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MT ESCOLA DE TEATRO

NECROPOLÍTICA: ENTENDA O QUE É A POLÍTICA DA MORTE E

COMO RESISTIR À NECROPOLÍTICA

Aprendiz: Waltair França da Silva

Área: Atuação

Núcleo 2

Cuiabá, MT

2019
MT ESCOLA DE TEATRO

NECROPOLÍTICA: ENTENDA O QUE É A POLÍTICA DA MORTE E

COMO RESISTIR À NECROPOLÍTICA

Relatório dos vídeos Necropolítica: entenda o que é a política de morte, e


Como resistir à Necropolítica? extraídos da entrevista do Psicanalista e Doutor em
Filosofia Fábio Luís Ferreira Nóbrega Franco, ao programa "Bom Para Todos", da
Rede TVT.

A entrevista inicia com o conceito de necropolítica de Mbembe, que é o


filósofo de referência de Fábio Luís, e ele diz que não é um termo novo, mas que já
foi cunhado por outros autores, e tem encontrado eco no mundo todo.

Ele cita o termo tanatopolítica, e cita como Mbembe destaca como os poderes
políticos tem se apropriado da morte como forma de gestão.

Essa gestão se dá inclusive pelo desaparecimento de pessoas não


identificadas e que a gestão dos cemitérios tem sido fator importante na
administração dos corpos.

A necropolítica não só é a gestão da morte, mas a gestão dos corpos, não só


sobre quem deve morrer, mas como devem morrer e o que se deve ser feito como
os corpos depois que morrem.

No segundo vídeo pergunta-se como evitar a necropolítica e Fábio Luís alerta


para a necropolítica local, como o casão de sua tese, os desaparecidos, o
movimento das mães, que fazem com que os nomes das pessoas mortas,
desaparecidas, tratadas como corpos descartáveis, o movimento das mães trazem a
tona esses corpos, fazem com que seus nomes sejam ditos, memoráveis,
lembrados.

Na peça que está sendo montada pelo Núcleo 2, temos um conflito agrário
que culminou em combate armado entre os campesinos e indígenas, fomentado por
um latifundiário.

Isso acontece pelo Brasil afora, e nem todos ficam sabendo. As vezes é
noticiado pelas mídias locais.
No início do módulo, ao se inteirar do eixo narratividade e do operador
necropolítica, escolhemos a área da saúde e das fronteiras territoriais, religiosas,
étnicas, e minha pesquisa se deu em cima dos povos indígenas, massacrados
desde que os portugueses pensaram que descobriram o Brasil.

Os indígenas foram expulsos, se retiraram para a mata, e os não índios,


explorando a mata, os minérios, tratam os povos indígenas como um problema. Com
isso os indígenas encontram dificuldades para existir.

Está acontecendo um massacre violento no interior do Brasil, e ninguém sabe


de fato o que está acontecendo.

Colocar esse fato em cena é trazer a tona muito pouco do que está
acontecendo, mas, como diz o Doutor Fábio no vídeo, quando cita o movimento das
mães, quando trazem a tona o nome de seus filhos assassinados, seus filhos não
serão devolvidos com vida, mas o nome dele será dito e conhecido. Não vai passar
desapercebido.

Isso é citado pelo Fábio Luís como uma forma de resistência contra a
necropolítica.

Creio que é isso, estamos citando narrativamente, de alguma forma, o que


está acontecendo pelo Brasil, e não é que ninguém liga, mas ninguém pára para
refletir sobre.

A seguir, a transcrição dos vídeos. Essa transcrição foi feita antes do relatório
acima. Acrescento na transcrição, a definição de tanatopolítica pela filósofa Marcia
Tiburi, e trecho da tese de doutorado de Fábio Luís, sobre a necropolítica entre
Israel e Palestina, sobre Eyal Weizman, citado por Mbembe.

“Você já ouviu falar sobre política da morte?

Aqui no programa vira e mexe o termo necropolítica surge na nossa conversa.

Vamos entender do que se trata?


