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Concepções de linguagem

Elegemos este tema – concepção de linguagem – porque ele constitui


um eixo que articula todos os demais temas que compõem o conteúdo
desta disciplina. Por outro lado, qualquer concepção de linguagem está
articulada a uma concepção de mundo, a uma concepção de realidade.
Concepção é, pois, algo mais amplo que um mero conceito.

Por que é importante, para o ensino


da língua escrita, ter uma concepção
clara de linguagem?
A forma como concebemos determinado produto ou processo da re-
alidade que tomamos como objeto de ensino-aprendizagem influi deci-
sivamente no modo como encaminharemos nossa prática pedagógica.
Não apenas a teoria sobre o ensino-aprendizagem, mas também a teoria
sobre o objeto do processo de ensino-aprendizagem, ou seja, sobre o
conteúdo curricular (neste caso, a língua escrita) são elementos essen-
ciais que norteiam nosso encaminhamento docente. Daí a importância
de aprofundarmos nossa compreensão científica sobre a linguagem,
uma vez que nela se enraízam todos os fundamentos e elementos expli-
cativos da língua escrita.

Podemos observar nos escritos, na literatura, ou nos discursos sobre


a linguagem, diferentes formas de conceber sua origem. A concepção
que cada pessoa tem sobre a linguagem tanto pode ser resultado de um
estudo detalhado e aprofundado sobre o assunto, como resultar da união
de múltiplas impressões que vão sendo incorporadas no dia-a-dia, e que
poderíamos chamar de senso comum. De qualquer modo, desde o senso
comum à consciência científica, várias são as concepções sobre a origem
da linguagem.

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Nesse conjunto variado de modos de pensar, de tendências e correntes teó-


ricas, destacaremos duas, pela sua importância e predominância: a concepção
inatista e a concepção histórico-social. Vamos nos ater apenas a elas porque en-
tendemos que todas as demais constituem apenas variações – mais ou menos
complexas, mais ou menos elaboradas – dessas duas concepções.

A linguagem como uma capacidade natural,


inata, de origem biológica
A primeira concepção de que trataremos entende a linguagem como um
processo mecânico, linear de comunicação, em que alguém envia uma mensa-
gem que é recebida, tal e qual, pelo seu destinatário.

Concebe a linguagem como um dado natural e, portanto, como uma ca-


pacidade inata não só dos homens, mas também dos animais em geral, guar-
dadas, evidentemente, as proporções de complexidade entre a linguagem de
uns e de outros.

Tal concepção pressupõe a origem biológica da linguagem, uma vez que a


concebe como uma função da consciência e concebe a consciência como um
dom primário direto, como uma experiência psíquica inerente ao sujeito desde
o princípio. Entretanto, sob essa perspectiva, ficam sem explicação consistente
vários aspectos importantes que cercam essa questão. Além disso, desse enten-
dimento decorre a noção de que o aprendizado da linguagem dar-se-ia espon-
taneamente, visto tratar-se de um processo predominantemente n ­ atural.

Essa tendência, que naturaliza as manifestações da condição humana, atribui


à educação apenas a função de zelar para que o ambiente seja adequado para
o desenvolvimento normal daquela capacidade inata. Nesse sentido, diminui a
importância da intervenção do professor no processo de ensino-aprendizagem,
reduzindo-o à condição de mero estimulador. O papel do educador seria, assim,
análogo ao do jardineiro, que não dá origem à flor, mas cuida para que as con-
dições ambientais que cercam a semente permitam seu desabrochar no curso e
ritmo normal de desenvolvimento determinado pela natureza. Um aspecto im-
portante a ser destacado nesta concepção é a noção de que o desenvolvimento
biopsicológico sempre precede e dá suporte à aprendizagem. Nesta perspectiva,
reduz-se significativamente a importância da intervenção pedagógica intencio-
nal e sistematizada como fator fundamental do desenvolvimento, acarretando
um prejuízo evidente para a formação das crianças em geral e, especialmente,
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daquelas crianças cujas famílias vivem em condições socioeconômicas nas quais


o exercício das práticas sociais envolvendo a criança (neste caso, mais especifica-
mente a prática linguística, nas formas oral e escrita) é menos frequente, diver-
sificado e rico.

