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TRABALHO DE LITERATURA BRASILEIRA II

MARINA FERREIRA SILVA LIMA – Nº USP 8569419

As expressões da culpa, abandono e solidão nos laços familiares


de “Feliz Aniversário” e “A terceira margem do rio”

Neste presente trabalho, irei estabelecer diferenças e semelhanças entre os contos “Feliz
Aniversário”, de Clarice Lispector – publicado em 19999 no livro Laços de Família – e
“A terceira margem do Rio, de Guimarães Rosa – publicado em no livro Primeiras
Estórias.

Ricardo Puglia descreve a literatura comparada em uma jornada na qual os pontos de


cruzamento são a base de construção de pesquisa, e pertinente à minha brevíssima
jornada, descreve a essência da lógica do meu trabalho.

“Cada uma das duas histórias é contada de maneira diferente. Trabalhar com duas
histórias significa trabalhar com dois sistemas diversos de casualidade.
Os mesmos acontecimentos entram simultaneamente em duas logicas narrativas
antagônicas, os elementos essenciais de um conto têm dupla função e são utilizados de
maneira diferente em cada uma das histórias”.1

De início, nota-se diferenças na relação familiar entre os dois contos. Em “A terceira


margem do rio”, Guimarães aponta o espectro do abando do pai em busca da sabedoria
e remete ao leitor à constante busca pelo significado da vida e da liberdade. Sente-se um
desconforto contínuo a medida em que a personagem principal se recusa a largar sua
jornada e regressar à sua família. Alfredo Bosi (1974), descreve em “Situações e formas
do conto brasileiro contemporâneo” que “...também há a relação dramática com o
passado, reino da posse e da memória e da perda. O convívio da consciência com a
memória tem produzido um intimismo de situações novas algumas ousadas e

1
Em Teses sobre o conto – pag. 3
desafiadoras”, 2 delineando perfeitamente a narrativa de Guimarães, numa procura de
atingir questões metafísicas e realidades atemporais.

Já em “Feliz aniversário, Clarice estabelece uma dinâmica familiar irônica e involucra


em ignóbil mácula e desdém. O nível de toxicidade e impolida displicência com a figura
da matriarca, D. Anita ultrapassa os limites da insensibilidade e deixa o leitor incrédulo
de tamanha indelicadeza. Bosi (1974) também descreve os desencontros familiares e a
aspereza cotidiana como cerne da questão do conto clariciano quando diz que “quando
já não há uma firme rede mitológica de base, perdidas ou estancadas que foram as
fontes da sabedoria tradicional, o espirito paira inquieto sobre as coisas e as pessoas e,
não sabendo que sentido lhes atribuir, faz da vida uma constante perplexidade. A que
não responde o discurso psicológico simples, julgado e rotineiro, falseador. Então é
preciso descobrir, se não reinventar, o caminho que vai do eu narrativo aos objetos. ” 3

O sequestro momentâneo, presente em ambos os textos, caracterizado por um estilo


baseado na intensidade e na tensão, no qual os elementos formais e expressivos se
ajustem, sem a menor concessão, à índole do tema, e lhe deem a forma visual a auditiva
mais penetrante e original”, tornando o texto singular e firmado em um determinado
contexto espaço-temporal (Cortázar 1993)4. A tensão conflitiva, citada por Nunes
(1989)5 como núcleo de uma crise interior e marcada em Clarice, neste conto específico,
mantem-se do início ao fim e se intensifica diante da forma dos elementos trazidos no
texto.

Ao que atinge a escolha do título dos contos, ambos têm a intenção de instigar o leitor e
a sua leitura para que descubra o significado do mesmo dentro da narrativa – mesmo
não tendo sido citado (como no caso de Terceira Margem do Rio), ou dito pelas
personagens (como em Feliz aniversário, apesar de ter sido dito “Happy Birthday” pelos
netos de Anita, dos diversos “Viva a Dona Anita! ” e de terem faixas com
parabenizações, o “Feliz Aniversário’ não foi diretamente citado no conto.) Na
diligência de procurar dentro do texto algo que remeta ao título, os autores obrigam o
leitor a ultrapassar o episódio “comum” e identificar através de elementos do texto as “

2
Em Situação e formas do conto brasileiro contemporâneo em O conto brasileiro contemporâneo – pg.10
3
Em Situação e formas do conto brasileiro contemporâneo em O conto brasileiro contemporâneo – pg.13
e 14
4
Em Valise de Cronopio - pag 57.
5
Em “O drama da linguagem: Uma leitura de Clarice Lispector – pg. 84
ligeras hermosuras, pequenos encantos muy visibles” (QUIROGA, 1925) que ocultam
questões vultosas dos aspectos psicológicos humanos - estrutura social e cultural.

