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PESQUISAS NA FORMAÇÃO CONTINUADA E EM SALAS


DE AULA: POSSÍVEIS CONTRIBUIÇÕES PARA O
ENSINO DA MATEMÁTICA
Ana Virginia de Almeida Luna – Coordenadora
Universidade Estadual de Feira de Santana/ NEEMFS
avaluna@uefs.br

Larissa Borges de Souza Lima


Escola Despertar/ NEEMFS
limaborgeslarissa@gmail.com

Isabelly Serafim de Sousa Santos


Universidade Estadual de Feira de Santana/ NEEMFS
isy_serafim@hotmail.com

Roberta D‟Angela Menduni Bortoloti


Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
robertamenduni@yahoo.com.br

Ana Paula Perovano


Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
paula.perovano@gmail.com

Jaqueline de Sousa Pereira Grilo


Universidade Federal do Recôncavo da Bahia/ GEPEMATE
jaqueline.pereira@ufrb.edu.br

Flávia Cristina de Macêdo Santana


Universidade Estadual de Feira de Santana/ GEPEMATE
flavia.cris@gmail.com

RESUMO GERAL

Este painel envolve o eixo 3, intitulado A Didática, seus saberes estruturantes e formação de
professores/as e o subeixo 2, Didática na formação de professores para a educação básica e
ensino superior, tendo em vista que o nosso propósito foi a articulação de pesquisas
envolvendo a circulação de textos legítimos do discurso da matemática escolar em espaços de
formação continuada e nas salas de aula da educação básica e do ensino superior. No primeiro
artigo, cujo tema diz respeito a diferentes textos que circulam na formação colaborativa de
professores de matemática para o ensino da multiplicação e da divisão, os contextos foram o
espaço de formação colaborativa e as salas de aula dos professores participantes. Quanto ao
segundo artigo, o tema em discussão é a comunicação entre professor e crianças na produção
de textos matemáticos no processo de alfabetização, o contexto envolveu a sala de aula e o
uso de um material didático. Por fim, o terceiro artigo apresenta uma proposição teórico-
metodológica para análise de recontextualizações de textos que circulam em cursos de
formação continuada de professores de matemática, para tanto apresenta um episódio tendo
como participantes um professor da Universidade que ministrou o curso e professores da
Educação Básica. As três pesquisas são fundamentadas à luz de conceitos da Teoria dos
Códigos do sociólogo Basil Bernstein. Os três estudos discutem a produção e a circulação de
textos matemáticos na formação de professores da educação básica e superior. Identificamos
um ciclo entre os estudos: aprendizagens em cursos de formação continuada, importância
desses cursos para a produção de textos matemáticos legítimos por professores/as e estudantes
em sala de aula e, por fim, uma proposição teórico-metodológica que possibilita analisar as
mudanças na prática docente oriundas da participação em cursos de formação continuada.

Palavras-chave: Formação de Professores. Sala de aula. Matemática. Ensino. Textos


legítimos.

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DIFERENTES TEXTOS QUE CIRCULAM NA FORMAÇÃO
COLABORATIVA DE PROFESSORES PARA O ENSINO DA
MULTIPLICAÇÃO E DA DIVISÃO
Ana Virginia de Almeida Luna
Universidade Estadual de Feira de Santana/ NEEMFS
avaluna@uefs.br

Larissa Borges de Souza Lima


Escola Despertar/ NEEMFS
limaborgeslarissa@gmail.com

Isabelly Serafim de Sousa Santos


Universidade Estadual de Feira de Santana/ NEEMFS
isy_serafim@hotmail.com

RESUMO

Neste artigo, temos como propósito investigar que textos e como esses textos podem ser
produzidos em espaços de formação para o ensino da multiplicação e da divisão em diferentes
salas de aulas. A trajetória metodológica adotada envolveu uma abordagem qualitativa, por
meio da observação e da análise documental. O contexto foi um grupo de professores
polivalentes e licenciados em Matemática que participaram de um grupo colaborativo. Os
dados permitiram identificar contribuições dos textos circulados no ambiente colaborativo
para o ensino da multiplicação e da divisão, tais como: a produção de atividades em grupo, a
antecipação de possíveis mediações, a realização de atividade em sala, a oportunidade de
retorno do relatório desta atividade para o grupo, a de produção narrativas, entre outras.

Palavras-chave: Formação de Professores; Multiplicação; Divisão; Ensino.

1 INTRODUÇÃO

A pesquisa referente à formação colaborativa de professores que originou o presente


artigo faz parte do projeto “As Estruturas Multiplicativas e a formação de professores que
ensinam Matemática na Bahia”, denominado PEM (Núcleo UEFS-Feira), financiado pela
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB), fundamentado pela Teoria
dos Campos Conceituais de Vergnaud (1983; 1994; 1996).

Embora esta pesquisa tenha se desenvolvido no contexto do PEM, que propõe o estudo
das Estruturas Multiplicativas, fundamentado na Teoria dos Campos Conceituais de Vergnaud
(1983; 1994; 1996), em nosso grupo de pesquisa a análise dos textos produzidos na formação

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foi fundamentada sob a ótica da abordagem sociológica de Bernstein (1996; 2000; 2003).
Quando nos referimos ao campo conceitual estamos nos referindo a um conjunto de
problemas ou situações no qual sua análise e tratamento requerem vários tipos de conceitos e
concepções, propriedades e procedimentos (invariantes) e representações simbólicas, os quais
se conectam estreitamente uns com os outros (MAGINA, 2008).

Assim sendo, o nosso objetivo no grupo colaborativo foi investigar que textos e como
esses textos podem ser produzidos em espaços de formação de professores de matemática
para o ensino da multiplicação e da divisão em diferentes salas de aulas. O termo texto é
entendido, aqui, como qualquer forma de comunicação, seja esta verbal, escrita, gestual, ou
até um simples olhar (BERNSTEIN, 2003).
Diante disso, nosso foco na formação foi a ampliação dos textos para o ensino da
multiplicação e divisão, como proposto em Magina, Santos e Merlini (2014). Os referidos
autores apresentam situações de estrutura multiplicativa classificadas de acordo com eixos,
classes e tipos, como, por exemplo, no que se refere à relação quaternária, são apresentados
pelos pesquisadores três eixos: a proporção simples, a proporção dupla e a proporção
múltipla, os quais estão divididos em duas classes, a saber: a classe de situações de um para
muitos e a de muitos para muitos, que podem ser discretas ou contínuas.

2 A FORMAÇÃO COLABORATIVA DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA

É um desafio muito grande para professores polivalentes, com um percurso escolar


pautado na metodologia da tradição da matemática escolar, bem como com uma formação
universitária no curso de pedagogia que não dá conta das várias nuances de como ensinar
matemática, devido à carga horária restrita para a disciplina referente à área específica. Assim
também, para professores licenciados em matemática, em que podem saber o quê ensinar, mas
não sabem como realizar, em sala de aula, o que sabem para que seus alunos produzam o
texto matemático legítimo. O texto é considerado legítimo quando as suas significações estão
adequadas ao contexto no qual foi produzido.
Outrossim, há outro desafio que é ensinar o que não se aprendeu além da técnica,
como é o caso, por exemplo, da multiplicação e da divisão. Por conseguinte, mais um desafio
que é a dinâmica social, com pessoas engajadas em uma sociedade democrática, para tanto,
necessitam de argumentos e uma nova forma de abordar o que já sabe, para poder atuar na
sociedade, não cabendo para essa perspectiva uma abordagem da tradição da matemática
escolar, transmitindo o conhecimento para aquele que nada sabe, principalmente em

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matemática, uma disciplina que se constitui como linguagem.
Ainda como desafio, em sala de aula, há grande ênfase nos estudos dos algoritmos das
operações, em detrimento dos conceitos, sendo desconhecido, para muitos dos professores,
como desenvolver nos seus alunos habilidades para operar por meio de cálculo mental,
estimar ou aproximar suas hipóteses ao conceito que para ele estará em desenvolvimento
(CARVALHO, 2005). Dessa forma, na prática pedagógica, entre professor e estudante é
muito importante um ambiente que fortaleça as práticas sociais, para que os alunos produzam
textos e possam fazer aproximações do texto legítimo, neste caso em relação a multiplicação e
a divisão, por meio da mediação do professor e de outros estudantes, em processos de
interação. Assim sendo, vivenciando práticas que têm ênfase na compreensão de significados.
Considerando esses desafios, será no processo de formação colaborativa que os
professores, ao discutirem sobre algum texto do discurso da matemática, poderão encontrar
meios para produzirem textos legítimos para o ensino e aprendizagem das crianças a serem
desenvolvidos em diferentes salas de aula. Em nosso estudo a prática pedagógica é entendida,
de acordo com Bernstein (2000), como um contexto social por meio do qual se realiza as
relações sociais e culturais, que podem ser de reprodução e de produção.
Nesse contexto, teremos diferentes modalidades de prática pedagógica: a do espaço de
formação colaborativa (formadoras-professores), as das salas de aula (professor(a) -
estudantes) e entre os participantes do grupo colaborativo.
Para se constituir como grupo colaborativo, a participação deve ser espontânea, além
disso, nas relações entre os participantes deve haver compartilhamento de ideias, confiança,
comprometimento, trocas de experiências e respeito mútuo (FIORENTINI, 2004;
FERREIRA; MIORIM, 2011). Nesta pesquisa isso ocorreu, pois todos os professores das
escolas envolvidas foram convidados, mas apenas participaram da formação os que
procuraram o nosso grupo de forma espontânea. Além disso, no decorrer da formação, o
espaço de formação se constituiu com todos os critérios apontados acima, os quais
caracterizam um grupo colaborativo.
Em espaços de formação, a prática pedagógica é constituída pelo discurso pedagógico,
sendo regulada pelos princípios de enquadramento e classificação. A classificação se refere ao
o que pode ser dito em um certo contexto e o enquadramento diz respeito ao como pode ser
dito, a forma de produção do texto legítimo, que regula as regras de realização para a
produção desse texto.
Na prática pedagógica, as regras de reconhecimento do texto que pode ser dito criam
os meios que regulam os significados considerados pertinentes em cada contexto. Essas regras

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são necessárias para a produção do texto legítimo, pois regulam o modo de unir os
significados para a produção de textos legítimos.
Por isso, no processo de formação faz-se necessário que os professores reconheçam o
que pode ser dito, a fim de que possam produzir o texto legítimo, que diz respeito às regras de
realização. Como estamos nos referindo a um grupo colaborativo, os textos sobre
multiplicação e divisão, que precisam ser reconhecidos e realizados no grupo, foram também
definidos pelos professores junto com as formadoras, havendo espaço para negociações, a
depender da potencialidade e/ou necessidade do grupo.

