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ANO-ZERO.COM
INTRODUÇÃO
Nos dois primeiros anos, o projeto Ano Zero passou por uma etapa de defi-
nição de identidade, e de depuração de seus princípios, valores e aspirações.
O que você lerá a seguir é o resultado desse longo processo. Mas não se
tratam de textos que apontam para o passado, para o que foi o AZ. Ao contrá-
rio, são textos que apresentam ideias e visões que apontam para os passos
futuros do projeto.
Os antigos alquimistas tinham um princípio de operação que resumiam
nas palavras solve et coagula (separa e une). No século XX, observamos a
humanidade evoluir graças a abordagem analítica da ciência e a separação da
abordagem do mundo em especialidades. Foi o período do solve. É chegada a
hora do coagula: da união e síntese de tudo o que aprendemos de útil e valioso
no século passado, para assim construirmos o amanhã neste momento.
Cânone, segundo o Priberam, significa, entre outras coisas, “conjunto de
autores ou de obras que são considerados exemplares em determinada altura
ou local”. Assim, escolhemos chamar de “Cânone AZ” o conjunto de publi-
cações que consideramos exemplares da visão que inspira o Ano Zero, que
servem de referência para as linhas mestras de nosso trabalho.
Esse primeiro ebook pode ser apenas o primeiro de uma série, na verdade
um tipo de “amostra”: pensamos em criar outros ebooks com a tradução de
todos os textos de autores como Tim Urban e Mark Manson, entre outros no-
mes constantemente presentes no site do Ano Zero e compor com todas essas
obras o “Cânone AZ completo”, disponibilizando-os a nossos leitores ao longo
de 2017. O que você acha da ideia? Se gostar ou tiver outras sugestões, entre
em contato conosco!
Obrigado por nos acompanhar ao longo desses anos e aguarde outras
novidades para 2017.
Boa leitura.
O editor.
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ÍNDICE
Como vencer a procrastinação, por Tim Urban: pg. 04
Você precisa parar de se preocupar com o que os outros pensam, por Tim Urban: pg. 24
Sete doenças que estão matando a humanidade, por Victor Lisboa: pg. 43
Sete sinais de saúde em uma sociedade enferma, por Victor Lisboa: pg. 52
Acorde: tem um desconhecido mandano na sua vida, por Victor Lisboa: pg. 62
Sete perguntas para encontrar o propósito da sua vida, por Mark Manson: pg. 72
Cinco coisas que deveríamos aprender na escola, por Mark Manson: pg. 78
Dez razões pelas quais você sempre fracassa, por Mark Manson: pg. 83
Os bichos de Orwell e nosso status na fazenda humana, por Felipe Novaes: pg. 95
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como vencer a
PROCRASTINAÇÃO
tim urban
PARTE 1:
POR QUE PROCRASTINADORES PROCRASTINAM?*
Pro-cras-ti-na-ção (substantivo do latim procrasti-
na-tio, -onis): ato de postergar ou adiar algo.
Ex.: Sua primeira dica é evitar a procrastinação.
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PLANEJAR
Procrastinadores adoram planejar, algo simples pois não envolve fazer, e
fazer é a kriptonita do procrastinador.
Mas quando um procrastinador planeja, ele gosta de fazer isso de uma
forma vaga, que não considera os detalhes ou a realidade muito de perto, e
seu planejamento deixa essas coisas perfeitamente configuradas para que na
verdade não realize nada. Uma sessão de planejamento do procrastinador
deixa-o no pesadelo de um realizador: uma grande lista de afazeres e com-
promissos intimidadores e obscuros.
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Uma grande lista é talvez uma fase inicial do planejamento, mas planeja-
mento precisa terminar com uma priorização rigorosa e um item que emerge
como o vencedor – o item que você colocará como o prioritário. E o item que
vence deve ser aquele que tem mais significado para você – o item mais im-
portante para a sua felicidade. Se há itens urgentes envolvidos, esses tem
de vir primeiro e precisam ser cumpridos tão rápido quanto possível a fim de
abrir caminho para os itens importantes (procrastinadores amam usar itens
urgentes mas sem importância como desculpa para adiar eternamente os
importantes).
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E se torne isso:
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FAZER
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A seguir temos uma procrastinadora que começa a tarefa, mas ela não
consegue manter seu foco, então ela fica fazendo longos intervalos para na-
vegar na internet e preparar algo para comer. Ela não termina concluindo a
tarefa:
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Após terminar, ele se sente decente pois realizou algo, mas ele não está
completamente satisfeito pois ele sabe que fez um trabalho de menor quali-
dade pois tinha muita pressa, e ele sente que desperdiçou a maior parte do
seu dia por razão nenhuma. Isso o faz chegar no Parque dos Sentimentos
Confusos.
Então se você é um procrastinador, vamos observar o que você precisa
para se manter no caminho certo, aquele que lhe deixará muito mais feliz.
A primeira coisa que você precisa fazer é passar pela Entrada Crítica. Isso
significa parar o que quer que você esteja fazendo quando chega a hora de
iniciar uma tarefa, deixando todas as distrações de lado e começando. Parece
simples, mas é a parte mais difícil. É aqui que o Macaco da Gratificação Ins-
tantânea coloca sua mais feroz resistência:
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Não faz sentido trocar a Floresta Negra pelo Playground das Trevas – am-
bos são sombrios. Ficar em ambos é desagradável, mas a grande diferença é
que a Floresta Negra leva à felicidade e o Playgroud das Trevas leva apenas à
mais miséria. Mas o Macaco da Gratificação Instantânea não é lógico, e para
ele o Playground das trevas parece muito mais divertido.
A boa notícia é que se você puder enfrentar um pouco da Floresta Negra,
algo curioso acontece. Fazer progresso em uma tarefa produz sentimentos
positivos de realização e eleva sua auto-estima. O macaco obtém sua força
da baixo auto-estima, e quando você sente um sopro de satisfação consigo
próprio, o macaco encontra uma Banana de Elevada Auto-estima no caminho.
Isso não elimina sua resistência inteiramente, mas isso o distrai por um boca-
do de tempo, e você perceberá que a necessidade de procrastinar diminuiu.
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Antes que perceba, você terminou e está no Playground Feliz. Agora, pela
primeira vez em muito tempo, você e o macaco são um time. Ambos querem
diversão, e ela é fantástica porque é merecida. Quando você e o macaco for-
mam um time, você quase sempre está feliz.
A outra coisa que pode acontecer quando você passar pelo Ponto Decisi-
vo, dependendo do tipo de tarefa e do quão bem o trabalho está indo, é que
você pode começar a se sentir fantástico em relação ao que está fazendo,
tão fantástico que continuar a trabalhar parece muito mais divertido do que
interromper para curtir atividades de lazer. Você se torna obsecado com a ta-
refa e basicamente perde interesse em tudo mais, incluindo em comida e no
passar do tempo – isso é chamado Fluxo. Fluxo não é apenas um sentimento
jubilante, é também onde geralmente você realiza grandes coisas.
O macaco é tão viciado em júbilo quanto você, e novamente ambos for-
mam um time.
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Esforçar-se até chegar no Ponto Decisivo é difícil, mas o que faz a pro-
crastinação tão mais difícil é que o Macaco da Gratificação Instantânea tem
uma terrível memória de curto prazo – mesmo se você foi bem sucedido de
um jeito incrível na segunda-feira, quando você começa a tarefa da terça o
macaco já esqueceu de tudo e novamente resistirá a entrar na Floresta Negra
ou nela permanecer.
E é por isso que persistência é um componente crítico do sucesso. Colocar
cada tijolo exige uma batalha interior – e no final, sua habilidade de vencer
cada batalha específica e colocar tijolo após tijolo, dia após dia, é fundamen-
tal na luta de um procrastinador para assumir o controle de seu mundo.