Nesse sentido, afirma Luria (1991, p. 77):


Na escola não só saem à luz as capacidades que já se desenvolveram, mas formam-se e logo
se desenvolvem novas capacidades; todas as crianças, ao adquirirem os métodos e os hábitos
de aprendizagem da escola, desenvolvem as suas capacidades, compensam as deficiências
e realizam o seu potencial de desenvolvimento mental. A escola, como a própria vida, é um
poderoso fator formativo; seria um grave erro subestimar esta influência formativa e pensar que
as “capacidades inatas” determinam inevitavelmente o futuro da criança, e que as dificuldades
que algumas encontram para aprender se devem a um baixo nível de “capacidades inatas”.

O caráter social da linguagem,


atividade propriamente humana
A segunda concepção, que, por considerar mais abrangente e científica, assu-
mimos como norteadora dos conteúdos que desenvolveremos ao longo desta
disciplina, entende a linguagem como processo e produto da atividade humana,
subordinada a uma dupla interação: a interação dos homens com a natureza e a
interação dos homens entre si, ou seja, da sociedade.

Nesse sentido, a linguagem não só é construída e aprendida no interior de


um processo histórico-social, como ela própria se configura como tal. Enquan-
to processo, a linguagem integra organicamente vários elementos também de
origem histórico-social.

Esta concepção fundamenta-se na ideia de que os elementos constitutivos


da realidade propriamente humana (entre eles, a linguagem) originam-se no
processo de produção social da existência humana, o qual combina a relação
ativa do homem com a natureza e com os outros homens. Esclareça-se que as
duas formas de interação sempre se apresentam indissociavelmente ligadas.
Nesta perspectiva, aqueles elementos não existem por obra direta da natureza,
pois, embora necessitem do concurso desta, só passam a existir por decorrência
da atividade humana, a qual, por sua vez, sempre tem um caráter social (ou seja,
de interação ou intercâmbio entre os homens).

Efetivamente, há uma distinção essencial entre os processos naturais e os pro-


cessos sociais. Os processos naturais (e seus produtos) ocorrem espontaneamen-
te e independem da vontade humana. Nos processos sociais, diferentemente, os
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homens são seus atores conscientes: atuam deliberadamente, visando a obje-


tivos bem definidos. Os processos sociais e seus produtos (entre eles, a lingua-
gem) resultam, seja direta, seja indiretamente, da atividade humana consciente
e intencional.

Cabe esclarecer que a expressão atividade humana é, aqui, tomada no sentido


de trabalho e, enquanto tal, designa algo mais complexo que uma simples ação.
Designa uma atividade especificamente humana, por meio da qual os homens,
de forma cooperativa, agem sobre a natureza para produzir suas condições ma-
teriais de existência e, ao produzi-las, produzem-se a si mesmos.

Defendemos, aqui, a concepção de que o trabalho, enquanto necessidade de


produção dos bens necessários à existência, é o ponto de partida para a compre-
ensão de quaisquer objetos ou processos da realidade humana.

O trabalho consiste em uma atividade especial em que as pessoas, em coope-


ração, produzem tudo aquilo que necessitam consumir para viver. Os produtos
do trabalho humano podem ser voltados ao atendimento de necessidades cor-
porais (bebida, agasalho etc.), como para suprir necessidades espirituais (ciên-
cia, arte etc.).

No processo de trabalho, as pessoas empregam instrumentos e atuam sobre


os chamados “objetos do trabalho” que, em uma expressão genérica, podería-
mos chamar de “matéria-prima”. Importante não confundir “produto” e “objeto”.
Emprega-se a expressão “objeto” para designar aquilo que sofre uma ação. Ma-
téria-prima é, por isso, objeto. É sobre ela que age o trabalhador, transforman-
do-a em algum produto útil. A fonte principal de matéria-prima é a natureza. Daí
dizer-se que a natureza é “o objeto do trabalho, por excelência”. É o mesmo que
dizer que, ao trabalhar, as pessoas agem sobre a natureza, transformando-a em
utilidades. Quando um oleiro trabalha o barro e produz uma cerâmica, o barro
é o objeto de seu trabalho, pois é sobre o barro que o oleiro atua, e a cerâmica
é seu produto. Quando o oleiro obtém, pelo seu trabalho, um produto – uma
vasilha, por exemplo –, ele também modifica a existência humana: desde que
se inventou a vasilha, as pessoas podem armazenar água dentro de casa, por
exemplo, não precisando mais ir até o rio a cada ocasião em que têm sede. Por
isso se diz que o homem, ao transformar a natureza, transforma a si mesmo, uma
vez que transforma as suas condições de vida.