Fábio Luiz Ferreira Nóbrega Franco, psicanalista, doutor em filosofia, membro
do Laboratório de Teoria Social, Filosofia e Psicanálise da USP e do Fórum do
Campo Lacaniano de São Paulo.

O que é Necropolítica.

O termo necropolítica foi cunhado por um filósofo camaronês, um cientista


social camaronês chamado Achille Mbembe, que recentemente foi publicado no
Brasil pela editora n-1, mas que vem sendo lido há muito tempo em outras línguas.

Outros termos parecidos com necropolítica já existiam, como tanatopolítica1,


etc, mas o Mbembe foi responsável por ter pensado e elaborado conceitualmente a
relação entre o poder e a morte de forma mais aprofundada do que outros autores
vinham fazendo.

A grande novidade trazida pelo Mbembe foi ter colocado no centro da reflexão
política uma discussão sobre os modos e as formas pelas quais o poder político, de
diferentes maneiras, se apropria da morte como um objeto de gestão. Isto é, o
poder, ele não só se apropria da vida, das formas de vida, o poder não apenas nos
limita, estabelece normas sobre como nós devemos viver, agir e nos conduzir, mas,
e é isso que aponta Mbembe, o poder também decide e toma medidas a respeito de
como devemos morrer, e de quem deve morrer e o que deve acontecer com essa
morte, com esse corpo.

Porque que aqui no Brasil a gente fala tanto sobre necropolítica?

Acho que é uma pergunta super importante, afinal de contas, o termo


cunhado por Mbembe escapou da mão do Mbembe, escapou da pena do autor e
ganhou vida própria se tornando um conceito político essencial para movimentos
sociais, para pesquisadores, para intérpretes da nossa contemporaneidade.

Em primeiro lugar, creio que no Brasil, nós tenhamos que colocar formas de
gestão necropolítica com outras formas de gestão da vida. Isto é, não se trata de
pensar que necropolítica é a única maneira do poder gerir as mortes e gerir os
mortos. A necropolítica no Brasil ela entra, digamos assim, num dispositivo mais
complexo em que ela se encontra, por exemplo, com o racismo, com o discurso do

1 Tanatopolítica é justamente o regulamento oculto da morte dos outros. Marcia Tiburi


inimigo interno, com o neoliberalismo, e com outras tantas racionalidades que
compõem a lógica do poder no Brasil.

E, pensando especificamente na necropolítica, o Brasil, nós o sabemos, as


forças de segurança no Brasil são responsáveis pela gestão violenta e mortífera das
populações nas periferias do nosso país. Podemos ver o caso de São Paulo,
podemos ver o caso do Rio de Janeiro e tantos outros.

Essa maneira de você administrar uma população, gerindo também as formas


de morrer, definindo quem vai ser morto e como vai ser morto, isso é propriamente,
segundo Mbembe, necropolítico.

Tudo isso que você citou é muito presente no Brasil, nesse momento,
realmente. Falou sobre o racismo, sobre a questão da política neoliberal, e
tudo fica muito claro quando a gente pega o Rio de Janeiro, como exemplo,
que tem essa guerra às drogas, declarada pelo governador Witzel. O que ele
exerce é de fato a necropolítica lá no Rio de Janeiro?

Eu acho que, sem duvida alguma, é possível ler as políticas do governador


Witzel no estado do Rio de Janeiro, como tendo um caráter marcadamente
necropolítico. Pegando a obra do Mbembe podemos pensar que duas coisas
caracterizam a necropolítica. Em primeiro lugar, não apensa fazer morrer, não
apenas produzir a morte, mas, mais do que isso, gerir condições mortíferas. O que
isso significa? Significa que trata-se de fazer com que determinadas regiões estejam
submetidas, permanentemente, a um controle das condições necessárias pra
sobrevivência em níveis mínimos, a um controle dos processos de circulação
marcados pelo risco permanente da morte, por exemplo. Isso também é
necropolítica.