Então isso é o que precisa acontecer. Mas se a procrastinação pudesse ser
resolvida lendo um texto de um site, não seria um problema tão grande na
vida de tantas pessoas. Só há uma forma de realmente vencer a procrasti-
nação:
Você precisa mostrar para si mesmo que pode fazer isso, e não apenas di-
zer para si mesmo. As coisas mudarão quando você mostrar a si mesmo que
elas podem mudar. Até lá, você não acreditará nisso, e nada mudará. Pense
em você como um artilheiro de futebol que há tempos não faz um gol. Para
jogadores de futebol, tem tudo a ver com confiança, e um artilheiro que há
tempos não faz gol pode dizer a si mesmo mil vezes “sou um grande artilhei-
ro, vou fazer o próximo gol”, mas não é antes de ele realmente fazer um gol
que sua confiança voltará e ele retomará sua habilidade de volta.
Então como começamos a golear?
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a) Tente internalizar o fato de que tudo o que você faz é uma escolha.
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Lembre-se, tudo isso tem a ver com mostrar a si mesmo o que você pode
realizar, então o segredo não é ser perfeito, mas simplesmente melhorar. O
autor que escreve uma página por dia escreveru um livro após um ano. O
procrastinador que melhora um pouco a cada semana é uma pessoa total-
mente transformada um ano depois.
Comece pensando sobre os termos que usamos neste artigo, e se eles
são raz Portanto não pense sobre ir de A até Z – apenas comece de A até B.
Mude o Roteiro de “eu procrastino em cada tarefa que faço” para “uma vez
por semana eu cumpro uma tarefa sem procrastinar”. Se você puder fazer
isso, você criará uma tendência. Eu ainda sou um miserável procrastinador,
mas definitivamente estou melhor do que estava um ano atrás, então me
sinto esperançoso sobre o futuro.
Porque eu penso nesse assunto tanto, e porque acabo de escrever um
artigo de 19.000 páginas sobre isso?
Porque derrotar a procrastinação é o mesmo que ganhar o controle de sua
própria vida. Muito daquilo que faz as pessoas felizes ou infelizes – seu nível
de realização e satisfação, sua autoestima, os arrependimentos que carregam
consigo, o quanto de tempo livre possuem para dedicar a seus relacionamen-
tos – está estreitamente vinculado a procrastinação. Então compensa demais
levar esse assunto a sério, e o tempo para começar a melhorar é agora.
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N o primeiro dia na segunda série, fui para a escola e notei que havia
uma nova e linda menina na classe – alguém que eu não havia visto no ano
anterior. Seu nome era Alessandra e uma hora depois ela já era tudo para
mim.
Quando você tem sete anos, não há realmente nenhum passo lógico que
você possa tomar quando ama alguém. Você nem mesmo sabe o que deseja
nessa situação. Existe apenas esse desejo amorfo que agora é parte da sua
vida, e nada mais.
Mas para mim isso se tornou subitamente relevante alguns meses depois,
quando durante o recreio uma das meninas da classe começou a perguntar
para os meninos: “com quem voceeeê quer casar?” Quando ela fez essa per-
gunta pra mim, nem pensei duas vezes. “Alessandra”.
Desastre.
Eu ainda era um novato nessa coisa de ser um humano e não tinha ainda
percebido que a única resposta socialmente aceitável era: “com ninguém”.
Assim que respondi, aquela menina detestável correu até os outros alu-
nos e disse a cada um deles “Tim disse que quer casar com a Alessandra!”. E
cada um para quem ela contava minha resposta tapava a boca para sufocar
uma gargalhada incontrolável. Fiquei arrasado. Minha vida tinha acabado.
A notícia rapidamente chegou aos ouvidos da Alessandra, que por dias
ficou o mais distante de mim possível. Se ela soubesse o que era um boletim
de ocorrência, ela teria feito um para se garantir.
Essa experiência horrível me ensinou uma lição fundamental – pode ser
fatalmente perigoso ser você mesmo, e você precisa continuamente exercitar
a extrema cautela social.
Claro que isso parece algo que apenas um menino traumatizado na se-
gunda série pensaria, mas o estranho (e que é o tema deste artigo) é que
essa lição não diz respeito apenas a mim e a minha infância desastrosa – é
uma definição da paranoia da espécie humana. Nós todos compartilhamos
uma insanidade coletiva que está presente em todas as culturas ao redor do
planeta:
uma obsessão irracional e contraprodutiva com os
que os outros pensam de nós.
*Tradução de Taming the Mammoth: Why You Should Stop Caring What Other People Think autorizada
pelo autor.
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A evolução fez tudo por uma razão, e para compreender a origem des-
sa insanidade precisamos por um minuto retroceder cinquenta mil anos na
Etiópia, época em que um antepassado seu vivendo como membro de uma
pequena tribo.
Naquele tempo, ser membro de uma tribo era crítico para a sobrevivên-
cia. Uma tribo significava comida e proteção numa época em que nenhuma
dessas duas coisas era fácil de conseguir. Então, para seu antepassado, quase
nada no mundo era tão importante quanto ser aceito por seus companheiros
de tribo, especialmente por aqueles em posição de autoridade. Adequar-se
àqueles que estavam ao seu lado e agradar àqueles que estavam acima dele
significava que ele podia permanecer na tribo, e um dos maiores pesadelos
que ele podia conceber seria o de as pessoas da tribo começarem a murmurar
sobre como ele era aborrecido ou pouco produtivo ou esquisito – porque caso
um número suficiente de pessoas antipatizassem com ele, seu status dentro
da tribo cairia, e se a coisa realmente ficasse feia, ele seria chutado para fora
da tribo e abandonado para morrer sozinho. Ele também sabia que se em al-
gum momento envergonhasse a si mesmo perseguindo uma garota da tribo
e sendo por ela rejeitado, ela contaria às outras garotas a respeito disso – e
ele não apenas acabaria com todas as suas chances com aquela garota, mas
possivelmente jamais teria uma parceira, pois qualquer outra mulher que
cruzasse seu caminho saberia de sua tentativa ridícula e fracassada. Ser so-
cialmente aceito era tudo.
Por causa disso, os seres humanos desenvolveram uma obsessão exces-
siva com o que os outros pensam deles – um anseio social por aprovação e
admiração, e um medo paralisante de ser desaprovado. Vamos então chamar
essa obsessão humana de Mamute da Sobrevivência Social. Ele se parece
mais ou menos assim:
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O pesadelo que o Mamute tem com a rejeição afetiva fez nossos ances-
trais serem cautelosos e experientes. Mas no mundo de hoje, isso só faz de
você um covarde:
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E nem vamos a falar do terror que o Mamute tem dos riscos artísticos:
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Às vezes, a atenção do
Mamute não está na socie-
dade como um todo, mas em
ganhar a aprovação do Mestre
Fantocheiro de sua vida. Um
Mestre Fantocheiro é uma pes-
soa ou grupo de pessoas cuja
opinião importa tanto para
você que essencialmente eles
estão controlando sua vida.
Um Mestre Fantocheiro é em
geral um parente, ou talvez
seu companheiro, ou às vezes
o membro alfa do seu grupo
de amigos. Um Mestre Fanto-
cheiro pode ser aquela pessoa
que você procura quando não
se sente bem – talvez uma celebridade que você jamais encontrou – ou um
grupo de pessoas que você tem em alta consideração.
Nós ansiamos pela aprovação do Mestre Fantocheiro mais do que a de qual-
quer outra pessoa, e ficamos tão aterrorizados com a ideia de irritar o Mestre
Fantocheiro ou experimentar sua rejeição ou desprezo que fazemos qualquer
coisa para evitar essas situações. Quando atingimos um nível tóxico no re-
lacionamento com o Mestre Fantocheiro, a presença dessa pessoa domina
totalmente nosso processo de decisão e puxa as cordas de nossas opiniões e
controla nossa voz moral.
Com tantos pensamentos e energia dedicado às necessidades do Mamute,
você frequentemente negligencia outro ser que existe no seu cérebro, al-
guém que deveria estar no centro de tudo:
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Sua Voz Autêntica está em algum lugar no seu cérebro e sabe tudo sobre
você. Em contraste com a simplicidade preto-e-branco do Mamute da Sobre-
vivência Social, sua Voz Autêntica tem nuances, às vezes é obscura, está em
constante evolução e é corajosa. Sua V.A. tem seu próprio código moral cheio
de nuances, criado pela experiência, pela reflexão, e tem também sua própria
concepção pessoal de compaixão e integridade. Ela sabe exatamente como
você se sente a respeito de coisas como dinheiro, família e casamento, e ela
sabe de que tipo de pessoas, assuntos ou interesses, e de que tipo de ativi-
dades você realmente gosta, e quais você não gosta. Sua V.A. está ciente de
que não sabe como sua vida será ou deveria ser vivida, mas ela possui uma
forte intuição sobre qual deve ser o próximo passo a ser dado.
