Sei sulla pagina 1di 15

Redescobrindo a Mãe Igreja

Seria “’presbiterianismo high-church” um oximoro?

As palavras “high-church” e “presbiteriano” raramente encontram-se juntas, e por bom motivo.


Os presbiterianos anglo-americanos e seus irmãos reformados no continente europeu nunca se
distinguiram por possuir as mais refinadas sensibilidades litúrgicas ou mecanismos altamente
eficientes para proteger as prerrogativas do clero.

Claro, para os descendentes de Calvino, teologia é moleza. Mas, no espectro eclesiástico


protestante, de alto a baixo, o máximo que os presbiterianos conseguem é se posicionar mais
ou menos onde os congregacionais estão, ali no centro, com os luteranos e episcopais acima e
o metodistas e os batistas abaixo. Isso pode ajudar a explicar o velho dito de que batistas são
metodistas com sapatos, e presbiterianos são batistas que sabem ler.

Por mais decente e ordeiro que seja aos presbiterianos habitar no centro das noções
protestantes sobre liturgia e ministério da Igreja, ainda assim, se deixados por conta própria,
eles invariavelmente descerão às regiões mais baixas das sensibilidades eclesiásticas. Assim,
para batistas em ascensão, a opção presbiteriana é bastante feliz, já que ela raramente exige
um ajuste significativo muito além de se entender com o Batismo infantil.

Minha esposa e eu fomos criados em congregações batistas fundamentalistas e agora


pertencemos à Orthodox Presbyterian Church (OPC), uma denominação basicamente low-
church. Cinco entre seis de nossos irmãos e irmãs já foram membros do equivalente sulista da
OPC, a Presbyterian Church in America (PCA). Embora essa evidência seja empírica, ela confirma
o argumento de que o presbiterianismo não é algo muito distante dos batistas. Na verdade,
pode até ser que seja a preferência denominacional de batistas experimentando ascensão
social.

Conquanto o presbiterianismo ofereça uma forma mais elitizada de cristianismo protestante aos
batistas, seus impulsos low-church são legião para os crentes que almejam uma expressão mais
sóbria e formal de devoção. Nós já estamos bastante longe da publicação de Evangelicals on the
Canterbury Trail1, de Robert Webber, para alegar que presbiterianos em busca de um culto sério
estejam se tornando episcopais. Isso pode ter sido verdade nos anos 70, mas os presbiterianos
buscando ascensão eclesiástica hoje ampliaram seus horizontes e podem agora ser encontrados
entres os ortodoxos orientais e os católicos romanos.

Rara é a congregação presbiteriana que ofereça a almas de mente litúrgica um lar acolhedor.
Outros presbiterianos, ao tentar extrair graciosidade litúrgica de uma tradição que aparenta não
ter nenhuma, recorrem a uma forma intelectualizada de culto misto. Ao invés de introduzir
cânticos de louvor e corinhos na liturgia presbiteriana média – o culto misto mais informal –
aqueles que querem uma formalidade maior importam elementos litúrgicos de outras tradições
high-church ao culto presbiteriano.

Presbiterianos podem ser high-church?

Mas talvez seja desnecessário ir embora de uma vez para outras tradições ou suplementar a
devoção presbiteriana com material anglicano ou ortodoxo. Talvez exista, enterrada no meio da
massa histórica de presbiterianismo low-church, uma tradição high-church tão divinamente
ordenada e liturgicamente bem concebida quanto o melhor que há nas outras tradições mais

11
N. do T.: Em tradução livre, Evangélicos na Trilha para Cantuária.
elevadas na escala. Se for assim, então presbiterianismo low-church é que seria o verdadeiro
oximoro.

Muitos cristãos podem se surpreender com as tendências high-church dentro da tradição


reformada, presbiterianos, talvez, figurando entre os mais surpresos. Protestantes na América
do Norte estão tão habituados a lembrar-se apenas dos sentimentos anti-papistas que se
esquecem de quantas práticas e crenças da cristandade foram perpetuadas em igrejas luteranas
e calvinistas, dentre as quais destacam-se o respeito pelo ritual, pela formalidade e pelo santo
ministério. A Reforma Protestante, afinal de contas, foi justamente isso: uma reforma das
formas e estruturas, não um repúdio a ritual e legítima autoridade eclesiástica (obviamente, isso
é discutível para os católicos romanos).

De fato, é uma distorção grosseira atribuir à tradição reformada especificamente as


características low-church que dominam o evangelicalismo nos EUA. Os primeiros credos das
igrejas presbiterianas e reformadas pressupunham uma alta estima pelo ministério ordenado
da Igreja: da função dos pastores aos meios de graça, bem como adesão às formas corretas de
liturgia e governo. Os reformadores consideravam a Igreja Católica Romana corrompida, mas
em nenhum lugar demonstraram o tipo de desprezo pela Igreja visível e pelas expressões
comunitárias da devoção cristã que algumas vezes têm caracterizado o protestantismo
americano. Apenas no século XVII, a era do pietismo e do puritanismo, foram amplamente
questionadas as visões high-church.

A área mais óbvia onde se separam os protestantismos high-church e low-church é o culto.


Deixando os Sacramentos de lado por um momento, a liturgia high-church é mais formal,
reservada e usa formulários e rituais aprovados, enquanto o culto low-church tende mais ao
espontâneo e a expressões da devoção popular. Seria vão procurar por informalidade ou
expressões individuais nas liturgias reformadas dos séculos XVI e XVII. De fato, praticamente
todas as igrejas da ala calvinista da Reforma produziram e usaram formas escritas e seguiam
uma ordem de culto definida. Em outras palavras, a unanimidade litúrgica prevaleceu tanto
entre as igrejas reformadas dos Países Baixos e as igrejas presbiterianas da Escócia quanto entre
os protestantes ingleses que seguiam o Livro de Oração Comum.

Este é precisamente o intuito por trás do livro A Liturgia Reformada23, de Charles Baird, uma
coletânea de formulários e cultos das igrejas reformadas da Europa e Grã-Bretanha. Um jovem
ministro presbiteriano do século XIX, Baird reuniu as liturgias das igrejas reformadas por causa
da frustração com o Diretório de Culto Público4 de sua igreja. Por um lado, Baird cria que as
instruções gerais do Diretório para a organização do culto impediam “o uso das melhores
composições litúrgicas”, forçando, assim, a dependência “em nossas capacidades individuais de
criação, por mais grosseiras, escassas e imaturas que fossem”.

