no sentido da determinação siste-
Itll.it'. colocar nos limites entre uma previsão «móvel»
mática. Pense-se, por exemplo, no § 242 BGB, no
!' IImu c1úusula geral topicamente aberta (84); o maior
trabalho de sistematização efectuado pela jurispru-
f1lllhilo destes três tipos permanece contudo ainda
dência e pela doutrina, em prol da sua «precisão jurí-
lu 1'1'.11llIcn te por concretizar, pelo que qualquer tópico
dico-teórica» (79). Assim se autorizou, para referir
(', udrnissíveJ. Assim, não se deve abandonar total-
apenas um exemplo, a «exceptio doli» e, dentro
1I\('nl(~ a cláusula geral à equidade e, com isso, ao
desta, que se conserva ainda como uma «sub-cláusula
pl'll:mnwnto tópico. Antes releva, também nela, a
geral» carecida de preenchimento com valoração, sur-

("") Cf. a exposição supra, § 4 I.


(76) Com razão, DIEDERICHSEN,ob. cit., p. 704; ainda des-
("') «Normativo» e «carecido de preenchimento com valo-
conhecido em CANARIS, ob. cit., p. 107, nota 172.
ril~:i)('s» não é a mesma coisa, ainda que a diferença possa ser
(77) Cf., quanto a isso, principalmente, PAWLOWSKI,ARSP il!H'II:lS de tipo gradual.
1964, p. 503 ss.; LARENZ, Jur. Jb. vol. III (1966), p. 98 ss. e
("") São eles: confiança em que a pretensão não mais
Allg. Teil, 1967, § LF III a.
:;('j<l feita valer; um «ater-5e» a isso; um certo decurso do
(78) Cf., a tal propósito, também PAULUS, Probleme
"'mpo; e a imputabilidade da omissão do apelo à pretensão.
richterlicher Regelbildung am Beispiel des Kreditsicherungsre-
('<:1) Assim pode, por exemplo, uma duração particular-
chts, Jur. Jb. vol. VI (1965/6), p. 134 ss.
11\l'llte longa da abstenção, suprir as medidas necessárias para
(79) Remeta-se apenas para o comentário do § 242 de
'I «a ter-se» a ela e inversamente.
SIEBERT, em SOERGEL-SIEBERT,9." ed., 1959 e para WIEACKER,
(",) Cf. ainda CANARIS, Die Vertrauenshaftung im
Zur rechtstheoretischen Priizisierung des § 242 BGB, 1956.
(/"ulse1zen Privatrecht, 1971, p. 266 5S., em especial p. 301-305.
simultaneidade das tendências individualizadora e t'lIfitillo» (11lI sentido mais amplo) entre «todos ou a
generalizadora da justiça (64a) e a esta última pres- IIltlltll'lll 011 os sübios - ainda que apenas «de certa
siona sempre no sentido da sistematização. "11111111». 11111:1
vez que o apelo à «consciência jurídica
De forma inversa, o âmbito virado, em primeira MNi1I» 011 Ú ~li!)(J~(.( não basta, antes sendo necessária
linha, para o pensamento sistemático, não se con~ fi ('lllllplull\Cnl.ação através de critérios objectivos,
serva totalmente livre das influências da tópica. Isso ('1111111 11 ideia de Direito ou a natureza das coi-
resulta, desde logo, de que o âmbito no qual existam rmf1 (""), ('''').
valorações jurídico-positivas ainda determináveis com NHo hú, assim, uma alternativa rígida entre .J pen-
clareza apenas tem contactos fluidos com o âmbito rJllIlll'nlo (:()pico e o sistemático, mas antes uma com-
no qual faltam, daí resultando uma zona de fronteira 1l1!'1I1I'lIla(Jiomútua. Quão longe vai um ou outro
na qual se podem misturar pontos de vista sistema- dl'I!'I'I11in,H:e, em termos decisivos, de acordo com a
ticamente legitimados e outros respeitantes apenas III!'dídn das valorações jurídico-positivas existen-
à €liaO~(,(. Também num aperfeiçoamento praeter legem fl'li, ~~.assim se explicando também o facto de a
do Direito, que se oriente pelo sistema, e em especial f(lpica jogar um papel bastante maior (90) em sectores
na concretização de princípios jurídicos «gerais» rlll'll'lIwnte marcados por cláusulas gerais como o
extra-legais - tal como também a propósito de modi- I>írl'ilo constitucional (91) ou em áreas reguladas de
ficações provocadas (85) - os meros tópicos desem- llllldo muito lacunoso como o Direito internacional
penham, pelo menos nos estádios iniciais do desen- prlv;tdo do que, por exemplo, no Direito imobiliário
volvimento, um papel considerável (86); pode-se até, (}II no Direito dos títulos de crédito.