E enquanto o mamute olha apenas para o mundo exterior durante seu
processo de tomada de decisão, sua Voz Autêntica usa o mundo exterior para
aprender e colher informações. Mas quando chega a hora de tomar uma deci-
são, ela tem todo o instrumental de que necessita bem ali mesmo, no centro
do seu cérebro.
Sua V.A. é também alguém que o Mamute tende a ignorar totalmente. A
opinião veemente de uma pessoa cheia de auto-confiança no mundo exte-
rior? O Mamute presta toda a atenção a ela. Mas uma súplica apaixonada de
sua V.A. é totalmente desconsiderada até que alguém lá fora a endosse.
E como nosso cérebro, programado há 50.000 anos, está condicionado a
dar ao Mamute um grande poder de influência sobre as coisas, sua Voz Au-
têntica começa a sentir que é irrelevante. O que a faz se encolher, desapare-
cer de cena e perder motivação.
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Nesse ponto de nosso papo, a missão deve estar evidente: nós precisa-
mos descobrir um modo de superar a programação de nosso cérebro e domar
o Mamute. Essa é a única forma de ganharmos controle de nossas vidas.
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Não é muito realista chutar o mamute totalmente para fora de sua cabeça
– você é um ser humano e seres humanos têm mamutes em suas cabeças,
ponto final. O que todos nós precisamos é estabelecer certas áreas de nossas
vidas que precisam estar nas mãos da Voz Autêntica e livres da influência
do mamute. Há áreas óbvias que precisam fazer parte dos domínios da sua
Voz Autêntica, como a escolha de seu parceiro, a sua carreira profissional e o
modo como você cria seus filhos. Outras dependem de suas escolhas pesso-
ais – e então vem a questão: “Em quais partes da sua vida você precisa ser
totalmente verdadeiro consigo próprio?”
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Então…
Uma amiga minha estava saindo com um cara em tese ótimo, mas ter-
minou o envolvimento porque ela não conseguia se apaixonar por ele. Ela
tentou explicar o porquê, dizendo que ele não era esquisito ou especial o su-
ficiente – ele parecia “só mais um dos caras”. Em outras palavras, ele estava
sendo controlado demais por um mamute.
Isso também vale entre amigos e colegas, em que pessoas controladas
por sua Voz Autêntica são mais respeitadas e mais atraentes – não porque
necessariamente haja qualquer coisa interessante sobre eles, mas porque as
pessoas respeitam alguém com a força de caráter necessária para domar seu
mamute.
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Este artigo era só diversão e festa até “comece a ser você mesmo” en-
trar em cena. Até agora, este texto foi uma interessante reflexão sobre por
que humanos se importam tanto com o que outras pessoas pensam, porque
isso é ruim, de que modo isso é um problema na sua vida e por que não há
nenhuma razão para isso continuar a atormentar você. Mas realmente fazer
alguma coisa após você terminar de ler este artigo é uma coisa totalmente
diferente. Isso exige mais do que reflexões – isso exige coragem.
Introjetar esse pensamento vai diminuir o medo que você sente, e sem
medo o mamute perde um pouco de seu poder.
Com um mamute enfraquecido, torna-
-se possível começar a dar apoio a quem
você realmente é e até mesmo fazer al-
gumas mudanças ousadas – quando você
perceber que essas mudanças acabaram
bem e com poucas consequências nega-
tivas e sem arrependimentos, isso vai re-
forçar a epifania e uma Voz Autêntica em-
poderada torna-se a regra. Seu mamute
agora perdeu sua habilidade de puxar
suas cordas, e está domado.
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3. O PROTAGONISMO
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4. AS RELAÇÕES LÍQUIDAS
papeis sociais rígidos nem certezas sólidas. Tudo, portanto, é fluído e não
social ou pessoa.
Que emprego escolher, com quem nos casar, que estilo de vida adotar:
não há qualquer orientação sobre o que é certo e errado diante de duas es-
colhas, e tudo o que nos é dito é que temos total liberdade para decidir. O
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5. A FALTA DE TEMPO
do seu tempo. A forma como utilizamos nosso tempo pessoal está cada vez
em um frenesi initerrupto.
caminho para esse sonho está ladrilhado com tarefas, microtarefas e toda
espécie de atividade que exige nossa constante atenção. Isso consome pra-
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6. O HIPERCONSUMISMO
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7. A IRONIA
Não apenas a sinceridade e a paixão estão hoje fora de moda, alerta Fos-
ter-Wallace, mas atualmente é sinal de distinção social e de inteligência estar
levemente entediado e ostentar uma leve, cínica, desconfiança sobre todas
as coisas: expressões faciais, gestos e comentários que informam, com ar de
superioridade, que “já vi de tudo nesse mundo”, que “sei que nada é o que
parece ser” e que “acho tudo isso que você leva tão a sério muito engraçado”.
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1. TER AUTOCONSCIÊNCIA
(DAVID FOSTER WALLACE)
David Foster Wallace proferiu em 2005 um discurso para uma turma que
colava grau no Kenyon College. Esse discurso, que passou a ser conhecido
pelo título “Isso é Água”, tornou-se talvez a obra mais popular e divulgada de
Wallace nas redes sociais. E a essência de sua mensagem trata da importân-
cia de aprendermos a pensar.
“Pensar”, algo que consideramos uma atividade automática e natural,
para Wallace é um processo a ser aprendido e praticado com consciência e
treino, principalmente durante as atividades cotidianas. Pensar seria, na ver-
dade, uma prática na qual podemos ser bem sucedidos ou falhar vergonho-
samente, e desse resultado dependeria nossa realização pessoal.
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Com essa proposta, Sartre pretende afastar a ideia popular de que a sua
filosofia é pessimista. Na verdade, ela é otimista e impulsiona o homem à
ação. “O covarde se faz covarde”, enquanto “o herói se faz herói”, sendo que
“existe sempre, para o covarde, uma possibilidade de não ser mais covarde”.
Porém, Sartre reconhece que a noção de que somos livres para construir
nosso destino é tão desafiadora que muitos a consideram um fardo, um peso
do qual buscam se livrar de todas as formas possíveis. E com isso abrimos as
defesas imunológicas da sociedade ao ataque de agentes nocivos.
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Toda vez que alguém deposita sua fé em uma doutrina espiritual segun-
do a qual forças insondáveis determinam o destino humano; toda vez que
um indivíduo decide levar a vida “no piloto automático”, seguindo as regras
sociais sobre o que ser e fazer sem questioná-las; toda vez em que alguém
abdica de sua própria liberdade pessoal para tornar-se militante a serviço de
uma ideologia ou líder político: em todas essas situações estamos comoda-
mente abdicando de uma importante parcela de nossa autonomia, como uma
espécie de preço que pagamos para viver sem a pressão da responsabilidade
sobre nosso destino.
A maioria dos seres humanos ingressa na vida adulta e decide seguir
o passo-a-passo tradicional que socialmente foi convencionado como cer-
to e normal: universidade, trabalho, casamento, filhos, casa própria, apo-
sentadoria e morte. Isso não é certo nem errado, o problema é fazer isso
sem reflexão, somente por pressão social. Isso nos torna vítimas perfeitas
dos aspectos mais adoecidos de nossa sociedade, como o hiperconsumismo.
Num mundo enfermo, um indivíduo começa seu caminho em direção à cura
quando reconhece que o seu destino é sua responsabilidade, e que precisa
construir um projeto pessoal a respeito do que fará e de quem será na vida.
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Para Viktor Frankl, a vida de cada ser humano é uma jornada espiritual
em busca da resposta à grande questão sobre o sentido dessa própria vida.