Da mesma forma que o trabalho é a condição para a invenção da linguagem,


a linguagem é condição para o desenvolvimento da consciência humana. Os

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mecanismos superiores da consciência (memória, lógica, imaginação etc.) só se


desenvolvem graças à linguagem (seja ela gestual, verbal, ou outro código).

Nesse sentido, é esclarecedora a explicitação de Spirkine e Yakhot (1975, p.


54-55):
No processo de seu trabalho em comum, da produção, os homens sentiram a necessidade
de comunicar-se entre si. Esta necessidade, disse Engels, criou pouco a pouco o órgão capaz
de pronunciar um som articulado a seguir a outro. Aparece, assim, a linguagem articulada, a
língua, meio de trocar pensamentos, meio de comunicação entre os homens, invólucro material
do pensamento.

A unidade da linguagem e do pensamento dimana da própria natureza do pensamento. O


pensamento só se torna real nas palavras. Enquanto está na cabeça do homem, está como
morto, inacessível aos outros homens. Marx também disse que “a linguagem é a realidade
imediata do pensamento”. Mesmo quando pensamos em nós próprios revestimos os nossos
pensamentos dum invólucro verbal. Graças à linguagem, os pensamentos formam-se e
transmitem-se aos outros homens. E graças à escrita, transmitem-se duma geração à outra.
Não se saberia exprimir um pensamento abstrato senão por palavras.

Desde a mais tenra idade do homem, a sua consciência forma-se com base em palavras, na
linguagem, porque é com a ajuda da linguagem que se exprimem os nossos pensamentos.

No decorrer deste processo, o pensamento alia-se intimamente à linguagem, fenômeno


próprio do homem. É impossível separar a consciência do pensamento, da linguagem. A
linguagem e o pensamento constituem uma unidade orgânica. (grifos dos autores)

Conforme bem esclarece Marx (1982, p. 202), o trabalho é:


[...] um processo de que participam o homem e a natureza, processo em que o ser humano
com sua própria ação impulsiona, regula e controla seu intercâmbio com a natureza.
Defronta-se com a natureza como uma de suas forças. Põe em movimento as forças
naturais de seu corpo, braços e pernas, cabeça e mãos, a fim de apropriar-se dos recursos
da natureza, imprimindo-lhes forma útil à vida humana. Atuando assim sobre a natureza
externa e modificando-a, ao mesmo tempo modifica sua própria natureza. Desenvolve as
potencialidades nela adormecidas e submete ao seu domínio o jogo das forças naturais. Não
se trata aqui das formas instintivas, animais, de trabalho.

A experiência prática nos permite perceber que, de todas as espécies, o


homem é a única que não consegue sobreviver adaptando-se ao ambiente.
Com efeito, é por meio dos produtos resultantes de seu próprio trabalho que
os homens satisfazem as suas necessidades em geral: beber, comer, proteger-se
das intempéries, repousar. Para realizar essa ação sobre a natureza, os homens,
dada sua fragilidade fisiológica, criam instrumentos e contraem relações com
outros homens, estabelecem cooperação, associam-se. É por esta razão que o
trabalho não consiste em uma atividade puramente fisiológica de intercâmbio
com a natureza (como se verifica no caso das demais espécies), mas caracteriza-
se por sua natureza social, uma vez que, para realizar-se, pressupõe a existência
de relações entre os homens.

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Ora, para estabelecerem tais relações de intercâmbio ou de cooperação, im-


põe-se aos homens a necessidade de comunicar-se. Em decorrência desta ne-
cessidade, os homens produzem a linguagem. Como já afirmamos,
A aventura humana tem, no trabalho, o seu ponto de partida. O homem trabalha, e, pelo
trabalho se humaniza. A mão humana, ela mesma órgão e produto de trabalho – realiza a
criação dos instrumentos que vão permitir, ao homem, dominar a natureza.

Ao agir sobre a natureza, o homem produz a existência humana, num processo de mútua
transformação: não só imprime, naquela, as marcas da sua ação, humanizando-a, como também
produz a si mesmo, humanizando-se, ou seja, realizando uma forma humana de vida, produzindo
tecnologia (artefatos, instrumentos), ideias (crenças, conhecimentos, valores) e mecanismos para
a elaboração de ideias (planejamento, raciocínio, abstração), diferenciando-se, cada vez mais, das
outras espécies animais.