de certa forma, atribuir estrutura tópica ao nasci-


mento de novos princípios jurídicos (87), porque a
modificação da consciência jurídica geral que lhes
(I<H) Cf., mais pormenorizadamente, supra, p, 70 s.
subjaz se realiza, de facto, no processo de «dis-
(1m) 'fambém estes são, por seu turno, influenciados pela
1'1"I1~wi('ncia jurídica geral, daí resultando de novo o problema
(84a) Cf. também HENKEL, ob. cit., p. 359 s. dll dialéc1:ica entre o espírito objectivo e o subjectivo.
(85) Quanto a isso cf. supra, § 3 IV 1. ('>I') Mas não o único decisivo; d. também F. MÜLLER,
tlb, f'iL, na nota seguinte.
(86) Cf., quanto a isso, sobretudo ESSER, ob. cit., pp. 5 ss.,
44 ss.; 218 ss. e passim. ('" ) Quanto ao significado da tópica para o Direito cons-
lillll'jtll1ó11 e1'., principalmente, PETER SCHNEIDER e EHMKE, em
(87) Cf. HORN, ob. cit., p. 607, que contudo não só vai
VVdllSIRI. 20, pp. 1 ss. (35 ss.) e 50 ss., respectivamente,
demasiado longe a partir do fundamento referido no texto e
Jl<'llI "tlIlJo com justificadas prevenções, F. MÜLLER, ob. cit.,
por isso também não distingue entre princípios imanentes à
lei e extra-legais. pp. '17 SI'. (:>7 ss.).
J. (.: pressuposto da praticabilidade do pensa-
1I\t'nto sistemático na Ciência do Direito e do desen-
volvimento de um conceito de sistema especificamente
lurldico, que o sistema possa cumprir uma função
~,ignificativa na Ciência jurídica. Isso depende de as
Cllrncterísticas do conceito geral de sistema se pode-
1('ln ordenar em correspondência com os fenómenos
jllrtdicos.

2. As características do conceito geral do sistema


~;ilo a ordem e a unidade. Eles encontram a sua cor-
respondência jurídica nas ideias da adequação valora-
I iva e da unidade interior do Direito; estas não são
apenas pressuposições de uma jurisprudência que se
('nll'nela a si própria como Ciência e premissas evi-
d('1I1 ('f; dos métodos tradicionais de interpretação, mas
1;11111>('111. e sobretudo, consequências do princípio da
ir.llil Idade e da «tendência generalizadora» da justiça,
p"rlallto, mediatamente, da própria «ideia de Direito».
3. A função do sistema na Ciência do Direito
reside, por consequência, em traduzir e desenvolver a
adequação valorativa e a unidade interior da ordem
jurídica. A partir daí, o pensamento sistemático ganha O. Este sistema não é fechado, mas antes aberto.
também a sua justificação que, com isso, se deixa IIHo vale tanto para o sistema de proposições doutri-
derivar mediatamente dos «valores jurídicos mais l/Mim; ou «sistema científico», como para o próprio
elevados».
IllNIOliia da ordem jurídica, o «sistema objectivo».
A propósito do primeiro, a abertura significa a incom-
ploltude do conhecimento científico, e a propósito do
IIIUrno, a mutabilidade dos valores jurídicos funda-
4. O conceito de sistema jurídico deve-se desen- II/onl.ais.
volver a partir da função do pensamento sistemático.
Por isso, todos os conceitos de sistema que não sejam 7. A abertura do sistema jurídico não contradita
capazes de exprimir a adequação valorativa e a unidade 11 Hplicabilidade do pensamento sistemático na Ciên-
interior da ordem jurídica são inutilizáveis ou, pelo ciu do Direito. Ela partilha a abertura do «sistema
menos, de utilização limitada; isso aplica-se, em espe- cientffico» com todas as outras Ciências, pois en-
cial, ao «sistema externo», ao «sistema de conceitos quanto no domínio respectivo ainda for possível um
puros fundamentais», ao sistema lógico da «jurispru- progresso no conhecimento, e, portanto, o trabalho
dência dos conceitos», ao sistema axiomático-dedu- eientffico fizer sentido, nenhum desses sistemas pode
tivo no sentido da logística, ao «sistema de conexões ser mais do que um projecto transitório. A abertura
de problemas» de SALOMON e ao «sistema de decisões do «sistema objectivo» é, pelo contrário, possivel-
de conflitos» no sentido de HECK e da jurisprudência mente, uma especialidade da Ciência do Direito, pois
dos interesses. ('Ia resulta logo do seu objecto ,designadamente, da
essencia do Direito como um fenómeno situado no
5. Uma vez determinado o conceito de sistema processo da História e, por isso, mutáve1.
com referência às ideias de adequação valorativa e
unidade interior do Direito, deve-se definir o sistema
jurídico como «ordem axiológica ou teleológica de
princípios jurídicos gerais». Também é imaginável
uma correspondente ordem de valores, de conceitos 8. Da problemática da «abertura» do sistema
teleológicos ou de institutos jurídicos. deve-se distinguir a sua «mobilidade». A mobilidade,
no sentido que este termo recebeu de WILBURG,
significa a igualdade fundamental de categoria e a
mútua substituibilidade dos critérios adequados de
justiça, com a renúncia simultânea à formação de I/.. A consciência do conceito e da qualidade do
previsões normativas fechadas. jurídico conduz também, desde logo, a uma
r.lIi1t'lllil