Quando você pensa, por exemplo, então na gestão da segurança pública em


certas regiões periféricas do Brasil como responsável por exercer,
permanentemente, naquela população, o medo de ser morto a qualquer momento,
fazendo com que o estado de exceção se transforme em norma nessas regiões, pra
citar um outro autor, Giorgio Agamben, isso é, de certa maneira, uma gestão
necropolítica dessas populações. E em segundo lugar, outra coisa que eu acho
absolutamente importante pra pensarmos a necropolítica, é tirarmos o olhar apenas
do estado pra pensarmos como que essa gestão da morte, ela se faz por meio de
uma série de outros atores, que passam então a também se responsabilizar pela
produção da morte em larga escala, junto ou não com o estado. É o caso do
narcotráfico, por exemplo, é o caso das milícias, por exemplo, que são entidades
que são agentes ambíguos do estado e ao mesmo tempo fora do estado, mas
também responsáveis pela administração dessas condições mortíferas em diversas
regiões do Brasil, marcadamente no Rio de Janeiro.

Quando a gente fala de necropolítica é muito relacionado à questão da


segurança pública. Se ignora todas as outras políticas públicas que precisam
ser desenvolvidas numa região?

Eu tenderia a pensar que a necropolítica é um conceito chave pra pensarmos


outras áreas pra além da segurança pública. É possível dizermos, por exemplo, que
temos uma saúde que opera necropoliticamente na medida em que, de novo, produz
condições mortíferas em determinados equipamentos de saúde, em determinados
serviços como traço fundamental de administração de certas populações.

Porque daí o que me leva a pensar é que você vai lotar o serviço público
de saúde, mas ao mesmo tempo você não vai investir porque você quer que
aquelas pessoas que vão para o sistema morram de fato.

Exato. Exatamente. Morram ou vivam em condições tão mínimas, tão


limítrofes que a relação ou a distinção entre vida e morte passa a ser muito, muito
pequena.

Além disso, em outro setor super interessante pra pensarmos a necropolítica


pra além daquilo que disse o Mbembe, é, por exemplo, a gestão cemiterial, a gestão
dos cemitérios. É importante lembrar que em São Paulo se esteve discutindo
recentemente a privatização dos cemitérios de São Paulo. Isso parece uma pauta
lateral, uma pauta sem muita importância, mas a gestão cemiterial ela é uma das
etapas fundamentais do processo de administração dos corpos. Todos os corpos
vão passar pelo cemitério. E a depender da gestão cemiterial, a depender da
maneira como se olha a administração dos corpos, você pode, por exemplo, produzir
maior número de cadáveres não identificados ou não reclamados, por exemplo. E
obviamente isso faz parte de uma política ou de uma necropolítica que se dá quase
que de forma invisível.
A gente olha muito pra segurança pública porque ali a necropolítica aparece
explicitamente nas intervenções policiais, nas intervenções das milícias, etc, mas há,
por exemplo, todo esse campo de gestão da morte que é muito menos visível, e
muito mais silencioso, o caso dos cemitérios como eu já mencionei, o caso da
administração dos IMLs, o caso da administração dos necrotérios universitários,
todas essas situações são formas de gerir mortos, de gerir populações de corpos.

Que curioso! Agora, quando a gente fala em política de certa forma a


gente tá falando em discussões pra construção de algo. Como é que fala em
necropolíticas, só destruição. Qual o objetivo disso tudo?

Pois é. Um pensador francês bastante conhecido chamado Michel Foucaut,


ele insistia que o poder não pode ser pensado apenas negativamente, isto é, como
um poder de destruição, de silenciamento ou de limitação. Uma vez que o poder, ele
também pode ser pensado e deve ser pensado produtivamente. O poder ele produz
efeitos, o poder ele cria coisas. Então a pergunta é o que cria ou o que produz a
necropolítica, o que cria ou o que produz o necropoder?