Baird preocupava-se com a qualidade da expressão litúrgica e desejava que o culto fosse
“desempenhado com dignidade e propriedade” a fim de que, nas palavras do Diretório de
Westminster, “não fosse desonrado com efusões vis, irregulares ou extravagantes”. Por
conseguinte, Baird devotou três capítulos para as liturgias de Calvino, um para liturgias
reformadas da França, duas ao presbiterianismo escocês, três para desenvolvimentos ingleses
entre os puritanos e a Igreja da Inglaterra, um para os reformados holandeses, um para os

2
Tradução brasileira: http://www.ky1.com.br/index.php?route=product/product&product_id=969
3
N. do T.: O título original do livro de 1855 é Eutaxia, or the Presbyterian Liturgies, mas Hart usa apenas
Presbyterian Liturgies.
4
Directory for Public Worship.
reformados alemães e, finalmente, um para o presbiterianismo americano de estirpe mais
elevada. Todas as igrejas ordenavam seus cultos segundo o padrão geral estabelecido por
Calvino em Genebra, que seguia assim:

o Invocação
o Confissão de Pecados
o Oração por Perdão
o Cântico de um Salmo
o Oração por Iluminação
o Lições da Escritura
o Sermão
o Coleta das Ofertas
o Orações de Intercessão
o Credo Apostólico (cantado enquanto os elementos da Ceia do Senhor eram preparados)
o Palavras da Instituição
o Instrução e Exortação
o Comunhão
o Oração de Ação de Graças
o Bênção

Surpreendentes Orações – e escritas!

Com exceção das igrejas presbiterianas que seguem o estilo litúrgico de Louvor & Adoração,
dividindo o culto ao meio (30 minutos de cantoria, 30 minutos de palavra), a maioria das igrejas
presbiterianas hoje seguem esse modelo de algum modo. E é por isso que a ordem de culto não
é o suficiente para qualificar alguém a ser incluído na ala high-church do protestantismo. Mais
importante do que a liturgia estruturada é o uso de formas e orações escritas.

Outra vez: presbiterianos devem ser os mais surpresos ao descobrirem quantas orações os
reformadores escreveram não apenas porque aqueles que ouviam seus sermões ou palestras as
transcreviam, mas porque os líderes protestantes compuseram orações para serem usadas por
outros membros e oficiais da igreja. No sentido de um presbiterianismo high-church que usa
orações escritas, pouquíssimas congregações se qualificariam como high-church; e aquelas que
usam, sim, estes textos, costumam mesclar elementos litúrgicos de tradições não reformadas,
pois aparentemente não conhecem a existência das orações usadas pelos seus antepassados
teológicos. A sensibilidade low-church está tão inculcada no consciente presbiteriano [moderno]
que qualquer anseio por uma expressão mais dignificada de culto resulta em ter-se de buscar
algo nas liturgias episcopais ou ortodoxas orientais.

Contudo, como indica Baird no livro A Liturgia Reformada, os líderes das igrejas reformadas e
presbiterianas nos séculos XVI e XVII não apenas forneciam a ordem do culto, mas também as
orações e formulários a serem usados. Por exemplo, a liturgia genebrina de Calvino incluía todas
as orações: as de confissão de pecado, por iluminação e intercessão. Esta última começava deste
modo:

“Deus Todo Poderoso, nosso Pai celestial, que prometeste nos conceder nossos pedidos no nome
de teu muito amado Filho, tu nos ensinaste em seu nome também a nos reunirmos, seguros de
que ele estaria presente em nosso meio a fim de interceder por nós diante de ti e de obter-nos
todas as coisas em que concordemos nesta terra em te pedir. Portanto, estando nós em tua
presença, dependentes de tua promessa, nós sinceramente te buscamos, ó gracioso Deus e Pai,
por causa daquele que é nosso único Salvador e Mediador, para que em tua infinita misericórdia
tu possas perdoar as nossas ofensas, e então elevar nossos pensamentos a ti e atrair nossos
desejos em tua direção, de modo que possamos buscar-te segundo tua santa e razoável
vontade.”5

Calvino não apenas escreveu orações para pastores usarem no culto público, mas também
orações para que os pais usassem em casa. De fato, até a introdução do novo hinário Psalter
Hymnal em 1987, o hinário da Christian Reformed Church6 incluía as orações de Calvino para os
cultos público e doméstico, além de outras orações para as reuniões da igreja. As orações para
as famílias eram em número de quatro: uma para o início do dia, outra para o fim, outra para
antes das refeições e outra para depois.

A reprodução dessas orações nos hinários indica que a prática do ramo continental da tradição
reformada teria incluído formalidade nas expressões de devoção tanto na igreja quanto em casa.
A imagem que vem à mente da liturgia reformada e do culto doméstico é uma onde os crentes
valem-se não apenas da Bíblia, mas também de um outro livro; um que inclua orações para
exprimir seu louvor, ações de graças e petições a Deus.

Os Bons Motivos de Calvino

Imaginar crentes reformados com seus olhos abertos durante a oração por estarem usando um
livro de oração é algo que seria considerado por muitos presbiterianos de hoje como um sinal
de rigidez cadavérica espiritual. Em muitos círculos presbiterianos, é comum presumir que a
verdadeira fé se expressa de modo espontâneo e sem adereços de formalismo (i.e., ortodoxia
“morta”).

Mas Calvino tinha boas razões para escrever orações não apenas para famílias, mas também
para pastores. “Eu altamente aprovo que haja um texto estabelecido”, ele declarou, “do qual os
ministros não devem ser permitidos desviar: primeiro, para que alguma provisão seja tomada
para ajudar a simplicidade e inabilidade de alguns; segundo, para que o consentimento e
harmonia das igrejas uma com a outra seja aparente; por último, que a frivolidade caprichosa e
leviandade de inovações afetadas possa ser evitada”7.

O que impressiona nas razões de Calvino para orações escritas é que elas cabem perfeitamente
dentro da gama de sentimentos que algumas vezes levam presbiterianos a buscar expressões
de devoção high-church fora das igrejas reformadas. Primeiro, ele admite implicitamente que
algumas pessoas oram melhor do que outras e que o culto, que é feito para o prazer de Deus,
deveria utilizar os melhores esforços que a Igreja é capaz de produzir. Em outras palavras, o
culto não é um tipo de programação inclusiva que permite a todos tempo igual durante a liturgia.
É melhor usar orações consideradas superiores, mesmo se feitas pelos santos do passado, do
que dar precedência às palavras amontoadas pelo pastor atual simplesmente porque a ele foi
dada agora a responsabilidade de orar.

Segundo, Calvino considera uniformidade na expressão litúrgica uma coisa boa, e não um sinal
de acomodação, um sentimento que contrasta tanto com a diversidade litúrgica que hoje
prevalece entre presbiterianos quanto com a lógica da contextualização cultural, que
frequentemente justifica esse tipo de diversidade litúrgica. Para Calvino, a teologia reformada

5
BAIRD, Charles W. The Presbyterian Liturgies: Historical Sketches. Grand Rapids: Baker Book House,
1957, p. 38 (tradução livre).
6
N. do T.: Denominação americana de origem holandesa
7
BAIRD, op. cit., p. 23 (tradução livre).
deveria incorporar certos modos de fazer litúrgicos, não sendo, portanto, uma substância
amorfa que pode tomar qualquer forma, contanto que seja sincera ou zelosa.