"mlposta para a questão do significado do sistema na


oh/('I/c,:ào do Direito. Quando se entenda o sistema
9. Também um «sistema móvel» merece ainda o COlllo uma ordem teleológica (aberta e fundamental-
nome de sistema, pois também nele se realizam as 1111'11(' imóvel), logo daí resulta que o argumento sis-
características da ordem e da unidade. Trata-se, con- ll'II1Míco apenas representa uma forma especial de
tudo, deu um caso limite da praticabilidade do con- fuudamentação teleológica; pode, por isso, e tal como
ceito de sistema. I'Hta, aspirar à mais alta categoria entre os critérios
dI' interpretação criativa. O sistema possui, com isso,
«aptidão para a derivação teleológica».
10. O Direito positivo é dominado, fundamen-
talmente, não por um sistema móvel mas antes por I:L O sistema cumpre sobretudo, em particular,
um imóvel. No entanto, ele compreende partes uuas tarefas na obtenção do Direito: ele contribui
móveis. pa ra a plena composição do conteúdo teleológico de
lima norma ou de um instituto jurídico o que conduz
n interpretá-Ios como parte do conjunto da ordem
11. O «sistema móvel» está, legislativamente,
jurídica e sobre o pano de fundo das conexões rele-
entre a formação de previsões normativas rígidas, por vantes; e ele serve para a garantia e a realização
um lado, e a cláusula geral, por outro. Ele permite da adequação valorativa e de unidade interior do
confrontar de modo particularmente feliz, a polari- I)ireito, porquanto mostra as inconsequências valora-
dade entre os «mais altos valores do Direito», em Uvas, proporcionando, com isso, o aperfeiçoamento
especial a «tendência generalizadora» da justiça e a do Direito, tanto pela delimitação de ameaçadoras
«individualizadora» e constitui, assim, um enriqueci- (~()ntradições de valores como pela determinação de
mento valioso do instrumentário legislativo. Ele não lacunas.
deve, contudo, ser exclusivamente utilizado, antes Por consequência, o significado do sistema pode
representando uma possibilidade legislativa entre reconhecer-se em todos os graus da obtenção do
outras, ligadas entre si. Direito: na «complementação de lacunas e na inter-
pretação criativa sistemáticas» não menos do que na 1)(\ n·:;to, os limites da obtenção do Direito a
«interpretação sistemática». /1«1'111' do sistema resultam dos próprios limites postos
~ l'ol'lIll1(;fíodo sistema.
14. O princípio da «aptidão para a derivação
teleológica» do sistema vale também para as «cons-
truções» do legislador. Contra a opinião de HECK,
estas não são «construções de conceitos privadas de
valores», que se possam corrigir «como um lapso de
IG. Estes limites à formação do sistema têm o
redacção», mas antes valorações em trajos de cons-
t-!t'u fundamento, por um lado, no desenvolvimento
trução, que são tão vinculativas como qualquer outra
IdHI()rico da ordem jurídica e nas falhas da legislação
valoração legal.
/'('llIcionadas com a incompleitude do conhecimento e
da linguagem humana, e, por outro, na chamada «ten-
15. Ao acentuar o significado do sistema para a
di'llcia individualizadora» da justiça, que se realiza
obtenção do Direito, não se devem desconhecer os
por sectores, em cada ordem jurídica e contra a qual
limites que lhe são colocados. Ele está, sobretudo,
Il('\ua () pensamento sistemático - conectado com a
sempre sob a dupla reserva de um «controlo teleoló-
<dt'ndência generalizadora»!
gico», do argumento sistemático e da possibilidade de
um aperfeiçoamento do sistema, em consonância com
o princípio da sua abertura. 17. As quebras sistemáticas, as normas estranhas
Perante isso, requer-se o maior cuidado em face ao sistema e as lacunas no sistema devem-se distin-
da tentativa de utilizar alegadas exigências da «jus- guir entre si. As quebras no sistema respeitam a
tiça material» contra argumentos sistemáticos: estes contradições de valores e de princípios, as normas
representam, por definição, apenas a ideia final dos estranhas ao sistema resultam de valorações que per-
valores da lei, dirigida ao princípio da igualdade e m,-~necemisoladas dentro do conjunto da ordem jurí-
recebeu, simultaneamente, o seu poder convincente dica e, também das que, em si mesmas, não possuem
da autoridade do Direito positivo e da dignidade da qualquer poder convincente e as lacunas no sistema