Eu tenho utilizado o termo necrogovernamentalidade, um termo técnico,


justamente pra sublinhar, pra enfatizar essa dimensão positiva ou produtiva da
necropolítica. Em que aspecto? Eu diria em dois aspectos. Em primeiro lugar, a
produção de cadáveres não identificados e não reclamados, chamados cadáveres
desconhecidos, que são ainda, digamos, produzidos em larga escala, os cadáveres
desconhecidos não aparecem, eles não existem. Todos nós temos identidade, todos
nós temos nomes. Então que existam cadáveres não identificados, isso é uma
produção do poder. O poder produz certos corpos sem nome. O poder produz
corpos cuja identidade é não ter identidade. Essa é uma produção. Uma segunda
produção é o que eu tenho discutido como um efeito de melancolização geral da
população. Isto é, certos setores em cujos mortos não podem ser chorados, certos
setores cujos mortos desaparecem, certos setores sociais cujas mortes não tomam
nenhuma proporção na sociedade, esses grupos, em alguns casos, ou algumas
dessas pessoas, podem se identificar com uma posição melancólica, isto é, com
uma posição de quem já não tem mais nada a fazer contra esse poder, uma posição
de quem perdeu algo que não sabe o que perdeu, que não pode simbolizar o que
perdeu, que não pode dizer nada sobre o que perdeu e que resta a ela se identificar
com essa perda e, portanto, se converter em uma forma de subjetividade passiva e
silenciosa.

Daí você mina qualquer tipo de reação também.

Como uma política dessa é reeleita? Porque só tem coisa ruim!

Eu acho que essa política ela tem essa face, mas ela tem muitas outras.
Como eu disse: nenhum governo ele tem uma única face necropolítica. Ele tem uma
face necropolítica e tá vinculada a ela outras faces desse poder, outras
racionalidades e outros discursos. E eu insisto, no Brasil o discurso do inimigo
interno é muito presente e é muito potente como nós vimos nas últimas eleições
presidenciais. E o que diz o discurso do inimigo interno? O discurso do inimigo
interno, como alguns autores insistem, é um discurso que tá organizado e se orienta
a partir de uma lógica que nós podemos chamar de lógica imunológica. O que isso
quer dizer? Tal como na imunologia, em que uma entidade externa infecta e
contamina um corpo e, portanto, pra que eu posso manter a saúde desse corpo eu
preciso eliminar essa entidade externa que me infecta, é preciso, portanto, destruí-la,
a necropolítica, no Brasil aparece, por exemplo, como no período da ditadura, e
mesmo na atualidade, muito vinculada a essa lógica imunológica. Ou seja, é preciso
matar, é preciso fazer com que algumas pessoas, alguns grupos desapareçam pra
que eu possa garantir a saúde do Brasil, pra que eu possa garantir a saúde da nossa
população.

Então, digamos, em última instância, o que sustenta a necropolítica é, no


fundo, a sua articulação com o discurso da saúde nacional, por exemplo.

E me parece bastante eficiente. Esse é o problema.

Algumas perguntas das pessoas que estão acompanhando pela internet.

A Letícia Durão disse assim: eu trabalho no cemitério municipal do


Boqueirão em Curitiba, pertencente ao serviço funerário municipal. Curitiba
tem muitos defeitos, mas nosso sistema de serviço funerário é exemplar.

Guilherme Santos fala assim: qual a relação entre o neoliberalismo e a


necropolítica?

Acho essas duas intervenções super importantes. Em São Paulo, um rápido


comentário, acho que vale a pena em razão do que disse a telespectadora de
Curitiba, em São Paulo o serviço funerário era municipalizado, aliás pouca gente se
dedica a entender o serviço funerário, mas em larga medida, o trabalho realizado
pelo serviço funerário municipal era um trabalho de, inclusive cuidado com esses
corpos que chegavam como não identificados, não reclamados, na gestão anterior,
na gestão municipal anterior, foi criado, inclusive, por iniciativa de alguns grupos,
inclusive do serviço funerário, uma página na internet com descrições de todos os
corpos que davam entrada nos cemitérios municipais, não identificados e não
reclamados, o que possibilitou que muitas famílias, inclusive de fora do município,
pudessem reconhecer naquela descrição algum traço do seu familiar desaparecido,
entrar em contato com o serviço funerário e finalmente localizá-lo. Então a
importância de um serviço funerário municipalizado, pensado como política pública é
justamente permitir que certas formas de gestão necropolítica dos corpos possam
encontrar resistência e limitações.