Finalmente, ele acreditava que orações escritas preveniam o tipo de insolência e desrespeito
tão frequentemente expressos na prática da oração espontânea, especialmente quando os
critérios são sinceridade e paixão, não dignidade e respeito.

Em outras palavras, todos esses motivos sugerem que, se Calvino fosse vivo hoje, ele estaria
buscando uma liturgia high-church juntamente com os presbiterianos desapontados atraídos a
Cantuária ou Constantinopla. Isso é um outro modo de dizer que a estrada para a velha Genebra
pode oferecer uma forma de culto tão sóbria e cuidadosa quanto as das tradições high-church
de hoje.

A Ceia como Palavra & Sacramento Visíveis

Para além de sua compreensão da oração, a estima que Calvino tem pela Ceia do Senhor dá
ainda mais base para presbiterianos em busca de uma liturgia mais elevada. Todo presbiteriano
frustrado pela administração da Ceia com frequência mensal a trimestral na maioria das igrejas
presbiterianas e reformadas encontrará um bem-vindo alento no desejo de Calvino por uma
observância semanal. Contudo, ainda mais importante do que o ajuste litúrgico que a
observância semanal implica – não apenas na extensão do culto, mas em sua seriedade – é a
compreensão de Calvino da presença real de Cristo na Ceia.

O aspecto do culto reformado que o distingue dos das demais tradições da Reforma é a
centralidade do sermão; e é precisamente essa prática de ter uma exposição longa da Escritura
que parece conflitar com o alto apreço pela Ceia e por sua frequente administração. Alguns têm
argumentado que, ao tornar a Palavra de Deus tão central no culto e, assim, dar mais peso ao
sermão, a tradição reformada teria negligenciado a última parte do binômio Palavra e
Sacramento.

Conquanto cristãos presbiterianos e reformados posteriores possam ter deslizado no que diz
respeito à Ceia do Senhor, nem Calvino, nem as primeiras gerações de crentes reformados o
fizeram. Na verdade, ao invés de ensinar que a Ceia era algo que suplementava o ministério mais
central da palavra [pregação], Calvino ensinava que os elementos do Santo Batismo e da Ceia
do Senhor eram formas visíveis da Palavra. Assim como o sermão comunicava verbalmente a
promessa do perdão de Deus em Cristo, assim também os Sacramentos representavam essas
mesmas promessas graficamente. Calvino escreveu: “Está errado aquele que pensa que algo
mais é-lhe conferido pelos Sacramentos do que o que é oferecido pela Palavra de Deus e
recebido por verdadeira fé”.

Concomitantemente, se os Sacramentos não apresentam mais do que a palavra pregada, o


inverso também pode ser afirmado, ou seja, que o Batismo e a Ceia não conferem nada a menos.
Como Brian A. Gerrish argumentou: “os Sacramentos, assim como a pregação, são o veículo da
autocomunicação de Cristo, da presença real”. Gerrish acrescenta: “Apenas a mais perversa
leitura equivocada poderia concluir que, para Calvino, os Sacramentos tinham uma função
puramente simbólica ou pedagógica”.

Por este motivo, é adequado para os que são de tradição calvinista falar da presença real de
Cristo na Ceia do Senhor. A presença de Cristo nos Sacramentos decorre da natureza dos
símbolos como Calvino os concebia. Apesar de ser possível distinguir entre os símbolos e a coisa
simbolizada, Calvino escreveu que isso é uma “distinção sem divisão”. Em outras palavras, é
possível distinguir a substância do símbolo, mas é impossível separá-los. E porque o próprio
Cristo é a substância da Ceia, o pão e o vinho são nada menos que, nas palavras de Gerrish,
“garantias da presença real”.8

Peso Litúrgico

Por este motivo, crentes reformados deveriam também estar confortáveis com a terminologia
de meios de graça. Fique-se claro que a perspectiva low-church dos presbiterianos de hoje lhes
faz estremecer com essa noção devido à sua associação com sacerdotalismo. Ainda assim, as
primeiras expressões da tradição reformada no século XVI não eram hesitantes em afirmar que
Deus usava os meios da Palavra e dos Sacramentos para, nas palavras do Breve Catecismo de
Westminster, “comunicar os benefícios da redenção”9. Não apenas a Ceia do Senhor nutre e
edifica os crentes na esperança do Evangelho, mas ainda, como o Breve Catecismo também
explica, os que a recebem dignamente, não corporalmente ou carnalmente, mas por fé, tornam-
se “participantes do seu corpo e do seu sangue, com todas as suas bênçãos”10.

Para se resguardar do sacerdotalismo, a tradição reformada entende que a eficácia dos


Sacramentos depende unicamente da bênção de Cristo, do trabalho do Espírito Santo e da fé do
recipiente. Em outras palavras, a Ceia não confere graça automaticamente, embora algo sempre
aconteça, seja em forma de bênção ou maldição.

Ainda assim, os meios de graça para os reformados são exatamente isso: meios, não apenas
símbolos, pelos quais Deus trabalha nas vidas de seu povo. Dada essa compreensão dos
Sacramentos, a tradição reformada não é oposta a ritos ou cerimônia. Antes, é uma questão de
quais ordenanças Deus prometeu usar para a bênção e edificação dos crentes. Os bons rituais
são a Palavra e os Sacramentos. Os maus rituais são quaisquer que tenham sido inventados pela
sabedoria humana sem sanção na Escritura, por melhor que tenha sido a intenção.

E mais, uma visão elevada da Ceia do Senhor, segundo Calvino, não diminui uma estima elevada
da pregação. Na verdade, a leitura de alguns dos primeiros credos reformados apresenta um
conceito de pregação que faria a maior parte dos presbiterianos de hoje, que enfatizam uma
boa pregação (e negligenciam os Sacramentos) e reclamam que sermões de 30 minutos são
muito curtos, parecerem dóceis.

Contrariamente à imagem contemporânea do sermão como recurso de ensino que equipa o


laicato para a ideia de “cada membro, um missionário”, cristãos reformados dos séculos XVI e
XVII encaravam o sermão como um ato divino. Inerente à liturgia reformada é o princípio
dialógico que considera o culto uma santa conversa entre Deus e seu povo. Deus o inicia por
meio da Palavra, crentes respondem em louvor, oração, ouvindo a Palavra lida e pregada e
recebendo os Sacramentos.