Mas tal resposta não está pronta, esperando que a descubramos: ela precisa
ser construída, e sua formulação não é feita por meio de explicações teóri-
cas, mas por meio de atos concretos. Assim, o caminho para uma sociedade
saudável dependeria de reconhecermos a importância de concebermos e im-
plementarmos coletivamente um sentido para a existência humana.
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(BERTRAND RUSSELL)
Reconhecer que precisamos aprender a amar e a pensar corretamente,
bem como admitir que nosso destino e o sentido de nossas vidas não estão
predeterminados, mas precisam ser diligentemente construídos por meio de
nossos atos, exige um tipo muito particular de humildade: a capacidade de
vivermos permanentemente na incerteza, com poucas convicções.
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“Ansiar pela certeza é algo inato na natureza humana, mas ainda assim
é um grande vício intelectual”, escreveu Russell. O fundamentalismo (não só
religioso, mas também político, em todas as suas facetas) tem por base uma
certeza dogmática e inabalável, que retoricamente ou emocionalmente seduz
os seus devotos.
Mas a incerteza não deve paralisar a ação, pois Bertrand Russell nos
previne do perigo de os mais inteligentes abrirem espaço na vida pública a
idiotas cheios de certezas equivocadas. “Agir com vigor, mesmo na falta de
absoluta certeza”, mas mantendo um elemento de saudável dúvida, ainda
que pequeno, em relação a cada assunto, é uma forma de evitar a um só
tempo o radicalismo, o fundamentalismo, a alienação e o preconceito.
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O EXPERIMENTO BARGH
O modo como você anda, o quão persistente você é, qual seu nível de
egoísmo e até mesmo o que você comprará no supermercado: sinto muito,
mas quem decide essas coisas banais e outras tantas mais importantes não
é você.
Em 1996, o psicólogo John Bargh realizou um experimento simples mas
de implicações perturbadoras. Ele dividiu voluntários em dois grupos e pe-
diu que formassem frases com palavras dadas por sua equipe. Mas um dos
grupos tinha uma peculiaridade: sem perceberem, algumas dessas palavras
eram relacionadas à velhice (esquecido, careca, ruga, etc). Em seguida, Bar-
gh pedia que todos os voluntários caminhassem até outra sala, mais distante,
informando que lá haveria mais testes, e cronometrava secretamente o tem-
po que levavam no percurso.
Por incrível que pareça, os voluntários do grupo com palavras associadas
à velhice caminhavam mais lentamente que os do outro grupo, como se fos-
sem idosos. Posteriormente, todos os voluntários disseram não ter percebido
as palavras relacionadas à velhice e tampouco notado algo de pouco natural
no seu próprio jeito de caminhar.
O teste foi repetido várias vezes, com rigor científico, e o resultado foi
sempre o mesmo.
Até então, a ideia de que mensagens subliminares (no sentido de infor-
mações apenas percebidas pelo inconsciente de alguém) fossem capazes de
realmente orientar o comportamento humano era uma espécie de “lenda ur-
bana” da psicologia. Mas, a partir do experimento de Bargh, novas experiên-
cias foram desenvolvidas para apurar a extensão desse efeito de mensagens
associativas no comportamento humano mais básico.
Em 2006, uma equipe de psicólogos publicou os resultados de um experi-
mento chamado The Psychological Consequences of Money (“As Consequên-
cias Psicológicas do Dinheiro”). Essencialmente, se tratava de um experimen-
to semelhante ao de John Barg, mas com palavras e símbolos relacionados
ao dinheiro, que os participantes não percebiam, mas eram repassadas ao
seu inconsciente.
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E COMO DESPERTAR?
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É por isso que se começarmos com uma compreensão de que qualquer
pequeno despertar diário, por menor que seja, já é uma vitória, estamos
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caminho certo. Seremos capazes de nos desculpar e compreender quando
nos apanharmos dormindo diante de uma situação, projetando no mundo
real o que é “sonho” de nossa mente, e seguiremos um trajeto suave, sem
atritos e obsessões, para um caminho de melhor qualidade de vida.
E qualidade de vida é uma palavra importante, pois deixa claro que, nes-
se tópico, o fundamental é ser prático e não filosófico. Não queremos chegar
a um estágio de superioridade metafísica – queremos é viver bem e reduzir
o sofrimento dos seres ao nosso redor. Isso porque ainda não respondemos
claramente como chegar a um maior despertar.
Ocorre que a segunda atitude mental saudável é não se deixar prender a
qualquer filosofia ou doutrina específica que nos sirva como forma de desper-
tar. Pois ao lado do risco da “obsessão”, também há o risco de “fanatização”
com uma das variadas doutrinas e técnicas que podem nos fornecer para
deixarmos de dormir acordados.
Porque há, sim, vários métodos capazes de servir como via para um maior
despertar. O grande truque é considerarmos todos esses métodos e doutrinas
como instrumentos, úteis dentro de determinados limites e contextos, e não
como verdades absolutas que trazem a panaceia para nossa situação.
E se adotarmos essa postura, praticamente quase todas as atividades de
desenvolvimento humano, da Yoga à prática de nosso esporte favorito, tor-
nam-se ferramentas para o despertar.
Dito isso, uma das práticas mais antigas e eficientes para começar a tri-
lhar o caminho de um maior despertar é a meditação. Por assim dizer, a ela
é uma “tecnologia de despertar” desenvolvida no Oriente. Há, na verdade,
vários tipos de meditação, e a experiência de cada uma delas é tão particular
que é como se fosse uma roupa que se ajusta à cada pessoa conforme suas
particularidades. Mas todas induzem, de uma forma ou de outra, nossa men-
te a ficar mais atenta aos seus processos internos e à relação com o mundo
externo.
E modernamente, arrisco dizer que o Ocidente desenvolveu moderna-
mente sua própria tecnologia de despertar, embora sobre ela ainda recaia
muita incompreensão e acusações injustas, em grande parte vindas de pes-
soas que jamais tomaram o cuidado de realmente estudá-la com a profundi-
dade e atenção que ela existe, e queconfundem o mapa com o terreno que
ele tenta representar. Trata-se da psicanálise, que se desenvolveu muito após
o passo inicial dado por Freud (e as principais críticas de leigos voltam-se
muito a esse fundador, ignorando o que foi revisto e reformulado ao longo
de um século) e que nos auxilia a compreender até onde a nossa percepção
do mundo circundante é afetada e mesmo falseada por elementos internos.
Existe, assim, um ponto de encontro entre a prática oriental da meditação
e o procedimento ocidental da psicanálise. Seja pelo treino da desindentifi-
cação entre a consciência e os pensamentos (meditação), seja pelo trabalho
de reconhecimento da representações emocionais/simbólicas (psicanálise),
ambas as experiências partem de pontos díspares (a meditação, do treino
da consciência; a psicanálise, do labor com o inconsciente) para atingir um
objetivo comum: a habilidade de distinguir o que há de real daquilo que há
de onírico.
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Todo mundo quer se sentir bem. Todo mundo quer viver uma vida des-
preocupada, feliz e suave, quer apaixonar-se e ter relacionamentos e encon-
tros sexuais maravilhosos, parecer perfeito e ganhar dinheiro e ser popular
e respeitado e admirado e um grande fodão ao ponto de as pessoas abrirem
caminho como se fossem o Mar Vermelho quando você caminha pela sala.
Todo mundo gostaria disso – é fácil gostar disso.
Se eu perguntar a você “o que você quer de sua vida?” e você responder
algo como “eu quero ser feliz e ter uma grande família e um trabalho que eu
goste”, isso é tão genérico que nem mesmo significa alguma coisa.
Uma questão mais interessante, uma questão que talvez você nunca te-
nha cogitado antes, é qual a dor que você quer na sua vida? Pelo que você
deseja sofrer? Porque essa questão parece ser muito mais determinante para
o que acontecerá na sua vida.
Todo mundo quer um trabalho sensacional e independência financeira –
mas nem todo mundo quer sofrer durante 60 horas de jornada de trabalho
por semana, em longos trajetos, diante de uma papelada aborrecida, en-
frentando a arbitrária hierarquia das empresas e os estritos limites de um
cubículo infinitamente infernal. As pessoas querem ser ricas sem o risco,
sem o sacrifício, sem o adiamento da gratificação que são necessários para
acumular riqueza.