3 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA

O objetivo do nosso trabalho foi investigar que textos e como esses textos podem ser
produzidos em espaços de formação colaborativa para o ensino da multiplicação e da divisão
em diferentes salas de aulas.
As atividades foram desenvolvidas no contexto do projeto As Estruturas
Multiplicativas e a formação de professores que ensinam Matemática na Bahia, denominado
PEM, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB), que
previa um estudo com uma ação de formação de professores, o qual é um projeto
interinstitucional, com sede na Universidade Estadual de Santa Cruz. Os encontros com os
professores, convidados para formação do projeto do PEM, foram realizados nas três escolas
parceiras por meio de rodízio, sempre às sextas-feiras, propiciando a participação dos
professores.
Para a presente investigação, os dados foram coletados pelo Núcleo de Estudos em
Educação Matemática de Feira de Santana (NEEMFS), um dos polos da pesquisa. As escolas
envolvidas foram convidadas juntamente com os professores, porém nem todos participaram,
pois, essa participação era voluntária, se inscrevendo 35 (trinta e cinco) e participando
efetivamente até o final 23 (vinte e três). Esta pesquisa ocorreu por meio da observação da
Formação do Projeto de Estruturas Multiplicativas (PEM) e dos documentos das salas de aula
desses professores participantes da formação colaborativa. Alguns desses professores foram
observados em sala de aula e também foram coletados documentos de sala de aula no
ambiente de formação.
O critério de escolha dos professores para serem observados foi terem participado de
todo o processo da formação, da elaboração dos problemas envolvendo multiplicação e/ou
divisão, terem feito os planos e seus respectivos relatórios e os compartilhado ativamente no
grupo colaborativo, além de assinar o termo de consentimento de participação da pesquisa.
Dessa forma, também, se deu a coleta para análise de documentos.

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Para a análise dos dados nos inspiramos no modelo da linguagem de descrição, nesse
modelo são considerados dois tipos de linguagem: a interna e a externa. A linguagem interna
é constituída por uma teoria ou por um conjunto de teorias, e a linguagem externa é composta
por proposições e modelos derivados da linguagem interna de descrição (BERNSTEIN,
2000).

4 COMO ACONTECEU A CIRCULAÇÃO DE TEXTOS NA FORMAÇÃO

Nossa análise ocorreu com ênfase nos textos que foram produzidos no espaço de
formação e os que foram trazidos para esse espaço pelos participantes por meio das suas
experiências em sala de aula. No período da formação do PEM, considerando os textos
produzidos pelos(as) professores(as), a partir dos seus repertórios anteriores e das relações
que iam estabelecendo com as trocas de experiências e com o repertório propiciado pelos
materiais compartilhados na formação, foi possível observarmos avanços na trajetória dos
participantes do grupo a partir dos diferentes textos que circulavam na formação sobre a
multiplicação e a divisão.
No espaço de formação colaborativa para o ensino da multiplicação e divisão, a
primeira etapa de formação continuada iniciou-se com o tópico Foco na Teoria, socializando
qual a importância do reconhecimento do sentido do número, segundo Spinillo (2006), o que
provocou, entre os participantes, discussões no que se refere a relações numéricas, estimativa,
usos do número em diferentes contextos, entre outras.
Nesse encontro, também foram propostos outros temas de estudo afins ao ensino da
multiplicação e divisão que inquietavam os participantes. Esses temas foram articulados com
a proposição de situações-problema e da resolução de problema que seriam propostas no
decorrer dos encontros a partir de situações com a multiplicação e a divisão, classificadas de
acordo com os eixos, as classes e os tipos (MAGINA, SANTOS; MERLINI, 2014), como
pode ser observado na figura 1.

Figura 1. Esquema do Campo Conceitual Multiplicativo


Fonte: SANTOS, 2015

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No que se refere à elaboração de situações-problema e a resolução de problemas,
observamos que, iniciados os encontros com o grupo colaborativo com esse foco, em uma
discussão, uma participante se inquieta e lança uma questão: Como meu aluno, que faz a
resolução dos problemas com a conta armada, agora vai voltar para responder de outra
forma? Neste momento o grupo de professores apresenta questões com textos semelhantes.
Nesta questão é circulado um texto que evidencia uma relação com as operações
centrada apenas no ensino do algoritmo (conta armada). No entanto, a proposta da formação é
a elaboração de diferentes situações-problema, conforme Magina, Santos e Merlini (2014)
com diferentes eixos e classes, para favorecer a produção de diferentes formas de resolução
desta situação pelos estudantes. A diversificação das estratégias é um texto que também é
compartilhado na formação.
Depois de toda inquietação e orientações compartilhadas, a participante que levantou
a questão reconhece o que é dito, porém não sabe como utilizar os conceitos e a proposta do
grupo, levando-se a si perguntar como será planejado ou desenvolvido o texto para que os
estudantes produzam outras estratégias.
Assim, o grupo começa a produção dos planos com eixo proposto para aquele
encontro – a configuração retangular, em que se discute a melhor maneira de se desenvolver o
texto. Portanto, as regras de reconhecimento possibilitam que eles sejam capazes de
reconhecer conceitos e significados; porém, reconhecer o texto não garante que eles sejam
capazes de utilizar esses conceitos de forma adequada e produzir o texto legítimo.
Com relação ao momento do Planejamento, era feita uma discussão com o grupo
sobre a situação prévia a ser desenvolvida, de estratégias possíveis a serem utilizadas pelos
estudantes.
A seguir é apresentado um exemplo de planejamento em que uma das participantes
propõe a atividade no grupo utilizando o jogo de tabuleiro, que pode ser observado a seguir:

Os integrantes dos grupos decidiram, por meio de sorteio, quem iniciaria a


partida. O jogador lança simultaneamente os dois dados, e observa suas
faces/quantidades sorteada. Exemplo: 4 e 5.O dado com menor valor representa
as linhas, e o de maior valor as colunas que os alunos terão que pintar o
tabuleiro quadriculado (preenchendo toda a área e considerando a primeira linha
pintada). Em seguida, deverão contabilizar os pontos conquistados, calculando
o total de quadrinhos pintados naquela rodada. O jogo terá três rodadas.
Vencerá o jogador que conseguir mais pontos. Ao final do jogo realizar as
seguintes questões:
Na primeira rodada, um aluno lançou os dados e obteve 5 pontos em um e 4
pontos no outro. Qual o total de quadrinhos que esse aluno pintou no tabuleiro
quadriculado?

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É possível notar a clareza na escrita do texto do jogo e os seus objetivos. Essa
professora consegue produzir um planejamento que pode favorecer a criação de estratégias
pelos seus estudantes, para que eles comecem a realizar a produção do texto legítimo de
configuração retangular.
Vale ressaltar que, após os momentos de socialização do eixo das estruturas
multiplicativas, os(as) professores(as) elaboravam o planejamento, que era revisado pelas
formadoras, para que pudesse ser realizado em sala de aula. Assim sendo, por meio dos textos
discutidos no ambiente colaborativo entre professores(as) e formadoras e professor(a) e
professor(a), em relação à elaboração do planejamento, os participantes puderam perceber de
que forma um planejamento podia ser organizado, com momentos de jogos e/ou desafios,
antes da atividade escrita, percebendo a importância desses ambientes de aprendizagem para
que as crianças desenvolvessem conceitos acerca dos diferentes eixos da multiplicação e da
divisão.
A realização da atividade planejada em sala de aula ocorria com apresentação de
uma situação prévia envolvendo jogos, brincadeiras, materiais manipuláveis, seções de
vídeos, diferentes situações relacionadas ao contexto real de realização dos conceitos
matemáticos, envolvendo multiplicação e divisão. Nas salas, as crianças socializavam as
estratégias utilizadas também.

Figura 2. Atividades desenvolvidas em sala


Fonte: Dados coletados pelo PEM, polo Feira de Santana (NEEMFS), em 2017.

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Na formação os professores relatavam como foi a realização da atividade planejada.

Figura 3. Recorte da narrativa de uma Professora


Fonte: Dados coletados pelo PEM, polo Feira de Santana (NEEMFS), em 2017.