regra da justiça (formal). A solução conforme com o silo a consequência de lacunas de valoração.
sistema é, assim, na dúvida, não só a que vincula,
de lege lata, mas sendo também de aceitar como a que 18. As quebras no sistema eliminam-se através
se justifica sob o império de uma determinada ordem da «interpretação sistemática» e da «integração sis-
jurídica. temática de lacunas».
Onde isso não seja viável, porque o teor e o sen- (J)('s subjacentes respeitem à erupção da «tendência
tido da lei, o Direito consuetudinário ou uma proibi- illdividualizadora» da justiça. Abre-se aqui um campo
ção de interpretação criativa se lhe oponham, fica a J<'gitimo para uma forma de pensamento não siste-
saída de considerar as normas contrárias ao sistema ll1útica e, em especial, para a tópica.
como nulas, por causa da sua violação da regra cons-
titucional da igualdade; pois as quebras no sistema
representam, por definição, contradições de valores
e, com isso, violações da regra da igualdade. O Tri-
bunal Constitucional da União já se pronunciou, de
facto, várias vezes nesse sentido. Com este reconheci- 20. Contra a opinião de VIEHWEG,o «pensamento
mento, o sistema ganha aliás, em simultâneo, signi- tópico» específico não se deve considerar com rela-
ficado prático, sob um novo aspecto. çüo ao «pensamento problemático»; em especial, o
Não obstante, mantém-se um resquício, ainda que «pensamento aporético» no sentido de NICOLAI
relativamente pequeno, de quebras no sistema, pois HARTMANNnão conduz, necessariamente, à tópica,
uma contradição de valoração nem sempre precisa mas apenas à abertura do sistema.
de significar «arbítrio», no sentido da interpretação A característica da tópica reside então antes em
dominante do artigo 3 I GG. que a legitimação das premissas a fundamentar se
apoia apenas na ElIaO;a, portanto, na «opinião de
19. As quebras irremediáveis no sistema impe- todos, da maioria ou dos sábios», isto é, no essencial,
dem de facto uma formação cabal do sistema mas sobre o «common sense».
deixam-no, intocado, nos demais âmbitos não directa-
mente atingidos pela quebra; assim sendo, nada de 21. A tópica é, por isso, basicamente, inconciliá-
decisivo depõem contra a aplicabilidade da ideia de vel com a doutrina da validade e das fontes do Direito;
sistema na jurisprudência. pois aq~ando da aplicação do Direito, as premissas
O mesmo vale, no fundamental, para as lacunas não se legitimam a partir da «opinião de todos ou da
do sistema que são essencialmente mais frequentes maioria ou dos sábios» mas sim do Direito positivo
do que as quebras sistemáticas. Elas deixam-se, na e isso mesmo quando este não coincida com aqueles.
verdade, integrar em parte no sistema através da Em especial, a tópica não consegue oferecer nenhum
realização de valorações adequadas mas, por outro critério acertado para a resposta à questão decisiva
lado, subtraiem-se em largos troços a qualquer sis- de a qual de entre vários «tópicos», que pela sua
tematização, em especial onde as lacunas de valora- natureza apenas podem ser propostas de solução, se
deve reconhecer a primazia; só o sistema pode, em HilJlH'lrll ('rup<.;ões da «tendência individualizadora»
regra, cumprir esta função de escolha. d~1ItlNIi(a contrária ao sistema e, por isso, exija a
Esta insuficiência da tópica perante o princípio da Ulíl'llill<:iíO ao caso concreto - de acordo com a
sujeição da aplicação do Direito à lei resulta de os !<;PiCll.
seus partidários não distinguirem suficientemente
entre as tarefas da legiferação e as da jurisprudência; :~:\. A oposlçao entre o pensamento sistemático
eles desconhecem, sobretudo, que a jurisprudência t' II tópica não é, assim, exc1usivista. Ambas as for-
tem parcialmente a ver com a execução compreensiva lilllfl de pensamento antes se completam mutuamente
de valorações já colocadas, mas não com uma escolha 1111 <'rpclwtrando-se, até, em parte.
tópica de premissas e que, por consequência, ela é
fundamentalmente uma doutrina do «entendimento
justo» e não uma doutrina da «actuação justa». Além
disso, o pensamento tópico está sempre orientado o
mais estreitamente possível para o problema singular
e corre, por isso, sempre o perigo de ignorar a regra
da unidade interior e da adequação da ordem jurídica.