Todo mundo quer ter ótimas relações sexuais e incríveis relacionamen-
tos – mas nem todo mundo quer enfrentar as conversas difíceis, os silêncios
constrangedores, os sentimentos magoados e o psicodrama necessários para
chegar até lá. E então as pessoas se acomodam. Eles se conformam e ima-
ginam “E se fosse assim?” por anos e anos até a questão “E se fosse assim?”
transforme-se em “Isso foi tudo?” E quando os advogados vão para casa e o
cheque da pensão alimentícia está nos correios eles perguntam “Para que foi
isso?” – e se foi apenas para baixar suas expectativas e padrões nos últimos
vinte anos, então para que foi isso?
Porque felicidade requer esforço. O positivo é efeito colateral de lidar com
o negativo. Você pode evitar as experiências negativas só até elas retorna-
rem rugindo de volta à vida.
Na essência de todo comportamento humano, nossas necessidades são
mais ou menos idênticas. É fácil lidar com experiências positivas. São as ex-
periências negativas que todos nós combatemos. Portanto, o que recebemos
da vida não é determinado pelas boas sensações que aspiramos, mas pelas
más sensações que buscamos e somos hábeis de tolerar para que nos levem
até as boas sensações.
*Tradução de The most important question of your life, autorizada pelo autor.
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U m dia, quando meu irmão tinha dezoito anos, ele valsou até nossa
sala de estar e orgulhosamente anunciou para mim e nossa mãe que um dia
ele seria um senador. Minha mãe provavelmente deu a ele um tratamento do
tipo “Que bom, querido”, enquanto eu com certeza estava distraído com uma
tigela de cereais ou algo do tipo.
Mas, por 15 anos, esse propósito moldou todas as decisões na vida de
meu irmão: o que ele estudou na faculdade, onde ele escolheu viver, com
quem ele se relacionou e mesmo o que ele fazia em suas férias e nos finais
de semana.
E agora, quase metade do tempo de uma vida depois, ele é consultor de
um grande partido político na sua cidade, além de ser o mais jovem juiz no
Estado. Nos próximos breves anos, ele espera candidatar-se a um cargo pú-
blico pela primeira vez.
Não me entenda mal. Meu irmão é um abobado. Essa história basicamen-
te nunca aconteceu.
A maioria de nós não tem nenhuma pista sobre o que quer fazer de suas
vidas. Mesmo depois de terminar a faculdade. Mesmo depois de conseguir
um emprego. Mesmo depois de começar a ganhar dinheiro. Entre 18 e 25
anos, mudei meu projeto sobre qual seria minha carreira mais vezes do que
troquei de cuecas. E mesmo após ter meu negócio, não foi até ter 28 que eu
claramente defini o que eu desejava para a minha vida.
É provável que você seja como eu e não tenha pista alguma sobre o que
você quer fazer. É uma luta que quase todos os adultos enfrentam. “O que
quero fazer na minha vida?” “O que me deixa apaixonado?” “O que sou pés-
simo em fazer?” Frequentemente recebo emails de pessoas com quarenta e
cinquenta anos que ainda não tem qualquer pista sobre o que querem fazer
de suas vidas.
Parte do problema é o conceito de “propósito de vida”: A ideia de que
cada um de nós nasceu com um grande propósito e que agora é a nossa
missão cósmica descobrir qual ele é. Esse é o mesmo tipo de lógica idiota
que costuma justificar coisas como cristais espirituais ou que seu número de
sorte é 34 (mas apenas nas terças e durante luas cheias).
Mas aqui está a verdade. Nós existimos neste planeta por algum período
indeterminado de tempo. Durante esse tempo nós fazemos coisas. Algumas
dessas coisas são importantes. Outras não tem importância. E aquelas que
são importantes dão à nossa vida significado e felicidade. As coisas sem im-
portância basicamente desperdiçam e consomem nosso tempo.
Então, quando as pessoas perguntam “O que eu deveria fazer da minha
vida?” ou “Qual o propósito da minha vida?”, o que estão realmente pergun-
tando é: “O que posso fazer com meu tempo que seja importante?”
*Tradução de 7 strange questions that help you find your life purpose, autorizada pelo autor.
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Antes que você seja capaz de ser bom em algo e fazer alguma coisa
importante, você precisa, em primeiro lugar, ser péssimo em algo e não ter
nenhuma pista sobre o que está fazendo. Isso é bem óbvio. E, para ser pés-
simo em algo e não ter nenhuma pista sobre o que está fazendo, você pre-
cisa envergonhar a si mesmo de alguma forma, de regra repetidamente. E
a maioria das pessoas tenta evitar envergonhar a si mesmo, principalmente
porque isso é uma merda.
Aí está. Devido à natureza transitiva da grandiosidade humana, se você
evita qualquer coisa capaz de potencialmente lhe envergonhar, então você
jamais acabará fazendo algo que sente ser importante.
Sim, parece que mais uma vez tudo tem a ver com vulnerabilidade.
Neste exato momento, há alguma coisa que você deseja fazer, alguma
coisa que você pensa em fazer, uma coisa que você fantasia em fazer, mas
ainda assim você não faz nada. Se você tem seus motivos, sem dúvida. E
você repete a si mesmo esses motivos ad infinitum.
Mas que motivos são esses? Porque eu posso dizer a você agora mesmo
que se esses motivos estão baseados naquilo que os outros vão pensar, então
você está ferrando com sua vida em grande estilo.
Se seus motivos são algo como “Eu não posso iniciar meu negócio porque
passar tempo com meus filhos é mais importante para mim” ou “Jogar Star-
craft todo dia provavelmente interferiria com minha música, e minha música
é mais importante para mim” então OK, seu motivo parece ser bom.
Mas se seus motivos são como “Meus pais odiariam isso” ou “Meus ami-
gos ririam de mim” ou “Se eu fracassar, vou parecer um idiota”, então é pro-
vável que você na verdade esteja evitando algo com que realmente importa,
porque importar-se com isso é o que mais apavora você, e não o que sua mãe
ou o José da porta ao lado diria.
Viver a vida evitando a vergonha é como viver a vida com sua cabeça
enfiada na areia.
As grandes coisas são, por sua própria natureza, únicas e pouco con-
vencionais. Portanto, para realizá-las precisamos ir contra a mentalidade de
rebanho. E fazer isso é apavorante.
Abrace a vergonha. Sentir-se idiota é parte do caminho para realizar algo
importante, algo significativo. Quanto mais a principal decisão de sua vida lhe
assustar, mais provável é que você precise tomá-la.
Caso você não tenha visto as notícias mais recentes, o mundo tem alguns
problemas. E por “alguns problemas” o que quero dizer é “tudo está fodido e
nós todos vamos morrer”.
Eu já falei disso antes, e as pesquisas também sustentam isso: para vi-
vermos uma vida feliz e saudável, nós precisamos abraçar valores que sejam
maiores do que o nosso próprio prazer ou satisfação.
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A maioria de nós não gosta de pensar sobre a morte. Isso nos apavora.
Mas pensar sobre sua própria morte tem surpreendentemente um monte de
vantagens práticas. Uma dessas vantagens é que isso força você a zerar sua
escala de prioridades na vida e a eliminar o que é só distração frívola.
Quando eu estava na faculdade, costumava caminhar e perguntar às pes-
soas: “Se você tivesse um ano para viver, o que você faria?” Como você pode
imaginar, eu não era popular nas festas. Um monte de gente dava respostas
vagas ou aborrecidas. Alguns drinks quase eram jogados em cima de mim.
Mas isso fazia as pessoas realmente pensarem sobre suas vidas de uma for-
ma diferente e a reavaliarem quais eram suas prioridades.
Qual será o seu legado? Que histórias as pessoas contarão sobre você
quando se for? O que seu obituário diria? Haveria algo a ser dito, enfim? Se
não houvesse, o que você gostaria que constasse nele? Como você pode tra-
balhar nessa direção hoje?
E novamente, se você fantasia sobre seu obituário dizendo um monte
de coisas maravilhosas que impressionam um monte de pessoas aleatórias,
você está falhando aqui.