Sobre a questão do neoliberalismo, uma questão fundamental, porque o


neoliberalismo ele parece o oposto da necropolítica, afinal de contas o discurso
neoliberal se caracteriza, dentre outras coisas, por uma espécie de supervalorização
da potência, da performance, da criatividade, injunções como “seja você mesmo”,
“invista em você”, “aumente o seu capital”, etc, e de que forma é possível pensar
necropolítica e neoliberalismo? Acho que a chave pra pensar a relação entre essas
duas racionalidades encontra-se justamente no fato de que no atual estágio do
capitalismo, e isso vem sendo discutido por vários autores, se produz cada vez mais
uma extensa massa da população que não vai ser absorvida pelo mercado de
trabalho. A gente tem a produção de uma massa da população que pode ser
considerada improdutiva. Por várias razões. Por n motivos, uma massa improdutiva,
uma massa que não vai ser incorporada pelo trabalho.

E o que fazer com essa massa? Como gerir essa população?

Antigamente, se poderia pensar, essa população ela é gerida de tal forma


que, a médio prazo, ela seja novamente reincorporada no mercado de trabalho.
Talvez esse fosse o mote, por exemplo, das políticas chamadas
“desenvolvimentistas”. Criam condições, criam certas estruturas que vão permitir, a
médio prazo, que esse grupo, que esse setor da mão de obra que não está sendo
aproveitada, no momento, possa ser reaproveitada. Bem me parece que essa lógica
se altera completamente, na medida em que, o que se faz hoje com esse setor da
população, é justamente gerir condições nas quais a sobrevida vai ser mantida, e em
alguns casos, a morte vai ser produzida.

Essas pessoas que você se refere são esses desalentados, que são
essas pessoas que estão desempregados já há um tempo e que não estão
procurando emprego porque sabem da situação que o país passa.

Exatamente. Esses setores ou as pessoas que estão em situação de rua, e


todos aqueles grupos que são considerados perniciosos, perigosos, improdutivos,
etc.

Parte 2

Robson Vieira Santiago pergunta assim: Há remédio pra essa catarse


social e o desânimo pra essa massa de zumbis que estão perdendo seus
direitos inclusive nada fazem?

Sempre procuro, quando falo sobre necropolítica, também pensar nas formas
de resistência a essa necropolítica e a essas formas de subjetivação, como eu
mencionei a melancolia que são induzidas e produzidas pela necropolítica. E temos
vários exemplos, várias formas de produzir resistência a isso.

Pensando, por exemplo, no caso da violência contra a população negra,


pobre, periférica, exemplos muito importantes de resistência e de luta aparecem nos
vários movimentos de mães que existem pelo Brasil, e que justamente contra a
política de desaparecimento, contra a política de produção de corpos não
identificados, contra a política do silenciamento das mortes, apostam em formas de
fazer com que essas mortes, os seus mortos sejam lembrados, sejam memorizados,
sejam pensados e sejam pronunciados, que esses nomes sejam ditos, que a
presença dessas pessoas seja rememorada. Então, essa é uma forma, por exemplo,
sem duvida, importante de resistência.

Porque justamente a melancolia, o que eu chamo de melancolia, e que


obviamente tem que ver com o conceito freudiano, psicanalítico de melancolia, é a
submissão a um poder que você não pode sequer nomeá-lo como um poder. É até
insidioso que você acaba sucumbindo a uma espécie de posição absolutamente
passiva, de dejeto mesmo, face a esse poder que parece inquebrantável, parece,
enfim onipotente. E o que esses movimentos fazem é justamente dizer não, esse
poder foi o poder que produziu a morte dos nossos filhos, dos nossos familiares, e
assim criando condições para que esse poder possa ser confrontado, enfrentado em
diferentes instâncias.