22. Embora, desta forma, a tópica não possa


abarcar, com correcção e no fundamento a estrutura
da Ciência do Direito, há no entanto áreas nas quais
ela tem uma função legítima a desempenhar. Elas
surgem sobretudo onde faltem valorações legais bas-
tantes e onde, por isso, não haja espaço para o pen-
samento sistemático.
Nessas áreas, a tópica é, por um lado, um mero
recurso e um primeiro passo para uma determinação
sistemática, representando também, por outro, o
único processo justificado. Este último caso verifi-
ca-se, sobretudo onde a própria lei remeta, em branco,
para o «common sense» e deixe ao juiz a determina-
ção das máximas da «actuação correcta» e onde a lei
I
I I

I I

I
I

I I
I

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I
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MUllcr. 127 S. 1976. DM 36,-.
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Struck. 162 S. 1977. DM 48,-.
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10. A evolução do Direito e a sucessão de
modelos sistemáticos; os modelos perifé-
rico, central e integrado . LXX
11. Mpdelos sistemáticos e codificações civis LXXXIV

IV - A REALIZAÇÃO DO DIREITO . . CI
12. O esquema concepto-subsuntivo; críticas;
a unidade da realização do Direito e a
natureza constituinte da decisão. CI
13. Os modelos de decisão; pré-entendimento,
sinépica e integração horizontal . CVII
14. O novo pensamento sistemático. CXII
li I." A FUNÇÃO DA !DElA DE SISTEMA NA CIÊN-
CIA DO DIREITO 9

r _. As qualidades da ordem e da unidade como


características do conceito geral de sistema 9
II - A adequação valorativa e a unidade interior
da ordem jurídica como fundamentos do sis-
tema jurídico . 14
1. Adequação e unidade como premissas
teorético-científicas e hermenêuticas . 14
2. Adequação e unidade como emanações e
postulados da ideia de Direito . 18

J- Conceitos de sistema que não se justificam a


partir das ideias da adequação valorativa e da
unidade interna da ordem jurídica 26

1. O sistema «externo» . 26
2. O sistema de «puros» conceitos funda-
mentais 27
::I. O sistema lógico-formal 28
a) O sistema lógico da jurisprudência
dos conceitos 28
b) o sistema axiomático·dedutivo no
sentido da logística
I ~"A uIJertura do «sistema científico» como
4. O sistema como conexão de problemas
íncompleitude do conhecimento científico. 106
II A abertura do «sistema objectivo» como
a) O conceito de sistema de MAX lIIodificabilidade dos valores fundamentais
SALOMON da ordem jurídica . 107
b) A concepção de FRITZ VON HIPPEL III - O significado da abertura do sistema para
as possibilidades do pensamento sistemático
5. O sistema como relações da vida . c da formação do sistema na Ciência do
6. O «sistema de decisões de conflitos» no Direito . 109
sentido de HECK e da jurisprudência dos IV - Os pressupostos das modificações do sis-
interesses . tema e a relação entre modificações do
sistema objectivo e do sistema científico 112
a) A posição da jurisprudência dos inte-
resses quanto à ideia da unidade do 1. Modificações do sistema «objectivo» . 114
Direito 2. Modificações no sistema «científico» . 124
b) As fraquezas do conceito de sistema
da jurisprudência dos interesses