Todavia, o discurso de Deus não se estende apenas aos elementos do culto onde sua Palavra é
lida, como na saudação apostólica, as lições, Palavras da Instituição ou a Bênção. O discurso
inclui também as palavras do próprio ministro. De acordo com a Segunda Confissão Helvética,
capítulo primeiro, “quando esta Palavra de Deus é agora anunciada na Igreja por ministros
legitimamente chamados, [...] a própria Palavra de Deus é anunciada e recebida pelos fiéis”.

8
GERRISH, B.A. John Calvin and the Reformed Doctrine of the Lord’s Supper. McCormick Quarterly. V.
22, n. 2, 1969, pp. 8-9.
9
N. do T.: Pergunta 85 do Breve Catecismo de Westminster.
10
N. do T.: Pergunta 96 do Breve Catecismo de Westminster.
Tal conceito de pregação obviamente aumenta o que está em jogo quando o ministro sobe ao
púlpito. O que está em jogo também aumenta quando Heinrich Bullinger escreve mais adiante
na Segunda Confissão Helvética que a pregação, não obstante realizada por um homem não
regenerado, é a própria palavra de Deus. Aqui a tradição reformada apelou ao argumento de
Agostinho contra os donatistas e contendeu que “a voz de Cristo deve ser ouvida, mesmo dos
lábios de maus ministros” do mesmo modo que os Sacramentos “são válidos para o fiel, embora
administrados por ministros indignos” (Cap. 18).

Nesse arranjo, as funções de pregação eram quase um ritual que, embora obviamente sem uma
forma fixa, ainda assim carregavam o peso litúrgico dos outros elementos, porque o sermão em
si é o momento em que Deus fala a seu povo por meio do seu servo. Pregar não é simplesmente
o ato de discurso onde o ministro tenta comunicar uma particularidade moral ou uma verdade
doutrinária. É uma atividade santa que Deus ordenou a fim de revelar-se a si mesmo no culto.

Chaves Ministeriais do Reino

Uma visão elevada da Palavra (pregada) e Sacramentos, por sua vez, leva a uma imagem bem
diferente de ministro do que a que prepondera nas igrejas presbiterianas contemporâneas. De
fato, o ofício especial da ordenação é o lugar onde o presbiterianismo low-church completa sua
volta e reduz o trabalho do pastor a um dos vários ministérios que o povo de Deus conduz em
sua caminhada de vida. Aqui, a doutrina do sacerdócio universal do crente e da Grande Comissão
foram pervertidos para significar que ministros prestam serviços que não são diferentes do que
os outros crentes fazem, exceto que os pastores fazem isso em tempo integral, enquanto o
laicato o faz como passatempo.

Assim, se a pregação realmente é a Palavra de Deus e os Sacramentos realmente comunicam os


benefícios da redenção, logo, as pessoas que desempenham essas funções são claramente
diferentes dos outros crentes e deveriam ser separados (ordenados) para desempenhar tão
santas tarefas. Além do que, as palavras de Cristo em Mateus 28: 18-20 para ir a todo o mundo
e fazer discípulos não são uma base legítima para que todo cristão se creia chamado para
ministrar a palavra.

As instruções de Cristo deixam claro que os meios de discipular as nações são a Palavra (ensino)
e Sacramento (Batismo). Se os evangélicos ou presbiterianos low-church vão citar a Grande
Comissão para desafiar a singularidade do ofício ministerial, então, eles precisam carregar
consigo, além de suas Bíblias, um pouco de água para realizar Batismos.

Essa é a lógica por trás da compreensão reformada da ordenação, um conceito que acrescenta
ainda outra peça ao mosaico do presbiterianismo high-church. A ordenação na maioria das
tradições cristãs tem a ver com separação de indivíduos para tarefas especiais dentro do
espectro da Igreja. Uma vez que o trabalho dos ministros, como o Apóstolo Paulo diz, envolve
ser despenseiro dos “mistérios de Deus” (1 Coríntios 4.1), a vocação dos ministros é um
chamado santo e sagrado. Eles foram separados para fazer trabalho que é santo, não que é
comum.

Segundo a Confissão de Genebra de 1537, chamado tão elevado requer dos membros da Igreja
que “recebam os verdadeiros ministros da Palavra de Deus como mensageiros e embaixadores
de Deus”, que “deem ouvidos” a esses ministros como ao próprio Cristo, e que considerem a
obra dos ministros uma “necessária comissão de Deus na igreja”. Calvino acrescentou que o
ministério não é uma “invenção de homens”, como se ele tivesse sido criado como um modo
sábio de governar a Igreja na eventualidade de se encontrar um laicato iletrado ou preguiçoso.
Antes, o ministério é “uma designação feita pelo Filho de Deus”, portanto, rejeitar ou desprezar
o ministro cristão seria como “rebelar-se e insultar ao próprio Cristo”11.

Além das epístolas paulinas, os moldadores da tradição reformada buscaram fundamentação


bíblica também em outro conjunto de textos que assusta a maioria dos protestantes low-church:
Mateus 16.19 e 18.15 em diante, onde Cristo instrui os apóstolos acerca das “chaves do reino”.
A razão óbvia para o temor low-church aqui é o apelo de Roma a essas passagens para justificar
a supremacia e autoridade papal. Contudo, esse apelo não inibiu os primeiros protestantes, que
não estavam dispostos a descartar totalmente o ministério para poder se livrar de alegações
papais. Da perspectiva deles, a aplicação de Roma desses textos era falha, mas não era falha a
ideia de oficiais da Igreja possuírem as chaves do reino. Por essa razão, o Catecismo de
Heidelberg, pergunta 83, diz que “a pregação do santo evangelho e a aplicação da disciplina
cristã para o arrependimento” são as chaves do reino, ambos os quais “abrem o reino do céu
para crentes e fecham-no para descrentes”.

Fique-se claro que os reformados tiraram as chaves do ministério sacerdotal individual e deram-
nas à obra declarativa de ministros e presbíteros. Os reformados não evitaram o que encaravam
como erros de Roma criando uma concepção de vida cristã onde a membresia numa igreja fosse
opcional ou secundária a formas de piedade pessoais ou paraeclesiásticas. Os cristãos
presbiterianos e reformados afirmaram que membresia numa igreja é algo que importa
muitíssimo, tanto que os teólogos de Westminster escreveram que não há “possibilidade
ordinária de salvação” fora da igreja visível (CFW 25.2).

O Glorioso Sábado do Cordeiro

A única área onde a tradição reformada obviamente desvia-se de outras tradições high-church
é na questão do calendário litúrgico. Aqui, contudo, está uma das grandes ironias do
presbiterianismo contemporâneo, já que suas sensibilidades low-church cultivaram um
impressionante apego à versão “light” do calendário litúrgico, a saber, observar apenas Natal e
Páscoa. Isso é irônico porque se os presbiterianos de hoje que se agarram a seus espetáculos de
Natal e reverenciam seus cultos de Sexta-Feira da Paixão tivessem de confrontar as origens high-
church de seus dias santos preferidos, eles poderiam mudar de ideia rapidamente.