O enredo de “A terceira margem do rio” trata-se de um homem, pai de família que ao


decidir viver o resto de sua vida em uma canoa remando “rio abaixo, rio a fora, rio a
dentro”6 deixa uma profunda mácula em sua família e principalmente em seu filho mais
velho. De acordo com o narrador “Só executava a invenção de se permanecer naqueles
espaços do rio,de meio a meio, sempre dentro da canoa, para dela não saltar, nunca
mais”.7 , e mesmo com a forte determinação de não voltar, o filho procura visita-lo e
deixar mantimentos para mantê-lo vivo. Com o passar dos anos a família passa a
estabelecer uma nova rotina e uma vida diferente, desintegrando-se.
“Minha irmã se mudou, com o marido para longe daqui. Meu irmão resolveu e se foi,
para uma cidade. Os tempos mudavam, no devagar depressa dos tempos. Nossa mãe
terminou indo também, de uma vez, residir com a minha irmã, ela estava envelhecida. ”8
Mesmo com a fragmentação da família, o narrador-personagem permanece à margem
do rio esperando seu pai, e ao despontar dos “primeiros cabelos brancos”, o filho grita à
margem do rio “...eu tomo o seu lugar, do senhor, na canoa!...”, tornando-a a primeira
manifestação da figura paterna pós a decisão de reclusão. O filho, no entanto, se assusta
“por pavor, arrepiados os cabelos, corri, fugi, me tirei de lá, num procedimento
desatinado” pois a figura do pai “cabeludo, barbudo, de unhas grandes, mal e magro,
ficado preto de sol e dos pelos com aspecto de bicho...” parecia a figura de alguém
vinda do além. 9

Em “Feliz Aniversário”, D. Anita, a matriarca da família comemora seus 89 anos


rodeado por filhos, noras, netos e bisnetos. A relação com “a carne de seu joelho” fica
nítida através da divisão da narração que ora entra no inconsciente da velha e hora paira
pelos fatos como se apenas o observasse. Após diversas descrições de confraternização
forçada, em uma das navegações pelos pensamentos da idosa, ela questiona como
aqueles “azedos e infelizes frutos” poderiam vir de uma mulher “...forte, que casara em
hora e tempo devidos com um bom homem a quem, obediente e independente, ela
respeitara”. Em um súbito surto de cólera, a velha “incoercível, virou a cabeça e com

6
Em a Terceira Margem do Rio
7
Em a Terceira Margem do Rio
8
idem
9
idem
força insuspeita cuspiu no chão. ” A festa repleta de laços forçados, como expresso no
uso das palavras “fingir”, “disfarçar e na expressão “como prova de animação”, o conto
acaba como começou: com a figura da D.Anita como objeto, como uma “aniversariante
à cabeceira da mesa”, questionando sua própria morte. Em ambas as obras, a
relação/laços familiares são os fios condutores dos contos.
Manifestados de maneiras diferentes, a culpa, a melancolia e a loucura são alegorizadas
nos contos. Em “A terceira margem do rio”, a escolha do pai não é explicada
racionalmente, e em oposição ao equilíbrio, o narrador expressa preocupação em
relação ao pai e sua condição mental; e paralelamente se vê reflexo daquela experiência
na navegação pelo desconhecido quando incorpora o laço familiar e desmonta o
conceito de loucura, questionando: “Sou doido? Não. Na nossa casa, a palavra doido
não se falava, nunca mais se falou, os anos todos, não se condenava ninguém de doido.
Ninguém é doido. Ou, então, todos. ” A melancolia no viver, expressa pela
caracterização da personagem como “homem de tristes palavras”, ou que sofre “o grave
frio dos medos” é alimentada constantemente, também a espelho da figura do pai, que
“sem alegria nem cuidado” decide se isolar. Em um misto de tristeza e medo, “é preciso
se acostumar com algo, sem se acostumar nunca” (GINZBURG). Já em “Feliz
aniversário”, o ataque de fúria de D. Anita, manifestado pela cena em que cospe no chão
ao pensar na família pode ser considerada pela família como sinal de senilidade,
demência. “Mamãe! Gritou mortificada a dona da casa. Que é isso mamãe! Gritou ela
passada de vergonha”, manifestou-se a filha cuidadora, quase num ímpeto de conter e
justificar o surto de demência da senhora que fazia quase noventa anos.
A culpa, em “Feliz aniversário” é uma culpa não propriamente anunciada e talvez, seja
apenas uma ponta de remorso que tão rápido passa quanto a visita à matriarca, quando o
filho José “gritou-lhe emocionado, grato, com os olhos úmidos”. O maior sentimento de
culpa do conto, seja talvez pertencente à Cordelia, que em um breve arrependimento
autocentrado, de antemão se vê na figura da D. Anitta.