Quando as pessoas sentem que estão sem senso de direção, sem pro-
pósito de vida, é porque não sabem o que é importante para elas, elas não
sabem quais são seus valores.
E quando você não sabe quais são seus valores, então está essencial-
mente adotando os valores dos outros e vivendo as prioridades dos outros ao
invés das suas prioridades. Isso é um bilhete sem volta para relações pouco
saudáveis e eventualmente para a miséria.
Descobrir o “propósito” da vida essencialmente se resume a encontrar
uma ou duas coisas que são maiores do que você e maiores do que aqueles
ao seu redor. E para descobri-las você precisa sair de sua poltrona e agir, e
arranjar tempo para pensar além de si mesmo, pensar maior do que você
mesmo e, paradoxalmente, imaginar um mundo sem a sua presença.
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*Tradução de 5 things that should be taught in every school, autorizada pelo autor.
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1. FINANÇAS PESSOAIS
2. RELACIONAMENTOS
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3. LÓGICA E ARGUMENTAÇÃO
Essas afirmações são falsas, e ainda assim você vê gente afirmando coi-
sas do tipo como se fossem fatos ou apresentando-as em discussões como se
fossem argumentos válidos, de modo que se tornam o fundamento de vieses
de raciocínio e preconceitos de muita gente.
Dia desses eu li aquele que é possivelmente o artigo mais idiota que vi em
meses. Ele tentava fundamentar que a objetificação das mulheres é errada,
mas a objetificação sexual dos homens não. Por quê? Porque os homens não
são estuprados tão frequentemente quanto as mulheres. Isso é o queijo suíço
dos buracos lógicos e das falácias.
Por que é importante? A questão é que somos vítimas dessas falácias
lógicas o tempo todo. E, em geral, de modos sutis que passam desaperce-
bidos por nós. E frequentemente essas falácias dizem respeito a decisões
importantes e a crenças que têm consequências marcantes em nossas vidas.
Elas são manipuladas em campanhas eleitorais (X é bom em fazer dinheiro;
o governo precisa de dinheiro; portanto X será bom para o governo), temas
relativos a direitos civis, decisões morais e éticas (José mentiu para mim,
portanto tenho direito de mentir para José), conflitos pessoais e por aí vai.
Essas falácias lógicas infiltram nossas vidas fazendo com que tomemos
decisões estúpidas. E são decisões estúpidas sobre nossa saúde, nossos rela-
cionamentos, nossa carreira e basicamente sobre tudo o mais.
O problema é que na escola raramente aprendemos como pensar direito
ou resolver problemas adequadamente. Ao invés disso, aprendemos a como
copiar ou memorizar as coisas – e logo depois esquecemos tudo [9]. Isso
mal nos prepara para a complexidade da vida adulta, principalmente para
a vida adulta do século 21, que é incrivelmente complexa. Eu suspeito que
talvez o retrocesso intelectual que estamos atualmente vendo nos movimen-
tos religiosos fundamentalistas e em outras manifestações intelectualmente
miseráveis vêm dessa completa falta de preparo para o complicado mundo
pós-moderno.
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4. AUTOCONSCIÊNCIA
O currículo incluiria: sei o que você está pensando agora: “como você
espera ensinar a autoconsciência?” Mas sério, gente, isso pode ser ensinado
e praticado como qualquer outra coisa.
Autoconsciência é a habilidade de pensar sobre as coisas que você pen-
sa. É a capacidade de ter sentimentos sobre seus sentimentos. Ter opiniões
sobre as suas opiniões.
Por exemplo, eu posso pensar algo como “Odeio todas as pessoas chama-
das Antônio, pessoas chamada antônio são más”. Esse é um clássico exemplo
de intolerância, uma simples canalização de ódio orientada por um estereó-
tipo superficial. E se você não tem autoconsciência, você vai levar esse pre-
conceito a sério.
Mas se alguém é autoconsciente, essa pessoa irá capturar esse pensa-
mento e questioná-lo. “Por que odeio pessoas que se chamam Antônio? Tal-
vez porque meu ex-namorado tinha esse nome? Talvez porque meu pai se
chame Antônio? Estou talvez direcionando meu ódio pelos Antônios da minha
vida para todos os Antônios do mundo? Eu fico envergonhada de como sou
enraivecida. Eu devia procurar um psicólogo.”
Isso sou eu pensando sobre meus pensamentos. Sou eu tendo sentimen-
tos sobre meus sentimentos. Sou eu tendo opiniões sobre minhas opiniões.
Isso é autoconsciência. E a maior parte das pessoas passa a maior parte de
suas vidas com muito pouca autoconsciência.
Mas isso pode ser ensinado, como tudo o mais, por meio da prática. Ba-
sicamente tudo que exige que você pense sobre aquilo que está pensando
estimula o desenvolvimento da autoconsciência. Isso pode ser feito através
da meditação, da terapia, de um diário ou apenas tendo ao seu lado alguém
muito íntimo que aponte seus vieses e preconceitos com consistência.
Por que é importante: pesquisas demonstram que um elevado grau de
autoconsciência traz benefícios, bem, para quase todos os aspectos das nos-
sas vidas. Pessoas que desenvolvem habilidades metacognitivas planejam
melhor, são mais disciplinadas, mais focadas, mais atentas às suas emoções,
são melhores tomadoras de decisões e mais capazes de antecipar problemas
em potencial.
Em tudo o que fazemos na vida, só tem uma coisa que fica conosco do
início ao fim: nossa mente. Ela é o grande filtro. Tudo o que fazemos e tudo o
que acontece conosco é filtrado pela nossa mente e pelos nossos pensamen-
tos. Portanto, precisamos investir tempo e energia para compreendermos ao
máximo como funciona a nossa mente, pois isso afeta tudo o mais.
Talvez você seja precipitado em se irritar ou julgar as pessoas. Talvez
você seja despreocupado demais com as coisas. Talvez você sofra de ansie-
dade de tantas formas que isso esteja atrasando a sua vida. Talvez você seja
impulsivo e um especialista em se autorrecriminar.
Seja o que for, precisamos identificar nossas tendências e daí aprender
como monitorá-las, para a seguir controlá-las.
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5. CETICISMO
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Pense em algo da sua vida que você queria muito fazer mas não conse-
guiu. Alguma coisa importante. Seja por você não ter chegado a tentar, por
ser tímido demais para fazer ou por ter tentado mas falhado espetacularmen-
te. Relembre em sua mente a maior derrota de sua vida, quem sabe você
esteja bem no meio dela agora.
É desnecessário dizer que todos nós fracassamos. Isso é óbvio. Claro,
alguns de nós são melhores nisso que outros, mas é também algo óbvio. E
ainda há aqueles que enfileiram momentos de frustração ao longo de toda
sua vida e fracassam de uma forma tão consistente que é algo que se aproxi-
ma da arte. Nos anos que passei ajudando os outros a superar seus desafios
pessoais, frequentemente me perguntava qual foi a principa causa dos fra-
cassos que testemunhei.
Algumas pessoas têm problemas com seus relacionamentos, alguns têm
problemas com dinheiro, outros problemas de ansiedade, etc. Mas o maior
problema que observei em muitas dessas pessoas não era algo específico
dos relacionamentos, dinheiro ou confiança. É fácil descobrir como convidar
alguém para sair, como começar um negócio ou como simplesmente fazer
algo mesmo que sinta medo. Lidar com seu medo do abandono, ou com seus
hábitos financeiros nocivos, ou com suas crenças autodepreciativas sobre o
que os outros pensam de você? Isso é estar bem mais envolvido.
É provável que uma profunda luta em uma área de sua vida acabe afe-
tando todos os outros aspectos de sua vida. Os motivos que causam uma
derrota não tem qualquer limite. Os comportamentos e pensamentos que
sabotam você em uma área de sua vida irão lhe perseguir em outras áreas.
Essa hesitação em convidar alguém a sair provavelmente influencia a sua
incapacidade de mudar-se para outra cidade ou procurar um novo emprego,
a sua timidez perante colegas mais dominadores e o relacionamento passi-
vo-agressivo que mantém com seus familiares.