É possível identificar, no texto produzido no processo de formação, que a


participante reconhece o quanto o grupo colaborativo e o desenvolvimento das atividades
ajudaram a legitimar os textos e a perceber que os diferentes eixos, os quais podem ser
desenvolvidos em qualquer grupo dos anos iniciais, podem ser reconhecidos e realizados de
diversas formas.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A formação de professores evidencia um grande salto para superação dos desafios da


profissão docente, já que, entre pares, os professores, solucionam problemas de sua formação
inicial, reveem suas práticas, bem como, ampliam seus conhecimentos. Nessa perspectiva, a
formação é vista como um “espaço de reflexão como orientação conceitual e fonte de
aprendizagem profissional” (MIZUKAMI, 2005-2006, p. 4).
Nesta pesquisa, a circulação dos textos no ambiente de formação colaborativa
propiciou a ampliação das aprendizagens dos professores, bem como, promoveu o
desenvolvimento de estratégias de ensino da multiplicação e da divisão. Os resultados
apontaram várias contribuições dos textos circulados na formação colaborativa para o ensino
da multiplicação e da divisão, a saber: a produção de atividades em grupo, as antecipações de
possíveis mediações, levantamento de encaminhamentos para o planejamento, a realização de
atividade em sala, a oportunidade de retorno do relatório desta atividade para o grupo, a
socialização de narrativas, entre outras.

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REFERÊNCIAS
BARBOSA, J.C. Designing written tasks in the pedagogic recontextualising field: proposing a
theoretical model. In: 7th International Mathematics Education and Society Conference.
Cape Town: University of Cape Town. 2007. v. 1. p. 213-222.

BERNSTEIN, B. Pedagogy, symbolic control and identity: theory research Critique.


Revised Edition. London: Taylor and Francis, 2000.

BERNSTEIN, B. Class, codes and Control, Vol. IV: The structuring of pedagogic
discourse. Londres: Routledge, 2003.

CARVALHO, Mercedes. Problemas? Mas que problemas?! Estratégias de resolução de


problemas matemáticos em sala de aula. Petrópolis: Vozes, 2005.

FERREIRA, A. C.; MIORIM, M. A. Collaborative work and the professional development of


mathematics teachers: analysis of a Brazilian experience. In: BEDNARZ, N; FIORENTINI,
D.; HUANG, R. (Org.). International approaches to professional development of
mathematics teachers. Ottawa: University of Ottawa Press, 2011.

FIORENTINI, Dario. Pesquisar Práticas Colaborativas ou Pesquisar Colaborativamente? In:


BORBA, Marcelo de Carvalho; ARAÚJO, Jussara Loiola (Orgs.). Pesquisa Qualitativa em
Educação Matemática. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. p.47-76

MAGINA, S. (Re)significar as estruturas multiplicativas a partir da formação „ação-reflexão-


planejamento-ação‟ do professor. Projeto de Pesquisa. Brasília: CNPq. 2008-2010.

MAGINA, M.P.; SANTOS, A.S.; MERLINI. V.L. O raciocínio de estudantes do Ensino


Fundamental na resolução de situações das estruturas multiplicativas. In: Ciênc. Educ.,
Bauru, v. 20, n. 2, p. 517-533, 2014.

MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti. Aprendizagem da docência: professores formadores.


Revista E-Curriculum, São Paulo, v. 1, n. 1, dez. - jul. 2005-2006. Disponível em:
http://www.pucsp.br/ecurriculum.

SANTOS, A.; MERLINI, V.L.; MAGINA, S. M. P. ; SANTANA, E. . A noção de divisão


para quem não aprendeu a divisão. Jornal Internacional de Estudos em Educação
Matemática, v. 7, p. 38-64, 2014.

SANTOS, A. Formação de professores e as estruturas multiplicativas: reflexões teóricas e


práticas. 1. Ed. Curitiba: Appris, 2015.

SPINILLO, A. G. O sentido de número e sua importância na Educação Matemática. In M. R.


F. de Brito (Ed.), Solução de problemas e a Matemática (pp. 83-111). Campinas, SP:
Alínea, 2006.

SKOVSMOSE, O. Desafios da Educação Matemática Crítica. São Paulo: Papirus, 2008.

VERGNAUD, G. A criança, a matemática e a realidade: problemas do ensino da


matemática na escolar elementar. Curitiba: Ed. da UFPR, 2009.

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A COMUNICAÇÃO ENTRE PROFESSOR E CRIANÇAS NA
PRODUÇÃO DE TEXTOS MATEMÁTICOS
Roberta D‟Angela Menduni Bortoloti
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
robertamenduni@yahoo.com.br

Ana Paula Perovano


Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
paula.perovano@gmail.com

RESUMO

Analisar a comunicação entre professor e crianças do 1º ano do Ensino Fundamental na


produção de textos matemáticos a partir dos marcadores é o objetivo deste texto. Nele
apresentamos um recorte dos dados do núcleo de Vitória da Conquista referente ao projeto de
pesquisa: A alfabetização matemática com o uso de um material didático e a produção de
textos matemáticos legítimos por alunos do 1º ano do ensino fundamental no estado da Bahia.
Durante o processo de alfabetização matemática, a produção de textos matemáticos tem
relação com a comunicação entre professor e aluno. Essa comunicação foi analisada sob as
lentes bernsteinianas, numa abordagem de pesquisa qualitativa em que foi utilizado o modelo
metodológico da linguagem de descrição. Ao analisarmos a comunicação entre professor e
alunos na produção de textos matemáticos no processo de alfabetização constatamos a
necessidade de oportunizar às crianças as produções de seus próprios textos, aproximando-se
da aquisição do código, no caso da escrita numérica.

Palavras-chave: Marcadores. Textos Legítimos. Alfabetização Matemática.

1 INTRODUÇÃO

Quatro núcleos da Sociedade Brasileira de Educação Matemática - Regional Bahia


(SBEM-BA) estabeleceram uma parceria em rede para desenvolver, no período entre 2013 e
2016, o projeto A alfabetização matemática com o uso de um material didático e a produção
de textos matemáticos legítimos por alunos do 1º ano do ensino fundamental no estado da
Bahia (PAMAT), coordenado pelo Núcleo de Estudos em Educação Matemática de Feira de
Santana (NEEMFS). O projeto foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado
da Bahia (FAPESB), com termo de outorga nº 0057/2013.

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Sob a coordenação do NEEMFS, o objetivo geral da pesquisa era compreender como o
uso de um material didático pautado na ludicidade, na interação entre alunos e no registro
matemático pode criar oportunidades para a produção de textos matemáticos legítimos por
alunos do 1º ano do Ensino Fundamental. O material didático em questão foi a Proposta
Didática Alfabetização Matemática (PDAM) (SANTANA et al, 2013), produzida para o
ensino de Alfabetização Matemática de crianças baianas no âmbito do Programa Pacto
Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) com os municípios.
Ao longo do desenvolvimento da pesquisa, o NEEMFS propôs aos núcleos a
produção, em conjunto, de marcadores para levantamento dos textos matemáticos legítimos.
Entendemos texto como qualquer comunicação que pode ser falada, escrita, visual ou gestual.
O texto é compreendido como legítimo quando é reconhecido por quem o comunica como
específico daquela comunicação. Os marcadores foram utilizados como procedimento de
análise de dados “para levantamento dos textos matemáticos que são reconhecidos e
produzidos por alunos do 1º ano do Ensino Fundamental [...]” (LUNA; LIMA; BARBOSA,
2016, p. 888). Os autores citados identificaram oito marcadores que apresentaremos
posteriormente.
Com o objetivo de analisar a comunicação entre professor e crianças do 1º ano do
Ensino Fundamental na produção de textos matemáticos a partir dos marcadores
apresentaremos, neste trabalho, um recorte dos dados do núcleo de Vitória da Conquista.
A análise, por meio dos marcadores, nos possibilitou observar como os alunos se
apropriaram ou não da produção do texto legítimo da alfabetização matemática, bem como
refletir sobre o papel do professor nessa apropriação. Entendemos por texto legítimo o texto
que se adequa ao contexto (BERNSTEIN, 2003).

2 A COMUNICAÇÃO NA PRODUÇÃO DE TEXTOS MATEMÁTICOS

Quando se comunica, a criança estabelece uma conexão entre suas noções informais e
intuitivas e a linguagem abstrata e simbólica da matemática que os professores e seus colegas
já possuem (PEROVANO, 2011). Assim, conectam seus pensamentos a novos conhecimentos
o que possibilita a produção de textos matemáticos legítimos.
A produção de textos matemáticos, no processo de alfabetização matemática, diz
respeito a comunicação matemática entre professor e aluno em uma determinada prática
pedagógica (BERSNTEIN, 2000). Entendemos prática pedagógica como um dispositivo
singularmente humano, tanto para a reprodução, quanto para a produção cultural, com um