É transformar essa possibilidade de apatia em indignação de fato.

A gente fala muito dessa questão da necropolítica aplicada aqui ao


Brasil. Outros países são exemplos de necropolítica também? Quais que a
gente pode citar? Pra poder entender um pouco melhor como que a
necropolítica inclusive influencia no mundo.

Em primeiro lugar a necropolítica, e isso aparece no texto do próprio Mbembe,


esse autor que eu mencionei, não é um fenômeno novo. Não se trata de algo que
tenha aparecido no século XX ou XXI. Inclusive o Mbembe vai, a partir de outras
pesquisas, de outras referências, localizar a necropolítica, por exemplo, já no plano
colonial, dado o grande latifúndio monocultor escravagista. O chamado plantation,
essa forma, esse modo de produção econômica colonial que se deu aqui no Brasil.

Nesse contexto, por exemplo, os escravos eles eram aqueles que estavam
submetidos à necropolítica. Os seus corpos poderiam ser destruídos, eles poderiam
ser mortos a qualquer momento, e viviam em condições de fato limítrofes à morte.

Outras formas de necropolítica se deram e ocorreram em momentos da


história em várias partes do mundo. Por exemplo, as políticas imperialistas das
potencias europeias do norte da África. Basta lembrar, por exemplo, da Argélia, do
caso emblemático do processo de independência da Argélia e que foi respondido
pelo governo francês, portanto pelo governo colonial argelino, com o massacre de
vários setores da população, com a criação inclusive, naquele contexto, de um
dispositivo de desaparecimento oficial vinculado ao estado.

Na contemporaneidade, o Mbembe cita, por exemplo, como um caso


particular de necropolítica, o que se passa no confronto entre Israel e Palestina. E se
refere a um autor bastante interessante, um arquiteto israelense chamado Eyal
Weizman que estuda as formas pelas quais Israel produziu nos territórios palestinos
um cerco cuja dimensão é de fato indutora da morte naqueles territórios. Inclusive
Weizman vai estudar de que maneira o governo israelense faz o controle dos fluxos
de alimento, dos fluxos de água, dos fluxos de energia elétrica, de medicamentos,
etc, de forma a manter aquelas populações, nisso que eu venho chamando, quanto
a isso, algumas vezes nessa conversa, de um nível mínimo de vida, ou seja, no
limiar mesmo entra a vida e a morte.

Baseado no caso palestino, o sociólogo africano destaca as características maiores do


necropoder. Primeiramente, a política de fragmentação territorial com o conseqüente
isolamento e multiplicação de assentamentos. Mbembe se apóia, principalmente, no estudo de
Eyal Weizman sobre o papel político da arquitetura e da urbanização nos processos de
ocupação israelense dos territórios palestinos, particularmente da Cisjordânia. Para dar conta
da particularidade desses processos, Weizman cunha o conceito de políticas da verticalidade,
com o qual se trata de mostrar a forma como o poder israelense segmenta em diferentes
móveis limites no céu, na superfície do território e no seu subsolo. Nessas circunstâncias,
afirma Mbembe, “a ocupação colonial não está somente relacionada ao controle, à vigilância e
à separação, ela também é equivalente à exclusão. É uma ocupação fragmentada, na linha do
urbanismo fragmentado da modernidade tardia (enclaves suburbanos e condomínios
fechados)” (MBEMBE, 2003, 28). Extraído da tese doutorado de Fábio Luís Ferreira Nóbrega
Franco.

Ou por exemplo, pra citarmos um outro caso, a forma como os Estados


Unidos, na sua política imperialista, na região também do Oriente Médio, produzem
mortes em larga escala, basta lembrarmos agora, os números que vem aparecendo
com o governo Trump, e essas mortes sequer encontram qualquer tipo de lugar,
qualquer tipo de menção na grande imprensa, por exemplo, norte americana. Nós
sabemos sempre dos volumes, nós sabemos dos números, quando eles não são
falsificados e manipulados, mas aqueles mortos, aquelas mortes permanecem pra
nós como silenciosas.