Nessa relação com a natureza, quando busca responder às suas necessidades, o homem supera,
diferentemente dos animais, os limites da situação imediata que o desafia, produzindo além
de sua necessidade pessoal e da prole. Ao fazê-lo, descobre nas coisas propriedades até então
desconhecidas, penetra na sua essência, abstrai suas características e capta as relações nas
quais se inserem, rompendo as fronteiras da experiência sensível. Realiza e incorpora, assim,
experiências e conhecimentos, e, sobretudo, cria novas necessidades.

A complexificação das atividades que precisa realizar para responder a necessidades cada
vez, também, mais complexas, lhe impõe outro desafio: a necessidade de auxílio mútuo. O
enfrentamento desse magistral desafio se efetiva na produção da linguagem.

Utilizando a linguagem, o homem pode organizar a atividade prática do grupo, comunicando


as informações necessárias e, além disso, pode acumular as experiências realizadas
socialmente, num processo de troca e transmissão de informações. Isso é possível, porque
essas experiências podem ser codificadas pela palavra. Dessa forma, permite que a geração
seguinte – pela aprendizagem – possa continuar o processo de desenvolvimento das formas
humanas de vida, a partir do estágio já atingido, sem voltar ao ponto de partida da geração
que a precedeu. (KLEIN; SHAFASCHEK, 1990, p. 23)

Como podemos observar, o trabalho e a linguagem constituem práticas es-


pecificamente humanas, de caráter eminentemente social, as quais traduzem
com clareza a distância existente entre o mundo natural e a realidade social.

Nesse sentido, esclarece Bakhtin (1992, p. 108):


Os indivíduos não recebem a língua pronta para ser usada; eles penetram na corrente da
comunicação verbal; ou melhor, somente quando mergulham nessa corrente é que sua
consciência desperta e começa a operar. [...] Os sujeitos não adquirem sua língua materna: é
nela e por meio dela que ocorre o primeiro despertar da consciência.

Concebendo a linguagem e a consciência como dimensões sociais, portanto


não-inatas, esta concepção, ao contrário da concepção inatista, entende que a
aprendizagem precede ao desenvolvimento da inteligência, servindo, na verdade,
de processo desencadeador desta última. É nesta direção que se coloca Vygotsky
(2001), ao propor a teoria da “zona de desenvolvimento proximal”. Segundo
essa teoria, os sujeitos apresentam uma determinada capacidade potencial de

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aprendizagem; se, nesse campo potencial, alguma aprendizagem se realiza, essa


capacidade se amplia proporcionalmente ao aprendizado, criando uma nova
zona potencial de aprendizagem e, por decorrência, também gerando um novo
grau de desenvolvimento da inteligência. Assim, a partir de uma base material
– as condições psicofisiológicas – o processo de aprendizagem vai gerando
patamares cada vez mais superiores de inteligência.

Vale destacar a coerência interna desta concepção, com relação à premissa


de que a realidade humana se constitui na dupla relação homem-natureza e ho-
mem-homem: a base natural – o organismo biológico, condição essencial para
qualquer atividade humana – é progressivamente modificada a partir das ativi-
dades laborais – que implicam relações sociais – e das experiências daí resultan-
tes, adquirindo novas capacidades, as quais, por sua vez, permitem atividades
mais complexas e experiências mais amplas.

A consequência dessa premissa para a educação é tão evidente quanto impor-


tante: desencadear o processo de ensino-aprendizagem é mais do que promover
o aprendizado de um dado conhecimento: é produzir capacidade intelectual mais
elevada. Nesta perspectiva, atribui-se a maior relevância à intervenção pedagó-
gica intencional e sistematizada como fator fundamental do desenvolvimento.
Afirma-se, deste modo, a importância da escola, não como mera transmissora de
informações fragmentadas, mas como instituição promotora de ricos processos
de ensino-aprendizagem que vão constituindo os alicerces da capacidade inte-
lectual do aluno.

Texto complementar

A importância da linguagem
(CHAUÍ, 2004, p. 174-178)

Na abertura da sua obra Política, Aristóteles afirma que somente o


homem é um “animal político”, isto é, social e cívico, porque somente ele é
dotado de linguagem. Os outros animais, escreve Aristóteles, possuem voz
(phoné) e com ela exprimem dor e prazer, mas o homem possui a palavra
(lógos) e, com ela, exprime o bom e o mau, o justo e o injusto. Exprimir e
possuir em comum esses valores é o que torna possível a vida social e polí-
tica e, dela, somente os homens são capazes.