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conjunto de princípios que a regulam, denominado de discurso pedagógico (BERNSTEIN,
2003).
O discurso pedagógico é um princípio recontextualizador da comunicação constituído
pelo discurso instrucional e pelo discurso regulativo. Pelas lentes bernsteinianas a produção
dos textos dos professores e alunos se desenvolve por meio do discurso instrucional e
regulativo. O discurso instrucional se refere ao que comunicar, ou seja, compreende o que é
legítimo falar. Em nosso caso, legitima a produção de textos matemáticos. Já o discurso
regulativo se refere ao como acontece a comunicação, ou seja, como produzir os textos. Este
discurso legitima como acontece a produção dos textos, no caso, dos textos matemáticos. Os
discursos instrucional e regulativo vão validar ou não a produção de textos matemáticos
legítimos.
Os marcadores nos ajudaram a analisar como os textos estão sendo produzidos pelos
professores e alunos bem como o que estão comunicando sobre o discurso da alfabetização
matemática.
Os marcadores nos indicaram a aproximação ou distanciamento do texto legítimo,
conforme o discurso da alfabetização matemática. Além disso, nos indicaram como o
Discurso Pedagógico está modelando essa aproximação ou distanciamento, por meio do
Discurso Regulativo e do Discurso Instrucional.
Neste trabalho, nosso foco está nessa relação entre esses discursos, pois no Discurso
Regulativo (normas, atitudes, valores), está embutido o Discurso Instrucional, que neste
estudos se referem aos textos da alfabetização matemática produzidos com o uso do PDAM.
Como frequentemente professores seguem o livro didático quando organizam suas aulas
(ZABALA 1998), consideramos na pesquisa a proposta didática, pois era utilizada, na época
de realização do projeto, pelas escolas baianas, como material didático. Dessa forma,
ponderamos que há na referida proposta um discurso instrucional cuja intenção das autoras
será interpretada pelo professor.
Nessa interpretação, ao implementar as sugestões apresentadas pelo material didático,
os professores podem reproduzir (propõem a seus alunos uma atividade conforme apresentada
nos materiais curriculares), adaptar (modificam as atividades a partir de suas experiências em
sala de aula; de seus conhecimentos, objetivos e crenças; e das necessidades de aprendizagem
de seus alunos) e improvisar (fazem alterações nas atividades durante o desenvolvimento da
aula para atender às ações espontâneas dos alunos, sem planejamento prévio) ao utilizar os
materiais curriculares nas situações reais de sala de aula, mobilizando seus conhecimentos
(Brown, 2009). O referido autor ressalta que nenhuma destas ações (reprodução, adaptação e
improvisação) é superior ou inferior à outra. As mesmas não

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dependem da experiência do professor, tratam-se de escolhas que não caracterizam a
qualidade do ensino, evidenciam as formas que os materiais curriculares contribuem para a
prática do professor. Em nosso caso, expõe as formas que a PDAM contribui para a
comunicação na produção de textos matemáticos.

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A abordagem da pesquisa adotada foi qualitativa que, de acordo com Ludke e André
(1986), preocupa-se com o processo em lugar do produto, que se torna importante na
produção de dados de determinado grupo investigado, verificando como ele se manifesta nas
interações cotidianas numa tentativa de capturar a perspectiva dos participantes.
Fizemos uso do modelo metodológico da linguagem de descrição (BERNSTEIN,
2000) que possibilita uma relação dialética entre teoria e empiria por meio da linguagem
interna e externa. A linguagem interna diz respeito à teoria, enquanto que a linguagem externa
são modelos ou proposições oriundas da linguagem interna de descrição (LUNA; LIMA;
BARBOSA, 2016; LUNA; SANTANA; MENDUNI-BORTOLOTI, 2018).
Conforme Luna, Santana e Menduni-Bortoloti (2018, p. 219) "A teoria oferece lentes
para que o pesquisador produza o que está identificando na empiria, por meio da teoria, de
modo que um alimente o outro". Em nosso caso, foi o que ocorreu ao usarmos os marcadores
para analisar a comunicação entre professores e crianças na produção dos textos matemáticos
legítimos.
Os marcadores foram produzidos colaborativamente e depurados pelos núcleos numa
relação dialética entre a teoria de Bernstein (2000) e a empiria (material didático). Luna, Lima
e Barbosa (2016) produziram oito marcadores: contexto de referência, relação pedagógica,
uso da linguagem matemática, sequenciamento das aulas, orientação pedagógica, avaliação,
distribuição e práticas de sala de aula. Para evitar repetições iremos apresentar cada um deles
na seção de resultados e discussões.
Nesta pesquisa fez parte também da empiria a filmagem, que proporciona inúmeras
possibilidades de observação do discurso dos indivíduos. Com o uso da filmagem, é possível
“[...] registrar não só momentos de contra-argumentações, mas diversos momentos de adesão
que podem ser notados pelo silêncio ou por expressões, quando o outro fala ou quando um
sujeito reconstrói seu discurso com base na hipótese do outro” (POWELL, SILVA, 2016, p.
28).
Foram filmadas dez aulas, neste texto apresentaremos um recorte da aula que se refere
a 2ª etapa, 7º semana, 2º dia da PDAM, do 1º ano do Ensino

15
Fundamental. O 2º dia de todas as etapas tiveram como foco a formalização da leitura e
escrita numérica, por isso foi selecionado. A Figura 1 ilustra parte do material que compõe a
PDAM.

Figura 1: Alfabetização Matemática 1º ano, Proposta Didática para o Professor e Caderno de


Atividades do Aluno, respectivamente.

Fonte: Santana et al., (2013)

Participaram da pesquisa 27 alunos do 1º ano do Ensino Fundamental de uma escola


municipal, que no período da coleta de dados possuíam entre 6 e 7 anos de idade, uma
professora e uma monitora da turma.
A seguir, apresentamos parte das tarefas do 2º dia, 7ª semana e a análise da produção
dos textos matemáticos por meio dos marcadores.

4 ANÁLISE DA COMUNICAÇÃO ENTRE PROFESSOR E CRIANÇAS NA


PRODUÇÃO DE TEXTOS

Conforme já anunciamos anteriormente, a análise da comunicação entre professor e


alunos na produção de textos matemáticos, a partir dos marcadores em sala de aula considerou
a PDAM. A principal característica desta proposta é a ludicidade, ela possui também
orientações que buscam estruturar o processo educativo e as práticas trabalhadas nas aulas de
matemática a partir da ótica da mediação do professor constituindo-se em um material
curricular inovador. Todas as aulas da PDAM são divididas em três momentos, conforme
ilustrado na Figura 2.
A análise é feita observando os oito marcados em cada momento, mas como o espaço
para a escrita é limitado, vamos discutir alguns dos marcadores em cada momento, de forma
que os oito sejam explanados ao longo desta seção.

16
Figura 2: Extrato da Proposta Didática Alfabetização Matemática referente a 2ª etapa, 7º semana, 2º
dia.
Fonte: Santana et al., (2013, p. 95-96)

O momento matematizar com jogos e desafios prioriza o fazer matemático em grupos


(duplas, trios, quartetos) e tem como princípio desafios e situações-problema. A dinâmica
desse momento prioriza o primeiro contato com o conceito ou conteúdo matemático que se
planeja abordar no respectivo dia. O segundo momento matematizar na roda de conversa
prioriza o fazer matemático por meio da socialização e registros coletivos dos saberes das
crianças. É um momento que também implica mudança conceitual em razão da mediação do
próprio grupo que interage e propõe novas argumentações diante do que foi realizado no
momento anterior (matematizar com jogos e desafios). O último momento matematizar com
registros prioriza o fazer matemático por meio do registro individual da criança no seu
próprio Caderno de Atividades e, a partir de sua produção, realizar a interface entre as
notações pessoais e a formalização matemática. Objetiva avaliar a produção do texto escrito
pelas crianças.

4.1 OS MARCADORES

O primeiro marcador tem a matemática como contexto de referência, pois as tarefas


contempladas nos três momentos da 2ª etapa, 7º semana, 2º dia da PDAM, utilizam elementos
que pertencem a comunicação matemática, como por exemplo, produzir um número de três
algarismos ou dado um número, escrever outro maior.
O segundo marcador práticas da sala de aula, prevê a prática pedagógica como
cenário investigativo ou como paradigma do exercício. A natureza das atividades propostas

17
pela PDAM fez com que os autores Luna, Lima e Barbosa (2016, p. 897) descartassem o
paradigma do exercício: "[...] a sequência de tarefas pensadas, só pode ser encaixada na
perspectiva de cenários para investigação, pois os alunos se envolvem no processo de
exploração [...]". Afirmamos que neste tipo de cenário o aluno socializa suas explicações e
argumentações, além de serem convidados a ouvir seus colegas. Podemos observar que na
proposta de atividade da PDAM, no primeiro momento os alunos são convidados a escrever
três números em que aparecesse o numeral 8 em sua formação; no segundo momento, quando
os alunos precisavam analisar os números e a posição do numeral 8 na formação dos números,
o que justifica a perspectiva de investigação.
Contudo, a comunicação da professora e monitora, em sala de aula, na produção do
texto se caracterizou pelo paradigma do exercício (SKOVSMOSE, 2000), cujo modo de
ensinar matemática não se faz com a participação dos alunos, o professor diz como o aluno
deve fazer (LUNA; LIMA; BARBOSA, 2016). Observemos o discurso regulativo (como) da
professora e monitora no excerto 1 (da filmagem) esclarecendo a afirmação feita acima. A
professora e monitora dividem a sala em trios, coloca uma mesa à frente dos alunos com as
fichas e chama algumas crianças:
Monitora: Agora eu vou pegar o trio de V. com os alunos G. e K. [as letras maiúsculas
referem-se aos nomes dos alunos]
Professora: G. já tem o número 8.
Monitora: G. vai ser o número 8. [a monitora entrega a ficha com o número 8 para o aluno]
Monitora: Você escolhe um número e V outro.
V: K. primeiro.
Professora: Que número é esse K? [o aluno responde outro número, a monitora diz que não e
a professora volta a indagar]. Que número é esse K?
G: nove.
Monitora: você vai por na frente ou atrás do oito?
K: do lado [a monitora pega a ficha e coloca do “lado” do oito sem indagar se aquele era o
lado que o aluno queria].
Professora: V vai escolher um número. Que número é esse V.?
Monitora: cinco [respondeu automaticamente] quantos algarismos tem esses números? [os
alunos respondem três e a monitora fala para os alunos como eles devem escrever os números
na lousa].