Quando se confronta com as maiores oportunidades da vida, a maioria de
nós se caga. E então elaboramos uma série de estratégias para evitar a dor e
a preesão inerentes a tentar alcanças nossos sonhos. Abaixo seguem 10 das
estratégias mais comuns para relutarmos. Vamos começar com uma análise
mais superficial e depois vamos abrir caminho até as profundezas de nossa
mente. Leia e chore.
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É um simples fato da vida: se você quer fazer algo incrível, algo que faz
você se destacar acima do resto, então você tem que se sentir confortável
sendo diferente do resto. As pessoas vão pensar que você é estranho, louco,
egoísta, arrogante, irresponsável, detestável, estúpido, desrespeitoso, gor-
do, inseguro, feio, raso, etc. Aqueles mais próximos a você, muitas vezes,
serão os mais severos. Se você tem autodefesas fracas ou não tem confiança
em suas próprias ideias e sonhos, então não vai muito longe.
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Levou mais de 35 anos até que Marlantes conseguisse publicar seu livro
– mais do que a metade de sua vida. Ele reescreveu o manuscrito seis vezes.
Durante as duas primeiras décadas, os editores mal conseguiam o ler, quem
dirá o rejeitar.
A maioria de nós desiste rápido de algo pelo qual sente paixão. E qual-
quer um que teve sucesso tem uma história de esforço e perseverança para
contar. Como diz o velho clichê, nada de valor vem fácil.
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Sou um solitário nato. E eu também sou maníaco por controlar meus pro-
jetos. Seja insegurança, obsessão ou simples arrogância, eu tenho proble-
mas em deixar as pessoas influenciarem aquilo no qual estou trabalhando ou
aquilo que me apaixona. É algo contraprodutivo. Isso uma vez afundou mi-
nhas aspirações de me tornar um músico profissional (uma área basicamente
formada quase que inteiramente de redes de contato) e com certeza aban-
donei algumas das oportunidades que surgiram em meu empreendimento na
internet por causa da minha hesitação em entrar em contato e me conectar
com outras pessoas que poderiam me ajudar.
Costuma-se dizer que 66% das pessoas contratadas para um emprego
conhecem alguém dentro da empresa que as contratou. Mas mesmo no mun-
do não-profissional, o isolamento pode fazer você desmoronar rapidamente.
Ao invés de falhar, você simplesmente entra em depressão. Construir relacio-
namentos sociais e emocionais saudáveis depende da habilidade de conhecer
pessoas e conectar-se com elas de uma forma significativa. As pesquisas
mostram que viver sem contato social regular é tão prejudicial à saúde como
fumar cigarros.
Passagem garantida para ser um idiota: tentar ter razão ao invés de ten-
tar ter humildade. Não importa o que seja, se você investe mais em discutir
e debater seu ponto de vista com quem está tentando ajudar do que investe
em aprimorar-se, então você definitivamente vai fracassar. E do alto de seus
argumentos sabichões, você ainda assim é estúpido demais para perceber
isso.
Para ser bem sucedido em alguma coisa, uma cadeia constante de opini-
ões precisa ocorrer: tentar algo -> receber opiniões e resultados -> aprender
com as opiniões e resultados -> tentar algo diferente. Pessoas que são obce-
cadas em discutir sobre o porquê elas têm razão (apesar de não funcionar)
estão efetivamente quebrando a cadeia ao não aceitar opiniões sobre o que
está fazendo. Portanto, elas nunca vão mudar.
Não quer dizer que todo mundo deveria sempre ouvir conselhos de todo
mundo, mas pelo menos você deveria saber aceitar opiniões sobre seu tra-
balho, acredite você ou não que são relevantes, e não ficar tentando discutir
como se você sempre tivesse razão em tudo.
As pessoas que sofrem desse problema tendem a ser altamente inteli-
gentes e extremamente inseguras. Essa é uma combinação prejudicial, pois
quanto mais uma pessoa é inteligente, mais ela é capaz de racionalizar suas
bobagens e encontrar justificativas para elas, e mais ela usará esse mecanis-
mo de defesa para proteger seu ego frágil.
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Sei que é tentador culpar algum fator externo por seus problemas, insistir
que era impossível, que não foi culpa sua, e que você não poderia ter feito
nada para mudar isso. Mas para resolver os problemas na sua vida, você
precisa ter poder sobre eles. Você não pode ter poder sobre aspectos de sua
vida ao menos que assuma responsabilidade sobre eles. Portanto, se você
não assume responsabilidade pelo que ocorre a você, você fracassa.
Há várias situações na vida que parecem completamente injustas e insu-
portáveis, como se Deus tivesse decidido chutar o pau da sua barraca, e não
há nada que você possa fazer a respeito.
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Muitos (ou a maioria) dos itens acima na verdade são aspectos super-
ficiais de uma causa mais profunda: acreditar que você não merece aquilo
que quer. Muitos de nós, lá no fundo, têm crença e ideias arraigadas sobre si
mesmas que não são muito lisonjeiras. Talvez você tenha se machucado um
pouco enquanto crescia, talvez seus pais ou professores tenham dito em al-
gum momento que você não conseguiria realizar nada, talvez você tenha sido
punido por seus coleguinhas por ser mais inteligente que eles. Seja o que for,
algo aconteceu. E como resultado alguma coisa dentro de você faz com que
se sinta desconfortável com a ideia de conquistar grandes realizações.
O empreendedor e consultor de negócios Sebastian Marshall escreveu em
seu livro Ikigai:
“Noite passada eu estava conversando com um amigo e disse:
“se você fizer isso, estou certo que conseguirá seu primeiro cliente
dentro de noventa dias”. E minha orientação deveria ser a principal
coisa de sua vida nos próximos noventa dias, mas provavelmente
funcionaria.
Seu principal objetivo naquele momento era a total independên-
cia financeira, e eu formulei um plano que o levaria até seu objetivo.
Mas ele o seguiria? Perguntei.
Ele hesita e responde: “Não, não vou”.
– “Essa é a pergunta que vale um milhão de dólares: por que
não vai?”
– “Eu não sei. Eu nem mesmo gosto de pensar nisso, pra falar a
verdade, mas vou tentar. Eu não sei. Medo? Eu tenho que confron-
tar meu potencial e o fato de que não estou vivendo como gostaria
de viver? Isso está certo? Eu me sinto despreparado? Eu não acho
que mereça? Eu acho que tenho que estudar mais antes? Eu não
sei.”
Por que as pessoas não realizam seus planos? Bem, eu orientei
gratuitamente pessoas sobre como ganhar dinheiro, elaborei um
plano claramente exequível e bom, ofereci para ajudá-las a imple-
mentar. Mais ou menos oitenta por cento delas não aceitou.”
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Epicuro
Esse é um trecho do diário. Marco Aurélio exorta-nos a sermos cautelo-
sos com nossos desejos. É preciso saber o que se deseja, pois a expectativa
de realizá-los gera sofrimento, uma vez que os desejos nunca cessam e,
portanto, podemos passar a vida sendo seus reféns. Portanto, é bom que
desejemos apenas aquilo que podemos ter. E reconhecer isso com humildade
exige sabedoria. Tal conselho serviria tanto para o desejo referente a bens
quanto a prazeres sensoriais. Devemos ser comedidos em relação a eles. O
objetivo, além de viver bem durante a única vida que o homem possui, seria
conquistar uma morte tranquila.
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DENUNCIANDO O STALINISMO
O escritor inglês, um comunista trotkista convicto, participou de guerras e
se expôs publicamente a favor do regime comunista, mas sua escolha política
não embaçou sua capacidade crítica, tendo sido sua obra proibida em diver-
sos países por conta da sutileza e força de sua denúncia do mito e da distopia
stalinista que a URSS tinha se tornado.
O mais bizarro disso tudo é que na própria Inglaterra a obra de Orwell foi
boicotada, pois a partir da Segunda Guerra Mundial até o fim da Guerra Fria
(termo cunhado por Orwell!), o bloco socialista e capitalista passariam a viver
uma relação de amor e ódio que poderia ser abalada a qualquer momento.