Porém nenhuma vez mais repetiu. Porque a verdade era um


relance. (...) enquanto Rodrigo, o neto da aniversariante, puxava
a mão daquela mãe culpada, perplexa e desesperada que mais
uma vez olhou para trás implorando à velhice ainda um sinal de
que uma mulher deve, num ímpeto dilacerante, enfim agarrar a
sua derradeira chance e viver. Mais uma vez Cordélia quis olhar.
Mas a esse novo olhar – a aniversariante era uma velha sentada
à cabeceira da mesa10.

Os filhos, nos dois contos, se veem na obrigação de cuidar de seus pais. O filho da
“Terceira Margem”, que ficou para cuidar de seu pai, alimentando-o, vestindo-o e
preocupando-se de longe, afirma que nunca podia querer se casar por ter a incumbência
não enunciada de cuidar de seu pai. “De que era que eu tinha tanta, tanta culpa? ”,
indagava o filho em busca de compreender o motivo da jornada de seu pai, numa
tentativa de estabelecer uma relação mais profunda com o familiar, colocando-o em um
patamar irreal, fantasmagórico.

Zilda, a filha cuidadora da matriarca da família do conto de Clarice sente-se na


obrigação de cuidar da mãe pela pressão exercida pelos seus irmãos e pelo resto da
sociedade – “a única mulher entre os seis irmãos homens e a única que, estava decidido
já havia anos, tinha espaço e tempo para alojar a aniversariante”. Com este encargo,
Zilda passa a olhar sua mãe como mero objeto, incluindo em sua tarefa um sacrifício
imposto por seus irmãos.
“Mas ninguém elogiou a ideia de Zilda, e ela se perguntou angustiada se eles não
estariam pensando que fora por economia de velas – ninguém se lembrando de que
ninguém havia contribuído com uma caixa de fósforos sequer para a comida da festa
que ela, Zilda, servia como uma escreva, os pés exaustos e o coração revoltado. ”,
narrava a filha, preocupando-se mais pelo que seus irmãos pensariam da festa do que se
tratava bem sua mãe. Para Zilda e seus irmãos, se fazer presente de vez em quando era
mais do que o necessário para estabelecer o vínculo familiar, “para que nem todos os
laços fossem cortados”, já para a família do conto de Guimarães, a distância quase
dilacerante, nos termos perto-longe, foram determinantes para destruir as relações e a
unidade familiar.

A questão do abandono, embora trabalhada de maneiras diferentes em cada autor, é


diretamente proporcional para a narração. Em “A terceira margem do rio”, a distância,
escolhida pelo pai é acatada com resistência pelos familiares próximos. Em busca de

10
Em Feliz aniversário –pg. 64
algo não mencionado no texto, o patriarca da família força a estrutura familiar e acaba
com os laços mesmo sendo visto de longe. Desde então, a ausência é cultivada ao longo
dos anos com a contradição da morte e da vida, presença e inexistência – num misto de
relações ambíguas. Embora visto, o pai se encontra numa espécie de “Limbo”, entre as
duas margens, e não é esquecido pela família, pois “...não falávamos mais nele. Só se
pensava. Não, de nosso pai não se podia ter esquecimento; e se, por um pouco, a gente
fazia que esquecia, era só para se despertar de novo, de repente, coma memória, no
passo de outros sobressaltos. ”.