Uma última pergunta. Vamos a uma luz no fim do túnel. Você falou que a
necropolítica tem uma relação direta com políticas neoliberais, com o racismo.
Não se combate ela diretamente. Se combate tudo isso? Como se faz o
combate à essa necropolítica?

É possível pensar o enfrentamento a necropolítica de muitas maneiras. Eu


tendo a postar muito nas formas de resistência locais da necropolítica, essas
inventadas por aquelas populações que sofrem diretamente com a necropolítica e
que passam, como eu falei antes, falando a respeito dos movimentos de mães, pelas
políticas de memória, pelas políticas de denuncia, pelos movimentos, pelos atos,
aqui trazem a tona os nomes desses mortos, do que aconteceu, etc.
Por outro lado, como você bem apontou, parte dessa necropolítica ela
funciona como um mecanismo, um dispositivo que faz gerar outras políticas no
interior do capitalismo, como por exemplo, o neoliberalismo. Eu falei sobre como que
a necropolítica incide sobre isso, que alguns autores chamam de um excedente
negativo. Nós estamos habituados a pensar o capitalismo como produzir um
excedente, mas tem um excedente recuperável. Esses setores da população sobre
os quais falamos.

A necropolítica, nesses casos, ela pode ser pensada como mecanismo de


gestão dessas populações. Mas de fato aquilo que precisa ser atacado em última
instância, aquilo que precisa ser combatido em última instância é a racionalidade
que movimenta a necropolítica, que é a racionalidade neoliberal, e a forma como ela
opera na conjuntura brasileira, e que é diferente da maneira como ela opera na
Europa central, por exemplo.

Não dá pra esperar muito da necropolítica. O que se pensa no fim das


contas, é então uma população servil, apática, e que aceite tudo que está
sendo colocado.

Em última instância esses são alguns dos efeitos da necropolítica. Mas eu


gostaria de fato insistir nisso. Não se trata de parar aí. Não se trata de olhar pra
esses efeitos pra assumirmos uma posição melancólica diante deles, mas é
importante olharmos pros processos de resistências locais que vem se constituindo
contra esses dispositivos.

A gente falou sobre essa questão do Witzel no Rio de Janeiro, você citou
também São Paulo, o governo Bolsonaro em si também exerce a
necropolítica?

O governo Bolsonaro ele sustenta a necropolítica no país por meio dos


discursos que falam, por exemplo, sobre a importância de se combater diferentes
formas de inimigos internos, quando faz um apelo fundamental a resistência armada
dos grandes proprietários contra movimentos que vão legitimamente questionar o
latifúndio.

Nesse sentido qual a relação do fascismo com a necropolítica?

É uma relação absolutamente essencial. O Giorgio Agamben, esse autor que


eu mencionei, italiano, embora não usasse o termo necropolítica nem tenha pensado
propriamente a partir desse conceito, optou por utilizar uma outra ideia muito
parecida chamada tanatopolítica, ele vai dizer que os movimentos fascistas eles são
justamente uma face que encobre a dimensão necropolítica deles, ou seja, se por
um lado os governos fascistas eles são governos da unidade, que vão exercer
diferentes estruturas populistas, etc, isso vem acoplado profundamente e
intimamente conectados com a produção em larga escala da morte dos mesmo
inimigos internos da nação, da unidade nacional, da saúde da pátria, etc, o discurso
é muito parecido.”
Referências

Programa Bom Para Todos, Rede TVT. Necropolítica: entenda o que é a


política da morte.
https://www.youtube.com/watch?v=w5Ebmemh2Nk

Programa Bom Para Todos, Rede TVT. Como resistir à Necropolítica?


https://www.youtube.com/watch?v=_Vwy3vB-FJM

TIBURCI, Marcia - Tanatopolítica


https://www.youtube.com/watch?v=Ci7mOEX9ktE

FRANCO, Fábio Luís Ferreira Nóbrega. Da biopolítica à


necrogovernamentalidade: um estudo sobre os dispositivos de
desaparecimento no Brasil.

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