Desde seu início, por causa da aplicação do Princípio Regulador do Culto, a tradição reformada
se opôs à celebração que requeresse presença de membros da igreja em qualquer outro dia
além do Dia do Senhor. O Princípio Regulador ensina, sucintamente, que a Igreja –
corporativamente falando, não membros individuais – só pode exigir aquilo que tem autorização
clara e explícita na Palavra de Deus. O calendário litúrgico, conseguintemente, pode até ser um
modo inteligente de relembrar aos crentes que o modo como eles contam o tempo é diferente
do modo como o mundo conta o tempo. No entanto, por não ter uma autorização clara da
escritura, as gerações mais antigas de presbiterianos rejeitaram o calendário como uma
invenção humana, logo, ilegítimo para o corpo da Igreja, não importando quão sábio ou
venerável ele fosse. Indivíduos podem observar alguns dias santos, mas os oficiais da Igreja só
podem exigir observância do único dia santo consentido pelo Novo Testamento, a saber, o Dia
do Senhor.

Obviamente, a tradição reformada parece incrível neste ponto para outras tradições litúrgicas.
Mas a ideia aqui não é convencer outros protestantes high-church de que a tradição reformada

11
AINSLIE, J. L. The Doctrines of Ministerial Order in the Reformed Churches of the Sixteenth and
Seventeenth Centuries. Edinburgh: T. & T. Clark, 1940, pp. 8–9.
é a correta ou mesmo plausível, mas, sim, mostrar como o presbiterianismo low-church
contemporâneo afastou-se de suas origens reformadas. Como igualmente é o caso com outras
expressões litúrgicas de fé, o presbiterianismo high-church não tanto rejeita o calendário
litúrgico, mas, antes, oferece-lhe uma alternativa: a observância semanal do Dia do Senhor. Os
protestantes reformados têm, portanto, 52 dias santos por ano.

Nesses dias santos em que cristãos descansam de seus labores semanais e reúnem-se para
cultuar, eles não apenas seguem o padrão de dias estabelecidos por Deus na semana da criação,
mas também aguardam ansiosamente o santo descanso que espera a todos os filhos de Deus
quanto Cristo voltar. Isso é especialmente verdade no próprio culto quando, segundo os
reformados creem, a Igreja reúne-se espiritualmente no Dia do Senhor com o restante dos
santos e anjos na presença de Cristo, para desempenhar aqueles atos de adoração que
prefiguram a ceia de casamento do Cordeiro. Considerar o Dia do Senhor desse modo high-
church, como um lampejo da glória, pode ser útil para evitar o modo hipócrita que
frequentemente tem cercado o descanso semanal dos presbiterianos.

Contudo, todas essas práticas reformadas tornam um presbiteriano em high-church? Ao ver as


observâncias que caracterizam as tradições high-church e ao compará-las com as práticas
reformadas antigas, deveria ficar ao menos evidente que bons presbiterianos podem nutrir
legítima simpatia pelo tipo de piedade que embasa o luteranismo ou o anglicanismo.

Os Puritanos & Liberdade de Consciência

Independentemente de as práticas reformadas apresentadas até agora serem qualificadas ou


não como high-church, elas claramente diferem das práticas modernas da maioria dos
presbiterianos. A pergunta permanece: por que há essa disparidade entre as formas mais
antigas e contemporâneas da vida eclesiástica reformada?

Talvez o maior obstáculo a um maior reconhecimento da importância da liturgia na vida dos


cristãos dentro da tradição presbiteriana seja o legado do puritanismo. Os puritanos
corretamente advogavam o Princípio Regulador do Culto, ou seja, a ideia de que tudo que for
feito no culto público deve encontrar autorização explícita na Escritura. Se a Bíblia não exige
algo, então não se o pode fazer, mesmo que a coisa em questão não seja inerentemente
pecaminosa. Então, por exemplo, a Bíblia pode não proibir explicitamente um momento de
testemunhos durante o culto. Contudo, a não ser que testemunhos encontrem sanção direta na
Escritura, eles não podem ser incluídos no culto público. O Princípio Regulador encontra apoio
tanto nas tradições reformada continental quanto na anglo-presbiteriana, diferindo, assim, das
práticas episcopais e luteranas, onde a Bíblia é usada principalmente como um referencial
negativo (i.e., “o que não pode ser feito?”).

Em mãos puritanas, o Princípio Regulador criou oposição ao Livro de Oração Comum, da Igreja
da Inglaterra. Fique-se claro que parte dessa hostilidade se originou na hipersensibilidade
puritana a qualquer traço de catolicismo existente na liturgia. Além do mais, os puritanos tinham
um medo legítimo de uma autoridade eclesiástica centralizada que pudesse forçar um ministro
a fazer orações que atentassem contra sua consciência.

De fato, uma questão frequentemente esquecida nas batalhas sobre o culto ou disputas sobre
o Princípio Regulador é que a liberdade de consciência é intimamente ligada à compreensão
calvinista de culto. Não é apenas que os puritanos reconhecessem que a Bíblia deva regular tudo
o que ocorre no culto público – uma concepção bem estreita – mas também que ela é a única
autoridade legítima que pode subordinar uma consciência individual; uma noção que reconhece
tanto a legitimidade da diferença de opiniões acerca das circunstâncias do culto como também
que o culto público força, intencionalmente ou não, os crentes a se submeterem à liturgia, seja
dela participando ou se abstendo. O culto público é algo realizado por todos. Assim, como todos
os membros de uma igreja devem participar dos elementos de culto, o melhor modo de compelir
a esse envolvimento é demonstrar que a Bíblia exige determinada prática.

Contudo, por mais louvável que tenha sido o esforço puritano de proteger consciências
individuais contra leis ilegítimas, seu desenlace foi o caos litúrgico. O raciocínio era que liturgia
exigida para todas as congregações era uma interferência contra a liberdade de consciência,
principalmente porque a Bíblia não estabelece uma ordem de culto em lugar nenhum. Essa
lógica foi especialmente evidente no Diretório de Culto de Westminster, que apenas fazia
sugestões sobre as formas, ao invés de apresentar textos e orações que os ministros pudessem
usar. O Diretório foi uma concessão aos congregacionais e independentes, que acreditavam que
qualquer liturgia estabelecida cheirava a tirania.

Tão forte tem sido o desejo presbiteriano e reformado de proteger a liberdade de consciência
que, mesmo naquelas igrejas onde se tem maior tolerância a liturgias estabelecidas, como na
Escócia ou nos Países Baixos, os concílios superiores12 sempre foram relutantes em exigir que
todas as igrejas usassem as formas aprovadas. Assim, as igrejas presbiterianas e reformadas
foram contra a defesa de Calvino por uniformidade litúrgica a fim de proteger os poderes locais
de pastores, conselhos13 e consistórios14.