Fonte: Excerto 1 - Matematizar com Jogos e Desafios - Filmagem 15 set 2015

O texto produzido pela professora e monitora se distanciou do cenário de investigação,


a professora e a monitora adaptaram a atividade indicada pela PDAM e por regularem a
escolha dos números pelos alunos, conforme pode ser percebido no excerto 1, podemos inferir
que o isolamento foi mais forte na Relação Pedagógica. A Relação Pedagógica, terceiro
marcador, se refere a comunicação estabelecida entre professor e aluno, cujo controle varia do
isolamento forte ao fraco (LUNA; LIMA; BARBOSA, 2016). Caracterizamos a comunicação
entre professora, monitora e crianças, conforme excerto 1, com isolamento forte, porque a

18
professora e monitora regularam a comunicação.
A orientação na PDAM é para que os alunos façam suas escolhas pelos algarismos e
formem seus números socializando suas escritas no quadro, ou seja, seus textos matemáticos.
Isso significa, pelas lentes bernstenianas dos marcadores, que o controle da comunicação seja
enfraquecido na relação pedagógica, para que os alunos comuniquem seus próprios textos
matemáticos. Assim sendo, o isolamento é semiforte. Entretanto, a condução da professora e
monitora (discurso regulativo) se mostrou diferente do que foi proposto pela PDAM,
coadunando com o paradigma do exercício.
Neste mesmo sentido as tarefas 1 e 2 do momento matematizar com jogos e desafios,
figura 2, se caracterizaria com Rigor Fraco no que se refere ao Uso da Linguagem
Matemática, quarto marcador, pois, há possibilidades de produção de diferentes textos por
parte dos alunos. O Rigor Fraco acontece quando "a tarefa apresenta um menor controle do
professor, levando o aluno a produzir um maior número de textos diferentes, aumentando as
possibilidades do texto produzido não ser legítimo" (LUNA; LIMA; BARBOSA, 2016, p.
894). Entretanto, a prática da sala de aula pautada no paradigma do exercício, mostrou um
maior controle por parte da professora e da monitora na busca pelo texto legítimo, o que
caracterizou o uso da linguagem matemática com rigor forte. Como a atividade foi adaptada,
voltando-se para o rigor forte, ponderamos que houve limitação das possibilidades de
produção do texto legítimo por parte das crianças.
Com o propósito de analisar a comunicação entre professor e crianças na produção dos
textos matemáticos produzidos em sala de aula a partir dos marcadores, apresentamos o
excerto 2, quando a professora e monitora fazem a leitura de alguns números escritos na
lousa, em conjunto com os alunos.
Monitora: turminha… Oh, presta atenção! Desses números que vocês escolheram aqui na
mesa, qual foi o menor? Deixa eu ver quem vai acertar.
Os alunos falam 23, 28, 6, 24
Monitora: 23? [...] Não. Vem G. [a aluna move-se até a lousa].
Professora: Qual é o menor número?
Os alunos continuam falando 23.
Monitora: calma, mas aqui dentro destes números [a professora aponta, para a aluna, os
números escritos no quadro]. Não tá 23. É só entre esses que eles escolheram. É só circular
esse número que o amigo tá falando: 28 é só passar um círculo no 28 [indica o local em que o
28 está escrito].
Professora: vamos deixar ela procurar, onde está o 28 [a aluna circula].
Monitora: G. identificou! Esse é o menor [escreve a palavra menor]. Agora vamos identificar
o maior [um aluno grita 895, ela chama o aluno].
Professora: Vai circular o maior número com três algarismos [o aluno circula o número e ela
escreve a palavra maior].
Monitora: agora vocês vão registrar estes números no livro.

Fonte: Excerto 2 - Matematizar na Roda da Conversa - Filmagem 15 set 2015

19
O quinto marcador, Sequenciamento da Aula, refere-se a forma com que a tarefa é
proposta aos alunos. A professora e a monitora produziram um discurso regulativo de forma
diretiva, ou seja, mostraram os procedimentos que os alunos precisavam utilizar para a
solução, como: "É só circular esse número que o amigo tá falando: 28 é só passar um círculo
no 28 [indica o local em que o 28 está escrito]". Além disso, a monitora escreve a palavra
menor ao circular o número menor (discurso instrucional).
A Distribuição, sexto marcador, diz respeito ao conteúdo do currículo que está sendo
ensinado e se a distribuição deste nas tarefas, são ou não oportunidades para aprendizagem.
Uma das perguntas indicadas na tarefa do excerto 2 é indagar aos alunos como sabem, dentre
4 números, qual é o maior deles. Esta distribuição, na proposta didática, classifica-se com
nível alto, pois requer investigações por parte dos alunos, além da produção de um texto
matemático legítimo. Entretanto, a professora e monitora limitaram às investigações. Com
isso, a distribuição apresentou-se em nível baixo, pois limitou-se a fazer o que a professora ou
monitora disseram para fazer (discurso regulativo), como por exemplo, um círculo em um
determinado número, sem explorar por que a resposta era aquele número.
O último excerto mostra como a professora direciona para a produção do texto
matemático legítimo: "Professora: o que vocês vão fazer aqui? (fazendo referência para a
atividade 2 - matematizar com registro – Figura 3) [...] um número maior que 25 [discurso
instrucional – explica a criança o que fazer]. E maior que 42, você vai colocar nessa
linhazinha. [...]" – mostra a criança como fazer – discurso regulativo.

Figura 3- Produção do texto matemático legítimo por parte dos alunos

O Sequenciamento, sétimo marcador, é Diretivo, pois a tarefa é estruturada e explicita


de modo claro o que precisa ser feito. Identificamos a produção do texto matemático de forma
legítima na figura 3. As três atividades que compõem o momento Matematizar com Registros
apresentam o sequenciamento diretivo, como ilustrado na figura 3 a professora reproduziu, ou
seja conduziu sua prática, neste momento da atividade, conforme foi apresentada pela PDAM.
Nas atividades não há indicação explícita de como o professor poderá avaliar as
produções dos textos matemáticos das crianças. Segundo Luna, Lima e Barbosa (2016)
quando isso ocorre temos uma avaliação implícita. O último

20
marcador, a Avaliação, que neste caso se mostrou implícita. Contudo, isso não representa que
a professora não poderia utilizar do discurso da criança para aproximá-las da produção do
texto matemático legítimo, mesmo não havendo por parte da PDAM orientações de como
fazer isso no momento do Matematizar com Registro.
Ao utilizarmos os marcadores para analisar a comunicação entre professor e crianças
na produção de textos matemáticos no processo de alfabetização constatamos, assim como
Luna, Lima e Barbosa (2016), a necessidade de oportunizar às crianças as produções de seus
próprios textos, aproximando-se da aquisição do código, no caso da escrita numérica.
Além disso, identificamos a imprescindibilidade do trabalho de formação continuada
com professores dos anos iniciais pois, pode contribuir para o (re)pensar da prática e a partir
dessa reflexão modificar e transformar as suas crenças e seu fazer pedagógico (PEROVANO,
2011).
Acreditamos que, com a formação continuada os professores se sintam amparados
quando resolvem mudar as práticas em sala de aula, pois o caso aqui apresentado mostra que
mesmo com o uso de um material que permite a participação das crianças, ou seja, uma
relação pedagógica, cujo isolamento é mais fraco, na relação pedagógica o isolamento é mais
forte, a prática ocorre na perspectiva do paradigma do exercício, com a professora conduzindo
a discussão.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Buscamos analisar a comunicação entre professor e crianças do 1º ano do Ensino


Fundamental na produção de textos matemáticos, a partir dos marcadores utilizando um
material didático pautado na ludicidade, na interação entre alunos e no registro matemático. A
análise dessa comunicação nos mostra que in loco alguns marcadores não foram identificados
com se previa. Para ilustrar trouxemos o marcador práticas da sala de aula, cuja prática
pedagógica proposta na PDAM deveria se dar no cenário investigativo, porém o discurso
instrucional da professora e monitora fez com que a atividade se desse no paradigma do
exercício, o que limitou a produção de textos matemáticos legítimo por parte dos alunos.

O modelo da linguagem de descrição nos ajudou a identificar por meio da teoria o que
aconteceu na empiria. Os discursos regulativo e instrucional podem demarcar uma forma de
produzir textos matemáticos independentemente da proposta didática adotada pela Escola. Por
isso, identificamos ser indispensável o trabalho de formação continuada com professores dos
anos iniciais, pois acreditamos que por meio da formação continuada os professores possam

21
mudar seus discursos e consequentemente a produção dos textos matemáticos. Espera-se com
isso, aproximar os textos matemáticos dos alunos dos textos considerados como legítimos.

REFERÊNCIAS

BERNSTEIN, B. Pedagogy, symbolic control and identity: theory research Critique.


Revised Edition. London: Taylor and Francis, 2000.

BERNSTEIN, B. Class, codes and Control, Vol. IV: The structuring of pedagogic discourse.
Londres: Routledge, 2003.

BROWN, M. W. The Teacher-Tool Relationship: theorizing the design and use of curriculum
materials. In: REMILLARD, Janine. T; HERBEL-EISENMANN, Beth A.; LLOYD,
Gwendolyn Monica. (Ed.). Mathematics Teachers at Work: connecting curriculum
materials and classroom instruction. New York: Taylor & Francis, 2009, p. 17-36.

LUDKE, Menga; ANDRÉ, M. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas – São Paulo:


EPU, 1986. Temas básicos de Educação e ensino.