A crítica histórica e ideológica clara explica parte do rebuliço que A Revo-
lução dos Bichos causou, mas não acho que dê conta de todo o caso. Além de
falar sobre um grupo de pessoas e um momento muito específico da História,
a obra também faz alusão – mesmo involuntariamente – a comportamentos
humanos antigos e arraigados. Isso porque a própria utopia comunista no
século XX esbarrava frontalmente nesse aspecto fundamental: o desejo de
status (que também é título de um livro muito interessante do filósofo Alain
de Botton).
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AS RAÍZES DA DESIGUALDADE
Logo no início da trama, uma égua muito vaidosa é repreendida por ques-
tionar se poderia continuar usando suas fitinhas de cabelo após a revolução.
É dito que fitinhas no cabelo eram coisa de humanos, marcas da exploração
e deviam ser extintas, pois animais andam sem adereços, e em 4 patas.
Isso tem profundas raízes na nossa realidade, pois em geral a esquerda
tem em mente sempre essas distinções entre o que seriam marcas de um
mundo burguês e o que seriam os sinais legítimos de um mundo feito para
os populares.
O mundo capitalista fomenta mais a ideia de indivíduo do que de coletivi-
dades, pois o indivíduo é o que interessa ao sistema. O motor que estimula o
consumo é basicamente a noção de que somos seres separados dos outros, e
como tais, precisamos nos distinguir materialmente deles. Daí nasce a moda,
o “consumo, logo, existo”.
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os valentões
DA JUSTIÇA SOCIAL
aristotelis orginos*
*Tradução de Social Justice Bullies: The Authoritarianism of Millennial Social Justice, autorizada pelo
autor. Todas as imagens que ilustram este texto são verdadeiras e foram retiradas de grupos de ativistas
brasileiros em redes sociais.
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Essa visão foi apoiada pela advogada e jornalista Rachel Sklar, que afir-
mou, para registro da posteridade, que considera “as mulheres que falam
de suas próprias experiências de estupro” automaticamente “críveis”, e que
qualquer um que faz perguntas a elas caracteriza-se como um apologista
do estupro. No Twitter, por sua vez, a jornalista Amanda Marcotte concluiu
que qualquer pessoa que tenha dúvidas sobre um determinado relato de
estupro está envolvida numa tentativa covarde de demonstrar que histórias
de estupro nem sempre são verdadeiras, enquanto que Sally Kohn, da CNN,
indignou-se com Jonah Goldberg quando pediu mais provas. Talvez o melhor
exemplo da presunção de que “todos os céticos são heréticos” vieram da no-
tavelmente desagradável Anna Merlan, que recompensou Robby Soave por
seu trabalho investigativo atribuindo-lhe um rótulo: “idiota.”
Grande parte dessa retó-
rica vem da idéia de que há
uma cultura do estupro ge-
neralizada nas universidades
de todo o país que deve ser
erradicada; mais exatamen-
te, haveria manifestações
do patriarcado opressor das
mulheres que seriam social-
mente e institucionalmente
endossadas. As ideias apre-
sentadas no trecho acima
procuram resolver isso atra-
vés de algo que chamam de
justiça social. Mas em que
mundo essas afirmações são
progressistas e representati-
vas da justiça social?
No artigo “Não importa o que Jackie disse, devemos em geral acreditar
em alegações de estupro”, Zerlina Maxwell sugere que deveríamos geral-
mente dar o equivalente a um cheque em branco para alguém que apresenta
uma acusação de estupro. Isso não é justiça e certamente não é a justi-
ça social também. É uma perversão não-progressita da justiça. Sir William
Blackstone é famoso pelo que é conhecido como a Regra de Blackstone: “É
melhor dez pessoas culpadas escaparem do que um inocente sofrer.” Este
axioma é uma fundação dos modernos sistemas de justiça em todo o mun-
do. É uma regra que presume a inocência; condenar alguém com base numa
acusação em virtude da identidade ou da situação de oprimido do acusador
é uma perigosa estrada morro abaixo. Ela corrói o princípio mais essencial
do progressismo: o devido processo legal.
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Para mulheres não-estudantes (7,6 por mil) do que para estudantes (6,1
por 1.000): “Usar estatísticas deliberadamente enganosas em uma cam-
panha maquiavélica, na qual a erradicação dos ataques sexuais em campi
universitários depende da má interpretação de dados e da eliminação do de-
vido processo legal, colabora mais para nos desviarmos de conversas sobre
ataques sexuais nas universidades do que um debate produtivo e legalmente
responsável nos desviaria.”
Tomemos também como exemplo a estatística sobre diferença salarial
citada em todos os lugares, desde aulas de sociologia até discursos presi-
denciais: de que as mulheres recebem 70% menos do que os homens. A
verdade é que essa é, de novo, uma estatística enganosa, que tenta aplicar a
nível nacional os dados agregados a nível individual. A revista Time informa
que “essa disparidade salarial é simplesmente a diferença entre as médias
dos ganhos de todos os homens e mulheres que trabalham em tempo inte-
gral. Ele não leva em conta diferenças de ocupações, posições, educação,
estabilidade no emprego ou horas trabalhadas por semana. Quando esses
fatores são considerados relevantes, a diferença salarial estreita a ponto de
desaparecer”. Isso é corroborado por uma quantidade aparentemente infini-
ta de fontes como o Wall Street Journal e Abigail Hall, que ironiza que “você
não gostaria de comparar os rendimentos de professores do ensino funda-
mental com os de acadêmicos com doutorado e reclamar de que há uma
diferença salarial entre físicos e professores secundaristas”. Note-se que há
cinco fontes só neste parágrafo.
Usar estatísticas enganosas para empurrar uma agenda não faz nenhum
bem a ninguém. Isso impede o progresso, na tentativa de apoiar uma causa
legítima com fundamentos de má qualidade. Fundamentos que, com o tem-
po, entrarão em colapso – e o progressismo com eles.
Aqui está o problema – muitos leitores ficarão indignados só pelo fato
de que estou apresentando essas estatísticas sob um ponto de vista nega-
tivo. Afinal, por que eu faria tal coisa senão para retratar o feminismo de
um modo feio ou para minimizar o problema do estupro nas universidades?
Como um homem heterossexual, presume-se que estou fazendo isso não
em nome da honestidade acadêmica de confirmar os fatos, mas por razões
sexistas, ou porque sou um apologista do estupro, ou porque acho que as
mulheres estão “pedindo por isso”.
Mas aqui está o detalhe – quem eu sou não tem (ou não deveria ter)
qualquer influência sobre os fatos. O problema com esse tipo de defesa da
justiça social moderna é que a identidade de uma pessoa (raça, classe, gê-
nero, etc.) torna-se o princípio e o fim de toda a sua capacidade de ter um
certo ponto de vista. Um defensor da justiça social moderna pode desqualifi-
car uma opinião simplesmente porque ela é dita ou escrita por alguém de um
grupo que é considerado opressor. É uma falácia lógica conhecida como ad
hominem, na qual alguém ataca uma pessoa que apresenta um argumento
ao invés de atacar o próprio argumento. Mas essa falácia lógica tornou-se a
principal arma da justiça social da Geração Y. É a morte da vida acadêmica,
do pensamento crítico e da honestidade intelectual. No entanto, essa é a
principal forma de se comportar nas universidades em todo o país.
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CONCLUSÃO
Esse longo artigo poderia ir muito mais longe. Eu poderia falar sobre
como a segmentação das pessoas em grupos baseados na identidade política
é uma ideologia regressiva e passional que agride a verdadeira diversidade.
Eu poderia falar sobre como a proposta de “diferentes mas iguais” acaba não
se tornando uma coisa boa, pois a esquerda a reformula e a chama de “es-
paços de segurança”.
O fato é que esse tipo particular de estratégia da justiça social é destru-
tivo para a academia, a honestidade intelectual, o verdadeiro pensamento
crítico e a mente aberta. Já o vemos ter um impacto profundo na forma como
as universidades agem e como eles abordam o currículo.
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Mas o fato que importa é o seguinte: aqueles que não estão dis-
postos a, sob a proteção moral do progressismo e da justiça social,
engajar-se em diálogos produtivos, abertos e mutuamente críticos
com pessoas que discordam não são progressistas, não são defenso-
res da justiça social; eles são os valentões da justiça social.
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