Em Desacordo com a Ordem

Embora admirável, o compromisso presbiteriano com a liberdade de consciência está em


desacordo com o igualmente louvável desejo presbiteriano pela unidade da Igreja. Não é difícil
que presbiterianos consintam com unidade teológica e eclesiológica, mas eles traçam o limite
quando o assunto é uniformidade litúrgica. Por exemplo, é raro o presbiteriano que não conheça
o valor de confessar os símbolos de Westminster como a norma teológica para se estar em
comunhão ministerial. De fato, a maioria dos presbiterianos conservadores orgulham-se de
serem teologicamente precisos. Esse confessionalismo presbiteriano é provavelmente o
responsável por boa parte da unidade teológica que prevalece nas denominações que enfatizam
a aderência à Confissão de Fé de Westminster e aos Catecismos Maior e Breve.

Semelhantemente, presbiterianos costumam ser bem rigorosos com sistema de governo. Aqui,
a Form of Government e o Book of Church Discipline15 saciam a sede presbiteriana por decência
e ordem. E mesmo que esses documentos não tenham referências de versículos bíblicos como
os Símbolos de Westminster, poucos presbiterianos veem as regras que governam os oficiais da
Igreja como algo pesado. De fato, sem eles, a Igreja seria caótica e arbitrária.

Por que é, então, que, quando o assunto é a liturgia do culto, presbiterianos ficam
desconfortáveis e permitem que indecência e desordem prevaleçam? Se presbiterianos
conseguem aquiescer a um conjunto detalhado de documentos confessionais e catequéticos,
por que não a um livro de oração comum? Se presbiterianos conseguem se submeter aos rigores

12
N. do T.: Adaptado ao presbiterianismo brasileiro. No original, “assembleias superiores”.
13
N. do T.: Adaptado ao presbiterianismo brasileiro. No original, “sessão”.
14
N. do T.: Nome dado ao Conselho nas igrejas de herança neerlandesa.
15
N. do T.: Assim como a IPB possui seu Manual Presbiteriano, onde estão reunidos seus documentos
governantes, a OPC também possui seu Book of Church Order, onde estão reunidos o Form of Government
(equivalente legal à Constituição da IPB), o Book of Discipline (equivalente legal ao Código de Disciplina) e
o Directory for the Public Worship (equivalente legal aos nossos Princípios de Liturgia).
de seguir o procedimento adequado em reuniões de Conselho e de Presbitério, por que não há
uma ordem estabelecida de culto? Formas litúrgicas e orações escritas podem subordinar a
consciência, mas não mais do que os Padrões de Westminster ou a Forma para Ordenação de
Presbíteros da Orthodox Presbyterian Church. Contudo, presbiterianos são tão receosos de
formalismo litúrgico que evitam formas comuns de culto.

A irônica exceção é o Directory for Public Worship da OPC, que inclui uma forma completa com
litanias e orações para a dedicação de um novo prédio. Aqui, o mesmo tipo de consentimento
voluntário usado para a aderência a credos e sistema de governo precisa embasar o uso
presbiteriano e reformado da liturgia. Se os oficiais da igreja voluntariamente consentem em
subscrever a Confissão e os Catecismos da Igreja com a ideia de preservar a unidade da igreja,
porque seria excessivo acrescentar liturgia aos credos e sistema de governo?

“Terno Derramar do Coração”

O perigo é que a liberdade de consciência frequentemente é uma cortina de fumaça para uma
piedade experiencial que está em desacordo com a formalidade inerente a liturgias prontas.
Desde os reavivamentos do século XVIII, que os presbiterianos largamente abraçaram, a tradição
reformada na América do Norte tem sido afligida com a premissa evangelical de que a devoção
cristã sincera não se pode exprimir nas palavras ou textos concebidos por outrem.

Charles Hodge expressou bem esse sentimento quando ele escreveu que orações escritas
“tendem à formalidade e não podem ser um substituto adequado ao terno derramar do coração
movido pelo espírito de genuína devoção”16. Essa perspectiva entre os presbiterianos cultivou o
senso de que se um ministro ou um crente regular usar um livro de oração, ele está
simplesmente seguindo um roteiro ou, pior, exibindo uma ortodoxia morta. Foi aqui que o
presbiterianismo fez uma curva errada: assumiu-se o jugo do entusiasmo, entusiasmo esse no
sentido usado por R. A. Knox quando ele escreveu sobre uma “nova abordagem à religião” onde
a fé cristã desloca-se de “uma questão de formas e ordenanças externas” para “um assunto do
coração”.17

Obviamente, os presbiterianos não podem pôr a culpa da afinidade de sua tradição por
entusiasmo exclusivamente em avivalistas como George Whitefield e Jonathan Edwards. Alguns
historiadores argumentam que a prática de Comunhão por temporadas do presbiterianismo
escocês, quando algumas igrejas administravam a Ceia apenas de duas a quatro vezes por ano
após uma semana de festividades antecedendo o Sacramento, também acrescentaram
fermento entusiástico à massa da prática presbiteriana. Essas festividades logo evoluíram para
acampamentos e reavivamentos em que a excitação daqueles que recebiam o Espírito soterrava
a experiência de receber os benefícios de Cristo na Ceia. (Cf. William De Arteaga, “When Heaven
Touches Earth,” Touchstone 10.2, Spring 1997.)

Por qualquer que tenha sido o modo como chegaram ao modo entusiástico de ser, a lógica anti-
formalista do presbiterianismo precisa de um escrutínio mais minucioso. A noção de que a
religião genuína deve necessariamente ser expressa nas palavras do próprio crente conduz a um
caminho carismático, não a um caminho presbiteriano. Quando os pentecostais falam em
línguas, eles exibem uma piedade logicamente consistente com a exigência evangelical de
expressar a fé nas palavras da própria pessoa. No entanto, se presbiterianos reconhecem que

16
HODGE, “Presbyterian Liturgies”, in The Church and Its Polity. London: T. Nelson, 1879, p. 162.
17
KNOX, Enthusiasm: A Chapter in the History of Religion. Oxford: Clarendon Press, 1950, p. 2.
usar palavras de outros, como as palavras da Escritura ou da Confissão de Fé, é algo saudável e
legítimo, então eles não deveriam ver óbice em usar palavras de terceiros no culto.

De fato, o caráter comunitário do culto exige tal dependência nas palavras de terceiros, já que
a demanda por ordem significa que apenas uma pessoa por vez fala ou ora; e quando todos
falam ou oram ao mesmo tempo, é em uníssono. Consequentemente, quando meu pastor faz a
oração de intercessão, eu estou usando as palavras de outro, independentemente de ele estar
orando de si ou de algum livro, pois está orando em nome da congregação. No caso do canto
congregacional, todos na igreja estão se valendo das palavras de um poeta para expressar sua
própria adoração a Deus. Ironicamente, portanto, qualquer congregação (inclusive,
presbiteriana) que não siga os padrões pentecostais ou quacres de culto está automaticamente
impedindo os crentes de expressarem sua fé em suas próprias palavras durante o culto público.