LUNA, A. V. A.; LIMA, L. B. S.; BARBOSA, J. C. A identificação de marcadores e a análise


de textos produzidos por crianças em processo de alfabetização com o uso de um material
didático. Perspectivas da Educação Matemática, v. 9, n. 21, 2016.

LUNA, A. V. A.; SANTANA, F. C. M.; MENDUNI-BORTOLOTI, R. D. A linguagem de


descrição: uma possibilidade de fazer pesquisas no campo da educação matemática.
Educação Matemática Pesquisa , 2018.

PEROVANO, Ana Paula. Educação Matemática e Educação Infantil: uma discussão a partir
do pensamento lógico argumentativo. In: XIII Conferência Interamericana de Educação
Matemática. 2011. Disponível em:
<https://www.academia.edu/4129583/Educa%C3%A7%C3%A3o_Matem%C3%A1tica_e_Ed
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B3gico_argumentativo> Acesso 06 jun. 2015.

POWELL, A. B.; SILVA, W. Q. O Vídeo na pesquisa qualitativa em educação matemática:


investigando pensamentos matemáticos de alunos. In.: POWELL, A. B. Métodos de pesquisa
em educação matemática: usando escrita, vídeo e internet. Campinas, SP: Mercado das Letras,
2015.

SANTANA, E. R. S.; TAXA-AMARO, F. DE O. S.; LUNA, A. V. A. ; BORTOLOTI, R. D.


A. M. Alfabetização matemática: Proposta didática para o professor 1° ano. 1ª. ed. Salvador:
Secretaria da Educação do Estado da Bahia/ IAT, 2013.

SKOVSMOSE, Ole. Cenários para investigação. 2000. Bolema, nº 14, p. 66 a 91, 2000.

ZABALA, A. A prática educativa: como ensinar. Tradução Ernani F. da F. Rosa.


PortoAlegre: Artmed, 1998

22
UMA PROPOSIÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA PARA
ANÁLISE DE RECONTEXTUALIZAÇÕES DE TEXTOS QUE
CIRCULAM EM CURSOS DE FORMAÇÃO CONTINUADA
Jaqueline de Sousa Pereira Grilo
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia/ GEPEMATE
jaqueline.pereira@ufrb.edu.br

Flávia Cristina de Macêdo Santana


Universidade Estadual de Feira de Santana/ GEPEMATE
flavia.cris@gmail.com

RESUMO

Esta pesquisa se configura como um ensaio que visa apresentar uma proposição teórico-
metodológica para análise de recontextualizações pedagógicas de textos que circulam em
cursos de formação continuada de professores. Para tanto, toma conceitos da Teoria dos
Códigos de Basil Berstein e estudos da área de Educação Matemática que problematizam o
conhecimento do professor de Matemática a fim de configurar a matemática para o ensino
resultante de um curso de formação continuada. A proposição teórico-metodológica que
resulta da análise empreendida nos dá indícios de que outras áreas do conhecimento também
poderão utilizá-la com o objetivo de identificar efeitos de cursos de formação continuada na
prática docente.
Palavras-chave: Recontextualização pedagógica. Proposição teórico-metodológica.
Formação continuada.

1 INTRODUÇÃO

Com base nos estudos sobre o domínio do conhecimento profissional do professor


desenvolvidos por Shulman (1987), pesquisadores da área de Educação Matemática têm
dedicado esforços para investigar os conhecimentos matemáticos dos professores. Entre esses
estudos, destacam-se os desenvolvidos pelo grupo liderado pela pesquisadora americana
Deborah Ball. Essas pesquisas têm recorrido ao estudo de Shulman para desenvolver a noção
de Mathematical Knowledge for Teaching, que traduzimos como Conhecimento Matemático
para o Ensino (CME). O CME diz respeito ao conhecimento matemático específico para o
ensino de Matemática que difere do conhecimento matemático necessário para outros
profissionais – um engenheiro, por exemplo (BALL; BASS, 2003).

23
A partir do refinamento do Conhecimento do Conteúdo e do Conhecimento
Pedagógico do Conteúdo elaborados por Shulman, os pesquisadores Ball, Thames e Phelps
(2008), identificaram a existência de subdomínios do CME. Assim, no Conhecimento do
Conteúdo foram identificados: Conhecimento Especializado do Conteúdo, Conhecimento
Comum do Conteúdo e Conhecimento Horizontal do Conteúdo. Já no Conhecimento
Pedagógico do Conteúdo, identificaram: Conhecimento do Conteúdo e Ensino, Conhecimento
do Conteúdo e dos Estudantes e Conhecimento do Conteúdo e do Currículo. Esse refinamento
da teoria estabeleceu uma agenda de pesquisas na área de Educação Matemática com o
propósito de identificar esses conhecimentos entre professores de matemática.
Sobre o Conhecimento Pedagógico do Conteúdo, por exemplo, Depaepe, Verschaffel
e Kelchtermans (2013) realizaram uma revisão sistemática que mapeou a forma como ele foi
conceituado e empiricamente estudado nas pesquisas em Educação Matemática. De modo
mais abrangente, após quase duas décadas de pesquisas, a revisão de literatura realizada por
Hoover et al. (2016) mapeou o que já é conhecido e o que ainda precisa ser investigado sobre
o CME. Segundo os autores, o campo ainda não tem uma definição teórica bem definida e
apontam algumas áreas-chave para o progresso das pesquisas.
Provavelmente, por não fazer parte do principal foco de análise, as duas revisões
citadas anteriormente não problematizam a presença na literatura de uma frente teórica que
discute o CME sob outra perspectiva epistemológica. Segundo Barwell (2013), a dificuldade
de identificação desses estudos reside no fato de que os pressupostos epistemológicos de
muitas pesquisas inspiradas no trabalho de Shulman não são declarados. Apoiando-nos no
trabalho de Barwell (2013), diremos que são estudos que não apresentam uma visão
representacional do conhecimento e que refletem os discursos que surgem nas salas de aula de
matemática, investigam o modo como professores organizam o ensino indo além da análise
do seu domínio sobre a Matemática e associamos à ideia de Mathematics for Teaching, em
sua livre tradução “Matemática para o Ensino” (MpE).
Apesar de alguns estudos tratarem CME e MpE como sinônimos (DAVIS; ADLER;
PARKER, 2007; KAZIMA; PILLAY; ADLER, 2008; ZAZKIS; LEIKIN, 2010; RHOADS;
WEBER, 2016), o CME parte do pressuposto de que o fazer do professor pode ser explicado
por meio de um conjunto de conhecimento próprio deste sujeito, como algo interno a ele. A
MpE, por outro lado, é entendida como tácito (DAVIS; SMMIT, 2006) e, portanto, afasta-se
das discussões sobre a necessidade de conhecimento do professor para aproximar-se das
formas de interação entre professores e alunos nas aulas de Matemática. Ou seja, a análise se
dá em torno de como professores selecionam a forma como irão abordar os conteúdos
matemáticos considerando o contexto em que estão inseridos.

24
Alinhando-se a essa perspectiva, Barwell (2013), apoiado na psicologia discursiva,
procura entender como os professores e os alunos se constróem como conhecedores, em vez
de tentar descobrir o que eles realmente conhecem e defende que esta abordagem oferece uma
análise sensível aos finos detalhes da vida em sala de aula.
Para Davis e Renert (2014), a MpE possibilitaria ao professor estruturar situações de
aprendizagem, interpretar atentamente as ações dos alunos e responder de forma flexível,
possibilitando que os alunos ampliem entendimentos e o alcance de suas possibilidades
interpretativas através do acesso a conexões eficazes e práticas apropriadas. Consideramos
que investigar a MpE perpassa por analisar formas emergentes de interação entre conceito
matemático-materiais didáticos-professor-aluno que são estabelecidas no ensino.
Sendo assim, nesta pesquisa estamos interessadas em apresentar uma proposição
teórico-metodológica que permite identificar como uma MpE se constitui a partir de um curso
de formação continuada. Na seção a seguir, apresentamos os conceitos teóricos que nos
permitiram, em confronto com dados empíricos, propor um esquema analítico para investigar
possíveis transformações na prática daqueles que participam do curso.

2 RECONTEXTUALIZAÇÃO PEDAGÓGICA E A MATEMÁTICA NO ENSINO

Apoiadas em conceitos teóricos bernsteinianos interpretamos as relações sociais como


de ordem discursivas, o que nos aproxima da concepção de MpE. De acordo com Rhoads e
Weber (2016), o conhecimento está situado em ambientes contextuais onde é usado. Segundo
os autores, essa mudança de perspectiva permite focalizar os benefícios, e não os déficits, de
conhecimento matemático dos professores. Um conhecimento que não é descontextualizado,
mas sim específico ao processo de ensino e, portanto, cursos avançados de matemática que
não abordam o ensino são de uso limitado para os professores.
Nesta mesma linha, Davis e Smmit (2006) destacam quatro aspectos que se entrelaçam
da MpE, ainda que não sejam exaustivos sobre o tema: objetos matemáticos; estruturas
curriculares; dinâmica coletiva; e, compreensão subjetiva. Assim, a atenção está direcionada
para as interações que ocorrem entre o que os professores mobilizam de matemática, ou têm a
necessidade de mobilizar, e como usam de acordo com as práticas pedagógicas que
participam. Tomamos o conceito de prática pedagógica da teoria de Bernstein (2000; 2003)
como uma relação social, regulada por princípios que determinam o que pode ser dito e como
pode ser dito, em que processos comunicativos materializam a produção e a reprodução
cultural.