II - O desenvolvimento do conceito de sistema a


I- As características do «sistema móvel», no
partir das ideias de adequação valorativa e da
conceito de WILBURG . 127
unidade interior da ordem jurídica . 66
II - Sistema móvel e conceito geral do sistema 130
1. O sistema como ordem axiológica ou III - Sistema móvel e Direito vigente 134
teleológica 66
2. O sistema como ordem de «princípios 1. A prevalência fundamental das partes
gerais do Direito» 76 rígidas do sistema . 134
2. A existência de partes móveis no sistema 135
a) As vantagens, na formação do sis-
tema, dos «princípios gerais do IV - O significado legislativo e metodológico do
Direito», perante normas, conceitos, sistema móvel . 138
institutos jurídicos e valores . 80
b) Os tipos de funções dos «princípios 1. O sistema móvel e a necessidade de uma
gerais do Direito» na formação do diferenciação mais marcada . 138
sistema . 88 2. Sistema móvel e cláusula geral . 141
c) As diferenças dos «princípios gerais 3. A posição intermédia do sistema móvel
de Direito» perante os axiomas . 100 entre a cláusula geral e a previsão nor-
mativa rígida e a necessidade de uma :~. Delimitação das contradições de valores
ligação entre estas três possibilidades ü de princípios perante os fenómenos
de formulação aparentados 201

a) Perante as diferenciações de valores 201


iJ) Perante os limites imanentes de um
princípio 202
I- Ordenação sistemática e determinação do c) Perante a combinação de princípios 202
conteúdo teleológico . el) Perante as oposições de princípios 204
1. A «interpretação sistemática» .
2. A integração de lacunas a partir do :". As possibilidades de evitar contradições
sistema de valores ou de princípios, através da
interpretação criativa do Direito 207
Ir - O significado do sistema para a defesa da
unidade valorativa e da adequação na inter- a) As possibilidades da interpretação
pretação do Direito 172 sistemática 208
h) As possibilidades da complementa-
1. A prevenção de contradições de valores 173
ção sistemática das lacunas 211
2. A determinação de lacunas . 176
c) Os limites da eliminação de contra-
III - O conteúdo valorativo das construções legais 178 dições de valores e de princípios
IV - Os limites da obtenção elo Direito a partir através da interpretação criativa do
do sistema 186 Direito 212
1. A necessidade de controlo teleológico 187
2. A possibilidade de um aperfeiçoamento 4. A problemática da vinculabilidade de
do sistema 188 normas contrárias ao sistema e a ligação
3. Justeza sistemática e justiça material. 193 do legislador ao pensamento sistemático 217
4. Os limites da formação do sistema como
limites da obtenção do Direito a partir a) A solução com auxílio da aceitação
do sistema 196 de uma «lacuna de colisão» . 218
b) A solução com auxílio do princípio
constitucional da igualdade 224

5. O significado das quebras sistemáticas


I- Quebras no sistema . 200 que se mantenham para as possibilida-
1. Quebras no sistenla como contradições des do pensamento sistemático e da for-
de valores e de princípios 200 mação do sistema na Ciência do Direito 233
2. As possibilidades remanescentes da
tópica. 269
1. Normas estranhas ao sistema como vio-
lação do princípio da unidade da ordem a) A tópica como meio auxiliar perante
jurídica 235 a falta de valores legais bastantes
2. Interpretação e validade de normas estra- em especial nos casos de lacunas 270
nhas ao sistema 237 b) A tópica como processo adequado
perante remissões legislativas para
o «common sense» e perante deci-
sões de equidade 271
1. Lacunas no sistema como lacunas na
valoração 239 3. A interpretação e a múltipla comple-
2. Lacunas no sistema como erupções de mentação dos pensamentos sistemático
modos de pensar não sistemáticos . 241 e tópico 273

1. Tópica e pensamento problemático 245


2. Tópica e legitimação de premissas atra-
vés de 1ivor'E'l ou de «common sense» 251

II - O significado da tópica para a Ciência do


Direito . 255

a) A impraticabilidade da vertente «re-


tórica» da tópica . 255
b) A insuficiência da tópica perante o
problema da validade e da adstrin-
gibilidade juridicas 256
c) A tópica como doutrina da actuação
justa e a jurisprudência como Ciên-
cia do entendimento justo . 262
I':HIII edição do PENSAMENTO SISTEMÁTICO
I': CONCEITO DE SISTEMA NA CIÊNCIA DO
I )110':1'1'0, de Claus· Wilhelm Canaris, foi
composta, impressa e brochada para a
I'I//I(lação Calouste Gulbenkian nas oficinas
dll Imprensa Portuguesa, Porto. A tiragem
é de 4000 exemplares.

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