Contradição Anticlerical

A seletividade de presbiterianos neste ponto (não objetando a hinos, mas opondo-se a livros de
orações) tem bastante a ver com a contradição da piedade evangelical. A devoção genuína não
apenas não pode ser legitimamente expressa nas palavras de outros, mas também a hierarquia
implícita em uma coleção determinada de orações é ilegítima. Afinal de contas, o
evangelicalismo nos EUA tem um impulso anticlerical que busca remover todas as barreiras (i.e.,
autoridades) que existam entre um crente e seu Deus. Usar orações aprovadas não apenas põe
palavras nas bocas dos crentes, mas também os força a se submeter ao clero que escreveu essas
orações.

Outra vez: o anticlericalismo evangelical não é adequado a presbiterianos, pois os herdeiros


espirituais de Calvino usam as palavras dos teólogos de Westminster para sua Confissão de Fé,
portanto, consentindo com a autoridade daqueles ministros e presbíteros, além dos oficiais da
igreja que escolheram a Confissão e os Catecismos como padrões doutrinários para as
denominações presbiterianas americanas. O que deixa os presbiterianos modernos irritados é o
prospecto de se submeterem aos oficiais da igreja hoje. Essa submissão parece quebrar o
sacerdócio universal de todos os crentes.

Mesmo assim, se eles reconhecem que Deus aponta autoridades humanas para supervisionar
as esferas civil e familiar (i.e., magistrados e pais), por que as autoridades eclesiásticas seriam
inerentemente suspeitas? Particularmente, se Deus aponta pastores, mestres e evangelistas
para cuidar de e nutrir seu povo, por que os membros da igreja objetariam ao uso, no culto, das
palavras escritas e aprovadas por ministros?

Frequentemente, presbiterianos se opõem à liturgia porque também se recusam a reconhecer


a autoridade legítima dos oficiais da igreja. Essa conexão sugere que usar liturgias elaboradas é
indiferente para o intuito de fazer presbiterianos moverem-se numa direção mais high-church;
faz-se também necessário o reconhecimento apropriado da obra e autoridade do Sagrado
Ministério.

Um Malfadado Estado de Alerta

O abandono das formas litúrgicas por experiências mais emocionais, algo tão característico do
presbiterianismo low-church, é um afastamento significativo do caráter da Reforma Protestante.
Isso põe presbiterianos na situação estranha de tentarem acomodar João Calvino e João Wesley.
O que muitos presbiterianos modernos parecem esquecer é que a Reforma foi apenas isso: uma
Reforma, não um reavivamento.
É possível diferenciar entre os dois usando o artigo 29 da Confissão Belga para determinar se a
igreja usa as formas corretas, especificamente se a Palavra está sendo fielmente pregada, se os
Sacramentos estão sendo fielmente administrados e se a disciplina está sendo corretamente
aplicada. Assim como todos os demais credos reformados dos séculos XVI e XVII, a Confissão
Belga nada informa sobre como identificar um “reavivamento” (grande número de novas
conversões e maior sinceridade da parte dos crentes). Para os reformadores, a questão não era
se uma igreja era viva ou morta.

O conceito evangelical de ortodoxia morta era virtualmente desconhecido até os reavivamentos


do século XVIII. Para os reformadores, a questão era se uma igreja era falsa ou verdadeira. Para
Lutero, Calvino e Cranmer, a maneira de distinguir a igreja verdadeira era observar as formas
mencionadas acima no culto e o modo pelo qual a ordenação acontecia. Esses assuntos não
eram ambíguos: ou uma oração, sermão ou culto de ordenação conformavam-se ao ensino da
Escritura ou não se conformavam (concedo aqui que cristãos episcopais, luteranos e reformados
liam o que a Bíblia diz sobre esses assuntos de modo diferente, algumas vezes).

Determinar se uma igreja ou pessoa era espiritualmente viva, reavivada ou morta não era algo
tão certo. Infelizmente, desde o Primeiro Grande Avivamento, presbiterianos têm buscado
atentar mais à obra invisível do Espírito Santo do que à obra visível da Igreja, um estado de alerta
malfadado à frustração devido aos movimentos misteriosos do Espírito.

A Igreja como Mãe

A resposta ao presbiterianismo low-church não é a introdução de coletas, formas para


administração da Ceia do Senhor, nem a recitação semanal do Credo. Por mais necessário e
edificante que o culto litúrgico seja, os presbiterianos low-church não reconhecerão sua virtude
a não ser que, ironicamente, passem por uma mudança de coração. A liturgia high-church exige
uma piedade high-church. O mesmo vale para sistema de governo high-church e
confessionalismo high-church.

Em outras palavras, presbiterianos precisam aprender que o ministério da Igreja é um meio de


graça. Segundo o Breve Catecismo de Westminter (P. 88), “os meios exteriores e ordinários pelos
quais Cristo nos comunica as bênçãos são as suas ordenanças, especialmente a Palavra, os
Sacramentos e a oração, os quais todos se tornam eficazes aos eleitos para salvação.” Não é luxo
cuidar para que as palavras corretas e apropriadas sejam empregadas nas ordenanças ou rituais
usados no culto, nem o é selecionar que homens são ordenados ao ministério. O próprio Deus
prometeu usar e abençoar as orações, canções, sermões e formas sacramentais de ministros
legitimamente ordenados.

Para muitos protestantes americanos, frequentemente a igreja é vista como apenas mais uma
expressão de devoção genuína sentida no coração, uma escolha que é equivalente às formas
pessoais de devoção ou a iniciativas paraeclesiásticas. Fique-se claro que a igreja reunida em
adoração e liderada por ministros é o local onde os crentes coletivamente expressam seu louvor
e adoração a seu Pai Celestial, portanto, eles deveriam tomar muito cuidado em como se
expressam ao soberano Senhor do universo. Mas a igreja também é o lugar onde Deus, por meio
de seus subpastores, ministra a seu povo, especialmente na Palavra lida e pregada e na
administração dos Sacramentos, quando Deus recorda seu povo do perdão que lhes deu e
edifica-os em santidade e conforto.

Uma visão elevada da Igreja, de seu culto, de seu ministério, e de seu credo, requerem, então,
uma piedade que reconheça a dependência do crente dos meios que Deus ordenou para
abençoar seus filhos. Se a Igreja é simplesmente um modo de exibir nossa devoção ou zelo,
então as formas e os ministros podem se tornar um fardo, mas se a Igreja é o local aonde vamos
para ouvir as Boas-Novas de homens devidamente ordenados, então a liturgia e o clero tornam-
se, pela bênção do Espírito Santo, a seiva da peregrinação e devoção do crente.