25
Ao princípio que regula o quê pode ser dito em um determinado contexto e que
determina as regras de reconhecimento do que pode ser dito, Bersntein chamou de
classificação. Enquadramento foi o nome dado por ele ao princípio que determina a forma de
produção do texto, ou seja, como pode ser dito, e determina as regras de realização para a
produção desse texto. Sem a aquisição dessas regras não é possível uma comunicação
legítima.
A palavra “texto” é utilizada no sentido expresso por Bernstein (2000; 2003),
compreendido em seu sentido literal ou como qualquer representação pedagógica gestual,
falada, visual, espacial ou expressa no currículo. Segundo Bernstein (2000; 2003) a maneira
como uma sociedade seleciona, classifica, distribui, transmite e avalia os textos veiculados
nos processos comunicativos reflete na distribuição de poder e assegura o controle social em
seu interior.
Entretanto, estudos têm indicado que o conhecimento matemático aprendido em
cursos de formação inicial de professores raramente dá conta das demandas advindas da
prática de ensino (BALL; THAMES; PHELPS, 2008; ZAZKIS; LEIKIN, 2010; RANGEL;
GIRALDO; MACULAN FILHO, 2015). Neste contexto, muitas pesquisas sobre CME e MpE
vêm sendo desenvolvidas em cursos de formação continuada no intuito de analisar que
conhecimento matemático os professores têm e como utilizam no ensino.
O crescente interesse da área de Educação Matemática sobre a temática tem levado
pesquisadores brasileiros a adotar o concept study (DAVIS, 2010) como referência
metodológica para investigar o CME (RANGEL; GIRALDO; MACULAN FILHO, 2015) e o
MpE (COUTINHO; BARBOSA, 2016; MENDUNI-BORTOLOTI; BARBOSA, 2018;
SANTOS; BARBOSA, 2016). Em comum, essas pesquisas envolveram a participação de
professores em cursos de formação continuada e investigaram um conceito matemático
específico: números racionais (RANGEL; GIRALDO; MACULAN FILHO, 2015),
combinação simples (COUTINHO; BARBOSA, 2016), proporcionalidade (MENDUNI-
BORTOLOTI; BARBOSA, 2018); e função (SANTOS; BARBOSA, 2016).
Consonante ao nosso aporte teórico temos considerado que nestes cursos, sejam de
formação inicial ou continuada, circulam textos que podem ser identificados com os
conteúdos matemáticos, mas não exclusivamente. Para elucidar como um texto é
transformado desde o momento em que é criado até ser reproduzido, Bernstein (2000; 2003)
definiu três campos: o de produção, o de recontextualização e o de reprodução, que se
relacionam hierarquicamente. Assim, não há reprodução de um determinado texto sem que
haja sua recontextualização; do mesmo modo, não há recontextualização sem que o texto
tenha sido produzido.

26
Com o intuito de exemplificar esses campos, aproximando-os da nossa pesquisa,
associamos a Matemática Científica ao Campo de Produção (CP). A Matemática Científica,
sob um olhar bernsteiniano, diz respeito a um campo intelectual especializado, que se
estrutura por meio de regras próprias e explícitas, historicamente legitimadas pela
comunidade dos matemáticos. Os campos de recontextualização podem ser de dois tipos:
oficial (formado pelo Estado e seus agentes) e pedagógico (constituído por formadores de
professor, cursos de formação continuada, autores de livros, dentre outros) e são organizados
a partir da seleção de textos do CP. Os Campos de Reprodução (CR), por sua vez, podem ser
associados às salas de aula da Educação Básica.
No contexto da pesquisa, estamos interessados no processo de transformação de textos
efetuado no Campo de Recontextualização Pedagógica (CRP), aqui representado por um
curso de formação continuada, e nas insubordinações criativas1 (GUTIÉRREZ, 2016)
operadas pelos professores quando materializam esses textos no CR. Ao processo de
deslocamento de textos do CRP para o CR, Bernstein (2000; 2003) chamou de
recontextualização pedagógica.
Para ilustrar a nossa proposição teórico-metodológica, apresentamos um episódio
ocorrido no Programa de Mestrado Profissional em Matemática em Rede Nacional
(PROFMAT), curso de formação continuada, em nível de mestrado, ofertado em rede
nacional. A escolha pelo programa deve-se ao fato dessa pesquisa estar vinculada a uma
pesquisa maior2 que tem o PROFMAT como objeto de análise, desenvolvida na Universidade
Estadual de Feira de Santana pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Matemática e Educação
(GEPEMATE)3.
De acordo com Bernstein (2000; 2003), a principal atividade do Campo
Recontextualizador é apropriar-se de textos do Campo de Produção para transformá-los em
discurso pedagógico. Segundo Bernstein (2000; 2003), o discurso pedagógico constitui-se a
partir da integração de dois discursos: um instrucional e o outro regulativo. O primeiro deles é
responsável pela transmissão/aquisição de competências e destrezas de vários tipos, e
podemos exemplificá-lo como a transmissão/aquisição de conteúdos matemáticos
compartilhados no PROFMAT. Já o discurso regulativo é de ordem moral e diz respeito à

1
A expressão “insubordinação criativa” surge na década de 1980, quando pesquisadores o utilizam para
identificar o trabalho de diretores de escola que resistem às políticas e diretrizes autoritárias para proteger os
professores. Com relação ao ensino de Matemática, a insubordinação criativa inclui os seguintes atos: aproxima
a Matemática ao contexto; questiona as formas de matemática apresentadas na escola; destaca a humanidade e a
incerteza da matemática; posiciona estudantes como autores de matemática; desafia narrativas deficitárias sobre
estudantes negros, pobres. (GUTIÉRREZ, 2016)
2
Pesquisa coordenada pelo prof. Dr. Jonei Cerqueira Barbosa intitulada: “Professores de Matemática e o
Programa Profmat: uma análise sobre suas identidades e recontextualizações pedagógicas”.
3
O GEPEMATE, assim como o Núcleo de Estudos em Educação Matemática de Feira de Santana (NEEMFS), é
um grupo de pesquisa que tem como uma das linhas de pesquisa Formação do professor que ensina Matemática.

27
transmissão de princípios de conduta e valores. Entendemos princípios como as regras,
consideradas legítimas para uma determinada prática pedagógica, que determinam as
condutas de ordem social e as formas de organização do tempo, do espaço e do conteúdo. Na
relação existente entre esses dois discursos, o regulativo é sempre o dominante.
Segundo Bernstein (2000; 2003), esses discursos apresentam-se embutidos, e por essa
razão, não faz sentido falar da existência de dois discursos, mas de apenas um. Assim, o
discurso pedagógico é um princípio recontextualizador que seletivamente se apropria de
textos de um dado contexto no intuito de recolocá-los, refocalizá-los e relacioná-los com
outros textos de diferentes contextos. Esse princípio regula o novo posicionamento ideológico
do texto; seja criando, mantendo, mudando e/ou legitimando o texto, a sua transmissão e as
práticas organizacionais que regulam os ordenamentos internos do discurso pedagógico.
Nesse sentido, os textos que circulam no PROFMAT, ao serem movidos para as salas
de aula nas escolas, sofrem modificações que não permitem mais serem igualados aos textos
originais. No âmbito do PROFMAT espera-se que as transformações ocorridas nos textos
levem em consideração a prática pedagógica escolar.

2.1 A IDENTIFICAÇÃO DE UMA MATEMÁTICA NO ENSINO

Inspiramo-nos no conceito de insubordinação criativa de Gutiérrez (2016) para


identificar na literatura estudos que conseguiram ir além dos conceitos teóricos já
consolidados e esboçam outras possibilidades de leitura do que está posto. Destacamos,
inicialmente, dois ensaios teóricos que se debruçaram sobre o conceito de Recontextualização
Pedagógica e, em seguida, um estudo empírico no qual identificamos a diferenciação entre
MpE e o que os autores chamaram de Matemática no Ensino (MnE). A leitura desses estudos
nos mostram a necessidade de outras pesquisas investigarem empiricamente suas teorizações
a fim de que possam contribuir com o refinamento dos conceitos elaborados e, até mesmo,
propor novas conceptualizamos.
Destacamos inicialmente o estudo de Jablonka e Gellert (2010), do qual se depreende
a noção sobre Recontextualização Dupla. Segundo os autores, a Matemática veiculada na
escola pode ser vista como resultado de uma subordinação do que identificamos como
Matemática Científica aos princípios pedagógicos e didáticos e, ao mesmo tempo, ela
recontextualiza atividades cotidianas, subordinando-as a um olhar matemático. Esse processo
de recontextualização dupla constrói um híbrido entre a Matemática e as práticas cotidianas e,
segundo os autores, pode ser identificado em diferentes métodos de ensino, a saber:
investigações e resolução de problemas, etnomatemática,