Já D. Anita, apesar de ter a presença da filha Zilda a todo momento, e de ter seus
familiares presentes na festa de aniversário é tratada como objeto de seu próprio destino.
Entre fingimentos, e simulações a velha sente-se abandonada e morta, em um “ instante
que pedia para ser vivo. Mas que era morto. ”11, ouvindo o barulho vazio das crianças,
que assim como as relações familiares, fazia sua casa (corpórea e física) praticamente
desabitada.

Clarice e Guimarães, em perspectivas e versões temporais distintas, em seus contos “A


terceira margem do rio” e “Feliz Aniversário”, nos fazem questionar questões ambíguas
e sensíveis como a vida e a morte, a voz e o silêncio, presença e abandono – e em suas
devidas proporções, faz do conto um ser “...tão secreto e voltado para si mesmo, caracol
da linguagem, irmão misterioso da poesia em outra dimensão do tempo literário. ”
(CORTAZAR, 1993)

Encerro a análise com uma citação de Guimarães rosa em uma entrevista concedida no
Congresso de Escritores Latino-Americanos em 1965, que traduz a “alta pressão
espiritual” na qual os contos são submetidos para concederem a abertura da consciência
do leitor (CORTAZAR, 1993): “ E não apenas isto, mas tudo: a vida, a morte, tudo é,
no fundo, paradoxo. Os paradoxos existem para que arada se possa exprimir algo para o
qual não existem palavras. Por isso, acho que um paradoxo bem formulado é mais
importante que toda a matemática, pois ela própria é um paradoxo, porque cada fórmula
que o homem pode empregar é um paradoxo. ”

11
P.66
BIBLIOGRAFIA
Livros:
CORTÁZAR, Julio. Valise de cronópio.Trad. Davi Arrigucci Jr.eJoão Alexandre Barbosa. São
Paulo: Perspectiva, 1993.
PAZ, Octavio em O arco e a Lira (1882) – ED. Nova Fronteira rj
BOSI, Alfredo. O Conto Brasileiro Contemporâneo. São Paulo: Editora Cultrix, 1974.
CÂNDIDO, Antonio. “The Brazilian Family”. In: SMITH, T. Lynn; MARCHAND A
(ed) Brazil: potrait of a half continent. New York: Dryden Press, 1951, p. 291-
312.
LEITE, Ligia Chiappini Moraes. “A tipologia de Norman Friedman”. In. O Foco
Narrativo. São Paulo: Ática, 1993.
LISPECTOR, Clarice. “Feliz aniversário” In. Laços de Família. Rio de Janeiro: Rocco,
1998 p. 54-67.
PASSOS, Cleusa Rios. “Clarice Lispector: Os Elos da Tradição”. In. Revista da USP
n.10, jun-jul-ago., 1991, p. 167-174.
SOUSA, Gilda de Mello e. “O Vertiginoso Relance” In. Exercícios de Leitura.
SãoPaulo: Duas Cidades, 1980 p. 79-91.
CANDIDO, Antonio. No Raiar de Clarice. In: Vários escritos. São Paulo: Martins, 1945. p.
98-109

XEROX:

ROSA, Guimarães.A Terceira Margem do rio em Primeiras Estórias


GALVÃO, Walnice Nogueira. Ensaios sobre Guimarães Rosa – Metáforas Nauticas
WALDMAN, Berta. Entre passos e rastos: Presença Judaica na literatura Brasileira
Contemporanea – A retórica do silencio em Clarice Lispector.
NUNES, Benedito. O Drama da linguagem: Uma leitura de Clarice Lispector – A forma
do conto
PIGLIA, Ricardo – Teses sobre o conto em O laboratório do escritor (tra. Josely vianna
Baptista) em editora Iluminuras p.46 a 48.
QUIROGA, HORACIO. Manual del perfecto cuentista em el hogar, Buenos aires, año XXI nº
8080, abril, 10, 1925, p. 10

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