Em outras palavras, presbiterianos precisam recuperar a noção da Igreja como mãe. Essa ideia
é alienígena para muitos dos herdeiros teológicos de Calvino, apesar de o reformador de
Genebra ter escrito explicitamente sobre as capacidades de nutrir da igreja. No Livro IV de suas
Institutas, Calvino afirma que a imagem da Igreja como mãe expressa quão importante a obra
dela é para os filhos de Deus. “Não há outro ingresso à vida a não ser que ela nos conceba no
ventre, a não ser que nos dê à luz, a não ser que nos nutra em seus seios, enfim, sob sua guarda
e governo nos retenha, até que, despojados da carne mortal, haveremos de ser semelhantes
aos anjos” (Institutas, Livro IV, 1.4). Calvino ensinou, juntamente com uma grande parte da
tradição reformada original, que o crente sem a Igreja definharia e morreria, assim como um
bebê sem sua mãe.

Assim como Deus proveu para os israelitas quando vagavam pelo deserto, a Igreja sustenta o
cristão em sua peregrinação por meio de seus ministros, ritos de pregação e Sacramentos,
cuidado e instrução. Os meios de graça que Deus ordenou para a Igreja ministrar são como o
maná e as codornizes que ele deu para os israelitas comerem até que chegassem à terra
prometida.

Contudo, para reconhecer a Igreja como mãe, presbiterianos precisam se lembrar se seu estado
de peregrinação. As chances são de que uma estima empobrecida da Igreja resulte diretamente
de uma estima excessivamente elevada de nós mesmos. A visão elevada que Calvino tinha da
Igreja e do cuidado que ela presta estava ligada a uma visão sóbria da necessidade que os
crentes têm de serem assistidos e edificados na fé.

A atitude comum dos presbiterianos low-church para com a Igreja é notavelmente evidente em
sua observância pouco frequente da Ceia do Senhor. A maioria das congregações celebram o
sacramento, no máximo, doze vezes por ano. O que isso diz sobre a piedade presbiteriana?
Alguns podem responder que essa baixa frequência reflete uma visão elevada da ordenança,
uma vez que observá-lo semanalmente poderia encorajar indiferença e desinteresse. Mas se
poderia dizer igualmente que tal irregularidade comunica a impressão de que nós não
precisamos da graça que vem da Ceia do Senhor; que, como crentes, somos relativamente
fortes, então a Palavra pregada e lida seria suficiente para recarregar nossas baterias espirituais.

“Alunos por Toda Nossa Vida”

Assim, a estima que se tem pela Igreja está ligada à avaliação que se faz da vida cristã. Neste
caso, parece que os presbiterianos low-church adotaram a atitude dos israelitas quando
reclamaram de sua dieta no deserto. A diferença é que os presbiterianos não estão tanto
resmungando contra a monotonia do alimento, mas sim seguindo uma nova dieta que lhes nega
o pão e o cálice da vida eterna três semanas em cada quatro. Se os israelitas tivessem recusado
o maná com tanta frequência, eles teriam perecido muito antes de chegarem às margens do
Jordão.

Uma vez que o único modo de os presbiterianos terem uma visão elevada da Igreja é recuperar
a ideia de Calvino da Igreja como mãe, também será preciso abandonar a noção de Igreja como
personal trainer. Para gente demais na tradição reformada, o conceito de vida cristã é um de
constante movimento: Deus exige o desempenho de muitas boas obras, de estudos bíblicos no
meio da semana ao desenvolvimento de uma visão cristã das artes, com a Igreja tendo como
tarefa simplesmente fornecer apoio motivacional e programas para desenvolvimento pessoal.
A verdadeira obra da Igreja, portanto, seria o que o povo de Deus faz durante a semana, sendo
o domingo uma espécie de fornecimento de educação continuada.

Entretanto, essa visão da Igreja e da vida cristã não reconhece quão necessitado e frágil o povo
de Deus é, nem quão perigosa é a batalha que peregrinos cristãos devem lutar. Menos confiança
em nossas habilidades e um maior reconhecimento de nossas enfermidades nos levariam a uma
visão diferente acerca da Igreja. Se presbiterianos continuarem a pensar na Igreja como um lugar
para encontros motivacionais, nem toda a formalidade e liturgia do mundo os faria high-church,
pelo contrário, tiraria o fator estimulante dos encontros, que supostamente apimentam a vida
cristã.

A única coisa que talvez quebre a mentalidade low-church é a instrução de Cristo em João 6.
Nessa passagem, Cristo tentou redirecionar os desejos terrenos de seus seguidores para a fome
pelo Pão da Vida. Para esse fim, ele lhes disse que o maná que os israelitas receberam no deserto
prefiguravam não o pão e o peixe com que ele alimentara os cinco mil, mas seu próprio corpo e
seu próprio sangue. “Eu sou o pão da vida”, ele disse. “Vossos pais comeram o maná no deserto
e morreram. Este é o pão que desce do céu, para que todo o que dele comer não pereça. Eu sou
o pão vivo que desceu do céu; se alguém dele comer, viverá eternamente; e o pão que eu darei
pela vida do mundo é a minha carne” (48-51). Cristo continuou: “pois a minha carne é verdadeira
comida, e o meu sangue é verdadeira bebida” (55).

Muitos dos discípulos reagiram a esse ensinamento destacando como ele era difícil: “quem o
pode ouvir?” (60). Para presbiterianos low-church, aprender sobre o ministério da Igreja é
semelhantemente difícil; quase tão difícil quanto superar os últimos 250 anos de história
presbiteriana nos Estados Unidos.

Contudo, se Calvino estava correto, se “nem sofre nossa fraqueza sermos despedidos da escola
[igreja] até que alunos hajamos sido pelo curso todo da vida”, se de fato “fora de seu grêmio
não há de esperar-se nenhuma remissão de pecados, nem qualquer salvação” (Institutas, Livro
IV. 1.4), talvez seja hora de os presbiterianos começarem a desfazer seu passado e
reaprenderem sua tradição. A saúde e ordem da doutrina e da igreja que tanto amam de fato
dependem disso.

Sobre o autor

Darryl G. Hart é presbítero da Orthodox Presbyterian Church, servindo atualmente no Conselho


da Hillsdale OPC. Escreveu o livro Secular Faith, dedicado a J. Gresham Machen, tem passagens
como docente ou diretor em seminários (Westminster California e Westminster Philadelphia) e
faculdades cristãs (Wheaton College), inclusive onde hoje leciona história (Hillsdale College).

Trad. Natan Cerqueira, 2018.

Potrebbero piacerti anche