28
modelagem matemática, alfabetização matemática crítica. Jablonka e Gellert (2010) advogam
que esses métodos representam diferentes potenciais, armadilhas, (des)vantagens e
discriminações para diferentes grupos sociais.
Em seu ensaio teórico, Barbosa (2013) ilustra a noção de Recontextualização Reversa
(RR) a partir um diálogo ocorrido entre professores da Educação Básica em um curso de
formação continuada. Segundo o autor, a RR pode ser identificada quando os professores, ao
participarem de atividades no CRP deslocam princípios que regulam as práticas no CR. Esse
movimento reverso, do CR para o CRP, não foi conceptualizado por Bernstein (2000; 2003).
Por meio de um estudo empírico, Santos e Barbosa (2016), para desenvolver um
modelo teórico de Matemática para o Ensino do Conceito de Função, investigaram um grupo
de professores em um curso de formação continuada e apoiaram-se metodologicamente no
concept study (DAVIS, 2010). O modelo teórico foi construído a partir das interações
discursivas entre os professores cursistas e os pesquisadores em torno de um conceito
matemático específico.
Diante disso, identificamos a MpE no CRP. Ou seja, diz respeito às interações
discursivas que envolvem conteúdos matemáticos para fins de ensino. É expressa, por
exemplo, em livros didáticos que norteiam a prática pedagógica na sala de aula ou no diálogo
entre professores sobre um determinado conteúdo em cursos de formação continuada.
Depreendemos do estudo de Santos e Barbosa (2016) e de Barbosa (2016) que os
professores assumem papéis diferentes quando comunicam conteúdos matemáticos. O
primeiro diz respeito ao modo como mobilizam e comunicam esses conteúdos para fins de
ensino, traduzindo a ideia de MpE; e o segundo diz respeito à comunicação de conteúdos
matemáticos no ensino, na prática pedagógica na escola, traduzindo a ideia de Matemática no
Ensino (MnE).
Concordamos com Rhoads e Weber (2016) quando eles apontam a necessidade de
estudos que investiguem não apenas as percepções dos professores sobre o ensino, mas o que
eles realmente fazem em sala de aula. Os autores supõe que o conhecimento matemático dos
professores está vinculado ao contexto, por isso destacamos a necessidade de descrever como
os fatores contextuais específicos regulam a MnE e as possibilidades de insubordinações
criativas.

3 DESENHO DA PROPOSIÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA

Face ao exposto nas seções anteriores, visando contribuir com o refinamento do


conceito de recontextualização pedagógica e com a área de

29
Formação de Professores de Matemática, apresentamos o esquema abaixo que visa
representar as recontextualizações pedagógicas que podem ser mobilizadas por professores
em um curso de formação continuada.

CAMPO DE RECONTEXTUALIZAÇÃO CAMPO DE REPRODUÇÃO


PEDAGÓGICA
Recontextualização
CURSO DE FORMAÇÃO SALAS DE AULA NA
Reversa
CONTINUADA EDUCAÇÃO BÁSICA

MpE2 MpE1
MpE MnE

Recontextualização Pedagógica

Esquema 1 – Representação esquematicamente das recontextualizações de textos de um curso de formação


continuada.
FONTE: As autoras.

A partir de lentes teóricas bernsteinianas, ilustramos no Esquema 1 a nossa proposição


teórico-metodológica. Nela localizamos os dois campos do sistema educacional definidos por
Bernstein (2000; 2003) que podem ser mobilizados em investigações que tematizam a
recontextualização de textos de cursos de formação continuada: o CRP, onde localizamos os
cursos de formação continuada e o CR, onde localizamos as salas de aula da Educação Básica
em que atuam os professores que frequentam esses cursos.
Esses professores antes de iniciarem o curso participaram de outras práticas que
comunicaram uma matemática para o ensino, por exemplo, quando organizam suas aulas a
partir do livro didático. Essa matemática para o ensino, anterior ao curso de formação
continuada, identificamos no esquema como MpE1. Considerando o PROFMAT como o
curso de formação continuada, diremos, de acordo com o seu objetivo, que a MpE2 é fruto de
interações discursivas em torno do domínio aprofundado do conteúdo matemático que
ocorrem no âmbito do curso. Defendemos que a MpE resultante da participação no curso é
resultado de um híbrido entre a MpE1 e MpE2.
A linha contínua na região elíptica onde identificamos o PROFMAT faz alusão à
preservação da força dos princípios de classificação e de enquadramento que tendem a
preservar o caráter distinto e especializado da Matemática Científica como apontaram
Caldatto, Pavanello e Fiorentini (2016). A linha tracejada na região elíptica onde
identificamos o a sala de aula da Educação Básica, por sua vez, faz alusão o enfraquecimento
da força dos princípios de classificação e de enquadramento que tendem constituir a

30
Matemática Escolar como resultado de múltiplos discursos conforme apontou Jablonka e
Gellert (2010).
O uso das setas, ligeiramente curvadas, se deu no sentido de imprimir a noção de
movimento, deslocamento, transformação de textos de um contexto a outro. Assim, se o
formador no curso de formação continuada mantiver uma classificação mais fraca
possibilitará, por exemplo, que os professores, por meio da recontextualização reversa,
comuniquem textos que constituem MpE1 com base em princípios que regulam a prática na
escola. Por fim, apresentamos que a MnE é resultado da Recontextualização Pedagógica da
MpE constituída a partir da interação entre a MpE1 e a MpE2.
Para ilustrar o esquema apresentado acima, apresentamos um episódio extraído de uma
turma do PROFMAT. No mesmo, nos referimos ao professor da Universidade que ministra o
curso como formador e ao professor da Educação Básica que frequenta o curso como
professor.

(01) Formador: Certo? É uma pergunta muito simples. Você pega um círculo, você
está no plano. E aí agora você pega uma reta.
(02) Professor L: Mas Grilo, o círculo eu falo circunferência.
(03) Formador: Bom, aí é questão de nomenclatura. Tanto faz eu chamar círculo ou
circunferência. Por exemplo, quando você fala do quadrado, para você o quadrado é
o polígono ou a região? Tanto faz você chamar isso aqui [apontando para a figura no
quadro] de círculo ou chamar de circunferência. É só você deixar claro o
componente que você está usando; porque usa esses dois indistintamente. Qual é a
área deste triângulo aqui? Base vezes altura dividido por dois . Quais são
os lados desse triângulo? Ah, qual é a medida desse ângulo? O cosseno desse
ângulo? O cateto oposto, a hipotenusa... Seno, cateto adjacente, tal... Quer dizer,
então, você usa triângulo pra representar duas coisas aparentemente distintas: que é
o polígono e a região toda, a região triangular. Eu acho que para os estudantes é até
melhor a gente não fazer essa distinção. Porque como eu já falei, o excesso de
formalização atrapalha um pouco o estudante. Eu não sei se eu já comentei com
vocês, eu acho que já, quando se fala equações; aí ah, equação completa e
incompleta. Aí você coloca uma equação desse tipo e diz, oh, o que está faltando
para ela ser completa? É uma equação. Então você não precisa fazer esse tipo de
distinção.
(04) Professor P: Mas é essa distinção que está lá no livro didático que o aluno...
(05) Formador: Às vezes, você não precisa fazer a distinção, é isso que eu estou
falando. Isso não precisa. Você vai calcular a área do círculo, ou a área da
circunferência.
(06) Professor P: Eu não estou nem discutindo para gente, porque a gente entende.
Eu estou discutindo pensando nos meus alunos.
(07) Formador: Mas é isso que eu estou dizendo. Eu estou falando dessa distinção
com os alunos, se você quiser fazer a distinção e acha melhor para os seus alunos
fazer essa distinção, não tem problema. Se não fizer também não tem problema;
porque é só questão de nome. É só questão de nome.
(08) Professor O: Eu ia fazer o mesmo questionamento que você fez, mas quando
ele deu o exemplo dos quadrados eu já fiquei convencido porque você fala de
quadrados, você está falando da limitação do perímetro do quadrado. Então a gente
só faz essa distinção no círculo e na circunferência. Então isso aí já me convenceu.

O episódio nos mostra, turnos de fala (03), (05) e (07), que o formador enuncia textos

31
que demarcam uma matemática para o ensino que privilegia a produção de um texto
matemático livre de formalizações excessivas, pois considera que no contexto da Educação
Básica essa formalização dificulta a compreensão de conceitos matemáticos por parte dos
estudantes. A essa matemática para o ensino apresentada pelo formador associamos no nosso
esquema a MpE2. No turno de fala (04) observamos que o professor mobiliza, via
recontextualização reversa, uma matemática para o ensino apresentada pelos livros didáticos
da Educação Básica e no turno de fala (06) dá indícios de que toma como referência a própria
prática. A essa matemática para o ensino resultante de uma recontextualização reserva
denominamos de MpE1. O turno de fala (08) mostra que a participação em um curso de
formação continuada permite que os professores constituam uma nova MpE que é resultado
de um híbrido entre a MpE1 e MpE2.
O episódio acima mostra os processos de transformação de um texto dentro de um
curso de formação continuada, o que nos possibilitou identificar a constituição de uma MpE a
partir da participação no curso.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste artigo apresentamos uma proposição teórico-metodológica para análise de


recontextualizações pedagógicas de textos que circulam em cursos de formação continuada de
professores. Para tanto, nos inspiramos em conceitos teóricos bernsteinianos que nos
permitiram identificar que os professores mobilizam textos, via recontextualização reversa,
próprios do contexto escolar que ao contato com textos enunciados no curso de formação se
transformam a fim de constituir uma nova matemática para o ensino.
Destacamos, entretanto, que quanto mais fracos forem os princípios de classificação e
de enquadramento há mais possibilidades de transformações nos textos oriundos do contexto
escolar pois permitem que os professores, por meio da recontextualização reversa,
comuniquem textos com base em princípios que regulam a prática pedagógica na escola que
podem ser transformados a partir da inserção em cursos de formação continuada.
Apesar do esquema que resulta da nossa proposição teórico-metodológica tratar de
processos de recontextualização de textos que constituem uma matemática para o ensino,
acreditamos que este mesmo esquema pode ser utilizado por outras áreas do conhecimento,
em investigações que tenham como objetivo analisar as mudanças na prática oriundas da
participação em cursos de formação continuada.

32
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