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Na mesma linha é o raciocínio de Rousseau, no primeiro capítulo do


Ensaio sobre a Origem das Línguas: “A palavra distingue os homens e os ani-
mais; a linguagem distingue as nações entre si. Não se sabe de onde é um
homem antes que ele tenha falado.”

Escrevendo sobre a teoria da linguagem, o linguista Hjelmslev afirma


que “a linguagem é inseparável do homem, segue-o em todos os seus
atos”, sendo
[...] o instrumento graças ao qual o homem modela seu pensamento, seus sentimentos,
suas emoções, seus esforços, sua vontade e seus atos, o instrumento graças ao qual ele
influencia e é influenciado, a base mais profunda da sociedade humana.

Prosseguindo em sua apreciação sobre a importância da linguagem,


Rousseau considera que a linguagem nasce de uma profunda necessidade
de comunicação:
Desde que um homem foi reconhecido por outro como um ser sensível, pensante e
semelhante a si próprio, o desejo e a necessidade de comunicar-lhe seus sentimentos e
pensamentos fizeram-no buscar meios para isto.

Gestos e vozes, na busca da expressão e da comunicação, fizeram surgir


a linguagem.

Por seu turno, Hjelmslev afirma que a linguagem é: “[...] o recurso último
e indispensável do homem, seu refúgio nas horas solitárias em que o espíri-
to luta contra a existência, e quando o conflito se resolve no monólogo do
poeta e na meditação do pensador.”

A linguagem, diz ele, está sempre à nossa volta, sempre pronta a envolver
nossos pensamentos e sentimentos, acompanhando-nos em toda a nossa
vida. Ela não é um simples acompanhamento do pensamento, “mas sim um
fio profundamente tecido na trama do pensamento”, é “o tesouro da memó-
ria e a consciência vigilante transmitida de geração a geração”.

A linguagem é, assim, a forma propriamente humana da comunicação, da


relação como mundo e com os outros, da vida social e política, do pensamen-
to e das artes. No entanto, no diálogo Fedro, Platão dizia que a linguagem é
um phármakon. Essa palavra grega (da qual vem nosso vocábulo farmácia),
que em português se traduz por “poção”, possui três sentidos principais: re-
médio, veneno e cosmético. Ou seja, Platão considerava que a linguagem
pode ser um medicamento ou um remédio para o conhecimento, pois, pelo
diálogo e pela comunicação, conseguimos descobrir nossa ignorância e

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aprender com os outros. Pode, porém, ser um veneno quando, pela sedução
das palavras, nos faz aceitar, fascinados com o que vimos ou lemos, sem que
indaguemos se tais palavras são verdadeiras ou falsas. Enfim, a linguagem
pode ser cosmético, maquiagem ou máscara para dissimular ou ocultar a
verdade sob as palavras. A linguagem pode ser conhecimento-comunicação
mas também pode ser encantamento-sedução.

Essa mesma ideia da linguagem como possibilidade de comunicação-


-conhecimento e de dissimulação-desconhecimento aparece na Biblia judai-
co-cristã, no mito da Torre de Babel, quando Deus lança a confusão entre
os homens, fazendo-os perder a língua comum e passando a falar línguas
diferentes, que impediam a realização de uma obra em comum e abriam as
portas para todos os desentendimentos e guerras. A pluralidade das línguas
é explicada, nas Escrituras Sagradas, como punição porque os homens ou-
saram imaginar que poderiam construir uma torre que alcançasse o céu, isto
é, ousaram imaginar que teriam um poder e um lugar semelhantes ao da
divindade. “Que sejam confundidos”, disse Deus, multiplicando as línguas.

Dica de estudo
LOBATO, Monteiro. História das Invenções. São Paulo: Brasiliense, 1987.

Nessa obra, Monteiro Lobato realiza uma tradução livre do livro História
das Invenções do Homem, o Fazedor de Milagres, de Hendrik van Loon. Nele, em
uma linguagem extremamente agradável, relata-se a história das invenções, de
modo a esclarecer como essas invenções vão modificando as condições de vida
do homem, vale dizer, modificando o próprio homem. É uma leitura que facilita
a compreensão da formação histórico-social do homem.

Atividades
1. Nesta unidade, foram apresentadas duas concepções de linguagem. Como
cada uma delas explica a origem da linguagem?

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